Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1303/17.0BESNT |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 07/15/2025 |
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Relator: | ISABEL VAZ FERNANDES |
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Descritores: | RECURSO CONTRA-ORDENAÇÃO PRESCRIÇÃO |
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Sumário: | I – Para efeito da análise da prescrição do procedimento contra-ordenacional importa ter presente o preceituado no artigo 33º do RGIT, tomando-se em consideração as causas de interrupção e de suspensão nele previstas, bem como as previstas na lei geral (RGCO). II – No entanto, é de aplicar ao procedimento contra-ordenacional tributário o disposto no nº 3 do artigo 28º do RGCO, que estabelece o seguinte: “A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo de prescrição acrescido de metade”. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO I – RELATÓRIO A AT, não concordando com a sentença proferida pelo TAF de Sintra que considerou procedente o recurso da decisão de aplicação de coima, proferida no Processo de Contra-Ordenação nº 3433-2014/060000515746 instaurado contra B... ... , Ldª, no Serviço de Finanças de Cascais 2, por infracção aos artigos 27º nº1 e 41º, ambos do CIVA, veio interpor recurso jurisdicional tendo formulado as seguintes conclusões: “ A. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou verificada a nulidade da decisão administrativa recorrida suportada na falta dos elementos essenciais enunciadas nas alíneas b) e c) do art. 79°, n° 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) por não resultar dos autos que o ofício de notificação do valor da coima aplicada tenha sido acompanhado do despacho/decisão nele referenciado. B. Apesar de todo o enquadramento atinente à descrição sumária dos factos e não desconhecendo o teor do despacho da entidade administrativa de 09-02-2015 dado como provado (facto D) é manifesto que o Tribunal a quo se limitou a entender não ter resultado provado nos autos "que a notificação do valor de coima a pagar, substanciada no referido ofício de 09.02.2015, tenha sido acompanhada do despacho a que ali se faz referência e que conteria, aquele sim, a descrição sumária dos factos imputados à aqui recorrente, acompanhada da indicação das normas violadas e punitivas." C. Tudo está, pois, em saber, se da prova recolhida no processo podia ou não o tribunal a quo convencer-se de que o despacho de 09-02-2015 foi acompanhado do despacho proferido nessa data, ou, no prisma oposto (como o fez) se podia dar por não provado esse facto. D. Dos autos foi dado por provado o facto D, correspondente à decisão da fixação da coima no qual figura o despacho de "CASCAIS, em 2015-02-09" (fls. 48 e 49 dos autos), o qual determina se notifique "(...) o arguido dos termos da presente decisão, juntando-se-lhe cópia, para (...) E. Foi ainda levado ao probatório o facto E, consubstanciado no Ofício de 09-02-2015, recebido em 19-02- 2015, dando-se conta que a ora recorrente "(...) foi notificada para proceder ao pagamento da coima no valor de € 5.007,90, aí se fazendo referência ao despacho do chefe de finanças da mesma data "que se anexa" — cfr. fls. 14 e 68/69 do suporte físico dos autos (sublinhado e negrito nosso) tendo ficado demonstrado nos autos que o despacho de 09-02-2015 foi anexo ao ofício da mesma data e dado por provado F. Nas notificações não é que não possam acontecer lapsos que possam gerar a mera dúvida, que não a dúvida razoável como a única dúvida que permite ao tribunal absolver o arguido sendo que no universo das notificações que diariamente são enviadas a nível nacional por todas as entidades públicas nas relações com os administrados o que é razoável é entender que as mesmas seguem de forma regular, e não o contrário. Isso é que é razoável. G. Além de que caso fosse verdade que a decisão de 09-02-2015 não acompanhou o ofício com a mesma data a atitude normal de qualquer cidadão em convivência social e que sente verdadeiramente a necessidade de se defender seria abeirar-se do órgão emissor solicitando a regularização do ato de notificação. H. É, de resto, particularmente evidente no que tange às notificações do órgão instrutor (SF Cascais 2) a preocupação do Chefe de Finanças (delegação) em determinar o despacho acompanhasse o ofício, e a preocupação reflexa de quem emite o ofício em dar conta que o despacho vai anexo. Mas desta evidência levada ao probatório, incompreensivelmente o tribunal a quo também não retira nenhuma ilação. I. O tribunal a quo não dá uma única razão porque entende que o despacho não acompanhava a notificação. Não dá nos factos não provados, e, menos o faz na fundamentação de direito. J. Que evidência seja de que natureza for que suporta a sua dúvida que não possa ser suplantada pela certeza jurídica que razoavelmente o determina? Desconhece-se, e, na verdade, não há. K. À luz dos princípios do direito processual penal de que o regime contra-ordenacional assenta, o infrator relativamente aos factos pode inclusivamente mentir sem que consequência penal lhe possa ser imposta. L. Tal como enunciámos supra (§ 14°), para o tribunal a quo se convencer neste domínio não basta a mera dúvida concebível. Não há racionalidade nesta decisão se suportada apenas nas declarações do infrator que, de resto, tem interesse em se furtar ao pagamento da coima (tanto mais que pelo próprio já foi assumido que pagou fora do prazo) contrariando inclusivamente o teor da prova documental ali confirmado pela entidade administrativa. M. Parece-nos, pois, evidente face prova reunida nos autos e aos deveres de coexistência social que impendem sobre os cidadãos, de que não estão dispensados os infratores — que ao tribunal a quo não sobrava outro caminho senão racionalmente dar por provado que o despacho de 09-02-2015 (facto provado D) acompanhou efetivamente o ofício dessa data (Facto E), mostrando-se ali enunciados todos os elementos de facto e de direito que determinaram a aplicação da coima no valor ali mencionado inexistindo, outrossim, qualquer nulidade insuprível assacável à decisão administrativa recorrida N. Ao determinar a nulidade da decisão de aplicação de coima, incorreu o douto Tribunal em erro de julgamento violando o disposto nos arts. 79°, n° 1, al. b) e c) do RGIT, inexistindo verdadeira insuficiência da descrição sumária dos factos e 63°, n° 1, alínea d), do RGIT inexistindo qualquer nulidade insuprível imputável à decisão administrativa. Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgando procedente o presente recurso mantenha na Ordem Jurídica, julgando legal, a decisão administrativa de fixação da coima. PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA! ” * * Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência da Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão. * - De facto Ao abrigo do preceituado no nº6 do artigo 663º do CPC, remete-se para a matéria de facto fixada na sentença. * - De Direito Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. Cumpre, antes de mais, conhecer da questão da prescrição do procedimento contra-ordenacional, por se tratar de causa extintiva de conhecimento oficioso e que precede o conhecimento do mérito da causa, e que, a verificar-se, torna inútil a apreciação de qualquer outra questão invocada em sede de recurso. Está em causa nos presentes autos o processo de contra-ordenação que, na fase administrativa possuía o n.º 3433-2014/060000515746, no âmbito do qual foi a arguida condenada no pagamento de coima no valor de € 5.007,90, pela prática da infracção ao disposto nos artigos 27º nº1 e 41º do CIVA, punida pelos artigos 114º nº2 e 5 e 26º nº4 do RGIT – falta de entrega da prestação tributária dentro do prazo. A infracção aqui em causa respeita ao período de Agosto de 2014, pelo que cumpre, antes de mais, averiguar se já se completou o prazo de prescrição do procedimento de contra-ordenação. No caso dos autos está em causa infracção reportada à falta de entrega de prestação tributária dentro do prazo (IVA), sendo que a data em que foi praticada a infracção vale para o início da contagem do prazo prescricional. Resulta do probatório que o PCO foi instaurado em 23 de Novembro de 2014 (cfr. alínea b) da matéria de facto assente) e que o despacho de fixação da coima foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças em 9 de Fevereiro de 2015 (cfr. alínea e) do probatório). Ora, quando a liquidação da coima viva na umbilical dependência da prévia liquidação do tributo, o prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação do tributo, o qual, por força do artigo 45.º, n.º da Lei Geral Tributária (LGT), é de quatro anos. Significa isto que, nestes casos e no limite, a prescrição do procedimento por contra-ordenação terá lugar logo que se mostrem decorrido seis anos e seis meses sobre a prática da infracção, pois, ressalvado o período máximo de suspensão (seis meses), ele terá sempre lugar logo que se mostre decorrido o prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação (quatro anos) acrescido de metade (dois anos). Seguiremos de perto o Acórdão do STA de 02/02/2022, proferido no âmbito do processo nº 03/16.3BESNT, do qual recuperamos o seguinte: “(…) Jurídico-conceptualmente a prescrição do procedimento contra-ordenacional é configurada como excepção peremptória (pressuposto processual negativo) de conhecimento oficioso em qualquer momento do processo, até à decisão final (cfr., em conjunto e conjugadamente, os artºs.35º e 193º, al.b), do C.P.Tributário, e 27º, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aprovado pelo Dec.Lei nº 433/82, de 27/10 e o artº.33, do R.G.I. Tributárias), que obsta ao julgamento da matéria de fundo e dá origem ao arquivamento dos autos (cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, Editorial Notícias, 1993, pág.1123 e seg.; Manuel Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, III, pág.14; M. Leal-Henriques e M. Simas Santos, C.Penal Anotado, Rei dos Livros, 1995, 1º.volume, pág.826 e seg.). Hodiernamente, o prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional está prognosticado no artº.33º, do R.G.I.T., norma que mantém no seu nº.1 o prazo geral de cinco anos, já consagrado no anterior artº.119º, da L.G. Tributária, tal como no artº.35º, do C.P. Tributário, no que tange às contra-ordenações fiscais não aduaneiras. (…) reportando-se o caso sub judice ao prazo de prescrição de contra-ordenação, por falta de pagamento do IVA dentro do prazo, é entendimento jurisprudencial uniforme que os prazos de prescrição do procedimento por contra-ordenação tributário previstos no artigo 33.º do RGIT, acrescidos de metade, nos termos do n.º 3 do artigo 28.º do DL n.º 433/82, aplicável ex vi do n.º 3, do mesmo artigo 33.º, constituem os prazos máximos de prescrição do procedimento contraordenacional, que, por isso, são sempre aplicáveis a todos os procedimentos, ainda que tenha havido interrupção desse prazo. Pontificam, a esse propósito, entre muitos, os Acórdãos do STA de 12/12/2018, Proc. nº 0367/14.3BELRA, de 20/12/2017, Proc. nº 084/17, de 20/12/2017, Proc. nº 0224/17, de 19/09/2007, Proc. nº 0453/07, de 30/04/2019, Proc. nº 0679/11.8BEALM e de 20.05.2020, Proc. nº 1901/15.7BELRA. Por outro lado e no tangente à contra-ordenação fiscal prevista e punida pelo artigo 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea a), do RGIT, o prazo prescricional geral de cinco anos é reduzido para o prazo de caducidade do direito à liquidação do IVA, ou seja, quatro anos (cf. artigo 45.º, n.ºs 1 e 4, na redacção que foi conferida a este último pela Lei n.º 32-B/2002, de 31 de Dezembro, ex vi artigo 94.º, n.º 1, do Código do IVA e do artigo 33.º, n.º 2, do RGIT). Em todo o caso, é enquadrável no prazo de prescrição previsto no artº.33, nº.2, do R.G.I.T., a infracção tributária que deriva da violação do regime de autoliquidação e pagamento do I.V.A., enquadrável em termos de responsabilidade contra-ordenacional no artº.114, do R.G.I.T. É que no artº.33º, nº.3, do R.G.I.T., remete-se para a aplicação das normas sobre suspensão e interrupção da prescrição do processo contra-ordenacional previstas no R.G.C.O.C. O curso da prescrição pode ser suspenso e interrompido. Há suspensão quando o tempo decorrido antes da verificação da causa de suspensão conta para a prescrição, juntando-se, portanto, ao tempo decorrido após essa causa ter desaparecido (cfr.artº.120, nº.3, do C. Penal). A suspensão impede que o prazo da prescrição decorra enquanto se mantiver a causa que a determinou. Inversamente, verifica-se a interrupção quando o tempo decorrido antes da causa de interrupção fica sem efeito, devendo, portanto, reiniciar-se a contagem de um novo período logo que desapareça a mesma causa (cfr.artº.121º, nº.2, do C. Penal). Quer dizer, a interrupção anula o prazo prescricional entretanto decorrido (cfr. Ac.S.T.A.-2ª.Secção, de 19/9/2007, Proc.453/07; Ac. S.T.A.-2ª.Secção, de 26/9/2007, Proc.518/07; Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.327; Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral, 6ª. edição, 2011, Áreas Editora, pág.261). Extrai-se do acabado de expor, que o prazo de prescrição capitula dentro do nº 2 do art. 33º do RGIT, ou seja o prazo consagrado no nº 1 do art. 45º da LGT – 4 anos, sendo de realçar que a prescrição do procedimento contraordenacional tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade, ou seja, conquanto a respectiva suspensão pudesse ter lugar, esta não poderia ultrapassar os seis meses (cf. artigo 27.º-A, n.º 2, do RGCO, ex vi artigo 3.º, alínea b), do RGIT). Nessa óptica, é inelutável que o procedimento contraordenacional fiscal prescreveu em 10 de Junho de 2020, em rigor, seis anos e seis meses após o seu início (10 de Dezembro de 2013), (…) e independentemente da verificação de factos interruptivos e suspensivos, o procedimento contraordenacional é forçosamente extinto por prescrição. (…)” Vejamos, agora, se já ocorreu a prescrição do procedimento no caso dos autos. Atendendo à data da prática da infracção – 18/08/2014 - e aplicando-se o prazo máximo supletivo de prescrição, acrescido de metade, ou seja, na presente situação, de seis anos (4+2), acrescidos dos 6 meses de suspensão, o prazo prescricional consumou-se em 18 de Fevereiro de 2021. Conclui-se, pois, à luz dos citados preceitos legais, que o procedimento contra-ordenacional se encontra integralmente prescrito. Encontrando-se prescrito o procedimento contra-ordenacional relativo à infracção objecto dos presentes autos, verifica-se excepção peremptória que determina a extinção do procedimento contra-ordenacional e obsta à apreciação da matéria de fundo, ficando, assim, prejudicado o conhecimento das demais questões invocadas. Relativamente às custas, declarado extinto o procedimento de contra-ordenação por prescrição, inexiste condenação da Arguida, não sendo, por isso, devidas custas processuais por esta. Por outro lado, não estando previsto que o Ministério Público suporte as custas, por ser entidade isenta do seu pagamento, e inexistindo norma no regime legal de custas aplicável em processo de contra-ordenação tributária que preceitue a condenação da Autoridade Tributária, na presente lide não haverá condenação em custas. * IV. DECISÃO Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contra-ordenacionais deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, e, em consequência, julgar extinto o processo de contra-ordenação nº 3433-2014/060000515746, por prescrição. Sem custas. Registe. Notifique. Lisboa, 15 de Julho de 2025 Isabel Vaz Fernandes Luísa Soares |