Acórdão do Tribunal Constitucional | |
| Nº Convencional: | ACTC00002968 |
| Acordão: | 91-372-P |
| Processo: | 91-0406 |
| Relator: | SOUSA BRITO |
| Descritores: | ASSEMBLEIA DA REPUBLICA AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA RESERVA RELATIVA DA COMPETENCIA LEGISLATIVA GOVERNO COMPETENCIA LEGISLATIVA INCONSTITUCIONALIDADE ORGANICA CONTRATO DE TRABALHO SUSPENSÃO DA PRESTAÇÃO DE TRABALHO REDUÇÃO DA PRESTAÇÃO DE TRABALHO SEGURANÇA NO EMPREGO INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO LEI INTERPRETATIVA LEI AUTENTICA DIREITO A RETRIBUIÇÃO DO TRABALHO DIREITOS DOS TRABALHADORES DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS DOS TRABALHADORES DIREITOS E DEVERES ECONOMICOS DIREITO FUNDAMENTAL ANALOGO REGIME DOS DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS REPRESENTANTE DOS TRABALHADORES |
| Nº do Documento: | TPV1991101791372P |
| Data do Acordão: | 10/17/1991 |
| Espécie: | PREVENTIVA C |
| Requerente: | PRESIDENCIA DA REPUBLICA |
| Requerido: | GOVERNO |
| Nº do Diário da República: | 256 |
| Série do Diário da República: | IA |
| Data do Diário da República: | 11/07/1991 |
| Página do Diário da República: | 5688 |
| Votação: | MAIORIA COM 5 VOT VENC |
| Privacidade: | 01 |
| Voto Vencido: | VITOR NUNES DE ALMEIDA. BRAVO SERRA. MESSIAS BENTO. CARDOSO DA COSTA. ANTONIO VITORINO. |
| Constituição: | 1976 ART52 B ART17. 1989 ART 17 ART18 ART53 ART54 N4 ART55 N6 ART57 N3 ART58 ART59 N1 A ART59 N3 ART115 N5 ART168 N1 B ART201 B. |
| Normas Apreciadas: | DL REGISTADO PCM N408/91 ARTUNICO. |
| Normas Declaradas Inconst.: | DL REGISTADO PCM N408/91 ARTUNICO. |
| Legislação Nacional: | DL 398/83 DE 1983/11/02 ART2 N1 ART5 N2 N3 ART10 N1 C N3 ART11 ART12 ART13 ART14 ART15 ART16 ART17 ART21. DL 64-B/89 DE 1989/02/27 ART1 ART14 ART15 ART16 ART17. L 27/83 DE 1983/09/08. L 28/83 DE 1983/09/08. L 107/88 DE 1988/09/17. L 107/88 DE 1988/09/17. CCIV66 ART9 N3. CONST33 ART91. |
| Jurisprudência Constitucional: | P CC 12/78 IN PCC V6 PAG3. P CC 2/70 IN PCC V7 PAG189. P CC 24/80 IN PCC V13 PAG129. P CC 29/80 IN PCC V13 PAG249. P CC 3/82 IN PCC V18 PAG154. P CC 12/82 IN PCC V19 PAG123. AC TC 142/85 IN DR IS 1985/09/07. AC TC 254/86 IN DR IIS 1986/11/26. AC TC 32/87 IN DR IIS 1987/04/07. AC TC 67/87 IN DR IIS 1987/04/16. AC TC 423/87 IN DR IS 1987/11/26. AC TC 77/88 IN DR IS 1988/04/28. AC TC 157/88 IN DR IS 1988/07/26. |
| Outra Jurisprudência: | |
| Área Temática 1: | TEORIA DA NORMA CONSTITUCIONAL. TEORIA DA LEI. PRINCIPIOS GERAIS DOS DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS. DIREITOS LIBERDADES E GARANTIASDOS TRABALHADORES. DIREITOS E DEVERES ECONOMICOS. ASSEMBLEIA DA REPUBLICA. GOVERNO. |
| Área Temática 2: | DIR TRAB. DIR CIV - TEORIA GERAL. |
| Decisão: | Pronuncia-se pela inconstitucionalidade das normas constantes do artigo unico do Decreto registado na Presidencia do Conselho de Ministros sob o n. 408/91, relativo a alteração do regime juridico de suspensão do contrato de trabalho e de redução do periodo normal de trabalho. |
| Sumário: | I - Não e a circunstancia de os Decretos-Leis ns. 398/83 e 64-B/89 - que estabelecem o regime juridico de suspensão do contrato de trabalho e de redução do periodo normal de trabalho - haveremm sido aprovados ao abrigo de autorizações legislativas da Assembelia da Republica que prova, em si mesma, constituir esse regime materia da reserva relativa de competencia legislativa daquele orgão. II - A suspensão do contrato de trabalho e a redução do periodo normal de trabalho, embora afectem temporariamente, no todo ou em parte, as prestações principais que emergem do contrato de trabalho (a retribuição e a prestação de trabalho) são instrumentos destinados a evitar a cessação pura e simples da situação juridica laboral e, nessa medida, constituem uma protecção indirecta da estabilidade do emprego tutelada, como "segurança no emprego", pelo artigo 53 da Constituição. III - Embora a expressão "trabalhadores" não possua, na Constituição, um sentido univoco, não restam duvidas, porem, de que tal expressão, referida naquele preceito constitucional, se reporta apenas a "trabalhadores subordinados": esta conclusão e imposta pela expressão proibição de despedimentos sem justa causa ou por motivos politicos ou ideologicos, para alem de a locução "segurança no emprego" ja pressupor a existencia de uma situação juridica laboral. IV - Uma interpretação literal do artigo 53 da Constituição permite concluir que o seu conteudo normativo não se esgota na proibição de despedimentos sem justa causa ou por motivos politicos ou ideologicos. V - Tal proibição surge apenas como uma especificação - que nada indica ser taxativa - da garantia, mais geral, de segurança no emprego. Presumindo que o legislador constituinte "soube exprimir o seu pensamento em termos adequados", não se pode tomar a segurança no emprego apenas como confinada a permanencia da situação juridica laboral: a sua menção seria redundante relativamente a proibição de despedimentos. VI - Por outro lado, uma interpretação sistematica da Constituição revela que ela inclui, em varios preceitos, proibições dissociadas de qualquer garantia geral, assim sucedendo, por exemplo, no n. 3 do artigo 57, que proibe o lock-out. Se o sentido do artigo 53 fosse, exclusivamente, a proibição de determinados despedimentos, o legislador constituinte não teria nele consagrado a garantia de degurança no eprego. VII - Mesmo reconhecendo-se aquela garantia uma dimensão programatica, o seu conteudo preceptivo não se pode esgotar em tal proibição, sob pena de, se tal sucedesse, essa garantia ser seriamente afectada. Se pudessem ser decretadas arbitrariamente, a suspensão do contrato de trabalho e a redução do horario normal de trabalho iludiriam qualquer de despedimentos, eximindo o empregador de efectuar - no todo ou em parte - a prestação principal a que esta adstrito (retribuição) e ate teriam o efeito perverso de manter o trabalhador vinculado aos deveres acessorios emergentes do contrato - maxime, o da lealdade. VIII - A suspensão do contrato de trabalho e a redução do periodo normal de trabalho afectam a segurança no emprego porque, não pondo em causa, imediatamente, a subsistencia da situação juridica laboral, atingem o seu normal desenvolvimento por implicarem a quebra das prestações principais dela emergentes. IX - Por outro lado, afectam tambem o direito a retribuição do trabalho pondo em causa - para alem da prestação de trabalho - a propria retribuição e não exclusivamente o modo da sua determinação. X - Assim sendo, limitam a garantia consagrada no artigo 53 da Constituição e, dado que tal garantia se inclui, sistematicamente, no titulo respeitante a "direitos, liberdades e garantias", ela constitui materia de reserva relativa de competencia legislativa da Assembleia da Republica. XI - O facto de a primeira revisão constitucional ter promovido uma divisão dos "direitos fundamentais dos trabalhadores" em "direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores", por um lado, e, por outro, "direitos e deveres economicos", não obsta a qualificação destes ultimos, "in tontum", como direitos fundamentais de natureza analoga, a que se aplica o regime do artigo 18, por força do disposto no artigo 17 da Constituição. XII - A eliminação da referencia inicialmente contida no artigo 17 da versão originaria da Constituição aos "direitos fundamentais dos trabalhadores" (onde se enquadrava a garantia de segurança no emprego), operada pela Lei Constitucional n. 1/82, explica-se porque tal referencia implicava que estes direitos não fossem classificados, na sua totalidade, como "direitos liberdades e garantias". A qualificação de parte dos "direitos fundamentais dos trabalhadores" como "direitos, liberdades e garantias" determinou a alteração do artigo 17: não faria sentido aplicar por remissão aqueles direitos um regime que passou a ser-lhes directamente aplicavel (ex vi do artigo 18). XIII - A inclusão da garantia de segurança no emprego na reserva relativa de competencia legislativa da Assembleia da Republica não pode sofrer contestação apos a revisão constitucional de 1982, dado que, a sua inserção sistematica no titulo III do Cap. II da parte I da Constituição implica a atribuição aquela garantia do "triplice regime substantivo, organico e de limites materiais de revisão constitucional" dos direitos, liberdades e garantias. XIV - Tem sido entendimento seguido pelo Tribunal Constitucional, desde a sua primitiva jurisprudencia, que o Governo tem competencia para, em materia de reserva da Assembleia da Republica, compilar e reproduzir a legislação vigente, não obstante ter sublinhado, posteriormente, ao precisar este entendimento, que nos casos em que tal reprodução ou compilação se inserisse num diploma com vocação globalmente inovadora do regime juridico em causa, ja seria de exigir para tanto uma especifica habilitação parlamentar. XV - A interpretação autentica integra o proprio exercicio da função normativa, pelo que so tem legitimidade para tal interpretação - ou seja, para impor a injunção nesta contida - o proprio autor da norma interpretada, isto e, o orgão que detem competencia para, "ab initio", produzi-la. O que significa que, em se tratando de normas que versem sobre materia da competencia reservada da Assembleia da Republica, so esta ou o Governo por ela autorizado podem interpreta-las autenticamente. XVI - A alteração introduzida pelo artigo unico do Decreto n. 393/83, prevendo expressamente a interrupção por periodos de trabalho "diario ou semanal" e abrangendo "rotativamente, diferentes grupos de trabalhadores" - entendida pelo Governo como uma explicitação do regime anteriormente em vigor - e uma interpretação dada a uma norma respeitante a redução do periodo normal de trabalho - e a segurança no emprego - e, por isso, seria indispensavel autorização legislativa da Assembleia da Republica. XVII - O Governo, ao proceder a alteração da norma do n. 3 do artigo 5 daquele decreto-lei pelo referido artigo unico do Decreto n. 408/91, substituindo a locução "a suspensão so podera ser utilizada" por "a suspensão so podera ser aplicada" - com a invocada finalidade de pretender actualizar a redacção daquela norma, apos ter sido eliminada a exigencia de autorização administrativa para a suspensão do contrato de trabalho e a redução do periodo normal de trabalho, atraves do artigo 1 do Decreto-Lei n. 64-B/89 - necessitava igualmente de titulo habilitador bastante do legislador parlamentar. XVIII- Esta conclusão tanto e valida para quem entenda que a decisão de reproduzir, de renovar, de manter e ja uma decisão legislativa e, neste entendimento, a autorização se impõe mesmo quando se verifique mera reprodução ou compilação de normas previamente existentes referentes a materia da reserva de competencia legislativa do Parlamento a cargo do Governo, como para quem entenda que a compilação e reprodução de legislação vigente pelo Governo - num contexto em que não seja globalmente alterado o anterior regime - não afecta a reserva relativa de competencia legislativa da Assembleia da Republica. XIX - Na verdade, o Governo ao entender, no que toca a segunda daquelas alterações, que a supressão do processo de autorização administrativa não implica a ab-rogação logica, mas antes a redução da exigencia contida na referida norma do n. 3 do artigo 5, não esta a rectificar - o que se traduziria na mera reprodução da norma, mediante a eliminação de um erro material - mas a interpretar - procurando alcançar o sentido da norma, atendendo ao elemento sistematico. XX - Com efeito a nova formulação radica no entendimento de que o principio da subsidiariedade da suspensão relativamente a redução resulta da natureza especialmente gravosa daquela (e não da exigencia de autorização administrativa, entretanto revogada), excluindo outras interpretações possiveis. XXI - Assim, seja para quem defenda a primeira daquelas doutrinas, seja para quem considere, como a segunda, que a inovação no plano normativo tem por base uma interpretação do preceito alterado, a alteração proposta pelo Governo sempre implicou uma modificação normativa e tanto basta para que o Governo para tal carecesse de autorização legislativa da Assembleia da Republica. XXII - A alteração efectuada pelo artigo unico do Decreto n. 408/91 ao n. 1 do artigo 10 do Decreto-Lei n. 393/83, propondo-se restringir a proibição de aumento das remunerações dos membros sociais (durante o periodo de redução ou suspensão) a situação em que se verifique comparticipação financeira e a abolir a proibição (durante o mesmo periodo) de proceder ao reembolso de prestações suplementares de capital ou de suprimentos, não se reporta a materia alheia ao proprio regime de suspensão do contrato de trabalho e de redução do periodo normal de trabalho, como sustenta o Governo. XXIII- Na verdade, as proibições contidas na alinea c) do n. 1 daquele artigo 10 constituem limitações a actividade da entidade empregadora, que visam assegurar o caracter excepcional da suspensão do contrato de trabalho e da redução do periodo normal de trabalho, a que surgem associadas, pelo que, tratando-se de uma medida que visa, por um lado , contribuir funcionalmente para garantir a estabilidade no emprego, mantendo disponiveis meios existentes na empresa e, por outro, garantir uma certa justiça na distribuição dos sacrificios impostos aos varios elementos da empresa, nas situaçoes de crise, não seria justo, na perspectiva do regime em vigor, que so os trabalhadores suportassem os custos de recuperação. XXIV - Estando em causa, pois, pressupostos do regime de suspensão e de redução e, mediatamente, da garantia de segurança no emprego, requeria-se ainda autorização legislativa da Assembleia da Republica. XXV - A reserva relativa de competencia legislativa da Assembleia da Republica abrange ainda o estabelecimento de criterios a observar, nos casos de suspensão de redução do trabalho consagrados no artigo 11 do Decreto-Lei n. 398/83 e alterados pelo artigo unico do referido Decreto n. 408/91. XXVI - Com efeito, esses criterios fazem parte do regime de suspensão e de redução e respeitam a garantia de segurança no emprego, pelo que a alteração das normas daquele preceito pressupõe tambem autorização legislativa. XXVII- A criação de uma preferencia de que passaram a gozar os representantes dos trabalhadores na manutenção das condições normais de trabalho, abolindo-se as preferencias consagradas no n. 1 daquele artigo 11 para certo tipo de pessoas, respeita a materia dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, consagrados no artigo 54, n. 4 e 55, n. 6 da Constituição, pelo que se tornava tambem indispensavel autorização legislativa para o Governo legislar sobre ela. |
| Texto Integral: |