Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | TELES DE MENEZES | ||
Descritores: | ACIDENTE DE VIAÇÃO PROPRIETÁRIO VEÍCULO AUTOMÓVEL CONDUTOR NÃO IDENTIFICADO FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA | ||
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Nº do Documento: | RP201009091454/06.7TJVNF.P1 | ||
Data do Acordão: | 09/09/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA. | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | O proprietário de veículo, sobre quem impende a obrigação de segurar, não o fazendo, é também – solidariamente com o FGA – responsável pelo ressarcimento dos danos causados pelo veículo tripulado por condutor cuja identificação não foi possível apurar, desde que não prove a utilização abusiva dele ou que foi utilizado no interesse doutrém. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 1454/06.7TJVNF.P1 (26.05.2010) – 3.ª Teles de Menezes e Melo – n.º 1161 Des. Mário Fernandes Des. Leonel Serôdio Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. B……… intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra C…….. e Fundo de Garantia Automóvel, pedindo que ambos os RR. sejam considerados solidariamente responsáveis ou apenas o 2º R. (FGA) pelo acidente de viação sofrido pela A. e, em consequência, solidariamente condenados ou apenas o 2º R. (FGA): a) a pagar à A. uma indemnização correspondente a todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em virtude do acidente dos autos, de montante nunca inferior a € 92.508,01; b) a pagar à A. uma indemnização a acrescer à primeira e referida em a) e cuja total e integral quantificação se relega para posterior liquidação em sede de execução de sentença, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais futuros, decorrentes das várias intervenções cirúrgicas, em número indeterminado, para tratamento e correcção das lesões a nível do punho direito, para correcção da impotência funcional e queixas álgicas que refere – intervenção cirúrgica ao problema do canal cárpico – várias operações plásticas, em número indeterminado, vários internamentos hospitalares, ajuda medicamentosa, ajudas técnicas, acompanhamento técnico quer a nível físico, quer psíquico para superar as consequências psíquicas que este tipo de sequelas causa, despesas hospitalares, vários tratamentos, exames médicos, consultas, sessões de fisioterapia e deslocações a hospitais e clínicas que a A. futuramente tenha que efectuar em consequência das lesões causadas pelo acidente descrito nos presentes autos, montantes esses, actualmente impossíveis de concretizar, mas cuja total e integral concretização e quantificação se relega para posterior execução de sentença a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais futuros; c) a pagar à A. as despesas médicas suportadas com vários internamentos hospitalares, várias intervenções cirúrgicas, tratamentos, consultas médicas na especialidade de ortopedia, psiquiatria, medicina interna, medicina geral e neurologia, com ajuda medicamentosa, vários exames clínicos, várias sessões de fisioterapia, quantia essa que até à presente data alcança o montante total de € 2.252,95 e que desde já se reclama, mas que poderão alcançar montante superior, montante esse, actualmente impossível de concretizar, mas cuja concretização se relega também para execução de sentença; d) a pagar à autora, as despesas suportadas pela autora com deslocações realizadas quer a consultas, quer a exames médicos, quer a sessões de fisioterapia, quer a clínicas, quer aos hospitais, quantia essa que até à presente data alcança o montante total de € 255,06, e que desde já se reclama, mas que poderão alcançar montante superior, montante esse, actualmente impossível de concretizar, mas cuja concretização se relega também para execução de sentença; e) a pagar à A. juros vincendos das referidas indemnizações à taxa legal anual, a contar da data da sua citação e até efectivo e integral pagamento. Alegou que em virtude de acidente provocado pelo primeiro R., que conduzia um veículo de sua propriedade sem seguro de responsabilidade civil automóvel válido e eficaz, com ele embatendo com o veículo da A., que circulava numa via prioritária na qual ele entrou sem ter parado no stop existente na confluência da rua de onde vinha com aquela por onde circulava a A., sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais, que virá ainda a sofrer por via da permanência das sequelas das lesões. Admitindo que o veículo não seja o identificado e que o condutor não seja o 1.º R., deverá ser unicamente condenado o FGA. Contestou o R. C……., invocando a sua ilegitimidade, e afirmando que o carro interveniente no acidente não era dele nem por ele conduzido, embora seja certo que o veículo identificado pela A. é seu e não tem seguro válido e eficaz, dado não circular. Igualmente contestou o R. Fundo de Garantia Automóvel, impugnando por desconhecimento os factos alegados pela A.. E porque o acidente foi a um tempo de viação e laboral, requereu a intervenção principal provocada da Companhia de Seguros D…….., seguradora da A. da área do trabalho. Replicou a A., pugnando pela improcedência da excepção dilatória invocada e pedindo a condenação do Fundo de Garantia Automóvel como litigante de má-fé, em multa e indemnização a favor dela, compreendendo esta última o reembolso das despesas suportadas por si e os honorários do seu mandatário. Nada opôs ao pedido de intervenção principal provocada da seguradora. Foi admitido o incidente de intervenção principal provocada e ordenada a citação da chamada. D……., S.A. ofereceu articulado, pedindo que a acção seja julgada procedente, relegando-se para liquidação em execução de sentença os montantes que a interveniente venha a suportar. Foi proferido saneador, no qual se relegou para a sentença o conhecimento da excepção de ilegitimidade invocada pelo réu C……... Elaborou-se a condensação, por remissão. Por requerimento de fls. 429 e ss, veio a interveniente D……. alterar e ampliar o pedido, que passa a ser de condenação do R. no pagamento da quantia de € 3.933,39, que já despendeu, bem como o que se liquidar em execução de sentença, quanto aos montantes que venha a suportar. Procedeu-se a julgamento e veio a ser proferida sentença que: a) Condenou os RR. C….. e Fundo de Garantia Automóvel, solidariamente, a pagar à A. o montante de € 52.508,01, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescido de juros de mora desde a citação. b) Condenou os mesmos RR. a pagar à A. a quantia que se liquidar em execução de sentença, referente aos danos patrimoniais e não patrimoniais futuros, decorrentes de ajuda medicamentosa e ajudas técnicas, a nível psíquico, bem como despesas com deslocações a hospitais e clínicas que a mesma futuramente tenha que efectuar em consequência das lesões causadas pelo acidente descrito nos autos. c) Condenou os mesmos RR. a pagar à Companhia de Seguros D……… a quantia de € 3.933,39, que esta já despendeu, bem como o que se liquidar em execução de sentença, quanto aos montantes que venha a suportar. d) Decidiu que a quantia de € 299,28 (referente à franquia), será deduzida das quantias referidas em a) e c), e é apenas da responsabilidade do 1.º R. C........ e) Absolveu os RR. do restante peticionado. II. Recorreram a A. e 1.º R., alegando nesses recursos. A. Conclusões da apelação da A.: ……….. ……….. ……….. B. Conclusões da apelação do 1.º R.: ……….. ……….. ……….. A A. contra-alegou, pedindo a improcedência das alegações do 1.º R. e ainda a ampliação do âmbito do recurso, nestes termos: ……….. ……….. ……….. O FGA contra-alegou em ambos os recursos, pedindo a confirmação da sentença. III. Questões suscitadas nos recursos: Pela A.: - deve fixar-se a quantia de € 45 000,00 pelos danos futuros decorrentes da perda da capacidade de ganho; - os danos não patrimoniais devem fixar-se em € 25 000,00; - outros danos patrimoniais e não patrimoniais futuros decorrentes das lesões sofridas pelo acidente devem relegar-se para liquidação posterior, nos termos do art. 378.º/2 do CPC. Pelo 1.º R.: - nulidade da sentença; - impugnação da matéria de facto; - diverso enquadramento jurídico, com absolvição do R. Pela A., subsidiariamente e ampliando o âmbito do recurso, para a hipótese de procederem as conclusões do 1.º R.: - Deve a acção ser decidida em conformidade com as conclusões da sua alegação de recurso, condenando-se o 2.º R. em conformidade. IV. Factos considerados provados na sentença: 1) A autora tinha, à data do acidente dos presentes autos, 20 anos de idade, já que nasceu em 16 de Setembro de 1982 (A). 2) À data do acidente a autora encontrava-se segura na interveniente por contrato de seguro do Ramo Acidentes de Trabalho, titulado pela apólice nº10/176.808 (B). 3) No passado dia 4 de Junho de 2003, cerca das 23.30 horas, na Avenida …., freguesia de …., concelho e comarca de Vila Nova de Famalicão, ocorreu um acidente de viação, no qual intervieram os seguintes veículos automóveis: - um veículo ligeiro de passageiros, de serviço particular, matrícula ..-..-LJ, propriedade de C....... e conduzido por indivíduo não apurado; e - um veículo ligeiro de passageiros, de serviço particular, matrícula VA-..-.., de propriedade e conduzido por B………. e aqui autora (1.º). 4) O supra referido veículo ligeiro de passageiros, matrícula ..-..-LJ, à data do acidente dos presentes autos (04.06.2003) circulava sem beneficiar de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel válido e eficaz que cobrisse a sua responsabilidade civil emergente de acidente de viação (2.º). 5) O primeiro réu (C……..) era, à data do sinistro dos presentes autos (04.06.2003) o proprietário do veículo ligeiro de passageiros, matrícula ..-..-LJ (3.º). 6) A autora B……, conduzia o veículo matrícula VA-..-.., na Avenida ….., freguesia de ….., concelho de Vila Nova de Famalicão, no sentido de marcha Poente/Nascente (Vila do Conde/Vila Nova de Famalicão), isto atento o seu sentido de marcha (4.º). 7) Seguia a uma velocidade de cerca de 40 kms/h (6.º). 8) Com as luzes de cruzamento (médios) do seu veículo acesas (ligadas) (7.º). 9) Rigorosamente dentro da sua metade direita da faixa de rodagem, bem junto à berma direita (8.º). 10) A Avenida da Indústria, no local onde ocorreu o acidente de viação dos autos e atento o sentido de marcha da Autora (Vila do Conde/Vila Nova de Famalicão), entronca pela sua esquerda com a Rua do Vau, rua esta proveniente do lugar da Colina do Vale (9.º). 11) Também no mesmo dia, mesma hora e no mesmo local, o veículo ..-..-LJ de propriedade do primeiro réu C…….., circulava na Rua do Vau provindo do Lugar da Colina do Sol, e em direcção à Av. da Indústria (10.º). 12) Para mais, aproximando-se de um sinal vertical de S.T.O.P. existente na berma direita da referida Rua do Vau por onde circulava e atento o seu sentido de marcha, sinal esse que lhe era então perfeitamente visível (14.º). 13) Sucedeu porém, que, quando o veículo VA-..-.. conduzido pela autora, se encontrava paralelamente ao referido entroncamento existente à sua esquerda e proveniente da Rua do Vau (lugar da Colina do Sol) (15.º). 14) O veículo ..-..-LJ, de propriedade do réu C……., proveniente da Rua do Vau, com o intuito de seguir em frente e dessa forma entrar na referida Av. Da Indústria e dessa forma passar a circular também no sentido de marcha da autora (16.º). 15) Não diminuiu a velocidade que lhe era então imprimida pelo seu condutor, não parou e nem deteve a sua marcha, dessa forma desrespeitando o sinal vertical de STOP existente do lado direito da referida Rua do Vau por onde circulava (18.º). 16) Em acto contínuo, de uma forma súbita, repentina e inesperada, atravessadamente e na perpendicular relativamente ao sentido de marcha da autora, seguiu sempre em frente e dessa forma invadiu por completo, ambas as hemi faixas de rodagem da supra referida Avenida da Indústria por onde já previamente circulava o veículo VA-..-.. conduzido pela a autora (19.º). 17) Dessa forma embatendo o veículo de matrícula ..-..-LJ, violenta e inevitavelmente com a sua parte frontal do lado direito na parte lateral esquerda do veículo VA-..-.., conduzido pela autora, mais concretamente na porta da frente do lado do condutor (20.º). 18) A aqui autora, que conduzia o veículo matrícula VA-..-.., nos supra referidos moldes, ainda tentou evitar ser embatida na sua parte lateral esquerda (porta da frente do lado do condutor), nomeadamente diminuindo a sua velocidade, travando e encostando-se o mais possível para a sua direita bem junto à berma, atendo o seu sentido de marcha (21.º). 19) Mas não o conseguiu (22.º). 20) O embate entre os veículos ocorreu totalmente dentro e a meio da metade direita da faixa de rodagem da Av. da Indústria por onde circulava previamente a autora, atento o sentido de marcha desta (23.º). 21) Ficando nessa mesma metade da faixa de rodagem direita, peças, plásticos, vidros partidos de ambos os veículos intervenientes (24.º). 22) A Rua do Vau, à data e no local onde ocorreu o acidente de viação dos presentes autos, constituía e constitui uma localidade densamente povoada, com grande tráfego de animais, veículos automóveis e ladeada e marginada de ambos os lados por edificações, com saídas directas para a mesma (26.º). 23) A Avenida da Indústria no local onde ocorreu o embate dos autos, à altura do acidente, tinha uma faixa de rodagem, que em toda a sua largura media 7,20 metros (27.º). 24) Dispondo assim cada hemi faixa de rodagem, de uma largura de 3,60 metros (28.º). 25) A Avenida da Indústria, à data e no local onde ocorreu o embate dos autos, atento o sentido e marcha da autora (Poente/Nascente -Vila do Conde/Vila Nova de Famalicão) apresentava uma configuração em forma de recta, com uma extensão superior a 200 metros, com boa visibilidade, com a via devidamente sinalizada e perfeitamente nivelada (30.º). 26) Na altura e no local onde ocorreu o embate dos autos, o pavimento alcatroado/betuminoso da referida Avenida da Indústria encontrava-se em bom estado de conservação (31.º). 27) Na altura e no local onde ocorreu o embate dos autos, o pavimento alcatroado/betuminoso da Avenida da Indústria encontrava-se seco em face das boas condições climatéricas que se faziam sentir na altura (tempo limpo e seco) (32.º). 28) À hora e no local onde ocorreu o embate dos autos já fazia noite (23 horas e 25 minutos) (33.º). 29) A Avenida da Indústria à data e no local do embate dos autos dispunha de uma faixa de rodagem única com dois sentidos de trânsito, com marcação de vias (34.º). 30) Acresce que, logo a seguir ao local onde ocorreu o embate dos presentes autos e sensivelmente a cerca de 4/5 metros do mesmo, atento o sentido de marcha da autora (Poente/Nascente -Vila do Conde/Vila Nova de Famalicão), existe uma passadeira destinada à travessia da via por peões, devidamente assinalada no solo (36.º). 31) Como consequência directa e necessária do supra descrito acidente de viação (colisão lateral esquerda), a autora sofreu múltiplos ferimentos e lesões traumáticas, tendo dado entrada no Serviço de Urgência do Hospital de São João de Deus S.A. em Vila Nova de Famalicão, em 05.06.2003 pelas 00:19 horas onde foi observada (37.º). 32) Apresentou traumatismo do crânio, da coluna vertebral e do membro superior direito (38.º). 33) A autora, teve alta hospitalar para o seu domicílio do Hospital de São João de Deus S.A. em Vila Nova de Famalicão em 05.06.2003, pelas 03 h 10 m (39.º). 34) A autora, durante o seu internamento no Hospital de São João de Deus S.A. em Vila Nova de Famalicão foi radiografada e foi-lhe aplicada 1 (uma) ampola de paracetamol ev. em 100 ml de soro fisiológico (40.º). 35) Cerca de duas semanas após o acidente dos autos, foi prescrito à autora o uso de colar cervical devido às fortes dores que referia e que usou durante mais de dois meses (41.º). 36) A autora, em 17.06.2003, pelas 17h 35m, foi novamente observada no Hospital de São João de Deus S.A. em Vila Nova de Famalicão, através do episódio de urgência n.º 23036043, tendo-lhe sido diagnosticado: Antecedentes traumáticos, e náuseas e cervicalgias (42.º). 37) A autora, em 07.07.2003, pelas 03h 27m, foi novamente observada no Hospital de São João de Deus S.A. em Vila Nova de Famalicão, apresentando: dor na área pré-cordial com irradiação para o M.S. esquerdo, e foi-lhe administrado Voltaren, Relmus e Diazepam 5 mg (43.º). 38) A autora, em 04.07.2003 e durante cerca de dois meses, cumpriu programa de Medicina Física e Reabilitação na “E……., Lda”, sita na Avª …., … …, … – Loja …, 460 – 103 Vila Nova e Famalicão (44.º). 39) A autora, desde 06.06.2003 a 06.01.2004, foi examinada no “Posto de Enfermagem Lda” (Enfermeiros Unidos), …., sita na Rua …., 129, 4760 – 127 Vila Nova De Famalicão, na especialidade de Ortopedia pelo Sr. Dr. F……., o qual lhe diagnosticou: Do ponto de vista ortopédico mantém cervicalgia e dorsalgia que a impedem de desenvolver a sua actividade profissional com regularidade (45.º). 40) À data do embate a autora era técnica de laboratório químico – preparadora de laboratório (46.º). 41) A autora, foi internada durante uma semana e recebeu tratamento médico no Hospital Privado dos Clérigos no Porto onde realizou RMN (47.º). 42) A autora, em 04.06.2003 e 26.09.2003, recorreu a consultas na Especialidade de Neurologia com o Dr. G…….., o qual lhe diagnosticou: Cefaleias, tonturas, desequilíbrios, perturbações de concentração e da memória com síndrome pós-traumático (48.º). 43) A autora, em 12.08.2003, recorreu a consultas na Especialidade de Neurologia com o Dr. H…….., o qual lhe diagnosticou: Tonturas e vertigens após o acidente de viação dos autos ocorrido em 04.06.2003 (49.º). 44) A autora, em 19.12.2003, recorreu a consultas de Medicina Interna Geral do Dr. I………, o qual lhe requisitou um electroencefalograma e lhe diagnosticou: TCE, e Cefaleias intensas (50.º). 45) A autora, em 18.02.2004, recorreu a consultas na Especialidade de Psiquiatria com o Dr. J……., tendo sido medicada com Seroxat, Bromalex, Remeron 15 mg, Stugeron e Xanax 1 mg, medicação essa que fez durante cerca de 6 meses, tendo-lhe sido diagnosticado: Depressão ansiosa reactiva; Síndrome psico-orgânico relacionável com traumatismo craneano ocorrido em 04.06.2003 e caracterizada por cefaleias, insónias, tonturas, enjoos, acufenos, parestesias na hemiface esquerda e braço esquerdo, perdas de conhecimento, alterações de memória de fixação e lapsos mnésicos, amenorreia de etiologia; Prognóstico reservado devido ao traumatismo craneano fechado e a haver risco de surgir epilepsia post-traumática; Algias diversas a nível da coluna cervical e lombo-sagrada; Dificuldade de mobilização, e Provavél hernia discal (51.º). 46) A autora, em 05.04.2004, recorreu a consultas na Especialidade de Neurofisiologia com a Dra. K…….., a qual lhe requisitou um Electromiograma ao membro superior direito e lhe diagnosticou: Síndrome do canal cárpico em grau severo com potenciais sensitivos do nervo mediano ausentes (52.º). 47) A autora, em 13.01.2005, foi submetida a um Exame Médico-Legal Psiquiátrico, no Departamento de Psiquiatria do Hospital de S. Marcos em Braga, o qual lhe diagnosticou o seguinte: A partir do acidente de viação dos autos ocorrido em 04.06.2003 passou a ter queixas de vómitos, cefaleias, tonturas lipotímias e insónia; Sinais e sintomas compatíveis com um quadro de síndrome pós-concussional (F07.2 – C.I.D.10) e de uma depressão reactiva prolongada (F43.21 – C.I.D.10) na sequência do acidente de viação ocorrido em 04-06-2003 (53.º). 48) A autora, em consequência do acidente de viação dos autos, esteve com as seguintes Incapacidades Temporárias Absolutas e Parciais (ITA) para o trabalho: ITA desde 05.06.2003 a 01.08.2003; ITP de 30% desde 02.08.2003 a 11.09.2003; ITA desde 12.09.2003 a 06.04.2004, data em que ficou clinicamente curada, com alta médica definitiva embora com sequelas permanentes e irreversíveis (54.º). 49) A autora, em 25.01.2005, foi observado na clínica Prof. J. Pinto da Costa, Centro de Medicina Legal, lda, onde lhe foi diagnosticado que a síndrome de canal cárpico resultou do esforço inusitado e violento que a autora efectuou quando no decorrer do acidente de viação dos autos procurou imobilizar-se através da fixação forte no volante do automóvel que conduzia, fazendo pressão com os membros superiores sobre essa parte do veículo (55.º). 50) A autora, em 30.11.2005, recorreu a consultas de Ortopedia do Dr. L…….., o qual lhe diagnosticou: Raquialgia residual, com mais queixas na região cervical (56.º). 51) A autora apresenta as seguintes lesões e/ou sequelas, resultantes do acidente: - crânio: síndrome de stress pós traumático manifestado por labilidade emocional, alteração da memória, insónias, irritabilidade fácil, dificuldade de concentração, episódios de dislexia, tonturas, cefaleias, humor triste e episódios de agressividade (57.º). 52) A autora, esteve e estará dependente de ajudas medicamentosas e ajudas técnicas (60.º). 53) Em consequência do acidente dos autos a autora ficou com uma IPG fixável em 15% (61.º). 54) Incapacidades essas, que como é obvio lhe reduzem a sua capacidade futura de ganho nessa mesma proporção (62.º). 55) A autora, em consequência das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas actuais e permanentes causadas pelo acidente dos autos, sente actualmente – e sentirá no futuro - dificuldades acrescidas e necessidade de realizar esforços suplementares no seu dia-a-dia laboral de técnica de laboratório químico -preparadora de laboratório - e outras categorias profissionais semelhantes, bem como dores e dificuldades, que até à data do embate não sentia (63.º). 56) Antes e à data do acidente de viação dos presentes autos, a autora era uma pessoa saudável, robusta e sadia, expedita, diligente, dinâmica e trabalhadora (69.º). 57) E sem qualquer deficiência ou incapacidade física ou orgânica que lhe dificultasse a sua normal vida pessoal e profissional e a diminuísse física e esteticamente (70.º). 58) E era uma pessoa calma, amante da vida, confiante, cheia de projectos para o futuro, atlética, desportiva, com alegria de viver, dinâmica, calma e detentora de um temperamento afável e generosa que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas (71.º). 59) A autora, à data do acidente dos presentes autos, exercia actual e habitualmente a categoria profissional de técnica de laboratório químico -preparadora de laboratório (72.º). 60) A autora, pelo exercício da sua categoria profissional de técnica de laboratório químico - preparadora de laboratório - auferia à data do acidente de viação dos autos um salário mensal ilíquido de 478,29€, correspondendo a quantia mensal de 389,50€ a título de vencimento base, a quantia mensal de 66,00€ a titulo de subsídio de alimentação e a quantia mensal de 22,79€ a título de subsídio de turno (73.º). 61) Por força das lesões sofridas com o acidente de viação dos autos, a autora teve necessidade de ser submetida a vários internamentos hospitalares, a várias intervenções cirúrgicas, de efectuar vários tratamentos, de recorrer a várias consultas médicas nas Especialidades de Ortopedia, Psiquiatria, Medicina Interna, Medicina Geral e Neurologia, de ajuda medicamentosa, de efectuar vários exames clínicos e de efectuar várias sessões de fisioterapia, tendo despendido até à presente data em tais despesas médicas a quantia que de momento alcança o montante total de 2.252,95€ (74.º). 62) A autora, para se deslocar, quer a consultas, quer a exames médicos, quer a sessões de fisioterapia, quer a clínicas, quer aos hospitais viu-se obrigada a recorrer aos serviços de táxi e ambulância, tendo em tais deslocações despendido até à presente data a quantia de 255,06€ (75.º). 63) A autora, em consequência das referidas lesões traumáticas sofridas com o acidente dos autos, sofreu múltiplas, frequentes e intensas dores durante todo o tempo que mediou entre o acidente, os vários internamentos hospitalares, os vários tratamentos, as várias sessões de fisioterapia, as várias intervenções e operações cirúrgicas a que foi submetida todos eles também bastante dolorosos, o período de convalescença, o período de incapacidade temporária absoluta e temporária e a sua recuperação ainda que parcial (76.º). 64) Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, a autora, padece actualmente de alterações de humor, do sono e alterações afectivas (80.º). 65) A autora, antes e à data do acidente de viação dos presentes autos, era uma pessoa sem qualquer incapacidade física, alegre, dinâmica, confiante, cheia de projectos para o futuro, cheia de vida, possuidora de uma enorme vontade de viver, sendo uma pessoa calma detentora de um temperamento afável e generoso que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas (86.º). 66) A autora, actualmente e desde a data do acidente de viação dos autos, devido às lesões traumáticas sofridas e às sequelas actuais e permanentes de que a mesma padece -e continuará a padecer no futuro -tornou-se uma pessoa triste, introvertida, abalada psiquicamente, deprimida, angustiada, sofredora, insegura, receosa de que o seu estado de saúde piore e desgostosa da vida (87.º). 67) A autora, sente-se actualmente e desde a data do acidente infeliz, desgostosa da vida, inibida e diminuída física e esteticamente (88.º). 68) Estando afectada psiquicamente e consciente das suas limitações (89.º). 69) A autora, sente-se actualmente e desde a data do acidente abalada, deprimida, introvertida, angustiada, triste, insegura, introvertida, muito nervosa (90.º). 70) O aqui 2.º Réu (FGA), em 19.01.2004 procedeu ao pagamento à autora de todos os danos materiais causados no veículo VA-..-.. de sua propriedade os quais orçaram a quantia de 647,72€ (94.º). 71) O aqui 2.º Réu (FGA), procedeu ao pagamento de todas as despesas médicas e hospitalares junto das entidades hospitalares que prestaram tratamento médico e hospitalar à autora (95.º). 72) O 2º réu (FGA) procedeu ao reembolso junto da interveniente Açoreana, da quantia de €4.818,19, referente a períodos de ITA e ITP, despesas médicas e medicamentosas, no âmbito da cobertura de acidentes de trabalho (96.º). 73) Nos serviços do Ministério Público deste Tribunal, correu termos processo de investigação criminal com o nº1156/03.6GAVNF, no qual o aqui réu fora constituído arguido, onde após o decurso de toda a investigação, nomeadamente, os depoimentos da aqui autora, do aqui réu e testemunhas, foi o respectivo processo arquivado (97.º). 74) O condutor do veículo LJ pôs-se em fuga não tendo sido possível a sua identificação (99.º). 75) Ao abrigo do referido contrato de seguro, a ora interveniente assistiu a autora, tendo suportado todas as despesas médicas e medicamentosas, bem como pago os períodos de ITA e ITP, até à data da alta da autora que ocorreu no dia 06/04/04 (103.º). 76) À data da alta médica a autora foi considerada curada sem desvalorização para o trabalho (104.º). 77) A autora por não se conformar com o facto de lhe ter sido dada alta sem desvalorização, recorreu ao Tribunal de Trabalho, encontrando-se a correr termos no Tribunal de Trabalho de Vila Nova de Famalicão, uma acção com o nº80/05.2TJVNF (105.º). 78) Os referidos autos aguardam a realização de novo exame por junta médica, porquanto as partes não concordam com o coeficiente de desvalorização (106.º). 79) Até à data da alta médica da autora, a ora interveniente teve despesas no valor de €4.818,19 (quatro mil oitocentos e dezoito euros e dezanove cêntimos), referente a períodos de ITA e ITP, despesas médicas e medicamentosas, sendo que a ora interveniente ainda liquidou a quantia de €3.933,39 a título e despesas no período compreendido entre 28/04/05 e 2/11/07 (107.º). 80) A quantia de € 4.818,19 foi apresentada ao FGA, tendo este liquidado as despesas (108.º). V. Começaremos por tratar as questões colocadas pelo 1.º R., na medida em que antecedem, logicamente, as demais. O primeiro tema abordado pelo apelante consiste na nulidade da sentença. Apesar de invocar os art.s 659.º/3 e 668.º/1-b) do CPC, que se reportam, inquestionavelmente, à sentença, o recorrente extrai a invocada nulidade de no texto daquela não existir “uma única referência a documentos ou depoimentos que suportem a prova de quaisquer factos” e, mais adiante, afirma que “Inexiste, em toda a sentença proferida pelo tribunal a quo qualquer fundamentação de facto quanto à matéria que aquele tribunal deu como provada”. Confunde, pois, o recorrente a fundamentação da sentença, cuja falta faz surgir a nulidade prevista no art. 668.º/1-b), com a fundamentação do julgamento da matéria de facto, em cujo despacho ou acórdão se deve explanar o raciocínio do julgador, mediante a análise crítica das provas, com especificação dos fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (art. 653.º/2). Ora, nem a sentença é nula por falta de fundamentação de facto e de direito, visto que dela constam os factos provados e sobre eles incidiu a apreciação jurídica da Sr.ª Juiz, nem a decisão da matéria de facto é inexistente, porquanto no despacho respectivo se indicaram as razões que levaram a Julgadora a considerar provados ou não provados os factos propostos na base instrutória. Como seja, esta última deficiência, quando ocorre, apenas dá lugar, a requerimento da parte, a que se possa determinar a sua supressão pela 1.ª instância (art. 712.º/5). Não ocorre pois nenhuma nulidade da sentença. Seguidamente, o apelante insurge-se contra as respostas aos quesitos que deram o seu veículo como interveniente no acidente. Concretamente, pede que se alterem as respostas aos quesitos 1.º, 2.º, 10.º, 16.º e 20.º, por forma a que o 2.º tenha resposta negativa e dos demais se retire a menção ao seu veículo, substituindo-a por veículo de matrícula não apurada. ……….. ……….. ……….. Por isso, mantêm-se as respostas aos quesitos impugnados. Finalmente, o apelante entende que mesmo que se não alterem as respostas, ficando, por isso, provado que foi o seu veículo que interveio no acidente, não se verificam em relação a si os requisitos da responsabilidade civil extracontratual, dado que se não provou que era ele o condutor. Na sentença considerou-se o 1.º R. parte legítima, porquanto o Fundo de Garantia Automóvel deve ser demandado em litisconsórcio necessário passivo com o responsável civil, sendo que neste conceito se engloba não só o condutor do veículo, como também o dono dele que não tenha feito prova da sua utilização abusiva, o que, efectivamente, o R. não somente não provou como também não alegou. E, depois, considerou-se que esse condutor desconhecido agiu com culpa exclusiva, ocorrendo relativamente a ele os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos consagrados no art. 483.º do CC. Decidiu-se bem. O art. 29º/6 do DL 522/85, de 31 de Dezembro, estabelece que, as acções destinadas à efectivação de responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, quando o responsável seja conhecido e não beneficie de seguro válido ou eficaz, devem obrigatoriamente ser interpostas contra o Fundo de Garantia Automóvel e o responsável civil sob pena de ilegitimidade. O responsável civil de que fala a norma é aquele sobre quem impende a obrigação de segurar que, segundo o art. 2.º/1 é o proprietário, contra quem, se satisfizer a indemnização, o FGA pode exercer direito de regresso (art. 25.º/3). Dispõe o art. 503.º/1 do CC que aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação. A direcção efectiva do veículo tem-na, em primeira linha, o proprietário, o usufrutuário, o adquirente com reserva de propriedade, o comodatário, o locatário, o que o furtou, o condutor abusivo e, de modo geral, qualquer possuidor em nome próprio[1]. Em princípio, a responsabilidade recai sobre o proprietário, o qual não é, todavia, responsável se, pelo acto de aquisição da propriedade, não tomou a direcção efectiva do veículo ou se a perdeu por qualquer circunstância[2]. Também se exclui a responsabilidade do proprietário se o veículo, quando do acidente, era utilizado abusivamente por pessoa não autorizada a utilizá-lo, por ser o utilizador abusivo quem tinha, nesse momento, a direcção efectiva e o utilizava no próprio interesse[3]. Assim, o proprietário responsável é quem efectivamente o seja no momento do acidente, conforme doutrina do assento de 31.05.1966, que os autores mencionados consideram aplicável ainda hoje[4]. A direcção efectiva do veículo é o poder real (de facto) sobre o veículo e constitui o elemento comum a todas as situações referidas, sendo a falta dele que explica, em alguns casos, a exclusão da responsabilidade do proprietário. Tem a direcção efectiva aquele que, de facto, goza ou usufrui as vantagens do veículo, e a quem, por essa razão, cabe especialmente controlar o seu funcionamento[5]. O requisito – utilização no próprio interesse – visa afastar a responsabilidade objectiva daqueles que, como o comissário, utilizam o veículo, não no seu próprio interesse, mas em proveito e às ordens de outrem[6]. Deste modo, o proprietário de veículo, sobre quem impende a obrigação de segurar, não o fazendo, é também responsável pelo ressarcimento dos danos, desde que não prove a utilização abusiva dele ou que foi utilizado no interesse doutrem. Responde o 1.º R., assim, com base em responsabilidade objectiva, por ser o proprietário sujeito da obrigação de segurar, não o tendo feito, e por não ter alegado, nem provado, a utilização a favor doutrem ou abusivamente, não obstante se ter provado a culpa exclusiva do condutor desconhecido[7]. Assim, embora falte referir na sentença que a responsabilidade do 1.º R. é objectiva, nos termos do art. 503.º/1 do CC, ela não pode ser, de modo algum, afastada. Improcedem, pois, todas as conclusões do recurso do 1.º R. A solução dada à apelação do 1.º R. implica que se não deva conhecer do pedido subsidiário formulado pela A. apelada na resposta àquela. Passemos, agora, à apreciação da apelação da A. Defende a apelante que pela perda da capacidade de ganho decorrente da IPG que lhe foi atribuída deve receber a indemnização de € 45 000,00. Na sentença fixou-se esta indemnização parcelar em € 35 000,00. Vejamos os factos: 51) A autora apresenta as seguintes lesões e/ou sequelas, resultantes do acidente: - crânio: síndrome de stress pós traumático manifestado por labilidade emocional, alteração da memória, insónias, irritabilidade fácil, dificuldade de concentração, episódios de dislexia, tonturas, cefaleias, humor triste e episódios de agressividade (57.º). 52) A autora, esteve e estará dependente de ajudas medicamentosas e ajudas técnicas (60.º). 53) Em consequência do acidente dos autos a autora ficou com uma IPG fixável em 15% (61.º). 54) Incapacidades essas que lhe reduzem a sua capacidade futura de ganho nessa mesma proporção (62.º). 55) A autora, em consequência das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas actuais e permanentes causadas pelo acidente dos autos, sente actualmente – e sentirá no futuro - dificuldades acrescidas e necessidade de realizar esforços suplementares no seu dia-a-dia laboral de técnica de laboratório químico - preparadora de laboratório - e outras categorias profissionais semelhantes, bem como dores e dificuldades, que até à data do embate não sentia (63.º). 59) A autora, à data do acidente dos presentes autos, exercia actual e habitualmente a categoria profissional de técnica de laboratório químico -preparadora de laboratório (72.º). 60) A autora, pelo exercício da sua categoria profissional de técnica de laboratório químico - preparadora de laboratório - auferia à data do acidente de viação dos autos um salário mensal ilíquido de 478,29€, correspondendo a quantia mensal de 389,50€ a título de vencimento base, a quantia mensal de 66,00€ a titulo de subsídio de alimentação e a quantia mensal de 22,79€ a título de subsídio de turno (73.º). 64) Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, a autora, padece actualmente de alterações de humor, do sono e alterações afectivas (80.º). 65) A autora, antes e à data do acidente de viação dos presentes autos, era uma pessoa sem qualquer incapacidade física, alegre, dinâmica, confiante, cheia de projectos para o futuro, cheia de vida, possuidora de uma enorme vontade de viver, sendo uma pessoa calma detentora de um temperamento afável e generoso que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas (86.º). 66) A autora, actualmente e desde a data do acidente de viação dos autos, devido às lesões traumáticas sofridas e às sequelas actuais e permanentes de que a mesma padece - e continuará a padecer no futuro -tornou-se uma pessoa triste, introvertida, abalada psiquicamente, deprimida, angustiada, sofredora, insegura, receosa de que o seu estado de saúde piore e desgostosa da vida (87.º). 67) A autora, sente-se actualmente e desde a data do acidente infeliz, desgostosa da vida, inibida e diminuída física e esteticamente (88.º). 68) Estando afectada psiquicamente e consciente das suas limitações (89.º). 69) A autora, sente-se actualmente e desde a data do acidente abalada, deprimida, introvertida, angustiada, triste, insegura, introvertida, muito nervosa (90.º). Se a jurisprudência tem vindo, maioritariamente, a considerar o dano biológico como de cariz patrimonial, indemnizável nos termos do art. 564.º, n.º 2, do CC[8], não há dúvida que a IPG da A. tem repercussão na sua capacidade futura de ganho, conforme se diz expressamente nos factos provados – cfr. facto 54. O valor indemnizatório nos danos futuros não é directamente determinável e quantificável, devendo recorrer-se à equidade na determinação do quantum (artº 566º/3 CC), dentro dos limites que se tiverem por provados, tendo presente que a quantia encontrada deve representar um capital produtor de rendimentos que no final se extinga, capaz de cobrir aquilo que se perdeu em ordem a obter a satisfação equivalente. A utilização das tabelas financeiras tem-se revelado de grande utilidade. Mas sempre temperadas com a equidade. A jurisprudência tem-se orientado pela solução de que o capital que constituirá a indemnização deve produzir um rendimento ao juro anual (antes de 9% ), e a seguir 4% ou até inferior, face à tendência da descida e à líquido pago pelas instituições financeiras aos depósitos a prazo oscila, ainda por cima nesta conjuntura, cuja evolução não é previsível. Assim, muito embora se lance mão das tabelas financeiras, o critério legal é o que resulta do art. 566º do CC, que consagra a teoria da diferença, com recurso à equidade, pela dificuldade de cálculo do valor exacto dos danos (n.º 3)[9]. É, pois, necessário atender a diversos factores, nomeadamente ao tempo provável de vida da A., não apenas útil, mas real, porquanto a desvalorização subsistirá até à morte da apelante. Não obstante, a quantia encontrada na sentença afigura-se-nos ajustada à situação descrita, pelo que é de manter. Em seguida, a apelante insurge-se contra a indemnização fixada por danos não patrimoniais, pretendendo vê-la alterada para € 25 000,00. Na sentença atribuíram-se-lhe € 15 000,00. Pensamos que esta quantia é adequada. Na estipulação deste valor não se dispensa o recurso à equidade, conforme dispõe o art. 496º/3 do CC. O julgamento pela equidade “é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar determinado problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas; distingue-se do puro julgamento jurídico por apresentar menos preocupações sistemáticas e maiores empirismo e intuição”[10]. Remetendo a norma citada para o art. 494º, há que atender ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica dele e do lesado e às demais circunstâncias do caso, como sejam as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, sem deixar de analisar os padrões geralmente adoptados na jurisprudência, bem como as flutuações do valor da moeda[11]. A quantia arbitrada não é simbólica, servindo de efectiva compensação pelos padecimentos passados e futuros da A. Se analisarmos as conclusões do exame médico de fls. 505 a 512, verificamos que a A. consolidou as lesões quase um ano após o acidente, tendo-lhe sido fixado o quantum doloris no grau 3; embora as sequelas sejam compatíveis com o exercício da profissão que tinha, implicam esforços suplementares e a A. ficou com um prejuízo de afirmação pessoal de 3/5. Embora estes elementos, completados pelos factos provados que dizem respeito a este tipo de dano, sejam relevantes, não podem considerar-se, comparativamente com outros, muito graves. Por isso, a indemnização arbitrada afigura-se-nos correcta. Finalmente, a apelante, reportando-se à quantia que lhe deve ser paga pelos RR. por danos patrimoniais e não patrimoniais futuros, decorrentes das ajudas medicamentosa e técnica, a nível psíquico, de deslocações a hospitais e clínicas, que haja de efectuar em consequência das lesões sofridas com o acidente, diz que a mesma em vez de ser apurada em liquidação em execução de sentença, como refere a sentença, deve sê-lo mediante o incidente referido no art. 378.º/2 do CPC, pelo que a sentença deve ser corrigida nessa parte. Foi a A. quem, na al. b) do petitório, pediu o apuramento do mencionado quantitativo em liquidação em execução de sentença. Aliás, em consonância com o disposto no n.º 2 do art. 661.º do CPC, que na altura tinha uma redacção conforme com o pedido formulado, só tendo vindo a ser alterada pelo DL 38/2003, de 08.03 que, segundo o seu art. 23.º, entrou em vigor em 15.09.2003. Agora, em vez da anterior expressão “no que se liquidar em execução de sentença”, a norma refere “no que vier a ser liquidado”. O incidente de liquidação está conexionado com o disposto no art. 471.º do CPC, que permite a formulação de pedidos genéricos quando, nomeadamente, não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito (al. b) do n.º 1). Dizia Salvador da Costa[12], que a utilização deste incidente não era obrigatória, por poder o autor ou o reconvinte conseguir a liquidação nos termos dos art.s 661.º/2, 806.º a 810.º. No entanto, após as alterações ao CPC mencionadas, a liquidação da obrigação no requerimento executivo é feita nos termos do n.º 1 do art. 805.º (art. 810.º/3-c)), isto é, quando for ilíquida a quantia em dívida, devendo, então, o exequente especificar os valores que considera compreendidos na prestação devida e concluir o requerimento executivo com um pedido líquido. Já em caso de condenação genérica, nos termos da previsão do n.º 2 do art. 661.º, o tribunal condenará o réu no que vier a liquidar-se, já não na fase liminar do processo executivo que se seguir, mas na própria acção declarativa, por imposição dos art.s 47.º/5 e 378.º/2[13]. Por conseguinte, em vez da condenação dos RR. na “quantia que se liquidar em execução de sentença”, corrige-se a mesma para “quantia que se liquidar”. Face ao exposto, julgam-se as apelações improcedentes, confirmando-se a sentença, excepto no que concerne à mencionada rectificação da al. b) do dispositivo. Custas de cada um dos recursos pelos respectivos recorrentes, sem prejuízo do apoio judiciário. Porto, 9 de Setembro de 2010 Trajano A. Seabra Teles de Menezes e Melo Mário Manuel Baptista Fernandes Leonel Gentil M. Serôdio ___________________ [1] Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anot., I, 2.ª ed., p. 446 [2] Ibid. [3] Ibid. [4] Ibid. [5] Ibid. e p. 447 [6] Ibid., p. 447 [7] Acórdãos desta Relação de 26.01.2009, Porc. 0857168, de 27.03.2006, Proc. 0650592, de 23.03.2006, Proc. 0534373, e do STJ de 05.05.2010, Proc. 130/02.4GFSTB.E1.S1, de 15.04.2010, Proc. 355/2002.E1.S1 e de 09.03.2010, Proc. 698/09.4YRLSB.S1, todos em www.dgsi.pt [8] Ac. do STJ de 27.10.2009, Proc. 560/09.=YFLSB-1.ª, www.dgsi.pt [9] Ac do STJ de 04.12.07, www.dgsi.pt/jstj [10] Menezes Cordeiro, O Direito, 122.º-272, citado no ac. desta Relação de 20.04.2010, Proc. 5943/06.5TBVFR.P1, www.dgsi.pt [11] Ibid. [12] Incidentes da Instância, Almedina, 1999, p. 249 [13] Lebre de Freitas, CPC Anot., 2.º, 2.ª ed., p. 684 |