Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01932/03
Data do Acordão:03/02/2004
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:ANTÓNIO MADUREIRA
Descritores:ELEITOS LOCAIS.
RENÚNCIA AO MANDATO.
SUBSÍDIO EXTRAORDINÁRIO.
Sumário:I - A renúncia de um vereador de uma Câmara Municipal ao seu mandato é um acto unilateral, que configura o exercício de um direito potestativo, pelo que extingue o seu mandato pela sua simples declaração de vontade, independentemente da anuência do órgão a que pertence.
II - Os eleitos locais em regime de permanência têm direito a remuneração mensal, bem como a dois subsídios extraordinários, de montante igual àquela, em Junho e Novembro (artigo 6.º, n.º 1 da Lei n.º 29/87, de 30/6).
III - Em face do paralelismo das situações, na vertente remuneratória, entre os eleitos locais e os funcionários das autarquias locais (àqueles é pago um subsídio extraordinário, no mês de Novembro, enquanto a estes é pago um subsídio de Natal, também em Novembro e em ambos os casos os subsídios correspondem à remuneração mensal) e ao laconismo da Lei n.º 29/87, que apenas se refere a esse pagamento, enquanto que o Decreto-Lei n.º 496/80 trata várias situações possíveis, designadamente a não prestação de funções no ano completo, é o regime do Decreto-Lei n.º 496/80 aplicável subsidiariamente aos eleitos locais.
IV - Donde decorre que, tendo em conta o estabelecido no artigo 7.º deste último diploma, um vereador de uma Câmara Municipal que exerceu funções, em regime de permanência, até 31 de Outubro, tem direito a receber os duodécimos do subsídio extraordinário de Novembro relativamente aos meses em que efectivamente exerceu as suas funções.
Nº Convencional:JSTA00060955
Nº do Documento:SA12004030201932
Data de Entrada:12/02/2003
Recorrente:CM DE VIEIRA DO MINHO
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAC PORTO.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR ADM GER.
Área Temática 2:DIR ELEIT.
Legislação Nacional:CPC96 ART664.
L 29/87 DE 1987/06/30 ART2 ART5 ART6 ART7.
LAL99 ART59 ART76 ART77 ART79 ART80.
DL 496/80 DE 1980/10/20 ART2 ART7.
Referência a Doutrina:VEIRA DE ANDRADE A JUSTIÇA ADMINISTRATIVA 4ED PAG72.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO
1. 1. A Câmara Municipal de Vieira do Minho interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo do Porto de 17/6/03, que, concedendo provimento ao recurso contencioso contra ela interposto por A..., com os devidos sinais nos autos, anulou a sua deliberação de 6/6/2 002, que negou o pagamento do subsídio de Natal de 2 001 ao recorrente, tendo considerado, para o efeito, violado o artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 496/80, de 20 de Novembro.
Nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:
1.ª) - A sentença recorrida violou, por erro na determinação da norma aplicável, o disposto no art.º 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 496/80 de 20 de Outubro, porquanto, o caso sub iudicio, de acordo com uma ponderação articulada dos elementos da interpretação (gramatical, sistemático e teleológico) se deve reger, exclusiva e integralmente, pelo disposto no artigo supra referido, em virtude do ora recorrido ter renunciado ao cargo de vereador a tempo inteiro da Câmara Municipal de Vieira do Minho em 31 de Outubro de 2001.
2.ª) - Tal é o que deflui, com meridiana clareza, não só da letra da declaração de renúncia do ora recorrido ao seu mandato como vereador a tempo inteiro da Câmara Municipal de Vieira do Minho (revelando-se decisivo o sentido a assacar ao elemento literal, em virtude de nos depararmos com uma declaração de vontade formal para efeitos do disposto no art.º 238.º do Código Civil, que se deverá ter por aplicável, com as necessárias adaptações, ao caso vertente), como, igualmente, dos usos da prática, sendo, por isso, este o resultado interpretativo que alcança um declaratário normalmente sagaz e diligente colocado, para o efeito, na posição do real declaratário - teoria da impressão do destinatário.
3.ª) - Acresce que o direito de renúncia, em razão da sua qualidade intrinsecamente potestativa, não carece da anuência de terceiros para desprender a sua energia jurídica, impondo-se, irresistivelmente, aos mesmos, independentemente e mesmo contra a sua vontade;
4.ª) - Do que decorre que o despacho de S.Ex.ª o Presidente da Câmara assume carácter meramente declarativo, não cabendo falar, em termos rigorosos, de qualquer tipo de retroactividade.
5.ª) - Ainda que assim se não entenda, no que se transige por mera hipótese de raciocínio, sempre estaríamos em face de uma retroactividade querida e, nessa medida - presume-se! -, favorável, pelo que em nada vedada pela lei.
6.ª) - Em inferência do que vai dito, é de enfatizar que a norma do art.º 80.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na redacção que lhe foi emprestada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro, há-de interpretar-se como desprendendo a sua eficácia normativa somente para as situações de cumprimento integral do mandato (perpetuando-se a manutenção em funções até à tomada de posse do novo executivo camarário) e não aos da sua suspensão ou cessação voluntária por facto de titular ou membro da Câmara Municipal.
7.ª) - Nesta tela de fundo, é apodíctico que se deva recusar o direito do ora recorrido à atribuição do subsídio extraordinário, consignado no art.º 6.º da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, para os eleitos locais em regime de permanência, por inobservância dos requisitos (materiais e temporais), cumulativos, de que se faz depender a sua concessão:
i. Exercício do mandato de eleito local em regime de permanência;
ii. Coincidência, forçosa, entre o período de desempenho de funções como eleito local e a data em que é pagável o competente subsídio extraordinário.
8.ª) - Bem andou, pois, a Câmara Municipal de Vieira do Minho ao negar o subsídio ao ora recorrido, uma vez que o mesmo não preenchia nenhuma das exigências legalmente prescritas para que lhe fosse reconhecido o direito reclamado.
1.2. Contra-alegou o recorrente, tendo formulado as seguintes conclusões:
1.ª) - A decisão recorrida julgou procedente o vício de violação da lei invocado e, em conformidade, anula a deliberação recorrida, porquanto considera inaplicável à questão sub judice o regime de atribuição do subsídio de Natal ao funcionalismo público (DL 496/80).
2.ª) - Sobre este fundamento a recorrida não produz qualquer comentário deixando-o, pois, intocável.
3.ª) - A decisão, também ela do acórdão recorrido, de “ a renúncia do recorrente … apenas (operar a cessão de funções) a partir do momento em que ele é substituído nos termos legais, não merece qualquer reparo e a recorrente não tem razão no alegado.
4.ª) - A renúncia, como declaração unilateral, só produz os seus efeitos, não com a emissão da declaração ou com a recepção desta pelo declaratário, mas sim nos termos e prazos em que, para cada caso, a lei estipula.
5.ª) - A renúncia ao mandato forense por parte de um advogado só produz os seus efeitos, no momento indicado, que aliás não foi sempre o mesmo ao longo dos tempos, pelo art.º 39.º do C.P.C..
6.ª) - A renúncia ao mandato de um deputado à Assembleia da República só produz os seus efeitos, nos termos e após conclusão do processo previsto no art.º 7.º do Estatuto dos Deputados.
7.ª) - A renúncia ao mandato por parte de um titular de um órgão autárquico só produz efeitos, ou seja, o renunciante só deixa de exercer o cargo com todos os direitos ou obrigações, aquando da sua substituição nos termos do disposto no art.º 80.º do D.L. 169/99, de 18 de Setembro.
1. 3. A Exm.ª Magistrada do Ministério Público emitiu o douto parecer de fls 133, no qual se pronunciou pelo não provimento do recurso.
1. 4. Foram colhidos os vistos dos Exm.ºs Juízes Adjuntos, pelo que cumpre decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2. 1. OS FACTOS:
A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
1. O recorrente - professor do 2.º e 3.º ciclos da Escola Básica do Parchal - por ter sido eleito para o mandato autárquico de 1 997/2 001, esteve em comissão de serviço extraordinária na CMVM, como vereador em regime de permanência - ver PA anexo;
2. Por carta de 31/10/2 001 - entrada nos serviços da CMVM na mesma data - o recorrente comunicou ao presidente da CMVM, além do mais, o seguinte: Conforme oportunamente informei V.Excia, venho comunicar a minha indisponibilidade para continuar a exercer as funções em regime de permanência, a partir do dia 1 de Novembro - ver folha 9 dos autos e folha 2 do PA, dadas por reproduzidas;
3. Em 2 de Novembro de 2 001, o presidente da CMVM despachou esta pretensão - ver folha 9 dos autos, sendo o teor do reduzido texto pouco perceptível;
4. Por ofício datado de 6 de Novembro de 2 001, o presidente da CMVM comunicou à Escola do 2.º e 3.º Ciclos do Ensino Básico do Parchal que o recorrente, a seu pedido, cessou as funções em regime de permanência a partir do dia 1 de Novembro de 2 001, com a consequente cessação da comissão de serviço a partir dessa data - ver folhas 3 do PA, dada por reproduzida;
5. Em 12 de Dezembro de 2 001, o recorrente foi nomeado, em comissão de serviço, Director do Núcleo de Planeamento e Estatística do Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social (CDSSS) de Braga, com efeitos a partir de 5 de Novembro de 2 001 - ver folha 11 dos autos, dada por reproduzida;
6. Em 20 de Fevereiro de 2 002, o recorrente solicitou ao presidente da CMVM o pagamento do subsídio de Natal referente ao ano de 2 001, nos termos seguintes. 1- O signatário exerce funções em regime de comissão de serviço no Centro Distrital de Segurança Social de braga, com efeitos a partir do dia 5 de Novembro de 2 001; 2 - Nos termos legais em vigor,, o subsídio de Natal devido ao funcionário é da competência do Serviço onde o mesmo se encontra em exercício de funções no dia 1 de Novembro; 3 - Acontece que nesse dia, o signatário ainda estava no exercício de funções nessa autarquia, conforme se pode verificar na comunicação oportunamente apresentada; 4- O signatário apenas foi abonado do Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social a partir do dia 5 de Novembro de 2 001, não tendo até à data recebido o subsídio de Natal. Nestas circunstâncias, vem solicitar a V. Excia se digne mandar processar este abono ainda em falta. Finalmente, considerando que o dia 2 de Novembro foi sexta-feira e houve tolerância de ponto decretada pelo Governo, vem solicitar que a desvinculação desse Serviço produza efeitos apenas a partir do dia 4 de Novembro de 2 001, pelas duas razões expostas - ver folha 10 dos autos, dada por reproduzida;
7. Em 7 de Março de 2 002, a Chefe da Divisão Administrativa da CMVM - analisando o pedido formulado pelo recorrente à luz do disposto no artigo 2.º, n.º 1 do DL n.º 496/80, de 20 de Outubro - emitiu parecer jurídico onde se conclui da forma seguinte: 1- No 01 de Novembro de 2 001, o requerente já não prestava serviço na CMVM; 2 - Nessa data, o mesmo prestava serviço na Escola Básica do Parchal; 3 - Deverá ser esse estabelecimento de ensino a proceder ao pagamento do subsídio de Natal - ver folhas 14/15 dos autos, dadas opor reproduzidas;
8. Na sua reunião de 6 de Julho de 2 002, a CMVM - tendo presente o requerimento do recorrente e o teor do referido parecer jurídico - deliberou, por unanimidade, indeferir em conformidade com o parecer jurídico - acto recorrido - ver folha 15 do PA, dada por reproduzida;
9. Em 15 de Julho de 2 002, o recorrente é notificado desta deliberação - ver folhas 13 a 15 dos autos, dadas por reproduzidas;
10. Em 15 de Julho de 2 002, deu entrada em tribunal o presente recurso contencioso.
2. 2. O DIREITO:
A sentença recorrida anulou o despacho contenciosamente impugnado, que negou o pagamento do subsídio de Natal de 2 001 ao recorrente, por ter considerado que o preceito em que se estribou para o fazer - o artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 496/80, de 20 de Novembro - lhe não era aplicável, pelo que incorreu em erro de direito, enquadrável no vício de violação de lei invocado pelo recorrente.
Consideramos, no entanto, que tal erro não era, só por si determinante da anulação.
Na verdade, não estando o juiz sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 664.º do CPC), só haveria fundamento para essa anulação desde que esse pagamento, não estando previsto nesse preceito, também o não estivesse noutra disposição legal. E, quanto a nós, está.
Com efeito, o Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela Lei n.º 29/87, de 30/6, após definir o regime de desempenho de funções, incompatibilidades, deveres e direitos (artigos 2.º a 5.º), estabeleceu o regime de remunerações dos eleitos locais que desempenhassem os cargos em regime de permanência (artigo 6.º), como era o caso do recorrente, fazendo-o, além do mais, nos seguintes termos: "1- Os eleitos locais em regime de permanência têm direito a remuneração mensal, bem como a dois subsídios extraordinários, de montante igual àquela, em Junho e Novembro."
Quanto a este subsídio nada mais disse, contrariamente ao estabelecido no regime geral do funcionalismo, que, regulando minuciosamente o seu vencimento, pagamento e montante, estabeleceu no seu artigo 7.º: “Os funcionários e agentes que cessem definitivamente funções (...), terão direito a receber, na data da cessação, um subsídio equivalente a tantos duodécimos quantos os meses de serviço completos prestados nesse ano, o qual se aferirá pelo último vencimento auferido.”
Partindo da letra da lei, defende a recorrida que são condições cumulativas para a sua atribuição: o exercício do mandato de eleito local em regime de permanência e a coincidência, forçosa, entre o período de desempenho de funções como eleito local e a data em que é pagável o competente subsídio extraordinário. Não lhe reconhecendo o direito, por entender que a renúncia do mandato produz efeitos imediatos, sem necessidade de qualquer acto de aceitação, o que implicou que o recorrente não exercesse funções em Novembro.
Tese a que contrapõe o recorrente - e que foi consagrada na sentença recorrida - a de que o mandato dos eleitos locais só termina quando forem substituídos nos seus cargos, o que, embora não estando apurado ao certo quando tal se verificou, foi seguramente depois de 1 de Novembro.
A primeira questão a resolver é, assim, a data da produção de efeitos da renúncia ao mandato dos eleitos locais.
O Meritíssimo Juiz recorrido estriba a sua posição – de que a renúncia só opera após a substituição do renunciante - no artigo 80.º da Lei da Autarquias Locais (LAL), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 169/99, de 18/9, segundo o qual os titulares dos órgãos autárquicos se mantêm em funções até serem legalmente substituídos, substituição essa que deverá ser feita de acordo com o estabelecido nos artigos 59.º e 79.º do mesmo diploma.
Esta é também a posição do recorrido (recorrente contencioso), enquanto que a recorrente defende que o direito de renúncia, em razão da sua qualidade intrinsecamente potestativa, não carece da anuência de terceiros para desprender a sua energia jurídica, impondo-se, irresistivelmente, aos mesmos, independentemente e mesmo contra a sua vontade, havendo de interpretar-se o referido artigo 80.º como desprendendo a sua eficácia normativa somente para as situações de cumprimento integral do mandato (perpetuando-se a manutenção em funções até à tomada de posse do novo executivo camarário) e não aos da sua suspensão ou cessação voluntária por facto de titular ou membro da Câmara Municipal.
A nosso ver, a razão está do lado da recorrente.
Na verdade, estabelece o artigo 76.º da LAL, no seu n.º 1 que "Os titulares dos órgãos das autarquias locais gozam do direito de renúncia ao respectivo mandato a exercer mediante manifestação de vontade apresentada, quer antes quer depois da instalação dos órgãos respectivos."
A referência à manifestação de vontade como modo de exercício do direito inculca estar-se perante um direito potestativo, direito esse que se impõe pelo seu simples exercício, sem dependência da anuência de qualquer destinatário, natureza que se evidencia através da comparação desta figura com a da suspensão do mandato, prevista no artigo 77.º, segundo a qual " Os membros dos órgãos das autarquias locais podem solicitar a suspensão do respectivo mandato" (n.º 1), que deve ser devidamente fundamentada (...), é enviada ao Presidente e apreciada pelo plenário do órgão na reunião imediata à sua apresentação (n.º 2).
Ora, enquanto a renúncia é feita mediante simples manifestação de vontade e não é apreciada, para deferimento ou indeferimento, por ninguém, a suspensão é requerida, fundamentada e apreciada pelo plenário do órgão a que o membro pertencer.
Não restam, pois, dúvidas que a renuncia configura o exercício de um direito potestativo e que, como tal, funciona imediatamente, per se, sem necessidade de aceitação pelo órgão a que o membro pertence ou por qualquer outra entidade.
Esta é a posição defendida por Vieira de Andrade, in Justiça Administrativa, 4.ª edição, pág.72, para quem, no âmbito dos direitos subjectivos públicos, há a considerar os direitos potestativos, que qualifica como "(...) poderes (unilaterais) de provocar inelutavelmente a constituição, modificação ou extinção de relações jurídicas, aos quais corresponde uma sujeição do lado passivo", dando como exemplos, entre outros, o de renunciar a mandato público.
Assim sendo, a continuidade do mandato dos eleitos locais até à sua substituição, consagrada no artigo 80.º da LAL, não pode deixar de se reportar apenas às situações de cumprimento integral do mandato, deixando fora do seu âmbito de aplicação as situações da sua cessação voluntária, como aquela que se verificou no caso em apreciação.
Em face do exposto, e aplicando a doutrina enunciada aos factos dados como provados, temos que, o recorrido (recorrente contencioso) renunciou ao seu mandato em 30/10/2 001, pelo que, em Novembro desse ano, mês em que havia lugar ao pagamento de um subsídio extraordinário equivalente à sua remuneração mensal, já não exercia o cargo político por que lhe era devido esse pagamento.
O que, segundo a recorrente, era absolutamente impeditivo desse pagamento.
Não cremos, no entanto, que assim seja.
Na verdade, o artigo 6.º do Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela Lei n.º 29/87, de 30/6, estabelece um estatuto remuneratório específico para os membros eleitos das autarquias locais, nele incluindo um chamado subsídio extraordinário de Novembro em tudo similar ao chamado subsídio de Natal estabelecido para os trabalhadores da função pública pelo n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 496/80, de 20/10.
Apenas estabelece que esse subsídio é pago em Novembro, nada dizendo, por exemplo, relativamente a situações de eleitos que tenham prestado serviço anteriormente a esse mês ou apenas o tivessem prestado após esse mês, contrariamente ao Decreto-Lei n.º 496/80, que regula todas essas situações.
Ora, sob pena de consagrarmos situações absolutamente inaceitáveis, como por exemplo, a decorrente de um eleito local que apenas exercesse funções durante um único dia desse mês de Novembro ter direito a um subsídio completo, e perante o laconismo da Lei n.º 29/87, teremos de considerar, face ao paralelismo das situações (apenas estamos a considerar a vertente remuneratória), que o regime do Decreto-Lei n.º 496/80 é aplicável subsidiariamente aos eleitos locais.
Donde decorre que, tendo em conta o estabelecido no seu artigo 7.º, o recorrente tinha direito a receber os duodécimos do subsídio extraordinário de Novembro relativamente aos meses em que efectivamente exerceu as suas funções.
Ao negar-lhe esse pagamento, o acto recorrido violou o disposto no artigo 6.º, n.º 1 da Lei n.º 29/87, conjugada com o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 496/80, pelo que é ilegal e devia ser anulado.
Em consequência, é de manter, embora com estes fundamentos, a anulação decretada pela sentença recorrida, pelo que improcedem as alegações da recorrente.
3. DECISÃO
Nesta conformidade, acorda-se em negar provimento ao recurso.
Sem custas.
Lisboa, 2 de Março de 2004
António Madureira – Relator – Políbio Henriques – João Belchior