Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 71/16.8BESNT |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 09/18/2025 |
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Relator: | SUSANA BARRETO |
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Descritores: | FALTA OU IRREGULARIDADE DA NOTIFICAÇÃO |
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Sumário: | ![]() |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - Relatório A…, LDA., com os sinais dos autos, veio recorrer da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou extinta a instância por não ter sido constituído novo mandatário no prazo que lhe foi concedido para o efeito. Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formula as seguintes conclusões: I. «A secretaria não deu cumprimento à primeira parte do despacho de 17/10/2017 tendo remetido, em 20/11/2017, notificação para constituição de mandatário, por carta registada com aviso de receção, para morada distinta daquela que consta das bases de dados, o que se concluiu facilmente pelo confronto da carta para notificação e a pesquisa efetuada em 19/02/2018. II. Se a secretaria tivesse dado cumprimento ao ordenado – tal como veio a fazer em 19/02/2018 – a referida notificação para constituição de mandatário teria sido enviada para o domicilio fiscal do recorrente e, consequentemente, teria sido recebida…tal como foi a carta para notificação da sentença. III. No caso em apreço, a omissão de uma diligência expressamente ordenada pelo Tribunal a quo – a do prévio apuramento do domicílio - prejudicou o recorrente que se viu impedido de tomar conhecimento da notificação para constituição de mandatário e, em consequência, de constituir mandatário e ver julgada a causa. IV. A carta de notificação para constituição de mandatário não foi recebida, única e exclusivamente, por erro da secretaria que não apurou previamente o domicílio fiscal do recorrente, pelo que a este não podem ser assacadas quaisquer responsabilidades, nem tampouco o mesmo ser penalizado por erro e omissão da secretaria, nos termos do disposto no art. 157º nº 6 do CPC. V. No caso em apreço, a notificação para constituição de mandatário é pessoal, quer por força da lei, quer porque assim foi ordenado pelo Tribunal (vide despacho de 17/10/2017), nos termos do disposto nos artºs 38º nº 5 do CPPT e 47º nº 2 do CPC. VI. Às notificações pessoais aplicam-se as regras sobre a citação pessoal, nos termos do disposto no art. 38º nº 6 do CPPT, sendo que, nos termos do disposto no art. 192º nº 1 do CPPT, as citações pessoais são efetuadas nos termos do Código do Processo Civil. VII. E, nos termos do disposto no art. 225º nº 2 do CPC, a citação é feita mediante transmissão eletrónica de dados, entrega ao citando de carta registada com aviso de receção, contacto pessoal do agente de execução. A remissão para as regras do processo civil, naquilo que os artigos 190º, 191º e 192º não regulam expressamente, afasta desde logo a possibilidade de se aplicaram as normas dos artigos 37º a 39º do CPPT. VIII. A não receção da carta registada com aviso de receção não tem o efeito presuntivo da citação, pois o objetivo da citação é precisamente o da produção da certeza do conhecimento do ato e a devolução da mesma só pode significar que não foi conhecido pelo citando. IX. Portanto, regra geral, a devolução da carta tem o efeito negativo de não se considerar efetuada a citação e não o efeito positivo de citação presumida. Só assim não seria se a devolução da carta registada ocorresse pelo facto do citando se recusar a recebê-la. X. Ora, in casu, se a secretaria – conforme ordenado – tivesse efetuado pesquisas nas bases de dados e/ou oficiado o Serviço de Finanças – facilmente teria tomado conhecido do domicilio fiscal do recorrente. XI. E, para além disso, frustrando-se a citação por via postal – como se frustrou, pois que se encontra junta aos autos a devolução da carta para notificação com a menção “objeto não reclamado” - a secretaria devia ter promovido tais diligências e repetido a referida citação. XII. É, pois, forçoso concluir que não houve notificação efetiva para a constituição de mandatário, mas apenas uma tentativa de notificação, e como não se pode presumir que o recorrente teve conhecimento do ato citando, não interessa saber se o desconhecimento desse ato ocorreu por motivo que lhe foi ou não imputável. XIII. Haverá sempre falta de citação, porque, frustrada que foi a expedição da carta registada com aviso de receção, impunha-se tentar outras modalidades de citação, até à citação edital, se fosse caso disso. XIV. A sentença recorrida viola os artºs 35º nºs 5 e 6, 191º a 192º do CPPT, 47º, 225º nº 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2º do CPPT. Nestes termos e nos demais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e, em consequência, revogada a sentença recorrida. Assim farão Vªs Exªs a sempre esperada JUSTIÇA! Não foram apresentadas contra-alegações. O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. O Ministério Público junto deste TCAS emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação Cumpre, pois, apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso. Assim, na falta de especificação no requerimento de interposição do recurso, nos termos do artigo 635/3 do Código de Processo Civil, deve-se entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao Recorrente. O objeto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (artigo 635/4 CPC). Assim, todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões e devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso. Atento o exposto, e tendo presentes as conclusões de recurso apresentadas, importa decidir se a sentença padece de erro de julgamento, na interpretação dos factos e aplicação do direito, ao ter julgado extinta a instância por falta de constituição de mandatário judicial no prazo concedido para o efeito. II.1- Dos Factos O Tribunal recorrido não procedeu explicitamente à fixação de factos, mas da decisão transcreve-se o seguinte: - Em 30.05.2017 a Ilustre Mandatária da Oponente comunicou nos autos a dissolução e liquidação da sociedade Oponente – cfr. fls. 149/150 do suporte físico dos autos. - Por despacho de 17.10.2017 foi determinada a notificação dos liquidatários da sociedade para constituir novo mandatário, atenta a caducidade do mandato anteriormente conferido pela sociedade Oponente. - No prazo legalmente estabelecido não foi cumprido o determinado pelo despacho acima referido. Pertinente, para a apreciação do presente recurso, releva ainda dos autos o seguinte: A) Em 2015.12.08, a presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Cascais-1 (cf. carimbo aposto na primeira página da pi); B) Com a petição inicial a que se refere a alínea anterior juntou procuração forense outorgada por P… e M…, na qualidade de legais representantes da sociedade A…, Lda.; C) Em 2017.05.30, a Advogada constituída informou que, por decisão de 2016.10.17, transitada em julgado em 2016.11.11, a opoente foi dissolvida e liquidada; D) Em 2017.10.17, foi proferido despacho a ordenar a notificação dos liquidatários da sociedade para constituírem mandatário; deste despacho transcreve-se: «(…) I) Diligencie através das bases de dados acessíveis ou, se necessário, por ofício ao Serviço de Finanças da área da sede da Oponente, no sentido de apurar o domicílio fiscal dos liquidatários da sociedade dissolvida, identificados na procuração de fls. 9. II) Após, notifique-os de fls. 149 e para, no prazo de 20 dias, constituírem mandatário atenta a obrigatoriedade decorrente do valor da causa - cfr. art.º 6.º, n.º 1, do CPPT e art.º 47.º, n.º 3, do CPC -, sob cominação de extinção dos autos nos termos previstos na al. c) do n.º 3 do mesmo art.º 47.º. (…)» E) Foi junta aos autos certidão permanente da qual se transcreve: «(…) Ap. 52/20051212 - CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE E DESIGNAÇÃO DE MEMBRO(S) DE ORGÃO(S) SOCIAL(AIS) FIRMA: A… LDA NIPC: 5… NATUREZA JURÍDICA: SOCIEDADE POR QUOTAS SEDE: Rua J…, nº …, 1º esq., A…Distrito: Lisboa Concelho: Cascais Freguesia: Estoril (…) SÓCIOS E QUOTAS: QUOTA: 2.500,00 Euros TITULAR: P… Estado civil: Casado(a) Nome do cônjuge: L… Regime de bens: Comunhão de adquiridos Residência: Rua D…, nº 1…, Estoril, Cascais QUOTA: 2.500,00 Euros TITULAR: M… Estado civil: Casado(a) Nome do cônjuge: L… Regime de bens: Comunhão de adquiridos Residência: Rua J…, nº …, 1º esq., A…, Estoril, Cascais FORMA DE OBRIGAR/ÓRGÃOS SOCIAIS: Forma de obrigar: Com a intervenção de dois gerentes. (…) Insc .2 AP. 5/20161220 10:16:28 UTC - DISSOLUÇÃO E ENCERRAMENTO DA LIQUIDAÇÃO Decisão: Processo Administrativo de Dissolução e Encerramento da Liquidação, na sequência do Av. 2 - AP. 15/20160804 Data da Decisão: 2016-10-17 Data do trânsito em julgado: 2016-11-11 Conservatória do Registo Comercial Cascais O(A) Conservador(a) Auxiliar, M… An. 1 - 20161220 - Publicado em http://www.mj.gov.pt/publicacoes. Conservatória do Registo Comercial Cascais O(A) Conservador(a) Auxiliar, M… Insc .3 OF. 1 da AP. 5/20161220 - CANCELAMENTO DA MATRÍCULA (…) Menção Dep. 17371/2011-11-14 19:14:25 UTC - TRANSMISSÃO DE QUOTA(S) QUOTA E SUJEITO ACTIVO: QUOTA: 2.500,00 Euros TITULAR: P… NIF: 1… Estado civil: Divorciado Residência: Rua P…, 4º B, A…, Estoril Código Postal: 2…-0… ESTORIL SUJEITO PASSIVO: QUOTA: 2.500,00 Euros Titular: L… NIF: 2… Estado civil: Divorciado Residência: Rua …, 2º esq, E…, Estoril Código Postal: 2…-4… ESTORIL (…)» F) Em cumprimento do despacho parcialmente transcrito na alínea D) supra, em 2017.11.20: - foi enviada carta registada contendo ofício de notificação para constituição de mandatário, enviada para: P…, Rua …, nº 1… - Estoril- 2… – CACAIS; -foi também enviada carta registada para: M…, nº …, 1º esq. A…- Estoril 2…- 5…- CASCAIS; G) Em 2017.11.30, no TAF de Sintra foi rececionado aviso de receção assinado por «M…»; H) E, em 2017.12.06, foi recebida a carta enviada a P… foi devolvida com a indicação de objeto não reclamado; I) Em 2018.01.22, foi proferida a sentença recorrida; J) A carta contendo a notificação da sentença enviada a P…, Rua D…, nº 1…Estoril- 2… – CASCAIS, foi devolvida ao remetente com a menção de objeto não reclamado; K) Em 2018.02.19, foi junto aos autos comprovativo de busca na base de dados «informação fiscal para os tribunais», que atesta que P…, tem domicílio fiscal na R P… -4º B A… 2…-0… ESTORIL; L) Em 2018.02.19, foi enviado novo ofício de notificação da sentença para a morada indicada como domicílio fiscal de P…, constante da alínea que antecede; M) Em 2018.03.08, foi junta aos autos procuração outorgada por P…; N) E, na mesma data de 2018.03.08, deu entrada o presente recurso. II.2 Do Direito Notificado o ora Recorrente da sentença que julgou extinta a instância por falta de constituição de advogado, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul. Alega, em suma, que a carta contendo o ofício de notificação foi enviada para morada que já não era a sua e que a Unidade Orgânica não deu cumprimento integral ao despacho proferido pelo Mº Juiz a quo no sentido de, previamente ao seu envio, proceder à confirmação das moradas dos notificandos nas bases de dados disponíveis. Desde já adiantaremos que tem razão o ora Recorrente no que alega Vejamos, então: Não é facto controvertido que a Opoente era uma sociedade por quotas que, entretanto, foi dissolvida e liquidada na pendência dos autos. Dos factos assentes resulta que eram sócios da referida sociedade P… e M…, com quotas iguais. Vejamos o que nos dizem os artigos 162º e 163º do Código das Sociedades Comerciais (CSC): Artigo 162.º 1 - As ações em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.os 2, 4 e 5, e 164.º, n.os 2 e 5.2 - A instância não se suspende nem é necessária habilitação. Artigo 163.º 1 - Encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada.Passivo superveniente 2 - As ações necessárias para os fins referidos no número anterior podem ser propostas contra a generalidade dos sócios, na pessoa dos liquidatários, que são considerados representantes legais daqueles para este efeito, incluindo a citação; qualquer dos sócios pode intervir como assistente; sem prejuízo das exceções previstas no artigo 341.º do Código de Processo Civil, a sentença proferida relativamente à generalidade dos sócios constitui caso julgado em relação a cada um deles. 3 - O antigo sócio que satisfizer alguma dívida, por força do disposto no n.º 1, tem direito de regresso contra os outros, de maneira a ser respeitada a proporção de cada um nos lucros e nas perdas. 4 - Os liquidatários darão conhecimento da acção a todos os antigos sócios, pela forma mais rápida que lhes for possível, e podem exigir destes adequada provisão para encargos judiciais. 5 - Os liquidatários não podem escusar-se a funções atribuídas neste artigo, sendo essas funções exercidas, quando tenham falecido, pelos últimos gerentes ou administradores ou, no caso de falecimento destes, pelos sócios, por ordem decrescente da sua participação no capital da sociedade. Assim, perante a notícia da dissolução e liquidação da sociedade foi ordenada a notificação dos sócios e liquidatários para constituírem advogado. E, para permitir a averiguação das moradas dos sócios foi, no mesmo despacho, desde logo autorizada a consulta das bases de dados disponíveis para o efeito. Todavia, a carta contendo a notificação ao sócio P.., foi enviada para morada que já não era a sua desde 2011. Com efeito da certidão permanente junta aos autos constava como residência do referido sócio: Rua P…, 4º B, A…, 2…-0… ESTORIL [cf. Menção Dep. 17371/2011-11-14 19:14:25 UTC - TRANSMISSÃO DE QUOTA(S)] e a carta foi enviada para: Rua D.., nº 1…- Estoril- 2… Cascais. Dos autos nada consta a este respeito, do porque é que a carta foi enviada para aquela morada e não para outra. Podemos apenas especular, mas de uma mera especulação se trata, no sentido de ter havido lapso aquando da consulta à referida certidão permanente junta aos autos, tendo sido considerada a morada constante sob a Apresentação nº 52/20051212 em detrimento da morada respeitante à inscrição no ano de 2011, que era posterior. Certo é que a carta contendo a notificação foi devolvida ao remetente com a menção de objeto não reclamado e, logo de seguida, aberta conclusão nos autos. Seguidamente, foi proferida a decisão recorrida, decisão com a qual se não conforma o ora Recorrente e da qual recorre. E, da matéria assente resulta que, tal como alegado, o ora Recorrente não foi validamente notificado para constituir advogado nos autos porquanto e como vimos já supra, a carta contendo o ofício de notificação foi enviada para morada que já não era a sua e perante a devolução da carta ao remetente, não foram efetuadas quaisquer outras diligências, nomeadamente, de confirmação do seu domicílio, diligências que no entanto foram posteriormente efetuadas perante a devolução da carta contendo o ofício de notificação da sentença. Foi, pois, praticada a alegada omissão do ato de notificação do ora Recorrente, irregularidade essa que se projetou na decisão da causa, com evidente prejuízo para a defesa. Ora, não resultando provado através de outros elementos, que o ora Recorrente teve conhecimento da notificação para constituir advogado, atendendo à gravidade da cominação, visto o disposto no artigo 195º CPC aplicável ex vi artigo 2.e) do CPPT, tal acarreta que os atos posteriormente praticados no processo e que não possam ser aproveitados, incluindo a decisão recorrida, devem ser anulados. Termos em que procedem as alegações de recurso. III - DECISÃO Nos termos expostos, acordam os juízes da Subsecção Tributária de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso e, consequentemente, anular os atos praticados no processo após a notificação omitida e ordenar a baixa dos autos à 1ª Instância para proceder à notificação omitida, prosseguindo a ação os ulteriores termos processuais, se a tal nada mais obstar. Sem custas. Lisboa, 18 de setembro de 2025 Susana Barreto Luísa Soares (em substituição) Lurdes Toscano |