Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:066/11.8BUPRT
Data do Acordão:09/26/2024
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:JOÃO SÉRGIO RIBEIRO
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO
SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
Sumário:I - Apesar de a não verificação da identidade substancial do quadro jurídico e dos factos, só por si, dada a necessidade da verificação dos vários requisitos ser cumulativa, bastar para que não seja aceite o recurso por oposição de acórdãos, não podemos deixar de sublinhar que, em rigor, nem sequer há uma oposição entre os acórdãos relativamente à questão que a recorrente elegeu como a principal.
II - Não estão, por conseguinte, preenchidos os requisitos para a verificação da alegada oposição de acórdãos
III - Julgar findo o recurso.
Nº Convencional:JSTA000P32656
Nº do Documento:SAP20240926066/11
Recorrente:A..., S. A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. A..., S. A., devidamente identificada nos autos, vem, ao abrigo do disposto no artigo 282.º, n.º 3, do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), na redação então vigente, por remissão do art. 284.º, n.º 5 do mesmo diploma legal, interpor recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 16.03.2017, proferido no Proc. n.º 24/03, por, em seu entender, estar em oposição com o decidido no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (2.ª Secção), de 10.02.2010, proferido no Proc. n.º 052/10, que invoca como acórdão fundamento.

1.2. Conclui as suas alegações de recurso da seguinte forma:
«…
19. Em situações equiparáveis, de paragem dos processos contestatários das liquidações por períodos superiores a 1 ano por facto não imputável ao contribuinte;

20. perante a circunstância de ambos os processos terem estado parados por mais de 1 ano já completado à data da entrada em vigor da Lei nº 53-A/2006, de 29/12 - que revogou o nº 2 do artigo 49º da LGT e aditou um novo nº 4 ao mesmo preceito legal,

21. ou seja, perante situações totalmente equivalentes, em que toda a factualidade relevante ocorreu na esfera da lei antiga - a apresentação de meio de reacção e a transposição do período de 1 ano de paragem já haviam decorrido à data da entrada em vigor da nova lei, instituída por aquela Lei nº 53-A/2006, de 29/12,

22. o douto Acórdão recorrido entendeu que era aplicável a lei nova - ou seja, a revogação do nº 2 do artigo 49º da LGT e o novo nº 4 do mesmo preceito legal, operados pela dita Lei nº 53-A/2006, de 29/12,

23. enquanto o douto Acórdão fundamento considerou que era outrossim aplicável a lei antiga - ou seja, o artigo 49º nº 2 e nº 3 na redação anterior àquela Lei (isto é, na redação da Lei nº 100/99, de 26/7).

24. Sendo, assim, evidente a oposição entre ambos os Acórdãos.

Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., reconhecendo a sobredita oposição de Acórdãos e notificando a Recorrente para apresentar alegações recursivas, V. Exas., como sempre, farão inteira JUSTIÇA. …»

1.3. Por despacho proferido pela Ex.ma. Juíza Desembargadora Relatora, em 06.02.2024, concluiu-se pela verificação da oposição de acórdãos invocada, determinando-se a remessa dos autos a este Supremo Tribunal Administrativo.

1.4. Devidamente notificada do despacho que antecede, veio a Recorrente apresentar alegações de segundo grau, ao abrigo do artigo 284.º, nº. 5, do CPPT, na redação anterior à Lei 118/2019, de 17/09, concluindo-as do seguinte modo:

«…

1. A Impugnação Judicial, apresentada em 24.02.2003, esteve parada por mais de 1 ano, entre 10.10.2003 e 23.12.2004 - cfr. 4 e 5 dos factos provados.

2. Pelo que o efeito interruptivo da prescrição, decorrente da apresentação da Impugnação Judicial em 24.02.2003, cessou em 10.10.2004 - nos termos do nº 1 e 2 do artigo 49º da LGT, redacção legal ao tempo.

3. Efetivamente, contrariamente ao decidido no douto Acórdão aqui recorrido, a dívida tributária emergente da liquidação aqui impugnada já prescreveu.

Senão, vejamos:

4. Como resulta da factualidade provada, está em causa uma liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 1997.

5. Em matéria de IRC, o facto tributário considera-se verificado no último dia do exercício a que respeita: 31.12.1997 (artigo 8º nº 7 do CIRC), no caso.

6. Atento o disposto no artigo 34ºdo CPT, em vigor em 31.12.1997, o prazo de prescrição era de 10 anos.

7. E contava-se desde o início do ano seguinte àquele em que tivesse ocorrido o facto tributário (artigo 34º nº 2 do CPT).

8. Por conseguinte, o referido prazo de prescrição iniciou-se em 01.01.1998.

9. E terminaria, assim, em 01.01.2008.

10. Contudo, em 01.01.1999 entrou em vigor a LGT (cfr. artigo 6º do DL 398/98, de 17/12).

11. E, com ela, um novo prazo de prescrição, que foi reduzido para apenas 8 anos (artigo 48º nº 1 da LGT, redacção aplicável).

12. Aplicando-se de imediato aos prazos em curso, desde a sua entrada em vigor, salvo se, segundo a lei anterior, faltasse menos tempo para o prazo prescricional se completar (artigo 297º nº 1 do CC, por remissão do artigo 5º nº 1 do DL 398/98, de 17/12).

13. Assim, e porque à luz da LGT o prazo de prescrição terminaria em 01.01.2007 (antes, portanto, do terminus do prazo à luz do CPT), é este prazo - de 8 anos, contado desde 01.01.1999 - o prazo de prescrição concretamente aplicável.

14. À luz do artigo 49º nº 1 da LGT, a dedução da presente impugnação judicial interrompeu a prescrição.

15. A instauração da presente Impugnação Judicial ocorreu em 24.02.2003,como se deduz dos sinais dos autos (cfr. fls. 1), e não em 24.02.2002, como certamente por mero lapso de escrita se afirmou em 4. do probatório - o qual, desse modo, deve ser objecto da concomitante rectificação, nos termos do artigo 667º do CPC (redacção aplicável), porque relevante para a decisão de mérito acerca da prescrição.

16. A apresentação da presente Impugnação em 24.02.2003 interrompeu a prescrição.

17. Reiniciando-se a contagem do dito prazo prescricional a partir da data da ocorrência deste facto interruptivo.

18. Contudo, nos termos do artigo 49º nº 2 da LGT, redacção aplicável ao tempo (ou seja, na redacção da Lei nº 100/99, de 26/7 - anterior à da Lei nº 53-A/2006, de 29/12, entrada em vigor apenas em 01.01.2007), esse "efeito interruptivo" cessava se o processo de impugnação tivesse estado parado durante mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte,

19. somando-se, neste caso, ao tempo que decorrer após este período de paragem, o tempo que tiver decorrido até à data da autuação do processo "interruptivo".

20. O que se verificou, conforme se provou e resulta dos sinais dos autos: este processo de impugnação esteve parado por mais de um ano, entre 23.12.2004 - data em que a Impugnante juntou aos autos um documento - e 02.06.2006 - data da notificação da Impugnante do despacho de 25.05.2006 - por facto não imputável ao contribuinte.

21. Com efeito, "Os presentes autos de impugnação estiveram sem qualquer movimentação processual desde 10.10.2003 até 23.12.2004, cfr. fls. 35 e 36 destes autos" (vide 5 do probatório).

22. Por conseguinte, e para efeitos do cômputo do prazo de prescrição, de 8 anos, deve apurar-se o tempo decorrido entre 01.01.1999 e 24.02.2003, ao qual deve ser somado o tempo decorrido desde 10.10.2004 - data a partir da qual se completou um ano de paragem do processo de impugnação por motivos não imputáveis ao contribuinte.

23. Constatando-se, segundo esse apuramento, que já decorreram aproximadamente 23 anos, é manifesto que o prazo de prescrição há muito se completou.

24. Ao contrário do que considera o douto Acórdão, a prestação de garantia, em 26.08.2003, é irrelevante, no caso, para o cômputo do prazo prescricional.

25. Com efeito, a prestação de garantia não consta do elenco dos factos interruptivos ou suspensivos da prescrição constantes do artigo 49º nº 1 e nº 3 da LGT, na redacção aplicável ao tempo - ou seja, na redacção da Lei nº 100/99, de 26/7.

26. Efectivamente, dispõe o artigo 49º nº 3 da LGT, na redacção da Lei nº 100/99, de 26/7, que "O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso".

27. Como se verifica, nesse preceito legal não é feita qualquer referência às situações em que a paragem do processo de execução fiscal advém da "prestação de garantia".

28. Por outro lado, como se disse e ficou provado, a Impugnação Judicial esteve parada por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte - de modo que o respectivo efeito interruptivo da prescrição se degenerou em efeito meramente suspensivo da prescrição, entre a data da sua instauração e a data em que se completou o período de um ano de paragem por motivo não imputável ao contribuinte (cfr. artigo 49º nº 2 da LGT, na redacção da Lei nº 100/99, de 26/7).

29. Assim, contrariamente ao entendimento do douto Acórdão recorrido, o prazo de prescrição não esteve suspenso até ao trânsito em julgado da presente impugnação - já que esta esteve parada por mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte, como se disse e provou (cfr. artigo 49º nº 2 da LGT, na redacção da Lei nº 100/99, de 26/7).

30. Sem prejuízo, a suspensão do processo de execução fiscal estaria sempre dependente da presente impugnação judicial - foi precisamente por causa desta Impugnação ter estado parada, por facto não imputável ao contribuinte, que foi declarada a caducidade da garantia em questão.

31. Efectivamente, não se pode "desligar" a execução fiscal da Impugnação Judicial - pois esta está na base da suspensão da execução fiscal.

32. O douto Acórdão recorrido padece de erro de julgamento ao não dar relevo ao facto da presente Impugnação Judicial ter estado parada por mais de um ano, para efeitos do cômputo da prescrição - uma vez que, segundo o Acórdão recorrido, a execução fiscal esteve suspensa e o artigo 49º nº 3 da LGT atribuiu efeito suspensivo da prescrição à suspensão do processo de execução fiscal.

33. Se este entendimento vale para os casos de reclamação graciosa, não se vislumbra qualquer razão para que não valha de igual modo nos casos de impugnação judicial parada por mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte.

34. Com efeito, a partir do momento em que a reclamação graciosa ou a impugnação judicial (que estiveram na génese da suspensão da execução fiscal) tenham estado paradas por mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte, deixa de se poder considerar que a paragem do processo do processo de execução fiscal é imputável ao contribuinte,

35. de modo que se deve reiniciar a contagem da prescrição a partir do momento em que se completou um ano de paragem do processo de execução fiscal for facto não imputável ao contribuinte - o que sucede a partir do momento em que a reclamação graciosa ou a impugnação judicial contra a liquidação exequenda tenham estado paradas por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.

36. Acresce que, quanto à execução fiscal, o artigo 49º nº 1 da LGT, na redacção da Lei nº 100/99, de 26/7, apenas concedia eficácia interruptiva da prescrição, no caso da execução fiscal, à citação para essa mesma execução fiscal - e não à instauração dessa mesma execução fiscal (como sucedia na vigência do CPT).

37. Ora, não se provou em que data o contribuinte foi citado para a execução fiscal.

38. Ao contrário do entendimento do douto Acórdão recorrido, do artigo 49º nº 3 da LGT, naquela redacção, não resulta a suspensão da prescrição por motivo de paragem do processo de execução em consequência de prestação de garantia - outrossim, "em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas",

39. muito menos a suspensão da prescrição por motivo de pendência de impugnação judicial, até ao trânsito em julgado desta - aliás, no caso, provou-se que esta esteve parada por mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte (cfr. artigo 49º nº 2 da LGT, na mesma redacção).

40. Aliás, só isso se coaduna com a respectiva lei de autorização legislativa - que visou

o encurtamento dos prazos de prescrição, como abaixo se refere com maior detalhe.

41. Apenas com o aditamento do novo nº 4 ao artigo 49º da LGT, que ainda não estava em vigor à data dos factos - foi introduzido pelo artigo 89º da Lei nº 53-A/2006, de 29/12, entrado em vigor apenas em 01.01.2007, conforme o respectivo artigo 163º-,

42. é que o legislador, inovadoramente, passou a consagrar que "4 - O prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida."

43. Desse modo, contrariamente ao decidido, não é legítimo considerar, "in casu", que o prazo de prescrição só se reinicia com o trânsito em julgado da impugnação.

44. Sendo certo, de todo o modo, ter-se provado que a presente Impugnação esteve parada por mais de um ano por facto inimputável ao contribuinte.

45. Desse modo, o reinício do decurso da prescrição não sucede apenas com o trânsito em julgado da decisão a proferir sobre a presente impugnação judicial - outrossim, a partir do momento em que se completou um ano de paragem desta impugnação, por facto não imputável ao contribuinte.

46. Qualquer interpretação da nova lei em sentido contrário contende com a própria lei de autorização legislativa que esteve na génese deste novo regime prescricional consagrado na LGT, como se verá infra, com maior detalhe.

47. Se se considerasse que o prazo de prescrição estaria sempre suspenso enquanto estivesse suspenso o processo de execução fiscal,

48. nenhuma utilidade ou sentido teria nº 2 do mesmo artigo 49º da LGT (redacção da Lei nº 100/99, de 26/7), segundo o qual essa suspensão ocorre apenas entre a data da instauração e a paragem do processo de execução por mais de um ano (por razão inimputável ao contribuinte).

49. Com efeito, o sobredito artigo 49º nº 3 da LGT é orgânica e materialmente inconstitucional, se interpretado no sentido de que o prazo de prescrição se suspende durante todo o período em que estiver suspenso o processo de execução fiscal, independentemente das paragens ocorridas nos processos impugnatários que hajam estado na génese da suspensão/paragem da execução fiscal.

50. A questão da prescrição é matéria de direito material, substantivo (e não meramente adjectivo ou processual), incluída no âmbito das garantias dos contribuintes.

51. Com efeito, e sobre as "garantias dos contribuintes", vigora o princípio da legalidade tributária e de reserva de lei formal (cfr. artigos 8º nº 1 e 2 a) da LGT, 103º nº 2 e nº 3, e 165º º 1 i) da CRP).

52. O regime legal da prescrição não é um regime legal "sobre procedimento e processo", ou seja, não é um regime legal adjectivo.

53. Outrossim, contende directamente com os direitos e garantias substanciais dos contribuintes.

54. E as "garantias dos contribuintes" constituem, pois, um dos elementos essenciais do direito tributário.

55. O artigo 49º da LGT, na redacção da Lei nº 100/99, de 26/7, não é, por conseguinte, susceptível de integração analógica, designadamente com o disposto nos artigos 326º ou 327º do Código Civil.

56. Por outro lado, se o processo de execução fiscal porventura estiver parado, a retoma da sua normal tramitação traduz-se, necessariamente, na prossecução para pagamento (voluntário, por execução da garantia ou por venda de bens penhorados) da dívida tributária exequenda.

57. Logo, se aceitar a tese segundo a qual a suspensão da execução fiscal, de per si, suspende de igual modo o decurso do prazo prescricional, nunca poderia ser declarada prescrita uma dívida tributária,

58. pois o pagamento da dívida acarreta a impossibilidade de se discutir, a posteriori, a prescrição dessa mesma dívida.

59. Ora, ao encurtar expressamente o prazo de prescrição, certamente que não foi propósito do legislador protelar "ad eternum" a ocorrência da prescrição, inviabilizando, na prática, a sua ocorrência.

60. Com efeito, se a suspensão da execução fiscal, no entendimento do douto Acórdão recorrido, suspende, de per si, o prazo de prescrição; se o prazo da prescrição, então, só retomaria o seu decurso quando a execução deixasse de estar suspensa, prosseguindo os seus termos; e se a execução fiscal só termina com o pagamento da dívida exequenda,

61. a prescrição só seria passível de ser suscitada depois do pagamento da dívida exequenda, o que, como se sabe, é legalmente impossível.

62. Entendimento, esse, que contraria os ideais de segurança e paz jurídica que estão

e sempre estiveram na génese do instituto da prescrição.

63. Com efeito, a seguir-se o entendimento do douto Acórdão recorrido, a prescrição nunca ocorreria, porquanto, quando a execução fiscal deixasse de estar suspensa, prosseguiria necessariamente para pagamento - momento a partir do qual a questão da prescrição deixa de fazer qualquer sentido.

64. Seja como for, nos termos da respectiva Lei de Autorização Legislativa nº 41/98, de 4/8, ao abrigo da qual foi aprovada a LGT, ficou o Governo autorizado a: (i) reforçar as garantias dos contribuintes (cfr. artigo 1º nº 2); (ii) rever os prazos de prescrição das obrigações, podendo encurtá-los "de modo consentâneo com as possibilidades e o aumento da eficiência da administração" (dr. artigo 2º, 17)); (iii) rever os pressupostos da interrupção do prazo da prescrição, que poderia ser encurtado "de modo consentâneo com as possibilidades e o aumento da eficiência da administração" (cfr. artigo 2º 18)); (iv) rever os pressupostos da suspensão do prazo da caducidade, podendo este ser dilatado nos casos de contratos fiscais no período a que os respectivos benefícios se aplicam; (cfr. artigo 2º 18)).

65. Assim, esta Lei de Autorização Legislativa apenas autorizou o Governo a alterar os pressupostos da interrupção do prazo de prescrição, que poderia ser encurtado.

66. E autorizava o Governo a rever os pressupostos da suspensão do prazo de caducidade.

67. Sendo certo e sabido que a caducidade não se confunde com a prescrição, a Lei de Autorização Legislativa não autorizou, assim, o Governo, a criar os pressupostos de suspensão do prazo de prescrição, que aquele veio a estatuir no artigo 49º nº 3 da LGT,

68. pressupostos, estes, que, na prática, e se interpretados em contravenção com a respectiva lei de autorização legislativa, se traduzem num alargamento do prazo de prescrição, como acima se exemplificou, contrariamente à intenção que subjaz à dita Lei Nº 41/98, de 4/8.

69. Deste modo, o artigo 49º nº 3 da LGT (redacção da Lei nº 100/99, de 26/7), na interpretação segundo a qual o prazo de prescrição se suspende enquanto durar a impugnação judicial ou a execução fiscal (e mesmo que estas hajam estado paradas por mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte),

70. para além de materialmente inconstitucional, por violação dos sobreditos princípios constitucionais da legalidade e tipicidade, bem como da segurança jurídica e protecção da confiança, decorrentes do primado do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2º da CRP,

71. é ainda organicamente inconstitucional, por violação da respectiva lei de autorização legislativa.

72. Em conclusão, o prazo de prescrição interrompeu-se com a apresentação da presente impugnação judicial, reiniciando-se a respectiva contagem a partir do momento em que se completou um ano de paragem desta mesma impugnação, por facto não imputável ao contribuinte.

73. Só esta interpretação é compatível com a lei aplicável e vigente ao tempo da apresentação da impugnação.

74. E só esta interpretação do artigo 49º nº 3 da LGT, redacção então em vigor, se coaduna com os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança, decorrentes do primado do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2º da CRP.

75. Com efeito, nos termos do artigo 91º da lei nº 53-A/200G, de 29/12 (Disposições transitórias no âmbito da LGT), "A revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo.".

76. Ora, à data da entrada em vigor daquela lei nº 53-A/200G, de 29/12 - 01.01.2007 (dr. artigo 163 da mesma lei) - o presente processo de Impugnação Judicial já tinha estado parado por mais de 1 ano por facto inimputável ao contribuinte.

77. Pelo que, contrariamente ao decidido no douto Acórdão aqui recorrido, nos termos do sobredito artigo 91º da lei nº 53-A/2006, de 29/12, a revogação operada ao nº 2 do artigo 49º da LGT é inaplicável aos presentes autos.

78. Com efeito, o douto Acórdão aqui recorrido considerou que a aquela cessação do efeito interruptivo da prescrição deve ser desconsiderada em virtude da revogação do nº 2 do artigo 49º da LGT, operada pela lei nº 53-A/2006, de 29/12,

79. de modo que, segundo o douto Acórdão recorrido, o prazo de prescrição está suspenso durante todo o período desde a apresentação da Impugnação Judicial e até trânsito em julgado da mesma, nos termos do nº 4 do artigo 49º da LGT, aditado pela lei nº 53-A/06, de 29/12,

80. Ora, à data da entrada em vigor daquela lei nº 53-A/2006, de 29/12 - 01.01.2007 -, já tinha decorrido mais de 1 ano de paragem do processo de Impugnação Judicial por motivo não imputável ao contribuinte.

81. Com efeito, a 01.01.2007, o processo de Impugnação Judicial já havia completado mais de 1 ano de paragem por motivo não imputável ao contribuinte - esse ano de paragem completou-se em 10.10.2004, como a acima se disse.

82. Pelo que a revogação do nº 2 do artigo 49º da LGT, operada pela lei nº 53- A/2006, de 29/12, era inaplicável ao caso em apreço - contrariamente ao decidido no douto Acórdão recorrido.

83. E naquela data, 10.10.2004, ainda não estava em vigor o novo nº 4 do artigo 49º da LGT, aditado pela lei nº 53-A/2006, de 29/12, entrada em vigor em 01.01.2007, - e que veio determinar a suspensão do prazo de prescrição até trânsito em julgado da Impugnação Judicial,

84. pelo que esse novo nº 4 era inaplicável ao caso, já que "uma solução desse teor afronta os princípios gerais relativos à aplicação das leis no tempo, em razão da sua retroactividade manifesta", como se afirma no sobredito Acórdão fundamento.

85. Com a revogação do nº 2 do artigo 49º da LGT e a o novo nº 4 do mesmo preceito legal, operados através da Lei nº 53-A/2006, de 29/12 (entrada em vigor em 01.01.2007), o facto dos processos de contestação das liquidações estarem parados por mais de 1 ano deixou de ter relevância no cômputo do prazo de prescrição - que passou a estar interrompido e suspenso desde a data da apresentação do meio processual de reação até à data do trânsito em julgado da respectiva decisão.

86. Com efeito, nos termos do nº 2 artigo 49º da LGT, na redacção anterior à da lei nº 53-A/2006, de 29/12, a paragem do processo por período superior a um ano (por facto não imputável ao sujeito passivo) fazia cessar o efeito interruptivo da prescrição motivado pela apresentação de reclamação ou impugnação,

87. somando-se, no cômputo da prescrição, (i) o tempo que decorresse após esse período de paragem por mais de um ano, ao (ii) tempo que tivesse decorrido até à data da autuação da reclamação ou impugnação,

88. Com a revogação daquele nº 2 do artigo 49º da LGT, a paragem do processo de reclamação ou impugnação, por mais de um ano, por motivo não imputável ao contribuinte, deixou, pois, de ter qualquer relevância no cômputo do prazo de prescrição.

89. E o nº 3 do mesmo preceito legal, na redacção anterior à da Lei nº 53-A/2006, de 29/12, não determinava que o prazo de prescrição se suspendia até trânsito em julgado da decisão da reclamação ou da impugnação judicial.

90. Esta matéria é relevante para o cômputo da prescrição e, consequentemente, para a decisão de mérito deste recurso, sendo que a garantia bancária caducou em 24.02.2006, como se provou e afirma no douto Acórdão recorrido.

Por conseguinte,

91. O douto Acórdão aqui recorrido padece de erro de julgamento e violação das referidas disposições legais, verificando-se ainda as inconstitucionalidades substanciais e formais acima aludidas.

Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., concedendo provimento ao presente recurso e revogando o douto Acórdão recorrido no segmento em que este julgou inverificada a prescrição da dívida emergente da liquidação aqui impugnada, V. Exas., como sempre, farão inteira JUSTIÇA. …»


1.5. A Fazenda Pública, aqui Recorrida, devidamente notificada, não contra-alegou.


1.6. O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal, emitiu douto parecer no sentido de o recurso ser julgado findo, com a seguinte fundamentação:

«…

1-Âmbito do Recurso

Em 3/4/2017, ao abrigo do disposto no art. 284º, nº1, do CPPT, na redacção então vigente, a ora recorrente interpôs recurso do douto acórdão do Tribunal Administrativo Norte, de 16/3/2017, por, em seu entender, o mesmo se encontrar em oposição com o decidido no douto acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 10/2/2010, proferido no âmbito do proc. nº 52/10, convocado como acórdão fundamento.

A Excelentíssima Desembargadora relatora, por douto despacho de 6/2/2024, julgou verificada a ocorrência de contradição de julgados sobre a mesma questão jurídica.

2.Apreciação

A decisão do Excelentíssimo Desembargador relator que reconheça a existência de oposição não impede que no julgamento do conflito de jurisprudência se decida em sentido contrário, neste sentido cfr. Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição, IV Volume, pag.482.

O recurso por oposição de acórdãos depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais:

- Contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.

-A oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas.

-Identidade de situações fácticas, nos seus contornos essenciais, em ambos os acórdãos.

-Trânsito em julgado do acórdão fundamento.

-Quadro legislativo substancialmente idêntico.

-Não ocorrência da situação em que a decisão impugnada está em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

Sem quebra do muito devido respeito por posição contrária, afigura-se-nos que por falta de existência de identidade de situações fácticas, nos seus contornos essenciais, em ambos os acórdãos (recorrido e fundamento), o presente recurso não poderá ser apreciado.

O único ponto de identidade existente, na matéria de facto relevante para a decisão, no que concerne à aplicação do disposto no nº 2, do art. 49º, da LGT, na redacção então vigente, consiste no facto de, em ambos os casos, os processos terem estado parados por um período superior a um ano.

Não encontramos mais semelhanças, em sede de matéria de facto.

Ambos os casos tratam de prescrição de dívida, cujo prazo prescricional é de 8 anos.

No acórdão recorrido, está em causa uma liquidação adicional de IRC, ano de 1997, objecto de impugnação judicial, instaurada em 24/2/2003.

Foi instaurado processo de execução fiscal para a cobrança da quantia liquidada em sede de IRC.

Tal processo de execução fiscal esteve suspenso no período de 26/8/2003 a 24/2/2006, por força da garantia prestada.

Os autos de impugnação judicial estiveram sem qualquer movimentação processual desde 10/10/2023 até 23/12/2004.

Por sua vez, no acórdão fundamento, em 30/3/2004, foi apresentada reclamação graciosa da liquidação de IRS do ano de 1999.

Aquela reclamação graciosa não teve qualquer movimentação processual, no período de 30/3/2004 a 11/5/2005.

Foi instaurado processo de execução fiscal, no âmbito do qual, em 12/5/2005, foi registada hipoteca legal para garantir a dívida exequenda.

No acórdão recorrido, todo o período em que os autos de impugnação estiveram sem qualquer movimentação processual coincidiu – em termos temporais – com o período em que teve lugar a suspensão do prazo de prescrição.

O mesmo não sucedeu no acórdão fundamento.

Do exposto, resulta a não existência de identidade da matéria de facto, objecto do acórdão recorrido e do acórdão fundamento.

Acresce que, no âmbito do mesmo quadro legal, acórdão recorrido e acórdão fundamento decidiram de modo concordante pela não prescrição das dívidas.

Assim, inexiste contradição quanto à mesma questão fundamental de direito.

Nestes termos, não se encontram reunidos todos os pressupostos, de verificação cumulativa, que permitam concluir pela existência de oposição de acórdãos.

Não havendo oposição de acórdãos, o recurso é julgado findo (nº 5, do art. 284º, do CPPT, na redacção anterior àquela que foi introduzida pela Lei nº 118/2019, de 17/9).

3-Conclusão: Nestes termos, emite-se parecer no sentido de o recurso dever ser julgado findo. …»

1.7. Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 92.º do CPTA, vêm os autos submetidos à Conferência para julgamento no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

2. Fundamentação

2.1. De Facto

2.1.1. A factualidade dada como provada nas instâncias e acolhida no acórdão recorrido, é a seguinte:

«1 - A impugnante foi objecto de uma acção de fiscalização por parte dos Serviços de Inspecção Tributária de Lisboa, respeitante ao exercício económico do ano de 1997, cfr. fls. 35 a 43 do PA em apenso.

2 - Dessa inspecção tributária resultou uma liquidação adicional de IRC, ora impugnada.

3 - Em 13 de Outubro de 2002 foi emitida a nota de liquidação. cfr. fls. 11 do PA e que aqui se dá por reproduzida. (ACTO IMPUGNADO)

4 - Em 24 de Fevereiro de 2002 deduziu impugnação judicial, cfr. fls. 1 destes autos. Por se tratar de um mero lapso de escrita, passa-se de imediato à sua correção, pois que na face da p.i., carimbo de entrada, consta a data de 24/2/2003. Assim a redação é a seguinte:

Em 24 de Fevereiro de 2003 deduziu impugnação judicial, cfr. fls. 1 destes autos;

5 - Os presentes autos de impugnação estiveram sem qualquer movimentação processual desde 10.10.2003 até 23.12.2004, cfr. fls. 35 e 36 destes autos.

6 - Em 03.02.2003 foi instaurado o processo de execução fiscal para cobrança da liquidação ora impugnada, cfr. fls. 94 a 97 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.

7 Dá-se aqui por reproduzido o extracto informático respeitante à tramitação da execução e constante destes autos a fls. 152.

Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração da matéria de facto dada como assente, nos factos provados e não impugnados e no teor dos documentos identificados e não impugnados.

FACTOS NÃO PROVADOS:
Inexistem com interesse para a presente decisão.
(…)
Ao abrigo do art. 712.º, n.º 1, atual 662.º, n.º 1, do CPC, procede-se à seguinte alteração da matéria de facto:

7- Em 26/8/2003 deu entrada no 1º Bairro Fiscal de Lisboa, um requerimento da A... a dar conhecimento que foi prestada uma garantia bancária no valor de 197.757,90 € destinada a caucionar o pagamento do IRC de 1997, no âmbito do p.e.f. n.º ...48 (despacho que declarou a caducidade da garantia, transitada em julgado e doc. 1, de fls. 102 e 103 do processo de impugnação);

8- A execução ficou suspensa partir daquele momento até 24/2/2006 por força da garantia prestada (como decorre do que foi decidido em matéria de caducidade da garantia). »



2.1.2. A factualidade dada como provada nas instâncias e acolhida no acórdão fundamento [Acórdão do STA, 2.ª Secção, de 10.02.2010, Proc. n.º 052/10], é a seguinte:


«1 - O requerente em 30/3/2004 reclamou graciosamente da liquidação do IRS de 1999;

2 - Do processo de reclamação graciosa consta: "Analisados os elementos do processo" de reclamação foi elaborada informação pelo funcionário da A. T em 11/5/05 que deu origem ao despacho: "tendo em conta a informação que antecede, notifique-se o reclamante para apresentar prova documental do valor referente às obras efectuadas", tendo a notificação do requerente ocorrido por carta registada com a/r assinado em 16/5/05;

3 - Seguiram-se-lhe várias diligências que culminaram com o despacho do Sr. Director de Finanças a decidir pela procedência parcial da reclamação em 8/6/07;

4 - Em 28/7/04 foi instaurada a execução 04/...98.4 de IRS do ano de 1999, cujo a/r de citação do executado está assinado com data 10/8/04 e executada, cônjuge, foi citada por carta com a/r assinado em 16/6/05;

5 - No processo execução foi o executado notificado em 16/11/04 para prestar garantia a fim de a execução suspender até à decisão da reclamação graciosa e em 30/3/05 ordenou-se a hipoteca legal para garantir a dívida exequenda, registada na respectiva conservatória em 12/5/05;

6 - O executado requereu ao Chefe da repartição de Finanças, em 30/6/09, a declaração de prescrição da dívida e extinção da execução, que foi indeferida, notificada com a/r assinado em 31/8/09;

7 - Em 10/9/09 apresentou reclamação de tal indeferimento.»

2.2. De Direito

O presente recurso de oposição de acórdãos vem interposto, ao abrigo do disposto no artigo 284.º do CPPT, na redação anterior àquela que lhe foi dada pela Lei 118/2019, de 17 de setembro, do acórdão do TCA Norte proferido nestes autos por alegada oposição com o entendimento perfilhado no acórdão do STA, de 10 de fevereiro de 2010, no Processo n.º 66/11.8BUPRT, relativamente ao efeito que a aplicação do artigo 49.º, n.º 1 e n.º 2, da LGT, tem (na redação vigente à data dos factos e anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), em termos da contagem do prazo de prescrição.

De acordo com o artigo 284.º, n. º 1, do CPPT pode ser interposto recurso por oposição de acórdãos quando o acórdão recorrido esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão anteriormente proferido pelo mesmo ou outro Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.

Um dos requisitos de admissão deste recurso é, por isso, a existência de uma contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre o invocado acórdão do STA e o acórdão recorrido.

A propósito da concretização do imperativo de que haja uma oposição entre os dois acórdãos relativamente a uma mesma questão fundamental de direito, a jurisprudência deste Supremo Tribunal tem sido, desde longa data, constante na afirmação da imprescindibilidade da verificação cumulativa dos seguintes requisitos:

- Identidade substancial da norma jurídica aplicável e da situação de facto a ela subsumível;

- Que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica aplicável;

- Que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;

- Que a oposição decorra de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, avançada no âmbito da apreciação de questão distinta.

O mesmo será dizer que, para que se considere verificada a contradição entre as duas decisões relativamente a uma mesma questão fundamental de direito, impõe-se a verificação simultânea dos requisitos acabados de apontar. Bastando que um deles não se cumpra para que fique comprometida a admissão do recurso para uniformização de jurisprudência.

O carácter excecional do recurso por oposição de acórdãos e o propósito de assegurar que situações de facto substancialmente idênticas têm o mesmo tratamento justificam a limitação da sua admissibilidade unicamente nas situações substancialmente iguais. O objetivo do recurso não é, portanto, avaliar o mérito de uma decisão por si, mas fazer uma avaliação do mérito no confronto com uma outra que verse sobre as mesmas normas jurídicas, aplicadas a uma factualidade em tudo idêntica para, assim, assegurar a verificação mais plena do princípio da segurança jurídica.

Confrontando os requisitos expostos com o caso em análise, vejamos se estão preenchidas as condições para admitir o recurso.

A questão jurídica fundamental erigida pela recorrente para fundar a alegada oposição foi o facto de, no segmento decisório em que em cada um dos acórdãos foram convocados os n.ºs 1 e 2 do artigo 49.º da LGT (na redação vigente à data dos factos e anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro), haver uma aplicação distinta desses preceitos, com consequências a nível da contagem do prazo de prescrição.

Apesar de a referida disposição legal ter relevo em ambos os acórdãos, sendo convocada em cada um deles, existe uma grande diversidade a nível da situação de facto a eles subsumível. No acórdão recorrido a dívida exequenda teve na sua base uma liquidação de IRC, tendo sido na sequência de uma impugnação judicial que foi suscitada a questão da interrupção da prescrição. No acórdão fundamento a dívida exequenda era de IRS e foi no contexto de uma reclamação graciosa que foi suscitada a interrupção da prescrição. Ainda que entendêssemos, com alguma flexibilidade, que a identidade em termos de matéria de facto pode, eventualmente, não ter de ser absolutamente total e que a circunstância de ambos os processos terem estado parados mais de um ano, ainda que no âmbito de garantias impugnatórias diferentes (jurisdicional e administrativa), asseguraria, de algum modo, a exigida identidade substancial da matéria de facto, chocaríamos com vários óbices de monta.

Em primeiro lugar, os factos relevantes que estiveram na base do modo como em cada um dos acórdãos foi aplicado o artigo 49.º da LGT, não se esgotam na razão de em ambos os acórdãos a impugnação e a reclamação graciosa, respetivamente, terem estado paradas por mais de um ano, mas, sobretudo, e essencialmente, na circunstância de para a determinação do impacto que decorre do artigo 49.º, n.º 2, da LGT, em termos da contagem do prazo de prescrição, terem sido determinantes outros factos que são totalmente diversos. Com efeito, no acórdão recorrido, foi devido ao facto (constante do probatório) de ter sido prestada garantia pela recorrente no âmbito da impugnação judicial, e a daí decorrente suspensão da execução, que se conclui pela não interrupção da contagem do prazo de prescrição (e, consequentemente, pelo não recomeçar do mesmo). Tendo afirmado a este propósito que «[p]ese embora, o processo de impugnação ter estado parado por mais de um ano por causa não imputável ao impugnante o certo é que o prazo de prescrição estava já suspenso por força daquela garantia, ou seja, neste período o prazo prescricional não corria». No acórdão fundamento não se verificou tal factualidade, conforme decorre da matéria provada, tendo a relevância que foi dada à circunstância de a reclamação ter estado parada mais de um ano sido condicionada, em matéria de prazo de prescrição, pelo facto de, num momento subsequente (e não anterior com efeitos que se prolongaram até à verificação do período em que esteve parada a impugnação, como no âmbito do acórdão recorrido), ter sido ordenada uma hipoteca legal. Constata-se, por conseguinte, que os factos que verdadeiramente condicionaram o relevo que viria a ter a paragem, quer da impugnação quer da reclamação, nos termos do artigo 49.º, n.ºs 1 e 2, são totalmente diversos.

Em segundo lugar, surge um outro obstáculo que decorre diretamente da diversidade da matéria de facto decisiva para a decisão da causa em cada um dos acórdãos. Referimo-nos ao necessariamente distinto enquadramento jurídico que se impôs fazer desses factos diversos, traduzido na convocação de outras normas jurídicas que vão para além do artigo 49.º, n.º 1 e 2, da LGT. Ora, essa decorrência afasta claramente a identidade das normas aplicáveis e, portanto, a aparente identidade substancial das normas jurídicas aplicáveis, diferentemente do sugerido pela tónica que a recorrente colocou no artigo 49.º, n.ºs 1 e 2, da LGT.

Por fim, e apesar de a não verificação da identidade substancial do quadro jurídico e dos factos, só por si, dada a necessidade da verificação dos vários requisitos ser cumulativa, bastar para que não seja aceite o recurso por oposição de acórdãos, não podemos deixar de sublinhar que, em rigor, nem sequer há uma oposição entre os acórdãos relativamente à questão que a recorrente elegeu como a principal. Pois, em boa verdade, no acórdão recorrido não é negado, como sugere a recorrente, o que é afirmado no acórdão fundamento no sentido de que «[n]os termos do n.º 1 e 2 do artigo 49.º da LGT (na redacção vigente à data dos factos e anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), a interposição de reclamação interromp[e] a prescrição, cessando, contudo, aquele efeito se o processo estive[er] parado por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, somando-se, deste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação». Com efeito, essa circunstância só não é relevante (no acórdão recorrido) porque o prazo de prescrição foi considerado como já estando suspenso na altura, em virtude da prestação de garantia. Não há, portanto, qualquer oposição no modo como é aplicado o artigo 49.º, n.º 2, da LGT, em situações em que a impugnação está parada por um período superior a um ano. O que se verificou foi, tão-só, existir uma factualidade diversa que condicionou a aplicação daquele preceito e não que tenha sido interpretado ou aplicado de um modo diferente, pois as consequências que dele foram retiradas para a determinação do prazo de prescrição deveram-se a factos distintos e à aplicação, daí decorrente, de outros preceitos legais, não relevantes no acórdão fundamento.

Do exposto decorre a conclusão, mais do que evidente, de que não estão preenchidos os requisitos para a verificação da alegada oposição de acórdãos exigida pelo artigo 284.º, n.º 3 do CPPT, na redação aplicável.

3. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em não julgar verificada a oposição de acórdãos e, consequentemente, julgar findo o recurso.

Custas pela Recorrente, porque vencida, nesta instância de recurso (artigo 527.º, do CPC).

Lisboa, 26 de setembro de 2024. - João Sérgio Feio Antunes Ribeiro (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Anabela Ferreira Alves e Russo - Fernanda de Fátima Esteves.