Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0425/19.8BEMDL |
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Data do Acordão: | 04/07/2021 |
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Tribunal: | 2 SECÇÃO |
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Relator: | FRANCISCO ROTHES |
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Descritores: | JUROS MORATÓRIOS DÍVIDA EXEQUENDA |
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Sumário: | I - A possibilidade de serem cobradas em processo de execução fiscal dívidas que não tenham natureza tributária (cf. art. 148.º, n.º 2, do CPPT) não implica que estas fiquem sujeitas ao regime das dívidas tributárias, designadamente no que respeita ao regime dos juros moratórios. II - A contagem dos juros de mora respeitantes à dívida que teve origem na exigência da devolução, por incumprimento contratual, de uma quantia, obtida a título de subsídio concedido pelo IEFP, há-de obedecer, por falta de outro regime especial, às regras gerais do Código Civil, designadamente o seu art. 559.º. |
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Nº Convencional: | JSTA000P27469 |
Nº do Documento: | SA2202104070425/19 |
Data de Entrada: | 02/03/2021 |
Recorrente: | AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Recorrido 1: | A............ |
Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Texto Integral: | Recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida no processo com o n.º 425/19.8BEMDL Recorrente: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) Recorrido: A………… 1. RELATÓRIO 1.1 O Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela veio interpor recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida naquele Tribunal, que, julgando procedente a reclamação judicial aí deduzida pelo acima identificado Recorrido ao abrigo do disposto no art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), considerou que os juros de mora respeitantes à dívida em cobrança nos autos – proveniente de um subsídio concedido pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, I.P. (IEFP) e cuja devolução este lhe ordenou – não podiam contar-se nos termos do regime especial para a contagem de juros de mora das dívidas do Estado, previsto pelo Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março (ELI: https://data.dre.pt/eli/dec-lei/73/1999/03/16/p/dre/pt/html.). 1.2 Apresentou alegações, com conclusões do seguinte teor: « 1.ª É inquestionável que a dívida em cobrança – subsídio do IEFP,IP – não tem natureza tributária. Porém, tal não justifica a aplicação subsidiária do regime comum de juros de mora legais previsto no artigo 559.º do Código Civil! Pois, existe um regime especial para a contagem de juros de mora das dívidas do Estado e outras pessoas colectivas de públicas – como é o caso do IEFP, IP, entidade pública conforme o Decreto-Lei n.º 143/2012 de 11 de Julho. 2.ª Pelo que, ao contrário do decidido na Douta Sentença e sempre com o devido respeito, a consideração da dívida em cobrança como não tributária é totalmente irrelevante para efeitos da aplicação do regime especial de juros de mora, previsto no Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março, com actualizações de taxa anuais publicadas nas competentes Portarias. 3.ª Pois, este regime especial de juros de mora, previsto no Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março é aplicável não só às dívidas de natureza tributária (também por força do artigo 44.º n.º 3 da LGT), mas também às restantes dívidas do Estado e outras pessoas colectivas de públicas, como sucede na cobrança deste subsídio do IEFP,IP. 4ª e última conclusão – assim, uma vez que as taxas de juros de mora são as mesmas que são aplicadas às dívidas de natureza tributária, os juros de mora foram correctamente calculados na execução fiscal, nos termos do Decreto-Lei n.º 73/99, de 6 de Março e Portarias anuais. Pelo que a dívida (juros de mora) ainda não se encontra completamente ressarcida e as penhoras em crise são válidas e necessárias à integral reposição do crédito da entidade pública. Nestes termos, e nos melhores de Direito, que serão por V. Ex.as Doutamente supridos, deve o presente recurso ser julgado procedente, e em consequência, revogada a Douta Sentença, com manutenção das penhoras e execução fiscal, por legais, justificadas e necessárias à integral cobrança do crédito da entidade pública». 1.3 O Recorrido contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido. 1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, deu-se vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso. Isto, após resumir o decidido pela sentença e os termos do recurso, com a seguinte fundamentação: «[…] Invoca a Recorrente que apesar de a dívida que está em causa nos autos não ser uma dívida tributária, não deve ser aplicado ao cálculo dos juros de mora, subsidiariamente, o regime comum do Código Civil, 1.5 Cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida fez errado julgamento ao considerar que os juros de mora da dívida exequenda não podem ser contados nos termos do Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto: «1. A dívida exequenda tem a sua origem e natureza numa obrigação de restituição, por incumprimento, de subsídio concedido ao Reclamante pelo Instituto de Empego e Formação Profissional (IEFP) cujo valor perfazia o montante de 11.456,39 €, acrescida de juros de mora no valor de 469,25 €, e cuja data de extracção de certidão para efeitos de execução ocorreu a 22/01/2004 – cfr. PA, em fls. não numeradas (Fls. 7 dos autos); 2. A interpelação específica para o cumprimento voluntário do pagamento do valor a restituir foi fixado em 15 dias úteis, a correr após o primeiro dia útil subsequente à notificação, ocorrida por AR, recepcionado a 28/02/2003 – cfr. PA, em fls. não numeradas (Fl. 3.ª/ v e 4.ª e 5.ª/V); 3. Nesta sequência, por ofício datado de 17/2/2005, o aqui Reclamante foi citado no âmbito do processo de execução fiscal 0493200501000098, que corre termos no SF de Carrazeda de Ansiães, para pagar 11.925,64 € – Fls. 6/v dos autos 4. Ao valor da execução foram imputados os seguintes montantes penhorados: 5. Os montantes afectos pelas penhoras foram desde logo imputados à quantia exequenda e levaram ao integral pagamento desta – cfr. PI, não impugnado na contestação e fls. 58 dos autos; 6. Até 28/2/2020 o aqui Reclamante entregou no processo de execução fiscal em causa o montante de 18.335,57 € – Fls. 58 dos autos; 7. A diferença entre os juros de mora pagos no PEF e o valor dos juros de mora calculados de acordo com o Código Civil em 28/2/2020, é de 2.817,50 € – Fls. 58 dos autos; 8. De acordo com a informação dada pela plataforma informática da AT em 19/9/2019, referente ao processo de execução fiscal em causa (0493200501000098) o Reclamante ainda tem de pagar 6.826,07 € – Doc. 44». * 2.2 DE DIREITO 2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR 2.2.1.1 O ora Recorrido apresentou reclamação contra a manutenção da penhora de parte do seu salário e do reembolso do IRS, pedindo o levantamento da penhora com o fundamento de que os montantes que já lhe foram penhorados no âmbito da execução fiscal mais do que asseguram o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, designadamente os juros moratórios e as custas. 2.2.1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela considerou que a divergência entre a AT, enquanto exequente, e o Reclamante, executado e ora recorrido, respeitava exclusivamente ao modo de contagem dos juros moratórios da dívida exequenda: enquanto aquela sustenta que os juros se devem contar nos termos no Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março, por estarmos perante uma dívida a uma pessoa colectiva pública, este sustentou que não pode ser aplicada outra regra senão a do art. 559.º do Código Civil (CC). 2.2.1.3 Inconformado com essa sentença, o Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela dela recorre para este Supremo Tribunal. 2.2.1.4 Assim, a única questão que cumpre apreciar e decidir no presente recurso é a de saber como se contam os juros moratórios da dívida exequenda. Sendo pacífico que tal dívida não tem natureza tributária – o que Recorrente e Recorrido não disputam e, pelo contrário, aceitam expressamente –, a resposta à questão passa por saber se esses juros se contam nos termos do Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março, como sustenta a Recorrente, ou nos termos do art. 559.º do CC, como decidiu a sentença, com a concordância do ora Recorrido e do Ministério Público, quer em 1.ª instância quer neste Supremo Tribunal. 2.2.2 DOS JUROS MORATÓRIOS – MODO COMO SE CONTAM Atenta a natureza da dívida exequenda – que teve origem na exigência da devolução, por incumprimento contratual, de uma quantia, obtida a título de subsídio concedido pelo IEFP – não vemos como sustentar a aplicação do regime de juros de mora prevista no Decreto-Lei n.º 73/99, de 16 de Março. 2.2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: I - A possibilidade de serem cobradas em processo de execução fiscal dívidas que não tenham natureza tributária (cf. art. 148.º, n.º 2, do CPPT) não implica que estas fiquem sujeitas ao regime das dívidas tributárias, designadamente no que respeita ao regime dos juros moratórios. II - A contagem dos juros de mora respeitantes à dívida que teve origem na exigência da devolução, por incumprimento contratual, de uma quantia, obtida a título de subsídio concedido pelo IEFP, há-de obedecer, por falta de outro regime especial, às regras gerais do Código Civil, designadamente o seu art. 559.º. * * * 3. DECISÃO Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT]. * Lisboa, 7 de Abril de 2021. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Paulo José Rodrigues Antunes. |