Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02143/18.5BEPRT
Data do Acordão:12/17/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:ADICIONAL
IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
INCONSTITUCIONALIDADE
Sumário:I - Como resulta da interpretação sufragada no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 299/2019, tirado em Plenário e por unanimidade, o artigo 135.º- B, n.º 2, do CIMI não enferma de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade nem por violação do princípio da capacidade contributiva.
II - Sobre a decisão das questões de constitucionalidade das normas a última palavra é sempre do Tribunal Constitucional.
Nº Convencional:JSTA000P25364
Nº do Documento:SA22019121702143/18
Data de Entrada:07/23/2019
Recorrente:A.....-........,LDA
Recorrido 1:AT- AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1 – A A…….- ………, Lda., com os sinais dos autos, interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em 31 de Dezembro de 2018, que julgou improcedente a oposição judicial ao processo de execução fiscal n.º 3190201801156403, respeitante à cobrança do montante de €82.539,43 atinente a dívida de adicional ao IMI do ano de 2017, apresentando, para tanto, alegações que conclui do seguinte modo:
A. O Tribunal a quo andou mal ao julgar improcedente a oposição à execução fiscal, por entender que o adicional de IMI não é inconstitucional, não violando nem o princípio da igualdade tributária, nem o princípio da capacidade contributiva.
B. O adicional ao IMI consubstancia um imposto que incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português, de que as pessoas singulares ou colectivas sejam titulares, substituindo a anterior verba n.º 28 de imposto do selo.
C. Com o imposto do selo e com o adicional de IMI, o Legislador pretende taxar as grandes fortunas imobiliárias, ou seja, o património de elevado ou muito elevado.
D. O TC entendeu que a verba 28.1 do Imposto do Selo era constitucional por não distinguir ou individualizar os sujeitos passivos por recurso a outro critério que não seja a titularidade dos valores patrimoniais, nomeadamente, pela titularidade de terrenos para construção de edifícios para habitação de elevado valor patrimonial tributário.
E. Pelo que, o Governo (entenda-se o legislador), por forma a manter um imposto que tributasse as grandes fortunas imobiliárias, mas que não tivesse os vícios legais e constitucionais do imposto do selo imputados pelo Acórdão do TC supra referido, revogou a verba 28.1, de imposto do selo, e criou o adicional ao IMI.
F. Contudo, a formulação da incidência subjectiva e objectiva do adicional ao IMI contém um vício de delimitação.
G. Salvo o devido respeito por melhor opinião, este novo imposto, designado de “adicional ao IMI”, padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade tributária e da capacidade contributiva, visto que (i) delimita a sua aplicação com base em valorações económico-financeiras e na natureza do titular de valores patrimoniais, bem como (ii) por que atinge indiscriminadamente contribuintes com e sem força contributiva necessária para suportar o imposto.
H. O adicional ao IMI, apesar no caso das pessoas singulares, apenas incidir sobre o património que excede o valor de € 600.000,00 euros, já no caso das pessoas colectivas, atinge todo o seu património imobiliário sujeitando-o à aplicação da taxa do adicional ao IMI, desconsiderando, o legislador, totalmente a circunstância das empresas terem, ou não, possibilidade para procederem ao respectivo pagamento.
I. Assim sendo, o legislador, uma vez mais, de forma precipitada, equivocada e nem sequer demonstrada, pretendeu identificar de forma automática, um sujeito passivo com capacidade contributiva excepcional, ou acima da média, numa pessoa colectiva.
J. Ou seja, este legislador, que criou o adicional ao IMI, entendeu que o sujeito passivo pessoa singular tem capacidade contributiva para ser tributado por este imposto, desde que seja titular de património com valor patrimonial tributário superior a € 600.000,00 euros; já um sujeito passivo que seja pessoa colectiva não merece esta diferenciação, considerando-se que tem sempre capacidade contributiva desde que seja titular de prédio(s) urbano(s) habitacionais, ou terrenos para construção.
K. Salvo o devido respeito, não podemos acompanhar o raciocínio ínsito na sentença recorrida, pois, o Tribunal a quo compadria o tratamento diferenciador que o Legislador fez às pessoas colectivas e às pessoas singulares com base no facto de todo o património detido por uma pessoa colectiva ser explorado por aquela, com vista à obtenção do lucro.
L. O raciocínio do Tribunal a quo não é desprovido de lógica, contudo, foge da ratio legis da criação de tal imposto, não tendo qualquer cabimento para averiguar da existência de violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva, por se basear no facto de as pessoas colectivas deterem imóveis sempre com o objectivo de obtenção do lucro.
M. O que devia ser considerado era a capacidade contributiva, a qual não é possível apurar meramente mediante a verificação da titularidade de imóveis, até porque o imposto em causa apenas pretende tributar aqueles imóveis com valor patrimonial tributário elevado, conforme é referido pelo Tribunal a quo.
N. A dívida pública portuguesa deixou de ser considerada como lixo, pelas agências de rating (de classificação de risco de crédito), no início do segundo trimestre de 2017, pelo que, também por este ponto, se suscita a questão da necessidade de manter um imposto que consiste num agravamento da colecta quanto ao património imobiliário, se a ratio legis do mesmo consiste na superação de uma crise económica e financeira, que os organismos oficiais, competentes na matéria, já consideram ultrapassada.
O. Apesar de o adicional ao IMI ter sido alargado ao conjunto do património de cada contribuinte, não garantiu uma efectiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento, visto que faz uma separação entre pessoas colectivas e pessoas singulares.
P. Contrariamente às pessoas singulares e heranças indivisas, em que apenas são tributados os grandes patrimónios imobiliários (pois o adicional apenas incide sobre o conjunto de imóveis cujo valor patrimonial tributário exceda o montante de € 600.000,00 euros), as empresas imobiliárias não têm qualquer protecção, sendo o adicional ao IMI mais um imposto a incidir sobre a sua matéria-prima.
Q. Apesar de o Legislador não querer criar um novo imposto para as empresas, as pessoas colectivas na área da promoção imobiliária verificam efectivamente, com a criação deste imposto, a sua carga fiscal agravada.
R. O que é de injustiça gritante por uma dupla razão: (i) por serem pessoas colectivas relativamente às pessoas singulares, e (ii) por o seu sector de actividade (promoção imobiliária) estar a ser excluído da isenção beneficiada pelos restantes agentes económicos.
S. O adicional ao IMI apenas deveria incidir subjectivamente sobre as pessoas singulares que acumulam património imobiliário ou sobre as pessoas que, inseridas no sector da promoção imobiliária, não desenvolvem, em concreto, a sua actividade, mas tão só parqueiam imóveis para uso e fruição dos titulares do seu órgão de administração e gerência.
T. A expectativa jurídica decorrente de um terreno para construção não corresponde a qualquer direito absoluto ou consumado de edificação, visto que a mesma pode ficar frustrada por qualquer motivo, incluindo de natureza legal, e nunca vir a ser edificado qualquer prédio ou, mesmo, vir a ser edificado um prédio com fins que não sejam habitacionais.
U. Termos em que se encontra claramente fora do objecto previsional do conceito de tributação de bem habitacional de elevado valor, os terrenos para construção, sendo esse o caso dos imóveis da Recorrente.
V. Assim sendo, e tratando-se meramente de uma expectativa jurídica, e não de um facto tributário, andou mal o legislador quando incluiu na incidência objectiva do adicional ao IMI de terrenos para construção.
W. Por conseguinte, verifica-se que o adicional ao IMI é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade tributária e capacidade tributária, consagrados nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa.
Nestes termos e nos demais de Direito, e com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, ser anulada a sentença recorrida e substituída por Acórdão que julgue procedente a Oposição à Execução Fiscal, declarando a inconstitucionalidade do adicional de IMI, por violação do princípio da igualdade tributária e da capacidade contributiva, e, consequentemente, ordene a extinção do processo de execução fiscal em causa».


2 – A Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

3 – O recurso foi dirigido ao Tribunal Central Administrativo – Norte, que, por decisão sumária de 28 de Junho de 2019, declarou aquele Tribunal incompetente em razão da hierarquia para o conhecimento do recurso, por a questão versar exclusivamente sobre matéria de direito, e competente para o efeito a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. A recorrente, por requerimento de 18 de Julho de 2019, solicitou, ao abrigo do disposto no artigo 18.º, n.º 2, do CPPT, a remessa dos autos ao Supremo Tribunal Administrativo.

4 - O Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, fazendo menção à jurisprudência do Tribunal Constitucional (acórdãos 299/19-PLENÁRIO, de 21/05/2019 e 307/2019, de 24/05/2019) que não julgou inconstitucional a norma extraída do artigo 135.-B, n.ºs 1 e 2 do CIMI.

5 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

II – Fundamentação

1. De facto
Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) A actividade da sociedade A……-……….., Lda. é a promoção e comercialização de empreendimentos imobiliários, compra e venda e revenda de imóveis adquiridos para esse fim, promover e contratar obras de construção, remodelação ou beneficiação de imoveis, venda a retalho de materiais de construção, construção civil e obras públicas, compra de imóveis para arrendamento e gestão de imóveis próprios, prestação de serviços relacionados com a gestão e administração de imóveis, condomínios e espaços comerciais e de consultoria de gestão e empresas e patrimónios peritagens e avaliações imobiliárias e comercialização e importação de materiais de construção civil - cfr. fls. 25 do processo físico;
B) Foi instaurado pelo Serviço de Finanças do Porto 5 o processo de execução n.º 3190200801156403 em nome de A…….-………., Lda., por dívidas de adicional de IMI do ano de 2017 no montante de €82.539,43 – cfr. fls. 7 a 11 do processo físico.


2. Questões a decidir
Saber se se há-de qualificar como ilegal (invalidade derivada ou consequente) o acto de liquidação do adicional ao IMI, impugnado em sede de oposição à execução fiscal, com fundamento em ilegalidade abstracta (artigo 203.º, n.º 1, al. a do CPPT), por serem inconstitucionais as normas com base nas quais foi efectuada aquela liquidação; o que determina ajuizar da conformidade constitucional dos artigos 135.º-A, 135.º-B do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (de ora em dia, abreviadamente, CIMI).


3. De direito

3.1. Da conformidade constitucional dos artigos 135.º-A e 135.º-B do CIMI

3.1.1. A Oponente e aqui Recorrente suscita a questão da ilegalidade abstracta da liquidação com fundamento na inconstitucionalidade dos artigos 135.º-A e 135.º-B do CIMI (normas com base nas quais a mesma foi efectuada), alegando que as referidas normas violam, primeiramente, o princípio fundamental da igualdade (artigo 13.º da CRP), por considerar que do recorte normativo da incidência subjectiva do tributo resulta uma diferença de tratamento entre pessoas singulares e pessoas colectivas que não é juridicamente fundamentada. Afirma, a este propósito, nas alegações, o seguinte: «Em linguagem comum, este legislador, que criou o adicional ao IMI, entendeu que o sujeito passivo pessoa singular tem capacidade contributiva para ser tributado por este imposto, desde que seja titular de património com valor patrimonial tributário superior a € 600.000,00 euros; já um sujeito passivo que seja pessoa colectiva não merece esta diferenciação, considerando-se que tem sempre capacidade contributiva desde que seja titular de prédio(s) urbano(s) habitacionais, ou terrenos para construção (…) Noutro prisma, apesar de o adicional ao IMI ter sido alargado ao conjunto do património de cada contribuinte, não garantiu uma efectiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento, visto que faz uma separação entre pessoas colectivas e pessoas singulares – incidindo apenas, quanto a estas, se o seu património imobiliário, no seu todo, for superior a € 600.000,00 euros».
A imputa ainda àquelas normas a violação do princípio da capacidade contributiva (artigo 104.º, n.º 3 da CRP), por entender que este tributo «não respeita a diferente capacidade contributiva dos proprietários dos prédios sobre os quais incide, atingindo indiscriminadamente contribuintes com e sem a força contributiva necessária para suportar o imposto, quer porque as diferenciações que introduz entre os que são abrangidos e excluídos do seu âmbito de incidência não são proporcionais, sendo inadequadas para satisfazer o fim visado pela norma, que é o de tributar de forma agravada os patrimónios imobiliários de maior valor em termos que satisfaçam “o princípio da equidade social na austeridade”».

3.1.2. As normas cuja inconstitucionalidade é suscitada pela Recorrente foram aditadas ao Código do Imposto Municipal sobre Imóveis pela Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro (Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2017) e vieram substituir a tributação dos prédios urbanos de elevado valor, prevista na verba 28.1. da Tabela Geral do Imposto do Selo, revogada pelo n.º 2 do artigo 210.º da mencionada Lei n.º 42/2016. Sobre esta alteração legislativa escreveu-se na Proposta de Lei n.º 37/XIII/2.ª, sob a epígrafe “A tributação progressiva do património imobiliário” (v. Diário da Assembleia da República, II.ª Série -A, de 14 de Outubro de 2016, p. 69), o seguinte:
«O adicional ao imposto municipal sobre imóveis introduz na tributação do património imobiliário um elemento progressivo de base pessoal, tributando de forma mais elevada os patrimónios mais avultados, com uma taxa marginal de 0,3% aplicada aos patrimónios que excedam os 600.000€ por sujeito passivo. Para evitar o impacto deste imposto na atividade económica, excluem-se da incidência os prédios rústicos, mistos, industriais e afetos à atividade turística, permitindo-se ainda às empresas a isenção de prédios afetos à sua atividade produtiva até 600.000€. A possibilidade de dedução do montante de imposto pago à coleta relativa ao rendimento predial constitui adicionalmente um incentivo ao arrendamento e utilização produtiva do património. Este imposto substitui o anterior imposto do selo de 1% sobre o valor do imóvel acima de 1 milhão de euros. Com uma taxa muito inferior (0,3%) é também mais justo por ter em conta o valor global do património imobiliário e não, isoladamente, o valor de cada prédio».

3.1.3. A questão suscitada pela Recorrente para fundamentar a inconstitucionalidade das normas e a consequente ilegalidade abstracta da liquidação, foi já analisada e tratada em diversos processos de fiscalização concreta na jurisprudência constitucional, a saber: i) no acórdão n.º 299/19 (tirado com a intervenção do Plenário, nos termos do artigo 79.º.-A da LTC), no qual se decidiu, por unanimidade, “[N]ão julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 135.º-B, n.º 2, do Código do IMI, no sentido de incluir, no âmbito de aplicação do Adicional ao IMI, os «terrenos para construção» com fins de comércio, indústria, serviços ou outros”; no acórdão n.º 306/219, onde se decidiu “[N]ão julgar inconstitucional a norma constante do artigo 135.º-B, n.ºs 1 e 2, do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aditado pelo artigo 219.º da Lei n.º 42/2016, de 28.12, no segmento em que sujeita a tributação em adicional ao imposto municipal sobre imóveis (AIMI) a propriedade de terrenos para construção pertencentes a empresas que têm por objeto a comercialização de imóveis”; no acórdão n.º 307/2019, onde se decidiu “[N]ão julgar inconstitucional a norma extraível do artigo 135.º-B, n.ºs 1 e 2, do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aditado pelo artigo 219.º da Lei n.º 42/2016, de 28.12, no segmento em que sujeita a tributação em adicional ao imposto municipal sobre imóveis (AIMI) a propriedade de prédios destinados à habitação e de terrenos para construção de prédios destinados à habitação, pertencentes a empresas que têm por objeto a comercialização de imóveis”; no acórdão n.º 399/2019, onde se decidiu “não julgar inconstitucional a norma resultante da conjugação do artigo 135.º B, n.º 2, com o artigo 6.º, n.º 1, ambos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, segundo a qual a exclusão da incidência objetiva do adicional ao imposto municipal sobre imóveis abrange os prédios urbanos para serviços mas já não os terrenos para construção, cuja afetação prevista dos edifícios a construir seja para serviços”; no acórdão n.º 530/2019, onde se decidiu “[N]ão julgar inconstitucional a norma do artigo 135.º-B, n.º 2, do Código do IMI, no sentido de incluir, no âmbito de aplicação do Adicional ao IMI os “terrenos para construção” com fins de comércio, indústria, serviços ou outros”; e o acórdão n.º 544/19, onde também se decidiu “não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 135.º-A do Código do IMI, interpretado no sentido de incluir, no âmbito de aplicação subjetiva do imposto, entidades que detêm património imobiliário como consequência inevitável da atividade económica que desenvolvem” e, ainda “não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 135.º-B, n.º 2, do Código do IMI, no sentido de incluir, no âmbito de aplicação do Adicional ao IMI os “terrenos para construção” com fins de comércio, indústria, serviços ou outros”.
Tem existido, pois, unanimidade da jurisprudência do Tribunal Constitucional no entendimento de que as normas cuja conformidade constitucional aqui nos cumpre apreciar não violam as normas e os princípios constitucionais da igualdade e da tributação segundo a capacidade contributiva. Um juízo que é também acolhido pelos subscritores da tese da inconstitucionalidade da verba 28 do CIS, como resulta expresso da declaração de voto que acompanha o acórdão n.º 299/2019.

3.1.4. Nestes arestos, de entre os quais aqui tomamos como referência para fundamentação por remissão, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 94.º do CPTA (aplicável ex vi da alínea c do artigo 2.º do CPPT),o primeiro - o acórdão n.º 299/2019 -, a tese sufragada pelo Tribunal constitucional é, essencialmente, a de que não existe violação do princípio da igualdade por três razões: i) primeiro, porque a questão da desigualdade tem de ser analisada entre os grupos homogéneos e não entre a universalidade dos titulares de bens imóveis, uma vez que a incidência do imposto se baseia (como destaca a Recorrente) na desoneração de uma parte dos imóveis, ou seja, na isenção reconhecida aos “prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros»” e, nessa medida, “a norma de exclusão tributária, porque cria situações de favorecimento fiscal, para além da necessidade de assegurar o respeito pelo princípio da proporcionalidade, em função dos fins que se propõe atingir, deve assegurar que o critério do desagravamento fiscal se aplique a realidades que se mostrem iguais à luz desse critério (…) Assim, na primeira tipologia, a relação de igualdade estabelece-se através de um juízo de comparação dos contribuintes à luz do critério da capacidade contributiva; na norma de não incidência, a relação de igualdade estabelece-se através do confronto das pessoas ou situações à luz do critério distintivo ou tertium comparationis de que o legislador se serviu por razões extrafiscais”; ii) segundo, porque a diferenciação decorrente da mencionada norma de incidência consubstancia uma medida de política económica («evitar o impacto deste imposto na atividade económica») ínsita na estrutura interna do tributo e “[P]ara prosseguir aquele objetivo de política económica, é patente que a exclusão tributária não se apresenta inadequada, desnecessária ou excessiva, já que o desagravamento tributário constitui um dos instrumentos de política fiscal com aptidão e capacidade para prosseguir o objetivo de proteção e estímulo das atividades económicas visadas. Com efeito, a proteção do comércio, assim como das indústrias, dos serviços ou outras atividades económicas, é um interesse extrafiscal que se pode revelar de maior grandeza do que os ganhos obtidos por via da arrecadação da receita do AIMI (…) Não significa isso, porém, que o legislador se tenha proposto afastar a tributação em AIMI de todas as atividades económicas, ou que o tenha feito em função da natureza dos sujeitos passivos, visando afastar o impacto do tributo nas entidades cujos ativos integrem prédios urbanos, mormente nos sujeitos de natureza empresarial”; e iii) terceiro, porque o “racional da delimitação da incidência do imposto em pauta não decorre da atividade económica exercida pelo sujeito passivo, mas sim, tal como no IMI, da afetação social do prédio urbano”, o que explica que a isenção abranja todos os prédios com afectação comercial e para serviços (para não onerar as actividades económicas) e não apenas aqueles de valor inferior a 600.000,00€.
E sustenta também aquela jurisprudência do Tribunal Constitucional que inexiste violação do princípio da capacidade contributiva na medida em que o “facto tributário do AIMI recai sobre realidade económica relevante, pois a titularidade de um prédio imóvel urbano constitui, em si mesma, uma manifestação de riqueza - e uma riqueza determinável, por lhe ser social e juridicamente atribuído um valor de mercado -, revelando uma especial pujança económica, superior à da generalidade dos cidadãos, que potencia posição negocial no comércio jurídico em geral, em especial a capacidade de angariar meios de financiamento. Exprime uma abastança, que não se mostra por qualquer forma infirmada pela forma como foi obtida (permanece inalterada caso a titularidade de direitos sobre prédios urbanos seja adquirida por ato oneroso ou gratuito), ou pela sua afetação a uma atividade económica, que pode ou não gerar lucro”. Essa capacidade contributiva é aferida pelo limiar dos 600.000,00€ do valor patrimonial tributável.
E no aresto que vimos de citar, o Tribunal Constitucional esclarece também que o facto tributário que subjaz ao adicional do IMI é “a riqueza diretamente revelada pela própria titularidade de um valor patrimonial” e não “o rendimento gerado pelo património imobiliário”, o que justifica a incidência do imposto sobre os fundos de investimento imobiliário.

3.1.5. Acresce que, embora nos arestos o Tribunal não tenha respondido directamente à questão da conformidade constitucional do artigo 135.º-A do CIMI “no sentido de incluir, no âmbito de aplicação subjectiva do imposto, entidades que detêm património imobiliário como consequência inevitável da actividade económica que desenvolvem”, é possível inferir da fundamentação expendida na apreciação da conformidade constitucional do n.º 2 do artigo 135.º-B, a sua posição sobre este tema. Assim, entende aquela jurisprudência que a inconstitucionalidade que poderia decorrer da tributação das empresas que têm como actividade económica a compra e venda de prédios (e que muitos assinalavam à verba 28 do CIS) é neste caso solucionada pela aplicação das regras já existentes para o início da tributação em sede de IMI, ou seja, o imposto (neste caso também o adicional) só é devido a partir “do 4.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um terreno para construção tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objecto a construção de edifícios para venda” e “do 3.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um prédio tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objecto a sua venda” (alíneas d e e do n.º 1 do artigo 9.º, aplicáveis ex vi da alínea a, do n.º 3, do artigo 135.º-C todos do CIMI). E tal basta para afastar a inconstitucionalidade desta tributação aplicada àqueles sujeitos passivos na medida em que aquele lapso de tempo é o suficiente e adequado para assegurar a neutralidade desta tributação sobre a referida actividade económica.

3.1.6. Assim, por todas as razões antes aduzidas, maioritariamente por remissão para a interpretação sufragada no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 299/2019, tirado em Plenário e por unanimidade, fica afastada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 135.º-A e 135.º-B do CIMI e, com isso, a ilegalidade da liquidação que é objecto da oposição judicial a que se reporta o presente recurso.

Conclusões
Assim, podemos concluir, relativamente à questão em apreço, que:
1. Como resulta da interpretação sufragada no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 299/2019, tirado em Plenário e por unanimidade, o artigo 135.º-B, n.º 2, do CIMI não enferma de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade nem por violação do princípio da capacidade contributiva.
2. Sobre a decisão das questões de constitucionalidade das normas a última palavra é sempre do Tribunal Constitucional.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente [nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi a alínea e), do artigo 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário].


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Lisboa, 17 de Dezembro de 2019. – Suzana Tavares da Silva (relatora) – Paulo Antunes – Ascensão Lopes.