Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP00042275 | ||
| Relator: | MARIA GRAÇA MIRA | ||
| Descritores: | PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PERDA DE INTERESSE DO CREDOR | ||
| Nº do Documento: | RP200903030826492 | ||
| Data do Acordão: | 03/03/2009 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
| Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO. | ||
| Indicações Eventuais: | LIVRO 301 - FLS 254. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - Terminar com a sua colocação on line era aquilo que a Ré, ao contratar, desejava obter, através dos conhecimentos técnicos oferecidos pela A ./Recorrente, de que a primeira, em principio, não dispunha. II - Sendo a A . uma empresa profissional não logrou informar a R. que o seu trabalho apenas poderia ser levado a bom porto com o acesso às passwords, assim tendo omitido um dever acessório do contrato, tornado-o inexequível. III - Assim sendo, a obra não se mostra concluída por facto imputável à A., e tendo em conta o lapso de tempo decorrido e, em concreto, a actividade aqui em causa, é objectivamente constatável a perda de interesse por parte da A . na manutenção do contrato, considerando a mora em que esta incorreu e face ao disposto no 808-°, n-°1, do C. C.. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Cível (1ª Secção), do Tribunal da Relação do Porto: * I – B………., Ldª. intentou acção declarativa especial, ao abrigo do estabelecido pelo DL n.º 269/98, de 1 de Setembro, contra C………., Ldª, peticionando, a final, a sua procedência e a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de € 5.158,23, acrescida de juros de mora calculados à taxa aplicável às transacções comerciais, com fundamento no contrato de prestação de serviços, celebrado em 23/09/05, no âmbito do qual prestou à R. os serviços constantes da factura n.º 251072, emitida e vencida em 28/11/05, no montante supra indicado, que, oportunamente, entregou à última.A R., apresentou oposição, pugnando pela improcedência da acção, alegando, em síntese, que, por banda da A., não foi cumprido o prazo estabelecido na proposta de adjudicação e que, após pagamento desta, não lhe foi disponibilizada a ferramenta informática acordada, para que os seus produtos estivessem “on-line”. “Até à data”, o site não ficou pronto “on line”, conforme tinha sido acordado, na adjudicação efectuada pelas partes. Ou seja, a A., adjudicou um contrato de prestação de serviços em 31/10/2005, cuja conclusão estaria prevista para finais de 2005, o que não se verificou. Procedeu-se a realização da audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo. Seguidamente, foram fixados os factos considerados assentes e proferida decisão que julgou a acção improcedente e, em consequência, a R. foi absolvida do pedido. Inconformada, a A interpôs recurso de apelação, apresentando, oportunamente, alegações, em cujas conclusões, de acordo com o estipulado pelo art.º 690º, do CPC, refere que: 1 – O contrato celebrado consistia, entre outros itens, na construção e desenvolvimento das áreas de design participado, gestor conteúdo avançado, pesquisa, Quem somos e Clientes. 2 – Assim, contrariamente ao referido na sentença recorrida , não era obrigação da Recorrente a colocação do site “on line”, mas sim a sua construção, o que de facto se veio a verificar. 3 – Na verdade, o objectivo último do contrato e proposta era a construção do site com a inserção de conteúdos e programação constantes de contrato e proposta e não a sua colocação on line, sendo a Recorrente alheia ao momento em que a Recorrida pretendia a sua colocação. 4 – Assim, a factura referida é devida, tendo a sentença recorrida violado o disposto nos artºs 1207º, 1208º e seguintes do C.C., porquanto os mesmos não foram interpretados e aplicados com o sentido versado nas considerações anteriores. Termos em que, tal decisão deve ser revogada e substituída por outra que condene a R., em conformidade. Contra alegou a R., defendendo a manutenção da decisão objecto do recurso, dado que, e para além do mais, uma empresa profissional de criação de sites não pode fazer um Web Site sem o colocar on-line, pois, como a própria Recorrente o diz “um website que não comunique é uma moldura de uma quadro sem tela”. II – Corridos os vistos, cumpre decidir. É, em principio, pelo teor das conclusões do/a recorrente que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso (artºs 684º, nº3, 690º, nº3, 660º, nº2 e 713º, nº2, todos do CPC). Assim, de acordo com tais conclusões, supra transcritas, o que há a decidir, neste recurso, é, tão só, verificar se foram violados, ou não, os normativos legais citados (artºs 1207º, 1208º, do C.C.), por parte do Tribunal a quo, ao decidir como decidiu. É o que iremos ver. Como factos provados, temos os seguintes: 1. Autora e Ré celebraram entre si um contrato cujo objecto consistia na “webificação” desta; 2. Nos termos do contrato celebrado comprometeu-se a Autora, para além do mais, no seguinte: “Pretende-se com este projecto uma nova abordagem, em relação ao anterior site, por um site dinâmico dirigido ao negócio da empresa, de conteúdos totalmente administráveis e com uma imagem institucional leve e apelativa, com especial foco na apresentação pormenorizada dos diferentes produtos disponíveis (doc. de fls. 14 a 55, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido); 3. Tal contrato foi celebrado em finais de Setembro de 2005 e o prazo de execução acordado foi de seis semanas a contar da data de aprovação do layout; 4. A Ré dedica-se à importação, exportação e comércio por grosso e a retalho de máquinas, ferramentas e acessórios; 5. Até à presente data, o site não ficou pronto “on line”; 6. Em meados de 2007 foi a Ré contactada pela Autora dizendo esta última que a Ré teria de alterar o apontador de domínio para o servidor desta, não sendo todavia possível proceder a qualquer alteração dos antigos sites da Ré por esta não dispor das respectivas passwords, facto que esta desconhecia e que nunca lhe foi comunicado pela Autora; 7. Em finais de Maio de 2006 o projecto mostrava-se concluído em termos de programação e de inclusão de conteúdos; 8. O site da Ré teria que incluir uma apresentação detalhada e organizada de todos os produtos da mesma, tendo a Autora que disponibilizar uma ferramenta informática para que o catálogo de produtos da Ré fosse facilmente introduzido na construção do site por parte da Autora; 9. O que não veio a acontecer até Dezembro de 2005; 10. Até Dezembro de 2005 não incluía o projecto a funcionalidade de carrinho de compras, dirigido quer a consumidores finais, quer a retalhistas quer a grossistas; 11. Até à data referida no n.º 7, a Ré aceitou os sucessivos atrasos da Autora; Debrucemo-nos, então, sobre o suscitado pela R., neste recurso. Não existem dúvidas de que estamos perante um contrato de prestação de serviços, na modalidade de empreitada, aplicando-se-lhe as regras próprias do regime normativo especial previsto pelos artºs. 1207º ("Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço") e seguintes, do Código Civil (cfr., art. 1156º, CC). Este tipo de contrato comporta, como seus elementos intrínsecos: - duas partes (o empreiteiro e o dono da obra); - a realização de uma obra - resultado material (de construção, criação, reparação, modificação ou demolição de uma coisa); - em contrapartida de um preço - retribuição (Pedro Romano Martinez, Contrato de Empreitada, Almedina, págs. 65 a 114), sem que exista um vínculo de subordinação do empreiteiro em relação ao dono da obra (como é característico do contrato de trabalho). “O empreiteiro age sob sua direcção, com autonomia, não sob as ordens ou instruções do comitente, estando apenas sujeito à fiscalização do dono da obra” (Pires de Lima-Antunes Varela, Código Civil Anotado, II, 3ªed., pág. 787). Acontece que, sendo um contrato sinalagmático e, por isso, gerador de obrigações para cada um dos contraentes, no caso, a A. – como empreiteira e cuja obrigação era a realização da obra contratada, nos termos referidos acima; enquanto que a contrapartida disso, uma vez satisfeito (e é neste ponto que reside o busílis), por banda da R. - dona da obra, era o pagamento do respectivo preço. Ora, esse pagamento não terá sido efectuado e, daí, a razão de ser da acção. Mas, o que competia à Recorrente/Empreiteira fazer, terá sido devidamente satisfeito? Dos factos assentes, resulta que não. Com efeito, não faz qualquer sentido, para um trabalho como o que foi contratado, não chegar ao seu “destino”. Ou seja, terminar com a sua colocação on line, que era, sem dúvida, a razão de ser do mesmo e aquilo que a Ré, ao contratar, desejava obter, através dos conhecimentos técnicos oferecidos pela A ./Recorrente, de que a primeira, em principio, não dispunha. Na verdade, tal como bem assinalado na sentença recorrida e resultante da factualidade assente, teria a Ré que disponibilizar os meios, nomeadamente através das passwords, para que tal fosse levado a cabo. Contudo, sendo a A. uma empresa profissional não logrou informar a R. que o seu trabalho apenas poderia ser levado a bom porto com o acesso às referidas passwords. E num País com tantos informático-excluidos, como se nos afigura ser a própria R., concluímos que, de forma grave, a A., omitiu um dever acessório do contrato, tornado-o inexequível. E, note-se que só posteriormente foi a R. informada de tal impossibilidade, Assim sendo, concluímos que a obra não se mostra concluída por facto imputável à A., sendo certo que não se vislumbra qualquer forma de sanar o vício aqui em causa (nem tal foi alegado por nenhuma das partes). Assim sendo, e tendo em conta o lapso de tempo decorrido e, em concreto, a actividade aqui em causa, é objectivamente constatável a perda de interesse por parte da A. na manutenção do contrato, considerando a mora em que esta incorreu e face ao disposto no art.º 808º, nº1, do C.C.. Portanto, tendo presente o estabelecido pelos normativos citados pela Recorrente, bem como todos os que se mostram invocados na decisão recorrida, com relevância para os artºs 1222º, nº1, 905º, aplicável ex vi do art.º 913º, 342º, nº1, 799º, nº1, 433º, 434º, nº1 e 289º, nº1, todos do C.C., apenas podemos concluir que a decisão tomada pelo Tribunal a quo é, sem dúvida, a que se mostra ajustada ao caso, não nos merecendo qualquer censura. * II- Pelo exposto, acordam em julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.Custas pela Recorrente. * Porto, 3 de Março, de 2009 Maria da Graça Pereira Marques Mira Mário António Mendes Serrano António Francisco Martins |