Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
13886/21.6T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI MOREIRA
Descritores: ADVOGADO
PATROCÍNIO JURÍDICO
CRITÉRIO DA REMUNERAÇÃO
Nº do Documento: RP2025040813886/21.6T8PRT.P1
Data do Acordão: 04/08/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 2. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Na ausência dos critérios previstos no art. 1158º, nº 2 do C. Civil, o recurso a um juízo de equidade para a fixação da remuneração devida a advogado pode estruturar-se sobre a consideração do número de horas tido por adequado para a realização do serviço prestado, bem como sobre o valor da remuneração por hora tido por justo.
II - Na fixação do valor da remuneração por hora serão considerados os critérios previstos no nº 3 do art. 105º do Estatuto da Ordem dos Advogados, designadamente a importância dos serviços prestados, a dificuldade e urgência do assunto, o grau de criatividade intelectual da sua prestação, a resultado obtido, as responsabilidades assumidas e usos profissionais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. Nº 13886/21.6T8PRT.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Central Cível do Porto ...





REL. N.º 948
Relator: Juiz Desembargador Rui Moreira
1º Adjunto: Juiz Desembargador Artur Dionísio do Vale dos Santos Oliveira
2º Adjunto: Juiz Desembargador. Pinto dos Santos



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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO


1 – RELATÓRIO

AA, advogada, intentou acção em processo comum, contra BB e CC, pedindo a condenação destes a pagarem-lhe a quantia de 134.782,00€, a acrescer com juros de mora vincendos à taxa legal, alegando ter-lhes prestado serviços de aconselhamento e patrocínio jurídico, no âmbito da partilha da herança aberta por óbito dos seus avós, cujo preço ascendeu a esse valor e que eles não lhe pagam.
Os RR. contestaram, justificando o desacerto do valor pretendido, ao afirmarem que “Os honorários reclamados são, para além de indevidos, desadequados, porque excessivos, face ao serviço realizado e aos resultados obtidos no âmbito do aludido processo.”. Apontaram a falta de qualquer justificação apresentada como fundamento para o valor contabilizado e concluíram pela sua absolvição do pedido ou que se solicitassem “…laudos ao Conselho Geral daquela Ordem [dos Advogados], para que (…), se pronuncie se o quantum de honorários peticionados pela A. é adequado aos serviços por ela prestados à Ré, pronunciando-se sobre as horas gastas para o tipo de serviços invocados.”
O processo foi saneado, a instância tida por válida e regular e foi colhido parecer junto da O.A., que se pronunciou no sentido de não conceder laudo ao valor de honorários pedido, de 109.000,00€, e afirmando, diferentemente, que haveria de ser concedido laudo se o pedido fosse de 60.000,00€ a acrescer com IVA.
Realizou-se o julgamento, no termo do qual foi proferida sentença que decidiu condenar os RR., solidariamente, a pagarem à autora, a título de honorários, a quantia de €24.000,00 (vinte e quatro mil euros), acrescido de €5.520,00 da taxa legal de IVA, e a quantia de €712,00 (setecentos e doze euros) a título de despesas, tudo a acrescer com juros de mora contados desde a citação até integral pagamento, absolvendo-os do mais que vinha pedido.
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É desta decisão que vem interposto o presente recurso, pela autora, que o termina alinhando as seguintes conclusões:
1- O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, por um lado pela errada interpretação e aplicação das normas dos artºs 1157,1158 do Código Civil, dos artºs 100º e 105º da Lei 145/2015 de 9 de setembro, com as alterações decorrentes da Lei n.º 23/2020, de 6 de julho, e da Lei n.º 79/2021, de 24 de novembro e pela Lei n.º 6 /2024 de 19 de janeiro Conforme versão republicada em 04-04-2024- EOA-, por outro e, nos termos do artº 640 do C.P.C., face à interpretação errada sobre a matéria fáctica, face à prova produzida.
2- A sentença em crise, proferiu errada decisão sobre a matéria de facto, quanto aos pontos 14; 17; 23; 27; 28, 29,30,31 e 33 da matéria dada como provada, pois face à prova produzida importava resposta diversa, bem como, também errónea é a resposta dada às alíneas a) e b) dos factos não provados.
3- Quanto ao ponto 14. por resultar o conteúdo contrário ás declarações prestadas pela Recorrente, gravado através do sistema integrado de gravação digital H@bilus Media Studio na audiência de 13 de Maio de 2024 aos minutos 9:11 a 12:40 deverá ser dada ser alterada a resposta dada, passando a ser a seguinte a redação do mesmo:
“A A. referiu que nessa fase era prematuro fazer uma previsão de honorários, porque não sabia o número dos bens envolvidos, o nível de litígio e se o processo se iria resolver extrajudicialmente ou pela via litigiosa, tendo referido que num processo de inventário poderia ser cobrado uma percentagem sobre o valor dos bens”
4- Quanto ao ponto 17. da matéria dada como provada, “o processo ter ficado parado cerca de 1 ano (entre Março de 2020 a janeiro 2021), resulta claro das declarações prestadas pela testemunha Drº DD gravado através do sistema integrado de gravação digital H@bilus Media Studio no dia 14-02-2024 ás 10h37 e terminado ás 12h22, que o processo esteve parado, por razões de doença do mesmo entre 29.04.2020 a 09.06.2020 e 01.09.2020 a 14.09.2020
5- A resposta dada, também contraria expressamente as resposta dadas aos pontos 37) 38) e alínea 20 do ponto 9), da matéria dada como provada, não esquecendo a prova documental junta aos autos, e não impugnada, nomeadamente da troca de emails datados de 09.06.2020 e de 14 e 18 de Setembro de 2020 e 8 de Outubro de 2020 (requerimento de 10.01.2023 – refª citius 44359674)
6- A resposta dada a este ponto 17º, e no que concerne às avaliações dos imóveis como tendo sido parte da razão de alguma paragem do processo, não corresponde à prova documental junta aos autos, nomeadamente porque contraria a alínea 17 do Ponto 9 da matéria dada como provada, onde expressamente é considerado provado que a A. em 02.09.2019 recebeu e analisou as avaliações dos imóveis.
7- Deverá ser alterada a resposta dada a este ponto, passando a ser a seguinte a redação do mesmo:
“ O processo esteve parado entre 29 de Abril e 02 de Junho e 01 a 14 de setembro de 2020, por motivo de doença do mandatário que representava o outro herdeiro”
8- Quanto ao ponto 23. por resultar o seu conteúdo contrário aos factos dados como provados nas alíneas 1 a 57 do ponto 9, onde estão elencados todos os atos praticados pela A., este ponto restringe de forma errónea os atos praticados, pelo que deverá ser dada ser alterada a resposta dada, passando a ser a seguinte a redação do mesmo:
“ Bem como existiram outros temas levados à A., nomeadamente contas de cabecelato, arrendamentos vigentes, cessão de quota de sociedade comercial, verificação e retificação da participação IS, divisão do veículo automóvel do avô que não foi participado para efeitos de IS, bem como todos os actos constantes do ponto 9 da matéria dada como provada “
9- Quanto aos pontos 27º; 28º, 29º e 30º, devem os mesmos ser eliminados da matéria de facto dada como provada, e ser considerada matéria não provada, por contrária às declarações de parte da A., bem como dos RR, conforme já que os pontos em causa dados como assentes não serem conformes á prova produzida em sede de declarações prestadas em Tribunal, quer pelas próprias partes (quer pela Recorrente quer pelos Recorridos) quer pelos depoimentos das testemunhas, conforme gravação digital H@bilus Media Studio, depoimento de 13.05.2024 11:24m a 12:36m, 14.06.2024- 00:00:46 e 14.06.2024 00:59:15 a 01:00:45
10- Quanto ao ponto 31., não existem quaisquer meios probatórios que confirmem, com alguma verossimilhança, a matéria dada como provada, pois para além, de, segundo a versão do Réu terem dado nota que discordavam de imediato da nota de honorários, saíram para pensar, voltaram para uma segunda reunião, sem que no entanto enviassem qualquer comunicação a dar nota que não aceitavam os honorários, pelo que deverá ser considerado não provado
11- Não podem ser dados como provados factos apenas e só com base nas declarações dos Recorridos, ou em afirmações articuladas em sede de contestação, tanto mais quando como é entendimento jurisprudencial as declarações de parte são sempre consideradas como uma prova de diminuta credibilidade, já que as partes defendem como é obvio a sua posição/interesse no desfecho dos autos, e muito mais quando essas declarações são desprovidas de qualquer outra prova adicional que corrobore as declarações prestadas.
12- Pelo que nessa esteira, quando muito não deveria o Tribunal ter dado como assente nenhuma das versões, e nessa medida cingir-se aos factos em concreto provados.
13- Ressalva-se que os honorários da Recorrente não foram liquidados, tendo sido emitidas desde logo as competentes faturas que se encontram juntas aos autos e cujo o IVA a Recorrente já suportou integralmente.
14- Quanto ao ponto 33. da matéria dada como provada, sempre se dirá que num processo que implicou por parte da Recorrente uma negociação desta monta e por um período de cerca de 3 anos, o tempo total dos serviços prestados ao ser fixado em 400 h não poderá ser considerado como exagerado: um ano tem 12 meses de trabalho, meses esses com 4 semanas cada um e que por sua vez representam com 5 dias de trabalho (8h/dia), se por semana a Recorrente gastasse uma média de 4h e se se multiplicasse essas horas por 10 meses (e não por 12) daria uma média de 160h/ano x 3 anos= obtém-se uma média de 480h de trabalho… ou seja número muito aquém do referido pela Recorrente na sua P.I. e perfeitamente aceitável.
15- Por errada interpretação da prova produzida, quer da prova dada como assente - ponto 9- deverá a resposta ao mesmo, ser alterado e considerar os serviços prestados pela A. aos RR corresponderam por defeito a um total de 400 h, pelo que o ponto 33. Deverá passar a ter a seguinte redação: “ Os serviços totais prestados pela A. aos RR. e referidos em 9) corresponderam a um total de cerca de 400h de trabalho”
16- Pelo que por via disso deverá também ser eliminada alínea b) da matéria dada como não provada.
17- Deverá passar a constar como matéria não provada as alíneas 27º; 28º; 29; 30 e 31º da matéria dada como provada.
18- São aplicáveis ao caso sub judice os artºs 1157º, 1158 nº 2 do Código Civil e artºs 100º e 105º do EOA, devendo atender-se na fixação dos honorários, critérios variados, nomeadamente parâmetros referências como DIFICULDADE E URGÊNCIA, CRIATIVIDADE INTELECTUAL, RESULTADO OBTIDO, TEMPO DESPENDIDO E RESPONSABILIDADE).
19- A A./Recorrente, usou na sua nota de honorários, os critérios identificados em 18 das conclusões, não usando exclusivamente o critério das horas despendidas como forma de retribuição, tendo a sentença usado apenas e só estritamente esse critério e, considerando, ainda que erroneamente que pelo menos durante um ano, dos três que durou, esteve parado, ou seja sem qualquer prestação de trabalho por parte da A./Recorrente !!!
20- Foi emitido Laudo pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados, não tendo sido colocado em causa pelos RR/Recorridos, sem que o mesmo tenha sido objeto de aceitação na sentença proferida e ora em crise, apesar de na mesma não ter sido fundamentada qualquer razão de discordância.
21- A A. Recorrente usou como critério de majoração dos seus honorários, também o resultado obtido, pois o seu preenchimento através do apuramento e determinação dos quinhões, bem como da obtenção do acordo de vontades das partes, na divisão dos bens, na partilha traduziu-se em verdadeira dificuldade, pois sabidamente não é o cálculo da sua definição que importa, mas a sua justa divisão e preenchimento, pois a determinação da quota decorre da lei e do simples cálculo aritmético.
22- A majoração pelo resultado obtido teve como principio que, com a resolução final das partilhas os Recorridos receberam pagamento de tornas e ainda a adjudicação das verbas integrais 2,3 e 5 e 9 e respetivamente ½ das restantes verbas, conforme consta da escritura de partilha, valor do quinhão recebido 1.370.950,00€, por contra ponto à proposta inicial, em que receberiam apenas as verbas 2 e 3 e de tornas 32.310,00 (valor do quinhão 167.250,00 €), para além do valor recebido das contas de cabecelato.
23- Para além de que, as partes encontravam-se em total desacordo quanto à composição desses quinhões e à valoração dos mesmos, razão pela qual concederam os RR/Recorridos o mandato forense à A/Recorrente.
24- Os honorários de um profissional forense não são encontrados mediante a utilização de uma operação aritmética que multiplica o número de horas despendido pelo valor hora fixado pelo Advogado ou acordado pelas partes.
25- Da parte dos Recorridos havia toda uma urgência em resolver as partilhas, até porque tratando-se de jovens em início de vida e de carreira, os valores patrimoniais resultantes da partilha iriam permitir-lhes solidificar as suas posições financeiras e ajudá-los estabilizar financeiramente, o que conseguiram, como de resto se pode verificar pela venda quase imediata de um dos bens recebidos pelo valor de 420.000,00 €
26- No caso em apreço foi em virtude do trabalho desempenhado pela Recorrente e que implicou efetivamente muitas horas de trabalho, conforme documentado nos autos que foi obtido o resultado referido em 22 das conclusões., e que após a escritura os RR agradeceram profundamente à A., agradecimento que depressa esqueceram…
27- Contrariamente ao defendido na sentença sub judice, foi devidamente estudada e ponderada a otimização fiscal evitando que os Recorridos fossem onerados com mais valias, ou sequer pagamento de IMT.
28- O critério de fixação dos honorários não tem e não deve ser calculado matematicamente, mediante a utilização de uma operação aritmética que multiplica o número de horas despendido pelo valor hora fixado pelo Advogado ou acordado pelas partes, ainda que assim se entenda as 160 h fixadas pelo Tribunal são manifestamente insuficientes, para o tempo que a Recorrente efetivamente gastou com este assunto, em manifesto prejuízo de outros processos e casos que poderia ter tratado nesse interregno.
Nestes termos e nos melhores de direito, deverá a sentença ora em crise ser revogada e substituída por outra, em que se considerem os factos como provados e não provados de acordo com o alegado e justificado em sede de alegações recursivas, alterando-se a decisão proferida em 1ª instância por outra que condene os recorridos no pedido contra eles formulado nos autos. Assim se fazendo a inteira e costumada JUSTIÇA! *
Os RR. apresentaram resposta ao recurso e apresentaram recurso subordinado onde, além de se pronunciarem pela improcedência das razões da apelante, concluíram quanto ao recurso subordinado, (cujos termos se não transcrevem, por absolutamente prolixos) pela ausência de complexidade do serviço produzido pela autora, o qual não deve ser contabilizado em mais de 100 horas, reduzindo-se em conformidade a sua condenação.
Para o efeito, defendem a alteração do teor do item 33º dos factos provados, para que ali conste o volume de 100 horas, em vez das 160 horas referidas.
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A autora apresentou resposta ao recurso subordinado, apontado estar por satisfazer a multa prevista no art. 139º, nº 6 do CPC e concluindo pela falta de fundamento desse recurso.
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Os recursos foram admitidos, com subida nos próprios autos e sob efeito devolutivo, como devido, mas sem qualquer pronúncia quanto à questão suscitada sobre a extemporaneidade do recurso subordinado.
Na sequência de notificação para o efeito, os RR. vieram oferecer o pagamento dos valores de taxa de justiça devidos, incluindo pela apresentação tardia do recurso subordinado, o qual pode, por isso, ser conhecido.
Cumpre decidir.
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2- FUNDAMENTAÇÃO

Não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas nas conclusões, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3 do CPC, é nelas que deve identificar-se o objecto do recurso.
No caso, as questões colocadas pela autora/apelante traduzem-se:
a) Na pretensão da alteração do teor dos factos descritos sob os pontos 14, 17, 23;
b) Na pretensão de exclusão dos factos descritos nos pontos 27º; 28º, 29º, 30, e 31º do elenco dos factos provados;
c) Na pretensão da alteração do ponto 33º dos factos provados, para que se dê por provado que os serviços prestados pela autora corresponderam a 400 horas de trabalho, em vez das 160 horas ali referidas, assim se admitindo o que consta da al. b) dos factos não provados.
d) Na pretensão de conclusão pelo acerto do valor dos honorários pedidos na acção.
Do recurso subordinado, extraem-se as seguintes questões:
e) Se deve ser fixado que o número de horas prestado foi de 100 e que o preço hora adequado é de 150,00€, resultando num valor de honorários de 15.000,00€.
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O tribunal deu por provada e não provada a seguinte matéria:
“ Encontra-se provada a seguinte:
B / MATÉRIA DE FACTO.
1) A A. é Advogada, encontrando-se inscrita na ordem dos advogados desde 30 de abril do ano de 1992, sendo titular da cédula profissional nº 4287p, data desde a qual faz desta atividade única profissão, habitual e lucrativa exercida em escritório próprio (Doc. 1).
2) No âmbito da sua atividade profissional a A. em Junho de 2018 foi consultada pelos RR, com vista ao aconselhamento e patrocínio jurídico, quanto à possibilidade e forma de resolução da partilha da herança aberta por óbito da sua avó paterna, EE falecida em ../../2010 e posteriormente também de seu avó FF que veio a falecer a 21 de Setembro de 2018.
3) Sendo que os RR. foram herdeiros, por via do exercício do direito de representação de seu pai GG falecido ../../2017.
4) Após reunião que teve lugar no escritório da A. e, na qual a mesma os esclareceu dos seus direitos, bem como das vicissitudes legais e contornos jurídicos que se colocavam no caso em apreço, os RR. mandataram a A. para os representar na qualidade de sua advogada e de conduzir as negociações tendentes à concretização da partilha.
5) Sendo que era também herdeiro, HH, tio dos RR.
6) Tendo o processo de partilha, sido concluído com a outorga de escritura partilha em 01 de abril de 2021, conforme cópia da escritura que se anexa (Doc.2).
7) Com a conclusão e resolução final do diferendo entre herdeiros, a A. apresentou a sua nota de honorários, remetida aos RR. quer por e-mail quer posteriormente por carta registada, onde peticiona €712,00 a título de despesas e €109.000,00 a título de honorários, acrescido de IVA (Doc.3).
8) Entre A. e RR. não foi efetuado qualquer contrato nem acordo verbal ou por escrito quanto ao valor dos honorários a liquidar pelos serviços prestados, sendo certo que ao longo dos quase três anos de trabalho nunca foi efetuado qualquer pagamento ou adiantamento por parte dos RR. por conta dos honorários finais nem foi liquidado qualquer valor de despesa, fruto da confiança que a A. depositava nos RR, seus conhecidos há muitos anos.
9) O exercício do mandato conferido à A., implicou reuniões e contactos, quer com os seus constituintes, quer com o Ilustre Colega que representava o outro herdeiro, Dr. DD, bem como o estudo de várias questões e análise de documentação, a saber e conforme melhor consta da respectiva nota de honorários:
1- Recepção, leitura e estudo da minuta da cessão de quotas e acta da AG da sociedade A..., Lda, e elaboração da respectiva resposta (17.07.2018).
2- Análise e estudo do direito de representação dos herdeiros, através da leitura e análise das respectivas habilitações de herdeiros lavradas em 08.10.2018; 10.01.2011; 21.07.2017 (12.12.2018).
3- Várias Conferências com o Colega que representa a parte contrária, Dr. DD (14.12.2018 a 27.05.2018)
4- Receção, leitura e análise da proposta de partilha de 28.05.2019, com proposta de adjudicação da verba 2 e 3 e pagamento de tornas aos clientes de 32.310,00€ (28.05.2019).
5- Conferência com o Colega, dando nota da não aceitação da proposta (28.05.2019).
6- Recepção, leitura, análise e estudo do contrato promessa de compra e venda do imóvel sito em ... em 30.05.2019.
7- Elaboração de resposta e sugestão de alteração à minuta do CPCV, remetida ao Colega (03.06.2019).
8- Recepção, estudo e análise da relação de bens e declaração para efeitos de IS de 21.11.2018 (03.06.2019).
9- Recepção, leitura e análise primeira prestação de contas do cabeça de casal (03.06.2019).
10- Elaboração e envio de resposta às contas apresentadas (11.06.2019).
11- Reunião presencial com o Colega no escritório da A. (12.06.2019).
12- Vários reuniões telefónicas com o Colega, para solicitação de esclarecimentos quanto à prestação de contas.
13- Reunião presencial com clientes para preparação de contra-proposta da partilha, bem como da exigência da inclusão do andar da Praça ..., sem que a outra parte tivesse direito a qualquer valor na sua venda (estava proposto a repartição do preço).
14- Intervenção escrita junto do Colega, dado o incumprimento na assinatura unilateral de CPCV terreno de ....
15- Contacto com Colega, e apresentação escrita de várias questões (veiculo automóvel, andar da Praça ... e esclarecimento prestação contas, recusa da imputação das custas de avaliação nas despesas de cabecelato) 11.07.2019.
16- Contacto com a Colega que patrocina acção de despejo dos inquilinos da Quinta ..., Dra II (11.07.2019).
17- Recepção, leitura análise e estudo da avaliação dos imóveis (02.09.2019).
18- Recepção, leitura e análise comparativa das duas avaliações dos imóveis (04.09.2019)
19- Preparação de reunião presencial com o Colega.
20- Reunião presencial com o Colega, com duração de três horas (11.09.2019).
21- Analise e elaboração da resposta dos valores a atribuir aos imoveis a partilhar (12.09.2019).
22- Receção, leitura e análise de todos os contratos de arrendamento dos imóveis (16.09.2019).
23- Análise, elaboração de resposta e comunicação de alterações à prestação de contas (17.09.2019).
24- Contacto com o Colega, para ponto de situação dos vários assuntos pendentes, bem como correção e tentativa de acerto por acordo dos valores dos bens a partilhar (19.09.2019).
25- Recepção, leitura e análise da citação para despejo do inquilino da Quinta ....
26- Recepção, leitura e estudo da atualização dos bens de ..., análise das certidões prediais, declarações da Câmara Municipal ..., e verificação da duplicação ou não de artigos matriciais (20.10.2019).
27- Receção, leitura e análise de documentos enviados de prestação de contas (21.10.2019).
28- Elaboração e envio de resposta escrita de contestação das contas do cabecelato (28.10.2019).
29- Deslocação Conservatória Registo Predial para obtenção de elementos para esclarecimento quanto à existência ou não de dois prédios em ... (29.10.2019).
30- Análise e elaboração de esclarecimento escritos quanto à questão dos dois imoveis de ..., para que a avaliação possa ser devidamente corrigida (04.11.2019).
31- Receção leitura, análise e elaboração de resposta escrita e análise de mais elementos para prestação de contas (06.11.2019).
32- Comunicações, telefónicas e escritas várias com o Colega nomeadamente em 06.11.2019; 19.11.2019; 20.11.2019; 21.11.2019, 23.12.2019).
33- Recepção e análise de documento referente à renda da papelaria B... (23.12.2019).
34- Recepção e análise e estudo de novas ponderações para partilha, preparação de reunião com as partes e com o Colega (11.01.2020).
35- Reunião presencial todas as partes (26.02.2020).
36- Diversos contactos com vista à articulação entre os avaliadores para obtenção de valores unânimes para os imoveis a partilhar.
37- Por razões de doença do Colega, os contactos com ele foram suspensos, com o acordo dos clientes que preferiram não avançar com o processo de inventario, ainda que se mantivesse o impasse quanto aos valores a atribuir aos imóveis (Abril de 2020).
38- Junho de 2020, foram reiniciados os contactos com o Colega, para obtenção de acordo para a partilha.
39- Recepção leitura e análise de vários esclarecimentos quanto às contas de cabecelato, e Comunicação escrita Colega que ainda não estão em condições de chegar a acordo com as avaliações (09.06.2020).
40- Recepção e confirmação que as contas/despesas do cabecelato passaram a ser devidamente pagas (15.06.2020).
41- Diversos contactos escritos e telefónicos com Colega, insistência para finalização dos valores referentes à partilha.
42- Notificação escrita ao Colega, que se aguardaria por 10 dias a conclusão extra judicial, sob pena de ser intentado inventario judicial (18.09.2020).
43- Contacto com o Colega com ponto de situação (valor dos bens, inclusão de bens a partilhar, valor de tornas, forma à partilha, adjudicação de bens e adjudicação de bens com determinação de parte e direito) e contas cabecelato) (08.01.2021).
44- Informação que contas do cabecelato foram liquidadas (11.01.2021)
45- Recepção, leitura e análise de valores atribuídos por acordo aos bens pela parte contrária (15.01.2021).
46- Receção e análise dos valores acordados e articulação dos mesmos quanto à sua atribuição e cálculo da questão das mais valias e IMT (Janeiro de 2021).
47- Receção e analise de nova exigência da outra parte de não dar de hipoteca bem a eles adjudicado para garantia do pagamento das tornas (11.02.2021).
48- Comunicação da exigência de hipoteca legal para garantia do pagamento das tornas acordado de 127.720,00 €, bem como da exigência da partilha global, ainda que com determinação de parte e direito dos bens sitos em ... (15.02.2021).
49- Diversos contactos com o Colega, com manutenção destas condições, nomeadamente em (15.02.2021; 16.02;2021,09.03.2021;18.02.2021;22.02.2021).
50- Elaboração e redação da minuta da partilha, com análise de diversos documentos.
51- Análise às alterações sugeridas quanto à minuta, nomeadamente quanto ao valor de IMT.
52- Respostas escritas às diversas contra-propostas (10.03.2021; 15.03.2021; 16.03.2021; 18.03;2021; 23.03.2021; 23.03.2021;25 .03.2021; 26.03.2021; 29.03.2021).
53- Análise e revisão final em articulação com o cartório da diversa documentação para a outorga da escritura de partilha
54- Elaboração de declaração de quitação (veículo automóvel) (30.03.2021).
55- Elaboração de declaração de entrega de cheques (30.03.2021).
56- Presença e acompanhamento outorga da escritura de partilha (01.04.2021).
57- Resolução final das partilhas através de partilha extra judicial, com pagamento de tornas e adjudicação das verbas integral das verbas 2,3 e 5 e 9 e respectivamente ½ das restantes verbas ainda em partilha. (valor do quinhão recebido 1.370.950,00€).
10) Como decorre da participação efetuada para efeitos de Imposto de Selo, o acervo hereditário a partilhar era composto por um património englobando dezassete bens imóveis, contas bancárias à ordem e a prazo e aplicações de valores mobiliários (Doc.4 e 5).
11) Sendo que só os bens imóveis objeto de partilha por via da escritura outorgada em 1 de Abril de 2021 ascenderam ao montante global de 2.741,900,00€ (dois milhões setecentos e quarenta e um mil e novecentos euros), valor esse que não engloba os restantes bens objeto de partilha nomeadamente os constantes das contas bancárias e aplicações mobiliárias e os restantes bens e participações sociais, que entretanto foram alienados.
12) Tendo os RR. em conjunto só por via da escritura de partilha outorgada em 01 de abril de 2021 recebido o equivalente a 1.370.950,00 € (um milhão trezentos e setenta mil novecentos e cinquenta euros).
13) Os Réus, na presença da mãe destes (nota: a A., em tempos, assumiu o patrocínio da mãe dos Réus num outro processo) questionaram a A. quanto ao modo como esta prestaria os seus serviços, e sobretudo, qual seriam os seus honorários, especificamente quais seriam os pressupostos de cálculo dos ditos honorários.
14) Ao que a A, simplesmente retorquiu que não se preocupassem, que mais tarde lhe diria, que mais tarde falariam no tema. Mais dizendo que conhecia a mãe de ambos e que, por isso mesmo, o tema honorários seria tratado mais tarde.
15) Os Réus retorquiram, designadamente o R. CC, que gostava de saber um valor aproximado e os termos para o cálculo destes honorários, ao que a A., voltou a retorquir que não se preocupasse que mais tarde falariam do assunto.
16) Os Réus prontificaram-se para pagar a respectiva consulta, e também a aqui A. não quis receber qualquer valor pela mesma “…..ficaria por conta…”, presumiram os Réus.
17) O tempo que demorou a ser concretizada a partilha deveu-se, em parte, ao facto do Mandatário que representava o outro herdeiro, ter adoecido e com isso o processo ter ficado parado cerca de 1 ano (entre Março de 2020 a Janeiro 2021) e pelo facto de ter existido uma avaliação dos imóveis.
18) Apesar dos Réus terem herdado do avó vários depósitos bancários, aplicações, recheio mobiliário, a mediação para tais partilhas nunca envolveu os advogados, ou seja a A., tendo sido resolvida amigavelmente entre tio e sobrinhos.
19) A participação activa dos advogados, ou seja, da A., aconteceu apenas para a partilha dos imóveis.
20) E focou-se principalmente na mediação para partilha dos seguintes imóveis:
5 imóveis no Porto:
- Apartamento ..., Rua ...;
- Prédio Rua ... (composto por 3 fracções);
- Prédio Rua... (onde está alojado negócio da família);
- Apartamento ...;
- Prédio ... (Composto por Loja e Prédio);
11 imóveis em Braga (...):
Casa da Família (Quinta, artigo ...09)
Casa do Caseiro (Artigo ...12)
Campo .../Campo ... (Artigo ...54)
Campo ... (Artigo ...39)
Campo ... (Artigo ...04)
Campo ... (Artigo ...62)
Bouça ... (Artigo ...65)
Bouça ... (Artigo ...08)
Terreno anexo Casa Caseiro (artigo ...42...)
Terreno ... (Artigo ...07) – Que os Réus confirmaram ter sido vendido previamente e já não integrar o património;
Terreno ... (Artigo ...05) – Que os Réus confirmaram ter sido vendido previamente e já não integrar o património
1 jazigo de cemitério ... (Porto)
21) Inicialmente, estimou-se apenas a partilha parcial de património, considerando apenas os imóveis do Porto, uma vez que o património de ... ficaria em comum para usufruto de ambas as partes (uma casa de família, em comum).
22) Mais tarde, quando se apuraram valores consensuais e justos para os imóveis, foi decidido fazerem a partilha total de todos os imóveis.
23) Bem como ainda existiram outras temas levados aos advogados, qual seja, validar contas de um cabecelato do ano de 2019 e até outubro de 2020 que se cingiu entre Réus e A. no envio e validação de faturas de conta entre advogados; e a Investigação do histórico de terrenos de ....
24) A A. aos 16 de Junho de 2021 chama os Réus ao seu gabinete para falar de honorários.
25) E transmite aos Réus o seguinte: “por recomendação da Ordem dos Advogados, os meus honorários são 10% dos valores que vos coube na herança, do vosso quinhão.”
26) Mais explicou que seriam 10% unicamente sobre o valor dos bens imóveis que couberam a cada um dos Réus, ou seja, sobre o quinhão a estes atribuído em sede da escritura da partilha junta aos autos como doc. 2, até porque sabia que nos demais bens e partilha destes não teve qualquer intervenção – 2.741.900 Euros (indicados no item 11.º e doc 2 junto aos autos, obviamente a dividir por 2 = 1.370.950 Euros.
27) Mais disse que por consideração com a mãe dos Réus, baixaria o percentual recomendado pela Ordem dos Advogados de 10% para 8%, mas que pretendia “arredondar” o assunto e ser paga desta forma:
a) – passaria uma fatura de 6.000 Euros acrescidos de IVA (correspondendo 50% deste valor para cada um dos Réus, ou seja, 3000 Euros + Iva para cada um);
b) – 103.676 Euros em numerário, sem fatura (correspondendo 50% deste valor para cada um dos Réus, ou seja, 50.000 Euros para cada um), a serem pagos em onze prestações mensais iguais e sucessivas de 8.000 Euros, com inicio a 1 de Setembro de 2021 e a última a 01 de Agosto de 2022 no valor restante, de 15.670 Euros –;
28) A A. desde logo percebeu a estupefação dos Réus, que lhe disseram ato contínuo que não estavam a contar com aquele tipo de valores nem com aquela forma de pagamento.
29) Os Réus saíram da reunião e aconselharam-se de direito sobre o tema e, uns dias depois, marcaram uma segunda reunião, a 28 do mesmo mês, com a A., na qual lhe transmitiram que não estavam de acordo com o valor proposto e muito menos com a forma de pagamento.
30) A A. ainda esboçou um desconto mantendo a forma de pagamento acima descrita e disse que se saíssem “não mais lhes perdoava o IVA”.
31) Retorquiram os Réus que não aceitavam e que iriam mesmo informar junto de um advogado e que este entraria em contato com a A. e solicitaram a nota de honorários.
32) A Ordem dos Advogados emitiu laudo em decidem “não conceder laudo ao valor de honorários peticionado de €109.000,00, acrescido de IVA, mas já seria de conceder se o montante pretendido fosse de €60.000,00, acrescido de IVA.
33) Os serviços totais prestados pela A. aos RR. e referidos em 9) corresponderam a um total de cerca de 160h.
***

FACTOS NÃO PROVADOS
a) Quer as negociações, quer a preparação do processo de partilha, se protelaram ao longo quase três anos, sendo que a resolução de várias situações e conflitos ultrapassados sempre com a intervenção direta da A., junto do Colega que representava o outro herdeiro.
b) Ao longo destes três anos, no acompanhamento de todas essas situações entre reuniões, telefonemas, emails e horas de estudo gastou a A. nunca menos de 400 horas no exercício do mandato que lhe foi conferido pelos RR.
*

Quer a A., no recurso principal, quer os RR., no recurso subordinado, vêm impugnar a decisão sobre a matéria de facto.
Tal iniciativa exige o cumprimento do regime processual previsto no art. 640º do CPC, designadamente quanto à especificação dos factos concretamente julgados a rever, ao sentido da decisão alternativa pretendida e aos meios de prova que o justificam. No caso destes corresponderem a depoimentos testemunhais ou declarações de parte, os segmentos relevantes destes devem ser identificados.
Podemos afirmar genericamente que qualquer dos recorrentes cumpriu tal regime, cabendo apreciar tais recursos nessa parte.
Em qualquer caso, não deverá este tribunal de recurso apreciar questões, designadamente em relação à decisão sobre a matéria de facto, que sejam irrelevantes, inócuas, inconsequentes para a decisão da causa, segundo as soluções plausíveis de direito e que se mostrem pertinentes no recurso. Trata-se de observar o princípio da limitação dos actos, consagrado no art. 130º do CPC, sob a forma de proibição da prática de actos inúteis.
Está, de resto, nestas circunstâncias, a pretensão de alteração do teor do item 14º dos factos provados (resposta da autora de recusa de informação sobre a previsão dos seus honorários, havendo eles de serem discutidos mais tarde), para que ali passasse a constar uma explicitação das razões para a não antecipação de qualquer valor: Assim, pretendia a apelante que passasse a ter-se por provado: “A A. referiu que nessa fase era prematuro fazer uma previsão de honorários, porque não sabia o número dos bens envolvidos, o nível de litígio e se o processo se iria resolver extrajudicialmente ou pela via litigiosa, tendo referido que num processo de inventário poderia ser cobrado uma percentagem sobre o valor dos bens”.
Com efeito, certo é, em qualquer dos casos, que não foi fixado qualquer critério ou valor para os honorários que haveriam de ser pagos ulteriormente, pelo que não é em função disso que cumpre avaliar a justeza do valor que a A. pretende cobrar.
Por conseguinte, a questão é irrelevante para a decisão a proferir, o que prejudica que se deva alterar o teor do item 14 dos factos provados, como pretendido.
*

O princípio que vem de aplicar-se é igualmente apto a que este tribunal se abstenha de intervir em ordem à alteração do teor do ponto 17º dos factos provados.
Consta, aí, como provado, que: “17º - O tempo que demorou a ser concretizada a partilha deveu-se, em parte, ao facto do Mandatário que representava o outro herdeiro, ter adoecido e com isso o processo ter ficado parado cerca de 1 ano (entre Março de 2020 a Janeiro 2021) e pelo facto de ter existido uma avaliação dos imóveis.”
Defende a apelante que se deve dar por provado apenas que “ O processo esteve parado entre 29 de Abril e 02 de Junho e 01 a 14 de Setembro de 2020, por motivo de doença do mandatário que representava o outro herdeiro”.7789. Esses seriam os períodos de doença do Dr. DD, conforme este teria declarado, sendo que os autos revelam actividades processuais ou conexas com o processo em 9/6/2020, 14 e 18 de Setembro e 8 de Outubro.
Acresce que a própria sentença refere que a autora “recebeu e analisou as avaliações dos imóveis” em 2/9/2019 (item 9º.17., dos factos provados), pelo que não terá sido a avaliação dos imóveis a provocar uma paragem do processo entre Março de 2020 e Janeiro de 2021.
Acontece, porém, que o sentido útil do facto descrito é o de que houve incidências que determinaram um atraso na realização da partilha e que todo o tempo decorrido até à concretização desta não envolveu um trabalho efectivo dos mandatários, seja porque em algum momento um deles esteve doente, seja porque a realização de avaliações aos prédios determinou igualmente alguma demora a qual, de resto, segundo o texto do ponto 17, nem é situada naquele período de Março de 2020 a Janeiro 2021.
Ora, por um lado, um tal sentido útil corresponde à realidade; por outro lado a correcção pretendida sempre seria irrelevante para a decisão a proferir, tal a falta de precisão que o facto apresenta e a sua irrelevância para a caracterização da prestação profissional da apelante e sua valoração.
Desprovido de parcial fundamento, mas de total qualquer interesse, resulta, pois, a pretendida alteração ao ponto 17 dos factos provados, que, por isso, se manterá nos seus precisos termos.
*

De seguida, a apelante impugna o teor do ponto 23, alegando a sua incompatibilidade com o teor do ponto 9, onde se descrevem as acções por si desenvolvidas no exercício do mandato em questão. Afirma que tais acções transcendem as intervenções na partilha, na apreciação das contas do cabeçalato e na investigação do histórico do terreno de ..., e que só isso resulta do ponto 23 (em continuação com o 22).
Acontece, porém, que tais descrições não são incompatíveis, devendo considerar-se, isso sim, como complementares. Assim, nos pontos 22 e 23, resultam descritos diferentes capítulos em que se pode compartimentar a actuação dos mandatários intervenientes. Sem prejuízo disso, no ponto 9º está descrita uma multiplicidade de actos que se podem subsumir a tais capítulos, sendo que neles se mencionam as intervenções relativas à sociedade, a um veículo automóvel e ao imposto sucessório.
Não se justifica, por isso, a alteração pretendida, improcedendo, também nesta parte, a pretensão recursiva da autora.
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Mais pretende a apelante que se deem por não provados os factos descritos nos pontos 27º a 31º:
Tais factos descrevem o desacordo dos RR. em relação aos valores de honorários cobrados e a uma forma de cobrança que teria sido proposta pela autora, em ordem a superar a controvérsia imediatamente instalada.
Repete-se, aqui, o que acima se referiu sobre a inutilidade desta matéria para a decisão a proferir. Com efeito, não está invocado qualquer acordo das partes quanto aos termos ou ao montante dos honorários cuja concretização seja necessária para vincular as partes, designadamente os RR. ao respectivo cumprimento. Assim, para a decisão do presente litígio, nos termos em que está instalado, é irrelevante aferir quantas reuniões tiveram lugar para tratar da questão e quais as propostas que a A. possa ter apresentado para obter o pagamento do seu trabalho. Certo é, isso sim, que nada disso condiciona já a decisão a proferir, que só assentará na análise do trabalho desenvolvido e no estabelecimento de um critério com pressupostos adequados à sua valoração económica.
Pelo exposto, abster-se-á este tribunal de recurso de introduzir qualquer alteração na matéria descrita nos pontos 27º a 31º, dada a inutilidade dessa actividade, que seria absolutamente inócua, i. é, desprovida de qualquer efeito, e o disposto no art. 130º do CPC, tal como acima se referiu e que aqui se mantém pertinente.
*

Por fim, pretende a apelante a alteração do teor do ponto 33º dos factos provados, que apresenta o seguinte teor: “Os serviços totais prestados pela A. aos RR. e referidos em 9) corresponderam a um total de cerca de 160h.”
Alegou a este propósito: “ Na realidade não há qualquer prova nos autos que confirme de forma exata e inequívoca estas horas de trabalho como despendidas pela Recorrente. Sendo certo que a Recorrente, na nota de honorários por si elaborada não faz referência nem se escora no valor hora, cobrado no seu escritório pelos serviços prestados, já que a mesma entende não ser essa a forma ou o pilar que deva estar na base do cálculo dos honorários. O tempo despendido apenas foi mencionado sim, mas na sua petição inicial e mais concretamente no seu artigo 21º, onde se refere que terá gasto nunca menos de 400h no exercício do mandato que lhe foi conferido. Pelo que não se compreende em que facto e ou depoimento concreto se baseou o Tribunal para determinar esse exato número de horas, como sendo o tempo despendido pela Recorrente.”
*

É igualmente em relação a este ponto da matéria de facto que se dirige o recurso subordinado, dos RR., pretendendo que se fixe apenas num total de 100, o número de horas a ponderar para o cálculo dos honorários em causa.
*

Apreciar-se-ão em simultâneo as razões dos recorrentes, já que à mesma questão se dirigem.
A este propósito, o próprio tribunal recorrido atentou na dificuldade em determinar, com base na prova existente, o número de horas adequado a servir de pressuposto ao cálculo da remuneração devida à autora. Motivou assim a sua decisão: “Com efeito, o Dr. DD patrocinava o cabeça de casal, o qual foi ele a elaborar um mapa, um gráfico inicial com os bens a partilhar, elaboração da minuta de cessão de quotas da sociedade, foi ele que desenvolveu a maior parte do trabalho junto do notário para elaboração da partilha, foi claro em dizer que esta partilha deu muito pouco trabalho, porque as partes trataram das questões mais melindrosas, como foi o caso das avaliações e de fornecimento de documentos, sendo que relativamente ao despejo de Braga foi outra colega de lá que tratou do assunto, além de que os advogados não tiveram qualquer intervenção na partilha de contas bancárias, móveis e jóias.
Mais referiu que o inventário dos autos não levantou grandes questões jurídicas, nem sequer de qualquer planeamento fiscal, porque as pessoas se falavam e decidiram entre elas os valores a partilhar.
Pese ter referido desconhecer o trabalho levado a efeito pela colega no patrocínio dos RR. foi claro em afirmar que 100 horas de trabalho ao longo de todo o processo já seria um valor por excesso.
Ora, mesmo considerando hipoteticamente que a A. tenha despendido mais tempo que o advogado representante do cabeça de casal, inexistindo um referência absoluta, matemática, o Tribunal considerando todo o contexto em que foi exercido o mandato pela A., considerou que o valor de 160 horas será um valor mais que razoável, adequado, proporcional ao tipo de trabalho e actos no patrocínio dos RR.”
Constata-se, então, que o tribunal ponderou três elementos essenciais para decidir: a descrição do trabalho realizado, de onde sobressai o seu prolongamento no tempo e a multiplicidade de actos – tudo como descrito no ponto 9º dos factos provados – mas também o reduzido grau de litigiosidade e de complexidade técnica das questões tratadas no exercício do mandato; a análise do trabalho homólogo desenvolvido pelo advogado da parte contrária, explicada pelo próprio; o parecer da Ordem dos Advogados.
Em qualquer caso, impõe-se ter presente que a demonstração dos pressupostos do direito que a autora se apresentou a exercer nesta acção só a ela lhe compete, atento o disposto no art. 342º, nº 1 do C. Civil.
À luz desta regra, e na ausência de um acordo que anteriormente tivesse estabelecido a obrigação dos réus ou fixado critérios para a sua determinação, cabia à autora comprovar a qualidade e quantidade dos actos praticados no exercício do mandato. Foi nesse quadro de circunstâncias que se atentou na sua alegação de que o trabalho que desenvolveu – e que se mostra descrito entre os factos provados, como referido, e no qual já nos fixamos - a teria ocupado, pelo menos, por 400 horas.
Ora, como bem resulta do laudo da Ordem dos Advogados, a contabilização do trabalho em horas e a repercussão da complexidade do trabalho do preço por hora é um método adequado para a determinação do valor dos serviços prestados no exercício da advocacia. Aliás, apesar de afirmar não ser adepta desse método, é a própria autora que acaba por o referir, ao apontar um mínimo de 400 horas como as que terá ocupado ao serviço dos réus.
Todavia, a própria autora não apresenta, sequer por aproximação, qualquer modelo de registo das horas de prestação dos seus serviços forenses aos réus. Para além disso, o advogado da parte contrária – Dr. DD – afirmou que o trabalho desenvolvido – que podendo não coincidir inteiramente com o seu, teve pelo menos o mesmo objecto e o tratamento das mesmas questões – justificaria, na melhor das hipóteses, o dispêndio de 100 horas.
Por outro lado, ainda, o parecer da Ordem dos Advogados afirma que o total de 60 horas, referido pelos RR., seria baixo, mas não deixou de afirmar o exagero do cálculo de 400 horas. Isso não obstante ter afirmado que, a admitirem-se tais 400 horas e o valor hora de 150.00€, daria lauda a uma conta de honorários de 60.000,00€ (400x150,00€).
No tratamento desta questão, entendemos ainda útil a ponderação de alguns elementos que a sentença recorrida referiu e que a resposta ao recurso igualmente destacou (art. 159 do respectivo articulado): - As partes, entre si, conseguiram resolver muitos diferendos, visto que a sua relação era boa, o que levou a uma desnecessidade de intervenção mais intensa dos advogados; os Recorridos, por si próprios, tiveram iniciativa e providenciaram, pela avaliação dos imóveis, que não foi controversa; a partilha de grande parte dos bens - móveis, jóias, contas bancárias – foi efetuada amigavelmente.
Para além disso, não pode deixar de se atentar no valor do património partilhado e no resultado que adveio aos réus, o que, independentemente da ausência de complexidade técnica, importa para o caso um grau de responsabilidade para os mandatários das partes que também deve ser ponderado.
É na ponderação de todos estes elementos que só podemos concluir pela bondade da solução decretada pelo tribunal a quo, ao adoptar os pressupostos das 160 horas e de 150.00€ por hora.
Naquele volume de horas se reflecte o parecer inconcreto da Ordem dos Advogados, ao referir a insuficiência de 60 horas, mas também o exagero das 400 horas invocadas, a versão do Dr. DD, para quem 100 horas bastariam, a análise da multiplicidade de actos e questões supervisionadas pela autora, como descrito no ponto 9º, sem prejuízo de se considerar que a ausência de prova para além das 160 horas, tem de reverter em prejuízo dos interesses da autora, que estava onerada com a respectiva prova.
Na determinação do valor/hora, levamos em conta o parecer da Ordem dos Advogados, que aponta para a adequação do factor de 150,00€/hora, afirmando o claro exagero da valoração operada pela autora. Acresce que o acerto dessa solução se alicerça ainda mais na consideração da facilitação que os diferentes herdeiros trouxeram para a partilha, acordando numas coisas, tratando eles próprios da avaliação dos imóveis a partilhar e aceitando sem controvérsia o seu resultado, que propiciaram aos advogados, designadamente à autora, ora apelante, tornado o serviço fácil e sem envolventes mais complexas, de ordem administrativa ou fiscal. E isso resulta claramente dos trabalhos descritos no ponto 9º: muito refere a autora ter analisado, mas parcas são as questões que aponta como tendo de providenciar pela respectiva resolução. Isso estendeu-se, por exemplo, à análise das próprias contas do cabeçalato, integradas por reduzida classe de despesas, e aceites sem controvérsia.
Por fim, na avaliação de uma realidade tão dinâmica quanto a que está subjacente à dos serviços prestados e cuja remuneração se discute, na ausência de uma perfeita determinação dos respectivos pressupostos, a presente decisão tem de acabar a alicerçar-se num juízo de equidade, como consta do nº 2 do art. 1158º do C. Civil, e bem o salientou a sentença recorrida, sem prejuízo do estabelecido no EOA (Lei n.º 145/2015, de 9 de Setembro), designadamente no seu art. 105º.
Por fim, resta afirmar que do anteriormente exposto resulta devidamente explicada a razão da divergência da solução acolhida para com o parecer da Ordem dos Advogados.
Resta, em conclusão, referir que se manterá o teor do ponto 33º dos factos provados, improcedendo, quanto a tal questão, quer a apelação da autora, quer o recurso subordinado dos RR.
*
A alteração da decisão recorrida, quer por efeito do recurso da autora, quer por efeito do recurso subordinado dos RR. dependia da alteração dos respectivos pressupostos factuais, quer quanto aos que se referiam ao volume de horas de trabalho adequados à caracterização da prestação da autora, quer quanto aos que eram instrumentais em relação a estes e aos que permitiam percepcionar o grau da sua tecnicidade e complexidade.
Como acabamos de afirmar, toda essa matéria se manteve.
Num momento sucessivo, a sentença recorrida, aplicando o regime do art. 1158º, nº 2 do C. Civil, considerou: “No caso em apreço entende-se de seguir as considerações expendidas no Laudo da Ordem dos Advogados, considerando-se que o valor hora de honorários oscilará entre €100 a €150,00 pra questões de média/baixa importância e responsabilidade, como é o caso dos autos.
As questões a resolver pela A. no autos, como decorre da intervenção relatada em 9) dos factos provados, têm uma dificuldade média/baixa, não tendo exigido grandes estudos, tendo sido um trabalho mais material, de dispêndio de tempo do que propriamente de criação e inovação jurídica.
Em termos de urgência/tempo do mesmo, há a salientar que o mesmo esteve parado durante cerca de 1 ano, a que acresce o facto te ter havido avaliações dos prédios, o que levou ao retardamento do mesmo, sem que daqui tenha havido qualquer trabalho acrescido para a A.
Quanto ao resultado obtido, foi um resultado normal para os RR., porquanto estes sempre teriam direito a receber 50% dos imóveis, ou seja, a actividade da A. não trouxe um acréscimo de património aos RR., porquanto ele esteve sempre definido ab initio, até à escritura de partilha.
Cabe ainda dizer que nenhuma questão de optimização fiscal se colocou e que tenha beneficiado os RR..”
A este respeito, da optimização fiscal, cumpre ter presente que nada vem provado em sentido contrário, que agora seja apto a sustentar a alegação divergente feita pela autora, nas suas alegações de recurso.
Por outro lado, tal como prescreve o nº 3 do art. 105 do EOA, consideram-se, nos termos antes referidos, a importância dos serviços prestados, a dificuldade técnica de grau limitado, das questões tratadas, a não identificação de urgência especial do assunto, a ausência de aplicação de criatividade intelectual particularmente relevante (atenta a factualidade provada) o resultado obtido, e a responsabilidade inerente ao valor económico dos interesses dos réus.
Note-se que o próprio parecer da O.A. qualificou as questões e soluções aplicadas como de média/baixa importância e responsabilidade, de média/baixa dificuldade e complexidade, sem caracter de urgência e em que o resultado obtido se reconduz ao efeito de um direito sucessório incontestado e ab initio inscrito na esfera jurídica dos RR.
Por todo o exposto, entendemos ser insusceptível de crítica o juízo enunciado pelo tribunal a quo, operando um critério de equidade, ao valorar o trabalho da autora na quantia de 150,00€/hora, aliás em plena concordância com o parecer da Ordem dos Advogados.
Confirmar-se-á, pois, também quanto a esta vertente, a decisão recorrida.
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Resta, em conclusão, confirmar a decisão recorrida, com a negação de provimento quer ao recurso da autora, quer ao recurso subordinados dos RR.
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Sumariando:
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3 - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar improcedente a presente apelação e, bem assim, o recurso subordinado, com o que confirmam a decisão recorrida.

Custas pelos recorrentes, em relação aos respectivos recursos.

Reg. e not.
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Porto, 8 de Abril de 2025

Rui Moreira
Artur Dionísio Oliveira
Pinto dos Santos