SENTENÇA
Processo nº161/2020-JPMCvº.
RELATÓRIO
1- IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: SP, com o NIPC X, com sede em Miranda do Corvo.
Demandado: JG, com o NIF Y, residente em Miranda do Corvo.
2- OBJECTO DO LITíGIO
A Demandante intentou a presente ação declarativa pedindo a condenação do Demandado, ao pagamento do valor de € 2.921,69, acrescido dos juros de mora vencidos no montante de € 69,41, perfazendo o total de € 2.991,10, bem como, juros de mora vincendos, contabilizados sobre o capital em dívida, à taxa legal em vigor, desde a data de entrada em juízo da presente ação até ao efetivo e integral pagamento e ainda, no pagamento das custas do processo. Juntou 4 documentos.
Para tanto, alegou a existência de um contrato de empreitada devidamente assinado pelo demandado, cujo valor ainda não foi pago por este.
Regularmente citado o Demandado contestou, alegando a sua ilegitimidade, impugnando a factualidade alegada pela Demandante, e requerendo a intervenção provocada de terceiros, concluindo pela improcedência do pedido e sua absolvição conforme resulta de fls. 21 a 27.
Sumariamente entende que, nada tem de pagar à demandante pois, essa responsabilidade é da empresa que lhe vendeu a fracção onde reside actualmente, juntou 4 documentos e decisão da segurança social deferindo o apoio judiciário requerido.
A intervenção provocada foi indeferida por despacho de fls. 62.
O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do território e do valor - que se fixa em € 2.991,10 – art.º 297º nº1e nº2, e 306º nº2, ambos do C. P. Civil.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
Não existem exceções que cumpram conhecer ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito da causa.
A audiência de julgamento realizou-se com observância das formalidades legais conforme se alcança das respetivas atas, na qual foi decidido a improcedência da excepção de ilegitimidade invocada.
A questão a decidir por este Tribunal consiste em saber se se tem por verificados os pressupostos de responsabilidade civil que geram a obrigação do Demandado em indemnizar a Demandante no valor peticionado.
Factos provados e com interesse para a decisão da causa.
1-A demandante é uma empresa que se dedica à realização de obras de construção civil.
2-O demandado adquiriu a fracção autónoma designada pela letra C, correspondente ao primeiro andar no Bloco A, destinada a habitação própria e permanente do prédio urbano em regime de propriedade horizontal pela Ap. * de 1985/01/28, sito no Concelho de Miranda do Corvo, sob o nº 21, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo Z, cfr. contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca outorgada em 19.03.2019, junta a fls. 28 a 41.
3-O vendedor da referida fracção foi “ H.” pessoa colectiva nº W, com sede em Oeiras, cfr. certidão junta a fls. 42.
4-O prédio onde se insere a fracção do demandado é composto por vários blocos, ou seja, vários edifícios independentes fisicamente entre si, o que tem dificultado a organização de um condomínio abrangendo todos os blocos.
5-A fracção do demandado está integrada num prédio de três andares, cada andar com esquerdo e direito todos destinados a habitação.
6-O bloco onde se integra a fracção do demandado necessitou de obras, que consistiram na substituição da cobertura do telhado de placas de lusalite, por chapa sandwich de cor vermelha com imitação de telha sol.
7- Tal substituição foi originada pela tempestade Leslie, ocorrida na noite de 13/14 de outubro do ano de 2018, e que levantou as ditas placas.
8- No exercício da sua atividade a demandante celebrou com o demandado, um contrato de empreitada cfr. doc. junto a fls. 3 a 5, cujo teor se dá por reproduzido e integrado para todos os efeitos legais.
9- Antes da assinatura deste contrato, o demandado já tinha assinado outro o qual continha um erro, tendo-lhe por isso sido devolvido o original.
10- Nos termos do contrato, o demandado adjudicou à demandante a Empreitada da cobertura do seu prédio, em chapa sandwich de cor vermelha com imitação de telha sol, com 4 cm de isolamento térmico, na permilagem que lhe correspondente, conforme resulta da respectiva certidão.
11- Fração essa, localizada em Miranda do Corvo, obrigando-se a demandante a executar a obra correspondente a trabalhos de execução da estrutura, acabamentos de remates exteriores, resultantes da substituição da cobertura, para os quais se encontra devidamente habilitada.
12-O preço acordado entre demandante e demandado foi de € 2.921,69.
13-A obra encontra-se concluída e a demandante emitiu as faturas, que remeteu ao demandado:
- Fatura nº 1 1/121, no valor de € 1.168,00, emitida em 30-09-2019, com vencimento na mesma data, referente a mão-de-obra, cfr. doc. junto a fls. 6 cujo teor se dá por reproduzido e integrado para todos os efeitos legais, e
- Fatura nº 1 1/140, no valor de € 1.753,01, emitida em 26-12-2019, com vencimento na mesma data, referente a material, cfr. doc. junto a fls. 7 cujo teor se dá por reproduzido e integrado para todos os efeitos legais.
14-O demandado não apresentou qualquer reclamação dos trabalhos efetuados pela demandante.
15- As quantias supra-referidas deveriam ter sido pagas nas datas de vencimento das indicadas faturas, o que não aconteceu.
16- Também não foram pagas em momento posterior, situação que se mantém na presente data apesar de o demandado ter sido instado para o efeito, nomeadamente através do envio de carta registada, cfr. doc. junto a fls. 8 e 9, cujo teor se dá por reproduzido e integrado para todos os efeitos legais.
Factos não provados
1-Nos demais blocos que integram o prédio em que se insere o bloco A, da fracção do demandado, pese embora não tenha havido o mesmo prejuízo nas coberturas de telhado, porque, tais coberturas eram em Lusalite composto por substâncias que podem libertar fibras de amianto, ao fazer a substituição num dos blocos do prédio, foi necessário proceder à substituição do telhado nos demais.
2- Numa das deslocações do demandado à fracção que pretendia comprar e antes de concretizar o negócio, estava acompanhado pela Sra. PD, mediadora da “CA”, da imobiliária “IC”, apareceu a vizinha do 1º andar esquerdo do mesmo bloco.
3- Que questionou a Sra. da imobiliária sobre a reparação da cobertura do telhado, ao que a mesma respondeu que tal assunto era com a “H.”.
4- Foi enviado orçamento da obra do telhado à anterior proprietária, “H.”, através da “WS”, representante daquela, que concordou com a sua comparticipação nas despesas, reclamando contudo que, para pagar o valor seria necessário apresentar uma acta do condomínio com a discriminação da despesa.
5- Foi a “WS” que em representação da “H”, contactou o demandado para marcar a escritura de compra e venda da fracção C.
6-A contratação da demandante “SP.”, para proceder à substituição da cobertura do telhado do bloco A, em que se insere a fracção do demandado, bem como nos demais blocos, foi acordado com o anterior proprietário da fracção adquirida pelo demandado.
7-O contrato de empreitada junto com a petição inicial foi assinado pelo demandado, porque pressionado pela demandante e demais proprietários.
8- Todos os proprietários já tinham pago, e a cobertura dos telhados de cada bloco já tinha sido substituída, faltando apenas parte da sua participação do bloco onde se insere a fração do demandado.
9-A demandante recusava-se a terminar a obra se o demandado não assinasse.
10-A parte do telhado que faltava substituir, era a cobertura do telhado levantada pela tempestade Leslie, sendo urgente a sua reparação, e se a demandante não concluísse os trabalhos agravaria os custos.
11-O que levou o demandado a assinar o contrato de empreitada, sem que quisesse ou tivesse intenção de assumir o respetivo custo de obra.
12- Assinou de cruz, nada tendo negociado ou ajustado a título de preço, nem demais cláusulas, pois que tudo foi tratado com o anterior proprietário.
FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Para a convicção formada, conducente aos factos julgados provados, concorreu as declarações do representante da demandante, do demandado, a prova documental junta aos autos, e os depoimentos das testemunhas inquiridas cujos depoimentos se revelaram isentos, credíveis e imparciais.
O representante da demandante confirmou a factualidade alegada no requerimento inicial, explicando a não existência de condomínio e a dificuldade em chegar a um entendimento atendendo ao número de condóminos envolvidos. Referiu ainda que, o demandado assinou dois contractos, o segundo na sua presença. O primeiro tinha um lapso e teve que ser substituído. O demandado, nunca disse que não pagava, mandou-lhe as facturas e uma carta para pagar.
Em declarações o demandado confirmou a assinatura dos dois contractos, o primeiro estava incorrecto. No período que mediou a assinatura do primeiro e segundo falou com a empresa vendedora da fracção.
Leu o contrato, e sabia o que estava a contratar, tem o 12º ano. Recebeu as facturas juntas aos autos, e a carta de interpelação e não as devolveu. A obra foi realizada.
A testemunha CV, vizinho do demandado explicou que a MC andava a pressionar o demandado, pois, era a responsável por recolher as assinaturas.
Tiveram de assinar dois contratos, pois, o primeiro não estava correcto.
A testemunha MC, explicou que foi a pessoa encarregue para resolver os problemas com o empreiteiro. Em 2018 o Sr. JG não era proprietário, tendo contactado a empresa que depois lho vendeu, que sem a existência de condomínio não pagou. Depois da aquisição da fracção pelo demandado, a empresa referiu-lhe que ele era o responsável pelo pagamento das obras. O demandado assinou o primeiro contrato sem objecção, no segundo já manifestou problemas. Quando a imobiliária lhe mostrou o apartamento, a mediadora disse-lhe que ele não era responsável pelo pagamento das obras no telhado. O segundo contrato, foi assinado com o empreiteiro. Entre a assinatura de um e outro contrato mediou cerca de um mês.
Assim, o facto assente em 1,6,7, consideram-se admitidos por acordo nos termos do disposto no art. 574º, nº2 do C.P.C.
Os factos enumerados sob os nºs, 2,3,8,12,13 e 16, resultaram do teor dos documentos juntos conforme referido em cada um dos factos.
Os factos sob os nºs. 4, 5 e 9, resultaram das declarações das partes, confirmados pelas testemunhas.
Os restantes, foram admitidos pelo demandado e resultaram igualmente dos depoimentos das testemunhas inquiridas.
Quanto aos factos não provados, resultam da ausência de prova quanto aos mesmos que permitisse concluir de forma diferente.
4-O DIREITO
Entre demandante e demandado foi celebrado contrato de empreitada nos termos do disposto no art.1207º do Código Civil.
A empreitada é uma das modalidades do contrato de prestação de serviços, “sendo um contrato sinalagmático, oneroso, comutativo e consensual”, in direito das obrigações, parte especial – contratos, de Pedro Romano Martinez.
No contrato de empreitada em apreço, as partes celebraram entre si, um acordo no qual a Demandante (empreiteiro) se obrigou a realizar uma obra que visava a cobertura do telhado do prédio onde o demandado tem uma fracção, mediante o pagamento pelo Demandado (dono da obra) do preço dos materiais aplicados e mão-de-obra previamente acordado.
Dispõe o art. 1207.º do Cód. Civil (CC) que” empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga à outra a realizar certa obra, mediante um preço”, resultando desta definição três elementos: os sujeitos (empreiteiro e dono da obra), a realização de uma obra (resultado material) e o pagamento do preço (retribuição).
Da relação jurídica emergente de uma empreitada, derivam obrigações recíprocas e interdependentes: a obrigação de realizar uma obra tem, como contrapartida, o dever de pagar o preço.
Temos assim que, do lado do empreiteiro, a principal obrigação é a de obter um certo resultado material (art. 1207.º do CC), que se traduz na execução da obra nas condições convencionadas, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (art. 1208.º do CC).
Enquanto, do lado do dono da obra em contrapartida, impende o dever principal de, caso aceite a obra, pagar o preço ajustado o que, na ausência de convenção ou uso em contrário, deve ser efetuado no ato daquela aceitação (art. 1211.º, n.º 2 do CC).
Ora, em face da prova produzida, verifica-se que, o demandado não procedeu ao pagamento do valor referido no contrato em apreço que se encontra devidamente assinado por si.
Pelo que, em conformidade terá de ser condenado no pagamento da quantia de 2.921,69 €.
Adicionalmente pede ainda a Demandante, a condenação do Demandado no pagamento de juros desde as datas de vencimento das facturas.
O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor (art.º 798.º do Cód. Civil).
A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor, considerando-se o devedor constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda que possível, não foi efetuada no tempo devido (art.º 804.º do Cód. Civil).
O devedor só fica, em regra, constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, correspondendo a indemnização na obrigação pecuniária, em princípio, aos juros legais a contar do dia da constituição em mora (art.ºs 805.º e 806.º do Cód. Civil).
Mas, nos termos do art.º 805.º, n.º 2, alínea a) do Código Civil, o devedor fica constituído em mora, independentemente de interpelação se a obrigação tiver prazo certo, o que sucede nos documentos juntos, logo, é a partir da data de vencimento de cada factura que se vencem os juros sem necessidade de interpelação.
Assim, a este título deve o Demandado juros vencidos à taxa legal de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 08.04 e art.º 559º do C.C.), que até à entrada da ação perfazem a quantia de € 69,41 ao que acresce juros vincendos sobre o capital em divida desde aquela data até integral pagamento.
Pelo exposto, também este pedido tem de proceder.
DECISÃO
Face a quanto antecede, julgo a presente ação totalmente procedente e em consequência condeno o Demandado a pagar à demandante o valor de € 2.991,10, acrescido de juros vencidos e vincendos até integral pagamento.
Custas:
A cargo do Demandado, que se declara parte vencida, art.º. 2º, nº1, alínea b) da Portaria 342/2019 de 1 de Outubro, sem prejuízo da isenção de pagamento de custas concedida ao demandado.
Notifique.
Miranda do Corvo, em 27 de abril de 2021
A Juíza de Paz
(Filomena Matos)
Processado por meios informáticos e
revisto pela signatária. Verso em branco.
(Artigo 131º, nº 5 do CPC e artigo 18 da LJP)
Depositada na secretaria em 27-04-2021