Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 436/25.4BELRA |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 09/18/2025 |
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Relator: | ANA CRISTINA CARVALHO |
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Descritores: | AUTORIZAÇÃO DE ACESSO A INFORMAÇÃO E DOCUMENTOS BANCÁRIOS SIGILO BANCÁRIO CONVENÇÃO PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO INFORMAÇÕES PROTECÇÃO DA VIDA PRIVADA COMBATE À FRAUDE E À EVASÃO FISCAIS PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE |
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Sumário: | I – A falta de cumprimento de obrigações declarativas legalmente exigíveis no Estado requerente constitui fundamento de acesso a informações ou documentos bancários sem dependência do consentimento do titular nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado português está vinculado; II – No procedimento de autorização de acesso a informação bancária vigente, a audição prévia do contribuinte manteve-se apenas para as situações em que o acesso a informações e documentos bancários se reporta a contas de que são titulares familiares daquele e/ou de terceiros que com ele estejam numa relação especial; III – O regime de derrogação do sigilo bancário tem em vista compatibilizar a protecção da privacidade do contribuinte com a promoção do combate à fraude e à evasão fiscais, pelo que, tal regime não colide com o princípio da reserva da intimidade da vida privada, pois está balizado por limitações tendentes a proteger e a garantir ambos os valores de acordo com o princípio da proporcionalidade. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO J…, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de M…, inconformado com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial por si intentada, contra a “decisão da Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira de derrogação do dever de sigilo bancário, proferida em 08/03/2025, que autorizou o acesso a todas as contas detidas, indireta ou indiretamente, por M… no Banco C…, ou em relação às quais tenham um interesse efetivo bem como aquelas em relação às quais tenham uma procuração, para o período compreendido entre 01/01/2020 e 31/12/2023”, dela veio interpor recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões: «1 – Sem o conhecimento da totalidade dos titulares das contas bancárias pertencentes ao acervo hereditário, não pode a AT ter acesso às informações das mesmas contas bancárias. 2 – A falecida foi sempre uma mulher pacifica, insusceptivel de qualquer investigação criminosa, por jamais ter praticado qualquer crime em França, e sempre declarou os seus impostos e fez as suas declarações em Portugal. 3 – Era apenas doméstica e companheira do cabeça de casal recorrente, não exercendo qualquer actividade económica em França. 4 – A presente sentença, viola o Nº 13 do artº 63-B da L.G.T, pois inexiste nos autos qualquer especificação ou concretização de qualquer verdadeira inspeção em França em relação à falecida. 5 – À data da sua morte a mesma tinha morada fiscal em Portugal, e o recorrente já tinha morada fiscal em Portugal há mais de dez anos. 6 – O acórdão do Proc. nº 268/20.6BEFVN referido nos autos, trata apenas de uma questão referente a um contribuinte residente em Portugal, e não a um contribuinte residente em França. 7 – Nos autos, inexiste justificação da prática do ato, ou motivação do conteúdo do ato, inexistindo as “premissas “justificativas da decisão. 8 – Donde a presente decisão ofende manifestamente o disposto no artº 26 nº 1 da C.R.P, ofendendo manifestamente o princípio da ponderação e proporcionalidade, que devem presidir nas decisões administrativas e tributárias. 9 – O acesso da AT à informação bancária não é irrestrito (art.°63.°, n.°3, da LGT) sendo que o legislador estabeleceu no n. ° 1 do art.° 63.°-B, da LGT as condições concretas em que tal acesso se pode verificar por acto administrativo, condições essas que têm de ser evidenciadas em procedimento inspectivo iniciado na pessoa que apresente algum elemento de conexão ao sistema fiscal português (art.°18.°, n.°3, da LGT). 10 – Deve ser aditado à matéria de facto, que se impugna através do presente recurso o seguinte facto: M – A falecida residia em Portugal nos últimos anos, com o marido cabeça de casal, e há mais de dez anos, tinha morada fiscal à data da sua morte em Portugal. Sempre apresentou as suas declarações fiscais em Portugal, sempre foi doméstica em França, nunca aí tendo qualquer actividade económica. 11 – O Acórdão do Proc. Nº 3/20.9BELRA de25-06-2020, constitui decisão similar à dos autos, o que para uniformização de jurisprudência, e entendimento judicial, impõe a revogação da presente sentença, julgando-se procedente o recurso instaurado com as legais consequências. 12 – De verdade a aliás douta sentença, viola além do mais o disposto no artº 63-B da L.G.T e a convenção celebrada entre Portugal e França para evitar dupla tributação de 14/01/1971 e o Dec. Lei 61/2013 Termos em que deve ser julgado procedente e provado o presente recurso, revogando-se a aliás douta sentença, e julgando-se procedente o recurso instaurado nos ternos do artº 146 B nº 1 do C.P.P.T, com todas as legais consequências.» * A Recorrida Fazenda Pública apresentou as suas contra-alegações, rematando-as com as seguintes conclusões: «a) A Recorrida entende que não assiste razão ao Recorrente e que a sentença sob recurso não enferma de qualquer erro de julgamento quanto aos factos ou quanto ao direito, acompanhando-a na íntegra. b) Quanto ao erro de julgamento relativamente à matéria de facto, o Recorrente pretende o aditamento ao probatório da sentença sob recurso, a título de matéria de facto provada, da factualidade que descreve sob a alínea M das suas alegações de recurso. c) Sucede, todavia, que o Recorrente não justifica, com fundamento na prova produzida nos autos, porque entende que o Tribunal “a quo” incorre em erro de julgamento ao não considerar provada a matéria de facto a que alude, o que, por si só, é suficiente para julgar, nesta parte, o recurso improcedente. d) Porém, há ainda que atender à relevância da matéria de facto ora em causa para a boa decisão dos autos, o que o Recorrente também não justifica. e) De todo o modo, quanto à matéria de facto que o Tribunal considerou relevante para a boa decisão da causa, resulta da leitura da sentença, conforme se transcreve de fls. 13, que apenas constam do probatório os “(…) factos alegados relevantes para a decisão, em face das possíveis soluções de direito, que importe referir como provados ou não provados”, de onde resulta que a factualidade agora em apreço tão pouco consta do probatório a título de matéria de facto não provada justamente porque não se afigura relevante para a decisão da causa. f) Na verdade, e conforme resulta de fls. 22 da sentença, que se transcreve, o facto alegado de que M…“nunca teve qualquer atividade económica em França, sendo sempre doméstica e os rendimentos do casal, sempre foram apenas decorrentes da atividade económica do recorrente marido até 2008, que aí em França sempre pagou todos os seus impostos, devidos pela mesma” constitui uma alegação que “não é relevante para a decisão sobre a legalidade do despacho em causa pois, efetivamente e como bem assinala a Fazenda Pública, a informação pretendida pela AFF não tem como pressuposto que M… exercesse uma atividade económica em França”. g) No que respeita ao erro de julgamento quanto ao direito, a Recorrida entende que a sentença sob recurso fez uma correcta aplicação do direito aos factos, pronunciando-se sobre todas as questões suscitadas pelo Recorrente e justificando o respectivo enquadramento legal. h) Assim, no que respeita à legitimidade do Recorrente, a sentença concluiu que não obstante a existência de mais herdeiros de M… para além do Recorrente, ainda assim, atento o facto de a herança permanecer indivisa, o que não foi contrariado nos autos, resulta forçoso concluir que é ao Recorrente que compete “a representação dos interesses da herança, tando em sede administrativa ou em sede judicial, pelo que o facto de a notificação da decisão impugnada lhe ter sido feita somente ao Recorrente, foi feita regularmente, não invalidando o procedimento de levantamento do sigilo bancário. i) No que respeita à legalidade da decisão de derrogação de sigilo bancário, a sentença entendeu que “de acordo com a informação prestada pelas autoridades francesas, está em curso uma ação inspetiva em França sobre a situação tributária da falecida e que consideram aquelas entidades que a mencionada contribuinte foi residente fiscal naquele país, e que não declarou a existência de uma conta bancária detida em Portugal às Autoridades Fiscais Francesas”, pelo que, considerando que a informação prestada pela autoridade fiscal francesa “faz fé como informação oficial prestada por administração tributária estrangeira ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado”, j) E atendendo a que o Recorrente não fez qualquer prova em contrário, i.e., “Nada aos autos foi trazido pelo Recorrente que contrarie aquela alegação, somente a alegação de que “o Recorrente ou a falecida jamais faltaram à verdade ou estão em falta com o que legalmente lhes é ou era exigível”, mas nenhum documento foi junto que prove que essa informação foi efetivamente prestada pela falecida as autoridades francesas”, k) Resulta forçoso concluir, como concluiu a sentença sob recurso, e que se transcreve de fls. 17, que “bem andou a AT em enquadrar isto na alínea b) do n.º 1 do artigo 63.º-B da LGT e, perante esta factualidade, verifica-se uma situação enquadrável no elenco taxativo daquele n.º 1 estando a AT legitimada a levantar o sigilo, ao abrigo da alínea b), cumprindo assim com a lei nacional, e, posteriormente, em cumprimento do disposto na alínea h) do mesmo artigo 63.º-B, ao prestar tal informação às autoridades francesas” l) No que respeita ao alegado vício de preterição de audiência prévia, a sentença sob recurso concluiu que não se encontra violado o previsto no n.º 5 e no n.º 13 do artigo 63.º-B da LGT, desde logo porque “o Recorrente aqui e no procedimento não tem a qualidade de terceiro, antes está a representar a herança como cabeça de casal, quanto muito ouvido a título de interessado”, a que acresce a aplicação da jurisprudência citada a fls. 17 a 19 da sentença. m) No que respeita à alegada falta de fundamentação da decisão de derrogação de sigilo bancário em apreço, a sentença concluiu, conforme se transcreve de fls. 20, que a “decisão aqui em causa não padece do vício formal de falta de fundamentação, uma vez que se sustenta e remete expressamente na / para a Informação da DSRI, prestada no âmbito do processo n.º 662020256622001764, bem como com os pareceres e despacho nela exarados (todos transcritos na matéria de facto assente), nos quais extensamente se enumeram as razões de facto e de direito que subjazem à decisão impugnada, mencionando-se, nomeadamente, o pedido de informação das autoridades francesas e os seus moldes, o esgotamento de recursos alternativo à obtenção de informação, a investigação corrente sobre a falecida, a ausência de resposta da falecida à tentativa de as autoridades obterem uma declaração de informação bancária portuguesa.” n) Mais refere a sentença sob recurso, conforme se transcreve de fls. 21, que “resulta claro e percetível o caminho percorrido para chegar à decisão em causa e que, aliás, da análise da petição do presente recurso resulta que o Recorrente corretamente o percecionou.” o) Por fim, quanto à alegada violação do direito à intimidade da vida privada, assim como a alegada violação ao princípio da proporcionalidade, concluiu a sentença que o Recorrente se limitou a afirmar as referidas desconformidades sem apresentar, no entanto, as concretas razões de facto assim como as razões de direito em que assenta o seu discurso jurídico. p) Concluindo, porque a sentença não enferma de qualquer erro de julgamento quanto aos factos ou quanto ao direito, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente. Nos termos supra expostos, e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o recurso ser julgado improcedente.» * O Ministério Público, junto deste Tribunal Central, emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. * Com dispensa dos vistos legais, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão. * II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pela recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Importa assim, decidir se a sentença recorrida: i) Padece de erro de julgamento da matéria de facto por se impor o aditamento de um facto; ii) Incorreu em erro de julgamento por inexistência de motivação do acto e dos pressupostos que justifiquem o acto impugnado, tendo o Tribunal a quo errado na interpretação e aplicação do disposto no artigo 63.º-B, n.ºs 1, alíneas b) e h) e 13 da LGT.
III - FUNDAMENTAÇÃO III – 1. De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida: «A) Em 04/12/2024, foi efetuado um pedido de troca de informação, sendo o país requerente França e o país requerido Portugal, concretamente, formulado pela “Direction Générale des Finances Publiques” e dirigido ao Ministro das Finanças português, referente a E.., com morada fiscal em França – cf. documento com a ref. 5983396 nos autos (suporte digital, a que correspondem futuras menções na presente decisão). B) Consta do pedido mencionado na alínea que antecede que o mesmo é feito ao abrigo da “Diretiva do Conselho 2011/16/EU”, que França esgotou as fontes de informação habituais passiveis de serem usadas nestas circunstâncias para obter a informação solicitada, sem correr o risco de prejudicar o resultado da investigação – cf. documento com a ref. 5983396 nos autos. C) No pedido mencionado em A), é solicitado ao estado português informação bancária relativa a M… na sua relação com o Banco C…, por a mesma se encontrar em investigação quanto ao período temporal entre 01/01/2020 e 31/12/2023, designadamente:
– cf. documento com a ref. 5983396 nos autos. D) Em 12/02/2025, foi solicitada, pela Chefe de Divisão da Direção de Serviços de Relações Internacionais ao Diretor dos serviços, a derrogação do sigilo bancário relativamente a M…, de cujo teor se extrai o seguinte: “Foram recebidos dois pedidos de informações sobre contas financeiras detidas pela Sra. M… em Portugal, no Banco B…, SA (proc 2025000094) e no Banco C…, SA (proc 2025000095) nos anos de 2020 a 2023. Foi enviada notificação à contribuinte a solicitar autorização de acesso à informação bancária, mas a carta veio devolvida.” – cf. documento com a ref. 59833997 nos autos. E) Em 20/02/2025, o Diretor de Serviços da Direção de Serviços de Relações Internacionais, propôs que fosse concedido o acesso aos elementos bancários de M… em concordância com informação dos serviços, de cujo teor se extrai o seguinte: “1. Em 04/12/2024, ao abrigo da Diretiva do Conselho 2011/16/EU, de 15/02, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, as Autoridades Fiscais Francesas efetuaram um pedido de troca de informação à AT, com referência à contribuinte M…, com o NIF 1…, nascida em 09/05/1951 em Portugal, e falecida em 07/03/2024, com último domicílio fiscal conhecido em em 4 rue M…, FRANÇA. 2. A informação solicitada encontra-se abrangida pelo sigilo bancário. (…) «As autoridades fiscais francesas estão a proceder ao controlo da situação fiscal da Sra. A…. Esta contribuinte é residente fiscal em França. De acordo com as informações obtidas pelas autoridades fiscais francesas na sequência de um anterior pedido de assistência administrativa internacional (referência: ID/SAD/2024/650/233885/1), a Sra. A…é titular de uma ou mais contas bancárias no 0033 BANCO C…. Na qualidade de residente fiscal em França, a Sra. A…é obrigada a declarar todas as contas financeiras abertas ou utilizadas no estrangeiro, bem como aquelas sobre as quais detém uma procuração. Além disso, deve declarar todos os rendimentos recebidos em França e no estrangeiro, bem como todos os bens detidos direta ou indiretamente, independentemente das entidades envolvidas, incluindo os detidos no estrangeiro. Além disso, no âmbito do controlo da sua situação fiscal, os contribuintes devem apresentar os extratos das contas financeiras utilizadas por eles próprios ou pelos membros do seu agregado familiar fiscal durante o período de controlo. (…) Por carta de 5 de dezembro de 2023, a administração fiscal interrogou a Sra A… para esclarecer a sua situação no que respeita à detenção destas contas financeiras no estrangeiro. Apesar do pedido por escrito, a Senhora A… não deu qualquer resposta ao serviço e, portanto, não forneceu os documentos comprovativos (ausência de apresentação dos extratos de conta). Note-se que a senhora A… tem o nome de nascimento D…, mas ela aparece como F… em alguns documentos. Também o seu nome é às vezes E… e M…em outras ocasiões.» DA LEGITIMIDADE DAS AUTORIDADES FISCAIS FRANCESAS PARA O PEDIDO 4. Em conformidade com o pedido efetuado, as Autoridades Fiscais Francesas encontram-se a investigar a situação fiscal da contribuinte M…, falecida em 07/03/2024, no que respeita aos anos de 01/01/2020 a 31/12/2023. 5. Para tanto, consideram aquelas entidades que a mencionada contribuinte foi residente fiscal naquele país, e que não declarou a existência de uma conta bancária detida em Portugal às Autoridades Fiscais Francesas; 6. Perante o conhecimento da uma conta bancária em Portugal (em concreto no BANCO C…SA), vêm as Autoridades Fiscais francesas solicitar informação financeira para, através da análise aos fluxos financeiros em Portugal, aferir da existência de rendimentos suscetíveis de tributação em França; 7. Sendo que aquelas autoridades reconhecem que esgotaram as fontes habituais de informação a que teriam podido recorrer segundo as circunstâncias para obter as informações solicitadas sem correr o risco de prejudicar a consecução dos seus objetivos, condição prévia para o pedido, conforme estabelece o n.º 1 do art.º 13.º do Decreto-Lei n.º 61/2013 de 10/05, que transpôs a Diretiva 2011/16/EU para a ordem jurídica nacional. 8. Pelo que se reconhece legitimidade à Administração Fiscal Francesa para aceder à informação financeira solicitada, com o objetivo de poder verificar a verdadeira situação tributária do sujeito passivo. ANÁLISE DO PEDIDO 9. Face ao exposto, há que aferir se estão, ou não, reunidos os pressupostos para que possa ser autorizado o levantamento do sigilo bancário. 10. Desde logo, nos termos do n.º 4 do art.º 8.º da Constituição da República Portuguesa, “As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respetivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático”. 11. A possibilidade de troca de informações entre Estados-Membros da União Europeia, encontra o seu enquadramento legal nos termos da Diretiva 2011/16/EU, de 15/02, a qual encontra-se transposta na ordem jurídica nacional através do Decreto-lei nº 61/2013 de 10/05. 12. Sendo que o n.º 2 do art.º 13.º do Decreto-Lei n.º 61/2013 de 10/05 não impõe ao Estado-Membro requerido a obrigação de efetuar diligências ou a proceder a recolha de informações, quando tais diligências ou recolha de informações infrinja a sua legislação nacional. 13. Ou seja, é necessário que a legislação interna permita a derrogação do sigilo bancário aqui solicitado. 14. Ora, nos termos dos nºs 1 e 4 do art.º 76.º da LGT, fazem fé as informações prestadas ou os documentos oriundos das administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado, sem prejuízo da prova em contrário do sujeito passivo ou interessado. 15. E, nos termos do n.º 1 do art. 63.º B da LGT, é permitido à administração tributária aceder a todas as informações ou documentos bancários, bem como a informações ou documentos de outras entidades financeiras previstas como tal no art. 3.º da Lei n.º 83/2017 (pese embora o n.º 1 do art. 63.º da LGT faça referência à Lei n.º 25/2008, de 5 de Junho, bem como às suas alterações, o aludido diploma encontra-se revogado, devendo, todas as remissões efetuadas para este diploma serem consideradas feitas para a Lei n.º 83/2017 de 18 de agosto, em conformidade com o seu art. 189.º), sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos; 16. Quando, nos termos da al. h) do mesmo normativo, se tratem de informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado português esteja vinculado. 17. Note-se que, não obstante os limites à prestação de informações estabelecidos nos n.ºs 2, 3 e 4 do art.º 13.º do Decreto-lei n.º 61/2013 de 10/05, tal não pode, em caso algum, ser entendido como autorizando a autoridade requerida de um Estado-Membro a escusar-se a prestar informações apenas pelo facto de essas informações estarem na posse de uma instituição bancária, de outra instituição financeira, de uma pessoa designada ou atuando na qualidade de agente ou de fiduciário ou pelo facto de estarem relacionadas com uma participação no capital de uma pessoa, conforme estatui o n.º 6 do art.º 14º do referido Diploma legal. 18. In casu, não se verificam quaisquer circunstâncias que limitem o pedido das Autoridades Fiscais Francesas, nos termos referidos. 19. Assim, face do que acima se referiu (pontos 4 a 8 da presente informação), o presente pedido deve ser admitido pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), por se enquadrar no conceito de troca de informações previsivelmente relevantes para a administração, nos termos do n.º 2 do art.º 1º do Decreto-lei n.º 61/2013 de 10/05, que transpôs a Diretiva 2011/16/EU para a ordem nacional, bem como por se encontrar previsto na al. h) do art.º 63.º-B da LGT. 20. Sem prejuízo do que se disse, acresce que, no caso em concreto, os factos que fundamentam o pedido formulado pelas Autoridades Fiscais Francesas, também permitiriam idêntico procedimento de derrogação do sigilo bancário à luz do direito interno português, por se verificarem indícios de falta de veracidade do declarado, conforme o disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 63.º-B da LGT. PROPOSTA DE DECISÃO 21. Concluindo, nos termos e com os fundamentos expostos na presente informação, deve ser autorizada a derrogação do sigilo bancário, nos termos do n.º 4 do art.º 63.º-B da LGT, de modo a permitir o acesso à informação bancária solicitada: Relativamente à(s) conta(s) bancária(s), do BANCO C… SA, titulada por M…, com o NIF 1…, e quaisquer outras contas que esta detenha, direta ou indiretamente, nesta instituição financeira, independentemente de quaisquer estruturas intermediárias, ou em relação às quais tenham um interesse efetivo, bem como aquelas em relação às quais tenham uma procuração, para o período compreendido entre 01/01/2020 e 31/12/2023: - Identificação do(s) titular(es) das contas. - Identificação da(s) pessoa(s) autorizada(s) a movimentar as contas. - Identificação da(s) pessoa(s) que procedeu(ram) à abertura das contas. - Balanço de abertura e fecho da conta para o período relevante - Montante dos juros e/ou impostos pagos através das contas. - Datas de abertura da conta e cartões de assinatura - Extractos para o período de 01/01/2020 a 31/12/2023 - Se a conta estiver encerrada, indicar a data em que os activos foram transferidos, bem como o banco, a conta de destino e o território em causa. - Facultar cópias de todos os documentos mencionados neste pedido. 22. Após autorização da derrogação do sigilo bancário, deverá o presente processo ser remetido à DSRI para que a mesma diligencie no sentido de obter a referida informação, sem prejuízo de, em simultâneo, se notificar o cabeça de casal da herança do Sr. M… (falecida em 07/03/2024), dando-lhe conhecimento do levantamento do sigilo bancário para efeitos de eventual recurso, nos termos do nº 4 do artº 63º-B da LGT.” - cf. documento com a ref. 5983398 nos autos. F) Em 08/03/2025, foi proferida decisão pela Diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, ora recorrida, de cujo teor se extrai o seguinte: “1. Nos termos e com os fundamentos constantes da Informação da Direção de Serviços de Relações Internacionais, prestada no âmbito do processo n.º 662020256622001764, bem como com os pareceres e despacho nela exarados, por se enquadrar no conceito de troca de informações previsivelmente relevantes para a administração, nos termos do n.º 2 do art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 61/2013 de 10 de maio, que transpôs a Diretiva 2011/16/EU de 15 de Fevereiro para a ordem nacional, e de se verificar o condicionalismo da h) do n.º 1 do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária; 2. Os factos que fundamentam o pedido permitem idêntico procedimento de derrogação do sigilo bancário à luz do direito interno português, conforme o disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária; 3. Assim, ao abrigo da competência que me é atribuída pelo n.º 4 do mesmo preceito legal autorizo que funcionários daquela Direção de Serviços, devidamente identificados, possam aceder a todas as contas bancárias sobre o Banco C…, de que é titular o sujeito passivo M…, com o NIF 1…, com referência ao período compreendido entre 01/01/2020 e 31/12/2023. 4. Devolva-se o processo à Direção de Serviços de Relações Internacionais para efeitos de prosseguir o procedimento de acesso à informação financeira antes mencionada.” - cf. documento com a ref. 5983399 nos autos. G) Pelo ofício n.º 2025-0078 de 12/03/2025, foi remetido o despacho mencionado na alínea que antecede ao “M…, S.A.” e solicitada informação financeira de M…– cf. documento com a ref. 5983400 nos autos. H) Pelo ofício n.º 805 de 14/03/2025, remetido ao aqui Recorrente na qualidade de cabeça de casal da herança de M…, por correio registado com aviso de receção, a Direção de Serviços de Relações Internacionais, deu a conhecer o despacho mencionado em F), juntando cópia do mesmo - cf. documento com a ref. 5983401. I) O ofício mencionado na alínea que antecede foi devolvido ao remetente, por o objeto não ter sido reclamado pelo destinatário – cf. documento com a ref. 5983403 nos autos. J) Pelo ofício n.º 1120 de 09/04/2025, remetido ao aqui Recorrente na qualidade de cabeça de casal da herança de M…, por correio registado com aviso de receção, a Direção de Serviços de Relações Internacionais, envia 2.ª notificação dando a conhecer o despacho mencionado em F), juntando cópia do mesmo - cf. documento com a ref. 5983404. K) Em 09/04/2025, o ofício mencionado na alínea que antecede foi entregue ao Recorrente – cf. documento com a ref. 5983405 nos autos. L) Em 07/03/2024, faleceu M… tendo sido nomeado como cabeça de casal da sua herança o ora Recorrente – facto não controvertido.» * A título de factualidade não provada exarou-se na decisão recorrida que: «Não existem outros factos alegados relevantes para a decisão, em face das possíveis soluções de direito, que importe referir como provados ou não provados». Em sede de fundamentação da matéria de facto consignou-se que: «A decisão da matéria de facto fundou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nos documentos juntos aos autos, conforme referido em cada alínea do probatório, bem como na posição expressa pelas partes, tendo sido considerados os factos relevantes para a decisão dentro das várias soluções plausíveis das questões de direito [nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e dos n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º do CPC, este último preceito aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT].» * III – 2. De Direito
Está em causa no presente recurso a sentença proferida pelo TAF de Leiria que manteve a decisão proferida pela Directora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, proferido em 08/03/2025, na sequência de um pedido de informação apresentado pela administração fiscal francesa (AFF), autorizando o acesso a informações e documentos bancários relativamente ao período compreendido entre 1 de Janeiro de 2020 e 31 de Dezembro de 2023, no entendimento de que se encontravam verificados os pressupostos que legitimam a derrogação do sigilo bancário, nos termos do disposto no artigo 63.º-B da LGT. Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, e de que ainda seja possível conhecer como referimos antes, é pelas conclusões com que o recorrente extrai das suas alegações, que se determina objecto do recurso e o âmbito de intervenção deste tribunal. Nas conclusões deve o recorrente indicar, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida, conforme resulta do disposto no artigo 639.°, n.° 1, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho. O recorrente não se conforma com o veredicto, sustentando a sua pretensão de ver revogada a sentença recorrida na insuficiência da matéria de facto e na alegação de que inexiste motivação do acto, bem como inexistem os pressupostos do acto impugnado. Começando pela impugnação da matéria de facto, mais concretamente pelo pedido de aditamento da matéria de facto provada. O recorrente alega que deveria ter sido julgado como provado o seguinte facto: M – A falecida residia em Portugal nos últimos anos, com o marido cabeça de casal, e há mais de dez anos, tinha morada fiscal à data da sua morte em Portugal. Sempre apresentou as suas declarações fiscais em Portugal, sempre foi doméstica em França, nunca aí tendo qualquer actividade económica. Para o efeito, sustenta a sua alegação na seguinte fundamentação: «Todas as considerações, quer das presentes alegações, quer da petição, quer do processo administrativo, impõe aditamento à matéria de facto provada, a seguinte: (…)». A recorrida entende que não assiste razão ao Recorrente e que a sentença sob recurso não enferma de qualquer erro de julgamento quanto aos factos ou quanto ao direito, acompanhando-a na íntegra. Alega que não está justificado com fundamento na prova produzida nos autos, a razão pela qual o recorrente entende que ocorre o invocado erro de julgamento nem qual a sua relevância sublinhando que a informação pretendida pela AFF não tem como pressuposto que M… exercesse uma atividade económica em França. Como bem se salienta na sentença recorrida, tal alegação não é relevante para a decisão a proferir sobre a legalidade do despacho em causa porquanto a visada no pedido foi considerada residente em França, estando em causa a omissão do cumprimento de obrigações declarativas, não constitui pressuposto do pedido de informação o desenvolvimento de uma actividade. Além disso, tais factos, a relevarem, devem ser dirigidos ao procedimento a correr termos junto da autoridade fiscal francesa por ser esta quem teve a iniciativa de solicitar a informação em causa e detém a competência para instruir e decidir o procedimento a que se destina a informação aqui em causa. Nos presentes autos cabe apenas apreciar se é ou não legal o acesso à informação bancária, o que passa por verificar se estão reunidos os pressupostos previstos nas normas aplicáveis e se existe algum impedimento no seu fornecimento. Ainda assim, sempre seria de rejeitar a conclusão 10ª, porquanto, por força do que dispõem os artigos 640.º e 662.º do CPC a alteração pelo Tribunal Central Administrativo da decisão da matéria de facto fixada em primeira instância pressupõe, não só a indicação dos concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, como também, os concretos meios de prova constantes do processo e/ou da gravação dos depoimentos das testemunhas, que imponham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, sob pena de rejeição nesta parte do recurso. Não basta alegar um facto na petição inicial e reiterá-lo em sede de recurso para se concluir pela imposição do aditamento pretendido. Para fundamentar a sua alegação o recorrente alude a «considerações» que resultam do processo administrativo sem indicar um único meio de prova que permita sustentar a necessidade do aditamento em causa, pelo que, baseando-se a argumentação numa asserção conclusiva, sem dar cumprimento ao referido regime legal, seria sempre de rejeitar o pretendido aditamento. Não obstante, compulsado o processo administrativo não se recolhe a prova dos factos alegados, impondo-se julgar improcedente a conclusão em causa. Nas demais conclusões o recorrente imputa à sentença recorrida erro de julgamento por considerar que não estão reunidos os pressupostos para que a AT possa aceder à informação bancária da de cujus. Está assim, em causa saber se o Tribunal recorrido efectuou incorrecta interpretação e aplicação ao caso das normas que dispõem sobre os pressupostos do levantamento do sigilo bancário. Vejamos qual o enquadramento legal aplicável. Resulta do artigo 27.º da Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação e Estabelecer Regras de Assistência Administrativa Recíproca em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 105/71, de 27/3: «1. Os Estados Contratantes obrigam-se, mediante reciprocidade, a trocar as informações úteis para assegurar o lançamento e cobrança regulares dos impostos abrangidos por esta Convenção, bem como a aplicação, no que respeita a esses impostos, das disposições legais relativas à repressão da fraude fiscal. Todas as informações deste modo trocadas serão consideradas secretas e só poderão ser comunicadas às pessoas ou autoridades encarregadas do lançamento ou da cobrança dos impostos abrangidos por esta Convenção. 2. O disposto no n.º 1 nunca poderá ser interpretado no sentido de impor a um dos Estados Contratantes a obrigação: a) De tomar medidas administrativas contrárias à sua legislação ou à sua prática administrativa ou às do outro Estado Contratante; b) De fornecer informações que não possam ser obtidas com base na sua legislação ou no âmbito da sua prática administrativa normal ou das do outro Estado Contratante; c) De transmitir informações reveladoras de segredos comerciais, industriais ou profissionais ou de processos comerciais ou informações cuja comunicação seria contrária à ordem pública.» Os Estados português e francês estão ainda vinculados pela Directiva n.º 2011/16/EU do Conselho, de 15 de Fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade e à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos e prémios de seguros. Na modalidade de troca de informações a pedido, que constitui o procedimento subjacente aos presentes autos, conforme resulta do disposto nos artigos 5.º a 7.º da referida Directiva, o procedimento é desencadeado com base num pedido apresentado pela autoridade requerente à autoridade requerida de outro Estado-Membro, no âmbito da cooperação entre si tendo em vista a troca de informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da legislação interna dos Estados-Membros respeitante aos impostos previstos no artigo 2.º. A autoridade requerida deve comunicar à autoridade requerente todas as informações que disponha ou que obtenha na sequência de inquéritos administrativos, entendendo-se como tal todos os controlos, verificações e acções empreendidos pelos Estados-Membros no desempenho das suas atribuições, com o objectivo de assegurar a correcta aplicação da legislação fiscal, conforme definição prevista no n.º 7 do artigo 3.º da Directiva. Tal como decorre da Convenção a que se fez alusão, também a Directiva estabelece limites ao cumprimento da obrigação de troca de informações entre os Estados Membros conforme resulta do disposto no artigo 17.º, n.ºs 1, 2 e 4 da Directiva devendo a autoridade do Estado Membro requerido informar os motivos que obstam a que o pedido seja satisfeito. Com efeito, na modalidade de troca de informações a pedido, as informações são comunicadas à autoridade requerente, na condição desta ter esgotado as fontes habituais de informação a que teria podido aceder segundo as circunstâncias, sem correr o risco de prejudicar a prossecução dos seus objectivos. Importa sublinhar que o Estado-Membro requerido não é obrigado a efectuar inquéritos administrativos ou a comunicar informações, se não for possível a reciprocidade em condições análogas e se tal infringir a sua legislação, no entanto, não pode, em caso algum, ser entendido como autorizando a autoridade requerida de um Estado-Membro a escusar-se a prestar informações apenas pelo facto de essas informações se encontrarem na posse de uma instituição bancária (cf. artigo 18.º, n.º 2). Releva ainda o disposto no artigo 6.º, n.º 3, no que se refere à obtenção das informações solicitadas e à condução do inquérito, a autoridade requerida procede como se agisse por iniciativa própria ou a pedido de outra autoridade do seu próprio Estado-Membro. O Decreto-Lei n.º 61/2013, procedeu à transposição para o ordenamento jurídico nacional da Directiva n.º 2011/16/UE, do Conselho, dispondo o n.º 2 do artigo 13.º que «[a] autoridade competente nacional não é obrigada a efectuar diligências administrativas ou a comunicar informações quando a realização dessas diligências ou a recolha das informações solicitadas para fins próprios, violar a legislação nacional.» Vejamos agora a legislação nacional sobre a questão que nos ocupa. Dispõe o artigo 63.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), sob a epígrafe «Inspecção», que «[o]s órgãos competentes podem, nos termos da lei, desenvolver todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes (…)», dispondo o n.º 3 que «[s]em prejuízo do número anterior, o acesso à informação protegida pelo sigilo bancário e pelo sigilo previsto no Regime Jurídico do Contrato de Seguro faz-se nos termos previstos nos artigos 63.º-A, 63.º-B e 63.º-C.» Como bem salienta o Tribunal recorrido, decorre do estatuído no artigo 63.º-B da LGT, na redacção conferida pela Lei n.º 82-B/2014, de 31/12, que em determinadas circunstâncias, a Autoridade Tributária tem o poder de aceder a todas a informações e documentos bancários, sem consentimento do respectivo titular, nomeadamente, no que releva para os presentes autos: - quando se verifiquem indícios da falta de veracidade do declarado ou esteja em falta declaração legalmente exigível [cf. n.º 1, alínea b)]; e/ou, - quando se trate de informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado português esteja vinculado [cf. n.º 1, alínea h)]. No caso que nos ocupa, o pedido de informações apresentado pela Autoridade Tributária Francesa tem o teor que foi transcrito na informação dos serviços propondo o deferimento do pedido e que integra o ponto E, n.º 1 da matéria de facto provada para a qual se remete. Não restam dúvidas de que está em causa o acesso a informação bancária abrangida pelo sigilo bancário. O recorrente alega que não se verificam os pressupostos necessários à prática do acto em causa nos autos. A alegação de que a falecida sempre foi uma mulher pacifica, insuscpetível de qualquer investigação criminosa, por jamais ter praticado qualquer crime em França, sempre ter declarado os seus impostos e apresentado as suas declarações em Portugal, ter sido apenas doméstica e companheira do cabeça de casal ora recorrente, não exercendo qualquer actividade económica em França (cf. conclusões 2 e 3), nada acrescenta em defesa da impossibilidade de acesso à informação bancária, uma vez que o pedido de acesso, como já o dissemos, funda-se no incumprimento das obrigações declarativas e não no desenvolvimento de uma actividade económica. Na conclusão 4, alega que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento por violação do n.º 13 do artigo 63.º-B da LGT, por inexistir «nos autos qualquer especificação ou concretização de qualquer verdadeira inspeção em França em relação à falecida» e na conclusão 7 alega que «inexiste justificação da prática do ato, ou motivação do conteúdo do ato, inexistindo as “premissas “justificativas da decisão». A recorrida contra-alega que perante a factualidade, a decisão decorre, citando a sentença recorrida de «uma situação enquadrável no elenco taxativo daquele n.º 1 estando a AT legitimada a levantar o sigilo, ao abrigo da alínea b), cumprindo assim com a lei nacional, e, posteriormente, em cumprimento do disposto na alínea h) do mesmo artigo 63.º-B, ao prestar tal informação às autoridades francesas». No que se refere ao invocado vício de preterição de audiência prévia, considera a recorrida que «a sentença sob recurso concluiu que não se encontra violado o previsto no n.º 5 e no n.º 13 do artigo 63.º-B da LGT» por não ser terceiro, antes estando a representar a herança. Quanto à fundamentação do acto, sustenta que a sentença recorrida não merece censura pois está fundamentada conforme se depreende da análise da petição do presente recurso. Vejamos. Dispõe o n.º 13 do mencionado artigo 63.º-B, que, nos casos abrangidos pela supra referida alínea h) (informações solicitadas ao Estado português por força de vinculação internacional em matéria fiscal) não há lugar a notificação dos interessados, nem a audição prévia do familiar ou terceiro quando o pedido de informações tenha carácter urgente ou essa audição ou notificação possa prejudicar as investigações em curso no Estado ou jurisdição requerente das informações e tal seja expressamente solicitado por este Estado ou jurisdição. Como se vê, a norma invocada pelo recorrente dispõe sobre a notificação da decisão e não sobre os seus pressupostos. A decisão autorizando a derrogação do sigilo bancário foi notificada ao recorrente, na qualidade de cabeça de casal, conforme resulta dos pontos H) a K) dos factos provados, nos termos em que se dispõe no artigo 63.º-B n.º 4, 2ª parte da LGT. Retomando a questão dos pressupostos do acto, o Tribunal julgou verificados os mesmos estavam verificados «nomeadamente, o pedido de informação das autoridades francesas e os seus moldes, o esgotamento de recursos alternativo à obtenção de informação, a investigação corrente sobre a falecida, a ausência de resposta da falecida à tentativa de as autoridades obterem uma declaração de informação bancária portuguesa.» Decorre ainda da sentença que «de acordo com a informação prestada pelas autoridades francesas, está em curso uma ação inspetiva em França sobre a situação tributária da falecida e que consideram aquelas entidades que a mencionada contribuinte foi residente fiscal naquele país, e que não declarou a existência de uma conta bancária detida em Portugal às Autoridades Fiscais Francesas”, pelo que, considerando que a informação prestada pela autoridade fiscal francesa “faz fé como informação oficial prestada por administração tributária estrangeira ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado”.» Conforme resulta do probatório, constituem fundamentos do pedido de acesso à informação bancária, o facto de, no período em causa, a visada ser considerada residente fiscal em França e aí decorrer uma acção de controlo da sua situação fiscal, por poder configurar-se uma situação de omissão das obrigações declarativas naquele território. Ora, tal factualidade subsume-se nas alíneas b) que permite o acesso a informação bancária quando «(…) esteja em falta declaração legalmente exigível;» e h), pois estão em causa informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado português está vinculado, ambas do n.º 1 do artigo 63.º-B da LGT. Dispõe o n.º 4 do artigo 63.º-B da LGT que as decisões da administração tributária devem ser fundamentadas com expressa menção dos motivos concretos que as justificam. O pedido de troca de informação que foi dirigido à AT diz respeito à contribuinte M…, com o NIF 1…, com último domicílio fiscal conhecido em «4 rue M…, FRANÇA» informando a autoridade fiscal francesa que está a proceder ao controlo da situação fiscal da referida contribuinte, que consideram ser residente fiscal em França. De acordo com as informações obtidas pelas autoridades fiscais francesas na sequência de um anterior pedido de assistência administrativa internacional (referência: ID/SAD/2024/650/233885/1), a Sra. A… é titular de uma ou mais contas bancárias no BANCO C…. Mais refere aquela entidade que, «na qualidade de residente fiscal em França, a aludida contribuinte é obrigada a declarar todas as contas financeiras abertas ou utilizadas no estrangeiro, bem como aquelas sobre as quais detém uma procuração. Além disso, deve declarar todos os rendimentos recebidos em França e no estrangeiro, bem como todos os bens detidos direta ou indiretamente, independentemente das entidades envolvidas, incluindo os detidos no estrangeiro» e que «no âmbito do controlo da sua situação fiscal, os contribuintes devem apresentar os extratos das contas financeiras utilizadas por eles próprios ou pelos membros do seu agregado familiar fiscal durante o período de controlo.» Do exposto resulta claramente a fundamentação do pedido de informação, com a expressa menção dos motivos concretos que a determinaram (cf. artigo 63.º-B, n.º 4 da LGT) estando assim patente a motivação do pedido mostrando-se os factos invocados subsumíveis às aludidas alíneas b) e h) do n.º 1 do artigo 63.º-B da LGT e fundamentada a decisão, sendo certo que, como se sabe, a inteligência artificial não é fonte de direito. Pela autoridade fiscal francesa foi ainda prestada a informação de que através de carta de 5/12/2023 foram solicitados esclarecimentos sobre a sua situação, no que respeita à detenção das referidas contas bancárias no estrangeiro, sem que tenha sido dada qualquer resposta, pelo que, não foi prestada a informação nem foram fornecidos os documentos comprovativos solicitados. Sabe-se que a visada faleceu em 07/03/2024, data posterior ao pedido de esclarecimentos. Resulta assim, também patente que o pedido de informação apresentado pela administração fiscal francesa decorre de acção de controlo da situação fiscal e que os esclarecimentos solicitados à contribuinte visada não obtiveram resposta. Dito de outro modo, foram esgotados os meios de que a administração fiscal francesa dispunha para obter as informações necessárias ao apuramento da situação tributária no âmbito de procedimento de controle que decorre em França, conforme impõe o artigo 17.º, n.ºs 1, 2 e 4 da Directiva, na sequência do qual foi desencadeado o instrumento de troca de informações, o que significa que o pedido decorre no âmbito de um procedimento de controlo. Conforme resulta das normas supra elencadas, os instrumentos legais aplicáveis, não constituem como pressuposto da prestação da informação solicitada pela ATF, ao abrigo de instrumentos jurídicos a que o Estado Português se obrigou, que a autoridade requerente tenha desencadeado uma acção de inspecção, embora tal pressuposto possa subsumir-se ao disposto no artigo 17.º, n.º 2 da Directiva. No entanto, ainda assim, sempre se dirá que também quanto a esta questão improcede o alegado pelo recorrente, na medida em que a acção de controlo da situação fiscal de um contribuinte a que alude, a decorrer pela entidade requerente, no âmbito da qual decorre o pedido em causa nestes autos, cabe no conceito de acção inspectiva de comprovação e verificação visando a confirmação do cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos na classificação prevista no artigo 12.º, n.º 1 a) do RCPITA, pelo que, improcedem as conclusões apreciadas. No que se refere às conclusões 3ª e 5ª, no que releva quanto à contribuinte visada, constituem factos a provar junto da administração fiscal, no âmbito do procedimento ali em curso não sendo relevantes como pressuposto e fundamento para indeferir o pedido de prestação de informação. Na conclusão 6ª alega o recorrente que «O acórdão do Proc. nº 268/20.6BEFVN referido nos autos, trata apenas de uma questão referente a um contribuinte residente em Portugal, e não a um contribuinte residente em França.» Socorrendo-nos do teor da sentença, constatamos que a citação do referido Acórdão do STA, que segue o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário (S.C.T.) do STA de 14/5/2015, proferido no processo n.º 0262/15 foi efectuada a propósito da invocação pelo recorrente de não ter ocorrido «a audiência prévia dos familiares, não existindo qualquer fundamento da urgência como impõem os n.ºs 5 e 13 do artigo 63.º da LGT.» (leia-se artigo 63.º-B). A sentença acolheu a fundamentação do aludido Acórdão concluindo que «o Recorrente aqui e no procedimento não tem a qualidade de terceiro, antes está a representar a herança como cabeça de casal, quanto muito ouvido a título de interessado, aplicando-se, no entanto, a jurisprudência supracitada.» Conforme decorre da redacção actual das normas que o recorrente considera terem sido violadas, a audição prévia do contribuinte manteve-se apenas para as situações em que o acesso a informações e documentos bancários se reporta a contas de que são titulares familiares daquele e/ou de terceiros que com ele estejam numa relação especial, conforme resulta do disposto no n.º 13 do artigo 63.º-B da LGT. Ora, no caso sub judice o recorrente apresenta-se na qualidade de cabeça de casal, qualidade em que, nos termos declarados na sentença recorrida para os quais se remete, representa os herdeiros e intervém no processo como se fosse a de cujus, pelo que, não ocupa a posição de familiar ou de terceiros. Por outro lado, a questão tratada no Acórdão e que foi acolhida na sentença recorrida, é a da necessidade de audição prévia cuja solução não depende de estar em causa um residente em França ou não, mas sim de a informação bancária que se pretende aceder ser da sua própria titularidade ou antes de familiares ou terceiros. No entanto, da leitura do Acórdão citado o que se retira é que o contribuinte a que se reporta o pedido de informação foi considerado em incumprimento das suas obrigações declarativas em França, pelo que, a situação de facto dos autos, nesse particular, é semelhante. Donde se conclui pela improcedência da alegação de recurso. Cabe ainda destacar que a propósito de situação idêntica, o STA decidiu no sentido propugnado, conforme se extrai do Acórdão de 13/12/2023 proferido no processo n.º 0147/23.5BEMDL: «I - A alínea b), do artigo 27.º da “Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação e Estabelecer Regras de Assistência Administrativa Recíproca em Matéria de Impostos sobre o Rendimento”, assinada em Paris em 14 de Janeiro de 1971, aprovada para ratificação pelo Decreto-Lei nº 105/71, de 26 de Março, e Aviso de 13 de Novembro de 1972 (Torna público terem sido trocados os instrumentos de ratificação da Convenção), estabelece que ”O disposto no n.º 1 [troca de informações para assegurar o lançamento e cobrança regulares dos impostos abrangidos pela Convenção e repressão da fraude fiscal] nunca poderá ser interpretado no sentido de impor a um dos Estados Contratantes a obrigação: b) De fornecer informações que não possam ser obtidas com base na sua legislação ou no âmbito da sua prática administrativa normal ou das do outro Estado Contratante e h), “informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal”. II – Nessa conformidade, estando em causa nos autos três decisões de levantamento do sigilo bancário da Senhora Directora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira em conformidade com três pedidos da administração fiscal francesa respeitando exclusivamente à “existência de contas em Portugal” do ora recorrido, em instituições de crédito de direito português e com sede em Portugal, é manifesto que as referidas decisões são, na letra e no sentido, enquadráveis na alínea b), do n.º 1, do artigo 63.º-B (Acesso a informações e documentos bancários), da LGT, que dispõem quanto aos residentes: “A administração tributária tem o poder de aceder a todas as informações ou documentos bancários, bem como a informações ou documentos de outras entidades financeiras previstas como tal no artigo 3.º da Lei n.º 25/2008, de 5 de junho, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 317/2009, de 30 de outubro, e 242/2012, de 7 de novembro, sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos: b) Quando se verifiquem indícios da falta de veracidade do declarado ou esteja em falta declaração legalmente exigível” e, ainda, h), “informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal”. III – Destarte, a ATA não está a solicitar informações que não possam ser obtidas com base na sua legislação, sendo legítimo o acesso às contas em apreço.» Na conclusão 8ª alega o recorrente que a decisão ofende manifestamente o disposto no artigo 26.º n.º 1 da C.R.P, ofendendo manifestamente o princípio da ponderação e proporcionalidade, que devem presidir nas decisões administrativas e tributárias. Contra-alega a recorrida que «o Recorrente se limitou a afirmar as referidas desconformidades sem apresentar, no entanto, as concretas razões de facto assim como as razões de direito em que assenta o seu discurso jurídico.» Começando pelo último princípio. Como se viu, a administração fiscal francesa tem informação de que a de cujus é titular de contas bancárias no Banco C… e considera-a residente fiscais em França, no período em causa estando a ser objeto de uma investigação à sua situação fiscal, poderão estar a omitir rendimentos tributáveis em França que não foram declarados naquele território. Com efeito, perante o conhecimento da existência de contas em Portugal relativamente às quais não foram prestados os esclarecimentos solicitados pela entidade fiscal francesa coloca-se a hipótese de que não tenha sido dado cumprimento às obrigações declarativas em França. Dirigiu à visada correspondência solicitando esclarecimentos sem que obtivesse resposta, esgotando assim os meios de que dispunha para obter esclarecimentos, pelo que, o recurso ao mecanismo de troca de informações a pedido, bem como a decisão de satisfazer tal pedido se mostra ponderada e proporcional, visando alcançar a verdade material quanto ao cumprimento das obrigações declarativas, que assim o exige. Tanto mais, que os dados assim recolhidos não deixam de ser os estritamente necessários para a sua utilização nos procedimentos instaurados para o efeito, impondo-se assim, julgar improcedente a alegação em causa. Alega o recorrente que o Tribunal recorrido violou o direito à reserva da intimidade da vida privada ao permitir o acesso a informação bancária da de cujus. Da alegação de recurso não se mostra evidenciado em que substancia o recorrente o erro de julgamento. Contra-alega a recorrida que, também quanto a esta questão «o Recorrente se limitou a afirmar as referidas desconformidades sem apresentar, no entanto, as concretas razões de facto assim como as razões de direito em que assenta o seu discurso jurídico.» O Tribunal recorrido julgou improcedente a pretensão do recorrente no entendimento de que os «motivos subjacentes à decisão de derrogação do sigilo bancário são claros e mencionados, em conformidade com as normas da LGT, pelo que, o Recorrente relacionando tal vício com a eventual violação do direito à intimidade da vida privada, tal argumento não colhe, não se verificando tal violação nos termos alegados; ademais, o Recorrente não concretiza em que medida tal direito foi violado.» Importa ter presente que o sigilo bancário não é um direito absoluto. Conforme decorre do regime jurídico supra explanado, em certas circunstâncias, permite-se a derrogação do sigilo bancário, mesmo sem autorização dos titulares dessa informação. Trata-se de compatibilizar o direito à reserva da intimidade da vida privada, que comporta a informação bancária, com o exercício do poder/dever de fiscalizar o cumprimento das obrigações declarativos e de forma mais abrangente, do dever de pagar impostos. Tal compatibilização tem subjacente evitar, em última análise, a fraude e a evasão fiscal, mas também a igualdade no contributo para a satisfação das necessidades colectivas de acordo com a capacidade contributiva revelada por cada um. Sendo de destacar que os funcionários envolvidos nos respectivos procedimentos estão abrangidos pelo dever de confidencialidade que decorre do sigilo fiscal previsto no artigo 64.º da LGT e, não envolvendo a prestação a informação solicitada a sua divulgação ampla, destinando-se a mesma aos fins prosseguidos pelas entidades envolvidas que constitui, em última análise, a cobrança dos impostos que se mostrem devidos. Sublinha-se que as informações e documentos em causa não deixam de estar cobertos pelo dever de confidencialidade e pela sua utilização adstrita exclusivamente ao âmbito do procedimento instaurado para o efeito, impondo-se assim, julgar improcedente a alegação em causa. Neste sentido v.g. para mais desenvolvimento o Acórdão do STA de 30/01/2014 processo n.º 07264/13, no qual se declarou que «Não sendo um direito absoluto, e podendo ceder perante a necessidade de salvaguardar o interesse público da cooperação com a justiça e outros interesses constitucionalmente protegidos, é de aceitar que as restrições ao segredo bancário apenas possam derivar de lei formal expressa e que a sua aplicação concreta possa ser objecto de um adequado controlo jurisdicional (cfr.ac.Tribunal Constitucional nº.278/95, publicado no Diário da República, II Série, de 28/7/1995; Noel Gomes, Segredo Bancário e Direito Fiscal, Almedina, 2006, pág.316 e seg.). Nestes termos, caminha-se claramente no sentido da flexibilização das situações em que o sigilo bancário pode ser afastado por via administrativa, por parte das autoridades fiscais, sempre que estejam em causa situações de suspeita de fraude ou evasão fiscal, lesivas do erário público, no limite pondo em causa a satisfação das necessidades colectivas, mas igualmente dos próprios interesses dos particulares não relapsos, devido a violação do princípio da igualdade e do dever fundamental de pagar impostos. O novo equilíbrio entre os valores mencionados assenta no reconhecimento de que a perspectiva mais garantística e restritiva do sigilo bancário pode dar cobertura a situações pouco transparentes, tanto para a A. Fiscal, a qual se vê privada de elementos essenciais para o apuramento do imposto, como para os próprios particulares, dado que o eventual benefício do instituto do segredo bancário pode gerar uma desigual repartição da carga tributária (cfr.Maria Eduarda Azevedo, O Segredo Bancário, Fisco, nº.33, Julho de 1991, pág.14; Noel Gomes, Segredo Bancário e Direito Fiscal, Almedina, 2006, pág.127 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc. 6172/12).» Tendo o regime de derrogação do sigilo bancário, constante do artigo 63.º-B, da LGT, em vista compatibilizar a protecção da privacidade do contribuinte com a promoção do combate à fraude e à evasão fiscais, ele decorre da necessidade de conjugar aqueles dois vectores, pelo que, não colide com o princípio invocado pelo recorrente, pois está balizado por limitações tendentes a proteger e a garantir ambos os valores de acordo com o princípio da proporcionalidade. Ora, tendo presente que o direito à reserva da intimidade privada não é absoluto e que a decisão se encontra fundamentada nas normas de direito interno aplicáveis, como supra se deixou dito e está em consonância com o regime previsto quer na Convenção, quer na Directiva a que se fez alusão, cumpre com os estritos ditames em que é possível o acesso à informação em causa e se mostra o estritamente necessário e nessa medida proporcional, importa concluir que não colhe a tese do recorrente. Por fim, alega o recorrente que «O acesso da AT à informação bancária não é irrestrito (art.°63.°, n.°3, da LGT) sendo que o legislador estabeleceu no n. ° 1 do art.° 63.°-B, da LGT as condições concretas em que tal acesso se pode verificar por acto administrativo, condições essas que têm de ser evidenciadas em procedimento inspectivo iniciado na pessoa que apresente algum elemento de conexão ao sistema fiscal português (art.°18.°, n.°3, da LGT). A questão foi já aflorada, no sentido em que a Directiva prevê a existência de um processo de inquérito administrativo destinado a avaliar se estão reunidos os requisitos necessários a determinar o acesso à informação bancária e se existem impedimentos a tal acesso e essa avaliação e ponderação foi efectuada pela AT, estando a decorrer acção de controle na autoridade requerente, pelo que, também quanto a esta questão soçobra a alegação do recorrente, mostrando-se assim o recurso totalmente improcedente. * IV – CONCLUSÕES I – A falta de cumprimento de obrigações declarativas legalmente exigíveis no Estado requerente constitui fundamento de acesso a informações ou documentos bancários sem dependência do consentimento do titular nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado português está vinculado; II – No procedimento de autorização de acesso a informação bancária vigente, a audição prévia do contribuinte manteve-se apenas para as situações em que o acesso a informações e documentos bancários se reporta a contas de que são titulares familiares daquele e/ou de terceiros que com ele estejam numa relação especial; III – O regime de derrogação do sigilo bancário tem em vista compatibilizar a protecção da privacidade do contribuinte com a promoção do combate à fraude e à evasão fiscais, pelo que, tal regime não colide com o princípio da reserva da intimidade da vida privada, pois está balizado por limitações tendentes a proteger e a garantir ambos os valores de acordo com o princípio da proporcionalidade.
V – DECISÃO Termos em que, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida. Custas pelo recorrente. Lisboa, 18 de Setembro de 2025. Ana Cristina Carvalho - Relatora Isabel Silva – 1.ª Adjunta (em substituição) Patrícia Manuel Pires – 2.ª Adjunta |