Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0793/21.1BELSB |
Data do Acordão: | 05/25/2023 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | TERESA DE SOUSA |
Descritores: | APRECIAÇÃO PRELIMINAR CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL EXCLUSÃO DE PROPOSTAS EFEITO ANULAÇÃO |
Sumário: | I - Não se justifica admitir revista se a questão versada nos autos, da aplicação do previsto nos arts. 57º, nº 1, alínea c), 70º, nº 2, alíneas a) e b) e 146º, todos do CCP, em conjugação com as cláusulas técnicas 2.10ª e 2.11ª do caderno de encargos aparenta ter sido bem decidida pelo TCA, através de uma fundamentação consistente, coerente e plausível, ao entender que a proposta da Recorrente não cumpre a referida cláusula 2.11ª e contraria a cláusula técnica 2.10ª. II - Como igualmente não se afigura, no juízo sumário que a esta Formação cabe fazer, que tenha incorrido em qualquer erro, muito menos ostensivo, quanto ao que decidiu sobre a não aplicação do art. 163º, nº 5, als. b) e c) do CPA (princípio da proporcionalidade). |
Nº Convencional: | JSTA000P31041 |
Nº do Documento: | SA1202305250793/21 |
Data de Entrada: | 10/03/2022 |
Recorrente: | A..., SA |
Recorrido 1: | B..., SA E OUTROS |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Formação de Apreciação Preliminar Acordam no Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A..., SA (doravante A...) e Hospital Senhora da Oliveira de Guimarães, EPE, contra-interessada (CI) e Entidade Demandada nos autos, em que é Autora B..., SA (B...), interpõem revista, nos termos do art. 150º, nº 1 do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCA Sul), de 02.06.2022, que negou provimento aos recursos jurisdicionais da Entidade Demandada e da CI, mantendo a sentença recorrida que julgou procedente a acção de contencioso pré-contratual intentada pela B..., além do mais, anulando o acto impugnado. Fundamentam a admissibilidade da revista na circunstância de se estar perante questão de relevância jurídica e social fundamental, havendo necessidade de uma melhor aplicação do direito. Em contra-alegações a A./Recorrida defende a inadmissibilidade das revistas ou a improcedência dos recursos. 2. Os Factos Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete. 3. O Direito O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”. Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos. Na presente acção administrativa de contencioso pré-contratual a A. demanda o Hospital da Senhora da Oliveira Guimarães, EPE, indicando como CI a A..., formula os seguintes pedidos: a) Ser anulado o acto de adjudicação adoptado no presente procedimento e, em consequência, ser também anulado o contrato celebrado em sua execução caso o tenha já sido; b) Condenar-se a Entidade Adjudicante a excluir a proposta da Contra-interessada A...; c) E, em consequência, condenar-se a Entidade Adjudicante a adjudicar o Concurso em favor da proposta apresentada pela B.... O TAC de Lisboa por sentença de 09.09.2021 julgou procedente a acção intentada pela A., anulando o acto de adjudicação adoptado e o contrato celebrado em sua execução. Mais condenou a Entidade Demandada a proferir decisão de exclusão da proposta da CI A... e a adjudicar o concurso à proposta apresentada pela Autora. O acórdão recorrido manteve o decidido pelo TAC, tendo entendido, em síntese, que, “Como resulta da factualidade apurada, a Entidade Demandada procedeu à abertura do concurso público para “Aquisição de serviços de comunicação de voz (móvel e fixo) de Dados, SMS, acesso à INTERNET, fornecimento de equipamento, Central telefónica e aplicações informáticas”, no qual fixou como único factor de avaliação o preço total da proposta, nos termos do artigo 74º, nº 1 al. b) do Código dos Contratos Públicos, na redacção dada pelo DL nº 111-B/2017 de 31.08. (…) Tanto o Programa do Procedimento (no Ponto 7.1, al. m)) como o Caderno de Encargos (na 6ª Cláusula geral – 6.1., al. m)), que regem o Concurso em causa, exigem, sob pena de exclusão, que a proposta seja apresentada com uma determinada organização e sequenciação. Para o que aqui releva, exigem a apresentação de um 12º separador com a descrição “Anexo II: Custos de Comunicação não previstos no caderno de encargos”, devendo possuir no seu conteúdo uma tabela de preços para comunicações internacionais, roaming, ou outros custos relacionados com os serviços não incluídos no caderno de encargos. Esta exigência relaciona-se com a cláusula 2.11ª das cláusulas técnicas do Caderno de Encargos, nos termos da qual “O tarifário para as comunicações internacionais, roaming, ou outros custos relacionados com os serviços não incluídos no presente contrato devem ser objeto de discriminação na proposta apresentada, conforme solicitado no nº 10 da cláusula 6ª das cláusulas gerais do Caderno de Encargos.”. Note-se que a indicação do nº 10 da cláusula 6ª se deverá a mero lapso na medida em que a mesma apenas contém 2 números, querendo referir-se ao nº 1. A Contra-interessada apresentou o Anexo II, do qual consta uma tabela de preços para comunicações internacionais e roaming, sem menção de quaisquer outros custos. Donde, considerou, e bem, a sentença recorrida que a Contra-interessada não indicou tabela de preços para “outros custos relacionados com os serviços não incluídos no caderno de encargos”, concretamente o preço das chamadas para serviços especiais, para serviço de apoio a clientes e para videochamadas. E, concluiu que seria causa de exclusão da proposta nos termos conjugados dos artigos 57º, nº 1, al. c), 70º, nº 2, al. a) e 146º, nº 2, al. o) todos do CCP.” Procedeu o acórdão à análise do disposto no art. 70º, nº 1, als. b) e c) do CCP [respeitante à análise das propostas em todos os seus atributos, representados pelos factores e subfactores que densificam o critério de adjudicação, e termos ou condições], fazendo notar que na redacção introduzida em 2017, se consagrou que constitui fundamento de exclusão da proposta não só a indicação de termos e condições que violem aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência, como também a omissão desses termos ou condições (art. 57º, nº 1, al. c) do CCP), sendo este aspecto da proposta (e não os atributos) que o acórdão (como antes a sentença) considerou estar em causa. Quanto à alegação de que a proposta da adjudicatária continha essa informação inserida nas peças da sua proposta, entendeu o acórdão não ser assim, já que “Consta da proposta da Contra-interessada que “as chamadas efetuadas para linhas de apoio ao Cliente e números especiais (Serviços não geográficos) são faturadas ao preço das comunicações de voz efetuadas fora do plafond.”. Disso deu conta a sentença recorrida, esclarecendo que a Contrainteressada remete a discriminação dos custos relacionados com os “serviços não incluídos no presente contrato” para os tarifários que na proposta correspondem às comunicações de voz efetuadas fora do plafond, sendo que nesses tarifários não estão contidas as tarifas aplicáveis às chamadas para serviços especiais e para serviços de apoio a clientes. Concluiu que a “determinação dos custos das chamadas efetuadas para linhas de apoio ao Cliente e números especiais (Serviços não geográficos), propostos pela Contrainteressada, queda-se irremediavelmente comprometida, porquanto as tabelas de preços para as quais somos remetidos são omissas quanto às tarifas aplicáveis a tais chamadas”, o que não mereceu a objecção das Recorrentes.” E, que “(…), a proposta da Contra-interessada não cumpre a cláusula técnica 2.11ª e contraria a cláusula técnica 2.10ª. A proposta, para além de não fazer qualquer referência à possibilidade de barramento de chamadas e bem assim à activação, por defeito, da inibição dos serviços de valor acrescentado e outros serviços com custos associados, prevê que “as chamadas efetuadas para linhas de apoio ao Cliente e números especiais (Serviços não geográficos) são faturadas ao preço das comunicações de voz efetuadas fora do plafond”, ou seja, atentos os seus termos, permite a realização deste tipo de chamadas e, uma vez realizadas, imputa os custos à Entidade Adjudicante. Assim, se a proposta, já devia ser excluída por força do disposto na alínea a), do art.º 70.º, n.º 2, do CCP, também o deveria por força da alínea b), a qual prevê que são excluídas as propostas cuja análise revele “(…) que apresentem termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetido à concorrência (…)”. Considerou, ainda, o acórdão que o efeito anulatório não é de afastar por não se verificar a previsão quer da alínea b), quer da alínea c) do nº 5 do art. 163º do CPA. Concluiu, assim ser de negar provimento aos recursos interpostos e manter a sentença recorrida. Nas presentes revistas os Recorrentes alegam [de notar que a Entidade Demandada/Recorrente não apresentou conclusões tendo aderido ao requerimento de recurso e respectivas alegações da A..., apenas tendo procedido a algumas “considerações”] que o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento quanto à interpretação do art. 70º, nº 2, al. a) no que toca à omissão numa proposta dos termos ou condições, conjugado com o disposto na al. c) do nº 1 do art. 57º, nºs 1 e 2 e do art. 146º, nº 2, todos do CCP, considerando que há um tarifário não apresentado de custos, o qual não é atributo da proposta, mas uma formalidade não essencial, sendo absolutamente irrelevante quer para a adjudicação, quer para o objecto do contrato. E que não foi feito uso do princípio da proporcionalidade para a não exclusão dos concorrentes, bem como foi violado o princípio da igualdade. Ora, a questão versada nos autos, da aplicação do previsto nos arts. 57º, nº 1, alínea c), 70º, nº 2, alíneas a) e b) e 146º, todos do CCP, em conjugação com as cláusulas técnicas 2.10ª e 2.11ª do caderno de encargos aparenta ter sido bem decidida pelo TCA, através de uma fundamentação consistente, coerente e plausível, ao entender que a proposta da Recorrente não cumpre a referida cláusula 2.11ª e contraria a cláusula técnica 2.10ª, visto que (como acima se transcreveu), tal proposta omite as tarifas aplicáveis às chamadas para serviços especiais e para os serviços de apoio a clientes, não fazendo referência à possibilidade de barramento de chamadas e à activação da inibição dos serviços de valor acrescentado e outros serviços com custos associados, permitindo a realização deste tipo de chamadas que, uma vez realizadas, seriam os custos imputados à Entidade Demandada/Recorrente. Como igualmente não se afigura, no juízo sumário que a esta Formação cabe fazer, que tenha incorrido em qualquer erro, muito menos ostensivo, quanto ao que decidiu sobre a aplicação do art. 163º, nº 5, als. b) e c) do CPA (princípio da proporcionalidade) e sobre a violação do princípio da igualdade (ao dele não conhecer). Aliás, o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência deste STA que cita, bem como com a melhor doutrina, pelo que não justifica a reapreciação por este Supremo Tribunal. Com efeito, as instâncias decidiram as questões em discussão de forma consonante, quanto à interpretação dos pertinentes normativos do CCP e das normas do concurso (programa do procedimento e caderno de encargos) e, tudo indicando que o acórdão recorrido decidiu com acerto, o que exclui a necessidade da revista para uma melhor aplicação do direito. Ao que acresce que as questões não se afiguram com particular relevância jurídica e social ou especial complexidade que justifique postergar a regra da excepcionalidade da revista. 4. Decisão Pelo exposto, acordam em não admitir as revistas. Custas pelos Recorrentes. Lisboa, 25 de Maio de 2023. – Teresa de Sousa (relatora) – José Veloso – Fonseca da Paz. |