Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 3414/25.0BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 09/11/2025 |
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Relator: | JOANA COSTA E NORA |
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Descritores: | PEDIDO DE PROTECÇÃO INTERNACIONAL |
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Sumário: | Não alegando o autor factos concretos consubstanciadores das situações legalmente previstas como pressupostos para a concessão do direito de asilo e/ou de protecção subsidiária, não se impõe à Administração que, no âmbito do procedimento administrativo iniciado com o seu pedido de protecção internacional, adopte quaisquer diligências instrutórias adicionais. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Administrativa Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO Acordam, em conferência, os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO S… veio instaurar acção administrativa urgente contra a AIMA-AGÊNCIA PARA A INTEGRAÇÃO, MIGRAÇÕES E ASILO, I. P.. Pede a anulação da decisão proferida pelo Conselho Directivo da AIMA, de 16.12.2024, no âmbito do procedimento de protecção internacional n.º 2287/2024-CNAR, que considerou o seu pedido de protecção internacional inadmissível, bem como que seja ordenada a reavaliação completa do seu pedido de protecção internacional. Pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa foi proferida sentença a julgar improcedente a acção e, em consequência, a absolver a entidade demandada do pedido. A autora interpôs o presente recurso de apelação, cujas alegações contêm as seguintes conclusões: Notificada das alegações apresentadas, a entidade demandada não apresentou contra-alegações. O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso. Sem vistos dos juízes-adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. n.º 2 do artigo 36.º do CPTA), importa apreciar e decidir. II – QUESTÕES A DECIDIR Face às conclusões das alegações de recurso – que delimitam o respectivo objecto, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC -, a questão que ao Tribunal cumpre solucionar é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito. III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Considerando que não foi impugnada, nem há lugar a qualquer alteração da matéria de facto, remete-se para os termos da decisão da 1.ª instância que decidiu aquela matéria, nos termos do n.º 6 do artigo 663.º do CPC. IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A sentença recorrida julgou improcedente a acção por considerar não estarem verificados os vícios que a autora imputou ao acto impugnado, correspondente à decisão proferida pelo Conselho Directivo da AIMA, de 12.12.2024, no âmbito do procedimento de protecção internacional n.º 2287/2024-CNAR, que considerou o seu pedido de protecção internacional inadmissível, com o fundamento previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 27/2008 de 30 de Junho. Ali se concluiu que a decisão se mostra devidamente fundamentada através da remissão para a informação na qual assenta, e que contém as razões de facto e de direito que sustentam a decisão. Mais se entendeu que, tendo o pedido da autora sido considerado infundado com base na alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 27/2008, é sobre si que recai o ónus de alegação e da prova dos factos que sustentam a sua pretensão, não resultando das suas declarações qualquer facto do qual decorra uma ameaça para a sua vida ou liberdade por “raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas”, nem eventuais torturas, castigos ou tratamentos desumanos ou degradantes, limitando-se a autora a alegar estar a ser alvo de perseguição pelo grupo armado denominado “águias negras” e que, ao tentar impedir o recrutamento ou envolvimento dos seus filhos, começou a receber ameaças de morte, sendo coagida a integrar-se na organização, sob pena de represálias que colocariam em risco a sua vida e a da sua família. Todavia, tais factos não revelam que, no respectivo país de origem, Colômbia, a vida ou a liberdade da autora estejam ameaçadas por factores conexos com a sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas, nem tão pouco que aí vá ser sujeita a torturas ou a tratamentos cruéis ou degradantes. Concluiu-se ainda que a autora não alegou qualquer factualidade que indiciasse que a mesma está a ser perseguida ou gravemente ameaçada por exercer actividades enquadradas no n.º 1 do artigo 3.º da Lei do Asilo, nem que indiciasse o receio de ser perseguida em virtude de raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, não resultando concretizada uma situação em que tenha sofrido qualquer medida em virtude de alguma das aludidas circunstâncias. Também se entendeu não estarem verificados os requisitos para a concessão de protecção subsidiária por não ter sido alegada qualquer factualidade que traduza ameaça grave contra a sua vida ou integridade física, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos, limitando-se a autora a referir que “o risco de ofensa grave, associado à ausência de resposta adequada do Estado, bastaria para conceder proteção subsidiária.” A autora também não logrou demonstrar a incapacidade do Estado para oferecer protecção ao problema por si apresentado como motivo para solicitar protecção internacional, nos termos dos artigos 6.º, n.º 1, alíneas a) e c), n.º 2, e 7.º, n.º 3, da Lei do Asilo, resultando do teor da informação que sustentou a decisão impugnada que foi atribuído pelo Estado Colombiano, duas vezes, à autora e aos seus filhos, o estatuto de vítimas por deslocamento forçado, tendo a autora mudado de cidade voluntariamente por razões de trabalho, pelo que, no seu país, existe zona segura para onde a mesma pode voltar para viver tranquilamente com a sua família, não existindo, assim, um receio fundado actual que justifique uma protecção internacional. Insurge-se a recorrente contra o assim decidido. Considera que o Tribunal errou ao considerar a decisão impugnada devidamente fundamentada, quando a fundamentação apresentada é exígua, reduzindo-se a declaração de concordância com informação interna não notificada, assim violando o artigo 153.º, n.º 1, do CPA. A exigência legal de fundamentação dos actos administrativos decorre do artigo 268.º da Constituição, em cujo n.º 3 se estabelece que “Os actos administrativos (…) carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos.” Este comando mostra-se concretizado nos artigos 152.º e 153.º do CPA. Estabelece a alínea a) do n.º 1 do artigo 152.º que devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente, neguem, extingam, restrinjam ou afectem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções. Esta exigência (i) Permite ao cidadão conhecer o percurso cognoscitivo e volitivo que levou a Administração a decidir naquele sentido, e não noutro, podendo aquele conformar-se com o acto ou impugnar o mesmo pela via administrativa ou judicial; (ii) Obriga a Administração a ponderar os factos e a uma melhor aplicação do direito, de modo a convencer o administrado da validade dos seus fundamentos e da decisão. A falta de fundamentação do acto constitui um vício de forma, tendo como consequência a sua anulação, podendo, não obstante, o acto ser renovado sem o vício. O artigo 153.º estabelece os requisitos da fundamentação, dispondo o n.º 1, designadamente, que a mesma “deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão”. Relativamente à exposição das razões de direito em que assenta a decisão, deve a mesma indicar as normas e a disciplina jurídica aplicáveis – não só as normas de competência, mas também as respeitantes “à situação concreta decidendi e às medidas que a Administração deve (ou pode) providenciar para elas (ou aos interesses ou necessidades que nelas devam ser prosseguidos)” - , sob pena de se “dificultar significativamente a avaliação pelos interessados da (i)legalidade do acto com que se confrontam”, não podendo a fundamentação cingir-se “só às razões de facto ou só às razões de direito” – neste sentido, cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES E JOÃO PACHECO DE AMORIM, “Código do Procedimento Administrativo”, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 602 e 603. Volvendo ao caso em apreço, o acto impugnado nos presentes autos, como vimos, é a decisão proferida pelo Conselho Directivo da AIMA, de 16.12.2024, no âmbito do procedimento de protecção internacional n.º 2287/2024-CNAR, que considerou o seu pedido de protecção internacional inadmissível, com o fundamento previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 27/2008 de 30 de Junho. Entendeu o Tribunal a quo que tal acto não padece do vício de falta de fundamentação considerando que a decisão se mostra devidamente fundamentada através da remissão para a informação na qual assenta, e que contém as razões de facto e de direito que sustentam a decisão. Vejamos. O fundamento legal em que assenta a decisão impugnada é a norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 27/2008 de 30 de Junho, nos termos da qual o pedido de protecção internacional se considera infundado quando se verifique que, ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para protecção subsidiária. Quanto aos fundamentos de facto, a decisão remete para a informação que a antecede, com o n.º 2697, datada de 11.12.2024, constante do ponto 6. do probatório, com o seguinte teor: Assim, nem a fundamentação é exígua, nem se reduz a mesma a declaração de concordância com informação interna não notificada. Com efeito, e em primeiro lugar, a eventual falta de notificação da informação que contém a fundamentação da decisão impugnada não releva para aferir da validade (ainda que formal) do acto, na medida em que a notificação contende com a eficácia, e não com a validade. Em segundo lugar, nos termos do n.º 1 do artigo 153.º do CPA, a fundamentação pode “consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato.”, pelo que a remissão da decisão impugnada para a fundamentação constante da informação que a antecede mostra-se legalmente sustentada. Finalmente, para além de a recorrente não justificar minimamente a exiguidade que imputa à decisão impugnada, revela a sua p.i. que bem compreendeu os fundamentos subjacentes à mesma, que se alcançam com a leitura do teor da informação que acima se transcreveu, e que se reconduzem, designadamente, às circunstâncias de a autora não ter pedido ajuda ao Estado colombiano (como o havia feito anteriormente, tendo obtido o auxílio peticionado), de existir zona segura no Estado Colombiano, onde a autora pode viver com a sua família, e de a mesma não ter alegado factualidade que integre os fundamentos legais para a concessão de asilo ou protecção subsidiária. Ante o exposto, improcede o invocado erro de julgamento quanto ao imputado vício de falta de fundamentação do acto impugnado. A recorrente alega também que o Tribunal a quo, ao indeferir a produção da prova testemunhal requerida, violou o princípio do inquisitório (nos termos do n.º 3 do artigo 90.º do CPTA) e o direito ao contraditório (nos termos do n.º 4 do artigo 20.º da Constituição), consequentemente impedindo a sanação de alegadas contradições menores e ferindo de nulidade a instrução, sem fundamentar a inutilidade da prova, assim violando o artigo 111.º, n.º 5, do CPTA, que só permite a dispensa fundada de diligências instrutórias. Tendo a autora requerido, na p.i., a produção de prova testemunhal e por declarações de parte, o Tribunal a quo julgou-a desnecessária, considerando a factualidade alegada e a prova documental carreada para os autos, inexistindo matéria de facto controvertida com relevância para a decisão da causa. Ora, para além de a recorrente não indicar os factos alegados e que não constam da matéria de facto provada que entende relevarem para a decisão da causa, a decisão recorrida não assentou na falta de prova de factos. Diferentemente, a improcedência da acção resultou da falta de alegação de factos constitutivos dos pressupostos de concessão de protecção internacional. Por tais razões, não se pode concluir que o Tribunal a quo tenha incorrido em erro de julgamento de direito por não ter havido lugar à produção de prova requerida pela autora. Mais alega a recorrente que a sentença não ponderou a vulnerabilidade de menores, consagrada no artigo 78.º da Lei do Asilo (superior interesse da criança). Todavia, não tendo tal questão sido invocada na p.i. – e, portanto, submetida à apreciação do Tribunal recorrido -, estamos perante uma questão nova, que logicamente não foi apreciada pelo Tribunal a quo. E, assim sendo, não pode ser apreciada por este Tribunal de recurso, que não pode conhecer de questões novas, exceptuadas as que sejam de conhecimento oficioso, não sendo o caso. Com efeito, como anota pertinentemente ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES (Recursos em Processo Civil, 7.ª Edição, Almedina, 2022, p. 133, nota de rodapé 231), “O objeto do recurso está dependente do objeto da ação, sendo este definido essencialmente a partir da conjugação entre o pedido e a causa de pedir, elementos que, por seu lado, são submetidos a apertadas regras a respeito da sua alteração, nos termos dos arts. 264.º e 265.º. Por conseguinte, salvo nos casos em que se estabeleça acordo das partes, está afastada a possibilidade de alterar ou ampliar o pedido ou a causa de pedir em sede de recurso. Alguma iniciativa do recorrente, fora do caso previsto no art. 264.º, deve motivar a rejeição do recurso nessa parte (…).” Assim sendo, o recurso jurisdicional apenas pode ter por objecto questões que tenham sido anteriormente suscitadas, e não questões novas, salvo se forem de conhecimento oficioso – idem, ibidem, pp. 139 e 140. Nestes termos, a invocação da questão referente ao vício de violação do artigo 78.º da Lei do Asilo consubstancia uma ampliação da causa de pedir, possibilidade esta que carece de fundamento legal, pelo que se impõe a rejeição do recurso nesta parte, o que se determina. Alega ainda a recorrente que a situação de facto não é subsumível à alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, porquanto alegou “ameaças de morte, coação armada, tentativa de recrutamento forçado de menor e assédio sexual”, previstos no artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e f). Vejamos. Nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, o pedido de protecção internacional é considerado infundado quando se verifique que, ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para protecção subsidiária. No n.º 8 do artigo 33.º da Constituição da República Portuguesa, “É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência da sua actividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.” Tal direito de asilo mostra-se concretizado na Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, que estabelece as condições e procedimentos de concessão de asilo ou protecção subsidiária e os estatutos de requerente de asilo, de refugiado e de protecção subsidiária, transpondo para a ordem jurídica interna as Directivas n.ºs 2004/83/CE, do Conselho, de 29 de Abril, e 2005/85/CE, do Conselho, de 1 de Dezembro. Sob a epígrafe “Concessão do direito de asilo”, dispõe o artigo 3.º, nos seus n.ºs 1 e 2, que têm direito à concessão de asilo os estrangeiros e apátridas (i) perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência de actividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana; (ii) e os que, receando com fundamento ser perseguidos em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, não possam ou, por esse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual. Para o efeito, estabelecem os n.ºs 1 e 2 do artigo 5.º que “os atos de perseguição suscetíveis de fundamentar o direito de asilo devem constituir, pela sua natureza ou reiteração, grave violação de direitos fundamentais, ou traduzir-se num conjunto de medidas que, pelo seu cúmulo, natureza ou repetição, afetem o estrangeiro ou apátrida de forma semelhante à que resulta de uma grave violação de direitos fundamentais.”, podendo assumir, nomeadamente, as seguintes formas: “a) Atos de violência física ou mental, inclusive de natureza sexual; b) Medidas legais, administrativas, policiais ou judiciais, quando forem discriminatórias ou aplicadas de forma discriminatória; c) Ações judiciais ou sanções desproporcionadas ou discriminatórias; d) Recusa de acesso a recurso judicial que se traduza em sanção desproporcionada ou discriminatória; e) Ações judiciais ou sanções por recusa de cumprir o serviço militar numa situação de conflito na qual o cumprimento do serviço militar implicasse a prática de crime ou ato suscetível de provocar a exclusão do estatuto de refugiado, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º; f) Atos cometidos especificamente em razão do género ou contra menores.” São agentes de perseguição, nos termos do artigo 6.º, “a) O Estado; b) Os partidos ou organizações que controlem o Estado ou uma parcela significativa do respetivo território; c) Os agentes não estatais, se ficar provado que os agentes mencionados nas alíneas a) e b) são incapazes ou não querem proporcionar proteção contra a perseguição”, considerando-se “que existe proteção sempre que os agentes mencionados nas alíneas a) e b) do número anterior adotem medidas adequadas para impedir, de forma efetiva e não temporária, a prática de atos de perseguição por via, nomeadamente, da introdução de um sistema jurídico eficaz para detetar, proceder judicialmente e punir esses atos, desde que o requerente tenha acesso a proteção efetiva.” – cfr. artigo 6.º. Sob a epígrafe “Protecção subsidiária”, dispõe o artigo 7.º, nos seus n.ºs 1 e 2, que “É concedida autorização de residência por proteção subsidiária aos estrangeiros e aos apátridas a quem não sejam aplicáveis as disposições do artigo 3.º e que sejam impedidos ou se sintam impossibilitados de regressar ao país da sua nacionalidade ou da sua residência habitual, quer atendendo à sistemática violação dos direitos humanos que aí se verifique, quer por correrem o risco de sofrer ofensa grave.” E que, para o efeito, “considera-se ofensa grave, nomeadamente: a) A pena de morte ou execução; b) A tortura ou pena ou tratamento desumano ou degradante do autor no seu País de origem; ou c) A ameaça grave contra a vida ou a integridade física do autor, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos.” Na p.i., a autora (ora recorrente) alega que residiu com o seu agregado familiar em diversas localidades da Colômbia, designadamente Girón, San Luis Yolima e Tumaco Nanimo, numa sucessão de tentativas de escapar às investidas de grupos armados que procuravam recrutar o filho mais novo para o tráfico de droga e o crime organizado e assediar sexualmente a filha mais velha. Ao tentar impedir tais investidas, começou a receber ameaças de morte e a ser coagida a apresentar-se ou a integrar-se na organização, sob pena de represálias que colocariam em risco a sua vida e a sua família, o que se intensificou no início de 2024, pelo que a autora adoptou as seguintes estratégias para se proteger: mudar de residência em mais de uma ocasião, pedir auxílio a familiares que residiam em Girón e outras localidades e recorrer ao Registo único de Vítimas (RUV) do governo colombiano. Os referidos mecanismos mostraram-se insuficientes porquanto a ajuda do Estado durou pouco tempo e, não raras vezes, não havia protecção policial ou acompanhamento que garantisse a segurança da família, que foi deslocada forçosamente em várias ocasiões, tendo decidido mudar-se, de forma voluntária, mas sob coacção indirecta, para Tumaco Nanimo, onde, após quatro a seis anos, foi novamente alvo de intimidações, sendo obrigada a regressar a Girón, por questões familiares e económicas. Na maior parte das vezes, a autora não apresentou queixa formal à polícia colombiana, devido à inoperância ou cumplicidade de alguns agentes estatais, receando que a denúncia pudesse agravar o risco de retaliação. Em Novembro de 2024, após meses de intensificação das ameaças e sem perspectiva de uma solução interna segura, saiu do país com parte do agregado familiar e chegou a Portugal em 13.11.2024, apenas tendo requerido protecção internacional após ter conhecimento claro dos procedimentos legais aplicáveis. As “contradições” entre as suas declarações e as do seu marido e da sua filha, a que se refere a decisão impugnada, respeitam a aspectos secundários, sem invalidar a existência de ameaças graves, deslocações forçadas e actuação reiterada de um grupo paramilitar/criminoso contra a sua família. Dada a amplitude da actuação dos grupos criminosos na Colômbia (em particular, as “Águias Negras” e grupos dissidentes que surgem e reaparecem em diferentes regiões), bem como as condições socioeconómicas e o fortalecimento de grupos paramilitares, é praticamente impossível encontrar um local no país de origem onde a família possa viver sem medo constante de retaliações ou tentativas de recrutamento forçado. O Registo Único de Vítimas é meramente declarativo de condição de vítima, não equivalendo a uma protecção efectiva contra grupos violentos, pelo que o regresso da autora à Colômbia implicaria um risco grave para a sua segurança pessoal, bem como para a segurança dos seus filhos, que foram explicitamente visados pelos criminosos. Antes de mais, não se mostra minimamente concretizada nem fundamentada a conclusão a que chega a autora de que os alegados agressores seriam membros de um grupo armado, que nem sequer caracteriza, limitando-se a indicar a sua designação. Ademais, a autora não faz referência a qualquer pedido de ajuda que tenha dirigido ao Estado Colombiano para obter protecção em face dos supostos agressores e que tenha sido recusado. Para efeitos de concessão de asilo, a situação de perseguição que a recorrente invoca reduz-se a uma alegação vaga e genérica que nada tem a ver com qualquer actividade exercida em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, nem sequer com a raça, religião ou opinião política do autor, que permita o enquadramento da situação descrita nos n.ºs 1 e 2 do artigo 3.° da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, e a ligação dos supostos agressores a um grupo armado não se mostra segura, decorrendo de uma conjectura da autora. Quanto à também requerida protecção subsidiária, a autora não alegou qualquer factualidade apta a concluir pela impossibilidade de regresso à Colômbia, desde logo porque não descreve qualquer situação de sistemática violação dos direitos humanos. Na verdade, a recorrente não alega de forma credível e plausível que, caso regresse à Colômbia, corre o risco de sofrer pena de morte ou execução, tortura ou pena ou tratamento desumano ou degradante, ameaça grave contra a vida ou a sua integridade física, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos. Ademais, a recorrente não alegou que requereu protecção do Estado Colombiano face à ameaça de que se sente vítima, sendo certo que, quando os agentes são não estatais só podem ser considerados agentes de perseguição se ficar provado que são incapazes ou não querem proporcionar protecção contra a perseguição (cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 6.° da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho). Deste modo, na exposição dos factos que sustentam o seu pedido, a recorrente não invocou uma impossibilidade de regressar ao seu país de origem apta a sustentar o pedido protecção subsidiária, pelo que as razões que invocou para fundamentar a protecção internacional não revestem da pertinência e relevância mínima necessária para a análise do pedido. A este propósito, alega a recorrente que o Tribunal a quo pressupôs, que as autoridades policiais colombianas estariam aptas a protegê-la. Todavia, nesta sua alegação, olvida a recorrente que, como referido, é à mesma que incumbe a demonstração de incapacidade de protecção por parte das autoridades policiais, ónus que não cumpriu. Acresce que a recorrente ignora ainda a falta de verificação das condições a que se reporta o n.º 4 do artigo 18.º da mesma lei, nos termos acima referidos, no sentido de a alegação de factos ser insuficiente para sustentar o pedido. E em face da manifesta insuficiência de alegação de factos, não assume qualquer relevância a desconsideração de meios probatórios (como o Registo Único de Vítimas, os panfletos e os relatórios internacionais) invocada pela recorrente. De resto, não é aplicável ao caso o benefício da dúvida, nos termos do n.º 4 do artigo 18.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, dado que o mesmo pressupõe a relevância da alegação do requerente de protecção internacional, a qual não ocorre no caso, pelas razões acima enunciadas. Aqui chegados, concluímos que a autora não logrou sequer alegar – muito menos provar – factos concretos consubstanciadores das situações legalmente previstas como pressupostos para a concessão do direito de asilo e/ou de protecção subsidiária, pelo que não se impunha que, no âmbito do procedimento administrativo iniciado com o seu pedido de protecção internacional, fossem adoptadas quaisquer diligências instrutórias adicionais. Termos em que se impõe julgar o presente recurso improcedente. * Sem custas, nos termos do artigo 84.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho.V – DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes da Subsecção comum da Secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul em: a) Rejeitar o recurso na parte relativa à invocação de violação do artigo 78.º da Lei do Asilo; b) Negar provimento ao recurso interposto. Sem custas. Lisboa, 11 de Setembro de 2025 Joana Costa e Nora (Relatora) Marcelo Mendonça Ana Lameira (em substituição de Lina Costa) |