Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:054/23.1BALSB
Data do Acordão:04/24/2024
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
RECURSO SUBORDINADO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P32157
Nº do Documento:SAP20240424054/23
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A..., SA
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral:

RECURSO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA

PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO



Acórdão

1. RELATÓRIO

1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira veio, ao abrigo do disposto no artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, dirigir ao Pleno desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo requerimento de interposição de Recurso para Uniformização de Jurisprudência.

1.2. Invocou, no referido requerimento, sumariamente, que a decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) a 10 de Março de 2023, no processo n.º 483/22-T, que ataca no recurso, está em oposição quanto a duas questões fundamentais de direito também decididas nos julgamentos proferidos a 28 de Setembro de 2021 e 20 de Outubro de 2019, respectivamente nos processos n.º 427/2020-T e nº 565/2018-T, ambas já transitadas em julgado e publicadas em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/.

1.3. Nas conclusões das alegações que acompanharam aquela interposição, a Recorrente, além de procurar demonstrar que as questões fundamentais de direito apreciadas nas indicadas decisões em confronto são as mesmas, defende que a decisão arbitral recorrida deve ser revogada e que deve ser uniformizada jurisprudência que acolha o sentido perfilhado pelas decisões fundamento nos seguintes termos:


«QUANTO AO CONCEITO DE INVESTIMENTO INICIAL PARA EFEITOS DE ELEGIBILIDADE EM SEDE DE RFAI

«A. O presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência vem interposto nos termos do n.º 1 do art.º 152.º do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e nº 2 do art.º 25.º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo DL nº 10/2011, de 20 de Janeiro), e tem por objecto a Decisão Arbitral proferida no processo nº 483/2022 – T CAAD pelo Tribunal Arbitral constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), por se encontrar em contradição com n.º 427/2020 – T CAAD, relativa à mesma questão que, com a devida vénia, passamos a transcrever na parte que cobre o caso concreto e onde se refere onde foi decidido que:

«A. Investimento em equipamento de substituição

A Requerente qualificou determinadas aquisições de bens como equipamento de substituição. Trata-se de activos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo, afetos à exploração da empresa e, portanto, ao contrário do que defende a AT, são aplicações relevantes, dado o seu nítido enquadramento no disposto no artigo 22.º, n.º 2, alínea a) (RFAI) e no artigo 30.º, n.º 1, alínea a) (DLRR).

No entanto, a AT considera adicionalmente que essas aquisições não podem qualificar-se como investimento inicial relacionado com o aumento da capacidade do estabelecimento já existente, por se tratar de equipamento de substituição de outro, inoperante ou obsoleto, não cumprindo os critérios de elegibilidade do RGIC, também reproduzidos na Portaria n.º 297/2015, nem sendo adições na aceção do artigo 22.º, n.º 5 do CFI.

Concordamos com o entendimento da Requerida. Na verdade, a mera substituição de equipamento não implica um investimento “inicial”, ex novo, que induza ao aumento de capacidade do estabelecimento existente. Consubstancia um investimento necessário que decorre do normal funcionamento de uma actividade industrial. Parece inquestionável ser imanente, quer ao RFAI, quer à DLRR, o estímulo a um investimento incremental e não apenas a manutenção de um status quo, mesmo que se adote uma abordagem contemporânea aos benefícios fiscais, no sentido de não terem natureza excecional, mas apenas derrogatória (especial) da disciplina ordinária do respetivo imposto. Destaques nossos disponível em: https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=25&listPage=17&id=5593

B. Os arestos indicados divergem no entendimento do enquadramento da seguinte questão:

Se imanente ao conceito de investimento inicial (excepto quanto à tipologia de alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento) está:

iii) o estímulo a um investimento incremental atento o seu propósito de incrementar a actividade económica e a criação de emprego,

iv) que se distinga em relação ao pré-existente, constituindo, por conseguinte, uma expansão do sistema de produção existente inicialmente, e que funcione em simultâneo com este, ou, se admite investimento de substituição?”

C. Aquele conceito (investimento inicial) é conditio sine quo non para aplicação do regime do RFAI (ex vi TFUE, OAR e RGIC).

D. Assim, ao contrário do assumido nos processos n.ºs 427/2020 – T CAAD; 113/2022 – T CAAD e 422/2022 – T CAAD, em que o Tribunal Arbitral concordou com a AT no sentido de que o investimento de substituição não integra o conceito de investimento inicial, a recente decisão 483/2022 –T CAAD colide com as decisões proferidas naqueles processos, admitindo-o.

E. A ora Recorrida dedica-se, a título principal, ao fabricação de calçado, e conforme ficou plenamente demonstrado no Relatório de Inspeção Tributária (RIT) e transcrito para a Decisão sob recurso, o investimento que considerou elegível para efeitos dos benefícios fiscais, quer do RFAI, quer da DLRR, nos anos de 2016 a 2019, tem características de investimento corrente de substituição, reparação e beneficiação de ativos, incluindo ainda a aquisição de ativos isolados destinados a utilização generalizada na unidade fabril pré-existente, razão pela qual, foram considerados não elegíveis na sua globalidade por não preencherem o conceito de investimento inicial (por não ter sido demonstrado o seu contributo para o aumento da capacidade do estabelecimento), e pelo facto de, parte substancial dos ativos considerados, não respeitar a aplicações relevantes nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º (em sede de RFAI) e do artigo 30.º (em sede de DLRR), ambos do CFI. Destaca-se as obras num edifício, em que, para além de outras condicionantes elencadas no RIT, incluindo o facto de se encontrar parcialmente arrendado a outra sociedade, se concluiu que “Estamos aqui perante um investimento que se cinge à melhoria de um edifício, com a necessária reposição e substituição de materiais, que não cabe no conceito de investimento inicial.(citado na página 13 da Decisão).

F. O resumo das situações de incumprimento em sede de RFAI e DLRR no que ao investimento respeita, foram transcritas para a Decisão, a partir da página 28 e da página 42, respectivamente.

G. Ora, O Guia prático do RGIC, emanado da União Europeia, vem, através das respostas a um conjunto de questões frequentes (FAQ do RGIC), esclarecer os diferentes Estados-membros acerca do seu âmbito e apoiar na sua aplicação. De facto, o RGIC – Regulamento Geral de Isenção por Categoria, alinhado com as diretrizes da EU, designadamente, com as OAR, determina e delimita as regras sob as quais os Estados-membros podem atribuir apoios estatais sem o risco de comprometer a livre concorrência na UE, de acordo com o TFUE, e, portanto, sem necessidade de notificação prévia à Comissão Europeia. Não podendo conceber-se, por tal motivo, que não sejam respeitadas as orientações emanadas para o efeito pela própria Comissão Europeia.

H. E conclui-se, a páginas 88 da Decisão, que:

“Como se vê, não há, quanto a este conceito de «extensão da capacidade de um estabelecimento existente», qualquer referência a afastamento dos equipamentos de substituição e, pelo contrário, incluem-se neste conceito todas as situações em que, com o equipamento adquirido, o estabelecimento passa a poder fabricar mais volume de pelo menos um dos produtos já produzidos no estabelecimento.

Por outro lado, não se exige que cada um dos investimentos tenha potencialidade para, por si só, aumentar a capacidade de produção, bastando que tenham potencialidade para influenciar esse aumento integrados num conjunto de aquisições que o geram.”

I. Verifica-se assim que, logo a título introdutório, a decisão CAAD 483/2022 aqui sob recurso, não exclui do conceito de “investimento inicial” contido no RGIC e nas OAR o investimento de substituição, não atribuindo, também, qualquer significado ao termo “inicial” nem equacionando que tipo de investimento é necessário para concretizar cada uma das suas tipologias. Considerando assim ilegais todas as correções em que o facto de se tratar de investimento de substituição era o ou um dos argumentos.

J. Ora, é na área da economia que encontramos os conceitos e as classificações dos investimentos, estando aqui em causa investimento produtivo.

K. E quanto a investimento produtivo, ou é investimento de substituição, de expansão ou de inovação, sendo que, o conceito de investimento inicial apenas contempla os dois últimos, ou seja, investimento que crie ou aumente capacidade de produção (expansão) ou investimento que concretize uma alteração fundamental do processo de produção global, em resultado de uma inovação (inovação ou modernização). Não contemplando, por tal motivo, o investimento de substituição.

“212. Estes conceitos e o que os distingue são do conhecimento geral, mormente das empresas. Veja-se por exemplo, que um dos inquéritos efectuados periodicamente pelo INE (Instituto Nacional de Estatística), o ICIT - Inquérito Qualitativo de Conjuntura à Indústria Transformadora, realizado ao abrigo da Lei n.º 22/2008, de 13 de maio, pede informação acerca dos investimentos realizados de acordo com essa classificação (cf questão 19 do DOC. 1 que ora se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).”

L. O investimento de expansão é um investimento estruturante, que visa o aumento a capacidade produtiva da empresa, redimensionando-a, razão pela qual é um investimento estratégico.

M. Já o investimento de substituição é o mais frequente nas empresas, e tem como principal objectivo a reposição da capacidade produtiva que se vai desgastando pelo uso e/ou pela passagem do tempo. Trata-se de um investimento corrente, imprescindível para manter a operacionalidade da unidade produtiva.

N. Trata-se, portanto, de um conceito amplo, que abrange, quer activos similares, porém novos, para substituir os existentes, quer ativos que operam de forma diferente no desempenho da mesma função, sendo este o tipo de investimento que as empresas mais frequentemente têm necessidade de realizar, tratando-se, portanto de investimento corrente, que visa sempre, em primeiro lugar, a reposição, razão pela qual, não se compreende o paradoxo contido no segmento da decisão antes referido.

O. As FAQ 25 e 80 do Guia Prático do RGIC, excluem este tipo de investimento para efeito dos auxílios regionais ao investimento, exceto se se tratar da tipologia de “mudança fundamental no processo de produção global”.

P. Ou seja, o investimento pode ser meramente de substituição, se for exclusivamente de modernização, em resultado de uma evolução tecnológica, se

i. corresponder a uma alteração fundamental do processo de produção global, e se

ii. exceder o triplo das depreciações dos activos associados.

Q. Portanto, precisamente porque uma alteração fundamental do processo de produção global assenta na substituição daquele, é que é aceite o investimento neste contexto, máxime de mera substituição, de resto, é excluído do conceito de investimento inicial.

R. Em síntese, o investimento de substituição só pode ser considerado como investimento inicial se operar uma alteração fundamental de um processo global de produção, de todo o processo de produção e não só de ativos isolados.

S. Trata-se, portanto, de um conceito amplo, que abrange, quer activos similares (a tal mera reposição), porém novos, para substituir os existentes, quer activos que operam de forma mais eficiente e até mais produtiva, no desempenho da mesma função, mas a não ser que introduzam uma alteração fundamental que abranja todo o processo de produção, estão excluídos do conceito de investimento inicial, principalmente por falta de aptidão para concretizar as restantes tipologias. Razão pela qual, nem precisa de ser expressamente excluído do conceito, porque se depreende do mesmo.

T. Ora, é na área da economia que encontramos os conceitos e as classificações dos investimentos, estando aqui em causa investimento produtivo.

U. Nas decisões dos processos n.ºs 427/2020 – T CAAD; 113/2022 – T CAAD e a recentíssima 422/2022 – T CAAD, o Tribunal Arbitral concordou com a Recorrente nesse sentido.

V. A questão em apreço nos presentes autos prende-se com a reposta à seguinte questão:

“Se imanente ao conceito de investimento inicial (excepto quanto à tipologia de alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento) está:

i. o estímulo a um investimento incremental atento o seu propósito de incrementar a actividade económica e a criação de emprego,

ii. que se distinga em relação ao pré-existente, constituindo, por conseguinte, uma expansão do sistema de produção existente inicialmente, e que funcione em simultâneo com este, ou, se admite investimento de substituição?”

W. Ora, é insofismável, da interpretação de todos os que regulam os auxílios de estado e os benefícios fiscais que o investimento de substituição não integra o conceito de investimento inicial,

X. Pelo que a decisão 483/2022–T CAAD colide com as decisões proferidas naqueles processos, admitindo-o.

Y. Fazendo uma errada interpretação de conceitos e subvertendo, igualmente, o primado do Direito da União Europeia.

Z. O princípio do primado do Direito da União Europeia foi reconhecido pelo TJUE, que o fundamenta na necessidade de homogeneidade na aplicação do direito europeu e no facto de os Estados-membros não poderem invocar direito nacional para fundamentarem o incumprimento das suas obrigações europeias (o que é também um princípio geral de direito internacional).

AA. Pois que a CRP prevê que o direito da União Europeia é aplicável em Portugal nos termos definidos pelo próprio direito da União Europeia (cf. o seu n.º 4 do seu art.º 8.º) o que inclui o primado, nos termos declarados pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

BB. Os benefícios fiscais constituem derrogações ao regime normal de tributação – a chamada «tributação–regra» - consubstancia-se numa vantagem (desagravamento) em favor de certas entidades ou actividades e são sempre instrumentos de política que visam alcançar objectivos extra-fiscais, de natureza económica, social ou de outra natureza com relevante interesse público.

CC. O Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI) é um regime de auxílio com finalidade regional, aprovado nos termos do quadro de direito comunitário a seguir indicado:

RGIC - Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho, designado por Regulamento Geral de Isenção por Categoria, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º DO TRATADO SOBRE O FUNCIONAMENTO DA UNIÃO EUROPEIA (TFUE), publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014:

- Artigo 2.º, §§ 40 a 61 - Definições aplicáveis aos auxílios com finalidade regional

- Artigos 13.º e 14.º - Auxílios regionais ao investimento

OAR - Orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para o período 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 209, de 23 de julho de 2013

DD. Em 2013, o RFAI foi transposto para o Código Fiscal do Investimento (doravante CFI), aditado pelo Decreto-Lei n.º 82/2013, de 17 de junho, e alterado posteriormente pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, que na sequência da reforma do IRC, procedeu à revisão global dos regimes de benefícios ao investimento e à capitalização, com o objectivo de intensificar o apoio ao investimento, favorecendo o crescimento sustentável, a criação de emprego, e contribuindo para o reforço da estrutura de capital das empresas.

EE. Este regime teve em vista, como ressalta da nota preambular, adaptar o regime legal ao novo quadro legislativo europeu aplicável aos auxílios estatais para o período 2014-2020, e, por outro lado, reforçar os diversos regimes de benefícios fiscais ao investimento, em particular no que se refere a investimentos que proporcionem a criação ou manutenção de postos de trabalho e se localizem em regiões menos favorecidas.

FF. O RFAI constitui-se assim como uma medida activa de apoio ao investimento produtivo e à criação de emprego, que opera por dedução à coleta do IRC e através de isenções ou reduções de impostos sobre o património (IMI, IMT e IS).

GG. As disposições que regulam o RFAI constam actualmente do Código Fiscal do Investimento - Capítulo III - Artigos 22.º a 26.º; Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro (RFAI): define os códigos CAE correspondentes às actividades admitidas pelas OAR e RGIC, e os setores de actividade excluídos e da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro: regulamentação do RFAI e da DLRR, no sentido de assegurar a aplicação integral das regras do RGIC, e, quando aplicável, das OAR.

HH. Para efeitos do RFAI, consideram-se aplicações relevantes os investimentos em activos fixos tangíveis (AFT) adquiridos em estado de novo, desde que afectos à exploração da empresa, e em activos intangíveis (AI), constituídos por despesas com transferência de tecnologia a ser explorada no âmbito do projecto de expansão industrial, nas condições previstas no n.º 2 do artigo 22.º do CFI, sempre dependentes do prévio enquadramento no âmbito do conceito de “investimento inicial” (nexo causal entre a estratégia definida e as necessidades de investimento), tal como definido na alínea d) do n.º 2 dos artigos 2.º e artigo 3.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, em concordância expressa com a alínea a) do § 49 do artigo 2.º do RGIC.

II. Para efeitos do DLRR, as aplicações consideradas relevantes constam do artigo 30.º do CFI, não divergindo, no essencial, das admitidas no regime RFAI, sempre dependentes, também, do prévio enquadramento no âmbito do conceito de “investimento inicial” (nexo causal entre a estratégia definida e as necessidades de investimento), tal como definido na alínea d) do n.º 2 dos artigos 2.º e artigo 3.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, em concordância expressa com a alínea a) do § 49 do artigo 2.º do RGIC, por remissão do artigo 11.º da mencionada Portaria.

JJ. O RFAI é, portanto, um regime de auxílios de base comunitária, com finalidade regional e âmbito sectorial, que pode ser usufruído no âmbito de um projecto de investimento inicial gerador de novos postos de trabalho.

KK. A DLRR constitui um regime de incentivos fiscais ao investimento em favor de micro, pequenas e médias empresas nos termos do RGIC [Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014 (2014-2020)], conforme determina o artigo 27.º do CFI, dependente, também, do enquadramento do investimento no conceito de investimento inicial.

LL. Nos termos da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro e com o objectivo de assegurar a aplicação integral das regras previstas no Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 17 de junho de 2014 (RGIC), que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado da União Europeia, bem como das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para o período 2014-2020, o RFAI e a DLRR apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do § 49¹⁴ do artigo 2.º do RGIC.

¹⁴“§ 49) “initial investment” means:

a) an investment in tangible and intangible assets related to the setting-up of a new establishment, extension of the capacity of an existing establishment, diversification of the output of an establishment into products not previously produced in the establishment or a fundamental change in the overall production process of an existing establishment.”

Na versão em língua inglesa, ambos os Regulamentos n.ºs 800/2008 (RGIG 2007-2013) e 651/2013 (RGIC 2014-2020), referem a tipologia “extension of the capacity of an existing establishment”. Na tradução disponibilizada em português, o Regulamento n.º 800/2008 refere “extensão da capacidade instalada”, e o Regulamento n.º 651/2013 “aumento da capacidade instalada”.

MM. Como tal, consideram-se investimentos iniciais, um investimento em activos corpóreos ou incorpóreos relacionado com:

• a criação de um novo estabelecimento,

• o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente,

• a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou

• uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.

NN. Portanto, o investimento inicial pode assumir 4 tipologias distintas, cabendo às entidades o enquadramento do investimento que consideraram relevante numa dessas tipologias, de acordo com as suas caraterísticas e objectivos, e ainda, tendo em conta os critérios definidos no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, nomeadamente:

- No caso da diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento: as aplicações relevantes devem exceder em, pelo menos, 200% o valor líquido contabilístico dos activos que são reutilizados, tal como registado no período de tributação anterior ao do início da realização do investimento;

- No caso de uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente: o montante das aplicações relevantes deve exceder o montante das amortizações e depreciações dos activos associados à actividade a modernizar contabilizadas nos três períodos de tributação anteriores ao do início da realização do projecto de investimento.

OO. Para o efeito, sempre que se faça referência ao regime RFAI aplica-se, quanto ao conceito de investimento inicial aqui em dissídio, à DLRR.

PP. Sendo a prioridade dos auxílios com finalidade regional, onde se enquadra o RFAI, o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego (e a sua manutenção), considera-se que esse objectivo é alcançável através de auxílios estatais que potenciem o investimento que proporcione a expansão do estabelecimento das entidades que acedem a esses auxílios, ou, dito de outro modo, que:

- Crie;

- Aumente, ou;

- Altere substancialmente a capacidade produtiva.

QQ. A capacidade produtiva pode ser definida como a capacidade máxima que uma empresa tem de produzir num determinado espaço de tempo, a partir da utilização dos recursos disponíveis, por exemplo, a produção (em peças) que a fábrica pode gerar trabalhando 24h x 7 dias¹⁵.

¹⁵ Francielly Hedler Staudta, Antonio Sérgio Coelho, Mirian Buss Gonçalves, Determinação da capacidade real necessária de um processo produtivo utilizando cadeia de Markov, Production, vol. 21, núm. 4, octubre-diciembre, 2011

RR. A capacidade de produção é a que decorre das características técnicas das máquinas e equipamentos básicos, coadjuvada pelas instalações e outros equipamentos auxiliares ou periféricos inerentes ao processo, a montante e a jusante.

SS. Não é, pois, o investimento na manutenção das actividades que tem potencial para gerar crescimento económico e emprego, mas o investimento na expansão dessas actividades, através de qualquer uma das formas ou tipologias que integram o conceito de investimento inicial (natureza incremental em relação ao capital fixo pré-existente).

TT. Repare-se ainda que não se utiliza apenas a palavra investimento, mas “investimento inicial”, sendo que, o conceito de investimento inicial surge habitualmente associado ao início de um negócio ou de uma actividade, englobando os recursos necessários para começar as operações (investimento que se destaca em relação ao capital fixo pré-existente, e que não se confunde com as necessidades deste último para se manter operacional).

UU. Esta natureza distinta e incremental subjacente ao conceito de investimento inicial, é a que decorre das quatro tipologias que o integram, devendo ter-se em conta, pare efeito de enquadramento em cada uma delas, os esclarecimentos prestados pela Comissão Europeia através de um conjunto de perguntas e respostas publicadas, entre 2015 e 2016 (FAQ), num guia destinado a auxiliar na aplicação das regras do RGIC - “Guia prático do RGIC”¹⁶ (que aqui se junta como Doc. 2 e se dá, para todos so efeitos legais como integralmente reproduzido), destacando-se, para cada uma dessas tipologias, os seguintes conceitos

i) Aumento da capacidade de um estabelecimento já existente vide FAQ 26

ii) Criação de um novo estabelecimento vide FAQ 30

iii) Diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento vide FAQ 22

iv) Alteração fundamental do processo de produção global de estabelecimento existente vide FAQ´s 25 e 80

¹⁶ “General block exemption Regulation (GBER), disponível em:

https://ec.europa.eu/competition/state_aid/legislation/practical_guide_gber_en.pdf

VV. Da interpretação da CE decorre hialinamente que a simples substituição de activos individuais sem alterar fundamentalmente o processo de produção global constitui um investimento de substituição que não é elegível para auxílios ao investimento regional, uma vez que não se qualifica como uma mudança fundamental de um processo de produção global, e, portanto, não é considerado como constituindo um investimento inicial. Isso também se aplica se itens individuais de equipamento forem substituídos por outros que têm maior desempenho, a menos que isso leve a uma alteração fundamental no processo de produção global.

WW. Com efeito, por força da sua incompatibilidade com o conceito de investimento inicial, este tipo de apoios de Estado sempre esteve e está vedado a investimentos de substituição pelas normas europeias, e tal figurava explicitamente no parágrafo 34 das Orientações Relativas aos Auxílios Estatais com Finalidade Regional para o período 2007-2013 (OAR 2007-2013), e no ponto 4.4 das OAR de 1998.

XX. Mais, nas OAR 2021-2027 recentemente publicadas no Jornal Oficial da União Europeia C153/1 de 2021-04-29, na alínea 13) do parágrafo 19 consta a definição de “investimento inicial”, terminando a definição com a menção Por conseguinte, um investimento de substituição não constitui um investimento inicial”. Destaques nossos

YY. O Regulamento (UE) n.º 651/2014 em vigor para o período 2014 – 2020, cujo conceito de investimento inicial é exatamente o mesmo das OAR, não contém norma expressa a afastar o investimento de substituição, contudo, conforme antes se referiu, o respectivo guia prático menciona nas FAQ 25 e 80, claramente, a exclusão de investimento de substituição da noção de “investimento inicial”, a menos que conduza a uma “alteração fundamental no processo de produção global” em consequência de uma inovação¹⁷.

¹⁷ Um exemplo de uma alteração "fundamental" do processo de produção global, seria, a produção de peças plásticas passar a ser efetuada através de impressoras 3D, que iriam substituir os equipamentos e os moldes de injeção de plásticos utilizados anteriormente.

ZZ. A mudança fundamental do processo de produção global em consequência de uma inovação, pressupõe a substituição das máquinas e equipamentos utilizados anteriormente, razão pela qual, o investimento de substituição não é genericamente ou totalmente excluído deste tipo de auxílios.

AAA. Mas apenas neste caso, conforme vêm esclarecer as FAQ 25 e 80, que em tudo o mais, afastam o investimento de substituição dos auxílios regionais ao investimento, por ser incompatível com o conceito de investimento inicial e com os próprios objectivos destes auxílios.

BBB. O processo de transformação utilizado na fabricação de produtos ou na prestação de serviços industriais (físico, químico, manual, etc.), é dos mais exigentes em termos de necessidades de investimento, sobretudo em AFT, quer em investimento para arranque da actividade, quer em investimento permanente na manutenção da fonte produtora.

CCC. Ora, é na área da economia que encontramos os conceitos e as classificações dos investimentos, estando aqui em causa investimento produtivo.

DDD. E quanto a investimento produtivo, ou é investimento de substituição, de expansão ou de inovação, sendo que, o conceito de investimento inicial apenas contempla os dois últimos, ou seja, investimento que crie ou aumente capacidade de produção (expansão) ou investimento que concretize uma alteração fundamental do processo de produção global, em resultado de uma inovação (inovação ou modernização). Exclui, por tal motivo, o investimento de substituição.

EEE. Estes conceitos e o que os distingue são do conhecimento geral, mormente das empresas. Veja-se por exemplo, que um dos inquéritos efectuados periodicamente pelo INE (Instituto Nacional de Estatística), o ICIT - Inquérito Qualitativo de Conjuntura à Indústria Transformadora, realizado ao abrigo da Lei n.º 22/2008, de 13 de maio, pede informação acerca dos investimentos realizados de acordo com essa classificação (Questão 19 do formulário, que se anexa).

FFF. O investimento de expansão é um investimento estruturante, que visa o aumento a capacidade produtiva das empresas, redimensionando-as, razão pela qual é um investimento estratégico e tem potencial para incrementar a actividade (via aumento da capacidade produtiva) e a criação de emprego.

GGG. Já o investimento de substituição é o mais frequente nas empresas, e tem como principal objectivo a reposição da capacidade produtiva que se vai desgastando pelo uso e/ou pela passagem do tempo. Trata-se de um investimento corrente, imprescindível para manter a operacionalidade da unidade produtiva.

HHH. Conforme mencionado anteriormente, a não ser que conduza a uma “alteração fundamental no processo de produção global”, o investimento de substituição não é elegível para auxílios ao investimento regional (as FAQ 25 e FAQ 80 referem-no expressamente), e, portanto, não se considera um investimento inicial:

᷃ A simples substituição individual de activos;

᷃ A substituição de itens individuais de equipamento por outros, ainda que tenham um melhor desempenho.

III. Assim, uma mera substituição de equipamentos, ainda que conduza a um aumento da capacidade, pela normal evolução tecnológica, não será suficiente para ser elegível para o benefício em causa.

JJJ. Nesse contexto, a substituição de uma máquina por outra mais eficiente até pode aumentar marginalmente a capacidade instalada, todavia, não é investimento inicial no aumento ou expansão da capacidade instalada. Não deixa de ser investimento de substituição.

KKK. O incremento da actividade só se compagina com um investimento de expansão, que permita incrementos substanciais da capacidade instalada, único com potencial para incrementar o crescimento económico e o emprego que são a principal condição do regime RFAI e objectivo de todos os auxílios regionais ao investimento.

LLL. Para além do investimento de substituição, os investimentos que impliquem o aumento da eficiência dos processos de produção existentes, por exemplo, através da introdução de novas tecnologias com o objectivo específico de melhoria da produtividade do trabalho ou da redução dos custos industriais ou de distribuição, investimentos para economizar matérias-primas, energia ou mão-de-obra, investimentos que se destinem à melhoria das condições de trabalho e proteção do ambiente, muitas vezes impostos pela legislação em vigor, também não têm enquadramento no conceito de investimento inicial.

MMM. Com efeito, os auxílios de Estado com finalidade regional não se destinam a financiar as necessidades de investimento para a realização da actividade de exploração corrente, não se destinam ao funcionamento das actividades pré-existentes, ainda que permitam ganhos de eficiência e/ou de produtividade, uma vez que não é a manutenção das actividades que promove o crescimento, o desenvolvimento sustentável e a criação de emprego, é o incremento dessas actividades ou a realização de actividades adicionais.

NNN. Não haverá dúvida que a “criação de um novo estabelecimento” é totalmente incremental.

OOO. Por sua vez, a natureza incremental da “diversificação da produção de um estabelecimento” ou da “mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”, está bem patente na quantificação exigida para enquadramento nessas tipologias, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 3.º da Portaria 297/2015, de 21 de setembro.

PPP. Assim, o “aumento ou extensão da capacidade instalada” tem que ser visto dentro do mesmo contexto e em paridade com as restantes tipologias em termos de potencial para concretizar os objectivos pretendidos com os auxílios regionais ao investimento.

QQQ. Não pode, pois, confundir-se com mera substituição ou actualização (sem ser alteração global) da unidade produtiva existente, ainda que permita ganhos de eficiência ou mesmo aumentos marginais de capacidade, sob pena de ser ilegalmente convertido num mero auxílio ao funcionamento, i.e., para compensar custos normais da actividade sem a incrementar (investimentos que teria sempre que fazer, devido a desgaste, obsolescência, etc).

RRR. Com efeito, as normas previstas no CFI relativas ao RFAI têm sempre de ser lidas e entendidas numa perspectiva unitária, à luz das regras do RGIC e das OAR aplicáveis a este tipo de auxílios e aos objectivos de política económica e fiscal que visam alcançar.

SSS. Ora, à semelhança do que fez a ora Recorrida, a tipologia de “aumento ou extensão da capacidade instalada” é aquela que maioritariamente é invocada pelas empresas para efeito de enquadramento dos seus investimentos.

TTT. O facilitismo com que as empresas deduzem benefícios fiscais ao abrigo do regime RFAI, gerando uma elevadíssima despesa fiscal sem contrapartidas visíveis a nível de crescimento económico e emprego no sentido de concretizar a ambicionada COESÃO, fica muito a dever-se ao facto desta tipologia ser encarada como aquela que, mais facilmente, permite incluir e justificar todos os investimentos realizados pela entidade, entendimento que pode ser exponenciado por interpretações irrestritas como aquela que produziu o CAAD neste processo 483/2022 – T CAAD.

UUU. Portanto, apenas um investimento distinto e incremental em relação ao já existente - INICIAL - será necessariamente incremental em todos os seus aspetos, incluindo em termos de postos de trabalho criados, e permite realizar o objectivo de crescimento sustentável e de criação de emprego.

- incremental em relação ao investimento já existente,

- incremental em termos de capacidade de produção instalada, e

- incremental ainda em termos de postos de trabalho criados.

VVV. Do mesmo modo, o DLRR, por exigir que o investimento se enquadre como um investimento inicial.

WWW. Investimento inicial terá que ser, assim, um investimento novo, novo não apenas no sentido de que os bens que o integram devem ser adquiridos em estado de novo (o que também se exige no n.º 2 do artigo 22.º e artigo 30.º do CFI), mas no sentido de que se trate de um investimento de raiz (inicial), necessariamente distinto e incremental em relação ao já existente, em que se identifique um projecto integrado e agregador inserido numa estratégia de investimento global, excluindo-se também, por tais motivos, a aquisição de activos isolados

XXX. Impõe-se, pois, a verificação prévia de um nexo de causalidade entre os activos considerados elegíveis, o objectivo estratégico do projecto e sua coerência com a tipologia de investimento inicial invocada – i.e., que as aplicações consideradas relevantes integram um projecto de investimento inicial, constituído por um conjunto de activos de capital fixo economicamente indivisíveis do ponto de vista técnico, funcional e estratégico e eventualmente activos intangíveis respeitantes a transferência de tecnologia, necessariamente distinto e incremental em relação ao já existente.

YYY. Não sendo o RFAI nem o DLRR regimes de auxílios ao funcionamento, não podem ser canalizados para investimentos que visem a manutenção da operacionalidade de unidades fabris já existentes, devendo estas funcionar simultaneamente com o novo investimento (a menos que se trate de uma alteração fundamental e global), pois só assim se poderá considerar que o projecto de investimento concretiza uma expansão, isto é, uma extensão do sistema de produção no caso de um investimento inicial na tipologia indicada de aumento da capacidade do estabelecimento.

ZZZ. Nos §§ 5 e 18 dos considerandos do RGIC consta:

18. A fim de garantir que os auxílios são necessários e incentivam o desenvolvimento de actividades ou projectos, o presente regulamento não deve aplicar-se aos auxílios a actividades que o beneficiário realizaria de qualquer modo, mesmo sem o auxílio.” Destaques nossos

AAAA. Nas orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional, em relação ao período 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia C209/01, de 2013-07-23, consta o seguinte:

“3. APRECIAÇÃO DA COMPATIBILIDADE DOS AUXÍLIOS COM FINALIDADE REGIONAL

3.1. Princípios de apreciação comuns

(…)

26. (…) Para o efeito, a Comissão só considerará uma medida de auxílio compatível com o Tratado se cumprir cada um dos seguintes critérios:

(…)

d) Efeito de incentivo: o auxílio deve alterar o comportamento da ou das empresas em causa, de modo a que estas criem novas actividades que não teriam realizado na ausência do auxílio ou que só teriam realizado de uma forma limitada ou diferente, ou noutro local (secção 3.5);

(…)

3.5. Efeito de incentivo

60. Os auxílios com finalidade regional só podem ser considerados compatíveis com o mercado interno se tiverem um efeito de incentivo. Apenas existe um efeito de incentivo quando o auxílio altera o comportamento de uma empresa de um modo que a leve a exercer uma actividade adicional que contribui para o desenvolvimento de uma região, actividade que não realizaria na ausência do auxílio ou que realizaria apenas de forma limitada ou diferente ou num outro local. Os auxílios não devem subvencionar os custos de uma actividade que uma empresa teria, em todo o caso, suportado, nem compensar o risco comercial normal de uma actividade económica.

(…)

62. Se o auxílio não alterar o comportamento do beneficiário incentivando investimentos (adicionais) na região em causa, pode considerar-se que o mesmo investimento teria sido nela realizado, mesmo na ausência do auxílio. Esse auxílio carece de efeito de incentivo para alcançar o objectivo regional e não pode ser aprovado como compatível com o mercado interno.” Destaques nossos

BBBB. É este o espírito subjacente ao conceito de investimento inicial.

CCCC. Ora, no caso de um “investimento inicial no aumento da capacidade do estabelecimento”, tipologia indicada pela então Requerente, teria que englobar, de igual modo, todos os activos necessários para produzir mais quantidades de produto (é necessário instalar capacidade de produção adicional), não se confundindo, naturalmente, com intervenções na estrutura produtiva pré-existente, que devem coexistir pois continuam a ser exigidas para a manter operacional, sob pena de não se estar a incrementar nada.

DDDD. i.e., a realização de um investimento inicial de aumento ou extensão da capacidade instalada, não dispensa o investimento corrente na manutenção da capacidade pré-existente, sendo que, apenas o primeiro é elegível para efeitos do RFAI, impondo-se, por tal motivo a devida separação.

EEEE. Tem, portanto, que haver separação entre um projecto integrado e agregador que se enquadre numa das tipologias de investimento inicial, com objectivos e área de intervenção concretamente definidos, e os constantes investimentos de substituição, manutenção e actualização exigidos por uma exploração desta natureza e dimensão, ainda que daí resultem ganhos de eficiência, de produtividade ou outros, pois nenhuma empresa se mantém no mercado se se tornar obsoleta ou menos competitiva.

FFFF. Estes investimentos não têm enquadramento no conceito de investimento inicial, são investimentos correntes para garantir a continuidade e não para incrementar o que quer que seja.

GGGG. Pela sua assertividade, por constituir uma interpretação autêntica dos normativos europeus; e pela relevância que tem nas respostas que aqui nos propomos a responder, convoca-se a Decisão (UE) 2012/466 da Comissão, de 3 de agosto de 2011 relativa ao auxílio SA. 26980 [C34/09 (ex N 588/08)] (Que aqui se junta como DOC. 3 e se dá, para todos os efeitos legais, por integralmente reproduzido), no que concerne ao conceito de investimento inicial. Vide pontos 50, 51, 128 a 131, 209 a 214, com os devidos realces, e que, no essencial:

- Descreve as categorias que designa por “normais” de um investimento inicial, de acordo com o ponto 34 das OAR 2007-2013, mas que, de facto, são transversais às OAR e RGIC dos períodos seguintes;

- O investimento de substituição, que não satisfaz nenhuma destas condições, está explicitamente excluído do âmbito de definição do investimento inicial;

- Manifesta dúvidas sobre se um projecto de investimento, que visa a modernização e a melhoria da integração das duas refinarias, aumentando a produção de um produto, mas diminuindo a produção de outro, pode ser considerado como um investimento inicial;

- A Comissão opõe assim, diametralmente, investimento inicial a investimento de substituição, considerando que, se o investimento novo funciona em simultâneo com as unidades existentes inicialmente, o projecto de investimento não constitui uma substituição, mas sim uma extensão do sistema de produção.

HHHH. É o próprio conceito de “investimento inicial” que afasta todos os investimentos incidentes sobre a instalação produtiva pré-existente (exceto a alteração fundamental e global), e que se consubstancia como um investimento de raiz, distinto e incremental no sentido de expandir essa instalação – criar, aumentar ou alterar substancialmente a capacidade produtiva.

IIII. Concluindo-se, em face do exposto, que a aceitação de investimento de substituição e modernização (sem ser uma alteração fundamental do processo de produção global), que são investimentos correntes de manutenção da operacionalidade e competitividade de um qualquer sistema produtivo, colide com o objectivo de crescimento económico e criação de emprego, razão pela qual, são afastados do conceito de investimento inicial na vertente de expansão, isto é, da criação de um novo estabelecimento, aumento ou extensão da capacidade do estabelecimento já existente ou diversificação da produção (produtos não fabricados anteriormente).

JJJJ. Esta é, aliás, a única interpretação do conceito de investimento inicial que tem potencial para concretizar o objectivo de criação de emprego, articulando-se perfeitamente com aquele conceito que consta das OAR 2014-2020, alíneas k) e o) das definições, e cujo elemento comum e fundamental radica precisamente na sua natureza incremental, isto é, mantendo simultaneamente os postos de trabalho pré-existentes o os novos criados em razão do investimento.

KKKK. Ou dito de outro modo, se o conceito de investimento inicial fosse compatível com investimento de substituição de máquinas, equipamentos ou processos pré-existentes, que capacidade teria de incrementar o crescimento económico e criar emprego, de pôr mais pessoas a trabalhar?

LLLL. Atalhando caminho para o segundo segmento decisório do qual se recorre, obviamente, admitindo o CAAD a mera substituição de um activo por outro, desde que o novo seja mais eficiente, mais produtivo (na era da tecnologia seria praticamente impossível não ser, pelo que, nesta perspetiva, não faria sentido utilizar a palavra “substituição”), não lhe resta alternativa que não seja a de defender apenas os postos de trabalho “casualmente” associados ao investimento considerado relevante, esvaziando de conteúdo a condição a que alude a alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.

MMMM. De facto, é o que resulta da posição assumida nesta sentença CAAD 483/2022-T, que se basta com um posto de trabalho supostamente criado pelo investimento, independentemente do que acontecer a todos os outros trabalhadores que integravam os quadros de pessoal da empresa antes desse investimento:

No caso em apreço, dos investimentos relativos à reorientação estratégica da Requerente e opção pela robotização resultou a criação de um posto de trabalho do Director Técnico, que se manteve para além de três anos a contar da data dos investimentos (ainda se mantinha em funções quando foi realizada a reunião para produção de prova), pelo que está cumprido o requisito previsto na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI..” (Página 103 da Decisão)

NNNN. Ou seja, admite até a reconversão de actividades que antes desenvolvia (reorientação estratégica), que até podem ser acompanhadas de despedimentos colectivos, desde que mantenha os postos de trabalho criados pelo investimento considerado relevante, que por falta de definição de metas, se pode bastar com apenas um (1) posto de trabalho.

QUANTO À CONDIÇÃO DA "CRIAÇÃO DE POSTOS DE TRABALHO"

In casu a questão em dissenso formula-se nos seguintes moldes:

A. “É exigível que o investimento conduza à criação líquida de postos de trabalho no estabelecimento por forma a que os sujeitos passivos possam beneficiar do regime de benefícios fiscais RFAI, concretizando uma efetiva “criação de emprego” de acordo com o conceito vertido nas Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR) aplicável ex vi alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.?”

B. A questão em apreço nos presentes autos prende-se com a interpretação da condição de criação e manutenção de postos de trabalho prevista na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, atento o objectivo extrafiscal de “criação de emprego” subjacente aos auxílios com finalidade regional, cujo conceito consta das Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para o período 2014-2020 (OAR).

C. Em concreto, se é exigível que o investimento elegível conduza à criação líquida de postos de trabalho no estabelecimento por forma a que os sujeitos passivos do IRC possam beneficiar do regime previsto no RFAI.

D. O presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência vem interposto nos termos do n.º 1 do art.º 152.º do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e nº 2 do art.º 25.º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo DL nº 10/2011, de 20 de Janeiro), e tem por objecto a Decisão Arbitral proferida no processo nº 483/2022 – T CAAD pelo Tribunal Arbitral constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), por se encontrar em contradição com o decidido no processo n.º 565/2018 – T CAAD, relativa à mesma questão que, com a devida vénia, passamos a transcrever na parte que cobre o caso concreto e onde se refere onde foi decidido que:

«Constituindo o RFAI uma medida excecional de fomento à empregabilidade e de incremento do rendimento per capita das regiões desfavorecidas, no quadro de direito europeu (…) assinalado, a aferição da criação e manutenção dos postos de trabalho reclamados pela alínea f) em análise deve ser efetiva, ao nível da entidade que aufere o benefício, pelo que se afigura que a comparação há-de ser feita nos moldes preconizados pela Requerida (entenda-se AT), i.e., globalmente, pois só assim se pode afirmar que o investimento tenha sido indutor da criação de postos de trabalho, pressuposto que, segundo entendemos, deve ser incremental. Aliás, a condição que a lei impõe de criação incremental de postos de trabalho no ano do investimento (…) é medida em função do número global de trabalhadores da entidade, a 31 de dezembro, face à média dos 12 meses anteriores, não havendo razão para adotar critério distinto em relação à manutenção dos postos de trabalho nos anos subsequentes”. Destaques nossos disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?s_processo=565&s_data_ini=&s_data_fim=&s_resumo=&s_artigos=&s_texto=&id=4402

E. Importa ressalvar que este aresto já foi citado e reforçado em outros processos posteriores (vg. Processo CAAD 488/2019 – T CAAD, de 17 de fevereiro de 2020, e Processo CAAD 82/2020 – T CAAD, de 22 de janeiro de 2021).

F. Cumpre ainda esclarecer que os “moldes preconizados pela Requerida”, referidos no processo 565/2018 – T CAAD e nas outras decisões acima citadas, correspondem à aferição da condição da criação e da manutenção dos postos de trabalho com contrato sem termo e que não bastará manter apenas os postos de trabalho especificamente criados pelo investimento.

G. Logo, não é permitido que, durante o período mínimo de manutenção dos bens de investimento e dos postos de trabalho, os trabalhadores com contratos sem termo e o nível de empregabilidade alcançados diminua.

H. Ou seja, o conceito de criação de emprego impresso nos normativos europeus e, por conseguinte, aplicáveis por força do primado do Direito da União Europeia (cf. n.º 4 do art.º 8.º da Constituição da República Portuguesa CRP) está, conforme demonstrado, umbilicalmente ligado à "criação líquida de postos de trabalho", conceito que, porém, foi totalmente obliterado pela decisão arbitral aqui em dissídio.

I. O equívoco em que laborou esta Decisão parte, desde logo, da errada interpretação que faz do conceito de investimento inicial, pois ao defender que este admite investimento de substituição, não lhe resta alternativa “coerente” que não seja restringir o requisito de criação de postos de trabalho aos proporcionados diretamente por esse investimento, independentemente de, e sob um ponto de vista global, apenas conservar ou mesmo reduzir o quadro de pessoal do estabelecimento. Porque, de facto, um investimento de substituição não revela potencial para incrementar e manter emprego, conforme resulta dos elementos referentes à evolução do quadro do pessoal da Requerente no processo CAAD:

- Quanto aos trabalhadores contratados sem termo:

[IMAGEM]

Quanto ao número total de trabalhadores:

[IMAGEM]

- Verifica-se, qualquer que seja a comparação, que em 2017, ano do investimento considerado elegível no âmbito do RFAI, não foi superada a média dos últimos 12 meses em pelo menos 1 trabalhador (1 UTA), verificando-se ainda uma quebra nos anos seguintes (falta de manutenção nos 3 anos seguintes).

J. Ora, considerar verificada a condição a que alude a alínea f) o n.º 4 do artigo 22º do CFI num cenário destes, significa reduzi-la à inutilidade, pois não realiza os objectivos que presidiram à sua criação, aliás, não realiza objectivo nenhum.

K. Também a referência do CAAD no processo 565/2018 – T CAAD à “medida em função do número global de trabalhadores da entidade” pretendeu esclarecer que não se resume, unicamente, aos postos de trabalho especificamente criados pelo investimento, conforme pretendia a Requerente (sujeito passivo) do Processo n.º 565/2018 – T CAAD, de 20 de novembro de 2019.

L. Donde, ao contrário do assumido nos processos CAAD 565/2018 – T, 488/2019 – T CAAD e 82/2020 – T CAAD, em que o Tribunal Arbitral concordou com os critérios utilizados pela AT, ora Recorrente, atrás descritos, a recente decisão CAAD 483/2022 – T CAAD colide com as decisões proferidas naqueles processos, não apenas na análise restritiva apenas em função dos postos de trabalho especificamente associados ao investimento, mas também na aferição com base no número global de trabalhadores da entidade, face à média dos 12 meses anteriores.

M. Deste modo, ficam claras as oposições de decisões arbitrais em sede de RFAI, nomeadamente entre a decisão CAAD 483/2022 – T CAAD aqui sob recurso e as decisões dos processos CAAD 565/2018 – T CAAD, 488/2019 – T CAAD e 82/2020 – T CAAD quanto:

i) à aferição exclusiva em função dos postos de trabalho especificamente criados pelo investimento (que pode ser apenas um – no caso concreto, 1 Director Técnico), desconsiderando mesmo uma quebra do número de trabalhadores da empresa (até pode haver um despedimento coletivo);

ii) a própria desconsideração da aferição da criação e manutenção dos postos de trabalho em função dos contatos de trabalho sem termo e do número total de trabalhadores.

N. O presente thema decidendum reporta-se às matérias de auxílios de Estado – regulados, em primeira mão, pelos normativos comunitários (TFUE, OAR e RGIC), por referência ao RFAI - facto que, em última análise, poderá acarretar consequências graves para o Estado Português, nomeadamente algum procedimento de averiguações e posterior contraordenação por parte da Comissão Europeia.

O. Os arestos indicados divergem no entendimento do enquadramento da seguinte questão:

É exigível que o investimento conduza à criação líquida de postos de trabalho no estabelecimento por forma a que os sujeitos passivos possam beneficiar do regime de benefícios fiscais RFAI, concretizando uma efetiva “criação de emprego” de acordo com o conceito vertido nas Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR) aplicável ex vi alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.”?

P. Adianta-se, desde já, que a resposta é no sentido positivo, i.e., de que, para efeitos de aplicabilidade do RFAI, haverá obrigatoriamente de haver uma criação líquida de postos trabalho ou criação de emprego.

Q. Sendo certo, relembremos, que a criação líquida é requisito cumulativo com os demais e, portanto, conditio sine qua non para aplicação do regime do RFAI (ex vi TFUE, OAR e RGIC).

R. Para o que aqui nos interessa e ocupa os benefícios fiscais, são uma despesa fiscal ¹⁸ passiva nas palavras de Casalta Nabais ¹⁹, na medida em que incide sobre uma situação sujeita a tributação e equivale, em termos quantitativos, a uma receita fiscal não arrecadada.

¹⁸ «…derrogação deliberada ao sistema normal de tributação, que permite actuar sobre a economia privada do mesmo modo que por despesas directas, representando um pagamento implícito feito pelos poderes públicos por intermédio de uma redução dos impostos a pagar ou seja uma despesa pública feita através do sistema fiscal.» PEREIRA, Manuel Henriques Freitas - ob.cit., p 475 e nota de rodapé 719.

¹⁹ NABAIS, José Casalta - ob.cit., p. 391.

S. Ademais, os considerados quer pela Organização Mundial do Comércio – OMC (cf. Acordo sobre subvenções e as Medidas de Compensação), quer pela União Europeia – UE (cf. art.ºs 107.º e 108.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia – TFUE), como auxílios de Estado e por conseguinte alvo de escrutínio no âmbito do Direito da Concorrência, aliás, como decorre já do art.º 6º do EBF.

T. Nos termos das disposições conjugadas das alíneas c) e f) do n.º 4 do artigo 22 do CFI, podem beneficiar do RFAI os sujeitos passivos de IRC que efectuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objecto de investimento, regra geral, 3 anos para as micro ou PME, e 5 para as grandes empresas.

U. Reportando-nos ao direito europeu, o ponto de partida em matéria de auxílios de Estado centra-se no artigo 107.º do TFUE, que, na parte que interessa considerar, dispõe o seguinte:

“1. Salvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.”

(…)

3. Podem ser considerados compatíveis com o mercado interno:

a) Os auxílios destinados a promover o desenvolvimento económico de regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego, bem como o desenvolvimento das regiões referidas no artigo 349.º, tendo em conta a sua situação estrutural, económica e social;”

V. Estabelece-se, assim, uma regra geral de proibição dos auxílios de Estado, que apenas pode ser derrogado em situações particulares e, designadamente, quando se tenha em vista, dentro de certo condicionalismo, o desenvolvimento de certas actividades ou regiões económicas.

W. É nesse âmbito que surgem as “Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR)”, publicadas pela Comissão Europeia, em que se estabelecem, a título introdutório, as directrizes essenciais de plano conceptual.

X. Nos termos do n.º 2 do artigo 1.º do CFI, o RFAI constitui um regime de auxílios com finalidade regional, aprovado nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014, da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno.

Y. Ora, o RGIC – Regulamento Geral de Isenção por Categoria, tal como a designação indica, estabelece os limites dentro dos quais as categorias de incentivos aí previstas, que incluem os “Auxílios estatais com finalidade regional”, podem ser atribuídas pelos Estados sem necessidade de notificação à Comissão Europeia (isenção de notificação).

Z. Fora desses limites, os auxílios carecem de autorização prévia.

AA. Dentro desses limites, os Estados podem fazer opções, tendo até em conta que a Comissão Europeia recomenda parcimónia na atribuição de auxílios de Estado:

5. Os auxílios com finalidade regional só podem desempenhar um papel eficaz se forem empregues com parcimónia e de forma proporcionada e se concentrarem nas regiões mais desfavorecidas da União Europeia (3). Em especial, os limiares de auxílio autorizados devem refletir a relativa gravidade dos problemas que afetam o desenvolvimento das regiões em causa.” (OAR – Introdução)

BB. Portanto, para além de os Estados membros não estarem vinculados a atribuir, em todos os casos, os auxílios estatais que sejam declarados como compatíveis com o direito da União Europeia, também podem adoptar, dentro das soluções possíveis, aquelas que melhor servem os propósitos pretendidos.

CC. Como foi o caso, no que concerne às soluções permitidas pelo n.º 4 do artigo 14º do RGIC, ou seja:

i. Adotando para base de cálculo do incentivo fiscal RFAI, os custos do investimento elegível, e;

ii. Não deixando de exigir que esse investimento crie e mantenha postos de trabalho.

DD. Mas criar e manter postos de trabalho em razão do investimento, só terá efeito prático se conduzir a um aumento do número de trabalhadores de estabelecimento, pelo que, a efetivação da condição a que alude a alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI exige que se produza esse resultado.

EE. De facto, se os postos de trabalho criados diretamente pelo investimento não conduzirem a um aumento do número de trabalhadores do estabelecimento em relação à média dos 12 meses anteriores (média + novos postos de trabalho criados ≥ 1), não se poderá considerar cumprida tal condição, pois não se compreenderia que o impacto do investimento no quadro de pessoal afeto ao estabelecimento fosse nulo ou mesmo negativo, e ainda assim, se admitisse a sua elegibilidade para efeito de usufruição de um benefício fiscal direcionado para investimento indutor de emprego.

FF. Ora, o RFAI constitui-se assim como uma medida activa de apoio ao investimento e emprego, em consonância com o enquadramento europeu em que se insere, desde logo, o § 31 do preâmbulo do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que determina que

“Os auxílios estatais com finalidade regional destinam-se a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável”. Destaques nossos

GG. No que concerne ao requisito da criação de postos de trabalho e a sua manutenção, considerando o objectivo de criação de emprego subjacente aos auxílios com finalidade regional, deve atender-se à definição constante das alíneas k) e o) do ponto 1.2 (Definições) das Orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para 2014-2020 (OAR), publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 209, de 23 de julho de 2013, em que se estabelecem, a título introdutório, as diretrizes essenciais de plano conceptual:

1.2 Definições

…/…

k) «Criação de emprego», um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, após deduzir os postos de trabalho eventualmente suprimidos durante o mesmo período do número aparente de postos de trabalho criados.”

…/…

o) «Número de trabalhadores», o número de unidades de trabalho anuais (UTA), isto é, o número de assalariados a tempo inteiro durante um ano; os trabalhadores a tempo parcial ou os trabalhadores sazonais são considerados como frações de UTA; Destaques nossos

HH. Este “aumento líquido do número de trabalhadores”, que também se encontra definido no §32 do artigo 2.º do RGIC, corresponde e dá cumprimento ao conceito de “criação de emprego”, de acordo com as OAR.

II. Com efeito, embora a solução adotada para efeito de quantificação dos benefícios fiscais no âmbito do RFAI (entre as soluções permitidas pelo n.º 4 do artigo 14º do RGIC), tenha por base os custos do investimento elegível e não os custos salariais decorrentes da criação de emprego em virtude do investimento, a alínea f) do n.º 4 do artigo 22º do CFI exige que o investimento proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento. E essa exigência é efetuada praticamente nos mesmos termos que resultam do n.º 9 do artigo 14º do RGIC (Regulamento n.º 651/2014 da Comissão), aplicável quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados, ou seja:

a) O projecto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número aparente de postos de trabalho criados nesse período;

…/…

c) Cada posto de trabalho criado através do investimento deve ser mantido na zona em causa durante um período mínimo de cinco anos a contar da data em que a vaga foi preenchida, ou três anos no caso de PME.

JJ. Portanto, tal como resulta do quadro de direito europeu acima assinalado, a aferição da criação e manutenção dos postos de trabalho deve ser feita nos moldes já referidos, i.e., globalmente, pois só assim se pode afirmar que o investimento tenha sido indutor da criação de emprego, pressuposto que deve ser incremental (aumento líquido ou criação líquida).

KK. Ora, a decisão CAAD 483/2022 – T CAAD aqui sob recurso, exprime entendimento contrário, nos seguintes termos:

Na verdade, na alínea f) do n.º 4 do artigo 21.º do CFI não se faz referência a aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento, mas apenas a «criação de postos de trabalho» e sua manutenção, o que constitui um elemento interpretativo de acentuada relevância no âmbito de benefícios fiscais, pois, como é jurisprudência pacífica, as normas sobre benefícios fiscais devem ser interpretadas em termos estritos, o que, se é certo que não afasta a necessidade de interpretação, designadamente teleológica, não viabiliza a exigência de requisitos para que não há qualquer suporte textual.

Por outro lado, se é certo que o n.º 9 do artigo 14.º do RGIC, refere que «o projecto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número aparente de postos de trabalho criados nesse período», também o é que ele apenas aplicável, como nele se refere expressamente, «quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados», o que não sucede no caso, pois está-se perante benefício fiscal baseado em investimento em activos fixos tangíveis e intangíveis (artigo 21.º, n.º 2, do CFI).

(…)

De resto, com se refere no acórdão arbitral proferido no processo n.º 307/2019-T … «Nessa perspectiva, a única interpretação que não se reconduza à “criação líquida de postos de trabalho”, será, julga-se, a de que a “criação de postos de trabalho” pressuposta pelo benefício fiscal em questão se refere à criação de postos de trabalho, e a sua manutenção, causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço.

Ou seja: o que está em causa é que o investimento realizado por determinada empresa será elegível para usufruir do benefício fiscal em questão se, e na medida em que, dele resulte, de forma causalmente adequada, a criação de, pelo menos, um posto de trabalho, e a sua manutenção»

(…)

No caso em apreço, dos investimentos relativos à reorientação estratégica da Requerente e opção pela robotização resultou a criação de um posto de trabalho do Director Técnico, que se manteve para além de três anos a contar da data dos investimentos (ainda se mantinha em funções quando foi realizada a reunião para produção de prova), pelo que está cumprido o requisito previsto na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.”

(páginas 102 e 103 da Decisão)

LL. De acordo com o entendimento expresso na decisão CAAD 483/2022 – T CAAD aqui sob recurso, basta que resulte do investimento realizado a criação de 1 (um) posto de trabalho, independentemente do impacto no número de trabalhadores do estabelecimento.

MM. Ou seja, apesar de não afastar a necessidade de interpretação da norma contida na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, tendo em conta nomeadamente o elemento teleológico, limitou-se à interpretação literal daquele preceito, demonstrando uma total indiferença pelos desígnios extra-fiscais do benefício em causa, contrariando o disposto no artigo 9º do Código Civil, por remissão do artigo 11º da LGT.

NN. De facto, nenhuma norma prevê tudo (o CFI também não define AFT, AI, coleta do IRC ao qual o BF é deduzido, etc), mas o próprio sistema jurídico estabelece as regras gerais de interpretação, interpretando-se as normas respeitantes a BF tal como quaisquer outras (artigo 10.º do EBF, artigo 11.º da LGT e artigo 9.º do CC).

OO. Em aplicação desses critérios, deve-se atender, na interpretação da alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI:

- Ao espírito/intenção do legislador ou fim para que foi criado o regime - incrementar a actividade económica e criar emprego, que é o desígnio europeu que fundamenta os auxílios regionais, pelo que, qualquer interpretação que contrarie esse propósito, não poderá estar correta;

- À sua coerência com o sistema normativo em que se insere (neste caso, o Código do Trabalho, onde se regulam as relações de trabalho). Logo, se o legislador fiscal adotou terminologia contabilística, laboral, ou outra, tais conceitos têm de ser interpretados em conformidade com as normas que os consagram, que são a respetiva fonte (SNC, Código do Trabalho, etc)

PP. A “criação líquida de postos de trabalho” decorre diretamente do objectivo e conceito de «Criação de emprego» das OAR, definido como um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, após deduzir os postos de trabalho eventualmente suprimidos durante o mesmo período do número aparente de postos de trabalho criados.

QQ. O instrumento selecionado para o efeito é a realização de um investimento produtivo. Sendo elegível apenas um investimento inicial, distinto e incremental em relação ao já existente, que no caso da tipologia de aumento da capacidade do estabelecimento (de expansão), se traduza na extensão/aumento da capacidade da unidade produtiva, implicará mais espaço fabril, mais máquinas e equipamentos produtivos, e deve ser causa direta da criação de mais postos de trabalho.

RR. Nestas circunstâncias, em que os novos ativos coexistem e podem entrar em funcionamento em simultâneo com a unidade produtiva pré-existente, os postos de trabalho criados por esse investimento também irão acrescer aos já existentes, traduzindo-se esse acréscimo numa criação líquida de postos de trabalho no estabelecimento desde que permita superar a média dos últimos 12 meses (em UTA), dando assim cumprimento à condição de criação de emprego.

SS. Não entender a condição de criação de postos de trabalho em razão do investimento como proporcionando ou conduzindo a uma “criação líquida” de postos de trabalho, retiraria qualquer sentido útil àquele requisito imposto pelo regime RFAI, que, no essencial, tem como objectivo pôr mais pessoas a trabalhar no estabelecimento (tem natureza incremental).

TT. A respeito do vínculo contratual, e tal como também decorre das normas de interpretação antes referidas, já a questão tem que ser dirimida à luz da legislação interna (não há um código do trabalho europeu comum), o que se percebe, pois, sendo uma questão de ordem prática, coloca-se aquando da admissão de um trabalhador em função da legislação da região (EM) e do posto de trabalho que vai preencher.

UU. A natureza da relação de trabalho associada aos postos e trabalho diretamente criados pelo investimento, é estabelecida à luz do Código de Trabalho, é a de contrato sem termo, que é a regra geral, não podendo incluir trabalhadores admitidos ao abrigo de contrato com termo, que, de acordo com o artigo 140º do Código do Trabalho, só pode ser celebrado para satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas mesmas necessidades.

VV. Em suma, a condição relativa à criação de postos de trabalho proporcionada pelo investimento relevante e à sua manutenção, face ao disposto na alínea f) o n.º 4 do artigo 22º do CFI, tem que ser cumprida com recurso a contratos de trabalho sem termo, e os postos de trabalho criados (criar é incrementar em relação ao existente) têm que garantir um acréscimo efectivo do número global de trabalhadores admitidos na empresa em determinado período, salvaguardando assim os valores subjacentes aos auxílios com finalidade regional, nos quais se inscreve o RFAI, designadamente, no § 31 do preâmbulo do RGIC.

WW. Ou seja, o conceito de criação de emprego impresso nos normativos europeus e, por conseguinte, aplicáveis por força do primado do Direito da União Europeia (cf. n.º 4 do art.º 8.º da Constituição da República Portuguesa CRP) está, conforme demonstrado, umbilicalmente ligado à "criação líquida de postos de trabalho", conceito que, porém, foi totalmente obliterado pela decisão arbitral aqui em dissídio.

XX. Ora, o princípio do primado do Direito da União Europeia foi reconhecido pelo TJUE, que o fundamenta na necessidade de homogeneidade na aplicação do direito europeu e no facto de os Estados-membros não poderem invocar direito nacional para fundamentarem o incumprimento das suas obrigações europeias (o que é também um princípio geral de direito internacional).

YY. As consequências da desconformidade entre o direito da União Europeia e o direito nacional é a desaplicação do direito nacional enquanto se mantiver a situação de desconformidade.

ZZ. Os deveres resultantes do primado do direito da União Europeia vinculam todas as entidades públicas, incluindo toda a administração pública, os tribunais nacionais e, por maioria de razão o centro de arbitragem tributário.

AAA. Conclua-se que a CRP prevê que o direito da União Europeia é aplicável em Portugal nos termos definidos pelo próprio direito da União Europeia (cf. o seu n.º 4 do seu art.º 8.º) o que inclui o primado, nos termos declarados pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

BBB. Termos em que, finalizando este capítulo, é inelutável que se responda afirmativamente à questão

“É exigível que o investimento conduza à criação líquida de postos de trabalho no estabelecimento por forma a que os sujeitos passivos possam beneficiar do regime de benefícios fiscais RFAI, concretizando uma efetiva “criação de emprego” de acordo com o conceito vertido nas Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR) aplicável ex vi alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.”?

CCC. Ao contrário do que fez a decisão arbitral 483/2022 – T CAAD, a qual, obliterou in totum os normativos comunitários, os conceitos aí vigentes e que por força do primado do Direito da União Europeia se querem de aplicação uniforme.

Sem prescindir,

DDD. Pela sua i) actualidade, ii) assertividade, iii) importância, iiii) por constituir uma interpretação autêntica dos normativos europeus; e iiiii) pela relevância que tem nas respostas que aqui nos propomos a responder, convoca-se a Decisão (UE) 2022/1414 da Comissão de 4 de dezembro de 2020 relativa ao regime de auxílios SA.21259 (2018/C) (ex-2018/NN) aplicado por Portugal a favor da Zona Franca da Madeira (ZFM) — Regime III, no que concerne à condição de criação e manutenção de postos de trabalho. (vide a pág 49 e ss , com os devidos realces).

EEE. Genericamente, a posição ante exposta e defendida pela ora Recorrente, é a de que as normas europeias (OAR) mandam criar emprego (aumento do número total de trabalhadores ou do total de postos de trabalho), e a seguir, as normas nacionais determinam o vínculo contratual adequado, neste caso, a emprego criado em razão de um investimento produtivo (Código do Trabalho – regra geral: contrato sem termo).

FFF. Posto isto, é incontornável que deve haver um “aumento do número total de trabalhadores do estabelecimento à custa do aumento dos contratados sem termo”.

GGG. Ora, a recente decisão da Comissão Europeia a propósito da ZFM trouxe alguns esclarecimentos acerca do conceito de criação de emprego e reclama a sua transversalidade. Assim,

HHH. Quanto ao conceito de criação de empregoque consta das OAR, a decisão da Comissão vem defender que

“(…) uma definição de postos de trabalho em ETI e UTA é a melhor forma de incluir, sem discriminação, todos os tipos de relações e contratos de trabalho” (pontos 173 e 174 da Decisão).

III. Quanto à natureza da relação de trabalho adequada para preenchimento de um posto de trabalho criado por um investimento, já a questão tem que ser dirimida à luz da legislação interna.

JJJ. O que se percebe, pois, sendo uma questão de ordem prática, coloca-se aquando da admissão de um trabalhador em função da legislação da região (Estado Membro) e do posto de trabalho que vai preencher.

KKK. Portanto, i) o investimento tem que cumprir a finalidade do incentivo, que é criar emprego no estabelecimento (OAR), sendo o conceito de criar emprego e manter emprego transversal às normas europeias e até universal, e corresponde, grosso modo, a pôr mais pessoas a trabalhar no âmbito de uma relação de trabalho, e ii) a natureza da relação de trabalho associada aos postos e trabalho directamente criados pelo investimento, à luz do Código de Trabalho, é a de contrato sem termo, que é a regra geral e a situação não se enquadra nas exceções previstas nos artigos 140.º do CT.

LLL. Destarte, há, portanto, uma dupla exigência ou condições de cumprimento cumulativo, i.e., o investimento tem que criar e manter emprego (aumento do número total de trabalhadores do estabelecimento), através de contratados sem termo (aumento dos contratados sem termo).

MMM. E tais aumentos têm que ser aferidos em relação a uma média, conforme resulta da definição de «criação de emprego» contida nas OAR, seja para evitar distorções provocadas por oscilações pontuais da força de trabalho, seja para evitar que as empresas que não criem e mantenham uma actividade económica substancial em razão do investimento, beneficiem de vantagens indevidas.

NNN. Os postos de trabalho criados e o nível de emprego atingido em razão dos mesmos, devem ser mantidos nos períodos seguintes (3 ou 5 anos), tendo em conta a natureza incremental deste pressuposto, que acompanha a do investimento (Formação bruta de capital fixo - FBCF), uma vez que o objectivo do incentivo não é criar emprego momentâneo, mas emprego sustentável.

OOO. Ou seja, tal como não é admitido investimento de substituição, também não deve ser admitido que o investimento realizado tenha um efeito nulo no nível de emprego no estabelecimento ou mesmo um efeito negativo, o que pode suceder em caso de adesão à tese da requerente no processo CAAD sob recurso.

PPP. Tal não se compreenderia, face aos princípios que enformam a regras atinentes aos auxílios de estado, onde se inclui o benefício fiscal RFAI.

QQQ. E este, sublinhe-se, é o que resulta, também, da aplicação das regras gerais de interpretação das leis, porque, de facto, nenhuma norma prevê tudo, estabelecendo, o próprio sistema jurídico, as regras e os critérios para o efeito, interpretando-se as normas respeitantes a benefícios fiscais tal como quaisquer outras (vide art.º 10.º do EBF, art.º 11.º da LGT e art.º 9.º do CC).

RRR. Descendo ao caso em apreço, e porque o direito objectivo, de facto, não é um aglomerado caótico de disposições, mas um organismo jurídico, um sistema de preceitos coordenados ou subordinados, em que cada um tem o seu posto próprio, em aplicação desses critérios, deve-se atender, na interpretação da alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI:

᷃ Ao espírito/intenção do legislador ou fim para que foi criado o regime - incrementar a actividade económica e criar emprego, que é o desígnio europeu que fundamenta os auxílios regionais. A interpretação extensiva pressupõe que dada hipótese, não estando compreendida na letra da lei, o está, todavia, no seu espírito.

᷃ À sua coerência com o sistema normativo em que se insere (in casu, Código do Trabalho, mas também o SNC quanto ao conceito de activos fixos tangíveis – AFT – e activos intangíveis – AI, ao CIRC quanto à definição de colecta do IRC à qual é dedutível o RFAI, etc).

1.4. Liminarmente admitido o recurso e antes de ser dado cumprimento ao aí determinado, veio a parte contrária, “A..., S.A, alegando ter sido “notificada” da sua interposição, apresentar requerimento de Recurso para Uniformização de Jurisprudência Subordinado, cujas alegações encerrou com a formulação das seguintes conclusões:

«1. O acórdão arbitral recorrido, no segmento aqui recorrido (moldes/RFAI), está em oposição com o acórdão arbitral (CAAD), de 28.09.2021, proferido no Proc. nº 427/2020-T, in www.caad.org.pt - acórdão fundamento.

Com efeito,

Quanto à oposição/contradição dos acórdãos arbitrais em confronto

2. O acórdão aqui recorrido, no segmento em que se reporta a moldes/RFAI, deu por provada, designadamente, a seguinte matéria de facto:

A) A Requerente foi fundada em 23-01-1963, com o CAE nº 15201 – “Fabricação de Calçado” – e dedica-se à indústria de sapataria, nomeadamente à fabricação e comercialização de calçado especializado nas áreas de segurança, equitação e caça;

AAA) Para manter a sua quota de mercado, Requerente começou, em 2016, a equacionar uma reorientação estratégica de investimento;

BBB) Essa reorientação concretizou-se em 2017, com a diferenciação da produção, através do desenvolvimento de produtos para nichos técnicos, cada vez de maior valor acrescentado, e procura de novos mercados geográficos e reconduziu-se a que a Requerente passou apostar na produção de calçado técnico e especializado (como calçado outdoor, calçado de equitação e calçado de segurança para uso profissional), que não produzia até então;

CCC) A estratégia de nicho foi suportada na inovação ao nível dos processos e tecnologia e na implementação de um plano de investimentos, de modo a permitir à Requerente desenvolver a sua capacidade para produzir calçado tecnicamente mais complexo, com maior conteúdo de trabalho, com alargamento de portefólio de produtos e, como tal, com séries de produção (dimensão média de notas de encomenda) de menor dimensão;

DDD) Essa aposta em calçado técnico e especializado permitiu aumentar a capacidade produtiva da Requerente, o preço médio de venda do calçado e o volume de negócios;

EEE) Para essa reorientação foi necessária uma nova linha de produção, bastando uma reorganização da mesma, aproveitando-se o espaço existente de forma diferente;

HHH) Com estes novos produtos a Requerente conseguiu obter novos clientes em mercados estrangeiros, como o ..., a ..., a ... e a ...;

KKK) Para concretizar essa reorientação da produção, a Requerente necessitou de efectuar investimentos, como a introdução de um robot de cardagem, equipamentos para montagem de calçado, incluindo calçado waterproof, moldes de solas e palmilhas;

DDDD) Ainda em 2016, no âmbito da estratégia de investimento, de expansão da capacidade de produção do produto técnico, a Requerente fez investimento na aquisição de moldes para solas ..., ... ou ..., ..., aquisição de moldes para solas de ..., aquisição de moldes para solas e palmilhas ...

EEEE) Os moldes são para produzir as solas, que são necessárias para os novos produtos;

FFFF) A Requerente, para desenvolver um produto diferenciador e para nichos de mercado, e com mais conteúdo técnico, tinha que desenvolver as suas próprias solas, pois um produto muito técnico, específico, novo, tem que ter novos moldes, para novas solas”;

HHHH) Para utilização do robot foram criadas fôrmas digitalmente com alta precisão até cinco décimas e alguns dos moldes que existiam na Requerente anteriormente não eram compatíveis com essa precisão, pelo que foi necessário criar novos (moldes) para a Requerente poder obter produtos condições técnicas perfeitas;

IIII) Os moldes são em ferro ou em alumínio, pesando centenas de quilos e são sempre compostos por uma parte inferior e superior, que se fecham, onde o material ou é injetado, ou é colocado no interior e é cosido, dependendo da matéria-prima;

JJJJ) É necessário fazer um molde para cada tamanho e para cada modelo de sola;

KKKK) As solas são feitas por uma indústria especializada, faz só solas, não sendo feitas pela Requerente;

LLLL) Os moldes criados pela Requerente para os seus produtos são sua propriedade e destinam-se a ser usados exclusivamente para o uso na fabricação dos seus produtos, mas estão no lugar físico onde a empresa que produz as solas as vai utilizar, o que é prática da generalidade das empresas de produção de calçado;

LL) No exercício de 2017, na sequência dos investimentos efetuados, a requerente contratou um novo funcionário com o cargo de director técnico, que é AA;

MM) O referido Director Técnico manteve-se no exercício das funções até o mês de Dezembro de 2020;

NN) O referido Director Técnico é uma pessoa altamente qualificada para o calçado diferenciado específico que a Requerente passou a produzir e tinha experiência anterior, como responsável pelo gabinete de desenvolvimento do Centro de Formação Profissional da Indústria de Calçado e professor de modelação em CAD 2D e CAD em 3 dimensões;

OO) O referido Director Técnico trabalha no desenvolvimento dos protótipos e modelação e acompanha todo o processo de produção até ao produto final e inclusivamente também o acabamento;

PP) Quando ocorreu a robotização do processo produtivo, em 2017, o referido Director Técnico era a única pessoa que sabia trabalhar nisso;

QQ) Os conhecimentos de informática que o referido director técnico possuía foram indispensáveis para conseguir pôr em funcionamento das máquinas adquiridas pela Requerente;

Por sua vez,

3. Como se retira da factualidade provada no acórdão fundamento, também estava aí em causa o benefício fiscal do RFAI, usufruível igualmente por uma sociedade de cariz industrial.

4. Essa empresa, à semelhança da Recorrente, também apostou na diversificação da sua área de negócios, através da produção de novos produtos e entrada em novos mercados.

5. Também à semelhança da Recorrente, utilizava robots na sua actividade de fabrico, onde se incorporavam diferentes equipamentos e componentes específicos para fabricar os diferentes produtos.

6. À semelhança da Recorrente, naquele acórdão fundamento “Os eletrodomésticos produzidos pela Requerente têm componentes plásticos incorporados. Como a Requerente não dispõe de máquinas de injeção de plástico, por ser economicamente inviável, os componentes plásticos são fabricados por outras entidades, fornecedores da Requerente, com base em moldes que são propriedade desta.” (cfr. J. dos factos provados no acórdão fundamento).

7. Também no caso do acórdão fundamento, a respectiva sociedade industrial investiu na aquisição de moldes e elegeu esse investimento para efeitos do benefício fiscal do RFAI (cfr. X d) e f) dos factos provados no acórdão fundamento).

8. À semelhança dos moldes da Recorrente, igualmente no caso do acórdão fundamento “Os moldes que pertencem à Requerente são colocados nas instalações dos fornecedores externos, que produzem as peças e componentes plásticos que, depois, são integrados nos produtos fabricados por aquela. (…).” (cfr. L dos factos provados no acórdão fundamento).

9. Em X) f) dos factos provados no acórdão fundamento é reforçado que os moldes “se encontram junto do fornecedor” (dos moldes, naturalmente).

10. Ou seja, também no caso do acórdão fundamento os moldes são da Requerente, embora estejam nas instalações do fornecedor.

11. À semelhança dos moldes da Recorrente, também no caso do acórdão fundamento “Os moldes, que permitem a fabricação das peças plásticas, e as ferramentas, necessárias à criação das peças metálicas, são feitos à medida para o produto específico a que se destinam, não servindo para outro produto. Sem estes moldes e ferramentas não é possível a produção dos componentes (plásticos e metálicos) essenciais aos eletrodomésticos produzidos e comercializados pela Requerente(cfr. M dos factos provados no acórdão fundamento).

12. À semelhança dos moldes da Recorrente, também no caso do acórdão fundamento “O processo de conceção, desenvolvimento e produção de moldes e ferramentas envolve um trabalho de afinação rigoroso, pois os mesmos são utilizados em operações de grande precisão. Até esse processo ficar concluído é, em regra, necessário fazer acertos e modificações, incorrendo a Requerente nos gastos associados, identificados no RIT como “alterações/reparações” e aquisição de “componentes/adições” a moldes e ferramentas.” (cfr. O dos factos provados no acórdão fundamento).

13. Também no caso do acórdão fundamento tinham sido feitos “investimentos para melhorar o respetivo processo produtivo e o aumento da capacidade produtiva, bem como a produção” de determinados produtos (cfr. P dos factos provados no acórdão fundamento).

14. Também no caso do acórdão fundamento foi implementado um novo projecto de produção automatizada, que alterou o layout da fábrica, com a realização de obras e a aquisição de novas máquinas (cfr. Q dos factos provados no acórdão fundamento).

15. Ainda à semelhança da Recorrente, “o aumento da produção derivado dos novos projetos suscitou o incremento da assistência técnica e do Call Center, tendo aumentado os postos de trabalho nessas áreas.(cfr. S dos factos provados no acórdão fundamento).

16. Com efeito, à semelhança do caso sub judice, também naqueloutro ficou provado que os investimentos em causa permitiram a criação de postos de trabalho.

17. A questão fáctico-jurídica em apreço no acórdão fundamento era a mesma dos presentes autos: “Os investimentos desconsiderados pela Requerida, ao abrigo do artigo 22.º, n.º 2, alíneas a) e b) do CFI, correspondem a seis categorias, a seguir descritas (…) EE. 2.ª categoria – investimento em moldes e ferramentas e alterações a moldes e ferramentas e/ou seus componentes, e em ativos colocados em fornecedores externos – Face à inexistência de equipamentos de produção (máquinas de injeção) de componentes plásticos na esfera da Requerente, os moldes e ferramentas adquiridos para a produção desses componentes plásticos, a incorporar nos produtos da Requerente, são apenas utilizados pelos fornecedores dos componentes. Assim, segundo a AT, apesar de serem propriedade da Requerente, não estão em uso, nem foram objeto de uso por parte desta, uma vez que, à data da ação inspetiva, se encontravam junto dos fornecedores, incluindo, em relação a algumas ferramentas, junto de fornecedores chineses. Considera a AT que as aquisições destes moldes e ferramentas não consubstanciam o aumento da capacidade do estabelecimento (já existente) da Requerente, pois as peças produzidas (com esses moldes e ferramentas) são-no fora desse estabelecimento, portanto, sem aumentar a respetiva capacidade, pelo que não são elegíveis para efeitos de RFAI, pois está ínsito no artigo 22.º do CFI que os investimentos sejam utilizados numa atividade da própria empresa que o realiza e não afeto à produção de outras sociedades.”.

18. Ou seja, também no caso do acórdão fundamento colocava-se a questão de saber se os moldes, por estarem fora das instalações da empresa (pois estavam nas instalações dos respectivos fornecedores) – e, por isso, (alegadamente) não serem usados/utilizados pela Requerente na sua própria actividade, nas suas próprias instalações – seriam ou não elegíveis para efeitos de RFAI.

Posto isto,

19. Resumidamente, segundo o acórdão recorrido, no segmento decisório aqui em causa - moldes/RFAI, “Investimentos em moldes. A Requerente inclui nas deduções do RFAI investimentos em moldes o montante global de € 59.254,97. (…) Resulta da prova produzida que a criação de novos moldes visou a criação de novos modelos de calçado dos tipos dos que a Requerente já produzia, mas não se trata de substituição dos produtos antigos pelos novos, mas antes de cumulação de novos produtos com os anteriores. A Requerente, ao investir num molde, distinto dos anteriores, pode fabricar produtos diferentes dos que produzia, pelo que está necessariamente a aumentar a capacidade de produzir produtos, que sem ele não podia produzir. Assim, os investimentos em moldes destinados a fabricar novos produtos são investimentos que estão relacionados com o «aumento da capacidade de um estabelecimento existente», pelo que se enquadram no conceito de «investimento inicial» definido no n.º 49) do artigo 2.º do RGIC. No entanto, não se encontrando os moldes adquiridos nas instalações da Requerente nem sendo utilizados pelos seus trabalhadores, tem razão a Autoridade Tributária e Aduaneira ao afastar a aplicação do RFAI por não preenchimento do requisito previsto na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, de os sujeitos passivos de IRC efectuarem «investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c)». (…) (fls. 95 a 97 do acórdão recorrido).

20. Ou seja, segundo o acórdão recorrido, o investimento em moldes não é legalmente elegível para efeitos do benefício fiscal do RFAI porque o investimento em moldes (alegadamente) não proporcionou a criação e manutenção de postos de trabalho, com a consequente violação do disposto nas alíneas c) e f) do nº 4 do artigo 22º do CFI,

21. já que os moldes não se encontravam nas instalações da Requerente, pelo que não eram utilizados pelos trabalhadores da Requerente.

22. Em suma, segundo o acórdão recorrido, os investimentos em moldes não estão conexionados com a criação de postos de trabalho.

Por sua vez,

23. Resumidamente, segundo o acórdão fundamento, no segmento que aqui releva, “(…) B. Investimento em moldes e protótipos de ferramentas e alterações a moldes e ferramentas e/ou seus componentes. A AT excluiu as aquisições de moldes, dado os mesmos serem utilizados pelos fornecedores da Requerente e se encontrarem nas instalações daqueles, concluindo que não aumentam a capacidade produtiva da Requerente. (…) Ficou demonstrado nos autos que o recurso a fornecedores externos se deve ao facto de a Requerente não dispor de máquinas de injeção para fabricar peças plásticas, por ser inviável, dado o elevado custo das mesmas, assegurar essa etapa da cadeia de valor. E, bem assim, que os moldes para a produção das peças plásticas e as ferramentas de produção das peças metálicas são essenciais no processo de produção de eletrodomésticos pela Requerente. Com efeito, os eletrodomésticos são compostos, quer por peças metálicas, quer por peças plásticas, que diferem em função das marcas e modelos fabricados, pelo que, em regra, cada eletrodoméstico terá moldes e ferramentas específicos que apenas servem para produzir determinada peça para um dado eletrodoméstico, ou seja, não são elementos fungíveis. Acresce que, nesta indústria, a produção de componentes plásticos é externalizada, sendo assegurada por fornecedores especializados, por não ser economicamente eficiente (dado o preço elevado dos equipamentos indispensáveis – máquinas de injeção – de que a Requerente não dispõe, e a necessidade da sua utilização intensiva para a respetiva rentabilização, que a escala de produção da Requerente não alcança). Neste âmbito, a Requerente adquire os moldes, feitos à medida, necessários à produção das peças plásticas e cede-os temporariamente aos fornecedores para que estes fabriquem as peças. Porém, a titularidade dos moldes pertence sempre à Requerente e quando não estão a ser utilizados pelos fornecedores são devolvidos à Requerente e armazenados nas suas instalações. Neste quadro contextual assente nos autos, é percetível que a atividade da Requerente não é exequível sem os moldes e ferramentas com base nos quais são fabricadas as peças que fazem parte dos eletrodomésticos. Sem essas peças o processo de produção é obviamente comprometido e, quanto mais peças forem fabricadas, mais eletrodomésticos a Requerente pode produzir e vender aumentando a capacidade do seu estabelecimento. É manifesto que a aquisição de novos moldes e de novas ferramentas para produzir novos componentes/peças para eletrodomésticos pela Requerente deve qualificar-se como investimento inicial que apresenta uma relação direta com o aumento da capacidade produtiva da Requerente. O facto de as peças plásticas fabricadas com recurso aos moldes o serem fora das instalações da Requerente, não altera esta conclusão, pois os moldes continuam a ser utilizados para os fins específicos da empresa que realiza o investimento [a Requerente], permitindo-lhe produzir mais eletrodomésticos (nas instalações da Requerente), sem prejuízo de serem suscetíveis de aumentar, de igual modo, a do seu fornecedor. Nota-se que o regime do RGIC, do CFI e da Portaria n.º 295/2015 não contém qualquer condição negativa de incremento da atividade dos fornecedores ou prestadores de serviços. Pelo contrário, é natural que o aumento de capacidade de produção da Requerente implique o acréscimo dos fornecimentos e serviços externos, ou seja, os seus fornecedores também sairão beneficiados. (…) Convém assinalar que as normas que preveem benefícios fiscais não devem ser objeto de interpretação restritiva (v. o artigo 10.º do EBF admite a sua interpretação extensiva) em linha com a conceção de que não têm natureza excecional, como preconizam a jurisprudência (v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 01047/14.5BEALM 0889/17, de 6 de novembro de 2019) e a doutrina contemporâneas, constituindo, nas palavras de CASALTA NABAIS, “um instrumento normal de política económica e social do Estado social contemporâneo e não um instrumento excepcional à maneira do entendimento próprio do Estado liberal” (apud citado acórdão). À face do exposto, conclui-se que o investimento em moldes novos e protótipos de ferramentas, incluindo as afinações dos mesmos na fase final da sua produção, são enquadráveis no âmbito de um investimento inicial relacionado com o aumento da capacidade do estabelecimento (existente) da Requerente e constituem aplicações relevantes de ativos fixos tangíveis em estado de novo [v. artigo 2.º, n.º 49, alínea a) do RGIC, artigo 22.º, n.º 2, alínea a) (RFAI) e artigo 30.º, n.º 1, alínea a) (DLRR)]. Esta conclusão enquadra-se na teleologia subjacente ao RFAI, de estímulo ao investimento produtivo empresarial para reforço da competitividade e da capacidade produtiva da economia, configurando os moldes e ferramentas criados para produzir novas peças a incorporar em novos equipamentos um exemplo paradigmático deste tipo de investimento.

Procede, neste ponto, a alegação da Requerente, sendo inválida, por erro nos pressupostos de facto e de direito, a desconsideração do valor de € 1.499.499,43 pela Requerida, para efeitos de dedução à coleta (RFAI e DLRR).”.
24. Em suma, segundo o acórdão fundamento, o facto de os moldes estarem fora das instalações da Requerente, não impede que o respectivo investimento seja investimento relevante criador de postos de trabalho para efeitos do RFAI, pois os moldes continuam a ser utilizados para os fins específicos da empresa que realiza o investimento, permitindo-lhe produzir mais nas suas próprias instalações.
Assim,
25. Perante factualidade similar e perfeitamente comparável; perante a mesma questão jurídica fundamental; e diante do mesmo quadro legislativo aplicável,
26. o acórdão recorrido está em oposição/contradição com o acórdão fundamento.
Posto isto,
Quanto ao erro de julgamento e violação de lei do acórdão arbitral recorrido
27. Salvo o devido respeito, o acórdão recorrido, no segmento decisório em questão, padece de erro de julgamento.
Com efeito,
28. Apesar dos moldes estarem fora das instalações da Requerente, como é prática comum na indústria (designadamente de calçado, como se provou in casu – vide supra),
29. é inequívoco que esses moldes se destinaram à produção de solas, que por sua vez foram afectas à produção de calçado,
30. estando os moldes, por isso, afectos e integrados no processo produtivo inovador estrategicamente adoptado pela Requerente,
31. comprovadamente incrementador da sua capacidade de produção comprovadamente incrementador dos postos de trabalho associados a esse novo processo produtivo.
32. Por conseguinte, é inquestionável que o investimento em moldes, no âmbito do projecto inovador em questão, está correlacionado, quer com o aumento da capacidade de produção da Requerente (nas suas próprias instalações, naturalmente), quer com a criação e manutenção de novos postos de trabalho (também nas suas próprias instalações, obviamente) - como se provou nos presentes autos.
33. Como é notório e do senso comum, sem investimento em novos moldes não haveria investimento em novas solas e por via disso não haveria investimento em novo calçado técnico diferenciado - passível de ser comercializado em novos mercados, do norte da europa e da américa do norte, como se provou.
34. Efectivamente, provou-se que “A Requerente, para desenvolver um produto diferenciador e para nichos de mercado, e com mais conteúdo técnico, tinha que desenvolver as suas próprias solas, pois um produto muito técnico, específico, novo, tem que ter novos moldes, para novas solas”.
35. Assim, à luz da factualidade provada e das regras de experiência comum, é manifesto que os moldes, apesar de permanecerem nas instalações dos fornecedores e de serem usados pelos trabalhadores dos fornecedores, não deixam de estar afectos e integrados no ciclo produtivo e de fabrico da Requerente, sendo por isso igualmente “usados” pelos trabalhadores da Requerente.
36. Aliás, como se provou, os moldes são de utilização exclusiva pela Requerente.
37. Como também se provou, o novo posto de trabalho criado e mantido (director técnico) passou a gerir todo o novo processo produtivo robotizado, no qual se incluía naturalmente a concepção dos moldes necessários à produção das solas, por sua vez necessárias à produção do novo calçado técnico.
38. Mais: provou-se que o novo colaborador/director técnico foi contratado precisamente “na sequência dos investimentos efetuados(designadamente em moldes).
39. Ou seja, o novo colaborador foi contratado por causa dos novos investimentos, designadamente em novos moldes.
40. Provou-se inclusivamente que os seus conhecimentos técnicos eram indispensáveis “para conseguir pôr em funcionamento as máquinas adquiridas pela Requerente”.
41. Desta forma, não se pode concluir, de todo, que os moldes fossem estranhos aos postos de trabalho criados pela Requerente associados ao projecto em questão.
42. Muito pelo contrário: os moldes constituíam factores produtivos essenciais em todo o novo processo produtivo, comprovadamente gerido, desde a concepção do molde, pelo novo posto de trabalho criado no seio da empresa.
43. Daí que, contrariamente ao entendimento do acórdão recorrido, o investimento em moldes, in casu, esteja claramente conexionado, também, com a criação e manutenção dos novos postos de trabalho – apesar dos moldes estarem nas instalações dos fornecedores de moldes e serem usados pelos trabalhadores desses fornecedores.
44. Sendo que o regime legal do RFAI não impede que os fornecedores do investidor (in casu, os fornecedores de solas) aumentem de igual modo a sua capacidade de produção.
45. Outrossim, é precisamente intuito do legislador estimular o aumento da capacidade de produção de todos os agentes do circuito económico que directa ou indirectamente se relacionem com a empresa investidora (e, por isso, usufruidora do benefício fiscal em questão).
46. Com efeito, tal como se afirma no acórdão fundamento, “o regime do RGIC, do CFI e da Portaria n.º 295/2015 não contém qualquer condição negativa de incremento da atividade dos fornecedores ou prestadores de serviços. Pelo contrário, é natural que o aumento de capacidade de produção da Requerente implique o acréscimo dos fornecimentos e serviços externos, ou seja, os seus fornecedores também sairão beneficiados. (…)”.
Acresce que,
47. Em matéria de benefícios fiscais, a AT não se pode substituir ao legislador e criar norma onde não exista norma, impondo a sua “interpretação” ad hoc ao contribuinte – como se de lei se tratasse, em violação dos princípios da legalidade e tipicidade fiscal.
48. O artigo 9º do Código Civil (ex vi do artigo 11º da LGT) impõe a reconstituição do pensamento legislativo a partir dos textos, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
49. Não podendo, contudo, ser considerado o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
50. Por sua vez, dado que estamos perante a interpretação e aplicação de normas sobre benefícios fiscais, “elementos essenciais dos impostos”, nesse esforço interpretativo e de aplicação da lei devem ser especialmente atendidos os princípios fundamentais da legalidade e da tipicidade,
51. no sentido de que a interpretação da lei deve atender primacialmente à letra da lei (cfr. artigo 103º nº 2 da Constituição da República Portuguesa “CRP”).
52. Como também se afirma no acórdão fundamento, as normas sobre benefícios fiscais não podem contemplar uma interpretação restritiva, já que não têm cariz excepcional – outrossim, extensiva (cfr. artigo 10º do EBF).
53. Ou seja, as normas sobre benefícios fiscais não devem ser interpretadas e aplicadas com um conteúdo que não tenha o mínimo de correspondência com a letra da lei (artigos 11º da LGT e 9º nº 2 do Código Civil).
54. Tais normas estão abrangidas pela reserva de lei da Assembleia da República – princípio da legalidade, conforme artigos 103º, nº 2 e nº 3, 165º, nº 1, alínea i), e 266º nº 2, todos da CRP.
55. Estabelece o artigo 8º, nº 1 da LGT que “Estão sujeitos ao princípio da legalidade tributária a incidência, a taxa, os benefícios fiscais, as garantias dos contribuintes, a definição dos crimes fiscais e o regime geral das contraordenações fiscais”.
56. Os princípios da legalidade e tipicidade, porque aplicáveis no domínio dos benefícios fiscais, constituem eles próprios, uma restrição na tarefa interpretativa das respetivas normas legais,
57. impedindo que, nessa tarefa, o intérprete lhes confira uma dimensão ou conteúdo normativo dissonante do respetivo texto legal.
58. Por outro lado, aquela admitida “interpretação extensiva”, no caso das normas sobre benefícios fiscais, vai naturalmente no sentido de “estender” os benefícios fiscais.
59. Ou seja, vai no sentido de abranger mais situações de benefício fiscal para além daquelas que, de imediato, decorrem da “literalidade” da norma – por estarem igualmente abrangidas pela intenção do legislador ou “ratio” do preceito.
60. E não no sentido de prejudicar os contribuintes, restringindo o âmbito do benefício fiscal.
61. No mesmo sentido - extensão dos benefícios fiscais – vai o artigo 11º nº 1 do EBF, segundo o qual as normas que alterem benefícios fiscais temporários não são aplicáveis aos contribuintes que já aproveitem do direito no benefício fiscal, “em tudo o que os prejudique”.
62. Em suma, e atenta a “unidade do sistema jurídico”, as normas sobre benefícios fiscais devem ser interpretadas no sentido de “estender” o seu âmbito de aplicação ao maior número de situações possível (sempre com o limite da letra da lei, como é obvio), em benefício dos contribuintes.
63. Apenas a Assembleia da República, ou o Governo, por autorização da Assembleia da República, têm legitimidade para fixar regras obrigatórias de interpretação da lei tributária, nos termos do princípio da legalidade constitucional (cfr. nº 2 do artigo 103º e a alínea i) do nº 1 do artigo 165º da CRP).
64. Os impostos só podem ser criados por lei e aplicados nos estritos termos vertidos no texto legal.
65. Ou seja, atenta a redação legislativa e tendo por pressuposto imperativo que “o interprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (cfr. artigo 9º, nº 3, do Código Civil).
66. A prevalência do princípio da legalidade, em matéria de incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes, está também consagrada no artigo 11º nº 4 da LGT, onde se pode ler que “As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica.”
67. Deste modo, quando se estabelece – em matéria de benefícios fiscais – condições, métodos ou pressupostos que não estavam expressamente previstos na lei, tal equivale a criar norma onde não existia norma e, portanto, a criar lei em matéria tributária que lhe está constitucionalmente vedada, por imposição do princípio da legalidade fiscal.
68. Por outro lado, decorre diretamente do princípio da legalidade fiscal a chamada “tipicidade fechada” ou numerus clausus tributário.
69. Só poderá haver “segurança tributária” ou “proteção da confiança” quando é respeitada a tipicidade fiscal na interpretação e aplicação da lei.
70. Consequentemente, ao adicionar à letra da leirespeitante a benefícios fiscais – condições que nela não estão previstas, e contrariando mesmo essas condições legalmente previstas, o julgador viola e ultrapassa a mera interpretação da lei, criando a lei nova.
Ora,
71. Como se provou, os moldes em apreço, não obstante se encontrarem nas instalações dos fornecedores, são propriedade da Requerente.
72. Como também se provou, esses moldes são de exclusiva utilização comercial pela Requerente.
73. Pelo que não podem ser utilizados por outros fabricantes de calçado.
74. Os moldes estão nas instalações dos fornecedores, porque, como bem refere a AT no RIT, a Requerente não é “(…) detentor de máquinas de injeção que permitam utilizar estes moldes.” - atendendo que não seria economicamente eficiente, dado o elevado investimento necessário para a aquisição de máquinas de injecção.
75. A externalização de etapas do processo produtivo e a localização dos activos objeto de investimento nas instalações de fornecedores não desvirtua a elegibilidade destes mesmos investimentos e, por conseguinte, a qualificação desses ativos como aplicações relevantes.
76. Com efeito, aquela colocação dos moldes à disposição dos fornecedores não representa uma violação do requisito de manutenção dos investimentos na empresa e região previsto na alínea c) do nº 2 do artigo 22º do CFI, pois os moldes continuam a ser propriedade da empresa e alocados à região na qual a mesma tem as suas instalações fabris.
77. O RFAI não está, nem pode estar, restrito às empresas que incorporam/integram a totalidade do processo produtivo.
78. Sendo os moldes imprescindíveis para a concretização da decisão estratégica de aposta nos produtos técnicos (sem os quais estes não são produzidos), e tendo o plano de investimentos realizado para aquela concretização proporcionado a criação de postos de trabalho, resulta claro que os investimentos em moldes contribuíram, quer para o aumento da capacidade produtiva, quer para a promoção da criação de postos de trabalho.
Por conseguinte,
79. Os investimentos em moldes, ainda que os moldes estejam localizados nas instalações dos fornecedores, devem ser igualmente ser considerados investimento elegível para efeitos de RFAI, nos termos dos artigos 2º nº 49 alínea a) e 30º nº 1 alínea a) do RGIC, e 22º nº 2 alínea a), b), c) e f) do CFI.
80. Portanto, constituem aplicações relevantes em ativos fixos tangíveis em estado de novo, elegíveis para efeitos de RFAI.
81. Não se extraindo da lei que seja condição do benefício fiscal do RFAI esses activos estarem nas instalações do contribuinte, ou seja, estarem a ser manuseados pelos seus trabalhadores - muito menos pelos postos de trabalho criados com o investimento em questão.
82. Sendo certo que se comprovou, in casu, a correlação entre os investimentos efectuados, designadamente em novos moldes, e a necessidade de contratação/criação de um novo posto de trabalho, de director técnico - atento o novo processo robotizado de fabrico instalado e a imperiosidade da sua gestão integrada (vide supra).
83. Por conseguinte, salvo o devido respeito, o acórdão recorrido, no segmento aqui recorrido, padece de erro de julgamento e violação das sobreditas disposições e princípios legais.
84. Devendo as liquidações impugnadas ser anuladas também no segmento decisório ora recorrido, por violação de lei, com o consequente reembolso do correspondente imposto indevidamente pago, acrescido dos respectivos juros indemnizatórios, por erro de Direito, nos termos do artigo 43º nº 1 da LGT.
1.5. A 6 de Junho de 2023 proferimos o seguinte despacho:
«Os presentes autos tiveram origem no requerimento de interposição de recurso jurisdicional para Uniformização de Jurisprudência apresentado pela Autoridade Tributária e Aduaneira neste Supremo Tribunal Administrativo
Imediatamente após ter sido proferido despacho de admissão do recurso, e quando a Unidade Orgânica se preparava para proceder ao seu cumprimento, veio a Recorrida, alegando ter sido “notificada de que a AT interpôs o recurso mencionado" juntar aos autos um requerimento de interposição de recurso subordinado que tem por objecto uma parte da decisão recorrida (sobre a qual a AT interpôs recurso para uniformização) e indicando como decisão fundamento um outro aresto que identifica.
Por se nos afigurar, por um lado, que a natureza extraordinária do recurso para uniformização e o regime processual que o conforma não admite a interposição de recurso subordinado, regime que apenas está previsto para os recursos ordinários (artigo 627.°, n.° 1 e 2, 633.° e seguintes e 688.° e seguintes, todos do CPC) e, por outro, que há muito se encontrava esgotado o prazo de 30 dias previstos no artigo 25.° do RAJT quando o requerimento de interposição do recuso subordinado deu entrada, o que determina a inutilidade, inclusive, de este Supremo Tribunal Administrativo convidar a Recorrida/Requerente a peticionar que tal requerimento de interposição seja distribuído enquanto requerimento de interposição de recurso para uniformização autónomo, notifique ambas as partes do presente despacho e para, querendo, em 10 dias se pronunciarem sobre a rejeição do requerimento de interposição de recurso subordinado».
1.6. A Recorrida, Requerente da interposição do Recurso para Uniformização Subordinado, veio, dentro do referido prazo, pugnar pela admissão do Recurso Subordinado, por, em resumo (e sem prejuízo do que infra, na apreciação da questão melhor se detalhará), essa interposição ter fundamento legal face ao preceituado nos artigos 29.º, n.º 1 do RJAT e 633.º do Código de Processo Civil.
1.7. A Excelentíssima Procuradora-Geral-Adjunta, notificada para se pronunciar sobre a questão prévia suscitada e sobre o mérito do Recurso para Uniformização de Jurisprudência, emitiu parecer, ao abrigo do artigo 146.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), pronunciando-se pela rejeição do requerimento de interposição do recurso subordinado, por o regime que conforma o Recurso para Uniformização de Jurisprudência o não admitir, e pelo não conhecimento do mérito do Recurso interposto pela Autoridade Tributária, por falta de verificação dos pressupostos substantivos de cujo preenchimento está dependente a sua admissão.

1.8. A 7 de Dezembro de 2023, a Unidade de Processos lavrou cota nos autos consignando que “Nesta data consigno que em virtude de não ter sido dado cumprimento ao despacho de 27.05.2023, vou nesta data proceder ao cumprimento do mesmo”, o que foi feito, notificando-se a Recorrida para, querendo, contra-alegar.

1.9. Notificada, a Recorrida apresentou contra-alegações, concluindo nos seguintes termos:

«1. O julgamento da matéria de facto não pode ser objecto do recurso para uniformização de jurisprudência.

2. Pelo que importa atender à factualidade provada segundo o douto Acórdão arbitral recorrido.

3. Segundo a Recorrente/AT, o presente recurso foi dirigido contra os 2 seguintes “segmentos decisórios”:

(1) “Quanto ao conceito de investimento inicial para efeitos de elegibilidade em sede de RFAI e DLRR”,

4. mais concretamente, quanto ao seguinte segmento decisório do Acórdão arbitral recorrido, segundo a Recorrente/AT, “3.7.2. Vicio de erro sobre os pressupostos de facto e de direito 3.7.2.1. Considerações gerais sobre o RFAI (…) O artigo 2.° do RGIC fornece várias definições, entre as quais se incluem os n.ºs 41 e 49, que esclarecem o que se entende por Auxílios regionais ao investimento e Investimento inicial. (…) Semelhante definição de «investimento inicial» é adoptada na alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de Setembro, em que se refere que os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente. À face desta definição não é de excluir deste conceito de «investimento inicial» o «investimento de substituição», pois, no que aqui interessa, se ele estiver relacionado com «aumento da capacidade de um estabelecimento existente» enquadra-se claramente no âmbito desta definição. Na verdade, o n.º 49 do artigo 2.º do RGIC e o artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015 apenas exigem, no que aqui interessa, que os investimentos estejam «relacionados» com aumento da capacidade de um estabelecimento existente.”.

5. Desde logo, como se verifica, este trecho da decisão não constitui qualquer “segmento decisório”.

6. Mas apenas um dos fundamentos do decidido a final pelo douto Acórdão recorrido.

7. O que coloca em crise a apreciação do presente recurso jurisdicional (vide Jurisprudência supra).

8. Não obstante, e segundo a Recorrente/AT, este alegado segmento decisório está em oposição com a decisão de 28.09.2021 proferida no Processo n.º 427/2020–T (CAAD)/Acórdão fundamento.

9. Desde logo, e ao contrário do que entende a Recorrente/AT, naquele Acórdão fundamento não foi questionado se o investimento de substituição integra ou não o conceito de investimento inicial.

10. Com efeito, atentos os factos provados e o caso concreto sob análise naquele Acórdão fundamento, que deve ser analisado na íntegra e não de forma truncada e descontextualizada, como aqui fez a Recorrente/AT,

11. o que ali foi entendido foi que, no caso concreto nele abordado, estavam em causa “ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo, afetos à exploração da empresa e, portanto, ao contrário do que defende a AT, são aplicações relevantes, dado o seu nítido enquadramento no disposto no artigo 22.º, n.º 2, alínea a) (RFAI) e no artigo 30.º, n.º 1, alínea a) (DLRR)”,

12. mas que, no caso concreto ali em análise, se teria tratado de substituição de equipamento, o que não implicaria um investimento inicial/ex novo que induzisse ao aumento de capacidade do estabelecimento existente – outrossim, tratar-se-ia de um investimento necessário que decorreu do normal funcionamento da atividade industrial.

13. Ora, como se constata, semelhante entendimento não significa que o Acórdão fundamento tenha entendido que o investimento de substituição não integra o conceito de investimento inicial, nos termos e para os efeitos dos benefícios fiscais do RFAI e da DLRR – como simplistamente entende a Recorrente/AT.

14. Com efeito, não há ali qualquer decisão expressa nesse sentido.

15. Outrossim, ali se decidiu que, no caso concreto em análise no Acórdão fundamento, os activos fixos tangíveis nele abordados, adquiridos em estado novo, por terem sido afectos à exploração da empresa, seriam aplicações relevantes, quer para efeitos de RFAI, quer para efeitos de DLRR.

16. Contudo, por se terem tratado, ali, de investimentos necessários decorrentes do normal funcionamento da actividade industrial, não teriam aumentado a capacidade do estabelecimento já existente, ou seja, não teriam constituído um “investimento incremental”.

17. Ou seja, o que o Acórdão fundamento entendeu é que apenas o investimento susceptível de aumentar a capacidade do estabelecimento existente era elegível para efeitos dos benefícios fiscais em discussão - e não que o “investimento de substituição” não é considerado “investimento inicial” nos termos e para os efeitos dos mesmos benefícios (RFAI e DLRR).

18. À semelhança, aliás, do douto Acórdão aqui recorrido.

19. Sendo certo que, atenta a factualidade provada nos presentes autos, é manifesto ter ficado provado que os investimentos em questão aumentaram a capacidade do estabelecimento instalado, assumindo um cariz nitidamente incremental.

20. Pelo que não se vislumbra onde está a alegada oposição decisória.

21. Muito pelo contrário, em consonância com o firmado naquele Acórdão fundamento, no Acórdão arbitral aqui recorrido foi expressamente afirmado constituir investimento relevante (“investimento inicial”) os investimentos relacionados “com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.

22. Tendo o Acórdão recorrido simplesmente entendido que não seria de excluir daquele conceito de “investimento inicial” o “investimento de substituição”, pois o que releva e é decisivo para qualificar o investimento em causa como “investimento inicial” (i.e., relevante para efeitos de RFAI e DLRR) é se o mesmo está relacionado com o “aumento da capacidade de um estabelecimento existente” – tal e qual como entendeu o Acórdão fundamento.

23. Com efeito, o Acórdão recorrido não afirmou que o “investimento de substituição” constituía “investimento inicial”, tão pouco o Acórdão fundamento considerou que o “investimento de substituição” não constituía “investimento inicial”.

24. O que ambos disseram é que o relevante para a elegibilidade do investimento para efeitos de RFAI e DLRR é que o mesmo tenha conduzido ao aumento da capacidade de um estabelecimento existente.

25. E nos presentes autos ficou claramente demonstrado esse aumento, como se denota da factualidade provada.

26. Aliás, como resulta dos presentes autos, particularmente da matéria de facto provada, a Requerente/Recorrida não qualificou quaisquer bens aqui concretamente em causa como equipamentos de substituição,

27. ao contrário do que sucedeu no caso do Acórdão fundamento, no qual o contribuinte declarou expressamente que alguns equipamentos seriam de substituição.

28. Pelo que não há identidade de situações fácticas.

29. Como também se retira da matéria de facto aqui provada e do douto Acórdão aqui recorrido, não se provou nem se concluiu que quaisquer dos bens aqui concretamente em questão fossem bens ou equipamentos de “substituição” – antes pelo contrário.

30. Ou seja, não foi pressuposto da decisão recorrida que os bens aqui concretamente em causa fossem bens ou “equipamentos de substituição”.

31. Que nem são, como se provou.

32. Com efeito, o que se provou foi que o investimento foi feito em bens e equipamentos claramente inovadores e de cariz manifestamente incrementador da capacidade do estabelecimento industrial da Requerente/Recorrida.

33. Em suma, no caso concreto aqui em discussão, não só não se provou que os bens aqui concretamente em causa fossem bens de substituição, como isso não constituiu ratio decidendi.

34. Aliás, como dela resulta, a decisão de 28.09.2021, proferida no Processo n.º 427/2020–T (Acórdão fundamento) foi procedente em 85% a favor do contribuinte – à semelhança do sucedido nos presentes autos.

35. O que só por si indicia a inexistência de qualquer oposição ou contradição de julgados entre as decisões em confronto – outrossim, sintonia.

36. Com efeito, o ali decidido foi substancialmente idêntico ao decidido nos presentes autos.

37. Aliás, a própria Recorrente/AT admite que “(…) o investimento de substituição (…) pode ser considerado como investimento inicial se operar uma alteração fundamental de um processo global de produção, de todo o processo de produção e não só de ativos isolados”.

38. Ora, nos presentes autos ficou igualmente provada esta alteração fundamental do processo global de produção, com a robotização introduzida (vide factualidade provada supra elencada).

(2) “Quanto à condição da criação de postos de trabalho”

39. mais propriamente no seguinte trecho da decisão recorrida, segundo a Recorrente/AT: “E no segmento “”3.7.2.8. Condição da criação de postos de trabalho (…) «Tendo em conta que, pelos fundamentos expostos, não se deverá equiparar a expressão “criação de postos de trabalho” a “criação líquida de postos de trabalho”, dever-se-á, em obediência ao princípio hermenêutico do legislador razoável, obter um resultado interpretativo que seja coerente com a teleologia do benefício fiscal em questão e que tenha um efetivo conteúdo prático. Nessa perspetiva, a única interpretação que não se reconduza à “criação líquida de postos de trabalho”, será, julga-se, a de que a “criação de postos de trabalho” pressuposta pelo benefício fiscal em questão se refere à criação de postos de trabalho, e a sua manutenção, causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço. Ou seja: o que está em causa é que o investimento realizado por determinada empresa será elegível para usufruir do benefício fiscal em questão se, e na medida em que, dele resulte, de forma causalmente adequada, a criação de, pelo menos, um posto de trabalho, e a sua manutenção” No caso em apreço, dos investimentos relativos à reorientação estratégica da Requerente e opção pela robotização resultou a criação de um posto de trabalho do Director Técnico, que se manteve para além de três anos a contar da data dos investimentos (ainda se mantinha em funções quando foi realizada a reunião para produção de prova), pelo que está cumprido o requisito previsto na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.”.

40. Como se denota, o trecho acabado de transcrever não constitui qualquer “segmento decisório” – outrossim, um dos fundamentos da decisão (vide supra).

41. Não obstante, segundo a Recorrente/AT, naquele alegado “segmento decisório” a decisão aqui recorrida está em oposição com a decisão proferida no Processo n.º 565/2018–T (CAAD)/Acórdão fundamento.

42. Ora, também aqui não se vislumbra qualquer oposição: a decisão recorrida considerou que a comprovada criação de 1 posto trabalho associado ao investimento em causa era bastante.

43. E não se provou nos presentes autos se houve ou não um aumento líquido total do número de trabalhadores – ao contrário/diferentemente do sucedido na decisão arbitral fundamento, no qual provou-se não ter havido esse aumento total líquido,

44. pelo que as circunstâncias factuais provadas e que servem de fundamento ao decidido nas decisões arbitrais em confronto são distintas.

45. Aliás, no caso do Acórdão fundamento estava em causa o indeferimento parcial de uma reclamação da autoliquidação do IRC do exercício de 2014 também no que respeita ao benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens (CLEJ), à data previsto no artigo 19º do EBF (cfr. I. dos factos provados segundo este Acórdão fundamento).

46. Mais: no Acórdão fundamento foi dado como não provado que “a Requerente efetuou investimento relevante que proporcion[ou] a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período de dedução”.

47. “Aliás, não só não foi demonstrado que os investimentos em causa – consubstanciados na aquisição de ativos, como ferramentas e equipamentos –, realizados para o lançamento de novos produtos, proporcionaram a criação de postos de trabalho com os mesmos relacionados, como a testemunha inquirida, indicada pela Requerente, afirmou que não é possível fazer uma conexão exata entre os trabalhadores e os equipamentos nos quais se concretizou o investimento.” (cfr. Acórdão fundamento).

48. Ou seja, o oposto da factualidade provada nos presentes autos, portanto – pelo que as circunstâncias factuais em confronto são substancialmente distintas, senão opostas.

49. Por conseguinte, não estamos perante a “mesma questão fundamental de direito”.

50. Por outro lado, o Acórdão fundamento, em sintonia com o Acórdão aqui recorrido, considerou ser condição necessária que o investimento em questão proporcionasse a criação de postos de trabalho e a sua manutenção.

51. Contudo, no caso concreto abordado no Acórdão recorrido, não terá sido estabelecido qualquer elo entre o investimento e os trabalhadores cujos postos de trabalho teriam sido criados, pelo que ali não teria sido demonstrado um pressuposto da acessibilidade ao benefício RFAI “no que se refere ao nexo de causalidade entre a realização de investimentos com relevância e elegíveis para o benefício do RFAI em 2014 e a criação dos postos de trabalho dos cinco colaboradores identificados”.

52. Com efeito, no caso do Acórdão fundamento não se provou que os postos de trabalho dos cinco trabalhadores ali em causa teriam sido criados na sequência ou em razão do investimento elegível para o RFAI.

53. Ora, no caso concreto do Acórdão aqui recorrido provou-se a relação de causalidade entre o investimento realizado e o posto de trabalho criado (vide supra).

54. Pelo que não há qualquer oposição com o Acórdão fundamento – muito pelo contrário.

55. Com efeito, diferentemente do sucedido no Acórdão fundamento, aqui ficou provado ter sido criado um novo posto de trabalho (de Diretor Técnico) na sequência e em razão do investimento elegível para efeitos do benefício fiscal do RFAI.

56. Ou seja, também neste (alegado) segmento decisório estamos perante circunstancialismos factuais completamente distintos – insusceptíveis, por isso, de conduzir a decisões de mérito opostas.

Efectivamente,

57. Quanto a estas questões, comungamos do douto Parecer de 01.09.2023, da Exma. Procuradora Geral Adjunta do Ministério Público (MP) junto deste STA, que por brevidade de exposição aqui se dá por reproduzido.

Assim,

58. Em ambas as questões alegadamente em oposição, e ao contrário do entendimento da Recorrente/AT, a factualidade não é substancialmente idêntica nas decisões em confronto (Acórdão recorrido e Acórdãos fundamento).

59. Com efeito, as específicas aquisições que dizem respeito a cada uma das decisões em confronto e a prova efectuada relativamente aos diferentes investimentos realizados conduziram a análises jurídicas/decisões de Direito diferenciadas.

60. Pelo que as questões fundamentais de Direito não são as mesmas no Acórdão arbitral recorrido e nos Acórdãos arbitrais fundamento.

61. De modo que não se verifica a contradição alegada pela Recorrente/AT.

62. Razão pela qual o presente recurso deve ser rejeitado por falta dos respectivos pressupostos processuais, consignados nos artigos 25º nº 2 do RJAT e 152º nº 1 e 2 do CPTA.

63. Neste sentido, tal e qual o caso do presente recurso, veja-se o douto Acórdão de 28.09.2023, deste Pleno da Secção de Contencioso Tributário, proferido no Proc. 033/23.9BALSB, in www.dgsi.pt, que aqui se dá por reproduzido.

64. No mesmo sentido, o douto Acórdão do Pleno desta Secção, de 22.11.2023, proferido no Proc. 019/23.3BALSB, in www.dgsi.pt, que aqui se dá por reproduzido.

Sem prescindir, a título subsidiário, por mera cautela de patrocínio, caso este recurso não seja rejeitado, o que só por hipótese se admite,

65. Como resulta das alegações de recurso, estas traduzem-se basicamente na reprodução do anteriormente alegado pela Recorrente/AT em sede de relatório inspectivo, resposta/contestação e alegações pré-decisórias - sucessivamente e por esta ordem.

66. Escusado será dizer que os recursos jurisdicionais têm por objecto imputar erros de julgamento à concreta Sentença recorrida (cfr. artigo 627º nº 1 do CPC).

67. E não repetir à exaustão os fundamentos das correcções e liquidações de imposto operadas pela AT – sem sequer especificar quais as normas violadas pelo Acórdão arbitral recorrido, em violação do artigo 152º nº 2 in fine do CPTA.

68. Com efeito, compulsadas as correspondentes alegações de recurso, estas não imputam directamente infracções/erros de julgamento ao douto Acórdão recorrida, tão pouco especificam quaisquer normas jurídicas violadas por essa decisão.

69. Naturalmente que o recurso jurisdicional se destina à reapreciação da decisão recorrida por uma Instância hierarquicamente superior (artigos 627º nº 1e 639º nº 1 do CPC),

70. pelo que as respectivas alegações de recurso devem dirigir-se à imputação de erros, neste caso de Direito, à decisão judicial recorrida.

71. Com efeito, neste momento processual está em causa a apreciação da douta decisão recorrida e não a apreciação da legalidade ou ilegalidade do relatório inspectivo – já apreciada no Acórdão arbitral recorrido.

72. Pelo que não podem as alegações de um recurso jurisdicional, ainda que extraordinário, voltar a insistir (como já tinha sucedido anteriormente, na contestação e nas alegações prédecisórias) no teor do relatório inspectivo que esteve na génese das correcções e das liquidações que constituem objecto dos presentes autos

73. Em sede de recurso jurisdicional competia, outrossim, imputar objectiva, circunstanciada e fundamentadamente, erros de Direito à douta decisão arbitral recorrida – o que não sucedeu, se bem analisamos as alegações/conclusões de recurso.

74. Com efeito, estas limitam-se a alegações em abstracto sobre os benefícios fiscais em discussão, reproduzido ipsis verbis, insistentemente e à exaustão, o já referido anteriormente pela própria Recorrente/AT no relatório inspectivo, na resposta/contestação ao pedido arbitral e nas alegações pré-decisórias,

75. negligenciando por completo a matéria de facto provada segundo o Acórdão arbitral recorrido – e, assim, abstraindo completa e indevidamente do caso concreto aqui em causa.

76. Pelo que o recurso interposto pela FP não cumpre sequer o ónus de alegação a que se reportam os artigos 639º nº 1 e 640º do CPC, e 152º nº 2 in fine do CPTA.

77. De modo que, também por isso, o presente recurso deve ser rejeitado, não se conhecendo do mesmo por falta de alegações (artigo 641º nº 2 b) do CPC) quanto às infracções/erros de julgamento de Direito de que alegadamente padeceria o Acórdão arbitral recorrido.

78. Com efeito, o esforço de alegação cinge-se à tentativa de demonstração da pretensa oposição de Acórdãos - negligenciando a matéria de facto provado e omitindo as infracções, erros de julgamento e normas jurídicas que teriam sido violadas pelo Acórdão arbitral recorrido.

Sem prescindir, a título subsidiário,

79. Como se disse, ao contrário do que pressupõe a Recorrente/AT, não se provou que o investimento em causa tivesse quaisquer “características de investimento corrente de substituição” – como a Recorrente/AT repete ad nauseam.

80. Com efeito, nada se provou no sentido de que no caso concreto estamos perante “investimento corrente de substituição”, muito menos que o mesmo teve “como principal objectivo a reposição da capacidade produtiva que se vai desgastando pelo uso e/ou pela passagem do tempo”, ou seja, “manter a operacionalidade da unidade produtiva”.

81. Muito pelo contrário, como se denota da factualidade provada (vide supra).

82. A Recorrente/AT, para o efeito, estriba-se no relatório inspectivo, transcrito na factualidade provada do douto Acórdão arbitral recorrido.

83. Ora, contrariamente ao pressuposto pela Recorrente/AT, o que se provou e consta do rol de factos provados foi a emissão formal do RIT, cujo texto a decisão recorrida transcreveu ipsis verbis em parte.

84. Ou seja, o que se provou foi a emissão de um RIT com um determinado teor (questão estritamente formal) – e não que ocorreram efectiva e realmente os factos nele descritos (questão substancial),

85. os quais, aliás, tão pouco foram percepcionados/presenciados pela AT, pois ocorreram muito antes do relatório inspectivo ter sido elaborado, pelo que a ocorrência efectiva dos mesmos, do ponto de vista da realidade dos mesmos, jamais poderia ser atestada no relatório inspectivo.

86. Com efeito, ao ter sido apenas provada a emissão de um relatório inspectivo, com determinado texto, evidentemente que dele não se pode extrapolar a conclusão de que os factos nele descritos ocorreram na realidade.

87. Importa não confundir (i) factos presenciados/percecpionados directamente pelo documentador com (ii) meros juízos pessoais do documentador, estes últimos naturalmente sujeitos a livre apreciação do julgador, pois são estritamente conclusivos (cfr. artigo 371º nº 1 do CCivil, in fine).

88. E os factos provados permitem simplesmente extrair que ficou provado ter sido emitido um RIT com um determinado teor, como acima se referiu – não mais do que isso.

89. Com efeito, a Recorrente/AT parte do pressuposto que a factualidade inscrita no relatório inspectivo teria sido dado como provada.

90. Ora, nada de mais errado, como salta à vista.

91. Da factualidade provada não se retira que o Acórdão arbitral recorrido tenha dado por provada a factualidade descrita no relatório inspectivo,

92. muito menos que tenha sufragado o enquadramento jurídico propugnado pela AT no relatório inspectivo – antes pelo contrário.

93. Aliás, se tivesse sido esse o caso, certamente que o sentido decisório teria sido bem distinto.

94. Como é de liminar clareza, uma coisa é dar como provados os factos invocados pela AT para proceder à correcção em causa; outra, completamente diferente, é dar como provado que a AT emitiu relatório inspectivo com determinado teor (como é o caso).

95. Aliás, não poderia ser de outro modo, atendendo a que o relatório inspectivo da AT, transcrito nos factos provados, está pejado de interpretações e juízos conclusivos – que obviamente não constituem matéria de facto.

96. Aliás, a afirmação de que o investimento em causa, alegadamente, teria sido meramente corrente/de substituição, é um juízo subjectivo e estritamente conclusivo da AT.

97. E do rol de factos provados extrai-se outrossim que o investimento em causa teve um cariz extraordinário e foi profundamente inovador e disruptivo no seio da Recorrida/Requerente, proporcionando um incremento e diversificação da capacidade produtiva do estabelecimento industrial existente.

98. Com efeito, não se provou que o investimento em causa tivesse qualquer cariz de “investimento corrente de substituição” ou “reposição” – muito, mas mesmo muito pelo contrário.

99. Aliás, da matéria de facto provada resulta que o investimento realizado traduziu-se numa “alteração fundamental no processo de produção global” da Requerente/Recorrida, por via da robotização introduzida, em função da redefinição estratégica dos seus negócios – que a Requerente/Recorrida se viu compelida a definir/prosseguir, em resultado da perda do seu principal cliente (vide supra matéria de facto provada).

100. Veja-se o Acórdão do CAAD, Proc. nº 574/2020-T, de 25.06.2021, cujo teor se dá por reproduzido.

101. Também ao contrário do que pressupõe a Recorrente/AT, da factualidade provada não se extrai que se tratou da mera “reparação e beneficiação (ou melhoria) de ativos, incluindo aquisição de ativos isolados destinados a utilização generalizada na unidade fabril pré-existente”.

102. Outrossim, o que se extrai da factualidade provada é que se tratou de um conjunto de investimentos inovadores e modernos, em novos equipamentos e novas máquinas, agregados em torno da redefinição estratégica da actividade da Recorrida/Requerente.

103. Com efeito, perante a prova produzida e a factualidade provada – que não pode ser colocada em causa no presente recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência,

104. são irrelevantes as considerações teóricas da Recorrente/AT quanto à conceituação do que se deve alegadamente entender como “investimento produtivo”, “investimento de substituição, de expansão ou de inovação” – e qual deles, alegadamente, deve integrar o “conceito de investimento inicial”.

105. Sendo certo que da factualidade provada resulta claramente que o investimento em causa, profundamente inovador e modernizador, aumentou a capacidade de produção do estabelecimento existente, proporcionou a diversificação dessa produção e permitiu uma alteração fundamental do processo de produção – por via da robotização do processo produtivo.

106. Pelo que, à luz do próprio entendimento da Recorrente/AT, o investimento em análise constituiu inequivocamente “investimento inicial” nos termos e para os efeitos dos benefícios fiscais do RFAI e da DLRR.

107. Com efeito, não se provou que o investimento em discussão se tivesse traduzido na mera “reposição da capacidade produtiva que se vai desgastando pelo uso e/ou pela passagem do tempo.”, ou de “investimento corrente, imprescindível para manter a operacionalidade da unidade produtiva.” – muito pelo contrário.

108. Aliás, segundo a própria Recorrente/AT, mesmo esse pretenso “investimento de substituição”, segundo “as FAQ 25 e 80 do Guia Prático do RGIC” apenas é excluído “para efeito dos auxílios regionais ao investimento” se não estiver incorporado numa “mudança fundamental no processo de produção global”.

109. Ora, da factualidade provada resulta precisamente uma alteração fundamental no processo produtivo da Recorrida/Requerente, em resultado da inovadora reorientação estratégica delineada pela Recorrida/Requerente e dos novos investimentos concretizados para dar execução a essa estratégia, devidamente comprovados nos presentes autos.

110. Sendo certo que o presente recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência está delimitado pelas questões alegadamente em oposição, não podendo servir para reapreciar todas e quaisquer matérias, como pretende a Recorrente/AT - designadamente no que concerne aos investimentos efectuados em edifício,

111. ou mesmo quanto ao entendimento da Recorrente/AT segundo o qual “O Guia prático do RGIC, emanado da União Europeia, vem, através das respostas a um conjunto de questões frequentes (FAQ do RGIC), esclarecer os diferentes Estados-membros acerca do seu âmbito e apoiar na sua aplicação. De facto, o RGIC – Regulamento Geral de Isenção por Categoria, alinhado com as diretrizes da EU, designadamente, com as OAR, determina e delimita as regras sob as quais os Estados-membros podem atribuir apoios estatais sem o risco de comprometer a livre concorrência na UE, de acordo com o TFUE, e, portanto, sem necessidade de notificação prévia à Comissão Europeia. Não podendo conceber-se, por tal motivo, que não sejam respeitadas as orientações emanadas para o efeito pela própria Comissão Europeia.”.

112. Com efeito, o Acórdão arbitral recorrido entendeu, nesse segmento, que “as opiniões da Comissão Europeia, veiculadas através de guias práticos e respostas a questões frequentes (FAQs), a que alude a Autoridade Tributária e Aduaneira, não são actos de natureza legislativa nem têm natureza vinculativa, pelo que não têm potencialidade para derrogar as disposições de Direito da União de natureza legislativa, como é o RGIC, nem normas legislativas de Direito Nacional.”.

113. O assim decidido, que se se saiba, não está em oposição com quaisquer decisões - muito pelo contrário.

114. E a AT/Recorrente, aliás, não alegou que houvesse qualquer oposição decisória nesta matéria.

115. Pelo que o assim decidido não pode ser objecto de reapreciação no âmbito do presente recurso - pois este não é um recurso ordinário, como acima se disse.

116. Também ao contrário do que afirma a Recorrente/AT, o CAAD não admitiu “a mera substituição de um activo por outro, desde que o novo seja mais eficiente, mais produtivo (na era da tecnologia seria praticamente impossível não ser, pelo que, nesta perspetiva, não faria sentido utilizar a palavra “substituição””.

117. Muito menos “admite até a reconversão de actividades que antes desenvolvia (reorientação estratégica), que até podem ser acompanhadas de despedimentos colectivos”.

118. E não se provou uma quebra do número total de trabalhadores da empresa, fossem eles contratados a termo ou sem termo, muito menos qualquer despedimento coletivo, quer no momento dos investimentos, quer nos anos subsequentes.

119. O Acórdão arbitral recorrido decidiu, e bem, ter havido a criação de trabalho propugnada pela lei - provou-se ter havido aumento e criação de 1 posto de trabalho em resultado dos investimentos realizados e a manutenção desse mesmo posto de trabalho.

120. Com efeito, a interpretação que a Recorrente/AT faz de criação de postos de trabalho viola o disposto na alínea f) do nº 4 do artigo 22º do CFI.

121. Violando os artigos ao abrigo dos quais foram feitas as correcções e liquidações em discussão: artigos 22º e 23º do CFI, 2º da Portaria nº 27/2015, de 21/9, e 90º do CIRC, quanto ao benefício fiscal do RFAI; artigos 29º, 30º e 34º do CFI, 11º da Portaria nº 27/2015, de 21/9, e 90º do CIRC, quanto à reposição do benefício fiscal da DLRR.

122. Não sendo legalmente admissível a fundamentação a posteriori, depois da emissão da liquidação - designadamente tão só nesta fase de recurso jurisdicional extraordinário para uniformização de jurisprudência.

123. Com efeito, a fundamentação deve ser anterior ou contextual do acto de liquidação, sob pena de irremediável prejuízo do direito de defesa do contribuinte.

124. Por razões evidentes de protecção do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva do contribuinte, consagrado nos artigos 20º e 268º nº 4 da CRP, não é legalmente admissível a fundamentação inovadora.

125. Isto, sob pena de violação dos princípios da segurança jurídica, da protecção da confiança, da boa-fé e das legítimas expectativas dos contribuintes (artigos 55º da LGT, 20º e 266º nº 2 da CRP, e 10º do CPA).

126. O contribuinte, quando se defende contra um acto tributário, só pode direcionar o seu direito de defesa relativamente aos concretos fundamentos desse acto tributário,

127. não podendo ser surpreendido com argumentos novos, supervenientes ao exercício do seu direito de defesa.

128. Por conseguinte, não pode vir agora a Recorrente/AT alegar inovadoramente que os benefícios fiscais em discussão declarados pela Requerente/Recorrida violam um manancial de legislação que a própria AT, na fundamentação das liquidações, não invocou.

129. Sendo certo que, como muito bem decidiu o douto Acórdão arbitral recorrido, quanto aos segmentos decisórios aqui concretamente recorridos, as liquidações em crise padecem de erro nos pressupostos de facto e de vício de violação de lei,

130. nos termos melhor explanados no Acórdão arbitral recorrido e que acima se reproduziram nos trechos relevantes para a decisão de mérito do presente recurso – os quais, por brevidade de exposição, nos escusamos de repetir.

131. Sendo apenas de reforçar o seguinte, em sufrágio do douto Acórdão arbitral recorrido: Quanto ao investimento elegível (RFAI e DLRR)

132. O RFAI encontra-se previsto nos artigos 22º a 26º do CFI, aprovado pelo Decreto-Lei nº 162/2014, de 31/10, o qual visa intensificar o apoio ao investimento, favorecendo o crescimento sustentável, a criação de emprego e o reforço da estrutura de capital das empresas.

133. Com a publicação do Decreto-Lei nº 162/2014, de 31/10, foi aprovado um novo CFI, tendo o RFAI passado a fazer parte integrante do diploma.

134. A Portaria nº 297/2015, de 21/9 (doravante abreviadamente designada por “Portaria nº 297/2015”), veio proceder à regulamentação do referido benefício, por forma a assegurar a aplicação integral das regras previstas na legislação europeia em matéria de auxílios estatais e definir os procedimentos especiais de controlo do montante dos auxílios de Estado com finalidade regional.

135. No âmbito das condições objetivas de aplicação do RFAI, o artigo 22º nº 2 do CFI estabelece quais são as aplicações/investimentos (activos) relevantes para o efeito.

136. Assim, para efeitos do RFAI, consideram-se relevantes os investimentos em ativo imobilizado corpóreo adquirido em estado de novo e ativo imobilizado incorpóreo constituído por custos com transferência de tecnologia, desde que afetos à exploração da empresa.

137. Nos termos do artigo 22º nº 7 do CFI, “Nas regiões elegíveis para auxílios nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 107.º, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia constantes da tabela do artigo 43.º, no caso de empresas que NÃO se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, apenas podem beneficiar do RFAI os investimentos que respeitem a uma nova atividade económica, ou seja, a um investimento em ativos fixos tangíveis e intangíveis relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou com a diversificação da atividade de um estabelecimento, na condição de a nova atividade não ser a mesma ou uma atividade semelhante à anteriormente exercida no estabelecimento.”.

138. Ora, como a AT/Recorrente sabe e refere no relatório inspectivo, a Requerente/Recorrida é uma PME, pelo que, a contrário, não lhe é o disposto neste artigo 22º nº 7 do CFI.

139. Ou seja, no caso da Requerente/Recorrida, para beneficiar do RFAI os investimentos não carecem de respeitar a uma “nova atividade económica, ou seja, a um investimento em ativos fixos tangíveis e intangíveis relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou com a diversificação da atividade de um estabelecimento”.

140. É certo que, nos termos do artigo 2º nº 2, al. d), da Portaria 297/2015, “Os benefícios fiscais previstos no artigo 23º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.”.

141. Contudo, esta norma meramente regulamentar, porque de hierarquia inferior, deve ser interpretada e aplicada em subordinação à lei que visa regulamentar – designadamente, em subordinação ao sobredito artigo 22º nº 7 do CFI.

142. Dito de outro modo, este artigo 22º nº 7 do CFI e a interpretação que dele se extrai prevalecem e sobrepõem-se ao sobredito artigo 2º nº 2 d) da Portaria nº 297/2015 de 21/9.

Sem prescindir, por cautela de patrocínio,

143. Nos termos do artigo 2º nº 2, al. d), da Portaria 297/2015, “Os benefícios fiscais previstos no artigo 23º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, OU uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.”.

144. Também no artigo 2º § 49º al. a) do RGIC pode ler-se que o “investimento inicial” consiste num “investimento em ativos corpóreos e incorpóreos relacionado com a criação de um novo estabelecimento, aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento OU mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.

145. Assim, apesar do elenco meramente alternativo da lei - do que é “investimento inicial” -, da factualidade acima referida resulta ter sido provado que o investimento em causa provocou o aumento da capacidade e diversificação da produção do estabelecimento existente, bem como a alteração fundamental do processo de produção desse estabelecimento.

146. Por conseguinte, tratou-se claramente de “investimento inicial” na acepção do RGIC e da Portaria nº 297/2015.

147. Com efeito, resulta do artigo 2º § 49º al. a) do RGIC e do artigo 2º nº 2, al. d), da Portaria nº 297/2015 que se enquadram nessa definição os investimentos relacionados com “aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.

148. Atendendo a esta definição, não é de excluir deste conceito de “investimento inicial” o investimento realizado pela Requerente/Recorrida nos anos em causa, desde que esteja relacionado com “aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.

149. A este respeito, veja-se o Acórdão do CAAD, Proc. nº 726/2020-T, de 10.12.2021, cujo teor se dá por reproduzido.

150. O aumento da capacidade do estabelecimento existente não implica que, de forma direta e imediata, os investimentos se traduzam no aumento do volume de vendas, muito menos no aumento da produção.

151. Veja-se também o Acórdão do CAAD, Proc. nº 546/2020-T, de 17.01.2022, cujo teor também se dá por reproduzido.

152. Resulta da jurisprudência citada que o aumento da capacidade do estabelecimento existente não implica que, de forma direta e imediata, os investimentos se traduzam no aumento do volume de vendas, muito menos no aumento da produção.

153. Como, aliás, é notório e do conhecimento geral.

154. E não se constata qualquer suporte legal para desaplicar o benefício fiscal a investimentos que não produzam resultados imediatos.

155. Veja-se igualmente o Acórdão do CAAD, Proc. nº 726/2020-T, cujo teor se dá por reproduzido.

156. Como se provou, a estratégia de maior especialização na produção de produtos técnicos, cuja materialização implicou a concretização de significativos investimentos a partir de 2016, permitiram à empresa dar um salto muito significativo em termos de capacidade de produção de produtos técnicos e aumento do preço médio de venda.

157. Foi provado o nexo causal dos investimentos efetuados de 2016 em diante e a estratégia delineada pela Requerente/Recorrida em 2016, com vista a incrementar a sua capacidade de produção de produtos de maior complexidade (de maior valor acrescentado) - e o seu enquadramento numa das tipologias de “investimento inicial” na aceção do RGIC e da Portaria nº 297/2015.

158. A Requerente/Recorrida demonstrou que os investimentos realizados de 2017 em diante foram efetuados em ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo que foram afetos à exploração da empresa, nos moldes preceituados pelo artigo 22º, nº 2 do CFI, o que não foi sequer questionado pela AT,

159. tendo por objetivo o aumento da capacidade de produção de produto técnico das suas instalações fabris, permitindo a criação de condições para produzir uma maior quantidade e diferenciação de produto técnico do que aquela que a empresa era capaz de produzir na fase pré-projecto – como se provou.

160. Com efeito, como se provou, os investimentos estrategicamente efetuados pela Requerente/Recorrida de 2016 em diante visaram diferenciar e aumentar a capacidade de produção de produto técnico com maior complexidade.

161. As aquisições/investimentos em questão enquadraram-se num investimento novo agregador, ou seja, não foram meras aquisições isoladas – como se denota da factualidade provada.

162. Mais: provou-se que o novo colaborador/director técnico foi contratado precisamente “na sequência dos investimentos efetuados”.

163. Ou seja, o novo colaborador foi contratado por causa dos novos investimentos.

164. Provou-se inclusivamente que os seus conhecimentos técnicos eram indispensáveis “para conseguir pôr em funcionamento as máquinas adquiridas pela Requerente”.

Por outro lado,

165. Também ao nível ao DLRR, a Requerente/Recorrida efetuou investimento com o objetivo de aumentar/incrementar a capacidade produtiva de um estabelecimento existente (cfr. artigo 2º nº 2, al. d), da Portaria 297/2015 e alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2º do RGIC) – como ficou provado e considera o douto Acórdão arbitral recorrido.

166. Como ficou provado, os investimentos efetuados nos exercícios de 2016 a 2019 inserem-se numa estratégia global de reforço da aposta na produção de produto técnico, visando a diversificação e aumento de capacidade da Requerente/Recorrida naquela produção.

167. que permitiu à Requerente/Recorrida diminuir a exposição da sua atividade a segmentos de mercado que tem como fator chave o preço, enquanto critério distintivo face à concorrência.

168. Da factualidade provada resulta que as aplicações relevantes realizadas nos exercícios de 2016 a 2019, para efeitos da DLRR não se reconduzem a investimentos “avulsos”, como entende a Recorrente/AT – outrossim, foram plenamente inseridos num projeto agregador e estruturante para a Requerente/Recorrida.

169. Pelo que são enquadráveis no artigo 27º e seguintes do CFI, constituindo investimento inicial e aplicações relevantes de ativos fixos tangíveis em estado novo (cfr. artigos 2º nº 49 alínea a) e 30º nº 1 alínea a) do RGIC).

170. Como se provou, o investimento não constituiu uma aquisição isolada de ativos, tendo antes a natureza de investimento estratégico,

171. sendo que a lei não impõe como requisito que todo e qualquer bem adquirido estrategicamente para o “aumento da capacidade de um estabelecimento existente”² seja “capaz de produzir autonomamente” o produto final.

² Que é condição exigida pelo RGIC e pela Portaria 297/2015, para que se possa considerar estarmos na presença de um “investimento inicial”, elegível para efeitos da aplicação da DLRR, aqui em causa.

172. Veja o Acórdão do CAAD no Proc. nº 546/2020, cujo teor se dá por reproduzido.

173. Por conseguinte, nada há a apontar ao douto Acórdão arbitral aqui recorrido – quanto aos concretos segmentos (alegadamente) decisórios aqui impugnados pela Recorrente/AT. Relativamente à criação de postos de trabalho (RFAI)

174. O artigo 22º nº 4 da al. f) do CFI requer que o investimento relevante proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do terceiro ano seguinte.

175. Como aqui sucedeu e se provou (vide supra).

176. Com efeito, como se extrai da factualidade provada, o requisito de criação de postos de trabalho e respetiva manutenção, previsto na alínea f) do nº 4 do artigo 22º do CFI, foi plenamente cumprido.

177. Sendo despropositada a interpretação efetuada pela AT/Recorrente ao conceito de “criação de postos de trabalho” previsto no artigo 22º nº 4 da al. f) do CFI.

178. Com efeito, a lei não determina que a aferição dos postos de trabalho criados e mantidos seja aferida segundo a metodologia da Recorrente/AT.

179. O RFAI é calculado com base nos custos de investimento com a aquisição de ativos corpóreos e incorpóreos, e não com base em custos salariais estimados.

180. Aliás, a própria Recorrente/AT reconhece que a tentativa de aplicação analógica do nº 9 do artigo 14º do RGIC é ilegal – já que os benefícios fiscais reconhecidamente não admitem aplicação analógica (cfr. artigo 10º do EBF).

181. A legislação comunitária aplicável aos auxílios regionais ao investimento, e que tem como custos elegíveis os custos de investimento em ativos corpóreos e incorpóreos, não prevê uma definição de criação de postos de trabalho, a qual também não se encontra prevista no CFI, nem na Portaria nº 297/2015.

182. A aplicação analógica não é possível em matéria de benefícios fiscais, sendo certo que, em prol do cumprimento do princípio da legalidade e da tipicidade, não pode a AT estabelecer requisitos que a lei não prevê (cfr. artigo 103º nº 2 da CRP).

183. Para o efeito, quanto à criação e manutenção de postos de trabalho, a AT argui que, seguindo a metodologia das orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR), publicadas no Jornal Oficial da União Europeia nº C 209, de 23 de julho de 2013, deve atender-se não só à criação de novos postos de trabalho gerados pelo investimento relevante no âmbito do RFAI, mas também ao aumento líquido de emprego relativamente à globalidade dos trabalhadores da empresa.

184. Isto, segundo a AT com base no argumento de que a exigência do artigo 22º nº 4 da al. f) do CFI é efetuada “praticamente” nos termos que resultam do nº 9 do artigo 14º do RGIC, aplicável quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados.

185. Ora, o RFAI é calculado com base nos custos de investimento com a aquisição de ativos corpóreos e incorpóreos, e não com base em custos salariais estimados - razão pela qual a aproximação de conceitos efetuada pela AT é indevida.

186. Aliás, a própria AT reconhece que essa tentativa de aplicação analógica daquele nº 9 do artigo 14º do RGIC é ilegal ao aplicar o advérbio de modo “praticamente”.

187. A aplicação analógica, conforme anteriormente exposto, não é possível em matéria de benefícios fiscais, sendo certo que, em prol do cumprimento do princípio da legalidade e da tipicidade, não pode a AT estabelecer requisitos que a lei não prevê (cfr. artigo 103º nº 2 da CRP).

188. O que, aliás, se confirma na Acórdão PIV nº …18, Processo 2010001800, citada no RIT, num excerto não publicado na correspondente ficha doutrinária: “Embora os incentivos fiscais previstos no RFAI 2009 não sejam calculados com base nos custos salariais (mas sim nos custos do investimento relevante) e, portanto, não seja indispensável, ao que parece a verificação das condições enumeradas no referido nº 3 do referido artº 12º (…) [norma do Regulamento (CE) nº 800/2008 – RGIC à data da emissão daquela informação – equivalente ao nº 9 do artigo 14º do RGIC em vigor]”.

189. Aliás, em face desta consideração, carece liminarmente de fundamento o entendimento da Recorrente/AT vertido na ficha doutrinária PIV nº …18, Processo 2010001800, citado no RIT.

190. Com efeito, é despropositada a interpretação efetuada pela AT do conceito de “criação de postos de trabalho” previsto no artigo 22º nº 4 da al. f) do CFI segundo os requisitos estabelecidos no nº 9 do artigo 14º do RGIC.

191. No mesmo sentido, a decisão arbitral nº 307/2019-T, de 09.03.2020, cujo teor se dá por reproduzido.

192. Aderindo igualmente ao entendimento vertido na decisão arbitral nº 307/2019-T, de 09.03.2020, veja-se a decisão arbitral nº 546/2020-T (também CAAD), de 17.01.2022.

193. Por conseguinte, a legislação aplicável não requer que exista um aumento do número global de colaboradores com vínculo laboral correspondente a contrato de trabalho sem termo ou por termo indeterminado.

194. Aliás, a própria AT reconhece no RIT que “(…) a relevância atribuída ao vínculo contratual manifestada na Informação Vinculativa convocada, não resulta em si mesma, nem poderia, de qualquer exigência emanada das normas europeias em matéria de auxílios do Estado com finalidade regional (…)”,

195. devendo acrescentar-se que também não resulta da legislação nacional relativa ao RFAI, razão pela qual este requisito não pode ser exigido.

196. A legislação aplicável não requer que exista um aumento do número global de colaboradores com vínculo laboral correspondente a contrato de trabalho sem termo ou por termo indeterminado.

197. devendo acrescentar-se que também não resulta da legislação nacional relativa ao RFAI, razão pela qual este requisito não pode ser exigido.

198. Tendo o investimento da Requerente/Recorrida para aumento da sua capacidade, no âmbito do processo de implementação da estratégica de reforço da produção de produtos técnicos, proporcionado a criação do posto de trabalho de “Director Técnico”, foi cumprido o requisito da criação de postos de trabalho previsto na alínea f) do nº 4 do artigo 22º do CFI – como bem decidiu o douto Acórdão arbitral recorrido.

199. Aliás, não está claro como a Recorrente/AT apurou o n.º de trabalhadores com contrato sem termo no final de cada um dos meses, pois o seu apuramento não corresponde à informação facultada pela Requerente/Recorrida no decurso do processo de inspeção tributária, nem se encontra demonstrado no RIT e respetivos anexos.

200. Na verdade, apenas consta do Anexo 3 do RIT um mapa nominativo de apuramento do n.º de colaboradores – o qual, por comparação com a tabela constante da página 38, se percebe que corresponde ao n.º total de trabalhadores, independentemente do vínculo laboral existente,

201. não se sabendo como foram apurados os n.ºs mensais de trabalhadores que serviram de base à construção das tabelas que constam na página 34 (do lado esquerdo) e na página 35 do relatório inspectivo (copiados nas alegações de recurso) e das quais resultou a conclusão acima.

202. Sendo certo que nada se provou a este propósito (vide factualidade provada): não se provou qualquer redução líquida do número total de colaboradores contratados sem termo no período em causa.

203. Ainda que, por mera hipótese, se admitisse a aplicabilidade do critério adoptado pela Recorrente/AT, não previsto na lei para o RFAI – consideração da totalidade dos colaboradores com contratos de trabalho sem termo e comparando com a média dos 12 meses anteriores -, a interpretação que a AT faz é incorreta.

204. De acordo com o entendimento da Recorrente/AT, a condição de criação de postos de trabalho é aferida em função do número de trabalhadores a 31 de dezembro, face à média dos 12 meses anteriores.

205. Em face de tal critério, conclui que “no ano do investimento, o sujeito passivo não cria postos de trabalho, pois regista um incremento de apenas 0,83 unidades, isto é, não chega sequer a criar um posto de trabalho”.

206. Ora, a análise e conclusão dos Serviços não tem qualquer sentido.

207. Desde logo, pela comparação do nº de trabalhadores em 31 de dezembro de 2016 com o nº de trabalhadores em 31 de dezembro de 2017, verifica-se um aumento, em termos absolutos, de 2 trabalhadores – 57 em dezembro de 2016 e 59 em dezembro de 2017.

208. Ou seja, mesmo restringindo a análise, por mera hipótese, à globalidade dos colaboradores com contrato de trabalho sem termo, tendo a Requerente/Recorrida passado a contar com mais 2 trabalhadores no ano de 2017, verifica-se um acréscimo efetivo do número de trabalhadores.

209. A metodologia da média é altamente falível, designadamente porque se poder concluir que uma entidade criou postos de trabalho – dado que o nº de trabalhadores a 31 de dezembro do ano de referência seria porventura superior à média dos últimos doze meses – num caso em que o nº de colaboradores no final desse ano é inferior ao nº de colaboradores no final do ano anterior,

210. bastando que ao longo do ano de referência o nº de colaboradores seja inferior ao nº em 31 de dezembro dos dois anos em causa.

211. Mas ainda que, por mera hipótese, essa metodologia pudesse/devesse ser adoptada, teria de se concluir, no caso concreto, que a média de colaboradores no período de dezembro de 2016 a novembro de 2017 é de 58 colaboradores.

212. Por conseguinte, mesmo adotando esta abordagem, por mera hipótese, a AT/Recorrente deveria ter concluído que se verificou a criação de um posto de trabalho, dado que a média foi de 58 colaboradores e a 31 de dezembro de 2017 a Requerente tinha 59 colaboradores.

213. Todavia, isso não foi relevado pela Recorrente/AT, atropelando o seu próprio entendimento.

214. Adicionalmente, tendo o projeto de investimentos sido iniciado em 2016, o momento pré-projecto é dezembro de 2015 e não dezembro de 2016, como considerado pela AT/Recorrente.

215. A AT/Recorrente extrai da informação vinculativa nº ...53 (PIV nº ...12) a conclusão de que a condição de manutenção de postos de trabalho é aferida em função do número de trabalhadores a 31 de dezembro face à média dos 12 meses anteriores.

216. A AT/Recorrente, ao fazer transcrições truncadas (cirúrgicas) daquela informação, descontextualizou e desvirtuou o entendimento ali plasmado, para dela extrair as conclusões que pretendia.

217. Quanto à condição de manutenção dos postos de trabalho criados, a referida informação (Processo nº ...53) dispõe que: “4. Ainda que a empresa pudesse beneficiar da totalidade do benefício no período de tributação que se iniciou em 2009, ela teria de manter os postos de trabalho criados nos termos anteriormente referidos até ao final do período de tributação que se inicie em 2013.”.

218. Não é, pois, aceitável o entendimento da Recorrente/AT - de que a condição de manutenção dos postos de trabalho se afere através do critério do nível de emprego e não em função da manutenção dos postos de trabalhos criados especificamente pelo investimento em causa.

219. Para além de criar lei onde não existe lei, a AT cria critérios inovadores ao interpretar os seus próprios entendimentos - quando estes não exigem esses critérios adicionais.

220. A este respeito, a AT/Recorrente afirma o seguinte: “Ou seja, em dezembro de 2019, volvido 3 anos, a empresa apresentava um quadro de 55 trabalhadores com contrato sem termo, contra os 59 que apresentou em 2017.”.

221. Ora, como se referiu anteriormente, não se percebe como a AT/Recorrente apurou aqueles números, o que não está demonstrado no relatório inspectivo nem nos respetivos anexos – e, sobretudo, não ficou provado.

222. Além disso, a AT/Recorrente continua a confundir a manutenção dos postos de trabalho criados em função do investimento com a manutenção do nível geral de emprego da empresa.

223. Sendo certo que se provou, in casu, a correlação entre os investimentos efectuados e a necessidade de contratação/criação de um novo posto de trabalho, de director técnico - atento o novo processo robotizado de fabrico instalado e a imperiosidade da sua gestão integrada (vide supra).

224. No sentido aqui propugnado e conforme douto Acórdão arbitral recorrido, veja-se o douto Acórdão Arbitral proferido no Processo nº 229/2022-T (CAAD), relativo a RFAI e DLRR, cujo teor se dá por reproduzido.

225. Veja-se igualmente o douto Acórdão Arbitral proferido no Processo nº 544/2022-T (CAAD), relativo a RFAI, cujo teor também se dá por reproduzido.

226. Veja-se também o douto Acórdão Arbitral proferido no Processo nº 307/2019-T (CAAD), relativo a RFAI, cujo teor igualmente se dá por reproduzido.

227. A posição adotada no processo 307/2019-T foi igualmente adotada nos processos 546/2020-T, 500/2021-T, 508/2021-T, 229/2022-T e 544/2022-T.

228. Veja-se também o douto Acórdão Arbitral proferido no Processo nº 488/2019-T (CAAD), relativo a RFAI, cujo teor também se dá por reproduzido.

229. Veja-se igualmente a douta decisão arbitral de 29.03.2023, proferida no Processo nº 485/2022-T (CAAD), cujo teor também se dá por reproduzido.

230. Por conseguinte, também quanto a esta questão o douto Acórdão recorrido não merece qualquer censura.»

1.10. A Recorrente e a Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta tomaram conhecimento das contra-alegações, nada tendo dito a primeira e mantendo a segundo tudo quanto já expendera no anterior parecer,

1.11. Observado o estipulado no n.º 2 do artigo 92.º do CPTA, cumpre, agora, a este Supremo Tribunal, em conferência do Pleno desta Secção de Contencioso Tributário, decidir.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1. É entendimento uniforme, reiteradamente professado por este Supremo Tribunal Administrativo, que não existe qualquer obstáculo legal a que num único Recurso para Uniformização de Jurisprudência sejam submetidas a apreciação mais do que uma questão fundamental de direito, desde que, relativamente a cada uma delas, seja indicado apenas um acórdão que haja julgado essa questão de forma oposta.

2.2. No caso, é o que sucede, uma vez que a Recorrente pretende com a interposição do presente recurso que se uniformize jurisprudência relativamente a duas questões fundamentais de direito que enunciou nos termos que passamos a transcrever:

- “Se imanente ao conceito de investimento inicial (excepto quanto à tipologia de alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento) está o estímulo a um investimento incremental atento o seu propósito de incrementar a actividade económica e a criação de emprego, que se distinga em relação ao pré-existente, constituindo, por conseguinte, uma expansão do sistema de produção existente inicialmente, e que funcione em simultâneo com este, ou, se admite investimento de substituição?” [conclusão B) das alegações do Recurso na parte relativa “AO CONCEITO DE INVESTIMENTO INICIAL PARA EFEITOS DE ELEGIBILIDADE EM SEDE DE RFAI”];

- “É exigível que o investimento conduza à criação líquida de postos de trabalho no estabelecimento por forma a que os sujeitos passivos possam beneficiar do regime de benefícios fiscais RFAI, concretizando uma efetiva “criação de emprego” de acordo com o conceito vertido nas Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR) aplicável ex vi alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI?” [conclusão A) das alegações do Recurso na parte relativa “À CONDIÇÃO DA CRIAÇÃO DE POSTOS DE TRABALHO”].

2.3. Questão distinta, prévia, e pela primeira vez colocada neste Supremo Tribunal Administrativo, é a de saber se interposto e liminarmente admitido Recurso para Uniformização de Jurisprudência é de admitir que a parte contrária interponha um recurso subordinado.

2.4. Neste contexto e face a tudo quanto ficou exposto, são três as questões a decidir: (i) decidir a questão prévia oficiosamente suscitada pela Relatora dos autos e que se prende com a admissibilidade de dedução em Recurso para Uniformização de Jurisprudência de um recurso subordinado; (ii) saber se o Recurso para Uniformização de Jurisprudência interposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira deve ser admitido por estarem preenchidos os requisitos para tanto legalmente exigíveis, tese que apenas a Recorrente perfilha; (iii) concluindo-se que todos os pressupostos de admissibilidade substancial estão preenchidos, julgar as questões colocadas pela Recorrente e que deixámos enunciadas no ponto 2.2. supra.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

3.1.1. Julgamento de facto constante da decisão recorrida:

A) A Requerente foi fundada em 23-01-1963, com o CAE nº 15201 – “Fabricação de Calçado” – e dedica-se à indústria de sapataria, nomeadamente à fabricação e comercialização de calçado especializado nas áreas de segurança, equitação e caça, conforme certidão permanente, tendo sido transformada em sociedade anónima (certidão consta do documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

B) Foi realizada uma inspecção à Requerente, com referência aos anos de 2017, 2018 e 2019, para controlo de benefícios, em que foram efectuadas correcções relativas a benefícios em sede de IRC;

C) Nessa inspecção foi elaborado o Projecto de Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido:

D) A Requerente exerceu o direito de audição nos termos que constam do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

E) Na sequência do exercício do direito de audição foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que consta do documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido em que se refere, além do mais, o seguinte:

II.1. CREDENCIAL E PERÍODO EM QUE DECORREU A AÇÃO

O procedimento inspetivo iniciou-se em 15-07-2021, com a assinatura da ...89, com âmbito parcial (IRC) e extensão ao ano 2017. Essencialmente pretendia-se a análise da dotação de RFAI constituída pela sociedade no ano 2017.

No âmbito deste procedimento foi verificado que, parte do investimento realizado no ano 2017 foi simultaneamente considerado reinvestimento da reserva constituída para efeitos de DLRR, relativa aos lucros gerados no ano 2015.

Conforme informado pelo sujeito passivo, o restante reinvestimento teria sido concretizado no ano 2016.

Relativamente à dedução DLRR declarada no ano 2016, o sujeito passivo informou que o reinvestimento teria sido concretizado nos anos 2018 e 2019.

Nestes termos, para efeitos de verificação destes investimentos, por despacho de 08-10-2021, foi o sujeito passivo notificado, através do ofício n.º ...55, do alargamento da extensão do presente procedimento inspetivo aos anos 2018 e 2019, concretizado na abertura das ordens de serviço n.º ...78 e ...79.

Relativamente ao ano de 2016, este alargamento foi concretizado através da abertura do despacho n.º ...78, destinado à mera verificação do cumprimento das condições legais associadas ao investimento realizado nesse ano.

(...)

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1. EM SEDE DE IRC - IMPOSTO

III.1.1. Deduções à coleta - RFAI

III.1.1.1. Enquadramento do benefício fiscal

O Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), criado pela Lei n.º 10/2009, de 10 de março, que vigorou, com algumas alterações, entre 2009 e 2013, bem como o mesmo regime incluído no Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, constitui um regime de auxílio com finalidade regional aprovado nos termos do Regulamento (CE) n.º 800/2008, da Comissão, de 6 de Agosto (2007-2013), e do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014 (2014-2020), respetivamente.

Segundo o § 31 do preâmbulo do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014 (doravante designado por RGIC), os auxílios com finalidade regional promovem a coesão económica, social e territorial dos Estados-Membros e da União no seu conjunto. Os auxílios com finalidade regional destinam-se a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável.

O mesmo parágrafo acrescenta, ainda, que nas regiões que satisfazem as condições previstas na alínea a) do n.º 3 do artigo 107.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), onde se insere a zona de ... (local da sede e atividade do sujeito passivo), os auxílios com finalidade regional podem ser concedidos para promover:

a) criação de novos estabelecimentos;

b) extensão da capacidade de um estabelecimento existente;

c) diversificação da produção de um estabelecimento ou

d) mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.

Nos termos da Portaria nº 297/2015, de 21 de setembro e com o objetivo de assegurar a aplicação integral das regras previstas no Regulamento (UE) nº 651/2014, de 17 de junho de 2014 (RGIC), que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107º e 108º do Tratado da União Europeia, bem como das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para o período 2014-2020, o RFAI apenas é aplicável relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do § 49 do artigo 2º do RGIC.

Por sua vez, o n.º 49 do artigo 2.º do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, considera, no âmbito dos auxílios com finalidade regional, um investimento inicial:

a) Um investimento em ativos corpóreos e incorpóreas relacionado com:

i. criação de um novo estabelecimento,

ii. aumento da capacidade de um estabelecimento existente,

iii. diversificação da produção de um estabelecimento, para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou

iv. mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente;

Dando cumprimento ao espírito e ao estipulado nos regulamentos comunitários acima referidos, para além do enquadramento do investimento numa das tipologias acima referidas, é exigido às entidades o cumprimento cumulativo de várias condições, entre elas, quanto às aplicações relevantes que integram esse investimento inicial, e quanto à criação de postos de trabalho e a sua manutenção, conforme a alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro.

Quanto às aplicações relevantes, o n. º2 do artigo 22.º do CFI estabelece que o investimento tem de ser feito em ativos afetos à exploração da empresa, nomeadamente:

a) Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:

i. Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreires e areeiros em investimentos na indústria extrativa;

ii. Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;

iii. Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;

iv. Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;

v. Equipamentos sociais;

vi. Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa;

b) Ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

Por sua vez, o n.º 4 do artigo 22.º do CFI impõe mais um conjunto de condições cumulativas às entidades que pretendam beneficiar de tal regime:

a) Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;

b) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;

c) Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, alterado pelas Leis n.ºs 64-B/2011, de 30 de dezembro, e 2/2014, de 16 de janeiro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras previstas no artigo 31.º-B do Código do IRC;

d) Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer contribuições, impostos ou quotizações ou tenham o pagamento dos seus débitos devidamente assegurado;

e) Não sejam consideradas empresas em dificuldade nos termos da comunicação da Comissão Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 249, de 31 de julho de 2014;

f) Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c).

O benefício fiscal associado a este regime prevê a dedução até 50% da coleta do valor correspondente a 25% das aplicações relevantes, relativamente a investimento realizado até ao montante de 5.000.000,00 euros conforme dispõem as alíneas b) do n.º 2 e i) do n.º 1 da alínea a) do n.º 1, ambas do artigo 23.º do CFI (redacção anterior à Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro).

Contudo, nos termos do n.º 5 do artigo 23.º do CFI, os benefícios fiscais devem respeitar os limites máximos aplicáveis aos auxílios com finalidade regional em vigor na região na qual o investimento seja efetuado, nos termos do artigo 43.º do CFI, sendo que, caso os investimentos beneficiem de outros auxílios de Estado, o cálculo de tais limites deve ter em consideração o montante total dos auxílios, proveniente de todas as fontes (n.º 6 do artigo 23.º do CFI).

Conforme dispõe o artigo 24.º do CFI, o RFAI apenas é cumulável com a DLRR e, na medida em que, não sejam ultrapassados os limites máximos aplicáveis previstos no n.º 5 e 6 do artigo 23.º do CFI. Tais limites estão fixados pelo artigo 43.º do CFI, estabelecendo um máximo de 25% para a região centro, majorado em 10% pelo facto da A... se configurar como uma média empresa, perfazendo uma percentagem máxima de 35% aplicável aos auxílios ao investimento.

Ora, no período de 2017, o sujeito passivo reconheceu uma dotação no montante de € 83.894,76, o qual foi sendo utilizado ao longo dos períodos de 2017 a 2020, por deduções à coleta inscritas no campo 355, do quadro 10, da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC dos mesmos, conforme quadro seguinte:

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Por fim importa ainda referir que, nos termos do n.º 2 do artigo 14.º do EBF, os benefícios fiscais extinguem-se pela inobservância das condições impostas. Deste modo, sendo o RFAI um benefício fiscal automático (não depende de reconhecimento), despoletado pela declaração apresentada pelo sujeito passivo onde invoca o direito ao mesmo, o ónus da prova recai, nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT, sobre o mesmo, ficando este obrigado a cumprir todas as obrigações legalmente previstas e a prestar todos os esclarecimentos que a inspeção tributária venha a considerar necessários para a sua validação, sob pena da sua desconsideração.

As obrigações acessórias previstas no âmbito do presente regime, constam do artigo 25.º do CFI e dos artigos 7.º da Portaria 297/2015, de 21/09.

III.1.1.2. Enquadramento do investimento realizado pelo sujeito passivo

Nos termos do n.º 1 do artigo 25.º do CFI, a dedução deverá ser justificada por documento a integrar o processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º do CIRC, aqui designado dossier RFAI, que identifique discriminadamente as aplicações relevantes, o respetivo montante e outros elementos considerados relevantes.

O n.º 2 deste mesmo artigo estabelece que, nos exercícios da dedução, neste caso compreende 2017, 2018, 2019 e 2020, deverá constar documento que evidencie o cálculo do benefício fiscal, bem como, documentos comprovativos das condições de elegibilidade previstas no artigo 22.º.

Por sua vez, o artigo 7º da Portaria 297/2015, de 21/09, determina que, para efeitos do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 25º do CFI, os sujeitos passivos devem incluir no processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130º do Código do IRC, entre outros elementos, a descrição do investimento inicial, indicando designadamente os objetivos, áreas de intervenção e os principais investimentos, bem como o respectivo enquadramento numa das tipologias previstas. E nos termos do artigo 8.º da referida Portaria, devem reunir tais elementos até à data da entrega da declaração periódica de rendimentos a que se refere a alínea b) do n.º1 do artigo 117.º do Código do IRC referente ao ano a que os benefícios fiscais respeitam ou até ao termo do prazo legal para a respetiva entrega, consoante o que ocorra primeiro, devendo proceder à entrega daqueles elementos à Autoridade Tributária e Aduaneira sempre que notificados para o efeito.

Para o efeito, o sujeito passivo apresentou um relatório, acompanhado de um conjunto de faturas avulsas, onde, resumidamente, descreve o seguinte (anexo 2):

1. Introdução

"(...) Ao longo do ano 2016 foram sendo equacionadas as várias soluções possíveis, acabando a empresa por enveredar por uma estratégia de profunda especialização em produtos técnicos destinados a nichos de mercado, altamente exigentes e por sinal, claramente identificados e conhecidos da empresa, como sendo botas técnicas (. . .).

Toda a nova estratégia e respetivo plano de investimento foi equacionado e programado com o propósito de incrementar e aumentar a capacidade produtiva da empresa relativamente aos referidos produtos técnicos.

Todas as medidas tomadas foram projetadas para os diferentes setores da empresa.

Ao longo do ano 2017, a implementação da nova estratégia implicou então o início de uma série de investimentos, nomeadamente na conceção e industrialização, na linha de produção, bem como nas instalações fabris."

2. Objetivos e áreas e intervenção

(....) Assim, o principal objetivo do presente investimento consiste no aumento da capacidade da empresa ao nível da produção dos referidos produtos técnicos, cada vez mais procurados.

O investimento deveria permitir aumentar a capacidade da sociedade na produção e produtos muito específicos, destinados a mercados muito exigentes, nomeadamente ao nível da qualidade e dos prazos de entrega, dotando-a assim dos recursos necessários para dar resposta a essas exigências.

Atendendo à estratégia definida, com vista a alcançar estes objetivos, o presente investimento teve como área de intervenção as linhas produtivas, desde a secção do corte até ao acabamento, com particular incidência na secção de montagem, atendendo a que se trata de uma secção especialmente crítica para a produção de um produto com a qualidade técnica exigida.

Para além disso, foi também realizado investimento na criação de instalações fabris adicionais, para a produção dos produtos técnicos, bem como para o armazenamento das matérias-primas necessárias para abastecer linhas de produção com maior capacidade."

3. Principais investimentos

O sujeito passivo apresenta um mapa, onde discrimina os seguintes investimentos:

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4. Tipologia de investimento

A Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, que regulamenta a aplicação o RFAI e da DLRR, estabelece no artigo 2.º, n.º 2, al. d), que, "os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente."

O sujeito passivo classificou o investimento realizado da seguinte forma:

"Assim, o investimento relativo à aquisição e adaptação do novo edifício industrial enquadra-se na criação de um novo estabelecimento. Adicionalmente, todo o investimento relevante enquadra-se na tipologia de aumento da capacidade..."

Um estabelecimento corresponde a um local onde se exercem atividades económicas, pelo que, é consensual o significado de "criação de um novo estabelecimento" como sendo um estabelecimento adicional, mas distinto do já existente, até por comparação com as restantes tipologias previstas para o investimento inicial.

E- designadamente, a que se refere ao aumento ou extensão da capacidade de um estabelecimento já existente.

Esta terminologia não se circunscreve a este regime de benefícios fiscais, sendo habitualmente suscitada para efeitos de, entre outros, preenchimento da declaração anual de informação contabilística e fiscal -IES, prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 117.º e 121.º do CIRC. No campo 4 do Quadro 04 da Folha de Rosto da sua declaração IES de 2017 e de todos os períodos de tributação posteriores, indicou possuir apenas 1 (UM) estabelecimento:

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A respeito da também indicada tipologia de aumento da capacidade instalada, o sujeito passivo refere:

"O investimento deveria permitir aumentar a capacidade da sociedade na produção de produtos muito específicos, destinados a mercados muito exigentes, nomeadamente ao nível da qualidade e dos prazos de entrega, dotando-a assim dos recursos necessários para dar resposta a essas exigências."

Como é evidente, não basta ao sujeito passivo dizer que o investimento aumentou a capacidade de produção, impõe-se que seja feita a demonstração da capacidade instalada antes e após projeto. Manifestamente, tal não ficou demonstrado, nem através do relatório elaborado pelo sujeito passivo, nem através da análise ao investimento que exporemos de seguida.

Além disso, já no âmbito da ação inspetiva externa realizada aos períodos de tributação de 2010 e 2011 (a coberto da ...28), entre outras, foi verificado que a empresa se dedicava à fabricação de calçado especializado nas áreas da segurança, outdoor, caça, equitação e calçado hidrofugado, pelo que, a estratégia de especialização em produtos técnicos que alega ter implementado ao longo de 2017, nada tem de novo face à estratégia que vinha sendo já seguida.

O quadro seguinte indica o montante do investimento realizado imputado a cada uma das tipologias.

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III.1.1.3. Não elegibilidade do investimento

Para efeitos de análise das aplicações consideradas relevantes, agruparemos o investimento pelas seguintes áreas:

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Antes de entrarmos propriamente na análise dos investimentos incluídos em cada um destes grupos, relembraremos o enquadramento deste benefício fiscal. O n.º 2 do artigo 1.º do CFI começa por estabelecer que o RFAI constitui um regime de auxílio com finalidade regional aprovado nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC.

Para efeitos do RFAI, consideram-se aplicações relevantes os investimentos em ativos fixos tangíveis (AFT) adquiridos em estado de novo, desde que afetos à exploração da empresa, e em ativos intangíveis (AI), constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nas condições previstas no n.º 2 do artigo 22.º do CFI, sempre dependentes do prévio e correto enquadramento no âmbito do conceito de "investimento inicial", tal como definido na alínea d) do n.º 2 dos artigos 2º e artigo 3.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, em concordância expressa com a alínea a) do § 49 do artigo 2.º do RGIC.

Assim, determina o n.º 3 do artigo 14.º do RGIC, que os auxílios regionais ao investimento só podem ser concedidos para um investimento inicial, na aceção do § 49, ou para um investimento inicial a favor de uma nova atividade económica, nos termos do § 51, ambos do seu artigo 2.º.

Fomos sublinhando a expressão "investimento inicial" porque a mesma tem extrema importância para efeitos de enquadramento do investimento elegível em termos de RFAI: este conceito de "investimento inicial" tem que ser considerado como o resultado de uma estratégia global de expansão ou de modernização, enquadrado, relativamente ao seu contributo, para:

- No caso da expansão, a criação ou aumento da capacidade do estabelecimento já existente, através da criação de um novo estabelecimento, aumento da capacidade do estabelecimento já existente ou diversificação da produção (produtos não fabricados anteriormente):

- No caso da modernização, a alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.

Neste sentido, uma "aquisição isolada" de ativos não consubstancia um "investimento inicial", logo, não é elegível para efeitos de RFAI.

Portanto, antes de qualquer análise casuística sobre a elegibilidade das aplicações consideradas relevantes pelos sujeitos passivos, importa realçar que, apenas serão aceites aquelas que, indubitavelmente, possam ter enquadramento no âmbito de um projeto de investimento inicial (nexo causal entre a estratégia de redimensionamento definida e as necessidades de investimento), direcionado para uma efetiva reestruturação da instalação fabril através de uma das quatro tipologias previstas. Ou seja, não basta aferir a exclusão (ou não), como aplicações relevantes, somente com base no disposto no n.º 2 do artigo 22.º CFI, impõe-se a verificação prévia de um nexo de causalidade entre os ativos considerados elegíveis e o objetivo estratégico do projeto e sua coerência com a tipologia de investimento inicial invocada pelo sujeito passivo.

De facto, a palavra inicial (em investimento inicial) não é meramente figurativa. Um investimento inicial é um investimento adicional, novo. Novo, não no sentido de adquirido no estado de novo (o que também se exige) mas, no sentido de investimento de raiz, necessariamente distinto e incremental em relação ao já existente.

Não é a manutenção das atividades que promove o crescimento, o desenvolvimento sustentável e a criação de emprego, mas sim o incremento dessas atividades ou a realização de atividades adicionais. O objetivo é incentivar um maior investimento ou atividade económica nas regiões mais desfavorecidas (investimento de expansão, aumento, ampliação), e não a mera manutenção ou substituição do que já existe, conforme resulta claramente do § 31 do preâmbulo do Regulamento nº 651/2014 da Comissão (RGIC):

"(...) os auxílios com finalidade regional promovem a coesão económica, social e territorial dos Estados-Membros e da União no seu conjunto. Os auxílios com finalidade regional destinam-se a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável. (...)" (negrito nosso).

A este propósito, os parágrafos 60 e 62 das orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, publicadas no jornal oficial a união europeia em 23-07-2013, definem o seguinte:

60. Os auxílios com finalidade regional só podem ser considerados compatíveis com o mercado interno se tiverem um efeito de incentivo. Apenas existe um efeito de incentivo quando o auxílio altera o comportamento de uma empresa de um modo que a leve a exercer uma atividade adicional que contribui para o desenvolvimento de uma região, atividade que não realizaria na ausência do auxílio ou que realizaria apenas de forma limitada ou diferente ou num outro local. Os auxílios não devem subvencionar os custos de uma atividade que uma empresa teria, em todo o caso, suportado nem compensar o risco comercial normal de uma atividade económica.

62. Se o auxílio não alterar o comportamento do beneficiário incentivando investimentos (adicionais) na região em causa, pode considerar-se que o mesmo investimento teria sido nela realizado, mesmo na ausência do auxílio. Esse auxílio carece de efeito de incentivo para alcançar o objetivo regional e não pode ser aprovado como compatível com o mercado interno."

Isto para dizer que, o "normal" e expectável investimento contínuo em ativos exigido para a manutenção do funcionamento de uma instalação industrial desta natureza e dimensão, associado ao desenvolvimento da atividade da empresa nos moldes em que vinha sendo exercida, quer substituindo os obsoletos, quer adquirindo ativos isolados ou complementando e tornando mais eficientes os que existem, não cabe na definição de investimento inicial, por incompatibilidade com o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

De facto, os auxílios com finalidade regional são dirigidos ao investimento incremental, à expansão dos estabelecimentos e das atividades económicas, pelo que, tem que haver uma separação entre um projeto integrado que se enquadre numa das tipologias de investimento inicial, com objetivos e área de intervenção concretamente definidos, e os constantes investimentos de substituição e manutenção exigidos pelo normal funcionamento da instalação industrial pré-existente.

Conforme resulta do que acaba de se expor, e bem assim, nos anteriores pontos III.1.1.1. e III.1.1.2., tem que se considerar, desde logo, incumprido o requisito que exige uma identificação clara e inequívoca do investimento realizado, designadamente e para além da identificação dos ativos que constituem o projeto de investimento, os seus objetivos concretos e a demonstração do enquadramento numa das tipologias de investimento inicial, que é fundamental e, obviamente, deveria anteceder a dedução à coleta do respectivo benefício fiscal, o que não aconteceu (artigo 25º do CFI e artigo 7º da Portaria 297/2015).

Não basta elencar objetivos genéricos e discriminar investimentos "avulso" por respeitarem a intervenções pontuais na instalação industrial pré-existente. Impõe-se a identificação de um projeto/investimento integrado e agregador, com objetivos e área de intervenção concretamente definidos, de forma a que seja justificado, entre outros, o seu enquadramento numa das tipologias abrangidas pelo conceito de investimento inicial, e os postos de trabalho proporcionados diretamente pelo investimento realizado. E, recorde-se, esta condição não se encontra cumprida.

De facto, o que foi encontrado no dossier relativo ao investimento e ao benefício fiscal do RFAI limita-se a meras listagens das aquisições de bens de investimento consideradas elegíveis para efeitos de quantificação deste benefício fiscal, sem qualquer identificação e justificação de um projeto de investimento integrado e agregador dos itens considerados, com objetivos e áreas de intervenção concretamente definidos, de forma a que seja justificado, entre outros, o seu enquadramento numa das tipologias abrangidas pelo conceito de investimento inicial.

O critério seguido pelo sujeito passivo acaba por se apresentar, de forma evidente, como um "varrimento" de praticamente todas as aquisições de AFT efetuadas neste período para efeito do RFAI (excluindo a aquisição do edifício, em estado de usado), conforme demostra o quadro seguinte.

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De igual modo, na visita efetuada às instalações, realizada para efeitos de verificação física dos ativos em que se concretizou o investimento, foi possível observar que tais bens se encontram disseminados por toda a instalação industrial, não se identificado um elemento agregador entre todos eles, que os interrelacione no sentido de constituírem um investimento inicial, distinto e incremental em relação ao pré-existente, consubstanciando investimentos correntes, conforme se passa a demonstrar através da análise de cada uma das aplicações consideradas relevantes.

III.1.1.3.1. Edifício

Relativamente à tipologia "criação de um novo estabelecimento", o sujeito passivo apresentou um conjunto de faturas, que se referem essencialmente a obras de remodelação do edifício designado por "N ...4", inscrito na matriz urbana sob o art.º n.º ...37, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira, sob o n.º ...00. Este edifício foi adquirido em 13 de fevereiro de 2017, por € 500.000,00 (a que acresceu IMT de € 32.500,00 e IS de € 4.000,00), no estado de usado, e encontra-se localizado em ... às instalações principais da sociedade.

O mapa seguinte compila o conjunto de faturas apresentadas pelo sujeito passivo, de acordo com o respectivo registo contabilístico, apresentando uma descrição sumária dos bens e serviços adquiridos e que foram imputados a obras no referido edifício.

(...)

Conforme inscrito no documento que integra o dossier fiscal, estas despesas serviram para a adaptação do edifício industrial adquirido, "com vista à produção de calçado técnico e armazenagem de matérias-primas específicas. Este investimento revela-se importante para dotara empresa de instalações fabris que permitam acompanhar o processo de crescimento e de aumento da capacidade, quer ao nível da linha produtiva quer do armazém de matérias-primas."

Sobre este investimento colocam-se as seguintes condicionantes que inviabilizam a sua aceitação:

Conforme prevê a al. a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI, só são elegíveis para efeitos de RFAI os ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo. Assim, relativamente à aquisição do edifício, o sujeito passivo procedeu corretamente quando não considerou esta aquisição para efeitos de RFAI, vejamos então se as obras de remodelação do edifício o poderão ser.

A maioria das faturas aqui listadas descrevem apenas reparações e substituições realizadas num ativo já existente (o edifício). Ora, se o regime previsto para a usufruição deste benefício fiscal não permite a consideração de edifícios que não sejam adquiridos em estado novo, não fará qualquer sentido que sejam aceites as obras de melhoria e requalificação do mesmo, quando estas se reduzem a melhoria e substituição de materiais, sem que se verifique qualquer alteração estrutural do edifício que permita classificar o investimento como inicial e incremental.

Estamos aqui perante um investimento que se cinge à melhoria de um edifício, com a necessária reposição e substituição de materiais, que não cabe no conceito de investimento inicial.

A este propósito se pronunciou a ficha doutrinária processo ...82, PIV ...69, sancionado por despacho de 25 de novembro de 2020, da Subdiretora-Geral do IR, onde estava em causa aferir a elegibilidade, ou não, em sede de RFAI, da parte do investimento relativa à substituição de chapas na cobertura e revestimento de um pavilhão industrial (que se encontrava em construção), motivada por um incêndio. A apreciação deste caso concluiu que "estando em causa um investimento relativo à substituição da parte do pavilhão que ficou danificada, o mesmo traduz-se num mero investimento de substituição e não numa adição e, como tal, não pode ser considerado elegível para efeitos de cálculo do valor do crédito fiscal RFAI."

Mas mesmo que assim não fosse, outra condicionante se coloca sobre este investimento.

Em 21 de julho de 2021 foi notificado o sujeito passivo para apresentar todos os contratos e respetivos anexos, que incidiram sobre o imóvel sito na zona ... de ..., Rua ..., ..., inscrito na matriz sob o n.º ...37, em vigor nos anos 2017 a 2021.

O sujeito passivo respondeu "Não foi celebrado qualquer outro contrato. O contrato em posse da AT, é o que está em vigor."

O contrato que a AT possui foi disponibilizado no âmbito de outra ação inspetiva realizada no ano 2017, para efeitos de apreciação do reembolso de IVA solicitado pelo sujeito passivo (anexo 4). É um contrato de cedência de utilização do prédio pela A... SA, à B... Lda, NIF ...51, celebrado em ../../2017, com efeitos a 1 de setembro de 2017. Neste contrato a A... cede a utilização dos espaços existentes no edifício e respetivos equipamentos à B... conforme planta anexa ao contrato e do qual é parte integrante, suportando todos os gastos com eletricidade, gás e água, prestando simultaneamente outros serviços conexos com a sua utilização e fruição, nomeadamente a gestão das instalações, serviços de limpeza e manutenção exterior, mediante o pagamento de uma remuneração mensal.

Em visita realizada ao local no dia 22 de julho de 2021, previamente agendada com o sujeito passivo, verificamos que o edifício está dividido em três secções: uma dedicada a armazenagem; outra à produção; outra a escritórios. A secção afeta a escritórios encontrava-se sem qualquer ocupação humana ou material. A secção do armazém encontrava-se ocupada com bens propriedade da A... e da B.... A secção de produção, dedicada essencialmente à costura, estava ocupada com pessoal e equipamentos da B... e, cumulativamente, estavam presentes 2 funcionários da A... afetos a uma pequena secção de corte.

Nos termos do n.º 2 do artigo 22.º do CFI, "Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:"

"a) Investimento em ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:

(.../...)

ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades administrativas: (...)"(nosso sublinhado).

Atendendo à referida disposição legal, verifica-se, desde logo que, o imóvel em questão, encontra-se indevidamente reconhecido como Ativo Fixo Tangível, uma vez que, tendo em conta a utilização que é dada à maior parte da sua área, deveria ser considerado uma Propriedade de Investimento. Com efeito, de acordo com a NCRF 11, § 5, uma propriedade de investimento é a propriedade (terreno ou um edifício, ou parte de um edifício, ou ambos) detida pelo proprietário ou pelo locatário numa locação financeira para obter rendas ou para valorização do capital (ou ambas). Note-se que a empresa adota o conjunto das Normas Contabilísticas e de Relato Financeiro (NCRF's), que integram o quadro das disposições em vigor em Portugal introduzido pelo Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de julho, que aprova o SNC.

Assim sendo, a elegibilidade das obras efetuadas no referido imóvel encontra-se, desde logo, afastada porque:

- Não se trata de investimento em Ativo Fixo Tangível, mas em Propriedade de Investimento, quanto à parte locada à B... incumprindo assim a alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI;

- Pelo motivo referido, não pode considerar-se que a contabilidade se encontra regularmente organizada de acordo com a normalização contabilística em vigor, designadamente, pelo reconhecimento de bens de investimento sem ter em conta, quer o fim a que se destinam, quer os critérios de reconhecimento que especificamente se lhes aplicam (neste caso, Propriedades de Investimento e não AFT), sendo que, tais bens foram considerados elegíveis para efeito de RFAI, incumprindo a alínea a) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI;

- Estando a maior parte do imóvel locada a terceiros, não se encontra afeto às instalações fabris nem à exploração corrente do aqui sujeito passivo, cuja atividade é fabricação de calçado e não o arrendamento de imóveis através do qual obtém um rendimento suplementar, que de resto, sempre seria uma atividade excluída do âmbito do RFAI, dado o caráter setorial deste incentivo fiscal, de acordo o artigo 2.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro. A outra parte destina-se a armazém, quer do sujeito passivo, quer da B... pelo que, não sendo instalações fabris, as obras aí realizadas encontram-se também expressamente excluídas do regime, conforme subalínea ii) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI;

- Ainda que assim não fosse, as várias faturas referentes ao investimento não discriminam áreas afetas às diferentes utilizações dadas ao edifício, nem o sujeito passivo efetuou essa necessária separação, sendo completamente inviável saber quais os montantes de investimento relativos a cada zona do edifício no sentido de aferir qual o investimento realizado afeto à exploração corrente da A... e qual o investimento afeto, via arrendamento, à exploração da B...;

- Efetivamente, encontrando-se o edifício, mesmo que parcialmente, afeto à atividade de uma outra sociedade, verifica-se que parte do investimento realizado (não identificável) não se encontra afeto à exploração corrente da empresa. Assim, tendo o sujeito passivo procedido à aplicação do benefício fiscal, de forma generalizada a todas as obras realizadas no imóvel adquirido, independentemente de cumprir ou não os pressupostos exigidos pela lei, e dada a sua excecionalidade (art.º 2.º do EBF) e o especial dever de fundamentação por parte de quem os utiliza, não poderá ser aceite a elegibilidade da totalidade dos investimentos realizados no Edifício ... para efeitos de RFAI.

Por fim, o investimento no edifício não cumpre o enquadramento na tipologia de "novo estabelecimento" indicada pelo sujeito passivo e prevista na al. d) do n.º 2 do art.º 2.º da Portaria 297/2015, de 21/09, de harmonia com o RGIC, na medida em que não é criada uma atividade independente. Apesar de se tratar de um edifício distinto do edifício-sede onde o sujeito passivo desenvolve a sua atividade, tal edifício é apenas parcialmente utilizado e de forma complementar em relação ao edifício principal, aí funcionando sobretudo um armazém.

Além disso, o investimento cinge-se a obras de reparação de um edifício usado, desacompanhado de investimento produtivo, pelo que, como é bom de ver, nunca poderia conduzir à criação de um novo estabelecimento nem sequer ao aumento ou extensão da capacidade instalada, por falta de potencial para, de uma forma ou de outra, incrementar a atividade desenvolvida (mais produção) e a criação de emprego.

Conforme referido pelo próprio sujeito passivo todo o investimento realizado em 2017 contribuiu, apenas, para a criação de um posto de trabalho, o de diretor técnico, não se prevendo como uma empresa consegue criar uma nova atividade independente apenas com um diretor técnico. Ou seja, o edifício foi efetivamente ocupado com funcionários, mas de outra empresa, a B... bem como, com antigos funcionários da A..., consubstanciando apenas uma deslocalização destes últimos. E tanto assim continuou que, conforme análise vertida no ponto III.1.1.4., nos anos 2018 e 2020, a A... regista uma redução efetiva do número total de funcionários.

Pelos motivos expostos, a dotação de RFAI constituída com base no investimento realizado no Edifício ..." no montante de € 173.198,88, deverá ser desconsiderada.

III.1.1.3.2. Máquinas

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Relativamente aos "novos equipamentos e ferramentas", o sujeito passivo justifica a elegibilidade do investimento no âmbito do RFAI da seguinte forma:

"Novos equipamentos e ferramentas para as diversas secções da área produtiva de modo que todas passassem a ter maior capacidade de produção dos produtos técnicos, procurando evitar a existência de situações de estrangulamento que pudessem comprometera capacidade global da fábrica e o compromisso de fornecer ao mercado um produto distinto, com qualidade técnica, no prazo acordado e nas quantidades necessárias."

Ou seja, é o próprio sujeito passivo que, ao indicar o destino dos equipamentos em causa, os afasta do conceito de investimento inicial.

O sistema robotizado de cardagem permite a automatização de uma parte do processo produtivo do calçado que antes era executada de forma menos automatizada, adquirindo a empresa, eventualmente, ganhos de eficiência produtiva. Este ganho de eficiência é concretizado através da redução da componente humana no processo produtivo, logo, com a inerente redução de incorporação de mão de obra.

Conforme informado pelo sujeito passivo na visita às instalações fabris, a máquina Sofione "dá calor para ajudar a colar as peles", ação que, anteriormente, era feita de forma manual.

Quanto à máquina de costura, verifica-se que esta foi adquirida na sequência da alienação, no mesmo ano, de duas máquinas de costura PFAFF, conforme inscrito no respetivo mapa de mais menos-valias, modelo 31 (anexo 5). Estamos assim perante um equipamento de substituição. E tanto assim é que o projeto não gera a contratação de uma gaspeadeira adicional, antes, um diretor técnico. O grupo de lâminas é uma componente de uma máquina de digitalização e corte de peles, marca ..., já existente, não se configurando como um investimento inicial, incremental, potenciador do aumento da capacidade de produção, nem criador qualquer posto de trabalho.

Assim, tendo em consideração que para além da máquina de costura, que visou substituir máquinas antigas, e do grupo de lâminas, que é uma componente de uma máquina, o sujeito passivo apenas adquiriu a célula robotizada de cardagem, a máquina de rebater e o sofione, manifestamente não foi criada qualquer linha de produção adicional, por conseguinte, não se concebe como poderão estes equipamentos, por si só, aumentar a capacidade de produção do estabelecimento. Ainda mais se atendermos a que, nos anos 2017 e 2018, a A... registou uma diminuição no montante das vendas declaradas.

Com efeito, conforme é referido pelo próprio sujeito passivo e foi possível confirmar aquando da visita às instalações fabris para efeito de verificação física do investimento realizado, os novos equipamentos e ferramentas foram distribuídos pelas diversas secções da área produtiva, sendo de utilização generalizada no âmbito da atividade desenvolvida, sem qualquer associação com um investimento de expansão dessa atividade. Trata-se sobretudo de ferramentas e equipamentos periféricos, que por si só, seriam manifestamente insuficientes para produzir o que quer que seja, pelo que, nunca poderiam sustentar um incremento visível da atividade (maior capacidade de produção), quando, muito, incrementes marginais derivados de maior eficiência e aumento de produtividade.

Ora, este benefício fiscal pretende apenas incentivar o investimento adicional que seja, simultaneamente, incremental em relação ao investimento já existente, incremental em termos de capacidade instalada e incremental ainda em termos de postos de trabalho criados. Por conseguinte, os investimentos que não satisfaçam estas condições cumulativas, encontram-se excluídos do RFAI. É o que acontece com esta máquina de costura, por se configurar como um equipamento de substituição.

Efetivamente, investimento inicial é precisamente o oposto de investimento de reposição ou se substituição. De facto, enquanto que o investimento de substituição visa substituir equipamentos usados ou obsoletos por equipamentos novos com características semelhantes, ainda que melhorados (é um investimento de manutenção), um investimento inicial é um investimento adicional, de raiz, necessariamente distinto e incremental em relação ao já existente, exigindo um conjunto de ativos que, de forma funcionalmente integrada e interrelacionada, permita uma efetiva e visível expansão da atividade instalada, isto é, permita um "salto produtivo" que coloque a entidade num nível superior (reestruturação ou redimensionamento da instalação fabril, visando a sua expansão).

Não é a manutenção das atividades que promove o crescimento, o desenvolvimento sustentável e a criação de emprego, é o incremento dessas atividades através da realização de atividades adicionais. O objetivo é incentivar um maior investimento ou atividade económica nas regiões mais desfavorecidas (investimento de expansão, aumento, ampliação, desenvolvimento), e não a mera substituição ou complemento do que já existe, conforme resulta claramente do parágrafo 31 do preambulo do Regulamento 651/2014 da Comissão (RGIC).

Assim, por estarmos perante equipamentos de substituição (máquina de costura), ferramentas e equipamentos periféricos, e ainda, por não ficar demonstrado de que forma este investimento permitiu o aumento da capacidade de produção instalada, o montante de € 84.170,50 não poderá ser considerado aplicação relevante para efeitos de RFAI.

III.1.1.3.3. Moldes

Para efeitos de dedução deste benefício fiscal o sujeito passivo incluiu os seguintes investimentos em moldes:

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No que respeita a este investimento o sujeito passivo expõe o seguinte:

"... importa referir que, para a produção o calçado técnico, não se encontram disponíveis no mercado, solas, aplicações e proteções com as características técnicas necessárias, pelo que a empresa teve que efetuar novos investimentos em ferramentas específicas, que são imprescindíveis para a produção destas matérias-primas."

Antes de mais importa referir que, conforme inscrição aposta nos respetivos documentos, tais como, "Reparação moldes ..." e "Reutilizar o molde ... para a placa ..., algumas faturas não correspondem à aquisição de qualquer equipamento em estado novo, antes ao serviço correspondente à reparação para reutilização e adaptação de moldes antigos. Consequentemente, afastados da elegibilidade para efeitos de RFAI, nos termos da al. a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.

Mas mesmo que assim não fosse, e apesar da justificação apresentada pelo sujeito passivo, a aquisição de moldes para solas e outros componentes da fabricação do calçado, não poderá ser aceite como investimento inicial para efeitos de RFAI, na medida em que estamos perante a aquisição de meras ferramentas periféricas, diretamente associadas à produção de cada coleção de calcado, o que, naturalmente, sofre alterações em cada ciclo produtivo, de acordo com as modificações que sofre cada coleção, consubstanciando apenas uma ferramenta de uso corrente e em constante reparação, adaptação e substituição por parte da empresa.

Efetivamente, está-se perante meros componentes de ativos fixos tangíveis que, de forma isolada, não podem ser usados na produção de bens.

A este respeito, a ficha doutrinária da AT resultante da Informação Vinculativa Processo ...41, PIV n.º ...71, sancionado por Despacho, de 12 de dezembro de 2018, da Diretora de Serviços do IRC, conclui que:

"o investimento na aquisição dos "moldes" necessários à realização da atividade de exploração corrente da requerente, nos mesmos termos em que já vinha sendo exercida, não integra o conceito de investimento inicial e como tal, não poderá ser elegível para efeitos do benefício fiscal previstos nos art.º 23.ºdo CFI"

vide: http://info. portaldasfinancas. gov. pt/pt/informacao_fiscaIlinformações_vncuI ativas/rendimentolcirc/Documents/PIV_14 471_2018_003941_DSIRC.pdf.

Pelo exposto, o investimento realizado em moldes não integra o conceito de investimento inicial previsto na al. d) do n.º 2 do artigo 2.º do CFI.

Por fim, o facto mais relevante que excluiu por completo estas despesas do âmbito do RAFAI, é que nenhum destes moldes se encontra nas instalações do sujeito passivo. Aliás, o sujeito passivo nem sequer é detentor de máquinas de injeção que permitam utilizar estes moldes. Conforme informado pelo sujeito passivo, estas ferramentas, desde a sua aquisição, estiveram a laborar em instalações de outros operadores económicos (fornecedores), portanto, externamente à sociedade. Para comprová-lo, o sujeito passivo apresentou os contratos celebrados com as empresas onde os moldes se encontram a laborar (anexo 6).

A este respeito o n.º 2 do artigo 22.º do CFI é claro ao impor como condição, que o investimento realizado seja afeto à exploração da empresa. E de acordo com o n.º 4 do mesmo artigo, alínea c):

"c) Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento..."

Estes moldes, apesar de serem propriedade da A..., estão em funcionamento noutras empresas externas, que os utilizam na sua atividade produtiva. São essas empresas que produzem as solas (por injeção de borracha ou outras matérias plásticas), sendo que, para efeitos de RFAI, releva investimento que crie ou aumente a capacidade instalada do estabelecimento da empresa que deduz o benefício fiscal, capacidade essa, que é medida pelo volume de produtos que consegue produzir. Ora, no que respeita a solas, a A... limita-se a adquiri-las aos seus fornecedores, tal como faz com qualquer outra matéria-prima, e que incorpora, de igual modo, nos seus produtos fabricados. Por conseguinte, não se encontram afetos à exploração da A..., não podendo contribuir para o aumento da capacidade produtiva da mesma, nem tão pouco promover a criação de postos de trabalho na A....

Pelas razões expostas, as aquisições e trabalhos realizados em moldes, no montante de € 59.254, 97, não serão aceites como aplicações relevantes para o RFAI.

III. 1.1.3.4. Equipamento Informático

Nesta rúbrica temos os seguintes investimentos:

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Relativamente a este grupo de investimentos o sujeito passivo apresentou o seguinte enquadramento:

"permitiram acompanhar e gerir todo o processo produtivo nas diferentes secções industriais da fábrica, os quais se revelam imprescindíveis para que seja alcançado o objetivo principal de aumento da capacidade, na medida em que permitem um melhor acompanhamento e gestão de todo o processo produtivo e monitorização da qualidade do calçado técnico."

Pela explicação dada pelo sujeito passivo, este investimento permite um melhor acompanhamento e gestão do processo produtivo. De todo o processo produtivo indistintamente, pelo que, ainda que tivesse sido, por exemplo, criada uma qualquer linha de produção adicional, que incrementasse efetivamente a capacidade de produção instalada (e não foi esse o caso), este investimento apenas parcialmente estaria afeto a esse investimento inicial, necessariamente distinto e incremental em relação ao pré-existente. Pelo que, sempre se exigiria ao sujeito passivo, a necessária distinção entre equipamento informático afeto à instalação industrial pré-existente, e equipamento informático afeto ao projeto de investimento considerado relevante no âmbito do RFAI. Mas para além de não existir qualquer critério de seleção ou de imputação de tais despesas ao investimento realizado, os equipamentos informáticos em causa apenas terão permitido a otimização das linhas já implementadas, não podendo associar-se a qualquer investimento produtivo incremental.

Relativamente à aquisição do antivírus Kaspersky, e para além de possuir as mesmas vicissitudes referidas para os equipamentos informáticos a que se destina, está em causa um ativo intangível, pelo que, temos que atender ao preconizado na alínea b) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI, onde apenas se inclui os ativos intangíveis constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

Deste modo, os únicos gastos com intangíveis considerados elegíveis em sede de RFAI são as "despesas com transferência de tecnologia", as quais estão associadas a aquisições de propriedade intelectual e não à mera aquisição de software massificado no mercado tecnológico.

Relativamente ao investimento na aquisição da impressora digital a cores, conforme inscrito na descrição da fatura "Doc Impressora em substituição da ...02" e aposto manualmente "2º Equipamento", bem como evidenciado no mapa de mais-valias e menos-valias (anexos 2 e 5), esta foi adquirida para substituição de um equipamento anterior, por conseguinte, não configura aplicação relevante de um investimento inicial por configurar um investimento de substituição.

Conforme Informação Vinculativa, Processo n.º ...69 PIV ...79, com despacho de 28 de maio de 2020 (DSIRC), "para que o investimento efetuado em aplicações relevantes seja elegível, é necessário que integre o conceito de "investimento inicial", não se considerando como aplicação relevante a "aquisição isolada" de ativos que não integrem tal conceito e, ainda, não sendo elegível como aplicação relevante o investimento na "aquisição de equipamentos de substituição"".

Por conseguinte, este investimento em nada contribuiu para o invocado fim subjacente à tipologia de "aumento da capacidade de um estabelecimento existente", nem tão pouco contribui para a criação de postos de trabalho, na medida em que se configura, como a própria fatura indica, como um investimento de substituição.

Assim, pelo facto de o software adquirido não ser considerado uma aplicação relevante nos termos da al. b) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI, pela impressora ser um equipamento de substituição e, acima de tudo, por todo o investimento ser meramente periférico e complementar do já existente, sem aptidão para aumentar a capacidade instalada, não pode ser considerado investimento inicial, conforme definido na al. d) do n.º 2 da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, e al. a) do parágrafo 49 do art.º 2.º do RGIC, pelo que, não poderá ser elegível para efeitos de RFAI o montante de € 14.229,90.

III.1.1.3.5. Mobiliário

A A... considerou, para efeitos de RFAI, a aquisição de frentes de estantes em faia no montante de € 3.200,00.

Conforme verificado no local, esta fatura correspondeu à remodelação de estantes instaladas na sala de apoio ao gabinete do administrador, através da colocação de portas de correr em madeira, calhas em alumínio e pintura.

Nesta matéria o regime do RFAI é claro, excluindo das aplicações relevantes os investimentos em mobiliário e equipamentos sociais, conforme prevê o ponto v) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.

Não obstante, estamos perante uma aquisição direcionada para um fim que não está associado a qualquer investimento inicial no aumento da capacidade de produção.

Deste modo, por exclusão prevista ponto v) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI e por não integrar o conceito de investimento inicial previsto na al. d) do n.º 2 da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, e al. a) do parágrafo 49 do art.º 2.0 do RGIC, não poderá ser elegível para efeitos de RFAI o montante de € 3.200,00.

III.1.1.3.6. Material comunicação

Em 25-07-2015 a empresa adquiriu material de comunicação designado por "...", que integra uma ventoinha, duas bases, uma carta DSP e uma EADP4, no montante de € 1.524,75. Estamos manifestamente perante um investimento em diversos ativos isolados e desintegrados de qualquer projeto de investimento inicial", que não existe.

Tratando-se de uma aquisição isolada de um Kit telefónico não se antevê qualquer associação deste investimento com o aumento da capacidade de produção da empresa. A sua aquisição poderia ocorrer em qualquer momento da vida da empresa, não se inserindo em qualquer projeto de investimento inicial. São investimentos no funcionamento das atividades pré-existentes, não justificados nem integrados num projeto de investimento inicial de aumento da capacidade instalada.

Conforme Informação Vinculativa, Processo n.º ...69 PIV ...79, com despacho de 28 de maio de 2020 (DSIRC), "para que o investimento efetuado em aplicações relevantes seja elegível, é necessário que integre o conceito de "investimento inicial", não se considerando como aplicação relevante a "aquisição isolada" de ativos que não integrem tal conceito".

Acresce, o estabelecido na Informação Vinculativa, Processo n.º ...69 PIV ...79, com despacho de 28 de maio de 2020 (DSIRC): "não obstante os investimentos em causa terem como objetivo comum o aumento da rentabilidade da empresa, o aumento da produtividade, redução do desperdício e modernização da empresa, entre outros, não se inseriram numa estratégia global de investimento com a finalidade de atingir o fim subjacente às tipologias do investimento indicadas".

Pelo exposto, o investimento em referência enquadra-se no âmbito de uma necessidade de gestão corrente da empresa, não sendo indutor nem estando associado a um qualquer aumento de capacidade de produção, não podendo ser, por isso, elegível nos termos do RGIC.

III.1.1.3.7. Conclusão

• Tem que se considerar, desde logo, incumprido o requisito que exige uma identificação clara e inequívoca do investimento realizado, designadamente e para além da identificação dos ativos que constituem o projeto de investimento, os seus objetivos concretos e a demonstração do enquadramento numa das tipologias de investimento inicial, que é fundamental e, obviamente, deveria anteceder a dedução à coleta do respetivo benefício fiscal, o que não aconteceu (artigo 25º do CFI e artigo 7º da Portaria 297/2015).

• De facto, não basta elencar objetivos genéricos e discriminar investimentos "avulso", que respeitam apenas a intervenções pontuais na instalação industrial pré-existente. Impõe-se a identificação de um projeto/investimento integrado e agregador das aplicações consideradas relevantes, com objetivos e área de intervenção concretamente definidos, de forma a que seja justificado, entre outros, o seu enquadramento numa das tipologias abrangidas pelo conceito de investimento inicial, e os postos de trabalho proporcionados diretamente pelo investimento realizado. E, recorde-se, esta condição não se encontra cumprida.

• Os investimentos considerados elegíveis pelo SP não constituem investimento inicial, porquanto na sua maioria são substituições, reparações, meras melhorias e complementos de equipamentos já existentes, constituindo investimentos normais da atividade pré-existente e sem que se possa observar que em razão dos mesmos, se tenha verificado um aumento da capacidade de produção instalada (aumento da capacidade de produzir um maior volume de produtos e não aumento de eficiência na utilização da capacidade pré-existente);

• A maior parte dos bens de investimento adquiridos encontra-se até expressamente excluída do âmbito do RFAI (substituições, reparações, ativos em uso nas instalações/produção de terceiros, ativos de utilização generalizada por toda a atividade, etc), embora isso não tenha impedido o sujeito passivo de indevidamente, os considerar para efeito de potenciar a poupança fiscal em sede de IRC;

• O regime RFAI foi aqui claramente utilizado para subsidiar o funcionamento da empresa, nos moldes em que já o vinha fazendo, e não para compensar o risco subjacente a um salto produtivo, embora condicionado a esse concreto objetivo. São benefícios fiscais condicionados, aqueles em que a sua eficácia fica dependente da verificação de certos requisitos, que são a sua condição. Citando Alberto Xavier (in "Direito Fiscal, Manuais da FDL, Lisboa, 1974), "(...) os benefícios condicionados traduzem-se em subordinar o direito ao benefício a contrapartidas de interesse público na forma de deveres ou ónus impostos aos beneficiários";

• O RFAI é um benefício fiscal de natureza condicionada, subordinado ao aumento do investimento e emprego com vista ao crescimento da economia e à diminuição das assimetrias regionais. É este o objetivo que constitui a sua razão de ser, e fundamenta o quadro de direito comunitário que estabelece a matriz deste regime de incentivos fiscais;

• Não é, pois, o investimento na manutenção das atividades que tem potencial para gerar crescimento económico e emprego, mas o investimento na expansão dessas atividades, através de qualquer uma das formas ou tipologias que integram o conceito de investimento inicial;

• Condição que, no caso do sujeito passivo, não se verifica.

Finalmente, para que os investimentos sejam elegíveis para o benefício em causa, existe uma outra condição imprescindível, criação de postos de trabalho.

III.1.1.4. Condição da criação e postos de trabalho

No concerne ao requisito da criação de postos de trabalho e a sua manutenção, embora a solução adotada para efeito de quantificação dos benefícios fiscais no âmbito do RFAI (entre as soluções permitidas pelo nº 4 do artigo 14º do RGIC), tenha por base os custos do investimento elegível e não os custos salariais decorrentes da criação de emprego em virtude do investimento, a alínea f) do nº 4 do artigo 22º do CFI não deixa de exigir que o investimento proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento. E essa exigência é efetuada praticamente nos mesmos termos que resultam do nº 9 do artigo 14º do RGIC (Regulamento nº 651/2014 da Comissão), aplicável quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados, ou seja:

"a) O projeto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número aparente de postos de trabalho criados nesse período;

c) Cada posto de trabalho criado através do investimento deve ser mantido na zona em causa durante um período mínimo de cinco anos a contar da data em que a vaga foi preenchida, ou três anos no caso de PME."

Este "aumento líquido do número de trabalhadores", também definido no § 32 do artigo 2º do RGIC, corresponde ao conceito de "criação de postos de trabalho" ou "criação de emprego", de acordo com as Orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para 2014-2020 (OAR), publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, nº e 209, de 23 de julho de 2013:

"1.2 Definições

.../...

k) «Criação de emprego», um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, após deduzir os postos de trabalho eventualmente suprimidos durante o mesmo período do número aparente de postos de trabalho criados."

.../...

o) «Número de trabalhadores», o número de unidades de trabalho anuais (UTA), isto é, o número de assalariados a tempo inteiro durante um ano; os trabalhadores a tempo parcial ou os trabalhadores sazonais são considerados como frações de UTA;

Portanto, tal como resulta do quadro de direito europeu acima assinalado, a aferição da criação e manutenção dos postos de trabalho deve ser feita nos moldes já referidos, i.e., globalmente, pois só assim se pode afirmar que o investimento tenha sido indutor da criação de emprego, pressuposto que deve ser incremental (aumento líquido ou criação líquida).

Acerca da condição relativa à criação de postos de trabalho proporcionada pelo investimento relevante e da sua manutenção, face ao disposto na alínea f) o nº 4 do artigo 22º do CFI, a AT já se pronunciou no sentido de que, "apenas pode integrar o conceito de "criação de postos de trabalho" a admissão de trabalhadores através da celebração de contrato de trabalho sem termo (ou por tempo indeterminado), abrangendo a admissão de trabalhadores novos e de trabalhadores que já estivessem na empresa mas ao abrigo de um contrato com termo" (conforme § 1 da ficha doutrinária PIV n.º …18 -Processo ...00).

Determina ainda, atendendo ao disposto no RGIC e nas OAR, que a condição de "criação de postos de trabalho" se considera "cumprida quando, à data de 31 de dezembro (…) se verifique um aumento líquido do número de trabalhadores relativamente à média dos 12 meses precedentes" (conforme § 2), acrescentado que "pode acontecer com admissão de um único trabalhador" (conforme § 3).

Ora, a relevância atribuída ao vínculo contratual manifesta na Informação Vinculativa convocada, não resulta em si mesma, nem poderia, de qualquer exigência emanada das normas europeias em matéria de auxílios do Estado com finalidade regional, mas tão só da seleção da modalidade contratual, à luz da legislação laboral vigente em Portugal, que garanta que a admissão de um funcionário se destina a ocupar uma função específica diretamente criada pelo investimento e não à satisfação de necessidades temporárias da empresa.

Efetivamente, as normas não devem ser interpretadas de modo isolado, mas dentro de uma ordem jurídica (interpretação sistemática), de modo a que o significado da norma seja coerente com o seu conjunto, pelo que, a condição de criação de postos de trabalho proporcionada pelo investimento relevante (funções específicas e permanentemente necessárias para que o investimento funcione), não pode ser concretizada à custa de trabalhadores admitidos ao abrigo de contrato com termo, que, de acordo com o artigo 140º do Código do Trabalho, só pode ser celebrado para satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas mesmas necessidades.

Em síntese, a condição relativa à criação de postos de trabalho proporcionada pelo investimento relevante e à sua manutenção, face ao disposto na alínea f) o nº 4 do artigo 22º do CFI, tem que ser cumprida "à custa" de contratos de trabalho sem termo, e os postos de trabalho criados (criar é incrementar em relação ao existente) têm que garantir um acréscimo efetivo do número global de trabalhadores admitidos na empresa em determinado período, salvaguardando assim os valores subjacentes aos auxílios com finalidade regional, nos quais se inscreve o RFAI, designadamente, no §31 do preâmbulo do RGIC:

"Os auxílios com finalidade regional destinam-se a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável."

Quanto à condição de manutenção dos postos de trabalho, a Informação Vinculativa Processo n.º …53, PIV n.º …12, com Despacho de 2010-10-27, do Diretor-Geral, determina que a entidade "tem de manter os postos de trabalho criados nos termos anteriormente referidos" (conforme § 4).

Ora, se a condição de "criação de postos de trabalho" é aferida em função do número de trabalhadores a 31 de dezembro, face à média dos 12 meses anteriores, considera-se que a condição de "manutenção" seja também ela avaliada nos mesmos termos, como aponta a ficha doutrinária Processo n.º ...53 atrás citada.

Só assim existe evidência plena que o investimento realizado num determinado período foi, efetivamente, proporcionador de criação de postos de trabalho durante um período mínimo igual ao da manutenção dos bens alvo do investimento, pois pretende-se a criação de emprego sustentável e não de emprego momentâneo.

Relativamente à condição de manutenção, uma vez que a empresa A... se configura como uma PME, o período mínimo de manutenção do investimento e do nível de empregabilidade é de três anos, nos termos da alínea c) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.

A este respeito o sujeito passivo indica que:

"O investimento realizado proporcionou a criação do posto de trabalho de "Diretor Técnico" o qual foi preenchido com o recrutamento de um trabalhador altamente qualificado, conceituado especializado, que se revela importante no processo de materialização do investimento realizado para alcançar maior capacidade de produção dos produtos técnicos. Por conseguinte, a A... SA tem mais um posto de trabalho do que tinha em 31 de dezembro de 2016"

De forma a aferir as condições de criação e de manutenção da criação de postos de trabalho, e porque esta evidência não se encontrava espelhada no processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º do Código do IRC, em conformidade com o determinado pelos n.ºs 1 e 2 do artigo 25º e pelos n.º 1 e 2 do artigo 33.º, ambos do CFI, e artigo 7.º da Portaria n.º 297/2015, solicitou-se ao sujeito passivo a demostração do cumprimento da condição legal de criação de emprego.

Para o efeito o sujeito passivo apresentou dois mapas:

inicialmente, um, em formato pdf, conforme imagem infra:

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– posteriormente, outro, em formato excel, com listagem nominativa dos trabalhadores em funções no final de cada mês dos anos em questão, contendo o nome e NIF dos mesmos, data de admissão e de cessação de funções e tipo de contrato de trabalho. Este mapa, pela sua dimensão, não é transcrito para aqui, mas poderá ser consultado no anexo 3.

Verificando-se divergências entre os números apresentados pelo sujeito passivo nos dois mapas, em 20-09-2021 foi solicitado ao sujeito passivo o esclarecimento das divergências detetadas (anexo 7-7º pedido - Postos Trabalho - esclarecimento da análise).

Em resposta a este pedido de esclarecimento o sujeito passivo reconheceu alguns lapsos na informação prestada (anexo 7- Resposta ao 7 Pedido - Postos Trabalho - esclarecimento da análise), que depois de retificada, resultou na elaboração dos seguintes mapas resumo:

[IMAGEM]

Resumindo:

• Considerando o primeiro quadro apresentado pelo sujeito passivo, em formato pdf, em dezembro de 2017 a empresa detinha, tem termos matemáticos, mais 10,581 funcionários que a média dos doze meses anteriores;

• Considerando o quadro resultante da nossa análise, após retificação das incorreções reconhecidas pelo sujeito passivo, em dezembro de 2017 a empresa detinha, tem termos matemáticos, mais [0,83 funcionários (abrangidos por contrato sem termo) que a média dos doze meses anteriores, e mais [0,50 funcionários (incluindo todos) que a média dos doze meses anteriores;

Ou seja, em nenhuma circunstância o incremento consegue chegar à unidade.

A alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI exige "a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento".

Sendo o RFAI um auxílio com finalidade regional que prevê dotações anuais, a aferição da criação de postos de trabalho será feita por referência a 31 de dezembro em "comparação com a média dos 12 meses anteriores "(dezembro de n-1 a novembro de n) conforme comparativo previsto no ponto 32) do artigo 2.º e alínea a) do n.º 9 do artigo 14.º, ambos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 (RGIC):

"Aumento líquido do número de trabalhadores - o aumento líquido do número de trabalhadores no estabelecimento em causa em comparação com a média durante um determinado período de tempo"

"O projeto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número aparente de postos de trabalho criados nesse período"

(...)

e. Síntese

Resumindo, o investimento não proporcionou a criação de postos de trabalho e a sua manutenção porque:

1. No ano 2017 a sociedade não aumentou o numero de trabalhadores com contrato sem termo, já que, o aumento do número de trabalhadores nestas condições em dezembro de 2017 face à media dos 12 meses anteriores não chega sequer a uma unidade (nem um posto de trabalho criou);

2. No ano 2017 a sociedade também não aumentou o numero total de trabalhadores (contratos com e sem termo), já que, no contexto global, o aumento do número de trabalhadores nestas condições (dezembro de 2017 face à media dos 12 meses anteriores) também não atinge uma unidade;

3. No ano seguinte ao investimento (2018) a sociedade não mantém o nível de empregabilidade do ano anterior, quer no número de trabalhadores sem termo quer no número total de trabalhadores;

4. No ano 2020 (3 anos após o investimento) a sociedade volta a registar uma quebra do número de trabalhadores (quer considerando apenas os trabalhadores abrangidos por contrato sem termo quer considerando todos);

5. Os ativos adquiridos, de per si, não proporcionaram a criação de qualquer posto de trabalho adicional, conforme era de esperar, em resultado da análise vertida nos pontos III.1.1.2 e III.1.1.3;

6. Efetivamente, segundo o sujeito passivo, o investimento realizado apenas contribuiu para a contratação de um novo funcionário com o cargo de diretor técnico. Para além de não ter sido estabelecido nem demonstrado, o nexo de causalidade entre a realização dos investimentos e a referida contratação, à partida, tal função não é dissociável do estabelecimento como um todo, tal como não o é o investimento realizado. Pelo que, também por esta circunstância, fica confirmado que o investimento realizado não integra o conceito de investimento inicial na criação ou expansão da capacidade de produção, nem foi indutor da criação de postos de trabalho.

Deste modo, a dotação apurada pelo sujeito passivo em sede de RFAI do período de 2017 que corresponde a um investimento de € 335.579,00, terá de ser integralmente desqualificada para efeitos deste benefício fiscal, revelando-se ilegítima por incumprimento de mais um requisito essencial previsto no n.º 4 do artigo 22.º do CFI:

["D) Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c)"].

III.1.1.5. Resumo dos incumprimentos do regime RFAI

Resumindo, a globalidade do investimento relacionado pelo sujeito passivo em sede de RFAI não poderá ser aceite pelos seguintes motivos:

- Investimento inicial / Criação de um novo estabelecimento

Os investimentos em obras realizadas no edifício não consubstanciam a tipologia de "criação e um novo estabelecimento" por não configurar uma unidade produtiva autónoma. Com efeito, trata-se de meras reparações de edifício adquirido em estado de usado, afeto a armazém e a arrendamento a terceiros, sem enquadramento no conceito de investimento inicial.

- Afetação à exploração da empresa

Quer o edifício onde foram realizados os investimentos, quer os moldes adquiridos ou modificados, encontram-se afetos à atividade operacional de outras sociedades.

- Investimento inicial / Aumento da capacidade de produção

Para além de parte do investimento ser, manifestamente, investimento de substituição, ferramentas e equipamentos periféricos diversos de utilização transversal a toda a instalação, não foi demonstrado, relativamente a todo o investimento, o potencial aumento da capacidade produtiva da empresa, e pela análise realizada, não se lhe reconhece sequer aptidão para esse concreto efeito. Relembramos que o sujeito passivo apenas associou o investimento ao aumento da qualidade dos produtos técnicos produzidos e a redução dos prazos de entrega. É, claramente, investimento de manutenção.

- Ativos intangíveis

Para além do facto de não se encontrar integrado em nenhum projeto de investimento inicial, também não se qualifica como "despesa com transferência de tecnologia" o investimento em ativos intangíveis (antivírus Kaspersky e Office home), pelo que, não consubstanciam aplicações relevantes.

- Criação de postos de trabalho e sua manutenção

O investimento realizado não proporcionou a criação de postos de trabalho nem a sua manutenção pelos três períodos seguintes, quer considerando a totalidade dos funcionários, quer considerando apenas os funcionários ao abrigo de contrato sem termo.

Para além disso, a empresa registou uma diminuição do número de trabalhadores ao seu serviço, quer em termos globais quer apenas dos trabalhadores com contrato sem termo, nos anos 2018 e 2020.

Por fim, quer a aquisição dos novos equipamentos quer as obras realizadas no edifício não contribuíram, de per si, para a contratação de novos funcionários já que, conforme invocado pelo sujeito passivo, o investimento realizado apenas contribuiu para a contratação de um novo funcionário com o cargo de diretor técnico. Assim, não se consegue estabelecer, nem o sujeito passivo demonstrou, o nexo de causalidade entre a realização dos investimentos e a referida contratação, sendo que, uma tal função está normalmente associada à atividade como um todo e não apenas à que decorre do investimento realizado e considerado elegível.

III.1.1.6. Quantificação das correções

Nos termos do n.º 2 do artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na sua parte relativa aos princípios gerais, "os benefícios fiscais (...) caducam (...), quando condicionados, pela verificação dos pressupostos da respetiva condição resolutiva ou pela inobservância das obrigações impostas, imputável ao beneficiário".

Assim, a totalidade da dotação de RFAI constituída no período 2017, montante de € 83.894,76 é ilegítima, mostrando-se indevidas as deduções declaradas nos períodos 2017, 2018, 2019 e 2020, conforme exposto no mapa seguinte.

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Atendendo que o presente procedimento incide apenas sobre os anos 2017, 2018 e 2019, a correção à dedução declarada no ano 2020, sendo resultante de um ajustamento decorrente da correção da dotação do RFAI apurada no ano 2017, será concretizada através de procedimento posterior.

III.1.2. Deduções à coleta – DLRR

III.1.2.1. Enquadramento do benefício fiscal

A Dedução por Lucros Retidos e Reinvestidos (DLRR) encontra-se regulamentada pelos artigos 27.º a 34.º do Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, e constitui um regime de incentivos fiscais ao investimento em favor de micro, pequenas e médias empresas nos termos do RGIC [Regulamento (UE) n.º 65112014 da Comissão, de 16 de junho de 2014 (2014-2020)], conforme determina o artigo 27.º do CFI.

A regulamentação do regime da DLRR é efetuada, ainda, pela Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, por forma a assegurar a aplicação integral das regras previstas no RGIC.

O artigo 11.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, dispõe que "para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 30.º do Código Fiscal do Investimento, apenas são elegíveis as aplicações relevantes em ativos aí previstos que respeitem a um investimento inicial, tal como definido nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º da presente portaria", a qual remete para a alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, ou seja,

"investimentos relacionados com:

a) A criação de um novo estabelecimento,

b) O aumento da capacidade de um estabelecimento já existente,

c) A diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou

d) Uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente".

Segundo o artigo 28.º do CFI, podem beneficiar da DLRR os sujeitos passivos de IRC residentes em território português, bem como os sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável neste território, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, que preencham, cumulativamente, as seguintes condições:

a) Sejam micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003;

b) Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;

c) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;

d) Tenham a situação fiscal e contributiva regularizada.

Nos termos do n.º 1 do artigo 30.º do CFI (redação anterior à Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro), consideram-se aplicações relevantes, para efeitos do regime da DLRR, "os ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:

a) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiras e areeiros em projetos de indústria extrativa;

b) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afetos a atividades produtivas ou administrativas;

c) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, barcos de recreio e aeronaves de turismo;

d) Artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;

e) Ativos afetos a atividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do setor público."

Refira-se que, apenas com a Lei n.º 2/2020, de 31 de março (OE 2020), se passou a admitir como aplicações relevantes alguns ativos intangíveis (despesas com "transferência de tecnologia").

O benefício fiscal associado ao regime da DLRR prevê uma dedução à coleta do IRC de até 10% dos lucros retidos que sejam reinvestidos em aplicações relevantes nos termos do artigo 30.º do CFI, no prazo de dois anos, no caso da DLRR 2014 a DLRR 20171, contados a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos, conforme n.º 1 do artigo 29.º do CFI, até à concorrência de 50% da coleta IRC (n.º 4 do artigo 29.º do CFI).

Neste sentido, nos anos 2015 e 2016, o sujeito passivo procedeu à dedução à coleta dos montantes de € 54.115,18 e € 19.905,82, respetivamente, incluídos no campo 355 do quadro 10 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC.

O valor das reservas a constituir em contas do capital próprio será de € 541.151,80 e € 199.058,20, relativas aos resultados retidos gerados nos anos 2015 e 2016, respetivamente, sendo estes os montantes que terão de ser reinvestido até ao ano 2017 e 2019, respetivamente.

Segundo a alínea a) do artigo 34.º do CFI, a não concretização da totalidade do investimento nos termos previstos no artigo 30.º até ao termo do prazo previsto no n.º 1 do artigo 29.º implica a devolução do montante de imposto que deixou de ser liquidado na parte correspondente ao montante dos lucros não reinvestidos qual é adicionado ao montante de imposto a pagar relativo ao segundo período de tributação seguinte acrescido dos correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais.

Se para o investimento realizado no ano 2017, o sujeito apresentou um relatório para efeitos do disposto no 1 e 2 do artigo 25.º do CFI (RFAI), de nove páginas, embora se tenha limitado, praticamente, a identificar tipologia do investimento e o seu enquadramento, relativamente ao investimento realizado nos anos 2016, 2018 e 2019, o sujeito passivo apenas enviou os "mapas de auxílio controlo e quantificação ao RFAI e DLRR relações dos investimentos e respetivos extratos contabilísticos, embora tenha sido solicitado, através do ofício n.º ...93 (anexo 8). o "suporte documental integrado no processo de documentação fiscal a que se refere artigo 130.º do Código do IRC, em conformidade com o determinado pelos nºs 1 e 2 do artigo 33.º do CFI identifique discriminadamente as aplicações relevantes objeto de reinvestimento, bem como, outros elementos considerados relevantes, que justifiquem os montantes deduzidos nos anos 2015 e 2016".

Posteriormente, presencialmente, apresentou as faturas e outros documentos de suporte relativos a esses investimentos tendo informado, verbalmente e sem qualquer demonstração, que estes se enquadravam mesma tipologia do investimento realizado no ano 2017, ou seja, aumento da capacidade produtiva.

Conforme resulta do que acaba de se expor, tem que se considerar, desde logo, incumprido o requisito exige uma identificação clara e inequívoca do investimento realizado, designadamente e para além identificação dos ativos que constituem o projeto de investimento, os seus objetivos concretos demonstração do enquadramento numa das tipologias de investimento inicial, que é fundamental obviamente, deveria anteceder a dedução à coleta do respetivo benefício fiscal, o que não aconteceu.

Não basta elencar objetivos genéricos e discriminar investimentos "avulsos" por respeitarem a intervenções pontuais na instalação industrial pré-existente. Impõe-se a identificação de um projeto/investimento integrado e agregador, com objetivos e área de intervenção concretamente definidos, de forma a que seja justificado, entre outros, o seu enquadramento numa das tipologias abrangidas pelo conceito de investimento inicial, tal como impõe o artigo 11.º da Portaria 297/2015 de 21 de setembro. Investimento inicial é claramente um investimento de expansão, que exige a reestruturação/redimensionamento da instalação produtiva, e não um mero investimento corrente que sempre é exigido para manutenção de uma atividade desta natureza, motivado pelo desgaste, obsolescência, etc.

De facto, o sujeito passivo apresentou meras listagens, para cada um dos anos, dos investimentos considerados elegíveis para efeitos de quantificação daquele benefício fiscal, não sendo suficiente dizer que se trata do aumento da capacidade instalada para se justificar o enquadramento numa tipologia do investimento inicial. Na realidade e à semelhança do que sucedeu com o RFAI, o sujeito passivo considera elegíveis para benefícios fiscais, praticamente todas as aquisições de ativos, que nada mais representam senão normais investimentos exigidos para a manutenção de uma atividade desta natureza e dimensão.

E na visita efetuada às instalações, para efeito de verificação física dos ativos em que se concretizou o investimento, foi possível observar que tais bens se encontram disseminados por toda a instalação industrial, não se identificado um elemento agregador entre todos eles, que os interrelacione no sentido de constituírem um investimento inicial, distinto e incremental em relação ao pré-existente, conforme se passa a demonstrar através da análise de cada uma das aplicações consideradas relevantes.

III.1.2.2. DLRR-Dedução realizada no ano 2015

No ano 2015 o sujeito passivo deduziu à coleta o montante de € 54.115.18, relativo a DLRR, cujo reinvestimentos foi realizado nos anos 2016 e 2017, conforme quadro infra.

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III.1.2.2.1. Análise ao investimento realizado no ano 2016

Relativamente ao investimento realizado neste ano o sujeito passivo apresentou uma listagem com os seguintes equipamentos:

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Tal como efetuado com os investimentos apresentados para os anos seguintes, procedemos à verificação física dos equipamentos elencados nesta listagem, no entanto, atendendo que, parte das faturas que titulam a aquisição dos equipamentos neste ano apenas descrevem genericamente os bens adquiridos, foi elaborado auto de ocorrência que consta do anexo 11, com a identificação dos itens que foram indicados pelo sujeito passivo, na pessoa do seu Contabilista Certificado, como sendo aqueles em que se concretizou o reinvestimento. Refira-se que, no âmbito desta verificação, não foi autorizado pelo sujeito passivo a captação de imagens dos equipamentos e das respetivas chapas identificativas.

Deste procedimento resultaram as observações descritas no quadro seguinte:

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Face à indisponibilidade do contabilista certificado da sociedade, que acompanhou a diligência, para aguardar pela conclusão do presente termo de ocorrência, ficou acordado o seu envio por correio eletrónico para verificação da conformidade do seu conteúdo e recolha da respetiva assinatura.

Depois de revisto, o sujeito passivo assinou-o, sinalizando "algumas imprecisões", que corrigiu através da elaboração de novo quadro:

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O quadro seguinte apresenta um resumo do investimento, agregado pelas diferentes rubricas, de acordo com a ordem seguida na análise.

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Conforme exposto de seguida, a globalidade do investimento realizado neste ano não cabe no conceito de investimento inicial, conforme obriga o artigo 11.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, tal como definido nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 2.º da mesma portaria, que, por sua vez, remete para a definição constante da al. a) do parágrafo 49) do artigo 2.º do RGIC, sendo as alterações registadas pelo sujeito passivo no auto de ocorrência, inócuas para as conclusões da análise.

A. Máquinas

Tal como previsto no artigo 11.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, para efeitos de DLRR, apenas são elegíveis as aplicações relevantes em ativos aí previstos que respeitem a um investimento inicial, tal como definido nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º da presente Portaria, ou seja, investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.

Relativamente à Prensa Hidr. Univ. Programada …, o primeiro item da listagem, verifica-se que foi alienada no ano 2020, conforme demonstra o respetivo mapa de mais valias e menos valias.

Conforme determina o n.º 5 do artigo 30.º do CFI, as aplicações relevantes em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos devem ser detidas e contabilizadas de acordo com as regras que determinaram a sua elegibilidade, por um período mínimo de cinco anos. Quando ocorra a transmissão onerosa dos ativos em que seja concretizado o reinvestimento dos lucros retidos antes de decorrido o prazo, o sujeito passivo deve reinvestir, no mesmo período de tributação ou no período de tributação seguinte, o respetivo valor de realização em aplicações relevantes, os quais devem ser detidos, pelo menos, pelo período necessário para completar aquele prazo. O sujeito passivo não demonstrou o reinvestimento do valor resultante da alienação da prensa em aplicações relevantes.

Quanto à máquina de Costura ..., segundo item da listagem, verifica-se que foi adquirida na sequência da alienação, nesse mesmo ano, de três máquinas de costura usadas, conforme respetivo mapa de mais valias e menos valias, complementado com as faturas de venda n.º ...29 e ...55 (anexo 5), configurando um mero investimento de substituição.

Os seguintes treze itens da listagem respeitam a:

- um humidificador mod 241 S;

- um leister Soprador Ar Quente;

- um aparelho de cortar ... A690;

- uma máquina de moldar contrafortes;

- duas escovadeiras veio longo;

- uma máquina fechar calcanheiras e lados mod. ...;

- uma máquina de montar bicos;

- um secador reativador ... e C 421 ...;

- uma prensa; uma cabine de pintura inox c/ filtros;

- um secador I R;

- uma máquina de cardar forro e um forno frio mod 488 ....

Todos estes equipamentos foram transmitidos pela B... Lda, empresa relacionada com a A..., através da fatura n.º ...88, emitida em ../../2016, sem qualquer especificação de marca, modelo, fabricante, número de série de cada equipamento e respetiva data de fabrico (anexo 9), não sendo possível aferir se o equipamento foi adquirido no estado novo ou usado.

Solicitado ao sujeito passivo a demonstração, relativamente a cada item, da sua aquisição no estado de novo, conforme exigido pelo n.º 1 do art.º 30.º do CFI, respondeu nos seguintes termos (anexo 7-13.º pedido):

"O que poderemos dizer é que nem sempre o ano de fabrico corresponde ao ano de aquisição, mas, de facto, aqueles bens foram adquiridos no "estado de novo". Mas, nesta altura, passados que são 5 anos, não estamos a identificar os meios para provar o estado a que nos referimos. Para nós, a melhor forma de comprovar o estado dos bens é a verificação física."

O procedimento de verificação física do investimento já referenciado (conforme auto de ocorrência, anexo 11, permitiu evidenciar que, relativamente aos equipamentos cuja chapa identificativa do ano de fabrico era visível, os anos de fabrico indicados são, 2003, 2006, 2008, 2010 e 2011, ou seja, é evidente o lapso temporal entre o ano de fabrico e o ano de aquisição das máquinas (2016).

Repare-se que, a dedução de benefícios fiscais automáticos é despoletada, no caso da DLRR, pela declaração de rendimentos Modelo 22 em que é invocado o direito aos mesmos, pelo que, o ónus de provar o direito a usufruir destes benefícios fiscais é, nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT, dos sujeitos passivos, e passa pelo cumprimento das obrigações previstas nos respetivos regimes e na prestação dos esclarecimentos adicionais considerados necessários.

Sendo um dos pressupostos do direito ao benefício fiscal que os bens em que se concretize os reinvestimentos sejam adquiridos em estado de novo, seria expectável que, em face do intervalo de tempo decorrido desde o ano de fabrico dos equipamentos até ao ano do investimento (2016), o sujeito passivo estivesse em condições de justificar o estado em que se encontravam nessa data. Até porque, a fornecedora B... é uma empresa relacionada, ocupa as instalações do sujeito passivo no âmbito de um contrato de arrendamento, tem como maior cliente o próprio sujeito passivo, e partilha o mesmo administrador/gerente e contabilista certificado.

Nestas circunstâncias, e em face das legítimas dúvidas acerca do estado dos bens em que se concretizou o investimento, o sujeito passivo não só tinha a obrigação, como, facilmente poderia dissipar essas dúvidas.

Pese embora tal facto, em 10 de novembro de 2021 teve que ser enviado ofício ...77, à sociedade B... Lda, solicitando informação sobre esta matéria (anexo 12).

Em 11 de dezembro de 2021, um mês após envio do ofício, a B... Lda apresentou os elementos solicitados, que se sistematizam no quadro seguinte:

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Verifica-se assim que as máquinas alienadas à A... no ano 2016, foram adquiridas pela B... no ano 2011, encontravam-se registadas em contas do ativo fixo tangível desta sociedade, exceção para o soprador de ar quente, e foram objeto de depreciações nos anos em que estiveram na sua posse.

Relativamente ao soprador de ar quente, a sua aquisição foi reconhecida como um gasto, isto é, a empresa reconheceu que este bem esgotou a sua utilização no próprio período.

Nesta matéria há que atender ao disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 30.º do CFI, segundo a qual os ativos fixos tangíveis só são considerados aplicações relevantes se tiverem sido adquiridos em estado novo, ou seja, não podem ter sido adquiridos em estado de uso.

Em princípio, é facilmente percetível, por parte de quem adquire, se os bens se encontram em estado de novo (as chamadas aquisições em 1ª mão), ou se são usados (em 2ª mão), pelo que, a dúvida é normalmente colocada no controlo efetuado a posteriori. Por tal motivo, a AT tem vindo a considerar que um ativo fixo tangível é considerado em "estado de novo" se não integrou anteriormente o ativo não corrente da empresa que pretende usufruir do RFAI ou de qualquer outra empresa (Processo n.º ...15, PIV n. º …49, com Despacho de 2015-07-07, da Diretora de Serviços).

Ora, quanto aos ativos adquiridos à B... para além do ano de fabrico, há que ter em conta que tais bens se encontravam classificados naquela empresa como ativos fixos tangíveis (ativo não corrente) e a ser depreciados desde 2011. Os AFT são itens detidos para uso na atividade operacional, com carácter de continuidade ou permanência, e com exceção dos terrenos, possuem normalmente uma vida útil limitada. A depreciação em função da vida útil ou utilização esperada, tem subjacente o princípio da correlação entre rendimentos gerados pelo AFT e gastos decorrentes do seu uso.

Não resta assim qualquer dúvida de que:

- Os equipamentos foram adquiridos à B... em estado de uso, aliás, em avançado estado de uso, uma vez que, estavam a ser utilizados no âmbito da atividade operacional daquela empresa desde 2011, ou seja, há cerca de 6 anos;

- Tal realidade teria que ser, obrigatoriamente, do conhecimento dos responsáveis de ambas as empresas e do seu contabilista certificado, encontrando-se espelhada nos elementos remetidos pela B... em resposta ao ofício que lhe foi remetido para o efeito.

Por fim, neste grupo das "máquinas", temos ainda aquisição de um monitor para máquina de … e uma Máquina de ....

O monitor corresponde a um mero componente acoplado a uma máquina de corte. Relativamente à máquina de ..., para além da fatura de aquisição designar "máquina reparada" verificamos que esta se encontra contabilizada na conta 43139 - Equipamento básico grandes reparações, isto é, mais uma vez, não estamos perante a aquisição de equipamento novo, conforme exige o n.º 1 do artigo 30.º do CFI, antes perante a reparação de um equipamento usado.

B. Equipamento Informático

Neste grupo encontra-se a aquisição de uma fotocopiadora impressora KM BIZ, com alimentador e armário, um computador intel core i7, onde se inclui o sistema operativo Windows, office home, teclado monitor e disco, um Aple Mc book Pro, um computador desktop e uma impressora Digital a Cores lcube.

Trata-se de equipamentos administrativos, não associados a qualquer investimento inicial, pelo que, também não podem ser elegíveis em sede de DLRR.

A. Moldes

Conforme já referido, os moldes utilizados em máquinas de injeção para a produção de solas não são mais que meros componentes de ativos fixos tangíveis que, de forma isolada, não produzem qualquer bem.

Efetivamente, a aquisição de moldes representa uma aquisição de ferramentas, diretamente associadas à produção de cada coleção de calcado, o que, naturalmente, sofre alterações em cada ciclo produtivo, de acordo com as modificações de cada coleção, consubstanciando uma ferramenta de uso corrente e constante da empresa, integrando o custo específico dos bens produzidos.

Verifica-se ainda, da análise à conta 4371 - Ferramentas e Utensílios, que o sujeito passivo submeteu, para efeitos deste benefício, a totalidade dos moldes adquiridos nesse ano, assumindo assim que, todos os moldes adquiridos respeitam a investimento inicial/incremental, como se a empresa não necessitasse de moldes para a sua atividade corrente pré-existente, o que parece manifestamente inverosímil.

Assim, conforme fundamentos já expostos no ponto III.1.1.4.3, o investimento em isolado em moldes não serão aceites como aplicações relevantes para efeitos de DLRR, por não respeitar a um investimento inicial.

B. Mobiliário e telemóvel

O investimento em mobiliário, representado numa única fatura, designa:

Um aparador com portas e prateleiras para sala de formação

Um aparador com portas e prateleiras para sala de reuniões

Um tampo em madeira para bancada controlo qualidade

- Bancada em madeira para mesa de embalagem

- 6 tampos para mesa de acabamento

- Tampo de secretária

O investimento no telemóvel respeita a um Apple lphone 7 plus.

Todos estes itens foram distribuídos pela fábrica, não estando nem se vislumbrando que possam estar associados a qualquer projeto ou estratégia de investimento destinada a expandir a capacidade de produção da unidade fabril.

Portanto, para além de o sujeito passivo não ter logrado demonstrar de que forma, todas estas aquisições, respeitam a um investimento inicial, tal como definido na alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º da Portaria 297/2015, neste caso, relacionados com a tipologia poi si indicada de aumento da capacidade do estabelecimento, verifica-se ainda que, a maior parte dos itens adquiridos se encontra expressamente excluída deste regime de benefícios fiscais (DLRR), não podendo sequer ser consideradas aplicações relevantes, assumindo especial destaque, a aquisição de equipamentos usados à entidade relacionada B....

III.1.2.2.2. Análise ao investimento realizado no ano 2017

Para efeitos do investimento em sede de DLRR o sujeito passivo apresentou o seguinte mapa:

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Conforme fundamentos expostos no ponto III.1.1.3. o investimento realizado na melhoria do edifício, com a necessária reposição e substituição de materiais, a aquisição de máquinas, moldes, equipamento informático e mobiliário, não cabem no conceito de investimento inicial, conforme obriga o artigo 11.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro e n.º 3 do artigo 17.º do RGIC.

Pelo exposto, o investimento realizado no ano 2017, no montante de € 333.064,85 também não poderá ser elegível, para efeitos de concretização do reinvestimento da reserva relativa à DLRR de 2015.

III.1.2.3. DLRR-Dedução realizada no ano 2016

No ano 2016 o sujeito passivo deduziu à coleta o montante de € 19.905,82, a que correspondeu a constituição e uma reserva especial de € 199.058,20. O reinvestimento deste montante foi concretizado nos anos 2018 e 2019, conforme quadro infra.

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Note-se que o investimento a realizar nos dois anos seguintes deveria, pelo menos, igualar o montante da reserva constituída, tendo ficado aquém em € 2.328,21.

III.1.2.3.1. Análise ao investimento realizado no ano 2018

Relativamente ao investimento realizado neste ano o sujeito passivo apresentou uma listagem com os seguintes investimentos:

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Juntamente com esta listagem o sujeito passivo apresentou as faturas, orçamentos, contratos, relativos a cada bem, respetivos extratos de lançamentos contabilísticos e mapas designados "mapas de auxílio controlo e quantificação ao RFAI e DLRR para cada ano (anexos 8 e 10).

Relativamente a este investimento, para efeitos de análise, agruparemos em:

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Relativamente ao primeiro grupo encontramos uma máquina de conformar canos de botas a frio, uma máquina de gravação, um secador, que se encontra numa cabine no exterior do edifício junto ao compressor, uma máquina de teste de fuga de ar e cortantes.

Estamos, pois, perante aquisições isoladas, distribuídas por toda a fábrica, que não consubstanciam o conceito de investimento inicial, não se concebendo, de que forma, por si só, contribuem para o aumento da capacidade de produção da empresa.

Quanto aos cortantes, para além do acima referido, constituem uma ferramenta de utilização numa máquina, cuja vida útil está estritamente associada à coleção que visam produzir, sendo, portanto, uma ferramenta de substituição e de investimento corrente numa empresa de calçado, sem cabimento, uma vez mais, no conceito de investimento inicial.

Tal como as máquinas, o equipamento informático, onde se inclui um Notebook, afeto a uma funcionária de escritório, que desempenha funções de planeamento, comercial e administrativa, outro computador afeto a uma funcionária de escritório, um PC Touch afeto à secção de produção, uma impressora de escritório, uma impressora de etiquetas e um tablet, ambos afetos ao armazém, também consubstanciam aquisições isoladas e distribuídas por toda a fábrica, sem cabimento no conceito de investimento inicial, necessariamente um investimento distinto e incremental (de expansão), não se concebendo, de que forma contribuíram para o aumento da capacidade de produção da empresa.

Quanto ao software, apenas com a Lei 2/2020, de 31 de março (orçamento do estado 2020) se passou a admitir como aplicações relevantes para efeitos de DLRR alguns ativos intangíveis (transferência de tecnologia). Até esse ano apenas eram admissíveis como aplicações relevantes aquisições de ativos tangíveis.

Os moldes adquiridos neste ano, à semelhança dos adquiridos nos anos anteriores, não são mais do que ferramentas e utensílios (como a própria contabilização reflete) de máquinas de injeção de solas. Estes investimentos são necessariamente contínuos na atividade da empresa, associados a alterações constantes dos modelos e coleções que a A... fabrica, e que, como já referido, se encontram a funcionar nas instalações fabris de outras unidades produtivas, neste caso, dos respetivos fornecedores.

Por fim, no que se refere à aquisição do televisor LCG Led e respetivo cabo HDMI, instalado na designada sala de amostras já existente da sociedade, a sua elegibilidade para efeitos de DLRR está subordinada ao seu enquadramento no âmbito do conceito de "investimento inicial", considerado de uma forma global, nos termos da citada alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria 297/2015, de 21 de setembro.

III.1.2.3.2. Análise ao investimento realizado no ano 2019

Relativamente ao investimento realizado neste ano o sujeito passivo apresentou uma listagem com os seguintes investimentos:

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Relativamente a este investimento, para efeitos de análise, agruparemos em:

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No que respeita às duas máquinas adquiridas, estamos perante aquisições isoladas, que não consubstanciam o conceito de investimento inicial. Ademais, conforme consta do mapa de mais-valias que consta do anexo 5, verifica-se que, no ano 2019, o sujeito passivo alienou uma máquina de cardar, cuja aquisição havia ocorrido em 2001, sendo de concluir que, a máquina de cardar adquirida neste ano, no montante de € 95.750,00 (96% do investimento em máquinas), incluída no investimento elegível, veio substituir a alienada.

Conforme já referido, o conceito de investimento inicial não compreende investimento de reposição ou se substituição. De facto, enquanto que o primeiro é um investimento adicional, de raiz, necessariamente distinto e incremental em relação ao já existente, visando a expansão da atividade desenvolvida, o investimento de substituição visa substituir equipamentos usados ou obsoletos por equipamentos novos com características semelhantes, ainda que melhorados (é um investimento de manutenção da atividade pré-existente).

Os moldes como já referido, não são mais do que ferramentas e utensílios (como a própria contabilização reflete) de máquinas de injeção de solas. Estes investimentos são necessariamente contínuos na atividade da empresa, associados a alterações constantes dos modelos e coleções produzidos, logo, são sempre investimentos de substituição.

O equipamento informático, onde se inclui um surface, um componente do servidor e software, também consubstanciam aquisições isoladas, sem qualquer relação com uma estratégia de investimento inicial de aumento da capacidade de produção.

Quanto ao software, sendo um ativo intangível, não é admitido como aplicação relevante para efeitos de DLRR neste ano.

Conforme fundamentos expostos anteriormente, o investimento realizado no ano 2019 não tem enquadramento no âmbito do conceito de "investimento inicial" ou não é considerado aplicação relevante, não sendo elegível para efeitos de DLRR.

III.1.2.4. Resumo dos incumprimentos do regime DLRR

Resumindo, a globalidade do investimento relacionado pelo sujeito passivo em sede de DLRR não poderá ser aceite pelos seguintes motivos:

- Investimento inicial / Aumento da capacidade de produção

Para além de parte do investimento ser, manifestamente, investimento de substituição, ferramentas e equipamentos periféricos diversos, tratam-se, na generalidade, de aquisições isoladas, de utilização transversal a toda a fábrica, sem identificação de um projeto/investimento integrado e agregador, com objetivos e áreas de intervenção concretamente definidos, de forma a que seja justificado o seu enquadramento numa das tipologias abrangidas pelo conceito de investimento inicial, tal como impõe o artigo 11.º da Portaria 297/2015 de 21 de setembro, neste caso, o potencial aumento da capacidade produtiva da empresa.

Efetivamente, o que se verifica é uma tendência em "varrer" praticamente todas as aquisições de bens de investimento para os benefícios fiscais disponíveis, mesmo os expressamente excluídos pelo regime, confundindo a facilidade em deduzir benefícios fiscais automáticos à coleta do IRC, com a desnecessidade de prestar contas pelo imposto que, dessa forma deixou de pagar, não justificado pela assunção de qualquer risco no incremento/expansão da atividade desenvolvida. Essa era a principal condição imposta, e não foi cumprida.

- Aplicação relevante expressamente excluída do regime

Os equipamentos adquiridos à empresa relacionada B... Lda e os ativos intangíveis, para além de não se enquadrarem no conceito de investimento inicial, não consubstanciam aplicações relevantes para efeitos de DLRR, por se encontrarem excluídos do âmbito do artigo 30.º do CFI. De acordo com a redação deste artigo à data, apenas são consideradas aplicações relevantes as adições de ativos fixos tangíveis adquiridos no estado de novo. Quer os responsáveis legais do sujeito passivo, quer o seu contabilista certificado, têm perfeito conhecimento desta circunstância, pelo que, nunca poderiam considerar este investimento elegível para efeito de DLRR. Retirando estes equipamentos, por serem usados, e os moldes ao investimento considerado em 2016, nada resta que possa ser considerado um investimento inicial suscetível de consubstanciar uma expansão da atividade da empresa.

Verifica-se ainda, e conforme já referido anteriormente, que os moldes constam como aplicações relevantes em todos os anos analisados, sendo que indubitavelmente, estão associados à atividade corrente que sempre foi desenvolvida por esta empresa, sendo uma necessidade constante e fundamental, que varia em função dos modelos de calçado produzidos.

Por fim, conforme demonstra o quadro seguinte, praticamente todo o investimento realizado nestes quatro anos foi considerado para efeitos de DLRR/RFAI, como se fosse possível uma instalação industrial subsistir sem constantes investimentos na manutenção da fonte produtora.

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III.1.2.5. DLRR - Resumo correções

Nos termos da al. a) do art.º 34.º do CFI, a não concretização da totalidade do investimento nos termos previstos no artigo 30.º até ao termo do prazo de dois anos previsto no n.º 1 do artigo 29.º implica a devolução do montante de imposto que deixou de ser liquidado na parte correspondente ao montante dos lucros não reinvestidos, ao qual é adicionado o montante de imposto a pagar relativo ao segundo período de tributação seguinte, acrescido dos correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais.

Nestes termos, a falta de reinvestimento das reservas constituídas nos anos 2015 e 2016, implicam a correção das deduções à coleta declaradas pelo sujeito passivo nesses dois anos, nos montantes de € 54.115,18 e 19.905,82, respetivamente, conforme esquematizado no quadro seguinte.

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III.1.2.6. Juros compensatórios

Assim, para além do imposto que deixou de ser liquidado na parte correspondente ao montante dos lucros não reinvestidos, conforme disposto na alínea a) do artigo 34º do CFI, são devidos os correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais, devido à não concretização do investimento nos termos previstos no artigo 30º do CFI até ao termo do prazo previsto no nº 1 do artigo 29º do CFI.

Os juros compensatórios são apurados com base na taxa anual de 4%, majorada em 15 pontos percentuais (19%), e contados dia a dia, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 35.º da LGT, de acordo com a seguinte fórmula:


imposto x taxa x número de dias em falta + 365

O número de dias em falta é apurado atendendo ao termo do prazo de entrega da declaração do período da dedução e a data do suprimento ou correção da falta que motivou o retardamento da liquidação, que, em caso de inspeção, se considera suprida ou corrigida a partir da data do levantamento do auto de notícia, conforme demonstrado no quadro infra:

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Assim, nos termos da alínea a) do artigo 34º do CFI, os juros compensatórios devidos são majorados em 15 pontos percentuais, ascendendo a € 57.634,89 e € 17.418,41, nos anos 2015 e 2016, respetivamente, devendo ser inscritos no campo 366 (e campo informativo 366-B) do quadro 10 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2017 e 2018, respetivamente.

III.2. EM SEDE DE IRC - MATÉRIA COLETÁVEL

III.2.1. Depreciações

(...)

IX.2. ANÁLISE DO DIREITO DEAUDIÇÃO EXERCIDO E CONCLUSÕES

(...)

1. Desenvolvimento do procedimento inspetivo

A propósito da extensão do procedimento inspetivo, realizado a coberto de ordens de serviço emitidas para os períodos de tributação de 2017, 2018 e 2019, todas de âmbito parcial - IRC e especialmente vocacionadas para o controlo de benefícios fiscais, tendo sido ainda emitido um despacho para 2016, para efeito da confirmação exigida pela alínea a) do n.° 1 do artigo 34.° do CFI, a efetuar em 2017 por respeitar à DLRR de 2015, vem o sujeito passivo alegar que, "de modo a evitara redundância dos procedimentos inspetivos, não pode ser realizada mais do que uma inspeção externa relativamente aos mesmos anos e ao mesmo imposto."

Efetivamente, começa o sujeito passivo por questionar o alargamento do procedimento inspetivo, concretamente, no que respeita à abertura do despacho externo n.º ...78, que incidiu sobre o ano 2016, com objetivo de "consulta, recolha e cruzamento de elementos" para efeito da "análise do investimento em que se concretizou parte da DLRR de 2015...", bem como, da abertura da ordem de serviço externa n.º ...89, que incidiu sobre o ano 2017, com âmbito parcial (IRC).

Relativamente ao despacho, refere o sujeito passivo que a empresa já havia sido alvo de um procedimento inspetivo externo, incidente sobre o ano 2016, “... no âmbito do qual foram validados todos os factos relativos ao IRC 2016", onde se incluem os investimentos efetuados nesse ano relativos à DLRR de 2015.

De facto, em 2017 a sociedade foi alvo de um procedimento inspetivo externo de controlo declarativo, credenciado pela ...82, que incidiu sobre o ano 2016. Deste procedimento resultaram correções realizadas em sede deste imposto.

O presente procedimento inspetivo nunca teve por objetivo comprovar os factos tributários declarados ou que devessem ser declarados em 2016, e conforme verificável pela análise deste relatório, apenas foram realizadas correções tributárias sobre os anos 2017, 2018 e 2019. O despacho que incidiu sobre o ano 2016 visou, exclusivamente, a consulta recolha e cruzamento de elementos, conforme claramente evidenciado no exemplar assinado pelo representante do sujeito passivo, e, portanto, os elementos declarados pelo sujeito passivo em sede de qualquer imposto nesse ano não sofreram qualquer alteração em virtude do presente procedimento inspetivo.

Neste âmbito é importante atender ao disposto no n.º 4 do artigo 63.° da LGT que, apesar de não permitir a abertura de mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação, estabelece algumas exceções, nas quais se incluem, entre outras:

"salvo se o procedimento visar apenas a consulta, recolha de documentos ou elementos", ou, se este visar a "confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária".

Indubitavelmente, o despacho em questão cabe, desde logo, na primeira exceção enunciada, já que visou, exclusivamente, a consulta recolha e cruzamento de elementos, mas não bastasse, também cabe na segunda, isto porque, especificamente, restringiu-se à confirmação dos pressupostos de um direito que o sujeito passivou invocou perante a administração tributária, neste caso, do cumprimento dos pressupostos legais para beneficiar da dedução à coleta do benefício fiscal DLRR declarado no ano 2015, que é efetuada em 2017, nos termos e para os efeitos do artigo 34.º do CFI. A DLRR é um benefício fiscal automático, despoletado pela declaração apresentada pelo sujeito passivo, onde invoca o direito ao mesmo, no enanto, a sua dedutibilidade depende do cumprimento de um conjunto de condições legais, a concretizar no próprio período e em períodos posteriores, designadamente, a realização de investimento elegível no período de tempo concedido para o efeito, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 30.° do CFl e do artigo 11.° da Portaria n.° 297/2015, de 21 de setembro, que cumpre à AT verificar.

Não restam dúvidas de que, ao abrigo do despacho externo n.º ...78, encontrava-se a AT perfeitamente legitimada para proceder à análise dos investimentos realizados no ano 2016, considerados pelo sujeito passivo como elegíveis para reinvestimento dos lucros retidos e deduzidos à coleta no ano 2015 a coberto do benefício fiscal DLRR. Como o prazo para reinvestimento terminou em 2017, seria esse o ano em que, nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 34.° do CFI, teriam que ser avaliadas as condições impostas pelo regime no sentido de as confirmar, ou, em caso de incumprimento, promover a reposição dos benefícios fiscais deduzidos em 2015. Pelo que, ao contrário do que conclui o sujeito passivo, os investimentos efetuados no ano de 2016 e relativos à DLRR de 2015, não foram validados pelos SIT no âmbito da ação inspetiva externa que incidiu sobre o ano de 2016, não tinham que o ser porque são fiscalmente inócuos naquele ano, nem, evidentemente, o respetivo relatório de inspeção tributária se lhes refere. E tanto assim é que, apesar de alguma dilação provocada pelo sujeito passivo3, os documentos foram apresentados e o respetivo investimento exibido à AT.

Relativamente à ordem de serviço externa que incidiu sobre o ano 2017, refere o sujeito passivo que foi alvo de diversas inspeções externas anteriores, que incidiram sobre esse ano e das quais não resultaram quaisquer correções tributárias.

Efetivamente, para além da ...89, que credenciou o presente procedimento inspetivo, para o ano 2017 o sujeito passivo foi alvo dos seguintes procedimentos inspetivos:

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Chamando novamente à colação o n.º 4 do artigo 63.º da LGT, este apenas restringe a abertura de mais de um procedimento externo de fiscalização se respeitar ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação, sendo, como decorre da própria letra da lei, estas três condições cumulativas. Antes de mais, excluímos logo à partida o anterior procedimento inspetivo interno (...48) sobre o qual não incide a restrição imposta pelo artigo 63.º da LGT por se tratar de um procedimento interno. Quanto aos restantes procedimentos inspetivos apresentados no quadro, apesar de externos, incidiram sobre um imposto distinto do atual, o IVA. Ao contrário do IRC que é um imposto periódico, o IVA caracteriza-se por ser um imposto de obrigação única e pagamento periódico (neste caso mensal), pelo que, apurando o sujeito passivo créditos sucessivos e solicitando os respetivos reembolsos, estará, naturalmente, como os demais, sujeito a frequentes ações de validação e verificação dos pressupostos para o seu deferimento, credenciadas por ordens de serviço de âmbito parcial porque especificamente emitidas para esse efeito. Como é facilmente percetível, as matérias em análise nestas ordens de serviço não coincidem com as matérias objeto de análise neste procedimento, logo à partida, porque estamos perante impostos distintos, não se verificando, mais uma vez, a limitação imposta pelo n.º 4 do artigo 63.º da LGT.

(...)

III. Investimento em ativos isolados

Manifesta a sua discordância com a caracterização do investimento, considerando os ativos em que foi concretizado o investimento "ativos plenamente enquadrados numa estratégia global de investimento iniciada em 2017/...17, em que todas as aquisições foram planeadas e realizadas com vista a contribuir para o objetivo principal de aumento da capacidade produtiva da empresa definida estrategicamente pela administração.", não se tratando de investimentos em ativos isolados.

E justifica esta discórdia com a seguinte argumentação: "Naturalmente, na realidade das empresas, o alcance deste objetivo não implica necessariamente a realização de investimentos apenas num determinado setor do processo produtivo ou a criação de uma linha de produção adicional. Na verdade, como no caso em apreço, tal objetivo (de aumento substancial, e não de aumento marginal, da capacidade) pode ser alcançado através da realização de um conjunto de investimentos em vários setores (desde a aquisição de diversas máquinas, equipamentos e moldes, à ampliação das instalações fabris através da adaptação do edifício adquirido para permitira reestruturação dessas instalações), devidamente estruturado, com vista a incrementara capacidade nomeadamente das áreas que se encontram subdimensionadas. Se for tida em consideração, como é devida, esta realidade empresarial e as demais explicações apresentadas ao longo da inspeção, conclui-se que as faturas apresentadas correspondem àquelas que titulam a aquisição dos ativos considerados elegíveis para efeitos de RFAI e DLRR por terem sido imprescindíveis ao cumprimento do objetivo global e principal do projeto de investimento, e não um conjunto de faturas avulsas ou de ativos isolados. Ainda que não se possam encontrar todos fisicamente conexos, ou próximos, os ativos considerados elegíveis no âmbito deste projeto de investimento concretizado ao longo dos vários anos têm o denominador comum de terem sido adquiridos com o propósito de aumentara capacidade da empresa. Os que não se enquadravam no âmbito deste projeto de investimento foram inviamente excluídos."

Ora, conforme largamente explanado ao longo deste relatório, não se pode concordar com a posição defendida pelo sujeito passivo. Com efeito, os benefícios fiscais RFAI e DLRR têm objetivos próprios e distintos dos subjacentes aos normalmente exigidos no âmbito da normal dinâmica empresarial, pois tais benefícios destinam-se a apoiar investimento de expansão das atividades (e que crie postos de trabalho, no caso do RFAI) e não investimentos de manutenção das atividades pré-existentes. É esse o conceito de investimento inicial, que também deve ser distinto e incremental e não investimento nos vários setores da instalação já existente, que não passa de investimento corrente sem o qual essa instalação não subsiste (investimento de manutenção, substituição, complementar, de reposição, etc). Além disso e entre outros, tem que ser investimento novo e não aquisições de bens usados (no caso, adquiridos a empresa relacionada), etc.

De facto, conforme relatado no ponto III.1.1.3. do PRIT, "na visita efetuada às instalações, realizada para efeitos de verificação física dos ativos em que se concretizou o investimento, foi possível observar que tais bens se encontram disseminados por toda a instalação industrial, não se identificado um elemento agregador entre todos eles, que os interrelacione no sentido de constituírem um investimento inicial, distinto e incremental em relação ao pré-existente, consubstanciando investimentos correntes, conforme se passa a demonstrar através da análise de cada uma das aplicações consideradas relevantes"

Obviamente, para justificar o cabimento do investimento no conceito de investimento inicial, enquadrando-o na tipologia de aumento da capacidade do estabelecimento, não basta ao sujeito passivo indicar o propósito que terá sustentado a sua aquisição. Este é uma mera formulação de uma intenção, como tal, incomprovável. Terá que o demonstrar, apresentando um conjunto de evidencias alicerçadas em documentos e dados técnicos.

Com efeito, o sujeito passivo não fundamenta aquilo que alega, reduz a argumentação a considerações genéricas e abstratas sem apresentar uma contra-argumentação factual coerente e sem verdadeiramente enfrentar os argumentos que suportam as correções projetadas, se é que o poderia fazer face às evidentes incompatibilidades entre os investimentos realizados e os exigidos pelos regimes de benefícios fiscais em apreço, pois não é elegível todo e qualquer investimento.

O sujeito passivo termina (ver transcrição supra) referindo-se que a empresa terá realizado outros investimentos, que não apresentou para efeitos de RFAI e DLRR, sem, contudo, os identificar para esse efeito.

A este propósito contrapomos com o quadro apresentado no capítulo III.1.2.4 do PRIT, demonstrando que o investimento apresentado para efeitos de RFAI e DLRR, nos anos 2016, 2017, 2018 e 2019 representou, praticamente, todo o investimento realizado pela empresa, assumindo proporções que rondam os 100% do total das aquisições, ou seja, o restante investimento é completamente insignificante.

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De facto, verifica-se que, reiteradamente e ao contrário do que afirma, o sujeito passivo tem considerado a quase totalidade do investimento realizado entre 2016 e 2019 como "investimento inicial", elegível para efeitos de RFAI e/ou DLRR. Como se todos os anos e todos os investimentos fossem investimentos de expansão da atividade, e como se a instalação industrial pré-existente não necessitasse de qualquer investimento para se manter operacional.

Ora, evidentemente, uma qualquer indústria "transformadora necessita de investimento constante na atividade de exploração corrente só para efeito da sua manutenção nos mesmos termos em que já vinha sendo exercida, e essa é que é a realidade empresarial referida pelo sujeito passivo e que se encontra subjacente aos investimentos realizados nestes anos. Todavia, e conforme largamente explicitado ao longo deste relatório, embora sejam investimentos necessários no âmbito da sua atividade, tais investimentos não integram o conceito de investimento inicial (de expansão) e como tal, não poderão ser elegíveis para efeitos dos benefícios fiscais RFAI e DLRR.

IV. Investimento de substituição ou manutenção

Segue abordando o tema de parte do investimento realizado ser de substituição ou manutenção, expondo, "Para além disso, não se trata de investimento de substituição ou manutenção normalmente exigidos pelo normal funcionamento das instalações fabris existentes. Não existiu qualquer substituição de ativos no período em apreço, mas sim a concretização de aquisição de ativos resultantes da necessidade de aumentar a capacidade para responder às solicitações do mercado, sendo que, na realidade das empresas, nem sempre o aumento da capacidade origina automaticamente o aumento do volume de negócios."

Mais uma vez o sujeito passivo contrapõe os vastos elementos e argumentos expostos no PRIT que classificam parte do investimento como sendo de substituição, com simples manifestação de discordância que só se sem apresentar quaisquer justificações que o provem.

Trazemos aqui apenas algumas das referências mais evidentes expostas no PRIT relativas a investimento de substituição:

- O investimento no edifício resumiu-se à sua melhoria, com a necessária reposição e substituição de materiais (várias faturas designam mesmo isso "substituição de..."), já que o edifício não sofreu qualquer alteração estrutural, para além de estar maioritariamente afeto à atividade de outra empresa, o que, por si só, o excluiria expressamente destes benefícios fiscais;

- a máquina de costura foi adquirida na sequência da alienação, no mesmo ano, de duas máquinas de costura;

- a impressora digital a cores, conforme inscrito na própria descrição da fatura e aposto manualmente, foi adquirida para substituição de um equipamento anterior;

- os moldes não são mais do que ferramentas e utensílios (como a própria contabilização o reflete) de investimento contínuo, usados em máquinas de injeção de solas de terceiros (fornecedores), alguns dos quais resultam de meras adaptações de antigos.

Estes e outros factos concretos minuciosamente expostos no PRIT permitem concluir que, para além de não integrar qualquer investimento inicial, parte do investimento apresentado é, efetivamente, investimento de substituição, não logrando o sujeito passivo provar o contrário.

V. Investimento no edifício

Seguindo a ordem expositiva apresentada pelo sujeito passivo, relativamente ao investimento no edifício industrial vem ainda clarificar, "...que se trata de obras de adaptação do respetivo imóvel à atividade do SP, atendendo a que o mesmo tinha estado anteriormente afeto a atividades da indústria da cortiça e não de meras obras de melhoria e substituição de materiais, o qual permitiu expandir as instalações fabris da Empresa ao libertar espaço no edifício sede de modo a acomodar os investimentos de expansão relativos às máquinas e demais equipamentos concretizados em 2017 e seguintes.".

Esquece-se aqui de referir que o edifício, na sua maioria, se encontra afeto à atividade de outra sociedade, portanto, não se trata de um ativo fixo tangível, mas de uma propriedade de investimento, incumprindo assim a alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º (RFAI) e n.º 1 do artigo 30.º (DLRR), ambos do CFI. Além do mais, não se encontrando afeto às instalações fabris nem à exploração corrente do sujeito passivo, as obras aí realizadas estão expressamente excluídas do RFAI, conforme subalínea ii) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.

Também não cumpre o enquadramento na tipologia de "novo estabelecimento", por si indicada, prevista na al. d) do n.º 2 do art.º 2.º da Portaria 297/2015, de 21/09, de harmonia com o RGIC, na medida em que não é criada uma atividade independente. Quanto a estes argumentos, devidamente desenvolvidos no RIT, o sujeito passivo nada refere. Ou seja, são aqui, ostensivamente, incumpridas várias normas legais, que o sujeito passivo nega sem qualquer justificação ou fundamento, fazendo letra morta da lei.

VI. Condição de aumento da capacidade produtiva

Quanto à tipologia de investimento inicial no aumento da capacidade produtiva, que o PRIT considera não demonstrada, e em que o investimento efetuado não possui caraterísticas para que possa ser cumprida, o sujeito passivo vem acrescentar: "Os impactos destes investimentos encontram-se bem notórios na evolução que se registou na atividade da empresa, sendo que, da análise adequada dos indicadores relevantes, conclui-se que não são marginais, mas, marcadamente substanciais. A estratégia de diferenciação pela qual a Empresa enveredou em 2016, através da especialização na produção de produtos técnicos, cuja materialização implicou a concretização dos significativos investimentos em apreço, permitiu à Empresa dar um salto muito significativo em termos de capacidade de produção de produtos técnicos. Caso esta estratégia não tivesse sido seguida, certamente hoje a Empresa continuaria a produzir sobretudo produtos standard, sem valor acrescentado, colocando assim em causa a sua sobrevivência e a manutenção dos seus postos de trabalho, como se tem verificado com outros agentes económicos deste setor.".

Desconhecemos os indicadores a que o sujeito passivo se refere, uma vez que ele não os identifica, tal como desconhecemos, porque não é elucidado, de que forma o desenvolvimento de uma estratégia de diferenciação e especialização, por si só, terá induzido o aumento da capacidade de produção. Uma estratégia de diferenciação e especialização permitirá à empresa, à partida, produzir bens diferentes, destinados a nichos de mercados especializados, eventualmente com maior valor acrescentado, não necessariamente, produzir mais.

Além disso, e uma vez que faz depender a sobrevivência da empresa de uma estratégia de diferenciação da produção, mantendo-se os níveis de atividade sem grandes oscilações, provavelmente abandonou ou reduziu substancialmente a produção dos produtos fabricados anteriormente, pelo que, também por aí, não se antevê qualquer impacto ao nível da capacidade instalada.

VII. Investimento em moldes

No que respeita aos moldes o sujeito passivo alega: "importa deixar mais uma vez claro que se trata de ferramentas específicas necessárias à produção das matérias-primas como solas, aplicações e proteções, que não se encontram disponíveis no mercado, atendendo ao facto de o produto da Empresa corresponder a calçado técnico e não a um mero produto standard. Assim, os moldes adquiridos pelo SP são ferramentas fundamentais, cuja produção implica investimentos avultados, não sendo assim uma ferramenta periférica de uso corrente e de rápida perecibilidade (como é o caso das formas, que não foram consideradas elegíveis para efeitos de RFAI e DLRR). Para além disso, os moldes não se encontram associados à produção de coleções, atendendo a que as matérias-primas produzidas a partir desses moldes não dependem das coleções. Assim, a aquisição dos moldes em apreço, à semelhança dos demais ativos considerados elegíveis para efeitos de RFAI e DLRR, resultou da necessidade de implementação da estratégia global da empresa baseada na especialização nos produtos técnicos, o que requereu o aumento da respetiva capacidade.".

Mais uma vez, o sujeito passivo evita enfrentar os argumentos constantes do PRIT, fazendo letra morta da lei também a propósito dos moldes.

Para além de não integrarem qualquer investimento inicial, para além de se tratar de uma necessidade normal e recorrente, recorda-se ainda que nenhum destes moldes se encontra nas instalações do sujeito passivo.

Aliás, o sujeito passivo nem sequer é detentor de máquinas de injeção que permitam utilizar estes moldes.

Conforme informado pelo próprio, estas ferramentas, desde a sua aquisição, estiveram a laborarem instalações de outros operadores económicos (fornecedores), portanto, externamente à sociedade. Na realidade, o sujeito passivo compra as solas fabricadas tal como compra peles e outros componentes para integrar no calçado que fabrica, integrando tais moldes o custo específico dessas solas.

A este respeito o n.º 2 do artigo 22.º do CFI é claro, ao impor como condição que o investimento realizado seja afeto à exploração da empresa, exigindo o n.º 4 do mesmo artigo, alínea c), que o mesmo se mantenha na própria empresa.

Ademais, conforme exposto no quadro seguinte, nos anos 2016, 2017, 2018 e 2019, a empresa incluiu praticamente todas as aquisições de moldes no investimento elegível para efeitos de RFAIIDLRR. Posto isto, para além da restante argumentação, nunca se poderia aceitar que a totalidade do investimento em moldes fosse associada a uma estratégia de expansão da atividade (que neste caso, não existe), e que, sem esta estratégia, o investimento em moldes seria nulo.

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VIII. Condição de criação de emprego e postos de trabalho

Por fim aborda a condição de criação de emprego e postos de trabalho, no âmbito do RFAI, da seguinte forma:

"Acresce salientar que, como o SP cabalmente demonstrou no relatório do RFAI, bem como na informação facultada ao longo da inspeção tributária, os investimentos realizados no âmbito da estratégia global para aumento da capacidade, para além da manutenção dos postos de trabalho criados até 2016, proporcionou a criação de um posto de trabalho, relativo ao "Diretor Técnico", altamente especializado na produção de produtos técnicos. Esta conclusão é também corroborada pela informação relativa ao número de trabalhadores do SP no final de cada um dos meses de dezembro de 2016 a 2017, incluída pelos SIT no projeto de relatório: a 31 de dezembro de 2017 a empresa tinha mais um colaborador do que em dezembro de 2016 e comparativamente com a média dos colaboradores no período de dezembro de 2016 a novembro de 2017. Caso não tivesse efetuado este investimento, o SP não teria necessidade de criar este posto de trabalho, continuando a laborar como tinha efetuado até então, produzindo sobretudo produtos indiferenciadas. Com efeito, os investimentos realizados proporcionaram a criação do referido posto de trabalho, o que se revelou fundamental ao aumento substancial da capacidade de produção de produtos técnicos.

Quanto à obrigação de manutenção do posto de trabalho criado por efeito do investimento, como os SIT tiveram oportunidade de constar aquando da verificação física dos bens de investimento, o mesmo mantém-se até aos dias de hoje, ocupado pelo mesmo colaborador."

Conforme amplamente explanado no PRIT, em primeiro lugar não é estabelecido, nem demonstrado, o nexo de causalidade entre a realização dos investimentos e a referida contratação. Não se alcança como: a aquisição de uma robô de cardagem de calçado - que até veio permitir a automatização de uma função executada manualmente; a aquisição de uma máquina de costura - que veio substituir outra; a aquisição de uma máquina de rebater; a aquisição de um sofione - usado no processo de colagem das peles; um grupo de lâminas - meros componentes de uma máquina de digitalização e corte de peles; os moldes - usados na atividade produtiva de outras empresas; computadores; servidores; antivírus e por fim a adaptação de um edifício; espoletou a contratação de um diretor técnico. O diretor técnico não veio manobrar qualquer um desses equipamentos e o seu posto de trabalho até se localiza no edifício antigo. Efetivamente, nem o investimento realizado constitui um investimento inicial, de expansão, nem revela qualquer aptidão para criar postos de trabalho, muito menos este cargo específico, que está associado ao estabelecimento como um todo e não ao investimento em concreto e o sujeito passivo não logrou provar o contrário.

De facto, este posto de trabalho mantém-se até aos dias de hoje, mas à custa da diminuição de outros postos de trabalho. Em dezembro de 2018 a empresa registava menos 3 trabalhadores (abrangidos por contrato sem termo) comparativamente a dezembro de 2017. Em 2019 recuperou um, mas logo no ano seguinte voltou a perder dois trabalhadores nestas condições. Ou seja, em dezembro de 2019, volvido 3 anos, a empresa apresentava um quadro de 55 trabalhadores com contrato sem termo, contra os 59 que apresentou em 2017.

Como é óbvio, não se pode considerar que a empresa criou e manteve os postos de trabalho criados durante os três anos seguintes, conforme exige a alínea f) do nº 4 do artigo 22º do CFI.

Ora, conforme consta do PRIT, para poder usufruir do benefício fiscal no âmbito do RFAI, o investimento tem que proporcionar a criação de postos de trabalho, e que essa criação de postos de trabalho deve ser feita "à custa" de contratos de trabalho sem termo, única modalidade contratual admitida para o preenchimento de novas funções criadas por um investimento inicial (artigo 140.º do Código do Trabalho). E que pese embora tal facto, o cumprimento daquela condição legal exige a verificação concomitante de acréscimo efetivo do número global de trabalhadores admitidos na empresa em determinado exercício, sob pena de não haver qualquer criação de emprego, mas mera substituição ou mesmo redução do nível de empregabilidade na empresa e na região.

Também neste âmbito a A... não logrou cumprir este objetivo, não revelando o investimento realizado qualquer aptidão para o aumento geral do nível de empregabilidade na empresa (não é um investimento de expansão), tendo-se registado uma diminuição do número total e trabalhadores ao seu serviço nos anos 2018 e 2020, ou seja, durante o período mínimo de manutenção dos postos de trabalho imposto pelo RFAI.

Relembra-se que o RFAI é um auxílio estatal com finalidade regional, excecionalmente permitido, sujeito ao cumprimento de condições rigorosas associadas ao investimento, designadamente, que permita a criação de emprego num contexto sustentável, contribuindo assim para o desenvolvimento das regiões. Nesse sentido é aceite o apoio a projetos de investimento inicial relacionados (entre outros) com o aumento de capacidade de um estabelecimento existente, sendo, como o termo indica (investimento inicial), incremental em relação ao investimento já existente. Não se pretende apoiar investimentos correntes, sejam de funcionamento, de atualização, de substituição ou outros, apenas porque uma empresa procede a uma maior especialização no seu portfólio. Pretende-se sim que os auxílios levem a uma alteração no comportamento das empresas, de forma a exercerem atividade adicional, com o necessário aumento da capacidade, através da expansão de linhas de produção, que levará necessariamente à criação de postos de trabalho adicionais.

VIII. Outras considerações

Quanto aos bens adquiridos no ano 2016 à B... Lda, empresa relacionada com a A..., no estado de usados, considerados pelo sujeito passivo para efeitos de reinvestimento da DLRR constituída no ano 2015, o sujeito passivo não apresenta qualquer consideração. Este investimento, que perfaz o montante de € 89.920,00 e representa 37% do investimento desse ano, encontra-se expressamente excluídos do âmbito da DLRR, por não se considerarem aplicações relevantes nos termos do artigo 30.º do CFI.

Também nada refere quanto à inclusão no investimento relacionado de mobiliário, televisor, telemóvel, telefone, fotocopiadora, impressora, antivírus, entre outros. De forma evidente tratou-se de varrer praticamente todas as aquisições de AFT efetuadas neste período para aproveitamento dos benefícios fiscais. Ou seja, tratou-se de mera poupança fiscal sem quaisquer contrapartidas.

IX. Conclusão

À semelhança do dossier apresentado pelo sujeito passivo para efeitos de justificação das deduções à coleta por utilização dos benefícios fiscais RFAI e DLRR operadas nas declarações fiscais dos anos 2017 a 2019, o sujeito passivo expõe agora, neste direito de audição, um conjunto de afirmações e considerações completamente genéricas e insustentadas, sem apresentar quaisquer contraposições factuais que permitam colocar em causa as conclusões vertidas no PRIT, sem enfrentar verdadeiramente a maior parte dos seus argumentos, e sem admitir que, efetivamente, incumpriu os comandos legais subjacentes aos respectivos regimes.

Assim, ao não apresentar quaisquer elementos novos, concretos, a propósito dos pressupostos e condições de que dependem os benefícios fiscais, cuja falta de verificação e cumprimento o PRIT expõe claramente, consideram-se não cumpridas as condições objetivas e obrigatórias para usufruir dos Benefícios Fiscais (RFAI e DLRR), nos anos de 2017, 2018 e 2019, pelo que se irão manter as correções propostas no Projeto de Relatório.

F) Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu as seguintes liquidações de IRC e juros compensatórios:

i) liquidação n.º ...42, de 28-03-2022, relativa ao exercício de 2017, da qual resultou € 143.333,39 a pagar, em que se inclui o valor de € 69.603,85 de juros compensatórios, quantia aquela que a Requerente pagou em 17-05-2022 (documentos n.ºs 1 e 2 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzido);

ii) liquidação n.º ...24, de 04-04-2022, relativa ao exercício de 2018, da qual resultou € 71.090,40 a pagar, em que se inclui o valor de € 23.007,09 de juros compensatórios, quantia aquela que a Requerente pagou em 25-05-2022 (documentos n.ºs 1 e 2 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzido);

iii) liquidação n.º ...96, de 07-04-2022, relativa ao exercício de 2019, da qual resultou € 30.881,97 a pagar em que se inclui o valor de € 1.774,35 de juros compensatórios, quantia aquela que a Requerente pagou em 30-05-2022 (documentos n.ºs 1 e 2 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzido);

G) Em 03-03-2021, foi enviado pela Autoridade Tributária e Aduaneira à Requerente o ofício que consta do documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, expedido pelos Serviços de Inspecção Tributária em que se refere, além do mais, o seguinte:

«Assumo: Pedido de elementos/esclarecimentos

Tendo-se verificado, através da análise ao Anexo D da declaração de rendimentos Modelo 22, que efetuou dotações de benefícios fiscais no âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI) e da Dedução por Lucros Retidos e Reinvestidos (DLRR), previstos no Código Fiscal do Investimento (CFI), solicita-se a V. Exa(s). que, no prazo de 15 dias, apresente a estes Serviços os seguintes elementos ou esclarecimentos, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 8.º da Portaria nº 297/2015, n.º 4.º do artigo 59.º da Lei Geral Tributária (LGT) e nos artigos n.ºs 9.º e 28.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA):

. Balancete geral analítico do(s) ano(s) de 2016 a 2019, mas 13; (anos de formação das dotações e deduções)

. Justificação para a dotação do período de 2017, no montante de 83.894,76 €, em sede de RFAI, a dedução do período de 2016, no montante de 19.905,82 €, em sede de DLRR, declaradas no quadro 07 do Anexo D, juntando o suporte documental integrado no processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º do Código do IRC, em conformidade com o determinado pelos n.ºs 1 e 2 do artigo 25º e pelos nºs 1 e 2 do artigo 33.º. ambos do CFI. e artigo 7.º da Portaria nº 297/2015, que permita aferir os requisitos substantivos e formais exigidos pelos diplomas legais a que se reportam, designadamente, que identifique o projeto de investimento realizado e demonstre o seu enquadramento numa das tipologias de investimento inicial, discrimine as aplicações relevantes, justifique a elegibilidade do CAE, os postos de trabalho diretamente criados pelo investimento que tenham permitido aumentar o nível de emprego na empresa e na região, e outros elementos considerados relevantes;

. Extrato da(s) conta(s) onde se encontram registados os investimentos a que se refere(m) o(s) ponto(s) anterior(es);

A resposta a presente notificação poderá ser feita pelo endereço de correio eletrónico (para o endereço ..........@.....), remessa postal, ou mediante entrega nestes Serviços.

Alerta-se que, nos termos do nº 2 do artigo 14º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), conjugado com o nº 2 do artigo 14.º da Lei Geral Tributária, a falta de apresentação de elementos e esclarecimentos relevantes para efeito de controlo dos benefícios fiscais, consubstancia, por si só, o incumprimento das obrigações acessórias e do dever de esclarecimento impostas ao beneficiário, implicando a caducidade dos benefícios fiscais em causa.».

H) Relativamente ao exercício de 2017, a inspecção foi realizada ao abrigo da Ordem de Serviço ...89, iniciou-se em 15-07-2021 e foi concluída em 23-02-2022 (documento n.º 5, página 7, e documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

I) Por despacho de 08-10-2021, foi alterado o âmbito da inspecção, com os seguintes fundamentos que constam da respectiva proposta (páginas 164 e 168, da 4.ª parte do processo administrativo):

«No âmbito deste procedimento foi verificado que, parte do investimento realizado no ano 2017, foi considerado reinvestimento da reserva constituída para efeitos de DLRR, relativa aos lucros gerados no ano 2015.

Conforme informado pelo sujeito passivo o restante reinvestimento foi concretizado no ano 2016. Nestes termos, para efeitos de verificação deste investimento, propõe-se o alargamento da extensão do presente procedimento inspetivo ao ano 2016, âmbito parcial-IRC.

Relativamente a dedução DLRR declarada no ano 2016, o sujeito passivo informou que o reinvestimento foi concretizado nos anos 2018 e 2019.«».

J) O despacho referido na alínea anterior foi notificado à Requerente por carta registada expedida em 11-10-2021, que foi entregue à Requerente em 18-10-2021 (documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

K) Na sequência deste despacho, foi realizada uma inspecção à Requerente, relativa a IRC e ao exercício de 2016, destinada à «consulta, recolha e cruzamento de elementos», designadamente «análise do investimento em que se concretizou parte da DLRR de 2015», iniciada em 21-10-2021 (página 158 da 4.ª parte do RIT);

L) Relativamente ao exercício de 2018, a inspecção foi realizada ao abrigo da Ordem de Serviço ...78, iniciou-se em 21-10-2021 e foi concluída em 23-02-2022 (documento n.º 5, página 9);

M) Relativamente ao exercício de 2019, a inspecção foi realizada ao abrigo da Ordem de Serviço ...79, iniciou-se em 21-10-2021 e foi concluída em 23-02-2022 (documento n.º 5, página 9);

N) Em 2017 a Requerente foi alvo de um procedimento inspetivo externo de controlo declarativo, credenciado pela ...82, que incidiu sobre o ano 2016, de que resultaram correcções em sede de IRC (página 63 do RIT);

O) Em 12-10-2021, a Administração Tributária enviou à Requerente o email que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se indica como «Assunto: DLRR 2015 e 2016 - agendamento de visita à empresa» e se refere, além do mais, o seguinte:

«Para efeitos de verificação física dos investimentos realizados nos anos 2016, 2018 e 2019, para efeitos de DLRR, solicita-se o agendamento de visita à sociedade A..., preferencialmente durante esta semana.

Nesse dia deverão ser apresentadas cópias de todos os documentos justificativas associados ao investimento realizado, designadamente, faturas, orçamentos, contratos, entre outros mais que considere relevantes para justificação das deduções declaradas»;

P) A Requerente não foi notificada da possibilidade de solicitar a reunião de regularização tributária que se refere no artigo 58.º-A do RCPITA;

Q) Em 11-05-2016, a Requerente submeteu à AT, a declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC, relativa ao exercício de 2015, nos termos previstos no artigo 117º, nº 1, alínea b), do Código do IRC, na qual apurou lucro tributável de € 1.033.622,46, uma coleta de € 216.460,72 e imposto a pagar de € 123.135,80 (documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

R) Nesta declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC, relativa ao exercício de 2015, a Requerente deduziu à coleta o montante de € 54.115,18, relativo a Dedução por Lucros Retidos e Reinvestidos (DLRR);

S) Em 29-05-2017, a Requerente submeteu à AT, a declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC, relativa ao exercício de 2016, na qual apurou lucro tributável de € 390.417,26, uma coleta de € 81.387,62 e imposto a pagar de € 54.381,62 (documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

T) Posteriormente, em 21-11-2017, a Requerente submeteu à AT uma declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC de substituição, relativa ao mesmo exercício de 2016, na qual apurou um lucro tributável de € 400.723,62, uma coleta de € 83.551,96 e imposto a recuperar de € 52.062,69 (documento n.º 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

U) Nesta declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC, relativa ao exercício de 2016, a Requerente deduziu à coleta o montante de € 19.905,82, relativo a DLRR (documento n.º 14);

V) Posteriormente, em 02-05-2018, a Requerente submeteu à AT, a declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC, relativa ao exercício de 2017, na qual apurou lucro tributável de € 189.660,56, uma coleta de € 39.228,72 e imposto a recuperar de € 47.717,24 (documento n.º 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

W) Nesta declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC, relativa ao exercício de 2017, a Requerente, inscreveu no campo 714, do quadro 074, do Anexo D, uma dotação do período a título de crédito fiscal de RFAI, no montante de € 83.894,76, do qual foi deduzido à coleta do período, o montante de € 19.614,36 (Campo 715);

X) No decurso da inspecção tributária, a Requerente apresentou o relatório do RFAI que consta do documento n.º 16 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

Y) Em 10-11-2021, os Serviços de Inspecção Tributária expediram para a B... LDA, NIF ...51, o pedido de elementos que consta do documento n.º 17 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, tendo esta empresa enviado por carta registada, em 10-12-2021, os documentos que constam desse documento;

Z) A solicitação da Requerente, o Centro Tecnológico do Calçado em Portugal (CTCP) elaborou, em Junho de 2022, a Memória Descritiva que consta do documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, que visa contextualizar «em termos estratégicos, os investimentos efetuados pela empresa A..., S.A. (A...) nos anos de 2016 a 2019», em que se refere, além do mais, o seguinte:

«A A..., ao longo dos anos de 2016 a 2021, deu continuidade e reforçou a sua estratégia de diferenciação através do desenvolvimento de produtos para nichos técnicos, cada vez de maior valor acrescentado, e procura de novos mercados geográficos. A estratégia da empresa visou reduzir a exposição a segmentos de mercado em que o fator preço tem um peso muito relevante nos fatores competitivos. Deste modo, a A... apostou numa estratégia de nicho com conceção e desenvolvimento, comercialização e produção de calçado para os seguintes nichos técnicos:

. Calçado outdoor – calçado desenhado para atividades na natureza devendo, por isso, o calçado integrar características waterproof (impedir a penetração de água) e incluir solas com elevada capacidade de resistência à abrasão e antiderrapante.

. Calçado para equitação – botas de cano alto (para proteção das pernas), com diferentes larguras de cano e altura o que implica a necessidade de um elevado grau de personalização do produto no seu desenvolvimento e produção;

. Calçado de segurança (uso profissional) – calçado desenvolvido para ser utilizado em atividades profissionais com riscos diversos e cujas características devem ser adaptadas ao tipo e grau de riscos envolvidos na sua utilização. O processo de desenvolvimento, seleção de materiais e de produção é exigente pois o calçado deve cumprir especificações de Normas ISO para obter marcação CE.

Esta estratégia de nicho foi sendo aprofundada através do desenvolvimento de produtos com maior incorporação de fatores diferenciadores, produtos com design próprio exclusivo, personalização (no calçado para equitação) e criação de marca própria. Uma estratégia de nicho implica o domínio técnico do processo de desenvolvimento e produção, a captação, formação e manutenção de recursos humanos competentes, o conhecimento de mercados específicos, o recurso a tecnologias específicas de gestão, conceção e desenvolvimento e de produção. A estratégia de nicho foi suportada na inovação ao nível dos processos e tecnologia e na implementação de um plano de investimentos, de modo a permitir à A... desenvolver a sua capacidade para produzir calçado tecnicamente mais complexo, com maior conteúdo de trabalho, com alargamento de portefólio de produtos e, como tal, com séries de produção (dimensão média de notas de encomenda) de menor dimensão.

O resultado desta estratégia de inovação foi a alavancagem da A... para segmentos de mercado de maior valor acrescentado. Entre os anos de 2014 e de 2018, a A... diminuiu a quantidade de pares vendidos e a quantidade de pares produzidos na sua unidade industrial, mas aumentou em cerca de 38% o preço médio de venda. A A... reduziu a sua exposição a segmentos de mercado que têm o preço como principal fator competitivo diminuindo o risco de concorrência com países de mão de obra de menor custo (..., ..., ...) e aumentando, significativamente, as condições para desenvolver e reforçar a sua atividade em Portugal. A tabela seguinte evidencia, com dados quantitativos, o percurso da A... entre os anos 2014 a 2021:

[IMAGEM]

(...)

Esta estratégia produziu resultados efetivos, com subida da empresa na cadeia de valor captando mais valor através do desenvolvimento de coleção própria e marca própria, aumentando o preço médio de venda em 40% através da capacidade de desenvolvimento e produção de calçado técnico mais complexo e com maior nível de personalização.

O objetivo da empresa foi o de prosseguir uma estratégia de inovação e foco em produtos de nicho de modo a aumentar a rentabilidade do negócio e reduzir a exposição a concorrência de baixos preços.

Para atingir este propósito a empresa planeou e implementou um conjunto de ações e investimentos faseados e articulados em quatro domínios fundamentais:

. Prototipagem – para aumentar a sua capacidade de desenvolvimento de produtos diferenciadores e exclusivos e melhorar a qualidade e valor acrescentado do portefólio de produtos;

. Processos de gestão – de modo a assegurar uma melhor capacidade de gerir com eficácia um maior volume de informação e dispor de mecanismos de controlo dos seus processos de gestão atempados e eficazes;

. Produção – para dotar a área industrial de versatilidade, agilidade e maior capacidade de produção de produtos mais complexos (com maior conteúdo de trabalho), com pequenas séries e customização com níveis elevados de produtividade e qualidade;

. Internacionalização – para procura sistemática de segmentos de mercado de maior valor acrescentado, dispersando assim o risco do negócio.

AA) A Requerente elaborou os catálogos de produtos que produziu e comercializou que constam do documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

BB) A Requerente investiu em 2019 na aquisição da máquina de cardar desbastar fundo ... K174 que se refere no documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

CC) A Requerente investiu na aquisição de uma máquina de fechar Ormac e uma máquina de montar e fechar bicos ... K078, nos montantes de € 80.000,00 e € 71.650,00, em 2020 e 2021 (documentos n.ºs 20 e 31 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

DD) As máquinas referidas foram incorporadas na linha de produção da unidade fabril a montante da célula robotizada de cardagem adquirida em 2017 (documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

EE) Em 16-10-2017, a Requerente cedeu a utilização de parte do edifício n.º ...4 à B... através do contrato de cedência de utilização de edifício, que consta documento n.º 22 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

FF) O edifício n.º ...4 corresponde à planta que consta do documento n.º 23 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

GG) Nos anos de 2017 a 2019, a Requerente dispunha de contabilidade organizada, de acordo com a normalização contabilística aplicável (Certificação Legal de Contas da Requerente que constam do documento n.º 24 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

HH) As duas máquinas de costura PFAFF alienadas pela Requerente em 2017 tinham sido adquiridas em 2005 (mapa de mais e menos-valias que consta do documento n.º 25 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

II) As máquinas de costura referidas foram transmitidas para a empresa C... Unipessoal, Lda, NIF ...84, pelo valor referido no documento n.º 26 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, sendo já delas destinada a abate;

JJ) O mapa de depreciações da Requerente relativo ao exercício de 2016 tem o teor que consta do documento n.º 28 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

KK) O mapa de depreciações da Requerente relativo ao exercício de 2018 tem o teor que consta do documento n.º 32 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

LL) No exercício de 2017, na sequência dos investimentos efetuados, a Requerente contratou um novo funcionário com o cargo de Director Técnico, que é AA (cópia do contrato de trabalho celebrado entre a Requerente e o novo trabalhador, que consta do documento n.º 29 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas BB, AA, CC e DD);

MM) O referido Director Técnico manteve-se no exercício das funções até o mês de Dezembro de 2020 (documento n.º 30 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimentos das testemunhas BB, AA e DD);

NN) O referido Director Técnico é uma pessoa altamente qualificada para o calçado diferenciado específico que a Requerente passou a produzir e tinha experiência anterior, como responsável pelo gabinete de desenvolvimento do Centro de Formação Profissional da Indústria de Calçado e professor de modelação em CAD 2D e CAD em 3 dimensões (depoimentos das testemunhas BB e AA);

OO) O referido Director Técnico trabalha no desenvolvimento dos protótipos e modelação e acompanha todo o processo de produção até ao produto final e inclusivamente também o acabamento (depoimentos das testemunhas BB e AA);

PP) Quando ocorreu a robotização do processo produtivo, em 2017, o referido Director Técnico era a única pessoa que sabia trabalhar nisso (depoimentos das testemunhas BB e AA);

QQ) Os conhecimentos de informática que o referido director técnico possuía foram indispensáveis para conseguir pôr em funcionamento das máquinas adquiridas pela Requerente (depoimento da testemunha AA);

RR) A utilização de robot de cardagem foi uma solução inovadora, sendo a primeira empresa a nível nacional a desenvolver uma situação dessas (depoimento da testemunha AA);

SS) Ao procurar implementar essa utilização, a Requerente apercebeu-se de que as máquinas que antes estavam acopladas, que estavam dentro da linha de montagem, não eram suficientemente rigorosas e eficazes para boas condições e rentabilidade ao trabalho que o robô estava a fazer (depoimento da testemunha AA);

TT) Por essa razão, a Requerente adquiriu outras máquinas para melhorar o trabalho para o robô, designadamente máquinas de retirar o excesso por baixo, máquinas de desbaste, máquinas de montar bicos e de fechar calcanheiras (depoimento da testemunha AA)

UU) Essas máquinas adquiridas, além de serem novas, são adequadas a outra ideologia de trabalho, todas com possibilidade de programação informática (depoimento da testemunha AA);

VV) A utilização dessas máquinas, aumentou a capacidade de produção geral da Requerente, para além de aumentar a capacidade de produção de todos os produtos simultaneamente, enquanto muitas das vezes em empresas convencionais têm que ter necessidade de criar várias linhas, onde cada produto trabalha numa linha, onde vai ter máquinas específicas para cada produto (depoimentos das testemunhas AA e CC);

WW) Todas essas máquinas estão ligadas à rede, sendo todos os dados guardados no servidor e computadores, que têm de proporcionar condições de segurança (depoimento da testemunha AA);

XX) A IES da B... Lda relativa ao exercício de 2017 tem o teor que consta do documento n.º 34 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

YY) Em 2015, ocorreu a saída dum sócio da Requerente, que criou uma outra empresa de produção de calçado, levando para seu cliente o melhor cliente da Requerente, que era a empresa D... GMBH da ..., que adquiria anualmente cerca de 2 milhões de euros de produtos da Requerente (depoimentos das testemunhas BB e EE);

ZZ) A perda desse grande cliente alemão e provocou prejuízos nos anos de 2015 e 2016 (depoimento da testemunha BB);

AAA) Para manter a sua quota de mercado, que Requerente começou, em 2016, a equacionar uma reorientação estratégica de investimento (depoimentos das testemunhas BB e EE);

BBB) Essa reorientação concretizou-se em 2017, com a diferenciação da produção, através do desenvolvimento de produtos para nichos técnicos, cada vez de maior valor acrescentado, e procura de novos mercados geográficos e reconduziu-se a que a Requerente passou apostar na produção de calçado técnico e especializado (como calçado outdoor, calçado de equitação e calçado de segurança para uso profissional), que não produzia até então (depoimentos das testemunhas BB e EE e AA e documento n.º 18);

CCC) A estratégia de nicho foi suportada na inovação ao nível dos processos e tecnologia e na implementação de um plano de investimentos, de modo a permitir à Requerente desenvolver a sua capacidade para produzir calçado tecnicamente mais complexo, com maior conteúdo de trabalho, com alargamento de portefólio de produtos e, como tal, com séries de produção (dimensão média de notas de encomenda) de menor dimensão (documento n.º 18);

DDD) Essa aposta em calçado técnico e especializado permitiu aumentar a capacidade produtiva da Requerente, o preço médio de venda do calçado e o volume de negócios (depoimentos das testemunhas BB, EE e AA);

EEE) Para essa reorientação foi necessária uma nova linha de produção, bastando uma reorganização da mesma, aproveitando-se o espaço existente de forma diferente (depoimento da testemunha FF

FFF) A Requerente continuou a comercializar os produtos que produzia antes da reorientação da sua actividade, fazendo subcontratração (depoimento da testemunha FF

GGG) Os produtos fabricados pela Requerente depois da reorientação são diferentes dos produzidos anteriormente e mais complexos (depoimento da testemunha CC);

HHH) Com estes novos produtos, a Requerente conseguiu obter novos clientes em mercados estrangeiros, como o ..., a ..., a ... e a ... (depoimentos das testemunhas BB e EE);

III) Para obter esses novos clientes, a Requerente participou em várias feiras, designadamente em ..., ..., ..., ... e nos ... (depoimento da testemunha EE);

JJJ) Entre os anos de 2014 e de 2018, a Requerente diminuiu a quantidade de pares vendidos e a quantidade de pares produzidos na sua unidade industrial, mas aumentou em cerca de 38% o preço médio de venda (documento n.º 18);

KKK) Para concretizar essa reorientação da produção, a Requerente necessitou de efectuar investimentos, como a introdução de um robot de cardagem, equipamentos para montagem de calçado, incluindo calçado waterproof, moldes de solas e palmilhas (documento n.º 18 e depoimentos das testemunhas EE e FF;

LLL) O sistema robotizado de cardagem assume grande importância, por a operação de cardagem ser crítica para assegurar a qualidade dos produtos, nomeadamente no caso dos produtos técnicos, pois é base da colagem do produto (depoimentos das testemunhas EE e FF;

MMM) Em 2019, quando já tinha ultrapassado o período de adaptação aos novos equipamentos e passou a alcançar economia de escala relativamente à estratégia planeada em 2016 e concretizada a partir de 2017, a Requerente atingiu e ultrapassou o volume de negócios que tinha antes da perda do cliente D... (depoimento da testemunha BB);

NNN) Com o aumento da produção a Requerente passou a ter necessidade de melhor organização e armazenamento de matérias-primas, pelo que adquiriu o edifício em frente (n.º ...4), que estava afecto à indústria corticeira (depoimento da testemunha BB);

OOO) O edifício adquirido teve de ser remodelado e adaptado à actividade da Requerente (depoimentos das testemunhas BB e FF;

PPP) Uma parte do edifício adquirido foi destinada a armazenagem de matérias-primas, com melhor organização, adequada à maior diversificação necessária à nova produção muito diferenciada (depoimento da testemunha BB e FF;

QQQ) A aquisição do edifício foi rrelevante para a gestão de stocks, pois é importante ter a informação sobre os stocks em dia, para não haver atrasos nas encomendas (depoimento da testemunha FF;

RRR) Outra parte do edifício adquirido foi utilizada por serviços administrativos da Requerente (depoimentos das testemunhas FF e CC);

SSS) Foi incluída no edifício adquirido uma secção de corte, com máquinas específicas para dar continuidade às operações de fabrico da Requerente, bem como uma máquina de testes dos produtos (depoimentos das testemunhas BB e CC);

TTT) Uma parte do edifício adquirido foi ocupada pela associada da Requerente B... Lda, que pertence aos sócios da Requerente e é gerida pelas mesmas pessoas (depoimentos das testemunhas BB e CC);

UUU) A B... Lda, costura gáspeas para a Requerente, que fornece a matéria-prima (depoimento da testemunha BB);

VVV) A B... Lda, produz exclusivamente para a Requerente (depoimento da testemunha BB);

WWW) A maior parte do edifício adquirido está afecta à Requerente, quer em área quer em volumetria (depoimentos das testemunhas BB e CC e documento n.º 23 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

XXX) Houve uma cedência de espaço à B... Lda, e não um contrato de arrendamento, sendo a electricidade e água paga pela Requerente, que assegura também as despesas de manutenção, de limpeza e de segurança (depoimentos das testemunhas BB e CC);

YYY) A B... paga por toda essa gestão de serviços e cedência de espaço cerca de dois mil e oitocentos euros mensais (depoimento da testemunha BB);

ZZZ) A Requerente dispõe de um servidor para carregar toda a informação relativa ao funcionamento das máquinas e dos equipamentos e para dar as respostas necessárias (depoimento da testemunha BB);

AAAA) O departamento de modelação da Requerente funciona com computadores, com software adequado que controla as máquinas de corte, que são totalmente digitais, com equipamentos informáticos acoplados (depoimento da testemunha BB);

BBBB) Não seria viável o funcionamento da Requerente com os novos equipamentos sem os sistemas informáticos (depoimento da testemunha BB);

CCCC) Nos anos de 2016 e 2017, a Requerente informatizou o processo de gestão e produção integrado, desde o desenvolvimento do produto, a recepção das encomendas, as compras, os stocks, até à produção e ao controlo de produção (depoimento da testemunha EE);

DDDD) Ainda em 2016, no âmbito da estratégia de investimento, de expansão da capacidade de produção do produto técnico, a Requerente fez investimento na aquisição de moldes para solas ..., ... ou ..., ..., aquisição de moldes para solas de ..., aquisição de moldes para solas e palmilhas Newchester (depoimentos das testemunhas EE e FF;

EEEE) Os moldes são para produzir as solas, que são necessárias para os novos produtos (depoimento da testemunha FF e GG);

FFFF) A Requerente, para desenvolver um produto diferenciador e para nichos de mercado, e com mais conteúdo técnico, tinha que desenvolver as suas próprias solas, pois um produto muito técnico, específico, novo, tem que ter novos moldes, para novas solas (depoimentos das testemunhas FF e GG);

GGGG) Antes da utilização do robot, a Requerente utilizava formas em plástico, para poder montar as gáspeas em cima dos sapatos, sendo necessárias duas operações manuais, que é o remate da biqueira e da parte de trás, operações estas que podiam ter variações de milímetros, o que não era a precisão necessária para a programação com o robot (depoimento da testemunha AA);

HHHH) Para utilização, foram criadas de formas digitalmente com alta precisão até cinco décimas e alguns dos moldes que existiam na Requerente anteriormente não eram compatíveis com essa precisão, pelo que foi necessário criar novos para a Requerente poder obter produtos condições técnicas perfeitas (depoimentos das testemunhas AA e GG);

IIII) Os moldes são em ferro ou em alumínio, pesando centenas de quilos e são sempre compostos por uma parte inferior e superior, que se fecham, onde o material ou é injetado, ou é colocado no interior e é cosido, dependendo da matéria-prima (depoimentos das testemunhas AA e GG);

JJJJ) É necessário fazer um molde para cada tamanho e para cada modelo de sola (depoimentos das testemunhas AA e GG);

KKKK) As solas são feitas por uma indústria especializada, faz só solas, não sendo feitas pela Requerente (depoimentos das testemunhas AA e GG);

LLLL) Os moldes criados pela Requerente para os seus produtos são sua propriedade e destinam-se a ser usados exclusivamente para o uso na fabricação dos seus produtos, mas estão no lugar físico onde a empresa que produz as solas ou vai utilizar, o que é prática da generalidade das empresas de produção de calçado (depoimentos das testemunhas AA e GG);

MMMM) A introdução do robot não provocou diminuição de postos de trabalho, porque a pessoa que fazia o trabalho de forma manual, antes, é exatamente a mesma pessoa que trabalha com o robô calçado (depoimento da testemunha AA);

NNNN) A máquina de cardar e desbastar fundo ..., modelo ...04 está antes do robot de cardagem e produz mais rápido do que um operador (depoimento da testemunha FF;

OOOO) Todos os investimentos destinados à reorientação da produção, designadamente o robot e cardagem, as máquinas de corte … e ..., o monitor para uma máquina de corte, a máquina de fechar calcanheiras …, máquina de rebater …, máquina …, grupo de lâminas e os sistemas informáticos, foram pensados de uma forma integrada, coordenada, agregadora, e não de forma dispersa (depoimentos das testemunhas EE e FF;

PPPP) O robot de cardagem foi um investimento disruptivo, constituindo tecnologia de ponta (depoimentos das testemunhas EE, FF e HH);

QQQQ) O robot faz o trabalho de cardagem de sapatos de uma forma mais rápida do que por outros meios, adapta-se automaticamente a cada tipo de sapato e repete as operações sempre da mesma forma, sem falhas ou erros, eliminado a necessidade de repará-los (depoimento da testemunha HH);

RRRR) Com o robot de cardagem é possível à requerente fabricar facilmente produtos que antes seria extremamente difícil produzir (depoimento da testemunha HH);

SSSS) As operações de costura são operações muito demoradas, pelo com a aquisição de novas máquinas mais rápidas, a Requerente passou a ter a capacidade para produzir mais, com mais eficiência (depoimento da testemunha FF;

TTTT) O robot de cardagem traz aumento de capacidade produtiva e aumento de flexibilidade na produção (depoimento da testemunha HH);

UUUU) As máquinas de corte referidas são equipamentos mais flexíveis e que permitem produzir com níveis produtividade elevados, em pequenas séries, mais personalizadas, de maior valor acrescentado e menos generalistas (depoimento da testemunha EE);

VVVV) O robot de cardagem implicou investimentos noutras máquinas e equipamentos, auxiliados por programação, designadamente a máquina de fazer a montagem da biqueira, a máquina de fechar o calcanhar, e a máquina de desbaste, que se ajustassem ao funcionamento do próprio robot (depoimentos das testemunhas FF e AA);

WWWW) A máquina de montar da biqueira e a máquina de fechar calcanheiras, também são muito inovadores para a empresa, uma vez que no passado o operador tinha que estar lá a ajustar a máquina, agora ela ajusta-se sozinha, sendo o tempo de setup muito mais rápido e a máquina é mais eficaz (depoimento da testemunha FF;

XXXX) A aquisição do servidor e computadores, fotocopiadoras, prensas, máquinas de costura, humidificador soprador, aparelho de cortar fita, máquina de moldar, escovadeiras, máquinas de fechar calcanheiras, máquina de montar bicos, secador-reativador, secador, máquina de cardar forro, forno frio, monitor de máquina de corte, máquina de conformar canos de botas a frio, máquina de gravação, marcação em forros, máquina teste de fuga, máquina de cardar e desbastar ..., inseriu-se na estratégia referida de reorientação da actividade da Requerente (depoimento da testemunha FF;

YYYY) Essa nova produção implicou alteração do layout do processo de fabrico, porque com as novas máquinas, a sequência já não estava certa, não era igual, pelo que teve de ser reajustada a sequência produtiva, para não haver perdas de produção (depoimento da testemunha FF;

ZZZZ) Foi a testemunha FF quem fez o layout da nova linha de montagem e acompanhou a sua articulação, organizando a linha de produção forma diferente e com equipamentos diferentes (depoimento da testemunha FF;

AAAAA) Não foi necessária uma nova linha de produção, mas alteração da existente, com grande intervenção e inovação tecnológica na linha de produção, designadamente pela inclusão do robot de cardagem e necessidade de adequar as restantes máquinas a sua intervenção (depoimento da testemunha FF;

BBBBB) O material de comunicação e interligação entre todas as secções da Requerente é necessário ao seu funcionamento, inclusivamente por estarem em edifícios diferentes (depoimento da testemunha BB);

CCCCC) O Centro Tecnológico de Calçado presta serviços à Requerente desde 2015, na área laboratorial, na área de implementação do sistema de gestão da qualidade, em estudos de layout de fabrico, projetos, candidaturas a programas de incentivos, estudos e implementação de processos de melhoria na área de stocks e na área de armazém, entre outras (depoimento da testemunha EE);

DDDDD) Centro Tecnológico de Calçado colaborou com a Requerente na definição do plano estratégico implementado em 2016 e 2017 (depoimento da testemunha EE);

EEEEE) A maior parte dos equipamentos encontravam-se em utilização, quando os Serviços de Inspecção Tributária visitaram as instalações da Requerente (depoimento da testemunha DD);

FFFFF) A prensa programada Mod P2000 TS adquirida pela Requerente em 2016 foi alienada em 2020 (RIT);

GGGGG) A Requerente foi notificada das seguintes liquidações de juros compensatórios:

– quanto à liquidação relativa ao exercício de 2017:

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– quanto à liquidação relativa ao exercício de 2018:

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– quanto à liquidação relativa ao exercício de 2019:

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HHHHH) Em 08-08-2022, a Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

2.2. Factos não provados

2.2.1. Não se provou em que data foi entregue à B... Lda, o ofício que consta do documento n.º 17.

A Requerente diz que a carta, que foi expedida pela Autoridade Tributária e Aduaneira em 10-11-2021, foi recebida por aquela empresa «apenas no dia 30 de novembro de 2021, por motivos a que a mesma é absolutamente alheia», mas não há qualquer prova de que isso corresponda à realidade.

2.2.2. Não se provou que tenha existido actividade inspectiva relativa ao ano de 2015.

2.2.3. Não se provou que a impressora Digital a Cores lcube adquirida pela Requerente, referida no RIT, tenha contribuído para a criação de postos de trabalho nem que tenha sido relevante na reorientação da actividade da Requerente e aumento da capacidade dela decorrente.

Também não se apurou que as impressoras adquiridas pela Requerente em 2018 (uma impressora de escritório OKI C612N – Euro (http://pt.all-specs.net/model/1473466/) e uma impressora de etiquetas e recibos Zebra portátil QLN 420 Wireless (http://www.myzebra.com.pt/pt/zebra-mobile-qln-series/4088-zebra-qn4-aunbem11-00.html.)) estejam relacionadas com o aumento da capacidade da Requerente, designadamente a forma com elas eram utilizadas na produção. Na verdade, nenhuma das testemunhas explicitou essa possível relação e ela não existe necessariamente, pois podem ser utilizadas para a actividade administrativa e comercial, que normalmente reclama a emissão de documentos em papel.

2.2.4. Não se apurou que o material de comunicação adquirido pela Requerente tenha relação com a reorientação estratégica da Requerente e a opção pela robotização que implementou.

2.2.5. Não se provou que os equipamentos adquiridos a B... pela Requerente que esta considerou como investimentos relevantes para DLRR no ano de 2016 tenham sido adquiridos em estado de novos.

Na verdade, como se refere no RIT, a B... registou os equipamentos na sua contabilidade em 2016, pelo que não é crível [à face das regras da experiência que o tribunal arbitral deve utilizar, nos termos da alínea e) do artigo 16.º do RJAT] que estivessem em estado de novos em 2016, quando os adquiriu.

2.2.6. Não se provou que o mobiliário e o telemóvel Apple Iphone considerados pela Requerente para efeitos da DLRR tenham conexão com o aumento da capacidade de produção da Requerente.

A prova produzida não permite vislumbrar essa eventual conexão.

2.2.7. Não de provou que o televisor LCG Led e respetivo cabo HDMI, instalado na designada sala de amostras já existente nas instalações da Requerente tenham conexão com o aumento da capacidade da Requerente.

Na verdade, não foi apresentada qualquer prova dessa relação, nem ela é perceptível a face da prova produzida.

3.1.2. Julgamento de facto da decisão fundamento proferida no processo nº 427/2020-T:

A. A E..., S.A., aqui Requerente, é uma sociedade de direito português constituída em 1979 para se dedicar ao fabrico de loiças metálicas e alumínios – cf. Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”) junto aos autos, pp. 8 e 11.

B. Em 1983, a empresa apostou na diversificação da área de negócios através da entrada no mercado de pequenos eletrodomésticos, com a produção de fritadeiras e grelhadores elétricos e, em 1986, iniciou a produção de torradeiras, ferros de engomar e louça em aço inoxidável. Em 1998, iniciou a produção de máquinas de café expresso, tendo em 2004 lançado um conceito destas máquinas para unidoses, com o respetivo registo de patentes. Em 2006, procedeu ao lançamento de uma máquina de cerveja de pressão doméstica, em parceria com a H… – cf. RIT, pp.14.

C. Em 2007, a E... abriu uma filial comercial em ... com o objetivo de alargar a distribuição da marca ... na Península Ibérica. Em 2008, iniciou a produção de máquinas de café expresso para cápsulas e, em 2013, lançou a …, uma máquina de cozinhar. Em 2015, constituiu a E... BV na ..., centro dedicado à investigação e desenvolvimento de novos produtos. Em 2016, apostou nos grandes eletrodomésticos, através da introdução de uma gama de fogões e, em 2017, continuou a apostar nesta linha de produtos, introduzindo uma nova gama de encastre – cf. RIT, pp. 14-15.

D. A Requerente dedica-se atualmente, e, bem assim, à data dos factos (2014 a 2017), à atividade principal de Fabricação de Eletrodomésticos (CAE 27510) e às atividades secundárias de Fabricação de louça metálica e artigos de uso doméstico (CAE 025991) e de Fabricação de outros produtos metálicos diversos, n.e. (CAE 025992) – cf. Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”) junto aos autos, pp. 8 e 11.

E. Além da atividade fabril, a Requerente dedica-se à atividade de comercialização de bens adquiridos para revenda que representou, entre 2014 e 2018, uma percentagem média aproximada de 25% do seu volume de negócios – cf. RIT, p. 11.

F. A Requerente fabrica e vende os eletrodomésticos para o mercado nacional e para o mercado externo, com uma ampla gama de produtos que vão evoluindo rapidamente com o tempo, num mercado altamente competitivo, implicando o desenvolvimento de inovação em novos produtos e novas funcionalidades – cf. RIT e depoimento da 3.ª testemunha.

G. Neste âmbito, utiliza máquinas – “Robots” – com fins e funções diferentes. Não servem apenas para a produção de um produto, têm um “tronco” central onde se incorporam diferentes equipamentos específicos para fabricar cada produto: braços mecânicos, garras, prensas, ferramentas de corte, entre outros – cf. Documento 11 e depoimento da 1.ª testemunha.

H. O “tronco central” é um equipamento que tem um período de utilização alargado, pois permite produzir muitos tipos de peças e produtos. Neste são acopladas máquinas ou instrumentos mais pequenos para serem utilizados em conjunto com o “tronco central” na produção das referidas peças e produtos – cf. depoimento da 1.ª testemunha.

I. Estas máquinas ou instrumentos mais pequenos são em regra adquiridas no estado de novo, a utilizar de forma combinada com um ou mais equipamentos antigos (v. o “tronco central” dos “Robots”) na produção dos novos produtos – cf. depoimento da 1.ª testemunha.

J. Os eletrodomésticos produzidos pela Requerente têm componentes plásticos incorporados. Como a Requerente não dispõe de máquinas de injeção de plástico, por ser economicamente inviável, os componentes plásticos são fabricados por outras entidades, fornecedores da Requerente, com base em moldes que são propriedade desta – cf. RIT, pp. 15-17, depoimentos das 2.ª e 3ª testemunhas.

K. A Requerente produz ainda componentes metálicos que integram eletrodomésticos de outras marcas, como, a título de exemplo, a ..., a ... e a ... – cf. RIT, p. 17.

L. Os moldes que pertencem à Requerente são colocados nas instalações dos fornecedores externos que produzem as peças e componentes plásticos que, depois, são integrados nos produtos fabricados por aquela. Estes fornecedores estão maioritariamente localizados em Portugal, num cluster próximo das instalações da Requerente, apenas se recorrendo pontualmente a fornecedores estrangeiros quando se trata de peças plásticas a serem montadas com a incorporação de componentes eletrónicas e em alguns casos de componentes com silicone – cf. RIT, p. 17 e depoimentos das 2.ª, 3.ª e 4.ª testemunhas.

M. Os moldes, que permitem a fabricação das peças plásticas, e as ferramentas, necessárias à criação das peças metálicas, são feitos à medida para o produto específico a que se destinam, não servindo para outro produto. Sem estes moldes e ferramentas não é possível a produção dos componentes (plásticos e metálicos) essenciais aos eletrodomésticos produzidos e comercializados pela Requerente – depoimentos das 2.ª e 3ª testemunhas.

N. Quando deixam de ser utilizados pelos fornecedores, os moldes são armazenados nas instalações da Requerente, podendo voltar a ser reutilizados por aqueles ou por outros fornecedores – depoimento da 2.ª testemunha.

O. O processo de conceção, desenvolvimento e produção de moldes e ferramentas envolve um trabalho de afinação rigoroso, pois os mesmos são utilizados em operações de grande precisão. Até esse processo ficar concluído é, em regra, necessário fazer acertos e modificações, incorrendo a Requerente nos gastos associados, identificados no RIT como “alterações/reparações” e aquisição de “componentes/adições” a moldes e ferramentas – cf. depoimento da 2.ª testemunha e RIT.

P. Em 2014, estava em curso o projeto “...” para a ..., tendo sido feitos investimentos para melhorar o respetivo processo produtivo e o aumento da capacidade produtiva, bem como a produção de máquinas de café ... da linha Office – cf. RIT, p. 30 e depoimentos das 2.ª e 3ª testemunhas.

Q. Foi iniciado em 2015 um novo projeto denominado “...”, de considerável dimensão, que implicou o desenvolvimento de uma nova linha de produção para fabrico do componente “...” da .... A implementação deste projeto mudou a configuração (“layout”) da fábrica para acomodar a nova linha e aproveitar de forma eficiente o espaço existente. Realizaram-se obras e foram adquiridas novas máquinas, por forma a permitir a produção automatizada, tendo o investimento “...” ocorrido nos anos 2015 e 2016, com alguns ajustamentos realizados até ../../2017 – cf. RIT, p. 34 e depoimento da 2.ª testemunha.

R. A Requerente dispõe de um Serviço de Apoio Técnico (SAT) e de um Call Center para apoio ao cliente (serviço pós-venda). Estas áreas visam proceder à reparação dos produtos fabricados e vendidos e responder às questões e reclamações dos clientes. Funcionam em instalações separadas próximas das instalações principais, que servem também de armazém de mercadorias. O serviço de Call Center divide-se em duas partes: apoio a clientes de artigos com a marca ... fabricados pela Requerente e apoio a clientes de artigos com a marca da Requerente, que poderão ou não ter sido por esta fabricados. O serviço de Call Center prestado aos clientes da marca ... é cobrado a estes clientes – cf. RIT, p. 18 e depoimentos das 2.ª e 3.ª testemunhas.

S. O aumento da produção derivado dos novos projetos suscitou o incremento da assistência técnica e do Call Center, tendo aumentado os postos de trabalho nessas áreas. Acresce que, no caso do projeto ..., o contrato celebrado com a Requerente para produção e fornecimento de equipamentos com aquela marca estabeleceu, como obrigação contratual, que a respetiva assistência técnica fosse assegurada por aquela nas suas instalações, o que efetivamente se verifica – cf. depoimento da 2.ª testemunha.

T. Globalmente, o número de trabalhadores da Requerente com contrato definitivo em 2013 era de 77, sendo de 86 em 2017. Se se incluírem os trabalhadores a termo, esse número total era de 83 colaboradores em 2013 e de 116 colaboradores em 2017 – cf. RIT e depoimento da 3.ª testemunha.

U. Nos anos em causa – entre 2014 e 2017 – a Requerente diversificou os produtos produzidos e comercializados e aumentou significativamente o volume de vendas de produção própria que foi, em 2014, de aproximadamente 21 milhões de euros e, em 2017, atingiu 29 milhões – cf. depoimento da 3.ª testemunha.

V. A Requerente foi objeto de um procedimento de inspeção externa, abrangendo os períodos de tributação de 2014, 2015, 2016 e 2018, de âmbito parcial (IRC³), para controlo de benefícios fiscais, visando a confirmação do cumprimento das obrigações do sujeito passivo, ao abrigo das Ordens de Serviço n.ºs ...06 – cf. RIT, pp. 7 e 8.

³Em 2017 e 2018 compreende ainda o IVA, imposto que não está em discussão nos presentes autos.

W. Por diversas omissões e insuficiências do dossier fiscal, que nos anos 2014 e 2015, continha apenas listagens de investimento, sem qualquer indicação do projeto/investimento associado e, nos anos 2016 e 2017, fazia uma menção genérica aos projetos ..., ... “...” e ..., a Requerente foi notificada para prestar informações adicionais e discriminar o investimento relevante, por projeto – cf. RIT, pp. 30 a 42.

X. A Requerente procedeu à referida discriminação e produziu listagens de distribuição do investimento por projeto, acrescentando uma série de outros projetos que não constavam descritos no dossier fiscal, imputando os respetivos documentos de investimento, a saber – cf. RIT, pp. 30 a 42:

a) ..., trabalhos na linha de montagem de grelhadores dessa marca;

b) SAT, aquisição de equipamento para o Serviço de Apoio Técnico/Call Center (sistemas informáticos de apoio ao atendimento e gravação de chamadas, computadores, impressoras e obras);

c) GERAL, telemóveis;

d) ... (aquisição de moldes e ferramentas, e, com menor expressão, de algumas máquinas e pequenas prensas);

e) SUBSTITUIÇÃO (equipamento informático classificado de substituição pela Requerente);

f) E... (sobretudo aquisição de moldes e ferramentas que se encontram junto do fornecedor, e, com menor expressão, algumas máquinas e pequenas prensas).

Y. Além destes projetos, a Requerente distribuiu uma série de equipamentos (essencialmente informáticos) adquiridos pelos projetos: “Dep. Técnico”, “Laboratório”, “Dep. Exportação”, “Dep. Marketing”, “Proteção de dados”, “Receção” e “Site Loja Online” – cf. RIT, pp. 42 a 44.

Z. Na sequência desta ação inspetiva, a Requerente foi notificada do Projeto de Relatório com propostas de correção à matéria coletável de IRC, estando aqui em causa as deduções à coleta ao abrigo do RFAI e do DLRR⁴ . A Requerente exerceu o direito de audição – cf. PA.

⁴ Não foram ainda aceites depreciações relativas aos anos 2016 e 2017, nos valores de € 20.607,22 e € 8.155,34, correções que não fazem parte do objeto da presente ação.AA. Foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”), cujo teor se dá por reproduzido, que corrigiu as deduções à coleta declaradas pela Requerente, conforme resumo do quadro seguinte:

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BB. Estas correções derivam do entendimento de que diversos investimentos não são elegíveis, para efeitos dos benefícios fiscais do RFAI e da DLRR, por duas ordens de razões:

a) Por configurarem investimentos em ativos tangíveis ou intangíveis excluídos nos termos do artigo 22.º, n.º 2, alíneas a) e b) do CFI; e/ou

b) Por serem investimentos isolados, não inseridos no âmbito de um projeto agregador de investimento inicial enquadrável numa das quatro tipologias previstas no artigo 2.º, n.º 49, alínea a) do RGIC. Acresce que, tratando-se de aquisições de bens e serviços avulsos, não configuram investimento “proporcionador de postos de trabalho” (artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI) – cf. RIT, pp. 45 e 50.

c) Em relação ao requisito de criação e manutenção de postos de trabalho, o RIT, após análise do número de funcionários com contratos sem termo conclui “por cumpridas as condições do n.º 4 do artigo 22.º do CFI” – cf. RIT, p. 48.

1. INVESTIMENTOS EM ATIVOS EXCLUÍDOS DO RFAI – ARTIGO 22.º, N.º 2, ALÍNEAS A) E B) DO CFI

CC. Os investimentos desconsiderados pela Requerida, ao abrigo do artigo 22.º, n.º 2, alíneas a) e b) do CFI, correspondem a seis categorias, a seguir descritas – cf. RIT, p. 50.

DD. 1.ª CATEGORIA – INVESTIMENTO EM EQUIPAMENTO DE SUBSTITUIÇÃO – A AT refere que foi a própria Requerente que enquadrou este investimento como equipamento de substituição. Por se tratar da aquisição de equipamento para substituição de outro deteriorado, inoperante ou obsoleto e não configurar investimento inicial com o intuito de aumentar a capacidade do estabelecimento já existente, conclui não ser enquadrável no RFAI – cf. RIT, p. 51:

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EE. 2.ª CATEGORIA – INVESTIMENTO EM MOLDES E FERRAMENTAS E ALTERAÇÕES A MOLDES E FERRAMENTAS E/OU SEUS COMPONENTES, E EM ATIVOS COLOCADOS EM FORNECEDORES EXTERNOScf. RIT, pp. 51 a 56 – Face à inexistência de equipamentos de produção (máquinas de injeção) de componentes plásticos na esfera da Requerente, os moldes e ferramentas adquiridos para a produção desses componentes plásticos, a incorporar nos produtos da Requerente, são apenas utilizados pelos fornecedores dos componentes. Assim, segundo a AT, apesar de serem propriedade da Requerente, não estão em uso, nem foram objeto de uso por parte desta, uma vez que, à data da ação inspetiva, se encontravam junto dos fornecedores, incluindo, em relação a algumas ferramentas, junto de fornecedores chineses. Considera a AT que as aquisições destes moldes e ferramentas não consubstanciam o aumento da capacidade do estabelecimento (já existente) da Requerente, pois as peças produzidas (com esses moldes e ferramentas) são-no fora desse estabelecimento, portanto, sem aumentar a respetiva capacidade, pelo que não são elegíveis para efeitos de RFAI, pois está ínsito no artigo 22.º do CFI que os investimentos sejam utilizados numa atividade da própria empresa que o realiza e não afeto à produção de outras sociedades.

FF. A AT entende, de igual modo, não serem elegíveis para a dedução do RFAI as alterações/reparações e aquisição de componentes/adições aos moldes e às ferramentas existentes, por não integrarem o conceito de investimento inicial (artigo 2.º, n.º 49, alínea a) do RGIC) e por não configurarem ativos tangíveis adquiridos em estado de novo (artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI) – cf. RIT, pp. 51 a 56.

GG. Neste âmbito, foram expurgados da dedução à coleta a título de RFAI os seguintes valores – cf. RIT, pp. 55 e 56:

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HH. 3.ª CATEGORIA – INVESTIMENTO EM EQUIPAMENTO USADO, REPARAÇÕES, MELHORIAS, RENOVAÇÕEScf. RIT, pp. 56 a 64 – A AT identificou equipamentos adquiridos pela Requerente em estado de uso, constantes da fatura n.º ...5 do fornecedor F..., S.L., no valor de € 186.500,00, e, ainda, a aquisição de equipamentos novos de programação e eletrificação de robots e associados à melhoria, renovação ou reparação de prensas e máquinas usadas, como as prensas ... (aquisição de sistema de automação), Arisa (renovação da prensa), ... (conjunto vibrachoc) e ... (eletrificação da prensa). No primeiro caso, da fatura n.º ...5, a Requerente aceitou essa correção (efetuada ao abrigo do artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI), pelo que a mesma não faz parte do litígio. No segundo caso, a AT não discute o facto de os equipamentos serem adquiridos em estado de novo, mas de serem integrados em máquinas/prensas/robots usados, para melhoria, adaptação ou renovação desses equipamentos, configurando “meras beneficiações de máquinas usadas”. Segundo a AT, as reparações, adições, benfeitorias (melhoria e renovação de máquinas) e substituições de ativos não têm enquadramento como investimento elegível para efeitos de RFAI, uma vez que o artigo 22.º do CFI requer que os investimentos sejam feitos em ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo, além de não integrarem o conceito de investimento inicial (artigo 2.º, n.º 49, alínea a) do RGIC).

II. Neste âmbito, foram expurgados da dedução à coleta a título de RFAI os seguintes valores – cf. RIT, pp. 63 e 64:

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JJ. 4.ª CATEGORIA – INVESTIMENTO EM MATERIAL INFORMÁTICOcf. RIT, pp. 64 e 66

– A AT identificou um conjunto de aquisições de material informático – portáteis, computadores fixos, impressoras, monitores, servidores, um projetor, unidades UPS e um tablet, que considerou aquisições isoladas de equipamento substituição, não enquadráveis no conceito de investimento inicial (artigo 2.º, n.º 49, alínea a) do RGIC) e, por essa razão, não elegíveis para efeitos de RFAI. A AT sustenta ainda que a aquisição de equipamento informático não é indutora da criação de postos de trabalho, verificando-se o inverso, ou seja, é a criação de postos de trabalho que leva à necessidade destas aquisições (artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI). O equipamento foi destinado aos departamentos técnico, de exportação, de marketing, para a receção e para o SAT/Call Center.

KK. Em relação ao equipamento informático adquirido para o SAT/Call Center, a AT acrescenta que não contribui para o aumento da capacidade do estabelecimento existente, por ser um serviço pós-venda que decorre da atividade normal da empresa, também não subsumível ao conceito de investimento inicial – cf. RIT, pp. 64 e 66.

LL. Neste âmbito, foram expurgados da dedução à coleta a título de RFAI os seguintes valores – cf. RIT, pp. 65 e 66:

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MM. 5.ª CATEGORIA – INVESTIMENTO EM SOFTWARE E LICENÇAS DE UTILIZAÇÃO DE SOFTWAREcf. RIT, pp. 66 a 67 – A AT considerou que a aquisição de programas de computador, incluindo o desenvolvimento do website, não é elegível para efeitos de RFAI por não configurar um “investimento em ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia”, como requer o artigo 22.º, n.º 2, alínea b) do CFI. Na perspetiva da AT, as despesas de transferência de tecnologia estão associadas a aquisições de propriedade intelectual e não à mera atribuição de licenças periódicas para operar softwares massificados. Conclui que o investimento em causa não se enquadra no conceito de investimento inicial, nem é relevante para a criação de postos de trabalho, pelo que também não cumpre a condição prevista no artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI.

NN. Nesta categoria, foram expurgados da dedução à coleta a título de RFAI os seguintes valores – cf. RIT, p. 67:

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OO. 6.ª CATEGORIA – INVESTIMENTO EM EQUIPAMENTOS SOCIAIScf. RIT, pp. 67 a 69 – Esta correção relativa à aquisição de ar condicionado para o refeitório e de um frigorífico para o refeitório do SAT/Call Centre (€ 1.900,00 em 2015 e € 203,25 em 2016) foi aceite pela Requerente.

2. INVESTIMENTOS EXCLUÍDOS DO RFAI POR NÃO ESTAREM INSERIDOS NUM PROJETO AGREGADOR DE INVESTIMENTO INICIAL, NUMA DAS QUATRO TIPOLOGIAS DO ARTIGO 2.º, N.º 49, ALÍNEA A) DO RGIC

PP. No que se refere aos investimentos desconsiderados pela Requerida, por não serem enquadráveis ao abrigo do RGIC, a AT procedeu a correções em 6 situações, infra descritas – cf. RIT, pp. 68 a 75:

a) SAT/CALL CENTER – O investimento realizado nesta área foi desconsiderado, pois, para a AT, sendo a atividade normal da Requerente a produção e comercialização de eletrodomésticos, este serviço pós-venda decorre dessa atividade e não de um investimento inicial. Os valores não aceites constam do quadro seguinte:

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b) GERAL – TELEMÓVEIS E COMPONENTES PARA TELEMÓVEIS – O investimento em telemóveis foi enquadrado pela Requerente no projeto “Geral”, inferindo a AT que o mesmo não está associado a um projeto específico, pelo que não constitui um investimento inicial. Aduz que também não contribui para o aumento da capacidade do estabelecimento existente, nem proporciona a criação de postos de trabalho. Os valores não aceites constam do quadro seguinte:

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c) SISTEMA DE DETEÇÃO DE INCÊNDIOS, SISTEMA DE VIDEOVIGILÂNCIA, SISTEMA DE CONTROLO DE ASSIDUIDADE, LED RECEÇÃO, MÁQUINA DE LAVAR CAMIÕES – A AT sustenta que estes investimentos não decorrem de um projeto agregador de investimento inicial, não contribuem para o aumento da capacidade do estabelecimento existente, nem proporcionam a criação de postos de trabalho. Os valores não aceites constam do quadro seguinte:

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d) OBRAS DE MANUTENÇÃO GERAL – Tendo em consideração que quase todo o investimento em obras de construção foi enquadrado pela Requerente no projeto ... e que a nova linha de produção terá ficado concluída em outubro de 2016, com alguns ajustamentos até ../../2017, as obras realizadas após esta data foram qualificadas pela AT como obras de manutenção corrente para garantir o funcionamento da unidade produtiva (vg. troca das chapas translúcidas na montagem, troca de iluminação, pintura das paredes da fábrica ou revestimento de paredes). Este investimento foi desconsiderado para efeitos de dedução no RFAI, dado não apresentar relação com a construção da linha ... para aumento da capacidade do estabelecimento. O valor não aceite cifra-se em € 191.376,86 e respeita ao ano 2017.

e) AR CONDICIONADO CARRINHA MERCEDES – Trata-se, para a AT, de uma adição/melhoria de um equipamento usado, que não contribui para o aumento da capacidade do estabelecimento existente, nem proporciona a criação de postos de trabalho, não podendo ser considerado para efeitos do RFAI. O valor não aceite cifra-se em € 1.544,00 e respeita ao ano 2014.

f) AQUISIÇÕES ISOLADAS DE EQUIPAMENTO – Esta correção refere-se a aquisições de bens inseridas no “projeto ...” (projeto que, além destes, só inclui os moldes e ferramentas já acima tratados). A AT entendeu que a aquisição destes bens não contém elementos passíveis de enquadrarem um investimento inicial num projeto agregador que aumente a capacidade do estabelecimento existente, ou de induzir a criação de postos de trabalho, configurando meras aquisições isoladas de bens em anos interpolados (2014 e 2016), pelo que não podem ser enquadradas no RFAI. Não foram aceites os valores de € 11.696,00 e de € 18.980,00, para os anos 2014 e 2016, respetivamente, perfazendo o total de € 30.676,00.

QQ. Em síntese, para efeitos de RFAI, a AT corrigiu o investimento considerado pela Requerente em € 2.279.965,04, não aceitando a dedução correspondente à importância total de € 569.991,26, abrangendo os períodos de tributação de 2014 a 2017 (€ 212.968,98 em 2014; € 131.160,43 em 2015; € 94.550,88 em 2016; e € 131.310,98 em 2017) – cf. RIT, pp. 73 a 75.

3. IRC DE PERÍODOS ANTERIORES - DLRR – EXCLUSÃO POR FALTA DE ENQUADRAMENTO NO ARTIGO 30.º DO CFI

RR. A AT corrigiu, de igual modo, o investimento classificado nas listagens da Requerente (que constam do dossier fiscal) na tipologia “aumento de capacidade de estabelecimento existente”, que aquela considerou para efeitos de DLRR (constituindo reservas especiais no balanço, nos anos 2014 a 2017, para poder beneficiar desta dedução) – cf. RIT, pp. 76 a 94.

SS. Como fundamento para a correção à DLRR, a AT invoca as mesmas desconformidades assinaladas ao investimento considerado relevante pela Requerente, para efeitos de RFAI, as quais são também geradoras da respetiva falta de enquadramento no disposto no artigo 30.º do CFI, implicando, desta forma correções em sede de DLRR – cf. RIT, pp. 76 a 94.

TT. Neste âmbito [DLRR], a AT procedeu às correções do investimento considerado elegível constantes do quadro resumo infra, em relação às quais a Requerente aceita a parte referente ao software, que, por conseguinte, não faz parte do objeto desta ação – cf. RIT, p. 90:

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UU. Estas correções conduziram a uma revisão das dotações anuais do benefício fiscal da DLRR. Em relação ao exercício de 2014, as correções referidas não geraram ajustamento, porque o investimento aceite ultrapassa a reserva constituída. No tocante a 2015, atenta a redação do artigo 29.º do CFI, aplicável a partir deste ano, que considera os lucros retidos e reinvestidos em aplicações relevantes no prazo de dois anos, contado a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos, a AT apenas considerou o investimento realizado a partir de 2016, resultando na correção a efetuar em 2017 de € 82.611,34, conforme ilustrado no quadro seguinte – cf. RIT, pp. 92 e 93:

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VV. A AT acresceu ainda juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais ao abrigo do artigo 34.º do CFI, que calculou em € 32.510,39, com base na taxa de 19% (4%+15%), contados dia a dia – cf. RIT, pp. 93 e 94.

WW. Foram posteriormente emitidas e notificadas à Requerente as liquidações de IRC, de juros compensatórios e de mora referentes aos períodos de tributação de 2014, 2015, 2016 e 2017, a seguir identificadas, no valor global a pagar de € 729.279,36, que constam dos Documentos 1 a 4 juntos pela Requerente, com as correspondentes demonstrações de liquidação e de acerto de contas, a seguir identificadas:

- Período de 2014 – liquidação de IRC n.º ...89 e liquidação de juros compensatórios n.º ...45, resultando no valor a pagar de € 133.827,64, na data-limite de 30 de abril de 2020, conforme Demonstração de Acerto de Contas n.º ...55;

- Período de 2015 – liquidação de IRC n.º ...92 e liquidação de juros compensatórios n.º ...59, resultando no valor a pagar de € 163.381,65, na data-limite de 4 de maio de 2020, conforme Demonstração de Acerto de Contas n.º ...77;

- Período de 2016 – liquidação de IRC n.º ...30 e liquidação de juros compensatórios n.º ...60, resultando no valor a pagar de € 173.874,57, na data-limite de 9 de julho de 2020, conforme Demonstração de Acerto de Contas n.º ...59; e

- Período de 2017 – liquidação de IRC n.º ...12, ...30, liquidação de juros compensatórios n.º ...67 e liquidação de juros de mora n.º ...68, na data-limite de 23 de julho de 2020, conforme Demonstração de Acerto de Contas n.º ...44.

XX. A Requerente procedeu ao pagamento das liquidações acabadas de referenciar – cf. Documentos 5 a 8 juntos pela Requerente.

YY. Em discordância com as liquidações de IRC e de juros compensatórios e de mora ora identificadas, a Requerente apresentou junto do CAAD, em 31 de agosto de 2020, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral Coletivo que deu origem ao presente processo – cf. registo de entrada do pedido de pronúncia arbitral (“ppa”) no SGP do CAAD.

2. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO E FACTOS NÃO PROVADOS

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos e, sempre que aplicável, nos depoimentos das testemunhas, que demonstraram conhecimento pessoal direto dos factos relatados e responderam de forma objetiva e detalhada às questões que lhes foram colocadas.

Em concreto, o Diretor de Produção, II (1.ª testemunha), descreveu a organização do processo produtivo da Requerente e alguns projetos à data dos factos, bem como as funções asseguradas pela área do SAT/Call Center; o Diretor e Investigação e Desenvolvimento, JJ, explicou detalhadamente a matéria relativa aos moldes e ferramentas (2.ª testemunha); o Diretor Financeiro, KK (3.ª testemunha), corroborou o afirmado pelas anteriores testemunhas e referiu alguns dados quantitativos sobre o aumento da produção e volume de negócios da Requerente, bem como o incremento do número de trabalhadores nos anos em causa; e, por fim, a Inspetora Tributária que interveio no procedimento inspetivo, LL (4.ª testemunha), arrolada pela Requerida, expôs os critérios que aplicou na sequência da observação da unidade fabril e dos equipamentos da Requerente, salientando ter sido aceite diverso equipamento informático e software associado à produção, apenas não tendo sido o remanescente.

Não se provou que as aquisições a seguir discriminadas se tenham destinado a um investimento inicial de incremento da capacidade produtiva do estabelecimento da Requerente:

(a) Material informático, na parte que foi desconsiderada pela AT (artigo 259.º do ppa). De notar que a Requerida tinha considerado elegível para dedução à coleta, nos termos do RFAI/DLRR, diverso equipamento informático diretamente conexo com a produção;

(b) Telemóveis (artigo 263.º do ppa);

(c) Sistemas de deteção de incêndios, videovigilância e controlo de assiduidade (artigo 264.º do ppa). Assinala-se a este respeito que apesar de a 2.ª testemunha referir que foi implementado um sistema de videovigilância, a AT não desconsiderou o sistema de vigilância específico adquirido para a monitorização da produção, apenas não tendo aceite como elegível equipamento genérico de videovigilância (v. depoimento da 4.ª testemunha);

(d) Obras de manutenção geral (artigo 265.º do ppa);

(e) Aquisições isoladas de equipamento (artigo 266.º do ppa). Não se provou também que estas tivessem sido efetuadas no âmbito de uma reestruturação da instalação fabril.

3.1.3. Julgamento de facto proferido no processo nº 565/2018-T:

A. No exercício de 2014, a G..., S.A., aqui Requerente, estava enquadrada como sujeito passivo de IRC e exercia a atividade de fabricação de eletrodomésticos correspondente ao CAE 27510 – cf. Documento 1 e Anexo A do relatório único reportado a 2014, juntos pela Requerente com o ppa e no caso do Anexo A antes da reunião arbitral.

B. Com referência à data dos factos, a Requerente dispunha de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e as disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade, não tinha o seu lucro tributável determinado por métodos indiretos e não era devedora ao Estado e à segurança social de contribuições, impostos ou quotizações – cf. apreciação conjunta dos Documentos 1 a 4 juntos com o ppa, também provado por acordo.

C. A Requerente não era, de igual modo, considerada uma empresa em dificuldades, nos termos da comunicação da Comissão - Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 249, de 31 de julho de 2014 – cf. apreciação conjunta dos Documentos 1 a 4 juntos com o ppa e provado por acordo.

D. Em 31 de dezembro de 2014 o número de colaboradores efetivos da Requerente, i.e., com contrato sem termo, cifrava-se em 173, valor superior à média do número de efetivos que registou nos doze meses precedentes, conforme quadro seguinte:

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– cf. Anexo A dos relatórios únicos referentes a 2013 e 2014.

E. No ano 2014, ocorreu a conversão de contratos de trabalho com termo em contratos de trabalho sem termo relativamente a cinco colaboradores/funcionários da Requerente a seguir identificados, os quais em 2018 ainda mantinham o vínculo laboral com a Requerente:

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– cf. Anexo A dos Relatórios únicos reportados aos anos de 2014 a 2018, contratos de trabalho e Documento 7 [recibos de vencimento] juntos pela Requerente.

F. No dia 26 de maio de 2015, a Requerente entregou a declaração de rendimentos Modelo 22 do exercício de 2014, na qual autoliquidou o IRC, resultando imposto a pagar no valor de € 584.326,32 – cf. Documento 1 junto com o ppa.

G. Na declaração Modelo 22 acabada de referir, a Requerente não considerou qualquer valor no Campo 355 do Quadro 10 (Benefícios Fiscais) – cf. Documentos 1, 3 e 4 juntos com o ppa.

H. Após a submissão da Modelo 22 do exercício de 2014, a Requerente concluiu que, no seu preenchimento, não considerou determinados ajustamentos ao lucro tributável, nem benefícios fiscais que, em seu entender, eram devidos, designadamente os referentes ao RFAI, no valor de € 383.041,62, que, conjuntamente com os demais ajustamentos, perfaziam o valor de € 406.880,41 de IRC pago em excesso – cf. Documento 2 junto com o ppa.

I. Assim, a Requerente apresentou, em 26 de maio de 2017, Reclamação Graciosa da autoliquidação de IRC reportada ao exercício de 2014, na qual sustenta que:

(a) Não foi considerado corretamente o valor do benefício fiscal relativo à criação líquida de postos de trabalho para jovens e desempregados de longa duração, previsto no artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”); e

(b) Tinha direito a incluir, não o tendo feito, o valor do benefício fiscal apurado a título de RFAI, no montante de € 383.041,63, por investimentos elegíveis efetuados no período em causa (2014), pedindo o reembolso do valor total de € 406.880,41 de IRC, que considerou ter pago em excesso relativamente às duas situações acima mencionadas (alíneas (a) e (b) supra) – cf. Documentos 1 a 3 juntos com o ppa.

J. No âmbito da Reclamação Graciosa, a Requerente juntou cópia de um contrato de Concessão de Incentivos Financeiros no Âmbito do Sistema de Incentivos à Inovação celebrado com o AICEP, cujo período de investimento decorreu entre 3 de maio de 2012 e 30 de abril de 2014; uma listagem com a descrição dos ativos adquiridos em 2014, com o detalhe do lançamento contabilístico, número e data do documento, indicação do valor contabilizado e do valor que considerou elegível para efeitos do RFAI, juntamente com a cópia de algumas faturas – cf. Documento 2 junto com o ppa (documentos 3, 4 e 5 da Reclamação Graciosa, respeitantes respetivamente ao contrato com a AICEP, à lista de bens elegíveis para o RFAI e às cópias de algumas faturas).

K. A AT notificou a Requerente do projeto de deferimento parcial da Reclamação Graciosa, por ofício de 29 de maio de 2018, contendo os seguintes fundamentos e proposta de decisão de indeferimento em relação ao benefício do RFAI:

Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI)

O Decreto-Lei n.º 162/2014 de 31 de outubro aprova um novo Código Fiscal do Investimento (CFI).

Relativamente ao regime do RFAI em vigor em 2014, as condições cumulativas de direito ao incentivo fiscal, passam a estar contempladas no n.º 4 do artigo 22 do novo CFI.

Nos termos do n.º 4 do artigo 22.º do CFI podem os sujeitos passivos de IRC beneficiar dos incentivos fiscais desde que se verifiquem cumulativamente as seguintes condições:

a) Disponham de contabilidade organizada;

b) O seu lucro não seja determinado por métodos indiretos;

c) Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE da Comissão de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de setembro, alterado pelas Leis n.ºs 64-B/2011, de 30 de dezembro, e 2/2014, de 16 de janeiro ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras previstas no artigo 31.º-B do Código do IRC;

d) Não sejam devedores às Finanças e à Segurança Social;

e) Não sejam consideradas empresas em dificuldades nos termos da comunicação da Comissão (publicada no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 249, de 31 de julho de 2014);

f) Efetuem investimentos relevantes que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c).

Importa aqui salientar o período temporal mínimo referido na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, por remissão para o período constante da alínea c) do n.º 4 do mesmo artigo.

Ora, a alínea c) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI remete para três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos (grandes empresas).

Determina o n.º 1 do artigo 2.º do Anexo à Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, a categoria de micro, pequenas e médias empresas (PME) é constituída por empresas que emprega menos de 250 pessoas e cujo volume de negócios anual não excede 50 milhões de euros ou cujo balanço total anual não excede 43 milhões de euros.

No caso em análise, a G..., excede há vários anos, claramente, os limites definidos no n.º 1 do artigo 2.º do Anexo à Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, nomeadamente no ano de 2014 verifica-se; uma média de 390 trabalhadores, sendo em 31 de dezembro 371, apresenta um volume de negócios de € 76.767.230,99 e um total de balanço de € 46.468.434,14, fls. 62 a 64 dos autos.

Deste modo, se o sujeito passivo não se qualifica como PME, o prazo a aplicar será de cinco anos.

Assim, pela conjugação das alíneas c) e f) do n.º 4 do artigo 22 do CFI, aos sujeitos passivos, que queiram beneficiar do benefício fiscal no âmbito do RFAI, é imposta a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, cinco anos a contar da data dos investimentos, conforme obriga a alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.

Da verificação efetuada pelos SIT, quanto à criação de postos de trabalho e a sua manutenção, constatou-se o seguinte:

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Sendo assim, constata-se que a G... não manteve a totalidade dos postos de trabalho criados em 2013 e 2014 uma vez que a comparação entre o numero de trabalhadores com contratos sem termo a 31 de dezembro de 2013 (166) e a 31 de dezembro de 2014 (173) com o numero à data de 31 de dezembro de 2015 (165) evidencia uma quebra face a 2013 (165 face a 166) e a 2014 (165 face a 173).

Face ao exposto, não se verifica o cumprimento integral das condições cumulativas de acesso ao benefício fiscal associado ao RFAI, nomeadamente por inobservância da manutenção dos postos de trabalho impostas pela alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, sendo de indeferir na totalidade a pretensão do sujeito passivo quanto à dedução à coleta no campo 355 do quadro 10 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC.

[…]”– cf. Documento 3 junto com o ppa e PA.

L. A Requerente exerceu o direito de audição em discordância com a proposta de indeferimento parcial das suas pretensões – cf. Documentos 3 e 4 juntos com o ppa e PA.

M. A AT manteve o sentido da decisão e a Reclamação foi parcialmente (in)deferida por despacho de 31 de julho de 2018 do Chefe de Divisão da Direção de Finanças de Aveiro, Divisão de Justiça Tributária, por subdelegação, notificado à Requerente em 15 de agosto de 2018. Em concreto, foi indeferido o benefício fiscal relativo à criação líquida de postos de trabalho quanto à colaboradora MM no valor de € 5.472,34, e a totalidade do pedido relativo ao RFAI, no montante de € 383.041,63 – cf. Documento 5 junto com o ppa e PA.

N. Como fundamento do indeferimento do benefício do RFAI, a decisão da Reclamação Graciosa refere o seguinte:

Relativamente ao RFAI, entende a AT que não foi verificada uma das condições cumulativas para a empresa beneficiar do benefício fiscal, nomeadamente a manutenção dos postos de trabalho.

De acordo com a verificação efetuada pelos SIT, e como já referido no projeto de decisão, o número de trabalhadores a contrato sem termo em 2014-12-31 era de 173, tendo-se verificado uma diminuição no ano de 2015, dado que em 2015-12-31, a empresa tinha 165 trabalhadores.

Sendo assim, e como a reclamante não manteve a totalidade dos postos de trabalho, será de indeferir a pretensão do contribuinte quanto à possibilidade de deduzir à coleta o benefício fiscal no âmbito do RFAI.” – cf. Documento 5 junto com o ppa e PA.

O. Inconformada com a decisão de (in)deferimento parcial da Reclamação Graciosa deduzida contra o ato autoliquidação de IRC reportado a 2014, a Requerente apresentou no CAAD, em 13 de novembro de 2018, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral que deu origem ao presente processo – cf. registo de entrada no SGP do CAAD.

P. Por despacho de 21 de dezembro de 2018 da Subdiretora-Geral da Área de Gestão Tributária do IR, por delegação, foi parcialmente anulada (“revogada”) a decisão da Reclamação Graciosa, na parte que indeferia o benefício fiscal relativo à criação líquida de postos de trabalho quanto à colaboradora MM no valor de € 5.472,34, o qual foi notificado à Requerente, mantendo-se o indeferimento no segmento do RFAI – cf. PA.

2. Factos não Provados

Não se provaram os factos alegados nos artigos 42.º e 44.º do ppa, designadamente que “a Requerente efetuou investimento relevante que proporcion[ou] a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período de dedução”.

Aliás, não só não foi demonstrado que os investimentos em causa – consubstanciados na aquisição de ativos, como ferramentas e equipamentos –, realizados para o lançamento de novos produtos, proporcionaram a criação de postos de trabalho com os mesmos relacionados, como a testemunha inquirida, indicada pela Requerente, afirmou que não é possível fazer uma conexão exata entre os trabalhadores e os equipamentos nos quais se concretizou o investimento.

3.2. Fundamentação de direito

Expostas as pretensões das partes e reproduzidos os probatórios em que as diversas decisões (recorrida e fundamento) sustentaram os respectivos julgamentos, enfrentemos agora as questões constantes do ponto 2., que conheceremos pela precisa ordem que aí ficaram enunciadas.

Assim:

3.2.1. Da admissibilidade de interposição de “Recurso Subordinado

Resulta do relatório do presente acórdão que a Autoridade Tributária, inconformada com a decisão final proferida sobre o pedido de pronúncia arbitral apresentado no CAAD pela sociedade “A... S.A.”, interpôs para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do preceituado nos artigos 25.º do RJAT e 152.º do CPTA, Recurso para Uniformização de Jurisprudência, alegando que a decisão arbitral recorrida tinha julgado duas questões fundamentais de direito, que submetia para fixação de jurisprudência, julgamento oposto ao realizado em outros dois processos arbitrais.

Fê-lo, como igualmente resulta do despacho liminar que proferimos, e que ora mantemos, dentro do prazo que para tanto legalmente dispunha (30 dias contados da notificação da decisão arbitral) e relativamente às duas questões ou vícios julgados procedentes, que determinaram a anulação parcial da liquidação impugnada, ou seja, na parte em que ficou vencida [conforme páginas 82 a 95 e 101 a 104 e ponto A) a C) do segmento decisório, página 136, todas da decisão recorrida].

A Requerente do pedido de pronúncia arbitral, como já resulta do que ficou dito, não obteve vencimento total, tendo o seu pedido, na parte relativa à correcção relativa aos investimentos em moldes, no montante de € 59.254,97, sido julgado improcedente [conforme páginas 95 (último parágrafo) a 97 e ponto E) do segmento decisório, página 137, todas da decisão recorrida].

Pese embora o seu vencimento parcial, a Requerente não interpôs qualquer tipo de recurso jurisdicional dentro do prazo de 30 dias contados da notificação da decisão arbitral. Porém, tendo tomado conhecimento (por notificação directa da Autoridade Tributária ou por consulta do SITAF) da interposição do Recurso para Uniformização de Jurisprudência interposto pela Autoridade Tributária, veio interporrecurso subordinado daquele acórdão arbitral (…) num dos segmentos (moldes/RFAI) em que aquele acórdão julgou o pedido arbitral improcedente, por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com outra decisão arbitral”.

Notificada da sua eventual rejeição, por o Recurso para Uniformização de Jurisprudência não comportar a possibilidade legal de dedução de recurso subordinado, veio opor-se a tal entendimento defendendo que o recurso interposto pela Autoridade Tributária não é um Recurso para Uniformização de Jurisprudência e, consequentemente, nenhum obstáculo legal existe à dedução de um recurso subordinado.

Tendo em vista afastar a qualificação de Recurso para Uniformização de Jurisprudência aduz a Recorrente que o recurso previsto no artigo 25.º do RJAT não é o mesmo tipo de recurso que está previsto no artigo 688.º do CPC, antes constituindo um recurso jurisdicional especial de decisão arbitral, previsto no RJAT que tem por “fundamento, designadamente, oposição com outra decisão arbitral ao qual é aplicável o regime de recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”. E que ao determinar que se aplica a este tipo de recurso o regime consagrado no artigo 152.º do CPTA com as necessárias adaptações o legislador quis precisamente autonomizar este tipo de recurso do previsto no artigo 688.º do CPC, a que atribuiu prazos e sobretudo “pressupostos fundamentais distintos”, designadamente “o prévio trânsito em julgado” da decisão recorrida. Pelo que a lei especial deve prevalecer sobre a lei geral e o seu “recurso especial da decisão arbitral” ser admitido.

Sustentando a admissibilidade do recurso subordinado nestas situações, alega que, não sendo o recurso previsto no RJAT um Recurso para Uniformização de Jurisprudência, não excluindo expressamente o regime especial a interposição do recurso subordinado e sendo-lhe subsidiariamente aplicável, por força do artigo 29.º do RJAT, o Código de Processo Civil, conclui que, tendo a Administração Tributária interposto recurso especial de decisão arbitral e tendo este sido liminarmente admitido, o recurso especial de decisão arbitral subordinado tem igualmente que ser admitido por, nos termos do artigo 633.º, n.º 5 do CPC, sendo admissível o recurso independente também o é o recurso subordinado.

Sublinha, ainda, neste sentido, que subjacentes à consagração do recuso subordinado estão razões de “justiça processual e igualdade das partes” que pretende ver asseguradas com a admissão do seu “recurso especial de decisão arbitral subordinado”.

Sem prejuízo de reconhecermos que a arquitectura argumentativa aduzida pela Requerente se encontra muito bem estruturada, não cremos que o artigo 25.º, nº 2 e 3 do RJAT contemple um novo tipo de recurso. O citado normativo prevê a possibilidade de interposição de um Recurso para Uniformização de Jurisprudência de decisão arbitral, sendo que, quanto a este, Recurso de Uniformização de Jurisprudência, está legalmente excluída a possibilidade de interposição de um “recurso subordinado”. Entendimento que professamos qualquer que seja o regime de recurso para uniformização aplicável (processual tributário, processual administrativo ou processual civil), sendo que, no caso da interposição de Recurso para Uniformização de Jurisprudência de decisão arbitral, esse entendimento resulta reforçado por força dos princípios e valores que estiveram subjacentes à consagração do RJAT e aos objectivos visados com o limitado regime de recursos que aí ficaram consagrados. O que significa que o recurso subordinado tem que ser rejeitado.

Justifiquemos este nosso julgamento.

Vimos que a tese de admissão de recurso subordinado defendida pela Recorrente assenta em dois pontos estruturais. O recurso previsto no n.º 2 e 3 do artigo 25.º do RJAT não é um Recurso para Uniformização de Jurisprudência mas um “recurso especial”. Não há nada na lei especial que impeça a dedução de recuso subordinado e o artigo 29.º do RJAT, ao remeter para o CPC, enquanto lei subsidiário, legitima essa interposição.

No sentido de demonstrar a sua falta de razão começamos por recordar, por ser essencial para a compreensão da questão que apreciamos e ao julgamento que fizemos, que, como é sabido, o Regime Jurídico de Arbitragem Tributária como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos no domínio fiscal foi construído com três objectivos principais: reforçar a tutela eficaz dos direitos e interesses legalmente protegidos dos sujeitos passivos; imprimir uma maior celeridade na resolução de litígios que opõem a administração tributária ao sujeito passivo e reduzir a pendência de processos nos tribunais administrativos e fiscais (vide, preâmbulo da Lei n.º 10 /2011, de 20 de Janeiro).

Para concretizar estes objectivos pretendeu o legislador adoptar como regra estrutural a total irrecorribilidade da decisão proferida pelos tribunais arbitrais que, por pressão da comunidade jurídica, particularmente da academia (Os contributos mais relevantes da doutrina nesta matéria em momento de discussão pública prévia à publicação do regime encontram-se publicados em), e por exigências óbvias de conformidade constitucional, acabou por ser introduzida no ordenamento jurídico temperada através da consagração de três tipos de recursos, passiveis de operar em contadas (muito contadas) situações. Tais recursos encontram-se previstos nos artigos 25.º e 27.º do RJAT: recurso para o Tribunal Constitucional, nos casos em que a sentença arbitral recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade ou aplique uma norma cuja constitucionalidade tenha sido suscitada; recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando a decisão arbitral esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo, pelo Supremo Tribunal Administrativo ou entre duas decisões arbitrais e recurso (impropriamente denominado de “Impugnação de Decisão Arbitral”) para os Tribunais Centrais Administrativos com fundamento na não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia ou na violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes.

A consagração apertada deste tipo de recursos – de que deriva a impossibilidade de sindicância por via de recurso jurisdicional quer das decisões arbitrais que não conhecem o mérito da pretensão, quer das decisões que não põem termo ao processo, mesmo que a decisão proferida afecte direitos e interesses legítimos dos contribuintes, quer dos eventuais erros de julgamento de facto de que padeçam essas decisões, mesmo que conheçam de mérito e ponham termo ao processo, entre outras situações menos beligerantes, e que exige como condição de apreciação do fundo ou mérito da decisão que a questão fundamental de direito sobre que a decisão arbitral se debruçou tenha sido anteriormente julgada de forma oposta pelos Tribunais Superiores da Jurisdição ou outra decisão arbitral – revela de forma inequívoca que o legislador quis reduzir ao máximo possível a possibilidade dos objectivo de celeridade e a estabilização das posições subjectivas das partes definidas pela decisão arbitral serem afectados por uma potencial (e expectável) interposição de recursos jurisdicionais, como ocorreria se as decisões arbitrais ficassem sujeitas às mesmas regras ou possibilidade ampla de controlo por via de recurso ordinário previstas na legislação processual civil, administrativa ou tributária.

É, pois, inequívoco, que o RJAT consagrou um modelo distinto de controlo da decisão arbitral por via de recurso. E, nessa medida, tem uma arquitectura de recursos ao nível da sua amplitude diferente das gizadas nos demais regimes jurídico-processuais vigentes no sistema judicial português.

Porém, o que vimos dizendo não significa, contrariamente ao que defende a Recorrente, que o legislador arbitral tenha criado através desta lei especial novos tipos de recurso. Antes, como claramente resulta do regime consagrado nos artigos 25.º e 27 do RJAT, que optou por acolher na lei especial, dentro dos tipos de recursos jurisdicionais que existem e vigoram para as decisões judiciais proferidas por tribunais estaduais, os tipos de recurso de que a decisão arbitral podia ser objecto, sem prejuízo das adaptações que a realidade jurídica que regulava naturalmente exigia e que directamente salvaguardou por normas especiais ou desvios ao regime regra desses mesmos tipos de recurso.

Em suma, colocado perante a impossibilidade de pura e simplesmente não consagrar qualquer tipo de recurso - por ser pacífico que ao legislador está vedado suprimir em bloco a recorribilidade ou fazer depender essa recorribilidade de circunstâncias que traduzam uma clara violação do princípio da proporcionalidade e consciente de que, pelo menos em matéria de fiscalização concreta de constitucionalidade, a denegação do direito ao recurso seria materialmente incompatível com o preceituado no artigo 280.º da Constituição da Republica Portuguesa (CRP) -, o legislador arbitral optou por consagrar o direito ao recurso limitado às situações em que a sua consagração está constitucionalmente imposta (recurso de constitucionalidade), às situações em que a sua não admissão conduziria à manutenção na ordem jurídica de decisões portadoras de vícios de tal forma graves que a não consagração, pelo menos da possibilidade de tais decisões serem expurgadas da ordem jurídica repugnava o próprio sistema de justiça (recurso com fundamento em nulidades da decisão arbitral – recurso para os Tribunais Centrais) e para as situações em que essas decisões ou julgamentos afrontam directamente os julgamentos de direito, interpretações de normas ou, institutos realizados pelos Tribunais Superiores da Jurisdição Administrativa e Fiscal (na redacção inicial) ou opostas a outros realizados igualmente em processos arbitrais (na redacção actual), por nestes casos serem colocados em causa de forma grave os princípios fundamentais da igualdade e de segurança jurídica.

É, pois, neste contexto que têm que ser interpretados os meios recursórios previstos no RJAT, particularmente o recurso aí previsto para o Supremo Tribunal Administrativo, o qual, materialmente, constitui um Recurso para Uniformização de Jurisprudência.

Efectivamente, uma análise cuidadosa do regime consagrado no artigo 25.º do RJAT, permite-nos concluir que, salvo no que respeita ao prazo de interposição, cuja contagem se inicia com a notificação e não com o trânsito da decisão recorrida, e quanto ao Tribunal em que a interposição do recurso deve ser realizada – em que o regime assume particularidade ditadas pela necessidade, no primeiro caso, de assegurar uma célere estabilização da decisão e, no segundo, imposta por razões que se prendem com a circunstância de os Tribunais Arbitrais serem constituídos no CAAD, ou seja, numa entidade externa à orgânica e hierarquia dos Tribunais Estaduais e terem, por isso, que dar entrada directamente no Supremo Tribunal acompanhado de uma certidão integral do processo (e não por este) - os pressupostos formais e substanciais de admissão do recurso aí previstos são idênticos aos que são exigidos pelos artigos 284.º do CPPT, 688.º, n.º 1 do CPC e 152.º do CPTA.

Quanto aos requisitos formais, o legislador arbitral limitou-se, salvo a já apontada excepção, a dizer que são aplicáveis as regras do CPTA (Note-se que esta remissão para o CPTA e não para o CPPT decorre da circunstância de, à data da introdução no ordenamento jurídico do Decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, este último não comportar a possibilidade de interposição de recurso para uniformização de jurisprudência, que não existia, e o recurso por oposição de acórdãos, pela forma como estava consagrado, ser manifestamente inapto a absorver o recurso de uniformização de jurisprudência que se queria consagrar.). Quanto aos requisitos substanciais, por a única particularidade residir na possibilidade de constituir fundamento do Recurso para Uniformização de Jurisprudência a contradição da decisão arbitral com acórdão das Secções de Contencioso dos Tribunais Superiores da Jurisdição Administrativa e Fiscal ou com outra decisão arbitral.

Como se colhe do requerimento de interposição do recurso apresentado pela Requerente, e das alegações e conclusões que o acompanham, o “recurso subordinado” interposto tem como fundamento uma alegada oposição entre o julgamento da decisão arbitral recorrida e uma outra decisão arbitral (que indica como decisão fundamento) relativamente a uma mesma questão fundamental de direito.

Ora, este fundamento de Recurso é o fundamento exclusivo de um determinado tipo de recurso: o Recurso para Uniformização de Jurisprudência. E não de qualquer outro tipo de recurso jurisdicional, como o comprovam os regimes consagrados nos artigos 284.º do CPPT, que estabelece, para o que ora releva, que as partes e o Ministério Público podem dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo, no prazo de 30 dias contado do trânsito em julgado do acórdão impugnado, pedido de admissão de recurso para uniformização de jurisprudência, quando, sobre a mesma questão fundamental de direito, exista contradição entre um acórdão do Tribunal Central Administrativo, e outro acórdão anteriormente proferido pelo mesmo ou outro Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo ou entre dois acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo; no n.º 1 do artigo 688.º do CPC, ao dispor que as partes podem interpor recurso de uniformização para o pleno das secções cíveis quando o Supremo Tribunal de Justiça proferir acórdão que esteja em contradição com outro anteriormente proferido pelo mesmo tribunal, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito e, no n.º 1 do artigo 152.º do CPTA, ao prever igualmente que as partes e o Ministério Público podem dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo, no prazo de 30 dias contado do trânsito em julgado do acórdão impugnado, pedido de admissão de recurso para uniformização de jurisprudência, quando, sobre a mesma questão fundamental de direito, exista contradição entre um acórdão do Tribunal Central Administrativo, e outro acórdão anteriormente proferido pelo mesmo ou outro Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo ou entre dois acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo.

Donde, sendo indiscutível que o único fundamento do recurso previsto no artigo 25.º, n.º 2 do RJAT é a oposição de julgamentos entre decisões arbitrais ou entre estas e decisões dos Tribunais Superiores da Jurisdição Administrativa e Fiscal relativamente a uma mesma questão fundamental de direito, que esta oposição de julgados constitui o fundamento do Recurso para Uniformização de Jurisprudência e remetendo o legislador arbitral em termos de regime deste recurso expressamente para o CPTA (tal como nos recursos para uniformização de jurisprudência o legislador processual tributário remeteu para o Código de Processo Civil), é forçoso concluir-se que nos n.º 2 e 3 do artigo 25.º do RJAT está consagrada a possibilidade de interposição de um Recurso para Uniformização de Jurisprudência e não qualquer outro tipo de recurso.

E se a circunstância de estar consagrado numa lei especial não obsta a essa qualificação, muito menos pode constituir obstáculo a tal qualificação a mera circunstância de a epígrafe do artigo 25.º do RJAT não conter a expressão “Recurso para Uniformização de Jurisprudência”, quer porque as epígrafes apenas constituem elementos auxiliares de interpretação do texto normativo (Como ensina Oliveira Ascensão, para efeitos de interpretação «pertencem por exemplo aos elementos lógicos as afirmações formalmente incluídas pelo legislador na própria fonte, sem todavia possuírem carácter vinculativo directo. São desta natureza (…) as epígrafes dos artigos (…). Podem servir assim de auxílio precioso para a interpretação dum texto. Não esqueçamos que neles intervêm ou convêm todas as entidades cuja pronúncia é indispensável para a produção da fonte. Estes elementos, apesar da sua autoridade, não têm o mesmo valor do texto. Em si, não têm o sentido de determinação, que é o próprio de uma fonte de direito (…)» - O Direito - Introdução e Teoria Geral, 13ª edição, 2006, Almedina, pág. 408.), quer porque a norma em referência tem uma epígrafe quase idêntica à detida pelo artigo 688.º do CPC e ninguém discute que é esse o tipo de recurso que aí está consagrado. Acresce que, como a Requerente bem sabe, é exactamente essa Uniformização de Jurisprudência que a Recorrente pretende obter com a interposição do recurso da decisão arbitral que interpôs para o Supremo Tribunal Administrativo, ainda que, por coerência face á decisão que vem defender, no seu recurso subordinado tenha peticionado, a final, a revogação da decisão arbitral e não a fixação do sentido interpretativo da norma ou normas jurídicas alegadamente violadas e interpretadas de forma distinta nos arestos em confronto.

Diga-se, por fim, que nem a expressão “com as necessárias adaptações” em que a Recorrente também suporta a sua tese de “recurso especial” permite extrair outra conclusão, pois, como a Recorrente também não ignorará, esta é a técnica clássica utilizada pelo legislador para salvaguardar a aplicação mais racional, integrada e sistemática do regime, sem descurar ou alertar para particularidades que devam ser ressalvadas.

Em conclusão, o RJAT não consagra um novo tipo de recurso, nenhum “recurso especial”, prevendo tão só, a admissibilidade de Recurso para Uniformização de Jurisprudência de decisão arbitral nas situações particulares enunciadas no artigo 25.º do RJAT, ao qual, em tudo que aí não esteja previsto, se aplica o regime de Recurso para Uniformização de Jurisprudência consagrado no artigo 152.º e seguintes do CPTA.

Foi, de resto, como Recurso para Uniformização de Jurisprudência, regulado conjuntamente pelos artigos 25.º do RJAT e 152.º do CPTA, que os recursos interpostos para a Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal de decisões arbitrais são recebidos e distribuídos desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20-2, que como tal foram admitidos (ou rejeitados) e as partes, que pacificamente sempre assim os identificaram, neles alegam e procuram demonstrar a existência de julgamentos opostos relativamente a uma (ou mais) questões fundamentais de direito, tendo em vista a sua admissão e subsequente fixação de jurisprudência.

Posto isto, isto é, assente que o recurso previsto no artigo 25.º do RJAT é um Recurso para Uniformização de Jurisprudência, importa agora que explicitemos porque também julgamos, como começamos por adiantar, que este tipo de recurso não admite a dedução de recurso subordinado, o que fazemos identificando as duas ordens de razões que obstam a essa admissão.

Primeira. Não é admissível que na sequência de um Recurso para Uniformização de Jurisprudência seja interposto recurso subordinado por a tal se opor a disciplina jurídica prevista para este tipo de recurso. Isto é, o Recurso para Uniformização de Jurisprudência é um recurso extraordinário e a sua regulamentação está prevista, no caso concreto destes autos, nos artigos 25.º do RJAT e 152.º do CPTA, podendo afirmar-se, com segurança, que este bloco normativo (que nesta matéria não remete para qualquer outro, designadamente para o CPC) constitui uma regulamentação perfeita ou completa do regime que o conforma. Ou seja, o quadro jurídico aplicável não comporta a possibilidade de interposição do recurso subordinado, que, na legislação processual administrativa apenas se encontra previsto para os recursos ordinários, nos mesmos termos em que se encontra previsto na legislação por força do disposto no n.º 3 do artigo 140.º do CPTA.

E nem se diga que da interpretação que fazemos do quadro normativo fica irremediavelmente posta em causa ou seriamente comprometida a justiça processual e igualdade das partes” que a instituição do recurso subordinado visou salvaguardar e a Requerente pretende ver asseguradas com a admissão do seu “recurso especial de decisão arbitral subordinado”. Porque não se pode olvidar que o Recurso para Uniformização de Jurisprudência não visa primacialmente tutelar os direitos e interesses das partes (assegurados pelos recursos ordinários em que o recurso subordinado é admissível) mas assegurar a uniformização de interpretação de normas e/ou institutos, não sendo, por isso, a justiça processual e a igualdade das partes nesta matéria o bem maior a proteger. A que acresce a circunstância de à parte ser permitido interpor Recurso para Uniformização de Jurisprudência independente ou autónomo, dentro do prazo que para tanto a lei lhe concede, sempre que o vencimento que não obteve seja o resultado de um julgamento de uma mesma questão fundamental de direito já julgada em sentido oposto anteriormente pelos Tribunais Superiores da Jurisdição ou outra decisão arbitral. Ou seja, o próprio regime oferece a ambas as partes idênticas possibilidades recursivas nas mesmas circunstâncias de direito, sendo, pois, injustificado entender-se que essa igualdade processual das partes ou a justiça processual só através da admissão do recuso subordinado é assegurada.

Segunda. Mesmo que assim não fosse, isto é, mesmo que houvéssemos de concluir como regra geral a admissão de interposição de recurso subordinado em sede de Recurso para Uniformização de Jurisprudência, forçosamente teríamos de concluir que nas situações em que o Recurso para Uniformização de Jurisprudência é interposto de decisão arbitral o recurso subordinado não é admissível.

Senão, vejamos. O recurso subordinado, tal como previsto no artigo 633.º do CPC – que prevê que ficando ambas as partes vencidas cada uma delas pode recorrer na parte que lhe seja desfavorável – destina-se, tal como todos os recursos ordinários, a uma sindicância da decisão, que pode ser de facto ou de direito, e visa exclusivamente a revogação da decisão, satisfazendo o interessa da parte com o acolhimento da sua pretensão.

Ora, este tipo de recurso de controlo do mérito da decisão está totalmente excluído do RJAT, uma vez que, como vimos, o legislador optou por não o integrar nos tipos de recurso admissíveis em sede de processo arbitral. Ou seja, a admissão de um recurso subordinado na sequência de apresentação e admissão de um Recurso para Uniformização de Jurisprudência de decisão arbitral traduzir-se-á, na prática, na destruição da arquitectura do regime de recurso consagrada no RJAT, que constitui um dos pilares, porventura o mais relevante, deste regime e conduziria à frustração dos objectivos que o legislador com esse apertado regime quis alcançar. Sendo que, como resulta de forma cristalina da leitura das alegações apresentadas, a sindicância do mérito da decisão arbitral é o objectivo que a Requerente pretende alcançar com o recurso subordinado, uma vez que, como já mencionamos, não obstante invocar como fundamento do recurso subordinado a contradição de julgados, não peticiona qualquer fixação de jurisprudência, prendendo-se, sobremaneira aos factos provados e aos erros de julgamento de que, em seu entender, padece a decisão arbitral.

Em suma, não é, por tudo quanto ficou exposto, admissível a interposição de um recurso subordinado na sequência de admissão de um Recurso para Uniformização de Jurisprudência interposto ao abrigo do regime consagrado nos artigos 25.º, n.º 2 e 3 do RJAT e 152.º do CPTA.

E, em conformidade, há que rejeitar o recurso subordinado interposto, o que, a final, se decidirá.

3.2.2. Da admissibilidade do Recurso para Uniformização de Jurisprudência interposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Reanalisados os articulados e averiguada a existência de quaisquer circunstâncias contemporâneas ou de ocorrência posterior à prolação do despacho liminar de admissão do recurso interposto, conclui-se inexistir qualquer fundamento para que o reconhecimento de legitimidade e de tempestividade então realizado deva ser alterado: a Recorrente ficou vencida na decisão arbitral recorrida no que respeita às duas questões de direito que submete para uniformização e alega que estas duas questões foram objecto de julgamento oposto ao proferido na decisão recorrida em duas outras decisões arbitrais, previamente proferidas e já transitadas em julgado que indica como decisões fundamento. E interpôs o presente recurso no prazo de 30 dias contados da notificação da decisão recorrida.

Também nenhum fundamento se logra encontrar para que se julgue não estar verificado o pressuposto de admissão imposto pelo artigo 25.º, n.ºs 2, 1ª parte: a decisão arbitral pronunciou-se sobre o mérito da pretensão e através dessa decisão foi posto termo ao processo arbitral.

Todavia, o requisito previsto na 2ª parte do n.º 2 do artigo 25.º do RJAT não se encontra preenchido. Isto é, uma leitura atenta das decisões arbitrais em confronto leva-nos a concluir que a decisão arbitral recorrida não julgou as questões de direito colocadas pela Recorrente para uniformização de forma oposta à que ficou julgada nas decisões arbitrais fundamento.

Foi este, de resto, como a Recorrente não ignorará, o julgamento proferido pelo Pleno desta Secção e Supremo Tribunal no processo n.º 33/23.9BALSB, de 29-9-2023, integralmente disponível em www.dgsi.pt, em que as questões que submeteu à nossa apreciação foram exactamente as mesmas e idênticos as decisões fundamento convocadas. E embora a sentença não possua uma formulação absolutamente idêntica, as razões que determinaram que não se tomasse conhecimento do mérito da sua pretensão, relativamente a qualquer uma das questões nesse processo, são exactamente as mesmas que no caso se elegem para realizar idêntico julgamento.

Assim, quanto ao conceito de investimento inicial para efeitos de elegibilidade em sede de RFAI, relativamente à qual vem indicada como decisão fundamento a decisão arbitral proferida no processo 427/2020-T do CAAD, de 28 de Setembro de 2021, alega a Recorrente que as decisões em confronto decidiram de forma oposta a seguinte questão fundamental de direito: imanente ao conceito de investimento inicial (excepto quanto à tipologia de alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento) está o estímulo a um investimento incremental, atento o seu propósito de incrementar a actividade económica e a criação de emprego que se distinga em relação ao pré-existente inicialmente e que, em simultâneo, funcione com este, ou, é de admitir como tal o investimento em substituição [conclusão B) das suas alegações de recurso respeitantes à primeira questão].

Segundo a Autoridade Tributária, enquanto a decisão fundamento decidiu, em consonância com aquele que é o seu entendimento, que o investimento de substituição não integra o conceito de investimento inicial, a decisão arbitral recorrida decidiu em sentido contrário.

Tal interpretação da decisão recorrida não é, porém, a mais correcta. Desde logo porque a decisão arbitral recorrida não assenta no pressuposto de que o investimento de substituição, sem mais, integra o conceito de investimento inicial. O que nela se defende é que um investimento de substituição em determinadas circunstâncias deve ser considerado investimento inicial.

Neste sentido apontam vários trechos da decisão recorrida - exarados após transcrição de um conjunto de normas jurídicas, particularmente a definição de “investimento inicial” contida nos artigos 2.º do RGIC e 2.º, n.º 2 al. d) da Portaria 297/2015, de 21 de Setembro – que passamos a reproduzir:

À face desta definição não é de excluir deste conceito de «investimento inicial» o «investimento de substituição», pois, no que aqui interessa, se ele estiver relacionado com «aumento da capacidade de um estabelecimento existente» enquadra-se claramente no âmbito desta definição.

Na verdade, o n.º 49 do artigo 2.º do RGIC e o artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015 apenas exigem, no que aqui interessa, que os investimentos estejam «relacionados» com aumento da capacidade de um estabelecimento existente.

Basta a relação desses investimentos com o aumento da capacidade produtiva para assegurar o direito da Requerente a dele usufruir, independentemente de ela se concretizar imediatamente na fabricação de novos produtos. Não há suporte legal para restringir a aplicação do benefício fiscal a investimentos que produzam resultados imediatos, nem sequer para o afastar quando, contra a vontade do investidor, os investimentos acabarem por não produzir os resultados pretendidos.

As normas que prevêem benefícios fiscais têm a natureza de normas excepcionais, como decorre do teor expresso do artigo 2.º, n.º 1, do EBF, pelo que devem ser interpretadas, em princípio, nos seus termos, sem ampliações ou restrições, com primazia do elemento literal, como é jurisprudência pacífica sobre a interpretação desse tipo de normas ( [5] )( [6] ), sem prejuízo da aplicação da regras gerais de interpretação e princípios jurídicos, designadamente em situações em que a redacção das normas seja imprecisa. ( [7] ).

Isto é, as normas sobre benefícios fiscais devem ser interpretadas em termos estritos, o que se é certo que não afasta a necessidade de interpretação, designadamente teleológica, não viabiliza a exigência de requisitos restritivos do campo de aplicação do benefício fiscal para que não há qualquer suporte textual, designadamente o de, relativamente a investimentos de que decorra aumento da capacidade de um estabelecimento existente, não se estar perante «investimento de substituição».

É, pois, o que fica dito, suficiente para que se afirme que não existe quanto a esta questão a divergência de entendimentos quanto à mesma questão fundamental de direito, o que impede este Tribunal de conhecer, nesta parte, o mérito do recurso.

E idêntica conclusão se deve extrair quanto à condição da “criação de postos de trabalho” relativamente à qual vem indica como decisão fundamento a decisão arbitral proferida no processo n.º 565/2018-T, de 20 de Novembro de 2019.

Na verdade, a Recorrente alega que as decisões em confronto decidiram de forma oposta a seguinte questão fundamental de direito: “É exigível que o investimento conduza à criação líquida de postos de trabalho no estabelecimento por forma a que os sujeitos passivos possam beneficiar do regime de benefícios fiscais RFAI, concretizando uma efetiva “criação de emprego” de acordo com o conceito vertido nas Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR) aplicável ex vi alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI” [conclusão A) das suas alegações de recurso respeitantes à segunda questão].

Não é, porém, totalmente correcta esta afirmação. Na verdade, na decisão recorrida, enfrentando a questão de saber se a Recorrente cumpriu a condição da “criação de postos de trabalho”, nos termos da alínea f) do nº 4 do artigo 22º do Decreto-Lei nº 162/2014”, foi entendido que o regime jurídico do RFAI exige que do investimento inicial realizado resulte um aumento do número de trabalhadores ao serviço da empresa e não um aumento líquido do número de trabalhadores, aduzindo para tanto uma argumentação de direito, especialmente a invocação de normativos sem paralelo na decisão fundamento e que, só por si, sustentam a decisão proferida:

«Na verdade, na alínea f) do n.º 4 do artigo 21.º do CFI não se faz referência a aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento, mas apenas a «criação de postos de trabalho» e sua manutenção, o que constitui um elemento interpretativo de acentuada relevância no âmbito de benefícios fiscais, pois, como é jurisprudência pacífica, as normas sobre benefícios fiscais devem ser interpretadas em termos estritos, o que, se é certo que não afasta a necessidade de interpretação, designadamente teleológica, não viabiliza a exigência de requisitos para que não há qualquer suporte textual.

Por outro lado, se é certo que o n.º 9 do artigo 14.º do RGIC, refere que «o projeto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número aparente de postos de trabalho criados nesse período», também o é que ele apenas aplicável, como nele se refere expressamente, «quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados», o que não sucede no caso, pois está-se perante benefício fiscal baseado em investimento em activos fixos tangíveis e intangíveis (artigo 21.º, n.º 2, do CFI).

Na verdade, aquele artigo 14.º do RGIC prevê, no seu n.º 4, como custos elegíveis, «custos de investimento em ativos corpóreos e incorpóreos» [alínea a)], e «custos salariais estimados decorrentes da criação de emprego, em virtude de um investimento inicial, calculados ao longo de um período de dois anos» [alínea b)],ou «uma combinação» desses custos [alínea c)] e o seu n.º 9, em que se alude ao «aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa» só se aplica «quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados, descritos no n.º 4, alínea b)».

Esta expressa referência no n.º 9 do artigo 14.º do RGIC à alínea b) do n.º 4, e não também à sua alínea a) ou à sua alínea c), constitui uma manifestação de vontade legislativa expressiva de que aquele aumento líquido apenas é exigido nos casos de auxílios calculados com base em postos de trabalho ou em custos salariais estimados.

De resto, com se refere no acórdão arbitral proferido no processo n.º 307/2019-T ([13]), «terá sido por ter noção do quanto se expôs que o legislador não utilizou a expressão “criação líquida de emprego”, quando a mesma era utilizada, por exemplo, no art.º 19.º do EBF vigente à data, esse sim, um benefício fiscal que tem por base os custos de investimento em postos de trabalho».

Como também se refere no mesmo acórdão

«Tendo em conta que, pelos fundamentos expostos, não se deverá equiparar a expressão “criação de postos de trabalho” a “criação líquida de postos de trabalho”, dever-se-á, em obediência ao princípio hermenêutico do legislador razoável, obter um resultado interpretativo que seja coerente com a teleologia do benefício fiscal em questão e que tenha um efectivo conteúdo prático.

Nessa perspectiva, a única interpretação que não se reconduza à “criação líquida de postos de trabalho”, será, julga-se, a de que a “criação de postos de trabalho” pressuposta pelo benefício fiscal em questão se refere à criação de postos de trabalho, e a sua manutenção, causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço.

Ou seja: o que está em causa é que o investimento realizado por determinada empresa será elegível para usufruir do benefício fiscal em questão se, e na medida em que, dele resulte, de forma causalmente adequada, a criação de, pelo menos, um posto de trabalho, e a sua manutenção».

Sendo nesta sequência que se vem a concluir que «No caso em apreço, dos investimentos relativos à reorientação estratégica da Requerente e opção pela robotização resultou a criação de um posto de trabalho do Director Técnico, que se manteve para além de três anos a contar da data dos investimentos (ainda se mantinha em funções quando foi realizada a reunião para produção de prova), pelo que está cumprido o requisito previsto na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.

Por seu turno, a decisão arbitral fundamento começa por determinar os poderes de conhecimento do tribunal arbitral no caso, indicando os termos da questão tal como ela é colocada pela ali Requerente:

Com base nos fundamentos do despacho de (in)deferimento parcial, a requerente reduz o ponto de discordância com a AT à circunstância de esta não ter considerado preenchida a condição relativa à manutenção dos postos de trabalho criados em razão do investimento relevante, até o final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, em virtude de no ano de 2015 ter diminuído o número total de trabalhadores a contrato sem termo (…). E retira a conclusão de que tendo sido esse o único aspeto em que se deteve a fundamentação da AT não lhe é lícito vir agora “lançar o manto da dúvida quanto à [falta] de verificação dos restantes requisitos”.

Importa, antes de mais, realçar que não se acolhe a tese preconizada pela Requerente, por dois motivos.

(…)

Desta forma, o que se impõe a este Tribunal Arbitral apreciar e decidir é a legalidade (parcial) da autoliquidação de IRC impugnada, para o que tem de aquilatar se estão reunidos os factos constitutivos (cumulativos) do benefício fiscal do RFAI por forma a concluir, em caso afirmativo, pela invalidade do ato de liquidação de IRC que não contemplou a sua dedução à coleta, ou, no caso de faltar algum requisito, pela manutenção de tal ato de liquidação na ordem jurídica.».

Como se disse no acórdão do pleno desta Secção já supra citado «Deste extracto da decisão retira-se que a decisão arbitral fundamento não limitou o seu conhecimento à questão colocada pela Requerente, respeitante à manutenção dos postos de trabalho, apesar de relativamente a essa mesma questão anunciar que estava do lado da Administração Tributária no sentido de a comparação dever ser feita de forma global (por contraposição à defendida pela aí Requerente, no sentido de que a comparação deveria ser feita por referência aos postos de trabalho especificamente criados pelo investimento realizado).

Apesar de tal manifestação, o pleito acaba por ser decidido nos seguintes termos:

Com efeito, resulta da citada alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, invocada na fundamentação da decisão da Reclamação Graciosa, que é condição necessária que os sujeitos passivos efetuem “investimento que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento”.

A Requerente limitou-se a juntar (à Reclamação Graciosa) um contrato e uma lista de elementos do ativo adquiridos nesse ano [2014], sem ter estabelecido qualquer elo de ligação entre o investimento e os trabalhadores cujos postos de trabalho alega terem sido criados. Ficou, pois, por demonstrar um pressuposto essencial da acessibilidade ao benefício da RFAI, o se que refere ao nexo de causalidade entre a realização de investimentos com relevância e legíveis para o beneficio do RFAI em 2014 e a criação dos postos de trabalho dos cinco trabalhadores identificados, cujos contratos a termo se converteram em contratos sem termo nesse ano, bem como a sua manutenção até ao final do período mínimo de detenção dos bens objeto de investimento.”

Da leitura deste extrato da decisão fundamento duas conclusões se retiram por confronto com a decisão recorrida: i) em primeiro lugar, não foi o entendimento quanto à aferição da manutenção dos postos de trabalho, se por referência ao investimento inicial (tese da ora Recorrida), se globalmente (tese da Recorrente) que ditou a sorte da causa, mas antes, a (in)verificação da criação de postos de trabalhos por causa do investimento inicial; ii) a factualidade em que a decisão fundamento se moveu é distinta/oposta à da decisão recorrida uma vez que nesta ficou provado que o investimento relevante proporcionou a criação de postos de trabalho, enquanto que na decisão fundamento ficou por demostrar “o nexo de causalidade nexo de causalidade entre a realização de investimentos com relevância e legíveis para o beneficio do RFAI em 2014 e a criação dos postos de trabalho.”

Donde, pelo que se deixou exposto, também nestes autos se conclui, em sintonia com a Recorrida e com o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto, que as decisões arbitrais partem de situações factuais distintas, que explicam os diferentes caminhos tomados e que não sendo as situações de facto, idênticas (recorde-se que os pressupostos de conhecimento do mérito do recurso têm natureza cumulativa), não poderão as mesmas ser analisadas à luz do recurso para uniformização de jurisprudência, por não existir verdadeira contradição entre os julgados.

4. DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- Rejeitar o requerimento de interposição de Recurso Subordinado apresentado pela Recorrida.

- Não tomar conhecimento do mérito do Recurso para Uniformização de Jurisprudência interposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Custas pela Recorrida quanto ao incidente a que deu causa com a apresentação do recurso subordinado e, no mais, pela Recorrente.

Registe, notifique e, transitado, comunique-se ao CAAD.

Lisboa, 24 de Abril de 2024. - Anabela Ferreira Alves e Russo (Relatora) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (vencido, conforme declaração infra) – Gustavo André Simões Lopes Courinha - Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Fernanda de Fátima Esteves – João Sérgio Feio Antunes Ribeiro.

Voto de vencido:

«Vencido, quanto à fundamentação e decisão de “- Rejeitar o requerimento de interposição de Recurso Subordinado apresentado pela Recorrida”.

Entendo que, nos termos conjugados dos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 e 3 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT), 140.º n.º 3, 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 633.º n.ºs 1 a 3 do Código de Processo Civil (CPC), por princípio (razões processuais), é admissível a utilização do mecanismo de interposição (de recursos em geral) inscrito, no CPC, como “recurso subordinado”, mesmo no âmbito do recurso (extraordinário) para uniformização de jurisprudência.

A previsão normativa do art. 633.º n.ºs 1 a 3 do CPC, encontra-se no capítulo respeitante às disposições gerais, aplicáveis, transversalmente, a todas espécies de recursos, não havendo qualquer justificativo para excluir a respetiva operação no quadro (geral) dos recursos uniformizadores de jurisprudência, como é, sem margens para discussão, o que nos ocupa. Obviamente, o “recurso subordinado” não tinha de ser previsto no RJMAT porque, aí, o legislador se limitou a positivar a modalidade/espécie de recurso, das decisões arbitrais de mérito, para o STA, deixando a regulamentação processual/tramitação para os diplomas remetidos…

Portanto, abreviando, no presente recurso para uniformização de jurisprudência, tendo ambas as partes ficado vencidas, na decisão arbitral recorrida, dois caminhos (processuais), alternativos, se lhes abriram:

- interposição de (dois) recursos independentes, nos 30 dias contados da notificação da decisão arbitral, quanto à questões fundamentais de direito em que tenham ficado vencidas (em relação à parte da decisão arbitral correspondente);

- apresentação de recurso subordinado, quanto à questões fundamentais de direito em que tenham ficado vencidas (em relação à parte da decisão arbitral correspondente), nos 30 dias seguintes à notificação de interposição de recurso (para uniformização de jurisprudência) da parte contrária.

Resta aludir que, necessariamente, neste último caso, a parte utilizadora do recurso subordinado sofre, sem mais, a consequência de o mesmo ser julgado caduco, por virtude, além do mais, de não se tomar conhecimento do primeiramente interposto; ou seja, in casu, o disputado recurso da recorrida só tinha de ser admitido (por legal, legítimo, atempado…) e decidido ficar caduco, pelo sentido do judiciado em relação ao recurso do primeiro recorrente.”.