Sentença de Julgado de Paz
Processo: 44/2024-JPPLM
Relator: HELENA ALÃO SOARES
Descritores: INCUMPRIMENTO CONTRATUAL
Data da sentença: 06/20/2024
Julgado de Paz de : PALMELA
Decisão Texto Integral:
Sentença
(artigo 26.º, n.º 1 da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, na sua redacção actual (LJP)).
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Processo n.º 44/2024-JPPLM

Matéria: Cumprimento de obrigações pecuniárias; incumprimento contratual
(artigo 9.º, n.º 1, alíneas a) e i) da Lei de Organização, Funcionamento e Competência do Julgados de Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2001, de 13-07, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31-07 (LJP))

Objecto do litígio: Pagamento de facturas - fornecimento de bens alimentícios

Demandante: [ORG-1], Lda., NIPC [NIPC-1], com sede na [...], [...] 41, [...], [Cód. Postal-1] [...] Representante: [PES-1], portador do Cartão de Cidadão n.º [Id. Civil-1] e contribuinte fiscal n.º [NIF-1], gerente
Mandatária: Dra. [PES-2], Advogada, com domicílio profissional na [...], 79, [...], 3.º Andar, E 310, [Cód. Postal-2] [...]
Demandada: [PES-3], contribuinte fiscal n.º [NIF-2], portadora do Cartão de Cidadão n.º 13854352, com última morada conhecida na [...], 3, [...], em 32540 A [...]: Dra. [PES-4], advogada, com escritório na [...], 84, R/C, em [Cód. Postal-3] Palmela
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I. Relatório
A Demandante [ORG-1], Lda., em 31-01-2024, intentou a presente acção contra a Demandada [PES-3], enquadrável nas alíneas a) e i) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei dos Julgados de Paz, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 1.855,38 (mil, oitocentos e cinquenta e cinco euros e trinta e oito cêntimos) acrescida dos juros legais desde a data do vencimento da factura até efectivo e integral pagamento e das custas do processo, nos termos do seu requerimento inicial, de fls. 3 a 6, que aqui se dá por integralmente reproduzido, alegando para tanto, e em suma, que no exercício da sua actividade comercial celebrou um contrato de compra e venda verbal com a Demandada, tendo fornecidos vários bens alimentícios àquela, tendo sido emitida a factura, que a Demandada não pagou, no valor de € 1.677,35 (mil, seiscentos e setenta e sete euros e trinta e cinco cêntimos), vencida no dia 21-01-2023. Mais alegou que apesar das tentativas de cobrança, a Demandada não logrou efectuar o pagamento, peticionando por isso nos presentes autos o seu pagamento e os juros de mora vencidos, desde a data de vencimento da factura e até efectivo e integral pagamento, no valor indicado de € 178,03, à data de 31-01-2024. A Demandante juntou ao seu requerimento inicial a procuração forense e os documentos de fls. 7 a 14.
Não se logrou possível a citação da Demandada (cf. fls. 18 e 34), pelo que lhe foi nomeado Defensor Oficioso (cf. fl. 37).
A Defensora Oficiosa nomeada (cf. fls. 44) foi citada em representação da Demandada, ausente, em 11/04/2024 (cf. fls. 49) e não apresentou contestação.
Afastada a mediação pela Demandante no seu requerimento inicial (e prejudicada pela representação da Demandada por Defensora Oficiosa), foi agendada audiência de julgamento (cf. fls. 51).
Na data agendada para a realização da audiência de julgamento, compareceu o legal representante da Demandante, sua ilustre mandatária e a ilustre Defensora Oficiosa nomeada à Demandada ausente. A audiência de julgamento decorreu nos termos da acta respectiva, a fls. 80 a 82.

II. Do Valor
Nos termos do disposto nos artigos 297.º, n.ºs 1 e 2, 299.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 63.º da LJP, fixo à presente acção o valor de € 1.855,38 (mil, oitocentos e cinquenta e cinco euros e trinta e oito cêntimos).
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O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objecto, do território e do valor.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, e são legítimas.
Não ocorrem excepções, nulidades, ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Estando reunidos os pressupostos da estabilidade da instância, cumpre apreciar e decidir.

III. Fundamentação
Dispõe a al. c) do n.º 1 do artigo 60.º da LJP que da sentença proferida nos Julgados de Paz consta uma sucinta fundamentação, o que se cumpre como segue.

A) De facto
Consideram-se provados, relevantes para o exame e decisão da causa, os seguintes factos:
1 – A Demandante [ORG-1] SUDD, Lda., com o NIPC [NIPC-1], é uma sociedade comercial por quotas, que tem por objecto social o exercício do comércio por grosso e retalho de produtos alimentares em geral, incluindo carne, peixe e conservas e agenciação de representações, comércio a retalho em outros estabelecimentos não especializados, com predominância de produtos alimentares, bebidas ou tabaco;
2 – A Demandada [PES-3], contribuinte fiscal n.º [NIF-2], em 22/12/2022, explorava um estabelecimento de restauração designado “[ORG-3]”, sito na [...], [...] 2205, [...];
3 – No exercício da sua actividade profissional, em 22/12/2022, a Demandante vendeu e forneceu vários bens alimentícios à Demandada, para o exercício do seu comércio;
4 – Pelos bens fornecidos, a Demandante emitiu a factura n.º FTFTC/033626, emitida em 22/12/2022, com vencimento a 21/01/2023, no valor de € 1.677,35 (mil, seiscentos e setenta e sete euros e trinta e cinco cêntimos), com IVA incluído;
5 – A Demandada recebeu e aceitou os bens fornecidos constantes das facturas, no dia 22/12/2022;
6 – A Demandada não pagou, o valor da factura emitida;
7 – A Demandante tentou junto da Demandada, obter o pagamento da factura em dívida, nomeadamente por intermédio da sua mandatária, através de carta, datada de 29/03/2023, remetida, por correio postal registado.

Não resultaram provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.

Motivação da matéria de facto:
A convicção probatória do Tribunal ficou a dever-se às declarações do legal representante da Demandante, ao depoimento, isento e imparcial, da testemunha apresentada pela Demandante, [PES-5], que com conhecimento directo dos factos, declarou ter transportado e entregue os bens constantes da factura à Demandada, e ter dado para aquela assinar o recibo de recebimento dos bens, que entregou depois aos serviços competentes da Demandante, uma vez que ela não pagou naquele momento os bens que recebeu e aos documentos juntos aos autos, de fls. 8 a 14. Para prova do facto 1. foi consultada certidão permanente do registo comercial, na base de dados Pis-Tmenu.
Da análise crítica de toda a prova produzida consideram-se provados os factos alegados pela Demandante supra descriminados.

B) De direito
O objecto da presente acção, delimitado pela causa de pedir e pelo pedido, reporta-se ao pagamento das facturas emitidas pela Demandante à Demandada, pelos bens alimentícios fornecidos a esta, no exercício das suas actividades comerciais.
Verifica-se assim que entre a Demandante e a Demandada foi celebrado um contrato de compra e venda, mercantil, atenta a qualidade dos contraentes e a celebração do mesmo no âmbito das suas actividades de comércio, regulada por isso nos artigos 463.º e seguintes do Código Comercial, aplicando-se o direito civil nos termos definidos no artigo 3.º do citado Código.
O contrato de compra e venda, tem como efeitos essenciais a transmissão da propriedade da coisa, a obrigação de entrega da coisa e do pagamento do preço (artigo 879.º do Código Civil).
Cabia à Demandante entregar os bens, enquanto vendedora, e à Demandada, enquanto compradora, a obrigação de pagamento do preço.
Ora, in casu a Demandante cumpriu com as suas obrigações; o mesmo não se pode dizer da Demandada, que não cumpriu a sua obrigação de pagamento do preço para com a Demandante, correspondente ao valor da factura emitida (facto provado 4.) no montante de € 1.677,35 (mil, seiscentos e setenta e sete euros e trinta e cinco cêntimos), com IVA incluído.
A Demandante peticionou também a condenação da Demandada nos juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento desse valor. Vejamos.
Em regra, a falta de pagamento atempado de uma quantia pecuniária a que o devedor esteja obrigado, constitui-o em mora e na obrigação de reparar os danos causados ao credor (artigo 804.º do Código Civil), ficando o devedor constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, existindo, porém, mora do devedor independentemente de interpelação, quando a obrigação tiver prazo certo (artigo 805.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a) do Código Civil).
Por força das disposições legais supra citadas, quando ocorre a falta de cumprimento de uma obrigação em dinheiro, o credor tem direito a receber uma indemnização, para compensar os prejuízos resultantes do atraso, indemnização essa que corresponde aos juros legais, vencidos (artigo 559.º do Código Civil), só assim não sendo se a taxa de juros fixada for superior à legal e as partes o tiverem convencionado por escrito.
Ora, no caso em apreço, é admissível a indemnização pela mora através da condenação nos juros moratórios comerciais, atenta a natureza comercial da compra e venda realizada, desde a data do vencimento da factura e até efectivo e integral pagamento, à taxa aplicável (que era de 7% até 31/12/2022, de 9,5% até 30/06/2023, de 11% até 31/12/2023 e de 11,50% a partir dessa data e até momento), que à data da propositura da presente acção (31/01/2024) importavam o montante de € 166,89 e na presente data importam o valor € 247,89 (duzentos e quarenta e sete euros e oitenta e nove cêntimos).
Atento o explanado, procede integralmente o pedido da Demandante de condenação da Demandada no valor da factura vencida e não paga, no montante de € 1.677,35 (mil, seiscentos e setenta e sete euros e trinta e cinco cêntimos) e nos juros de mora vencidos e vincendos desde a data do vencimento da factura até ao seu efectivo e integral pagamento, que à data importam o valor de € 247,89 (duzentos e quarenta e sete euros e oitenta e nove cêntimos).
Em relação ao pedido de condenação da Demandada nas custas do processo, importa referir que nos processos que correm termos nos Julgados de Paz, não há lugar a custas de parte, atentos os seus princípios orientadores vigentes e ao facto de as partes não terem de estar acompanhadas por advogado, improcedendo por isso tal pedido, sendo a responsabilidade pela taxa de justiça devida no processo atribuída e fixada em razão do decaimento.

IV. Decisão
Em face do exposto, declaro integralmente procedente a presente acção, por parcialmente provada, e consequentemente condeno a Demandada [PES-3] a pagar à Demandante [ORG. 1} SUDD, Lda.:
a) A quantia de € 1.677,35 (mil, seiscentos e setenta e sete euros e trinta e cinco cêntimos), com IVA incluído, referente à factura FTFTC/033626, emitida em 22/12/2022, com vencimento a 21/01/2023;
b) Os juros de mora vencidos e vincendos, à taxa comercial, desde a data do vencimento da factura até efectivo e integral pagamento, que à data importam o valor € 247,89 (duzentos e quarenta e sete euros e oitenta e nove cêntimos).

Custas
Custas no valor de € 70,00 (setenta euros) pela Demandada, [PES-3], que declaro parte vencida (cf. artigos 607.º, n.º 6, 535.º, n.º 1 e 527.º do CPC, aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei dos Julgados de Paz e alínea b) do n.º 1, do art.º 2.º, da Portaria 342/2019, de 01 de Outubro), sem prejuízo da isenção do pagamento da taxa de justiça devida pelos ausentes, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, na redacção atualizada, da alínea l), do n.º 1, do art.º 4.º, da qual beneficia a Demandada.
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Registe e notifique.
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Notifique o Ministério Público junto do Juízo Local Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal (n.º 3, do art.º 60.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, revista pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho).
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Cumpra-se o disposto no artigo 249.º, n.º 5 do CPC.
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Palmela, 20-06-2024
A Juiz de Paz

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Helena Alão Soares
(Em auxílio)