Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1101/24.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/18/2025
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:CITAÇÃO
AVISO DE RECEÇÃO ASSINADO POR TERCEIRO
PRESCRIÇÃO
Sumário:I - A obrigação do pagamento das contribuições e das quotizações, devidos à segurança social, prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
II - A citação, enquanto causa interruptiva do instituto da prescrição, transversal a todo o tipo de dívidas (civis, tributárias – art. 49.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) - e equiparadas…), detém e opera com um duplo efeito; instantâneo (interrompe, no sentido de que faz parar a contagem e inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente) e, por outro lado, duradouro (não deixa começar a correr novo prazo de prescrição até ao termo do processo, v.g., em que decorra a cobrança coerciva da dívida) - cfr. Acórdão do STA de 16/02/2022 – proc. 01208/21.0BEBRG.
III - A citação pessoal rege-se pelo disposto no artigo 192.º do CPPT, que, por sua vez, remete para os termos do Código de Processo Civil (CPC), no qual se estipula que a citação pessoal se faz, em regra, por carta registada com aviso de receção.
De acordo com o nº 1 do artigo 230º do CPC, a citação postal considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Tributária de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO


P…, notificado da sentença proferida em 2025.04.21 pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a reclamação de atos de órgão de execução fiscal contra a decisão proferida pela Coordenadora da Seção de Processo Executivo de Lisboa III, que no âmbitos dos processos de execução fiscal nº 1102201100225606, 1102201100225614 e 1102201021036114 indeferiu o pedido de declaração de prescrição das dívidas exequendas, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul.

Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formulou as seguintes conclusões:

A) «Por despacho de 23/07/2024 e notificação eletrónica de 25/07/2024, a Recorrida foi notificada para responder no prazo de 8 dias, nos termos e para os efeitos do disposto no n° 2 do artigo 278°, do Código de Procedimento e Processo Tributário;

B) Regularmente citada, não apresentou contestação/resposta (não constituiu mandatário e não interveio de qualquer forma no processo), tendo apenas prestado informação inicial aos autos, pelo que se consideraram confessados todos os factos articulados na petição inicial (art.° 567°, n° 1 do CPC);

C) Referiu a Recorrida que relativamente aos PEFs n° 1102201100225606, 1102201100225614 e 1102201201036114, instaurados contra o executado, por dividas ao sistema de Segurança Social, tiveram por base as certidões de dívida 20383/2011; 20384/2011 e 98134/2012 e que as citações pessoais foram efetuadas na morada do executado em 19/03/2011 no valor de 14.692,32 € e em 21/11/2012 no valor de 2.338,17 € e remete para os doc. n°s 1 e 5, tendo alegado também que as mesmas foram confirmadas pelo executado em 25/03/2011 e 28/11/2012;

D) Os documentos n° 1 e 5 apenas provam a sua emissão e não o seu envio, nem a sua receção pelo destinatário. A Recorrida não produziu qualquer prova quanto ao envio e à receção de tais cartas/citações pelo Recorrente ou por terceiro;

E) O documento n° 4 não se mostra assinado pelo Recorrente nem lhe foi entregue o objeto a que alegadamente se refere o aviso de receção, facto que foi confirmado pela testemunha ouvida em sede de audiência de discussão e julgamento e dado como não provado na sentença recorrida, ou seja, que o recorrente não foi citado para o PEF 1102201100225606 e apensos porque a Recorrida não fez prova de que enviou ao Recorrente a informação de que o oficio de "Citação" foi entregue em terceira pessoa, violando o disposto no art.° 233° CPC, o que configura nulidade, pelo que se verifica a falta de citação e ou a nulidade da citação, cfr. art.° 191° e seg. do CPC, o que se invoca e pretende ver declarada para os devidos e legais efeitos, sendo também de declarar a prescrição invocada;

F) A Recorrida confessou nos autos que não deu cumprimento ao disposto no artigo 241° do CPC de 1961 (atual artigo 233°), nem juntou qualquer documento que atestasse o cumprimento do ali referido, pelo que, se verifica a exceção supra;

G) Assim como não deu cumprimento à citação para os PEFs referidos nos factos assentes sob as al.s: A; B; C); D); J). A emissão de certidão e a autuação de processos não garante ao Recorrente nem a ninguém a citação para tais processos, o conhecimento os mesmos e a possibilidade daquele se defender deles.

H) O documento n° 7 parece ter a assinatura do Recorrente, mas este aviso de receção não se refere à notificação do PEF 1102201201036114, junta sob doc. n° 5 mas ao PEF n° 1102201100225606 e apensos, os quais foram objeto de resposta atempada e a prescrição invocada;

I) O documento n° 7 datado de 28/11/2012, diz respeito ao PEF n° 1102201100225606 e apensos, e foi objeto de resposta e alegada prescrição invocada (cfr. n° 2, 3, 6 e 7 juntos à reclamação);

J) O Recorrente não celebrou qualquer acordo de pagamento com a recorrida nem tão pouco se recorda de a sua conta bancária ter sido penhorada, nem foi junto aos autos qualquer tipo de documento desse género — assinado pelo Reclamante;

K) Pelo que, deverá ser dado como não provados os factos vertidos nas al.s II) e I) da sentença recorrida, porque dos autos não resulta a existência de qualquer pedido efetuado pelo Recorrente, não existe nos autos qualquer formulário ou escrito assinado pelo Recorrido a pedir o pagamento em prestações, nem tão pouco a entrega do deferimento desse plano ao Recorrente;

L) A testemunha indicada e ouvida em tribunal negou ter recebido a carta a que se refere o aviso de receção junto sob n° 4, tendo afirmado com toda a certeza de que a assinatura ali aposto não é da sua autoria e que os dados do seu cartão de cidadão estão incompletos, tendo afirmado ainda que não entregou qualquer carta ao Recorrente que tivesse sido emitida pela Reclamada;

M) Estão em causa nestes autos alegadas dívidas à Segurança Social, por contribuições de trabalhador independente, nos seguintes PEF: 1102201100225606 — período de 2007/09 a 2010/11; 1102201100225614 — período de 2006/09 a 2006/11 e 2007/01 a 2007/08; e 1102201021036114 — período de 2010/12 a 2011/10;

N) Tais dívidas deveriam ter sido pagas até ao dia 15 ou até ao dia 20 do mês seguinte àquele a que dizem respeito, conforme disposto nos artigos 10°, n° 2, do Decreto-Lei n° 199/99, de 8 de junho e 43° da Lei n° 109/2009, de 16 de setembro, que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (aplicável após 11.01.2011);

O) Por notificação datada de 04/05/2016 e enviada em Outubro de 2017 o Recorrente foi informado de que se encontravam valores em divida ao IGFSS, IP relativos ao PEF 1102201100225606 e apensos - referentes a contribuições que remontam aos anos e meses de Julho de 2004 a Novembro de 2012;

P) O Recorrente respondeu por meio de fax (enviado a 12/10/2017) e carta registada com A/R enviada a 16/10/2017, tendo requerido a revogação da notificação dos valores em divida do executado e a declaração de prescrição dos mesmos;

Q) A ausência de resposta durante o período de 90 dias configura o deferimento da pretensão do Reclamante, o que se invoca;

R) Em face da ausência de qualquer resposta e volvidos mais de 12 anos após as alegadas dívidas (contada da mais recente) e volvidos mais de 20 anos (da alegada divida mais antiga) e volvidos 7 anos após o primeiro requerimento enviado pelo aqui Reclamante, o IGFSS, IP., veio novamente em abril de 2024 notificar o Recorrente para pagamento dos valores em divida por email de 12/04/2024;

S) Em face desta última notificação — via email, o Recorrente no dia 22/04/2024, veio novamente alegar a prescrição dos tributos por considerar que os mesmos já não eram nem são exigíveis por há muito se encontrarem prescritos;

T) Os valores em dívida referem-se a contribuições referentes a julho de 2004 a novembro de 2012 e o prazo de prescrição dos tributos (fixado em 5 anos) já ocorreu há vários anos, em 2010 quanto às dívidas mais antigas e as restantes dos anos subsequentes, sendo que a divida mais antiga correspondendo a contribuições de 2012 que já prescreveram pelo menos no ano 2018;

U) Por carta datada de 26/06/2024 (recebida a 28/06/2024) o Recorrente, na pessoa do seu mandatário, foi notificado pela Recorrida de que havia declarado a prescrição dos tributos referentes aos PEF's 1102201300898678 e 1102201400435937 referentes a contribuições dos períodos de 11/2011 a 10/2012 e 11/2012, mas não declarou prescrita a divida por contribuições referentes ao PEF 1102201100225606, 1102201100225614 e 1102201021036114 por considerar interrompida a prescrição por ter ocorrido a citação postal do Recorrente no período da prescrição;

V) A decisão recorrida está errada, porque o Recorrente considera que a divida por contribuições referentes ao PEF 1102201100225606, 1102201100225614 e 102201021036114 se encontra prescrita, nos termos e com os fundamentos supra, sendo falso que o Recorrente tenha sido citado para o PEF 1102201100225606 em 25/03/2011, PEF 1102201100225614 em 25/03/2011 e PEF 1102201021036114 em 20/11/2012;

W) O Recorrente em dezembro de 2012 e não em 25/03/2011 recebeu uma citação para o processo executivo n° 1102201100225606, referentes a contribuições que remontam a fevereiro de 2006 a novembro de 2010 e após a receção da citação, no dia 28/12/2012 o Recorrente apresentou resposta à mesma no qual alegou a prescrição das contribuições referentes aos meses de fevereiro de 2006 a dezembro de 2007 por já nessa data ter decorrido o prazo de 5 anos previsto na lei;

X) Os pedidos do Recorrente nunca mereceram qualquer resposta pelo IFGSS, IP Secção de Processo Executivo de Lisboa III;

Y) O Recorrente não recebeu qualquer citação para o PEF 1102201100225614 em 25/03/2011, nem para o PEF 1102201021036114 em 20/11/2012;

Z) Não obstante a citação efetuada para o processo executivo n° 1102201100225606 em Dezembro de 2012, aquando da citação efetuada mesmo que tais valores fossem devidos, os mesmos encontravam-se pelo menos parcialmente prescritos, prescrição que se invocou, aqui se volta a invocar e que se pretende ver declarada, designadamente nessa data (Dezembro de 2012) as contribuições referentes a Fevereiro de 2006 a Dezembro de 2007 já se encontram prescritas por já haver decorrido o prazo quinquenal de prescrição para as mesmas;

AA) As quantias reclamadas a título de contribuições e cotizações impõe-se o respeito e a observância da lei, no sentido de se considerar que o prazo prescricional começa a correr no dia imediato ao termo do prazo legalmente estabelecido para a entrega das prestações contributivas devidas, ou seja, no dia 21 do mês seguinte ao que disser respeito, atento o prescrito no art.° 43° do CRCSPSS;

BB) Aquando da citação para o PEF n° 1102201100225606 em dezembro de 2012, as contribuições referentes a fevereiro de 2006 a dezembro de 2007 já se encontravam prescritas por já haver decorrido o prazo quinquenal de prescrição para as mesmas, o que se invoca e pretende ver declarado e diga-se que, quanto às restantes, ou seja, de dezembro de 2007 a novembro de 2010 as mesmas encontram-se igualmente prescritas;

CC) Dos factos não provados deu-se como assente que o Recorrente não foi citado para o PEF n° 1102201100225606, logo tem de ser declarada a prescrição;

DD) Os valores referentes aos PEF 's 102201100225614 e 1102201021036114 dizem respeito a contribuições referentes a 09/2006 a 11/2006, 01/2007 a 08/2007 e 12/2010 a 10/2011 e tal como se pode verificar o prazo de prescrição dos tributos (fixado em 5 anos) já ocorreu há vários anos, em 2011 quanto às contribuições referentes aos períodos de 09/2006 a 11/2006, no ano 2012, referente às contribuições de 01/2007 a 08/2007 e em 2016 referente às contribuições de 12/2010 a 10/2011, não tendo existido qualquer suspensão ou interrupção da prescrição, pelo que, o valor em divida referente ao PEF 102201100225614 e 1102201021036114 relativas às cotizações e contribuições referentes a 09/2006 a 11/2006, 01/2007 a 08/2007 e 12/2010 a 10/2011 encontram-se prescritas, prescrição esta que se invoca e pretende ver declarada;

EE) Requer que seja declarado e reconhecido o transcurso do prazo quinquenal da prescrição dos tributos, juros de mora e custas, nos termos do art.° 187° do CRCSPSS, relativamente às contribuições reclamadas nos PEF s: 1102201100225606 e apensos; PEF 102201100225614 e PEF 1102201021036114;

FF) O Recorrente através das peças que juntou a juízo impugnou por falsidade todos os documentos referentes à sua notificação e ou citação nos processos de execução fiscal sufragando a falsidade da assinatura nos mesmos constante como sua e cabia à Reclamada provar a sua veracidade;

GG) Impendida sobre a Recorrida o ónus da prova da citação, nos termos do artigo 74°, n° 1 da LGT, pelo que, suscitando-se dúvidas sobre a falsidade da assinatura constante dos documentos que a comprovam (os avisos de receção) e não tendo o IGFSS, IP, apresentante desses documentos logrado afastá-la, não se prefigura que possa considerar-se ter sido o Recorrente quem procedeu à assinatura das mesmas, atentas as discrepâncias entre as referidas assinaturas;

HH) A Recorrida, apesar de devidamente notificada da referida impugnação, não requereu a realização de qualquer exame pericial às assinaturas em apreço para demonstrar a veracidade (ou não) das mesmas;

II) Deve ter-se aqui presente também que a dúvida sobre a realidade de um facto resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita (cfr. art.° 414° do CPCivil);

JJ) Não tendo a Recorrida requerido a realização de qualquer prova pericial, e impendendo sobre a mesma a prova da assinatura dos avisos de receção, a terá de proceder a alegação, isto é, era sobre o IGFSS, IP. que impendia o ónus da prova da citação, nos termos do artigo 74°, n° 1 da LGT, pelo que, suscitando-se dúvidas sobre a falsidade da assinatura) constante dos documentos que a comprovam (os avisos de receção) e não tendo o IGFSS, IP, apresentante desses documentos logrado afastá-la, e não tendo pedido a realização de prova pericial, para que pudesse aferir-se que ter sido o Recorrente quem procedeu à assinatura das mesmas, atentas as discrepâncias entre as referidas assinaturas;

KK) A falsidade do documento autêntico está configurada como um incidente (vfr. Se infere do teor do n° 2 do artigo 449.° do CPC), o qual está previsto e regulado pelos artigos 446° a 449° do CPC. Sendo assim, relativamente aos documentos supra identificados, não fez a Recorrida a prova da genuinidade da assinatura neles apostas, pelo que, em consonância com o bem ajuizado pela primeira instância, não se pode ter como provado «que o Recorrente tenha assinado os avisos de receção referidos no elenco dos factos provados.» Do mesmo modo, não se pode dar como provado que o Recorrente tenha assinado a notificação para o direito de audição prévia;

LL) Incumbia à Recorrida a prova do facto constitutivo do direito de que se arroga - realização da válida citação do Recorrente no âmbito dos PEFs em apreço, vide art.° 74°, n° 1 da LGT e 342° do CC, mas compulsado os PEFs em apreço a única conclusão possível é da inexistência de elementos comprovativos da realização da putativa das citações;

MM) Perante a impugnação dos documentos por falsidade da sua assinatura, incumbia Recorrida, na qualidade de apresentante dos mesmos, comprovar a veracidade da assinatura, nos termos do disposto no art.° 374°, n° 2 do Código Civil, devendo em caso de dúvida o tribunal considerar a assinatura como não genuína [art. 346.° do Código Civil], não o tendo feito, a pretensão do Recorrente tem de proceder, cfr. acórdão proferido no âmbito do processo n° 2605/23.BEPRT, pelo TAC Norte Unidade Orgânica 2 - Subsecção Execução fiscal e de recursos contraordenacionais, no dia 31/10/2024;

NN) Pelo exposto, a sentença recorrida tem de ser revogada e ser substituída por acórdão que julgue totalmente procedente por provada a reclamação apresentada, com as legais consequências.

Termos em que,

Requer que a presente reclamação seja julgada totalmente procedente por provadas, sendo declarado que:

- Se verifica falta de citação e ou a nulidade da citação para os PEFs em apreço, cfr art.° 191° e seg. do CPC;

- Se verifica a falta de citação do executado para o processo de execução fiscal e declarados nulos todos os atos processados posteriormente nomeadamente o acto de penhora, nos termos do art.° 187°, al. a) do CPC (ex vi artigo 2° do CPPT);

- Seja reconhecido e declarado a verificação e o decurso do prazo prescricional previsto nos termos e para os efeitos do art.° 187° do CRCSPSS em relação às contribuições alegadamente não pagas e ora exigidas pelos IGFSS, IP., relativas aos Processo de Execução Fiscal n° 1102201100225606 e apensos e PEF 102201100225614 e 1102201021036114, com todas as legais consequências;

- Deverá ser declara o reconhecido que a Recorrida não citou nem deu cumprimento ao disposto no artigo 241° do CPC (atual artigo 233° quanto aos PEFs referidos nos factos assentes sob as al.s: A; B; C); D); J), com as legais consequências;

- Requer que seja dado como não provados os factos vertidos nas al.s II) e I) da sentença recorrida, porque dos autos não resulta a existência de qualquer pedido efetuado pelo Recorrente, não existe nos autos qualquer formulário ou escrito assinado pelo Recorrido a pedir o pagamento em prestações, nem tão pouco a entrega do deferimento desse plano ao Recorrente;

- Requer que a sentença recorrida seja revogada e substituída por acórdão que julgue totalmente procedente por provada a reclamação apresentada, com as legais consequências;

- Em qualquer dos casos, requer a condenação da Recorrida no pagamento das custas, custas de parte e demais encargos legais.

Decidindo desta forma,

Farão Vossas Exas,

A mais Sã e Objetiva Justiça!»


A Recorrida, apresentou contra-alegações, nas quais conclui:

A) «O Reclamante /Recorrente foi regulamente citado nos Processos Executivos Fiscais n.º 1102201100225606 e apenso (1102201100225614) e n.º 1102201201036114 em causa nos autos .
B) O Reclamante /Recorrente foi citado do processo n.º 1102201100225606 e apenso (1102201100225614) em 25/03/2011, conforme assinatura aposta no Aviso de Recepção pela Exma. Senhora M…, esposa do Reclamante.
C) O Reclamante /Recorrente foi, igualmente, citado do processo n.º 1102201201036114 em 28.11.2012, conforme assinatura aposta no Aviso de Receção pelo próprio.
D) A citação para a execução fiscal constitui facto interruptivo do prazo legal de prescrição de dívidas à Segurança Social, o qual tem não só um efeito jurídico instantâneo (de inutilizar todo o prazo anteriormente decorrido), como, também, um efeito jurídico duradouro, isto é, um efeito interruptivo que permanece até ao termo do processo executivo, em conformidade com o disposto no art.º 327º nº 1 do Código Civil, norma cuja aplicação se deve ao facto de o diploma que define o regime das contribuições à Segurança Social e a actual Lei Geral Tributária nada disporem sobre a matéria.
E) Considerando que a confirmação da citação pessoal de cada um dos processos executivos em apreço se deu no período dos 5 anos do prazo de prescrição, conforme registo do AR – Aviso de Recepção assinado, não pode a dívida ser considerada prescrita.
F) A citação efectuada em pessoa diversa do citando, encarregue de lhe transmitir o conteúdo do acto, é equiparada à citação pessoal, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento, considerando-se a citação efetuada no dia em que se mostre assinado o aviso de recepção e tem-se por efectuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário .
G) O Reclamante /Recorrente não logrou fazer prova em contrário de que não teve conhecimento da citação assinada pela sua esposa.
H) Tanto assim é que em maio de 2011 requereu junto da Reclamante /Recorrida um plano de pagamento em prestações.
I) O Recorrente não impugnou a assinatura aposta no aviso de receção.
J) O tribunal não está impedido de se socorrer de qualquer meio de prova, designadamente da prova testemunhal, para formar a sua convicção acerca da autoria de um documento.
K) A dívida em causa nos autos é devida e não se encontra prescrita.

Nestes termos, requer-se a V. Exas se dignem julgar o presente Recurso improcedente, por não provado, e consequentemente condenem o ora Recorrente no pagamento da quantia exequenda, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos e nas custas processuais.


O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Os autos foram com vista ao Ministério Público, que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa de vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.


II – Fundamentação

Cumpre, pois, apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso.

Assim, na falta de especificação no requerimento de interposição do recurso, nos termos do artigo 635/3 do Código de Processo Civil, deve-se entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao Recorrente. O objeto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (artigo 635/4 CPC). Assim, todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões e devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Atento o exposto, e tendo presentes as conclusões de recurso apresentadas, importa decidir sobre se a sentença padece de erro de julgamento, na seleção e interpretação dos factos e aplicação do direito, ou seja, apreciar se no caso concreto estão verificados os pressupostos de que depende a declaração da prescrição das dívidas exequendas.


II.1- Dos Factos

O Tribunal recorrido considerou como provada a seguinte factualidade:

A. «Em 19.02.2011, a Secção de Processo SP Lisboa II do IGFSS, I.P. extraiu "Certidão de Dívida" n.° 20383/2011, por dívidas do ora Reclamante, resultantes de Contribuições de Trabalho Independente, entre os períodos de 2007/09 e 2010/11, num valor total de € 7.724,04 — [cfr. fls. 6 e 7 do processo administrativo instrutor a fls. 50-58 do SITAF];
B. Na mesma data - em 19.02.2011 - a Secção de Processo SP Lisboa II do IGFSS, I.P. extraiu "Certidão de Dívida" n.° 20384/2011, por dívidas do ora Reclamante, resultantes de. Contribuições de Trabalho Independente, entre os períodos 2006/02 e 2007/08, num valor total de € 3.433,91 — [cfr. fls. 8 e 9 do processo administrativo instrutor a fls. 50-58 do SITAF];
C. Em 13.03.2011, foi autuado o Processo de Execução Fiscal n.° 1102201100225606, contra P…, referente à quantia exequenda de € 7.724,04 - [cfr. fls. 1 do processo administrativo instrutor a fls. 50-58 do SITAF];
D. Na mesma data - em 13.03.2011 -, foi autuado o Processo de Execução Fiscal n.° 1102201100225614, contra P…, referente à quantia exequenda de € 3.433,91 — [cfr. fls. 2 do processo administrativo instrutor a fls. 50-58 do SITAF];
E. Em 19.03.2011, foi expedido, pela Secção de Processo de SP Lisboa II do IGFSS, I.P. oficio de "Citação", por carta registada com aviso de receção, para o ora Reclamante, referente ao PEF 1102201100225606 e apensos, num total de € 14.692,32 — [cfr. fls. 4 do processo administrativo instrutor a fls. 50-58 do SITAF];
F. Em 25.03.2011, foi assinado, por “T…”, titular do “BI ou documento oficial” n.º 4..., o aviso de receção referente ao ofício de “Citação” identificado na alínea E) que antecede – [cfr. fls. 1 do processo administrativo instrutor a fls. 59 do SITAF];
G. Em face do descrito na alínea F) que antecede, a Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P, não remeteu ao Reclamante a informação de que o ofício de “Citação” foi entregue em terceira pessoa – [cfr. fls. 256-259 do SITAF];
H. Em data que não foi possível identificar, o Reclamante requereu, junto da Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P, o pagamento da quantia exequenda do PEF n.º 1102201100225606 e apensos em 60 (sessenta) prestações mensais – [cfr. fls. 260 do SITAF];
I. Em 18.05.2011, a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P, deferiu o plano prestacional identificado na alínea H) que antecede e a isenção de garantia – [cfr. fls. 260 do SITAF];
J. Em 17.11.2012, o ISS, I.P. extraiu “Certidão de Dívida” n.º 98134/2012, por dívidas do ora Reclamante, resultantes de Contribuições de Trabalho Independente, entre os períodos 2010/12 e 2011/10, num valor total de € 2.062,53 – [cfr. fls. 2 do processo administrativo instrutor a fls. 60-67 do SITAF];
K. Em 19.11.2012, foi autuado o Processo de Execução Fiscal n.º 1102201021036114, contra P…, referente à quantia exequenda de € 1.993,83 – [cfr. fls. 3 do processo administrativo instrutor a fls. 50-58 do SITAF];
L. Em 21.11.2012, foi expedido, pela Secção de Processo de SP Lisboa II do IGFSS, I.P. ofício de “Citação”, por carta registada com aviso de receção, para o ora Reclamante, referente ao PEF n.º 1102201021036114, num total de € 2.338,17 – [cfr. fls. 1 do processo administrativo instrutor a fls. 60-67 do SITAF];
M. Em 28.11.2012, foi assinado, pelo Reclamante, titular do “BI ou documento oficial” n.º 0..., o aviso de receção referente ao ofício de “Citação” identificado na alínea que antecede – [cfr. fls. 4 do processo administrativo instrutor a fls. 60-67 do SITAF];
N. Em 28.12.2012, o mandatário do Reclamante remeteu ao IGFSS, I.P., por carta registada com aviso de receção, missiva, através da qual requereu a revogação do despacho de citação e a declaração de prescrição dos valores em dívida – [cfr. fls. 40-43 e 44-47 do SITAF];
O. Em 05.05.2016, a Secção de Processo SP Lisboa II do IGFSS, I.P. dirigiu ao Reclamante o ofício n.º 11409/2016, sob o assunto “Notificação de valores em dívida - NIF: 1…”, de onde se extrai o seguinte:
“(…) informamos que está pendente contra V. Exª um processo de execução fiscal com o n.º 1102201100225606 (e outros) para cobrança coerciva de dívida de contribuições ao sistema de Segurança Social, no total de € 10.558,0 de quantia exequenda, ao qual acrescem juros e custos. Assim, recomendamos-lhe o pagamento imediato até dia 10-05-2016 dos valores em dívida, evitando ordens de penhora e custos processuais adicionais.
(…).” – [cfr. fls. 12-13 do SITAF];

P. Em 16.10.2017, o mandatário do Reclamante remeteu ao IGFSS, I.P., por carta registada com aviso de receção, missiva, através da qual requereu a revogação da notificação dos valores em dívida do executado e a declaração de prescrição dos mesmos – [cfr. fls. 14-25 e 26-27 do SITAF];
Q. Em 12.04.2024, a Secção de Processo SP Lisboa II do IGFSS, I.P. dirigiu ao Reclamante, através de e-mail, missiva sob o assunto “Regularização da Dívida à Segurança Social em sede de Execução Fiscal – IGFSS, I.P”, na qual o informou da existência do processo de execução fiscal n.º 1102201100225606, por dívidas à segurança social, no valor total de € 7.342,75 e da possibilidade de pagar ou requerer pagamento em prestações – [cfr. fls. 26-27 do SITAF];
R. Em 22.04.2024, o mandatário do Reclamante remeteu ao IGFSS, I.P., através de e-mail, missiva, na qual requereu a declaração de prescrição dos valores em dívida – [cfr. fls. 30-39 do SITAF];
S. Em 26.06.2024, a Secção de Processo SP Lisboa II do IGFSS, I.P. dirigiu ao mandatário do Reclamante o ofício n.º S-IGFSS/156175/2024, sob o assunto “Notificação de apreciação de prescrição – Processo de execução fiscal n.º 1102201100225606 e outros – Executado: P… – NIF: 1…”, de onde se extrai o seguinte:
“(…)


– [cfr. fls. 3 a 5 do processo administrativo instrutor a fls. 60-67 do SITAF];



– [cfr. fls. 3 a 5 do processo administrativo instrutor a fls. 60-67 do SITAF];


Quanto a factos não provados, na sentença exarou-se o seguinte:

I. «O Reclamante foi citado para o processo de execução fiscal 1102201100225606 em dezembro de 2012.»


E quanto à Motivação da Decisão de Facto, consignou-se:

«A convicção deste Tribunal quanto à prova dos factos supramencionados fundou-se no alegado pelas partes, nos articulados e na análise dos documentos juntos aos autos, incluindo o processo de execução fiscal, conforme indicado em cada uma das alíneas dos factos dados como provados.
Relativamente à citação do Reclamante, no âmbito dos processos de execução fiscal em causa, a decisão do Tribunal quanto à sua ocorrência (cfr. alíneas E), F), G), L) e M) dos factos provados), sustentou-se na existência nos autos, dos ofícios de citação relativos aos respetivos processos de execução fiscal e, bem assim, dos avisos de receção assinados, pelo próprio Reclamante como por T…, sua esposa.
No seu articulado inicial, o Reclamante afirma que apenas em dezembro de 2012 foi citado para o PEF n.º 1102201100225606, sendo que nenhuma prova a esse respeito foi feita, uma vez que o Reclamante junta, a respeito da sua alegação, o documento n.º 6, que corresponde ao ofício de citação identificado na alínea E) dos factos provados e, portanto, datado de 19.03.2011 e que apenas prova que, na referida data, foi elaborado e expedido o referido ofício. Por essa razão, foi dado como não provado em 1) que o Reclamante só foi citado para o referido PEF em dezembro de 2012.
Ademais, para a prova do aludido facto não provado, contribuiu ainda o depoimento testemunhal de M…, esposa do Reclamante que, apesar de informada da possibilidade prevista no artigo 497.º, n.º 1, alínea c) do CPC, e confrontada com o talão do aviso de receção dos CTT, constante de fls. 59 do SITAF, prestou um depoimento muito pouco credível, contraditório e inverosímil.
Com efeito, asseverou a testemunha não se lembrar e não ter ideia do mencionado documento. Quando questionada se rececionou correspondência da Segurança Social em março de 2011, dirigida ao seu marido, atestou que “tenho quase a certeza de que não” e que nada lhe entregou proveniente da Segurança Social.
Mais atestou, no que concerne à informação constante do talão do AR dos CTT, que:
i) “falta um dígito” no que respeito ao n.º do cartão de cidadão, na medida em que consta do referido talão do AR o n.º “4...”, encontrando-se em falta o número 0 (zero) à esquerda, ou seja, o número do seu cartão de cidadão é “0...”;
ii) no que se refere ao campo “data e assinatura”, constante do talão do AR, diz que “parece a minha letra” mas, quando questionada, pelo mandatário do Reclamante, sobre se a assinatura é, ou não, sua, acabou por concluir que “este C… não é de todo a minha letra” e que “eu acho que não está C… escrito”. Mais à frente aduziu que “T… é parecido com a minha letra, C… eu nunca escrevo assim, nunca assino assim”, “não é a minha letra”, “dá a sensação que T… pode ser realmente a minha letra mas o segundo nome, C…, não fui eu”. Concluiu dizendo “não é a minha letra, eu conheço a minha letra” e que “nem C… acho que está escrito como deve de ser” e, mais à frente, que “não fui eu de certeza, de certeza”.
Ora, o referido depoimento não merece qualquer credibilidade deste Tribunal, antes se afigurando ser um falso testemunho, pensado e ensaiado para tentar retirar força probatória ao documento em apreço.
Num primeiro momento, começa a testemunha por dizer que parece a sua letra e que o nome “T…” é parecido com a sua letra para momentos depois, afirmar com certeza, que não é de todo a sua letra, o que se traduz num depoimento contraditório.
Já no que concerne ao número do documento de identificação da testemunha, que esta entende estar incompleto, pelo facto de lhe faltar um zero antes dos restantes números, há a dizer que, como se sabe, o zero à esquerda de um número não tem qualquer valor e pode ser omitido, substituído por um espaço em branco, sem que isso leve a qualquer perda de informação.
Para além disso, e como bem notou a Mandatária do IGFSS, I.P., em 2011, aquando da assinatura do talão do AR, a testemunha poderia ainda não ser detentora do “cartão de cidadão”, mas sim o “bilhete de identidade”, o que se compadece com o facto de ter sido inserido, no talão do AR, a data de emissão e a “entidade emissora”, encontrando-se preenchido “03.06.05” e “Lisboa”, informação que, nos dias de hoje, não consta do “cartão de cidadão”. Também por esta razão, e pelo facto de o talão do AR dos CTT não ter campo próprio para o efeito, se compreende que não constem os restantes elementos do número, ou seja “ZY2”.
De notar ainda que, o talão do AR dos CTT apresenta vários campos, sendo que, surge em primeiro lugar a “identificação do destinatário ou de quem recebeu a CNVP”, seguido do campos “BI ou outro documento oficial”, “data”, “entidade emissora”, “nome legível” e “data e assinatura”.
Relativamente ao facto de se afigurar à testemunha que a letra pode não ser a sua, em todos os campos à exceção da “data e assinatura”, é de crer que os mesmos são preenchidos pelo distribuidor postal, i.e., o carteiro, em consonância com o n.º 4 do artigo 39.º do CPPT que prevê que “[o] distribuidor do serviço postal procederá à notificação das pessoas referidas no número anterior por anotação do bilhete de identidade ou de outro documento oficial” e com o n.º 3 do artigo 228.º do CPC que dispõe que “[a]ntes da assinatura do aviso de receção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos.”
Tal facto justifica que a testemunha não reconheça a letra aposta em todos os campos à exceção do último, ou seja, “data e assinatura”.
Já no que concerne ao último campo, “data e assinatura”, com as suas afirmações perentórias – “T… é parecido com a minha letra, C… eu nunca escrevo assim, nunca assino assim”, “não é a minha letra”, “dá a sensação que T… pode ser realmente a minha letra mas o segundo nome, C…, não fui eu”, “não é a minha letra, eu conheço a minha letra” e “nem C… acho que está escrito como deve de ser” – parece a testemunha sugerir uma adulteração ou falsificação da assinatura, uma vez que se não foi a testemunha a assinar, alguém o fez, o que se afigura totalmente inverosímil e inverídico, uma vez que a carta em apreço é dirigida a P… e os dados colocados no talão do AR dos CTT, quer seja o nome completo da testemunha, M…, quer seja o número do bilhete de identidade/cartão de cidadão e data de emissão, não se encontram na disponibilidade de alguém que não o próprio.
De facto, não sendo a testemunha M… a destinatária da carta ora em causa, nunca um terceiro – como o distribuidor postal ou, conjeturando-se, um vizinho – poderiam conhecer os referidos dados e, ainda que se admitisse que alguém poderia conhecer o nome completo da testemunha, composto por dois nomes próprios e quatro apelidos, é totalmente improvável que alguém que não a própria soubesse o número do bilhete de identidade/cartão de cidadão e data de emissão.
Em suma, foi a análise crítica de toda a prova enunciada que, em conjugação com as regras da experiência comum, sedimentou a convicção do Tribunal — cfr. artigos 74.º, 76.º, n.º 1, ambos, da Lei Geral Tributária (doravante, LGT) e 362.º e seguintes do Código Civil.


II.2 Do Direito


O Reclamante e ora Recorrente solicitou junto da Seção de Processo Executivo de Lisboa a declaração de prescrição da dívidas que lhe estão a ser exigidas no âmbito dos processos de execução fiscal contra si instaurados para cobrança coerciva de contribuições de trabalho independente.

Notificado do despacho da Coordenadora da Seção de Processo Executivo de Lisboa que indeferiu o requerido, reclamou judicialmente e da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que indeferiu a reclamação, interpôs recurso.

Por Acórdão deste TACS de 2024.12.19 foi concedido provimento ao recurso, anulada a sentença recorrida, e ordenada a baixa dos autos à 1.ª instância, nomeadamente para inquirição da testemunha arrolada pelo Reclamante.

Subsequente foi proferida nova decisão, decisão com a qual não se conforma o ora Recorrente e da qual vem interposto o presente recurso.

Nas conclusões das alegações de recurso, o Reclamante e ora Recorrente começa por repetir o mesmo argumento em que imputa à sentença, além do erro de julgamento, vício de nulidade, por excesso de pronúncia, defendendo que não tendo a ação sido contestada pela Entidade Reclamada, se deveriam ter por confessados todos os factos articulados na petição inicial.

Trata-se efetivamente da mesma questão antes invocada e já analisada no anterior Acórdão, em que são esgrimidos os mesmos argumentos antes apresentados, pelo que nos limitaremos a repetir aqui a decisão anteriormente proferida, no sentido de a sentença não padecer de tal vício:

«(…)
Diz o artigo 125/1 do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), sob a epígrafe Nulidades da sentença:

1 - Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.”

Também a alínea d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil (CPC), invocada pelo ora Recorrente, dispõe que é nula a sentença quando:
(…)
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Efetivamente, nos termos do disposto no artigo 125/1 do CPPT, constitui causa de nulidade da sentença a a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.

A nulidade por excesso de pronúncia ocorre quando o tribunal se pronuncia sobre questões que não foram suscitadas pelas partes e que não sejam de conhecimento oficioso.

Por questões submetidas à apreciação do Tribunal deve entender-se aqui as que se referem aos pedidos formulados, atinentes à causa de pedir ou às exceções alegadas, não se confundindo, pois, com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem verdadeiras questões para os efeitos preceituados na norma citada.

Nas palavras de Alberto dos Reis (1-Aut Cit, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: anotado, I Vol. pág. 284, 285 e V Vol. pág. 139), são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer questões de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal qualquer questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.

Alega o ora Recorrente que não tendo a ação sido contestada pela Entidade Reclamada, se deveriam ter por confessados todos os factos articulados na petição inicial, defendendo que o Tribunal a quo deveria apenas ter condenado a demandada no peticionado e, não o tendo feito, a sentença recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia.

Assim, na ótica do ora Recorrente, é esta falta de condenação «de preceito» em que funda a legada nulidade por excesso de pronúncia, porquanto a sentença não se limitou à condenação da Exequente no pedido formulado.

Desde já adiantaremos não ter razão o ora Recorrente, não se verificando, no caso, a alegada “nulidade por excesso de pronúncia”.

Com efeito, é pacífico que no processo judicial tributário a falta de contestação ou de resposta não implica a confissão dos factos nem tem, em si mesma, qualquer efeito cominatório.

O nº 6 do artigo 110º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), também aplicável à oposição por remissão do nº 1 do artigo 211º do mesmo Código, e em todo o caso matriz das demais formas processuais, diz-nos: «[a] falta de contestação não representa a confissão dos factos articulados pelo impugnante.»

Como expende Jorge Lopes de Sousa (2-Aut. Cit, CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO: Anotado e Comentado, 6ª Ed., 2011, Áreas Editora, Vol. IV, pág. 311): (…) Configurando-se o incidente de reclamação como uma acção de impugnação [designação que lhe é expressamente atribuída nos arts. 49.e, n.ºs 1, alíneas a), subalínea iii), e 49.º-A, n.ºs 2, alínea a), subalínea iii), e 3, alínea a), subalínea iii), do ETAF de 2002 enxertada no processo de execução fiscal e com tramitação especial, nos casos omissos, quando não seja de aplicar analogicamente normas do CPPT, deverão aplicar-se as normas do CPTA que regulam a acção administrativa especial, que são as adequadas à impugnação de actos praticados pelas autoridades administrativas.

Temos assim que é assim aplicável à reclamação prevista nos artigos 275º e seguintes do CPPT o disposto no nº 6 do citado artigo 110º CPPT, não sendo necessário recorrer às normas subsidiárias.

Assim e pese embora que a falta de contestação especificada dos factos seja livremente apreciada pelo juiz ao formular o seu juízo sobre a prova produzida, não tem o efeito propugnado pelo Recorrente nas conclusões das alegações de recurso.

Não tem, pois, razão o ora Recorrente pelo que improcede o recurso quanto à alegada nulidade por excesso de pronúncia.


Vejamos agora quanto à impugnação da matéria de facto.

Quando impugna a matéria de facto, o ora Recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição do recurso nesta parte.

Vejamos o que nos diz o artigo 640º Código de Processo Civil (CPC) aplicável ex vi artigo 281º CPPT:

Artigo 640.º
(Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto)
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.

Desde já adiantaremos que estes ónus foram apenas parcialmente cumpridos pelo ora Recorrente.

Na verdade, nas alegações de recurso o Recorrente não indicou nas respetivas conclusões, nem nas alegações, com a precisão que lhe era exigida, os concretos meios probatórios que imporiam decisão diferente, e a decisão que, no seu entender pretende aditar, pelo que, desde já diremos que não se considera integralmente cumprida esta obrigação que sobre si recaía.

Com efeito, incumbe à Recorrente cumprir este ónus, identificando os factos que entende terem sido mal julgados: quer por terem sido dados como provados quando o não deveriam ter sido, quer os que foram desconsiderados e considera serem relevantes à decisão, com indicação dos meios de prova que suportam esta sua pretensão de alteração do probatório.

Contudo, mais que a impugnação da matéria de facto propriamente dita, entendemos que o ora Recorrente argui sim o erro de julgamento de facto.

Vejamos, todavia:

O Reclamante e ora Recorrente impugna os factos constantes da informação elaborada pelo órgão de execução fiscal e nega ter sido citado para os termos dos processos de execução fiscal (PEF) nº 1102201100225606 em 2011.03.25, PEF nº 1102201100225614 em 2011.03.25 e PEF 1102201021036114 em 2012.11.20 [cf. conclusão C) das alegações de recurso], alegando que os documentos nº 1 e 5 apenas comprovam a sua emissão e não o seu envio e menos ainda a sua receção pelo Executado e que o documento nº 4 não está por si assinado e diz, não lhe foi entregue.

Nas alíneas E) e F) dos factos assentes a sentença recorrida deu-se como provado o seguinte:

E. Em 19.03.2011, foi expedido, pela Secção de Processo de SP Lisboa II do IGFSS, I.P. ofício de "Citação", por carta registada com aviso de receção, para o ora Reclamante, referente ao PEF 1102201100225606 e apensos, num total de € 14.692,32 — [cfr. fls. 4 do processo administrativo instrutor a fls. 50-58 do SITAF];
F. Em 25.03.2011, foi assinado, por T…, o aviso de receção referente ao oficio de "Citação" identificado na alínea que antecede — [cfr. fls. 1 do processo administrativo instrutor a fls. 59 do SITAF];

Ora, nas alíneas E. e F. supratranscritas deu-se como provado que «foi expedido» pelo órgão de execução fiscal o ofício de citação respeitante aos PEF nº 1102201100225606 e apensos e que o aviso de receção foi assinado por T… pelo que nada há a censurar quanto a estes factos levados ao probatório.

Coisa diferente da impugnação da matéria de facto fixada são as conclusões que na sentença recorrida deles se retirou, no sentido de considerar que o Reclamante e ora Recorrente foi citado para os termos da execução naquela data, por a carta que continha o ofício de citação ter sido atempadamente entregue ao citando, argumento que melhor veremos infra a propósito do alegado erro de julgamento.

Termos em que improcede nesta parte o recurso.

Prosseguindo:

Na conclusão K) das alegações de recurso, insurge-se o ora Recorrente contra os factos que foram dados como provados sob as alíneas H) e I) com fundamento em não existir nos autos qualquer formulário ou escrito assinado pelo Recorrido a pedir o pagamento em prestações, nem tão pouco a entrega do deferimento desse plano ao Recorrente.

Recordemos o que nas alíneas H) e I) dos factos assentes se deu como provado na sentença recorrida:


H. Em data que não foi possível identificar, o Reclamante requereu, junto da Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P, o pagamento da quantia exequenda do PEF n.º 1102201100225606 e apensos em 60 (sessenta) prestações mensais – [cfr. fls. 260 do SITAF];
I. Em 18.05.2011, a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P, deferiu o plano prestacional identificado na alínea H) que antecede e a isenção de garantia – [cfr. fls. 260 do SITAF];

Compulsados os autos, e tal como alegado, não foi junto o requerimento através do qual o ora Recorrente teria solicitado o pagamento da dívida exequenda em prestações, constando de fls. 260 do processo o ofício de notificação do despacho da Coordenadora da Seção de Processo Executivo de Lisboa II que deferiu ou aprovou o pedido de pagamento da dívida em prestações, pese embora no despacho se faça referência a tal pedido.

Neste ponto terá que ser dado parcial provimento à impugnação da matéria de facto e por não escrita a alínea H) do probatório.

Impugna ainda o ora Recorrente, em suma, toda a matéria dada como provada e a que depôs a testemunha ouvida.

Relembremos aqui que os autos baixaram para audição da referida testemunha a fim de possibilitar ao Reclamante e ora Recorrente efetuar a contraprova no que respeitava às circunstâncias de entrega da carta contendo o ofício de citação ao citando.

Além de atender à ligação familiar, ou seja, de a testemunha ser mulher do Reclamante e ora Recorrente, o Tribunal a quo na motivação da decisão de facto da sentença recorrida desconsiderou o depoimento prestado por contraditório, pouco credível e mesmo inverosímil.

A testemunha cujo depoimento ouvimos, afirmou não se lembrar de ter recebido no domicílio qualquer carta proveniente da Segurança Social e negou ter assinado o aviso de receção que se encontra junto aos autos e com o qual foi confrontada durante a inquirição.

Na verdade, consideramos que o depoimento da testemunha ouvida não convenceu e, logo, que o Reclamante e ora Recorrente não apresentou contraprova bastante para ilidir aquela presunção.

E, contrariamente ao que alega era sobre ele, ora Recorrente, que recaía o ónus da prova e de requerer a realização da perícia sobre a veracidade da letra e assinatura aposta no aviso de receção.

Termos em que indefere, nesta parte, a impugnação da matéria de facto.

Vejamos agora:

Na conclusão Q) das alegações de recurso veio o ora Recorrente suscitar questão nova argumentando que a falta de resposta ao fax e à carta datada de 2017.10.12, em que solicitou “a revogação da notificação dos valores em divida do executado e a declaração de prescrição dos mesmos”, durante o período de 90 dias configura deferimento tácito da pretensão do Reclamante e ora Recorrente.

Trata-se de questão não suscitada anteriormente, na reclamação, e sobre a qual, naturalmente, o Tribunal a quo na sentença recorrida se não pronunciou, e que, por não ser de conhecimento oficioso, não pode, pois, ser conhecida no presente recurso.

Com efeito, como é de jurisprudência reiterada e uniforme, os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova, e por essa razão, regra geral, em sede de recurso, não se pode tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado [nesse mesmo sentido citamos, a título meramente exemplificativo os acórdãos do STA de 2021.10.06, Proc. n.º 01235/09.6BESNT, e o Ac. do STA de 2014.11.05, Proc. n.º 01508/12].

Tal questão não pode, pois, ser agora aqui apreciada.

Vejamos agora quanto ao alegado erro de julgamento e responder à pergunta sobre se estão ou não prescritas as dívidas de contribuições à Segurança Social que estão a ser exigidas nos processos de execução fiscal.

A sentença começa por discorrer assertivamente sobre o quadro legal aplicável, respeitante à prescrição, em termos aos quais pouco ou nada temos a acrescentar. Diz no segmento que aqui interessa:

(…)
A prescrição da dívida exequenda traduz-se na faculdade concedida ao devedor de, após o decurso de determinado período de tempo, previsto na lei, recusar o cumprimento da dívida e opor-se ao seu exercício coercivo – cfr. artigo 298.º, n.º 1 e 304.º do Código Civil (“CC”).
A prescrição consubstancia, assim, uma exceção perentória, extintiva do direito, que pode ser conhecida oficiosamente ou a pedido das partes (cfr. artigo 175.º do CPPT) e o seu reconhecimento determina a extinção da execução fiscal (cf. artigo 176.º, n.º 1, alínea c) do CPPT e 304.º do CC).
Com efeito, e na medida em que o Reclamante requereu, ao órgão de execução fiscal, a declaração da prescrição da quantia exequenda, o seu indeferimento tem cabimento no âmbito da presente reclamação, como incidente de execução.
Nos presentes autos estão em causa dívidas à Segurança Social provenientes de contribuições, cotizações e juros, referentes aso períodos de 2007/09 a 2010/11 (PEF n.º 1102201100225606), 2006/09 a 2006/11 e 2007/01 a 2007/08 (PEF n.º 1102201100225614) e 2010/12 a 2011/10 (PEF n.º 1102201021036114).
De acordo com o princípio geral da aplicação da lei no tempo, a lei reguladora do regime de prescrição da dívida tributária é a que vigorar à data da sua constituição.
Assim, nos presentes autos, o regime prescricional encontra-se fixado no artigo 63.º da Lei n.º 17/2000, de 8 de agosto, que aprovou as bases da segurança social, o qual se manteve inalterado no artigo 49.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de dezembro, que revogou aquele diploma (e, acrescente-se, no artigo 60.º, n.º 3 da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, que por sua vez revogou a Lei n.º 32/2002, de 20 de dezembro, encontrando-se atualmente regulado no artigo 187.º, n.º 1 da Lei n.º 110/09, de 16 de setembro, que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social).
Com efeito, dispunha o artigo 63.º da Lei n.º 17/2000, de 8 de agosto, que entrou em vigor em 08.02.2001 (180 dias após a data da publicação atento o disposto no artigo 119.º), a respeito da prescrição, o seguinte:

“Artigo 63.º
Cobrança coerciva e prescrição das contribuições
1 - A cobrança coerciva dos valores relativos às cotizações e às contribuições é efectuada através de processo executivo e de secção de processos da segurança social.
2 - A obrigação de pagamento das cotizações e das contribuições prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
3 - A prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida.”

Por conseguinte, o artigo 49.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de dezembro (que entrou em vigor 30 dias após a sua publicação, nos termos e para os efeitos do artigo 130.º) preceituava o seguinte:
“Artigo 49.º
Prescrição das contribuições
1 - A obrigação do pagamento das cotizações e das contribuições prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
2 - A prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento conducente à liquidação ou à cobrança da dívida.”

Demais, o artigo 187.º da Lei n.º 110/09, de 16 de setembro, que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social (que entrou em vigor em 11.01.2011) estabelece que:
“Artigo 187.º
Prescrição da obrigação de pagamento à segurança social
1 - A obrigação do pagamento das contribuições e das quotizações, respectivos juros de mora e outros valores devidos à segurança social, no âmbito da relação jurídico-contributiva, prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
2 - O prazo de prescrição interrompe-se pela ocorrência de qualquer diligência administrativa realizada, da qual tenha sido dado conhecimento ao responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida e pela apresentação de requerimento de procedimento extrajudicial de conciliação.
3 - O prazo de prescrição suspende-se nos termos previstos no presente Código e na lei geral.”

O regime de prescrição de créditos da Segurança Social regula apenas alguns dos pontos relativos à prescrição, tais como:
i. o prazo, que é de cinco anos, afastando o prazo subsidiário de oito anos previsto para as obrigações tributárias, no artigo 48º, n.º 1 da LGT;
ii. o início do prazo, corresponde à data em que a obrigação de pagamento deveria ter sido cumprida i.e., para as contribuições dos anos de 2006-2010, a partir do dia 15 do mês seguinte àquele a que as contribuições dizem respeito (cfr. artigo 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de julho e o artigo 6.º do Decreto Regulamentar nº 26/99, de 27 de outubro) e para as contribuições do ano de 2011, a partir do dia 20 (cfr. artigo 43.º do Código Contributivo);
iii. os factos interruptivos da prescrição são, conforme constitui entendimento da jurisprudência e da doutrina, todas as diligências que ocorram nos processos administrativos de liquidação e nos processos de execução fiscal – vide exemplificativamente o Acórdão do STA de 21.04.2010, processo n.º 023/10 (Miranda de Pacheco) – o que afasta a relevância interruptiva da reclamação, do recurso hierárquico, da impugnação e do pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo, constantes do n.º 1 do artigo 49.º da LGT.

A propósito destas diligências administrativas, JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária – Notas Práticas, 2.ª Edição, 2010, pág. 127 a 129, refere o seguinte:
"[n]este regime especial de prescrição são actos interruptivos quaisquer diligências administrativas, realizadas com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducentes à liquidação ou à cobrança da dívida.
Diligências administrativas serão todas as que ocorram nos processos administrativos de liquidação e nos processos de execução fiscal, conducentes à liquidação e cobrança da dívida, de que venha a ser dado conhecimento ao devedor.
Não é necessário que nessas diligências seja manifestada pela administração tributária a vontade de proceder à liquidação ou cobrança da dívida, pois tal não é exigido pelas normas que têm previsto o regime de interrupção da prescrição das dívidas de contribuições para a segurança social.
(...)
Assim, terão efeito interruptivo não só os actos praticados no processo de liquidação de que seja dado conhecimento ao devedor (como as notificações para exercício do direito de audiência e da liquidação), mas também os actos praticados no processo de execução fiscal pela administração tributária de que é dado conhecimento ao devedor (como a citação, a penhora, a notificação do responsável subsidiário para se pronunciar sobre a possibilidade de reversão e a notificação do ato que a decide).” (sublinhados nossos)

Assim, e sabido que só o que não encontre regulação neste regime especial pode ser regulado pelas regras contidas na LGT, é inquestionável que só podem constituir factos interruptivos do prazo de prescrição das dívidas à Segurança Social as diligências administrativas que ocorram no processo conducente à sua liquidação ou à sua cobrança, como é, o caso da citação (sem prejuízo da aplicação das regras da LGT no que não está especialmente regulado atenta a vocação desta Lei para regular a generalidade das relações jurídico-tributárias, afirmada no seu artigo 1.º). Contudo, no que concerne aos efeitos ou eficácia jurídica destes factos interruptivos – i.e., se os factos interruptivos têm efeito instantâneo ou duradouro – eles terão de ser os previstos no artigo 326.º e 327.º do CC, uma vez que nem o diploma que define o regime das contribuições à Segurança Social nem a LGT (após a entrada em vigor da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, que alterou o artigo 49.º) dispõem sobre esta matéria. Resultam, assim, dos n.ºs 1 destes artigos 326.º e 327.º interrupções de dois tipos: “[u]m que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição)” – cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária – Notas Práticas, 2.ª Edição, 2010, pág. 57. Neste contexto, a regra geral é que as diligências administrativas, enquanto factos interruptivos, têm efeito instantâneo: tais diligências determinam, em princípio, a eliminação de todo o período de tempo então decorrido e o imediato início de novo prazo prescricional, por aplicação da regra geral contida no artigo 326.º do Código Civil, segundo o qual “[a] interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo seguinte” – neste sentido, vide Acórdão do STA de 10.04.2019, no processo 01437/18.4BEBRG (Dulce Neto).
A exceção (ao efeito instantâneo), é a situação prevista no artigo 327.º do Código Civil (que consubstancia um efeito duradouro da prescrição): por força da parte final do artigo 326.º do Código Civil, o ato interruptivo passa a ter efeito duradouro quando esteja em causa um ato de citação, sabido que o n.º 1 do artigo 327.º dispõe que “[s]e a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.”

Prossegue a sentença recorrida no segmento que aqui interessa:

«(…)
Da factualidade assente resulta que em 19.03.2011, foi expedido, pela Secção de Processo de SP Lisboa II do IGFSS, I.P. ofício de “Citação”, por carta registada com aviso de receção, para o ora Reclamante, referente ao PEF n.º 1102201100225606 e apensos, num total de € 14.692,32 – cfr. alínea E) dos factos provados – sendo que o aviso de receção foi assinado, em 25.03.2011, por T…, titular do “BI ou documento oficial” n.º 4…– cfr. alínea F) dos factos provados – não tendo o IGFSS, I.P. dado cumprimento ao disposto no artigo 233.º do CPC – cfr. alínea G) dos factos provados.
Por conseguinte, em data que não foi possível determinar, o Reclamante requereu, junto da Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P, o pagamento da quantia exequenda do PEF n.º 1102201100225606 e apensos em 60 (sessenta) prestações mensais – cfr. alínea H) dos factos provados – o que veio a ser deferido em 18.05.2011, pela Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P – cfr. alínea I) dos factos provados.
Ademais, em 21.11.2012, foi expedido, pela Secção de Processo de SP Lisboa II do IGFSS, I.P. ofício de “Citação”, por carta registada com aviso de receção, para o ora Reclamante, referente ao PEF n.º 1102201021036114, num total de € 2.338,17 – cfr. alínea L) dos factos provados – sendo que o aviso de receção foi assinado, em 28.11.2012, pelo próprio Reclamante, titular do “BI ou documento oficial” n.º 0…, – cfr. alínea M) dos factos provados.
Tratando-se de uma diligência administrativa, realizada no âmbito do processo de execução fiscal, conducente à cobrança da dívida exequenda, forçoso será concluir que o prazo de prescrição de 5 anos se interrompeu com a referida citação – que, ao contrário do que entende o Reclamante, não ocorreu em dezembro de 2012, mas sim em 25.03.2011 e 28.11.2012 (cfr. alíneas F) e M) dos factos provados e ponto 1) dos factos não provados) – sendo que o referido facto interruptivo tem efeito duradouro (cfr. artigo 326.º, parte final e artigo 327.º do CC), o que vale por dizer que se inutilizou para a prescrição o tempo antes decorrido, não começando novo prazo de prescrição a correr enquanto não findar o processo executivo no qual aquela interrupção se verificou.
De facto, é de entender que, na medida em que o ofício de citação, remetido ao Reclamante, referente ao PEF n.º 1102201100225606 e apensos foi entregue na sua morada a terceira pessoa, uma vez que foi assinado por “T…” – cfr. alíneas E) e F) dos factos provados –, por força desta citação interrompeu-se o cômputo do prazo de prescrição, apesar de ter resultado provado que o IGFSS, I.P. não remeteu ao Reclamante a informação de que o ofício de “Citação” foi entregue em terceira pessoa, conforme resulta do artigo 233.º do CPC – cfr. alínea G) dos factos provados.
Com efeito, o n.º 1 artigo 192.º do CPPT estabelece que “as citações pessoais são efetivadas nos termos do Código de Processo Civil, em tudo o que não for especialmente regulado no presente Código”.
Consequentemente, é aplicável o disposto no artigo 228.º do CPC que prevê que a citação se faça “por meio de carta registada com aviso de receção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando” – cfr. n.º 1 – que “pode ser entregue, após assinatura do aviso de receção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando” – cfr. n.º 2.
Assim, mesmo que entregue a pessoa diversa, “considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, ..., presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário” – cfr. n.º 1 do artigo 230.º do CPC, nesse sentido vide o acórdão do TCA Norte proferido no âmbito do processo n.º 00269/23.2BEVIS em 26.10.2023.
Ademais resulta dos presentes autos que o Reclamante não logrou ilidir a mencionada presunção legal de receção, seja através de prova documental, seja através da prova testemunhal produzida, que se revelou, como acima se deixou expresso, pouco credível, contraditória e inverosímil.
Não obstante, recordamos que a eventual nulidade da citação, por não terem sido observadas as formalidades legais não obsta ao efeito interruptivo da citação, face ao disposto no artigo 323º, n.º 3, do Código Civil – cfr. Acórdão do TCA Sul, de 10.02.2022, proferido no âmbito do processo n.º 1504/21.7BELRS. Com efeito, a jurisprudência e a doutrina são pacíficas a entender que, ainda que se verifique a nulidade da citação, não deixa de haver interrupção do prazo de prescrição nos termos do disposto no artigo 323º, n.º 3 do Código Civil.
Haverá a reter que a citação por via postal por meio de carta registada com aviso de receção é feita com base em modelos oficialmente aprovados, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho. No caso de citação de pessoa singular, a carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de receção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando (cfr. n.º 1 e n.º 2 do artigo 228º do CPC). Em qualquer dos casos, antes da assinatura do aviso de receção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos constantes do bilhete de identidade ou de outro documento oficial que permita a identificação (cfr. n.º 3 do artigo 228.º do CPC).
Quando a carta seja entregue a terceiro, cabe ao distribuidor do serviço postal adverti-lo expressamente do dever de pronta entrega ao citando (cfr. n.º 4 do artigo 228.º do CPC). Nestes casos, de entrega da carta a terceiro, deverá ainda ser enviada carta registada ao citado, comunicando-lhe a data e o modo por que o ato se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada (cfr. artigo 233.º do CPC).
O envio desta (segunda) carta registada - no prazo de dois dias úteis, após se mostrar que a citação terá sido efetuada em pessoa diversa do citando - constitui uma formalidade complementar que visa reforçar os mecanismos de conhecimento da pendência da execução fiscal, não constituindo condição da citação; pelo que o seu incumprimento não gera falta de citação. Tanto nos casos em que a carta é entregue ao citando como naqueles em que a entrega é feita a terceiro, a citação por via postal considera-se feita no dia em que se mostrar assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário (cfr. artigo 230.º, n.º 1, do CPC) e só ocorrendo falta de citação se o destinatário alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento da citação, por motivo que não lhe seja imputável, conforme resulta do artigo 190º, n.º 6, do CPPT – o que não ocorreu no caso dos autos, conforme acima já se deixou expresso.
A este propósito, veja-se, o acórdão do TCAN, de 26.10.2023, processo n.º 00269/23.2BEVIS, que expressamente refere no seu sumário:
“ VI - A citação considera- se efectuada no dia em que se mostre assinado o aviso de recepção e temse por efectuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário (cfr. artigo 238.º, n.º 1 do CPC, aplicável ao tempo, correspondente ao actual artigo 230.º), e só ocorre falta de citação se o destinatário alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento da citação, por motivo que não lhe seja imputável, conforme resulta do artigo 190.º, n.º 6, do CPPT.”
A este propósito, veja-se também os acórdãos do TCAN, de 20.01.2011, processo n.º 00572/06.6BEPRT, de 29.01.2015, processo n.º 00307/13.7BECBR e do Tribunal da Relação de Lisboa, de 29.09.2022, processo n.º 1969/09.2TBCSC- CL1- 2, sendo que este último refere:
“ I) A citação efectuada em pessoa diversa do citando, encarregue de lhe transmitir o conteúdo do acto, é equiparada à citação pessoal, presumindo- se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento, considerando- se a citação efetuada no dia em que se mostre assinado o aviso de recepção e tem- se por efectuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário (cfr. artigo 238.º do CPC, anterior ao de 2013 e artigo 230º, nº 1, do CPC de 2013).
II) Verificando- se que foi remetida carta para citação dirigida para o domicílio do executado, que foi rececionada por terceiro, não ocorreu falta de citação, não tendo o ato sido omitido, nem se verificando qualquer das demais situações que determinariam tal falta.
III) Se a carta for entregue a terceira pessoa, deve esta ser advertida do necessário cumprimento do dever de pronta entrega ao citando e detetando-se que o aviso de receção foi assinado por terceiro e a carta entregue a pessoa diversa do citando, haverá que remeter carta registada ao citado, nos termos e com as prescrições legais (cfr. artigo 241.º do CPC, anterior ao de 2013 e artigo 233.º do CPC de 2013).
IV) O envio desta (segunda) carta registada - no prazo de dois dias úteis, após se mostrar que a citação seja efetuada em pessoa diversa do citando - constitui uma formalidade complementar que visa reforçar os mecanismos de conhecimento da pendência da ação, não constituindo condição da citação, nem do início da contagem do prazo da apresentação de contestação/defesa.
V) O não cumprimento do preceituado no mencionado normativo do artigo 233.º do CPC de 2013 (correspondente ao artigo 241.º do precedente CPC), quando seja legalmente imposto, ou o seu deficiente cumprimento (como a remessa de missiva para morada diversa da do executado), não gera falta de citação (prevista nos art.ºs 187.º, al. a), 188.º, nº 1, als. a), b) ou e) e 189º. do CPC em vigor, correspondentes aos artigos 194.º, al. a), 195.º, nº 1, als. a), b) ou e) e 196.º do precedente CPC).
VI) A nulidade da citação (a que alude o artigo 191.º, nºs. 1 e 2 do CPC de 2013/artigo 198.º, nºs. 1 e 2, do precedente CPC), com tal fundamento, é apenas arguível pelo citando, dentro do prazo indicado para oferecer a sua contestação, dependendo a procedência dessa nulidade, da alegação e prova pelo citando de que a carta destinada à citação não lhe foi oportunamente entregue pelo terceiro - que a rececionou - e que, por isso, por motivo que não lhe é imputável, não teve conhecimento da citação, sendo que, nos termos do nº 4 deste último artigo, “ a arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado ” .
VI) Ainda que se considere tempestiva a arguição de nulidade da citação, com o mencionado fundamento (envio da correspondência em cumprimento do prescrito no, à data vigente, artigo 241.º do CPC, para morada diversa da do citando), ainda assim, a arguição não conduz à declaração de nulidade da citação, por não se poder concluir que a inobservância de tal formalidade, com o envio assim efetuado, prejudicou o direito de defesa do executado.” (sublinhados nossos)
Também JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário, volume III, 6.ª Edição, 2011, página 379, refere que tanto nos casos em que a carta é entregue ao citando como feita a terceiro, a citação considera-se efetuada no dia em que o aviso de receção tenha sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.
Realça-se, ainda, o acórdão do STA de 09.12.2021, processo nº 01121/21.1BEBRG, cujo sumário refere: “A "advertência" a que se reporta o artigo 233.º do CPC (ex artigo 241.º CPC) tem um mero efeito informativo e não jus-constitutivo da verificação da citação que seja efetuada nos termos do artigo 190.º, n.º 6 do CPPT.” (sublinhado nosso).
Uma última nota para referir ainda que, em momento posterior à supracitada citação do Reclamante (ocorrida em 25.03.2011 – cfr. alínea F) dos factos provados), este requereu ao IGFSS, I.P. o pagamento da dívida do PEF n.º 1102201100225606 e apensos em 60 (sessenta) prestações mensais – cfr. alínea H) dos factos provados – tendo o referido pedido sido deferido em 18.05.2011 por despacho da Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Lisboa II do IGFSS, I.P, - cfr. alínea I) dos factos provados – o que reforça a convicção de que a informação lhe chegou ao conhecimento naquela data e não em dezembro de 2012 – cfr. ponto 1) dos factos não provados.
Assim, dúvidas não existem de que, a dívida mais antiga, referente a 09/2006 deveria ter sido paga até 15.10.2006, o que faz com que, à data do facto interruptivo, não se encontrasse prescrita, raciocínio que se aplica às dívidas dos períodos seguintes.
Atento o exposto, conclui-se, sem necessidade de mais amplas e aturadas considerações, pela improcedência da presente Reclamação.
(…)»

Vejamos, então:

As dívidas exequendas aqui em causa e cujo pagamento está a ser exigido ao executado por reversão e ora Recorrente são relativas a contribuições à Segurança Social respeitantes aos meses de setembro a novembro de 2006, janeiro de 2007 a novembro de 2010 e de dezembro de 2010 a outubro de 2011.

Como vimos supra em matéria de prescrição rege o disposto no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (CRCSPSS), aprovado pela Lei nº 110/2009, de 16 de setembro, que estrou em vigor em 1 de janeiro de 2011.

As eventuais lacunas quanto à relação jurídica contributiva são integradas com recurso às normas da Lei Geral Tributária [cf. alínea a) do artigo 3º do CRCSPSS].

O supratranscrito artigo 187º do CRCSPSS, diz-nos que o prazo de prescrição das dívidas respeitantes a contribuições e cotizações é de cinco anos, prevendo-se nos nº 2 e 3 do mesmo artigo as causas de suspensão e de interrupção do prazo.

Tal como decidido, a prescrição conta-se da data em que a obrigação deveria ter sido cumprida: para as contribuições dos anos de 2006-2010, a partir do dia 15 do mês seguinte àquele a que as contribuições dizem respeito (cfr. artigo 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de julho e o artigo 6.º do Decreto Regulamentar nº 26/99, de 27 de outubro) e para as contribuições do ano de 2011, a partir do dia 20 (cfr. artigo 43.º do Código Contributivo).

O nº1 do artigo 49.º da Lei Geral Tributária (LGT), aplicável atento o disposto na alínea a) do artigo 3.º do CRCSPSS, diz:

1 – A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.

Entretanto, a jurisprudência mais recente dos tribunais superiores, da qual citamos o Acórdão STA de 2018.01.17, proferido no processo nº 01463/17 e ainda os Acórdãos STA de 2016.09.29, Proc nº 0956/16, de 2016.10.12, Proc nº 0984/16 e de 2019.04.10, proferido no processo nº 0147/18.4BEBRG, todos disponíveis em www.dgsi.pt, tem cristalizado o entendimento de que a citação para a execução fiscal tem um efeito jurídico instantâneo (de inutilizar todo o prazo anteriormente decorrido), como também um efeito jurídico duradoiro, isto é, um efeito interruptivo que permanece até ao termo do processo executivo, em conformidade com o disposto no nº 1 do artigo 327º do Código Civil, norma cuja aplicação se deve ao facto de o diploma que define o regime das contribuições à Segurança Social e a atual Lei Geral Tributária nada disporem sobre a matéria.

Vejamos, então, se o ora Recorrente foi ou não citado, como defende.

O ofício de citação foi enviado por carta registada com aviso de receção para o domicílio do Reclamante e ora Recorrido e assinado por terceiro.

Desde já diremos que o decidido na sentença recorrida não merece a censura que lhe é feita.

No processo de execução fiscal as citações pessoais são efetivadas nos termos do Código de Processo Civil (CPC), em tudo o que não for especialmente regulado no CPPT (cf. artigo 192/1 CPPT).

Nos termos do artigo 228º do CPC, a citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de receção, de modelo oficial, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho.

De acordo com o disposto no nº 1 do artigo 230º do CPC, a citação postal considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.

Alega o ora Recorrente não ter tido conhecimento da citação.

Consideramos, todavia, que a mera alegação desse facto não era suficiente para contrariar aquela presunção, e que o Reclamante por quem corria o respetivo ónus, apesar de ter arrolado como testemunha a pessoa que recebeu a cartas e cujo nome constava como tendo assinado o aviso de receção, não conseguiu ilidir tal presunção.

Além da jurisprudência citada na sentença recorrida chamamos à colação o acórdão deste TCAS, o qual foi sufragado pelo mesmo coletivo, em que a atual relatora subscreveu como 2ª Adjunta, no qual se decidiu: «de acordo com o nº 1 do art. 230º do CPC, a citação postal considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário»

Assim se concluindo que o Reclamante e ora Recorrido se tem por citado no dia seguinte ao da assinatura por terceiro do aviso de receção que ocorreu em 2011.03.26, no que respeita ao PEF nº 1102201100225606 e apensos instaurados para cobrança de contribuições dos períodos de setembro a novembro de 2006 e de janeiro de 2007 a novembro de 2010, e em 2012.11.29, no âmbito do PEF nº 1102201201036114, instaurado para cobrança coerciva de contribuições do período de dezembro de 2010 a outubro de 2011, e, logo, interrompido o prazo de prescrição.

Assim se concluindo que as dívidas não estão, pois, prescritas.

Em face do exposto, o recurso só pode improceder.


Relativamente à condenação em custas importa considerar que nos termos dos artigos 527/1 CPC: a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa (…).

Assim, atento o princípio da causalidade, consagrado no artigo 527/2, do CPC, aplicável por força do artigo 2º, alínea e), do CPPT, as custas são pelos Recorrentes, que ficaram vencidos.


Sumário/Conclusões:

I - A obrigação do pagamento das contribuições e das quotizações, devidos à segurança social, prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
II - A citação, enquanto causa interruptiva do instituto da prescrição, transversal a todo o tipo de dívidas (civis, tributárias – art. 49.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) - e equiparadas…), detém e opera com um duplo efeito; instantâneo (interrompe, no sentido de que faz parar a contagem e inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente) e, por outro lado, duradouro (não deixa começar a correr novo prazo de prescrição até ao termo do processo, v.g., em que decorra a cobrança coerciva da dívida) - cfr. Acórdão do STA de 16/02/2022 – proc. 01208/21.0BEBRG.
III - A citação pessoal rege-se pelo disposto no artigo 192.º do CPPT, que, por sua vez, remete para os termos do Código de Processo Civil (CPC), no qual se estipula que a citação pessoal se faz, em regra, por carta registada com aviso de receção.
IV - De acordo com o nº 1 do artigo 230º do CPC, a citação postal considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.


III - Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes que constituem a Subsecção Tributária de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente que decaiu, nos termos expostos.

Lisboa, 18 de setembro de 2025.

Susana Barreto

Luísa Soares

Lurdes Toscano