Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | FERNANDA SINTRA AMARAL | ||
Descritores: | CRIME DE HOMICIDIO QUALIFICADO ILICITUDE CULPA AGRAVANTES REGIME ESPECIAL DOS JOVENS PRESSUPOSTOS | ||
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Nº do Documento: | RP202411132216/22.0JAPRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/13/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL (CONFERÊNCIA) | ||
Decisão: | REJEITADO O RECURSO INTERPOSTO PELA ASSISTENTE MM; NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS INTERPOSTOS PELOS ARGUIDOS AA, BB, CC, DD, EE, E FF, E CONCEDIDO PROVIMENTO PARCIAL AOS RECURSO INTERPOSTOS PELO ARGUIDO GG E PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I – Quando o quadro factual, descrevendo, é certo, um primitivismo de reacções em que emergem pulsões primárias que indicam a desproporcionalidade entre o motivo que despoleta o itinerário criminoso e a acção, não aponta, apesar disso, para uma total ausência de racionalidade ou para uma total ausência de um processo compreensível (no sentido de que se percebe a perspectividade do seu desfecho) que, minimamente, convoque a lógica como explicação da conduta dos arguidos, como acontece nos casos em que se procura a vingança - um dos motivos mais habituais nos crimes de homicídio - entende-se que tal quadro é insusceptível de integrar a circunstância de qualificação do crime de homicídio vertida na al. e) do n.º 2 do art. 132.º do CP – motivo fútil. II – Não se verifica uma acentuada diminuição da ilicitude, da culpa ou da necessidade da pena, antes pelo contrário, num cenário de crime de homicídio qualificado, com preenchimento das agravantes previstas nas als. h) e i), do nº 2, do art. 132º do CP – praticadas com especial censurabilidade ou perversidade, e em co-autoria -, necessárias à aplicação do regime atenuativo previsto no regime penal especial dos jovens. Isto mesmo que, eventualmente, se perfilasse a hipótese de vantagens da atenuação especial para a reinserção social do jovem arguido. III – É certo que o arguido tem a total liberdade de prestar as declarações que entender, assim como de não as prestar de todo, decorrente do seu estatuto processual, mas também não se olvide que o tribunal, na sua tarefa de determinação da medida concreta da pena, decide em obediência ao princípio da livre apreciação da prova, decorrente do disposto no art. 127º do Código de Processo Penal, onde se incluem mormente as conclusões que retira das características de personalidade do arguido, face à sua postura em relação aos actos praticados, espelhada, muitas vezes, nas suas declarações em audiência, com as consequências daí advenientes. (Sumário da responsabilidade da Relatora) | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 2216/22.0JAPRT.P1 [Recurso Penal]
Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo Central Criminal do Porto - Juiz 3
Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I.1 No âmbito do processo comum colectivo n.º 2216/22.0JAPRT, que corre termos pelo Juízo Central Criminal do Porto - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, em que são arguidos, entre outros: AA BB CC DD EE FF e GG, com os demais sinais nos autos, foi proferido acórdão, em 08/05/2024, no qual se decidiu [transcrição]: “(…) Decisão. Por todo o exposto, decide-se: I. - Absolver os arguidos HH, II, GG e JJ da prática de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. e), h), i) e j), do Código Penal; - Absolver o arguido II da prática de um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02. - Absolver o arguido KK da prática de um crime de ameaça agravada, p.p. pelo art. 153, n.º 1, e 155, n.º 1, al. a), do Código Penal; - Condenar o arguido AA pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, na pena de 20 (vinte) anos de prisão; - Condenar o arguido BB pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, na pena de 18 (anos) anos de prisão; - Condenar o arguido CC pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, na pena de 18 (anos) anos de prisão; - Condenar a arguida DD pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, mediante: a) regime de prova orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); b) pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; - Condenar a arguida EE pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, e 4, do Dec. Lei 401/82, de 23.09, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, mediante: a) regime de prova orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); b) pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; - Condenar a arguida FF pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, e 4, do Dec. Lei 401/82, de 23.09, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, mediante: a) regime de prova orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); b) pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; - Condenar a arguida LL pela prática, no dia 8/6/2022, de um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de €8,00 (oito euros), no montante global de 1.440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros); - Condenar o arguido GG pela prática, no dia 8/6/2022, de um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de €8,00 (oito euros), no montante global de 1.440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros). Custas a cargos dos arguidos AA, BB, CC, DD, EE, FF, GG e LL, fixando-se a taxa de justiça individual dos dois últimos em 3 UCs e a dos restantes em 5 Ucs. II A. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização formulado pela demandante MM e, em consequência: - Absolver dele os demandados HH, II, GG e JJ; - Condenar solidariamente os demandados AA, BB e CC no pagamento à demandante da quantia total de 165,000,00€ (cento e sessenta e cinco mil euros), sendo: - 60.000,00 (sessenta mil euros) pelo dano intercalar (danos não patrimoniais até à morte); - 80.000,00 (oitenta mil euros) pelo dano da morte; - 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) pelos danos próprios da demandante; - Absolver os demandados AA, BB e CC do demais peticionado; - Condenar os demandados AA, BB e CC no pagamento dos juros à taxa legal, a contar da data desta decisão e até integral pagamento. Custas a cargo de demandantes e demandados na proporção do decaimento, sem prejuízo de apoio judiciário que haja sido concedido. B. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização formulado pela demandante NN e, em consequência: - Absolver as demandadas DD, EE e FF do peticionado a título de danos patrimoniais; - Condenar solidariamente as demandadas DD, EE e FF no pagamento à demandante da quantia total de 12,000,00€ (doze mil euros) para compensação dos danos não patrimoniais, absolvendo-as do demais peticionado a esse título; - Condenar as demandadas DD, EE e FF no pagamento dos juros à taxa legal, a contar da data desta decisão e até integral pagamento. Custas a cargo de demandantes e demandados na proporção do decaimento, sem prejuízo de apoio judiciário que haja sido concedido. (…)” » Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o Ministério Público para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respectiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]: » Inconformada com tal decisão, dela veio também a assistente MM interpor recurso para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respectiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]: » Inconformados com tal decisão, dela igualmente interpuseram recurso para este Tribunal da Relação, os arguidos AA, BB, CC, DD, EE, FF e GG, com os fundamentos expressos nas respectivas motivações, das quais extraíram as seguintes conclusões [transcrição]: **** XCIV. Chegados a este ponto, torna-se necessário abrir um parêntese para explicar o que parece ter escapado ao tribunal a quo, tendo inclusivamente sido mal interpretado, o que levou a que no acórdão constasse uma nota acerca do caracter do OO e que se mostra relacionado com a junção aos autos da foto que OO publicou numa rede social com uma faca, foi feita na sequência das declarações da testemunha XX que afirmou que OO nunca usava facas. XCV. Nesse mesmo sentido foi realçada a mensagem trocada entre OO e a namorada que pretendia ir a determinada discoteca, tendo-lhe OO dito que estava impedido de lá ir porque “tinha esfaqueado um segurança”. XCVI. Como resulta evidente não se pretende ligar estes acontecimentos aos dos autos, mas tão só evidenciar contradições nas declarações das testemunhas e demonstrar o carácter violento e agressivo de OO, o que não se coaduna com os factos que o tribunal considerou como provados. XCVII. Aliás quando a defesa do arguido BB pretendeu confrontar a testemunha ZZ, namorada do OO à data, com mensagens constantes de um ficheiro dos autos, mas que não tinha sido transcrito pelo MP. XCVIII. Embora o recorrente desde já se penitencie pela extensão da transcrição, a mesma é a clara demonstração desde logo do que no início foi dito em relação ao papel do MP. Junta prova aos autos: a leitura do telemóvel da testemunha ZZ, mas apenas junta as que favorecem a acusação. E tenta por todos os meios que a parte que poderia interessa á defesa não seja admitida, chegando a falar em impugnar transcrições, quando não se trata de transcrições, mas sim de prints de mensagens trocadas entre OO e a testemunha. XCIX. Na verdade, é que lido e relido o acórdão, não existe uma única menção a estas conversas, que na opinião do recorrente, repete-se demonstram de forma cristalina a vontade que o OO tinha de enfrentar o arguido BB e a sua família. C. Face a tudo o que foi exposto, deve a matéria dada como provada do Acórdão recorrido ser alterada no sentido pelo que se pugnou. DAS QUESTÕES DE DIREITO I – Insuficiência da matéria para a decisão CI. Como referido no início deste recurso, entende o recorrente que o Acórdão viola a alínea a) do artigo 410.º do CPP. CII. Essencialmente do que acima foi exposto relativamente à prova testemunhal, no que ao recorrente toca, pois não temos nenhum depoimento que não contradiga ou as imagens, ou outros depoimentos, ou até as regras da experiência. CIII. As imagens, vistas de forma isenta, retratam a realidade do relato efetuado pelo recorrente e corroborado pelos demais arguidos que prestaram declarações. CIV. Note-se uma vez mais, que praticamente todas as testemunhas de acusação eram amigas do OO, pessoas com ele estava naquela noite, que o acompanhavam. E aqueles que poderiam ser testemunhas do arguido BB, foram todos constituídos arguidos, ficando assim comprometido o seu depoimento. CV. A participação do arguido BB nos eventos daquela noite, consistiu em “andar à porrada” com alguns dos elementos desse grupo do OO, que não consegue identificar, sendo que inclusivamente evidencia ferimentos provocados por objeto perfurante, mas que foram totalmente descredibilizados pelo Tribunal. CVI. O arguido BB não matou o OO nem contribuiu para esse infeliz acontecimento, não existindo matéria suficientemente segura para poder condenado o arguido nos moldes em que o foi. II – Do crime imputado ao arguido CVII. Como já referido, o arguido BB não pugna pela sua total absolvição, uma vez que efetivamente se envolveu em confrontos físicos, numa primeira fase com OO e posteriormente com desconhecidos. CVIII. Assim, e sem mais considerandos deveria o mesmo ser condenado pela prática do crime de ofensas à integridade física, em pena que V. Exas. reputem como adequada. Sem prescindir e por mero dever de patrocínio III – Da não verificação das agravantes das alíneas h) e i) do n.º 2 do artigo 132.º CIX. Tendo em conta a análise acima efetuada quanto ao erro de julgamento e, em consequência, quanto aos factos que, afinal, deveriam ter sido considerados provados e/ou não provados, mormente o facto de, na opinião do Recorrente, apenas se ter provado que este desferiu uma facada na zona lombar de OO, importa iniciar a presente análise pela subsunção jurídica desses mesmos factos. CX. Assim, e como princípio de análise, importa começar por referir que o crime de homicídio simples (p. e p. pelo artigo 131.º do CP) visa proteger o bem jurídico vida, punindo este tipo legal todas as condutas dolosas que atentem quanto àquele bem. CXI. Transpondo estes ensinamentos ao caso em análise, importa discorrer sobre se a conduta do Arguido AA – desferir uma facada na zona lombar de OO –, é causa efetiva do resultado que se veio a verificar – morte. CXII. Conciliando o teor da referida informação constante do processo com a referida teoria da causalidade adequada entende o Recorrente que não é possível estabelecer qualquer nexo de causalidade entre a conduta praticada – desferimento de uma facada na zona lombar – e o resultado verificado – morte. CXIII. Isto porque, resulta indubitavelmente daquela informação que a lesão provocada pelo Arguido AA não é, por si só, causa de morte. CXIV. Consequentemente, a falta do nexo de causalidade entre a condutas e o resultado não pode levar a outra conclusão que não seja a de que não podia o Recorrente ter sido condenado pela prática do crime de homicídio (na forma simples e, por maioria de razão, na forma qualificada), mas sim, e ao invés, pela prática do crime de ofensa à integridade física, na medida em que a conduta se reconduz, isso sim, a uma ofensa à integridade física de OO. CXV. No caso em análise, e sem prejuízo de conforme referido ter sido vedada ao aqui Recorrente a possibilidade de demonstrar, com maior veemência, em sede de audiência de julgamento a falta de nexo de causalidade entre a conduta por si perpetrada e o trágico resultado final verificado, a informação constante de fls. 541 era suficiente para, à luz dos factos que deveriam ter sido dados como provados, ter o Tribunal a quo concluído pela inexistência de uma relação causal entre a conduta e o resultado. CXVI. Aliás, o próprio Tribunal a quo não é insensível à falta deste nexo de causalidade entre as lesões verificadas em OO e constantes do relatório da autópsia médico-legal e as ações alegadamente praticadas pelos Arguidos, uma vez que não conseguindo obter qualquer prova sobre como foram produzidas todas as lesões acaba por se socorrer de uma mera suposição: as demais lesões ter-se-ão produzido no decurso dos eventos relatados. CXVII. Consequentemente, não podia, por falta de nexo de causalidade, o Tribunal a quo ter condenado o aqui recorrente pelo crime de homicídio, mais se impondo que, em sede de recurso, seja o Arguido AA absolvido da prática daquele crime e condenado pela prática do crime de ofensa à integridade física. CXVIII. E caso se entenda estarmos perante um crime de homicídio entende o Recorrente que não se verificam as agravantes das alíneas h) e i) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal, pelas quais foi condenado. CXIX. Quanto à alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º que prevê como indício de uma especial censurabilidade ou perversidade a circunstância de o agente ter praticado o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas. CXX. Contudo, para que se verifique esta agravante é necessário que, previamente, se tenha demonstrado existir coautoria na prática do crime, após o que se apurará se a prática do mesmo naquelas condições de coautoria é ou não suscetível de revelar uma maior censurabilidade ou perversidade. CXXI. Sucede que não foi feita prova da existência de qualquer acordo prévio entre os Arguidos AA, BB e CC tendente à prática de qualquer ato ilícito contra OO, como também não existiu qualquer adesão a um plano em curso já que, conforme se demonstrou e decorre dos depoimentos das testemunhas, a atuação dos três arguidos é independente. CXXII. Não só não se verifica o elemento subjetivo da coautoria (o acordo), o que só por si implica que não exista coautoria, como não existe sequer o seu elemento objetivo, na medida em que não se verifica qualquer divisão de tarefas tendente a um objetivo comum. CXXIII. Aliás, destaque-se que o Tribunal a quo não dispensa uma única linha do Acórdão Recorrido a demonstrar e/ou a explicar a existência de coautoria! Assim, e apenas pela inexistência de qualquer coautoria, não podemos estar perante a agravante da alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º do CP. CXXIV. O desígnio de, com recurso a objeto de natureza corto-perfurante, atingir OO foi exclusivamente do Arguido AA, pelo que não se compreende (também porque o Tribunal a quo não esclarece), em que medida é que entende que o facto ilícito foi pratica com, pelo menos, mais duas pessoas. CXXV. Acresce que, e porventura mais relevante, do Acórdão recorrido não é possível depreender o percurso lógico seguido pelo Tribunal no que diz respeito ao preenchimento desta qualificativa. CXXVI. É que, da “fundamentação” quanto a esta questão não consta, em nenhuma medida, de onde conclui o Tribunal a quo a existência de uma especial censurabilidade e/ou perversidade, não deixando de ser curioso que nenhuma destas palavras seja sequer invocada por aquele! CXXVII. Aliás, atente-se que o Tribunal a quo se limita a referir uma maior ilicitude e culpa, mais dizendo que o facto de os Arguidos agirem em conjunto (o que não corresponde à realidade, conforme se viu), lhes conferiu uma maior superioridade, para além daquela que teoricamente já teriam por estarem munidos de um objeto de natureza corto perfurante. CXXVIII. Ora, levando o raciocínio do Tribunal a quo ao extremo, e se bem o compreendemos, a prática de um crime em coautoria com recurso a um qualquer objeto será, na verdade, e seguindo esta fundamentação, um crime qualificado pela referida alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º do CP. CXXIX. Como é bom de ver, tal entendimento contraria, frontalmente, o espírito deste dispositivo que, como acima se expôs, implica uma maior desconformidade com o direito para além daquela que já existe com a prática, por si só, do crime punido. CXXX. Aliás, acolher-se o entendimento do Tribunal a quo equivale a ter a deixarmos o sistema dos “exemplos-padrão” sempre subsumíveis ao n.º 1 do artigo 132.º, para termos uma qualificativa de funcionamento automático. CXXXI. Desta forma, não existindo qualquer facto provado, nem alegando o Tribunal a quo nesta sua análise qualquer circunstância de onde considere que exista uma especial censurabilidade e/ou perversidade do aqui Recorrente, deve o Arguido AA ser absolvido da prática do crime de homicídio qualificado p. e p. pela alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º. CXXXII. No que diz respeito à alínea i) do n.º 2 do artigo 132.º do CP, a qual prevê como indício de uma especial censurabilidade ou perversidade a circunstância de o agente utilizar (veneno ou) qualquer outro meio insidioso. CXXXIII. Contudo, e salvo o devido respeito, não pode o Recorrente concordar com a opinião vertida no Acórdão recorrido, por entender que não se verifica qualquer insídia no seu modo de atuação. CXXXIV. Em primeiro lugar, porque o Tribunal a quo – fruto dos factos dados como provados que, como se viu, merecem censura – coloca nas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar três Arguidos quando, conforme acima se viu, a atuação destes e, para o que aqui releva, do Arguido AA é independente e isolada da conduta adotada pelos demais arguidos. CXXXV. Em segundo lugar, porque o Tribunal a quo volta, aqui, a referir a procura e perseguição dos Arguidos a OO que, conforme acima se demonstrou, não existiu, sendo, outrossim, uma confabulação do libelo acusatório. CXXXVI. Em terceiro lugar, porque o Tribunal a quo traz, agora, um novo elemento que, até ao momento, não tinha sido referido: que os Arguidos “escolheram” um dia de festa para, assim, conseguirem concretizar o efeito pretendido... CXXXVII. Ora, para além de este novo elemento não ter qualquer correspondência com a realidade, não tem também qualquer correspondência nos factos dados como provados – mesmo na redação do Acórdão recorrido –, não tendo sido alvo de qualquer meio de prova, o que não pode levar a outra conclusão que não seja a de que não pode, aqui, ser tido em conta. CXXXVIII. Assim, não só este facto, mas, ainda, a circunstância de não ter havido qualquer perseguição ou atuação conjunta dos Arguidos, levaria a que a alegada traição, emboscada e impossibilidade de a vítima se defender seja uma hipótese longínqua e remota. CXXXIX. Por outro lado, não se pode olvidar que a generalidade das testemunhas que depuseram em sede de audiência de julgamento (e cujos depoimentos o Tribunal a quo considerou como verosímeis, mesmo quando o não eram na opinião do Recorrente) relatam com franca nitidez o aproximar de um grupo de pessoas a OO, o qual ele viu perfeitamente e, nessa sequência, decidiu correr (em sentido convergente, note-se). CXL. A este facto importa ainda acrescentar que são também vários os depoimentos das testemunhas que atestam a existência de diversas chamadas de atenção, as quais alertam para a existência de conflitos. CXLI. Acresce que, não pode deixar de se atentar no seguinte: a qualificativa em análise prevê um comportamento traiçoeiro, encoberto, aquele que impede a vítima de se defender. CXLII. Ora, no caso em análise, e mesmo partindo dos factos dados como provados pelo Tribunal recorrido – os quais não se aceitam, conforme acima se expôs, mas dos quais aqui se parte por facilidade de exposição –, a circunstância de haver um grupo que se desloca, em corrida, de uma ponta da Alameda ... para o outro lado, em direção a um outro grupo, constitui um “ataque” traiçoeiro, encoberto e que impediu a vítima de se defender? CXLIII. Entende o Recorrente que a resposta não pode deixar de ser, perentoriamente, negativa. CXLIV. Já quanto à fundamentação exposta pelo Tribunal a quo, entende o Recorrente que tanto para o preenchimento desta qualificativa, como para o preenchimento daquela que já foi analisada, aquele parte exatamente do mesmo ponto: a existência de três Arguidos que, alegadamente, “atacam” em vítima em conjunto. CXLV. Como é bom de ver, e além de tal entendimento decorrer de uma errada interpretação da prova produzida, uma vez que não houve, conforme se demonstrou, qualquer perseguição/emboscada ou atuação conjunta, uma mesma circunstância não pode contribuir para o preenchimento de duas qualificativas diversas, sob pena de violação do princípio ne bis in idem. CXLVI. Ora, quanto a este concreto aspeto, mormente a circunstância de a qualificativa prevista nesta alínea implicar que esta, pelos modos seguidos pelo agente, se tenha tornado numa “presa fácil”, com uma clara impossibilidade de resistir, importa ainda atentar num aspeto que o Tribunal a quo desconsiderou completamente, mas que, na opinião do Recorrente se reveste de enorme relevância: na sequência do confronto entre BB e OO, aquele ficou com as lesões que se encontram documentadas a fls. 466 a 470 do Processo – ou seja, facadas!. CXLVII. Aliás, o próprio referiu, nas suas declarações em sede de audiência de julgamento que as mesmas foram produzidas por OO, circunstância confirmada pelo Arguido AA. CXLVIII. Consequentemente, e mesmo na hipótese de se entender que a factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo está correta – o que não se concede, pelos motivos já expostos –, o acima referido contraria, frontalmente, os “pressupostos” para o preenchimento desta qualificativa, isto é: o meio ardiloso, a emboscada, a surpresa, traição. CXLIX. Se a vítima ainda teve possibilidade de atacar, ripostar e envolver-se em confronto físico, logicamente não se viu numa situação de ataque “surpresa” e impedida de reagir! CL. Por último, importa destacar o seguinte: também na análise desta qualificativa se basta o Acórdão recorrido com a referência a “uma culpa acrescida, merecedora de uma censura acrescida”. CLI. Assim, pergunta novamente o Recorrente: de onde decorre a especial censurabilidade/perversidade que lhe tem de ser imputada? CLII. Conforme é entendimento unânime quer da doutrina quer da jurisprudência, as qualificativas previstas no n.º 2 do artigo 132.º do CP não são de funcionamento automático, sendo, isso sim, meros indícios da verificação de uma especial censurabilidade/perversidade. CLIII. Deste modo, verificando-se alguma das circunstâncias previstas no n.º 2 do artigo 132.º do CP tem o tribunal a obrigação de “passar” o comportamento concreto do agente pelo crivo do n.º 1 e, aí, concluir se esse mesmo comportamento é suscetível de demonstrar uma especial censurabilidade/perversidade do agente, o que, entende o Recorrente, o Tribunal a quo não fez. CLIV. Não existindo qualquer correspondência com os factos dados como provados, e, ainda, pera inverosimilhança de que tenha havido um qualquer ataque surpresa ou traiçoeiro, bem como, e porventura mais relevante, não alegando o Tribunal a quo nesta sua análise qualquer circunstância de onde considere que exista uma especial censurabilidade e/ou perversidade do aqui Recorrente, deve o Arguido AA ser absolvido da prática do crime de homicídio qualificado p. e p. pela alínea i) do n.º 2 do artigo 132.º. CLV. E na hipótese de se entender que o Recorrente deve ser condenado pela prática do crime de homicídio – o que, salvo o devido respeito, que é muito, não se concebe nem concede –, não se verificando nenhuma das qualificativas previstas no n.º 2 do artigo 132.º do CP (por não passarem o crivo do n.º 1 do mesmo dispositivo), deve aquele ser condenado pela prática de um crime de homicídio simples. IV – Da falta de fundamentação na pena aplicada CLVI. Considera o recorrente que o acórdão se mostra ferido por falta de fundamentação tendo sido violado o prescrito no artigo 375.º, n.º 1, do CPP, que “a sentença condenatória especifica os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada (…)”. CLVII. Imposição que decorre, prima facie, do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa, nos termos da qual “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”. CLVIII. Em consequência, o artigo 97.º, n.º 1, alínea a), n.º 2 e n.º 5 do CPP, prevê que “os atos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão”, imposição esta concretizada no artigo 374.º, n.º 2 do CPP. CLIX. No que à medida da pena concerne, e após explicitar a não aplicação do Regime Especial para Jovens ao aqui Recorrente, o Tribunal recorrido limita-se, após fazer umas considerações gerais sobre os dispositivos a aplicar ao caso em concreto (artigos 70.º, 71.º e 40.º do CP) e um breve resumo do percurso socioeconómico do Recorrente nada referindo quanto à justificação para o quantum da pena dentro da moldura legalmente existente… CLX. Analisando o Acórdão, não vislumbra o Recorrente qualquer fundamentação para a concreta medida da pena aplicada, uma vez que do excerto acima transcrito – no qual o Tribunal se debruça sobre a medida da pena – não decorre, em nenhum momento, qual a justificação para se reputar adequada a pena de 20 anos e não, por exemplo, a de 16 anos (ou outra qualquer). CLXI. Acresce que, o Tribunal a quo apenas dispensa alguma fundamentação para explicitar a diferença da medida da pena aplicada ao aqui Recorrente e aos demais Arguidos, não fundamentando, relativamente a cada um deles – e, para o que aqui importa, em relação ao Recorrente –, quais os fundamentos para aquela pena em concreto. CLXII. Tal omissão impedirá, entende o Recorrente, não só o douto Tribunal superior de compreender o raciocínio seguido pelo Tribunal a quo, e, consequentemente, de reapreciar a decisão impugnada, e impede o Recorrente de exercer, na sua plenitude, o seu direito ao recurso – constitucionalmente consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP –, colocando em causa os fundamentos que levaram à aplicação daquela pena em concreto. CLXIII. Por violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 375.º, 97.º, n.º 1, alínea a), n.º 2 e n.º 5 do CPP e artigos 32.º, n.º 1 e 205.º da CRP, é o Acórdão recorrido nulo, nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1 alínea a) do CPP, a qual expressamente se argui para todos os legais e competentes efeitos. V – Da medida da pena CLXIV. A pena de 18 anos aplicada ao recorrente é desadequada e desproporcional à medida da culpa, sendo ostensivamente exagerada. CLXV. A decisão recorrida para determinação da medida da pena coloca um especial enfoque nas elevadíssimas exigências de prevenção geral no crime de homicídio e, nas exigências de prevenção especial pelo facto de o recorrente ter antecedentes criminais CLXVI. No que bule com as elevadíssimas necessidades de prevenção geral porque clama o crime de homicídio, assume o recorrente que tal é uma realidade incontornável. CLXVII. No entanto, não podem estas nunca se sobrepor ao limite da culpa do agente e acima de tudo nunca podemos esquecer que o fim último de uma condenação é a ressocialização do arguido. CLXVIII. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo pretende “dar o exemplo” com uma pena muito severa como é a dos autos, não é o caminho para resolver esta realidade, cuja solução passará certamente por caminhos educacionais das crianças/jovens. CLXIX. O arguido BB tem antecedentes criminais, é um facto. Por condução sem habilitação legal, por venda de bilhetes, e uma condenação por ofensas à integridade física a um arbitro de futebol, durante um jogo. CLXX. Como o próprio referiu em audiência esta agressão é um facto do qual não se orgulha e que não devia ter acontecido. Trata-se de um ainda jovem pai, com três filhos, um neto, com uma vida pessoal, profissional e social estabilizada. CLXXI. Entende assim o recorrente que a ser condenado nos moldes em que o acórdão o fez (repita-se: só se admite como mero exercício académico), a pena deveria rondar os 14 anos e 3 meses. Normas e princípios violados − Artigos 32.º, n.º 1 e 205.º da CRP. − Artigo 26.º do CP; − Artigos 40.º, 70.º e 71.º do CP; − Artigos 131.º e 132.º do CP − Artigo 48.º do CPC por remissão do artigo 4.º CPP − Artigo 410.º n.º 1 e n.º 2, alíneas a) e b) do CPP; − Artigos 374.º, n.º 2, 375.º, 97.º, n.º 1 alínea a), n.º 2 e n.º 5 e 379.º, n.º 1 alínea a) do CPP; O Recorrente requer, ainda, a realização de audiência no Tribunal Superior, com vista a debater a matéria de facto que infra se impugna, nos termos do disposto no artigo 411.º, n.º 5 do CPP. Nestes termos e nos mais de Direito, que V. Exas. doutamente melhor suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via disso, deverá o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que contemple as conclusões atrás aduzidas. Decidindo, deste modo, farão V. Exas., aliás como sempre, um ato de Inteira e Sã Justiça! (…)” * I.2.5 Arguido CC:“(…) CONCLUSÕES: 1 – O Recorrente vinha acusado e pronunciado pela prática de um crime de homicídio, previsto e punido pelos artigos 131.º e 132.º n.º 1 alíneas e), h) e i) do Código Penal. 2 – Após a produção de prova em audiência de julgamento, foi o Recorrente condenado pela prática do referido crime na pena de 18 anos de prisão. 3 – O presente recurso tem como objeto toda a matéria de facto e de direito em que se fundamenta a decisão ora refutada. 4 – A mãe do falecido OO constituiu-se assistente nos presentes autos, tendo como Mandatário o Ilustre Advogado Dr. EEE. 5 – Aquele Causídico foi mandatário do arguido BB em processos judiciais anteriores aos presentes autos. 6 – Esta questão foi reportada ao processo por aquele arguido, através de missiva junta aos autos a fls. 2599. 7 – Em nossa opinião, a intervenção daquele Causídico no processo é irregular, violando os preceitos contidos nos artigos 99.º e 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados. 8 – A irregularidade do mandato do Causídico que representa a Assistente nos presentes autos, foi novamente abordada aquando do debate instrutório e no início da audiência de julgamento, todavia não foi tomada qualquer posição pelo Tribunal a quo, prosseguindo com a produção de prova. 9 – Aquele Causídico subscreveu peças processuais, requerimentos, inquiriu testemunhas e opôs-se a requerimentos apresentados pela defesa do Recorrente. 10 – Esta intervenção irregular do Ilustre Mandatário da Assistente veio coartar os direitos de defesa dos arguidos, designadamente do aqui Recorrente, uma vez que o Recorrente não beneficiou das mesmas “armas” da Assistente, ou seja, não tinha conhecimento de factos da parte contrária que pudessem resultar em vantagens processuais. 11 – O Código do Processo Penal nada diz quanto à irregularidade do mandato, sendo necessário socorrermo-nos do que dispõe o artigo 4.º do C.P.P. que, por sua vez, remete para os princípios que regem o processo penal e para o direito adjetivo civil, designadamente para o artigo 48.º do C.P.C. 12 – Os direitos de defesa do Recorrente não foram assegurados com a intervenção irregular do Ilustre Mandatário da Assistente, por violação do princípio da igualdade de armas a que alude o artigo 32.º n.º 1 da Constituição Portuguesa. 13 – Em suma, a atuação do Ilustre Mandatário da Assistente MM nos presentes autos, configura uma situação de conflito de interesses e violação do segredo profissional, que conflitua com os interesses da defesa dos Arguidos, conduzindo a uma inexistência jurídica de todos os atos praticados por aquele Causídico, de acordo com a conjugação dos artigos 4.º do C.P.P., 48.º do C.P.C., 20.º e 32.º da C.R.P. 14 – Devendo, para o efeito, ser revogado o douto Acórdão recorrido e, por via disso, o processo deve ser remetido para a fase de instrução, de forma a serem repetidos todos os atos que violaram as disposições supra enunciadas. 15 – O Tribunal a quo considerou provada, entre outra, a seguinte matéria de facto: “1 – Desde o início do ano de 2022 que o arguido AA, o seu agregado familiar, constituído pelos arguidos BB, seu progenitor, DD, sua progenitora, e EE, sua irmã, e CC, companheiro da sua tia paterna (QQ), mantinham um clima de conflito com OO. … 7 – Na posse dessa informação, o arguido BB decidiu deslocar-se com o arguido CC para o estádio e juntamente com o arguido AA decidiram localizar, perseguir, manietar e agredir com instrumento de natureza corto-contundente OO, e, assim, fazendo-se valer do fator surpresa que o grande aglomerado de pessoas lhes proporcionava, bem como da superioridade numérica, dele se vingarem, tirando-lhe a vida. … 11 – Como não conseguiram encontrar o OO, os arguidos AA e BB e CC, acompanhados dos demais arguidos, desembocaram na Rua ..., onde os três primeiros continuaram a procurá-lo entre o aglomerado de pessoas que lá se encontravam, prosseguindo em direção à Alameda ..., passando junto ao .... 12 – A determinado momento, os arguidos AA, BB e CC avançaram por debaixo do viaduto da Rua ..., tendo localizado pelas 2.42.45h o OO, no sentido ascendente da Alameda .... 13 – Nesse instante, os arguidos AA e BB e CC moveram uma perseguição desenfreada a OO. … 15 – O arguido AA logrou alcançar OO quando este ainda corria pela faixa de rodagem da Alameda ..., no sentido ascendente, e esfaqueou-o pelo menos duas vezes, tendo a agressão sido presenciada pelos arguidos BB e CC. 16 – Alguns metros mais à frente, já junto à berma do lado esquerdo da dita Alameda, no sentido ascendente, o OO foi novamente alcançado pelos arguidos BB e CC e quando este conseguiu agarrá-lo pelas pernas, aquele prendeu-o pelos braços, manietando-o, impedindo-o de fugir e de se defender, fazendo-o cair ao chão. 17 – Nessa altura, o arguido AA, fazendo uso da faca de que se encontrava munido, novamente desferiu golpes no OO. … 25 – Em consequência da conduta dos arguidos AA e BB e CC, OO sofreu as seguintes lesões: … 34 – Os arguidos AA e BB e CC agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas acordadas condutas eram proibidas e punidas por lei. 35 – Os arguidos AA, BB e CC sabiam que os golpes desferidos com a faca nos locais referidos poderiam causar a morte como causaram de OO, o que representaram e quiseram. 36 – Sabiam os arguidos AA, BB e CC que ao agir da forma descrita em conjugação de esforços e divisão de tarefas, com superioridade numérica e usando de violência e de instrumentos corto-perfurantes, se constituíam em elevada desproporção relativamente a OO, impedindo-o de se defender e fugir. 37 – Os arguidos AA e BB e CC sabiam que ao perseguir, cercar, agarrar, manietar e agredir OO, impediam a sua fuga e defesa, assim como possibilitavam, como queriam, que o arguido AA desferisse repetidamente golpes com a faca no corpo do OO, atingindo-o nas costas, no peito e no abdómen, onde aqueles sabiam que se alojavam órgãos vitais. 38 – Os arguidos AA, BB e CC não souberam refrear os seus impulsos violentos, atuando da forma descrita, motivados por um desejo de vingança, numa escalada de violência, por motivos relacionados com desentendimentos familiares que envolviam os arguidos AA e BB com o OO. …” 16 – A matéria de facto considerada provada para o efeito, padece de vícios que geram erros na sua apreciação. 17 – Entende o Recorrente que a reapreciação, in casu, das provas gravadas abalará a convicção acolhida pelo Tribunal a quo, porquanto é verosímil que a decisão sobre a matéria de facto está profundamente desapoiada face às provas produzidas. 18 – Deste modo, impõe-se impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, com a qual não concorda o Recorrente, pretendendo a reapreciação da matéria de facto, por ocorrência de erros de julgamento, indicando, nos termos do artigo 412.º n.os 3 e 4 do C.P.P.: “Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida”. 19 – O Recorrente prestou declarações no dia 15 de Março de 2024, conforme CD do dia, com início a 10:15 e final a 11:26, tendo negado os factos que lhe eram imputados. 20 – Em momento algum, o Recorrente refere ou dá a entender que tinha conhecimento dos intentos do arguido AA, ou tivesse conhecimento que este tivesse em sua posse qualquer objeto corto-contundente. 21 – No dia do homicídio do OO, o Recorrente dirigiu-se à Alameda ... para ir buscar a família, mulher e filhos, 22 – Quando chegou junto da sua companheira, QQ, que se encontrava junto ao ..., apercebeu-se que só estava junto daquela o filho FFF, faltando a filha WW, 23 – O que motivou a sua decisão em procurar a sua filha junto ao Estádio, daí ter subido as escadas, e chegado junto ao Estádio começou a procurar a filha. 24 – Os restantes arguidos colocaram-se por baixo do viaduto junto ao cogumelo do Estádio .... 25 – O Recorrente pela indumentária que trajava e pelo seu porte físico é possível observar que não se encontrava naquele local junto dos restantes arguidos, para tanto basta atentar nas imagens de videovigilância da Câmara E069 a minutos 2:40:13 a 2:46:32. 26 – Nas suas declarações, o Recorrente diz que no momento em que está à procura da sua filha é agredido por dois indivíduos que veio a apurar serem amigos do OO e que foram testemunhas nos presentes autos, TT e YY. 27 – A testemunha YY esfaqueou com um X-Ato o Recorrente no braço. 28 – É ainda referido pelo Recorrente nas suas declarações que só vê o OO quando este já estava prostrado no chão, na zona ajardinada da Alameda ..., já os restantes arguidos fugiam do local. 29 – O Recorrente ficou no local onde se encontrava o corpo do OO, tentando ajudá-lo. 30 – Aliás, ficou surpreendido quando viu o OO esfaqueado. 31 – A testemunha TT prestou depoimento referindo que viu o arguido BB e o Recorrente embrulhados com o OO e que foi no seu auxílio, empurrando o arguido BB e dado um soco no Recorrente. 32 – Nesse mesmo instante empurra o OO para este fugir do local. 33 – O OO foge do local, de costas sempre voltado para a testemunha e para o Recorrente, e quando o OO já está a uma distância de cerca de 5 metros, vê o arguido AA a chegar pelas costas do OO e a espetar-lhe uma faca na zona das costelas. 34 – Refira-se que a testemunha diz que esse momento ocorre já o OO estava na zona ajardinada da Alameda .... 35 – Na sequência vai de encontro ao OO, vendo este prostrado no chão. 36 – Diz também que o Recorrente é o último a chegar ao local onde estava o OO prostrado no chão. 37 – É dito ainda por esta testemunha que o Recorrente ficou surpreendido e abalado ao ver que o OO estava esfaqueado. 38 – O que também foi confirmado pelo arguido II nas suas declarações. 39 – Por sua vez, a testemunha SS diz que não viu o arguido AA com nenhuma faca, todavia vê estes a fazer dois movimentos em direção ao OO que não eram consentâneos com murros. 40 – Esses movimentos são feitos pelo arguido AA na zona ajardinada, local onde o OO ficou prostrado. 41 – É também referido por esta testemunha que o Recorrente é o último a chegar junto do OO. 42 – A testemunha YY refere também que vê o arguido AA a desferir uma facada no OO, mas situa essa facada na zona ajardinada. 43 – Contudo, em nossa opinião, esta testemunha não merece qualquer credibilidade, uma vez que andou à pancada com o Recorrente, tendo-o esfaqueado com um X-Ato no braço. 44 – Diz igualmente que o Recorrente foge do local, o que não corresponde à verdade, desde logo, pelo depoimento das restantes testemunhas, assim como pelas imagens de videovigilância, onde é possível observar que o Recorrente fica no local, inclusivamente, já se encontrava no local agentes da PSP. 45 – A testemunha ZZ refere ter visto o arguido AA a esfaquear o OO, situando essa agressão na zona ajardinada. 46 – Em local onde não se encontrava o Recorrente. 47 – Também a testemunha AAA refere ter visto o arguido AA a dar uma facada no OO, situando a mesma na zona ajardinada da Alameda ..., local onde o Recorrente não se encontrava. 48 – Por este motivo, deverá ser alterada a matéria dada como provada, designadamente, os pontos 1, 7, 11, 12, 13, 15, 16, 17. 25, 34, 35, 36, 37 e 38, para a matéria dada como não provada. 49 – O Acórdão ora recorrido está ferido de nulidade, por violação do que dispõe a alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do Código de Processo Penal. 50 – O Recorrente na sua contestação alega que não fugiu do local, que não conhecia o OO e quando o viu esfaqueado tentou ajudá-lo. 51 – Sucede, porém, que o Tribunal a quo ignorou por completo aquela matéria, o que conduz à nulidade do acórdão nos termos da disposição acima mencionada. 52 – Nulidade que aqui se invoca com as legais consequências. 53 – Por outro lado, a decisão ora recorrida dá como provado que o Recorrente, juntamente com os arguidos AA, BB, DD e EE mantinham um clima de conflito com OO (Facto 1 dos Factos Provados). 54 – Ainda nesta senda, no facto 77 da matéria de facto dada como provada, é referido que o Recorrente não conhecia a vítima, referindo-se ao OO. 55 – Há uma manifesta contradição na matéria de facto dada como provada. 56 – Ocorre, assim, o vício prevenido na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal. 57 – Por este motivo, somos propelidos no entendimento de que o Acórdão está ferido de nulidade, nulidade que aqui se invoca, com as legais consequências. 58 – Ficou patente dos depoimentos das testemunhas que não ocorreu qualquer esfaqueamento na faixa de rodagem da Alameda ..., 59 – Assim como não resulta que o Recorrente tenha observado qualquer esfaqueamento. 60 – Por outro lado, na motivação dos factos, o Tribunal a quo refere expressamente que o Recorrente e o arguido BB dominam a vítima, enquanto o arguido AA fazendo uso de uma faca esfaqueia o OO. 61 – Esta conclusão é desfasada da realidade e dos depoimentos das testemunhas, havendo erro notório na apreciação da prova, assim como há insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada. 62 – E por via disso, deverá ser conhecido o vício constante do artigo 410.º n.º 2 alíneas a) e c) do C.P.P. e que consubstancia uma nulidade do Acórdão recorrido. 63 – Não há coautoria material nos presentes autos. 64 – Não resulta da prova produzida em audiência de julgamento que o Recorrente tenha feito qualquer acordo, expresso ou tácito, para tirar a vida ao OO. 65 – Tanto mais que resulta da prova produzida que o Recorrente quando viu o OO esfaqueado ficou surpreendido, tentando ajudá-lo. 66 – Por outro lado, não praticou quaisquer atos que preencham o tipo legal de crime de homicídio, assim como não contribuiu para a ocorrência da morte do OO. 67 – Por estes motivos, não existe coautoria material, devendo, por via disso, o Recorrente ser absolvido da prática do crime de homicídio. 68 – Sem prescindir, a pena de prisão aplicada ao Recorrente é desproporcional. 69 – Tendo em conta que o Recorrente encontra-se socialmente inserido, nunca foi condenado pela prática de crime contra a vida ou integridade física de outrem. 70 – A ser condenado, o que não se concebe, deveria ser numa pena próxima do mínimo, a rondar os 12 anos de prisão. 71 – Por último, o Acórdão recorrido viola as normas constantes dos artigos 71.º, 131.º e 132.º do Código Penal, artigo 4.º, 379.º e 410.º do Código do Processo Penal e artigos 18.º, 20.º e 32.º da Constituição da República Portuguesa. TERMOS EM QUE, NOS MELHORES DE DIREITO, SEMPRE COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS VENERANDAS EXCELÊNCIAS SE REQUER, SEJA DADO INTEIRO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, CONSEQUENTEMENTE, SE REVOGUE A DECISÃO RECORRI+DA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE, ABSOLVA O RECORRENTE DA PRÁTICA DO CRIME DE HOMICÍDIO, ASSIM SE FAZENDO PLENA, COMO ELA O É JUSTIÇA! (…)” * I.2.6 Arguida DD:“(…) Conclusões: A. O presente recurso pretende dar nota de um veemente dissenso em matéria de facto. B. Efetivamente, o que se extrai das provas produzidas em audiência, nomeadamente do depoimento das testemunhas é que as lesões sofridas pela Demandante, nomeadamente, cicatriz na cara, no nariz e a perda de um dente, não foram consequência do puxão de cabelos pela Arguida, matéria de facto dada como provada pela sentença objeto do presente recurso. C. Essas lesões devem-se ao pontapé desferido por um homem, avistado por uma testemunha, assim sendo, nada tendo conexão com a Arguida, que somente se limitou a defender-se, dado que a Demandante lhe puxou os cabelos, tendo sido salva por uma das testemunhas que a conseguiu libertar de tais agressões. D. Ora, ao contrário da decisão ora recorrida, não foram relatados factos pelas várias testemunhas que permitissem concluir ao Tribunal a quo, com a certeza que é exigível, que a Arguida tenha desferido socos, pontapés e joelhadas à Demandante. E. Dadas as agressões de que a Arguida estava a ser alvo, apenas exerceu a defesa necessária para repelir essas mesmas agressões e sempre numa atitude de "defendendi", como a própria testemunha RR referiu por diversas vezes em julgamento. F. Tendo em conta as declarações prestadas pelas testemunhas, não poderiam nunca servir para que o Tribunal a quo formasse a sua convicção no sentido de que a Arguida tenha praticado qualquer crime. G. Foram extremamente titubeante, incoerente e pouco convictos os depoimentos prestados pelas testemunhas, tendo-se o julgamento pautado pela mentira guarnecida, pelo que muitos deles foram adulterados face aos laços afetivos com a Demandante. H. Quanto à prova testemunhal, a testemunha PP dissertou incongruências de tal modo que afetou todo e qualquer silogismo lógico possível, não devendo ter qualquer valor devido à insuficiência de credibilidade; A testemunha VV limitou-se a reproduzir o que ouviu dizer, pelo que não tem qualquer valor, devendo o Tribunal declarar nulo o seu depoimento; A testemunha GGG, não obstante a ter avistado as agressões quando a Demandante estava de pé, até ao momento que esta cai no chão, não conseguir identificar nenhum dos agressores; A testemunha RR assistiu a Arguida ser agredida, não conseguindo esta sair de tal situação, tendo a própria testemunha socorrido a arguida; As testemunhas HHH, III e JJJ, bombeiros, não lograram identificar a Arguida, apenas versaram sobre sujeitos não identificadas; A testemunha NN depôs de forma tal incoerente que não se concebe como pode ter o Tribunal a quo ter valorado tal depoimento. I. Um ponto fundamental será pontapé desferido na cara da Demandante, que depois acaba por confessar que não sabe se foi um pontapé ou não, supõe, tampouco viu quem o desferiu. J. Este ponto tem extrema importância, porque as lesões que a mesma diz ter tido, nomeadamente, cicatriz na cara, no nariz e a perda de um dente, devem-se ao pontapé desferido por um homem (avistado por uma testemunha como supra referido), assim sendo, nada tendo conexão com a Arguida, que simplesmente lhe puxou o cabelo (todavia, a arguida apenas exerceu a defesa necessária para repelir as agressões desferidas pela Demandante). K. A própria Demandante admitiu que estavam mais pessoas no local, não conseguindo identificar quem disferiu o pontapé. L. A mesma chega à conclusão que lhe foi desferido um pontapé não por se recordar exatamente de tal acontecimento, mas sim porque “eu vi no vídeo era que era mais gente”, ora, não tendo assim conhecimento direto dos factos, apenas tentando reproduzir o que viu num vídeo. M. Quanto à prova documental, da visualização do vídeo, nada leva a concluir que a Arguida agrediu a Demandante, porque nada se visualiza no mesmo, dado a baixa qualidade do vídeo, o ser um local com pouca luz e pouca visibilidade, não se conseguindo visualizar quem lá se encontrava. N. Não sendo assim percetível na imagem a Arguida a agredir a demandante. O. O Douto Tribunal a quo fez presunções sem qualquer suporte fáctico. P. A verdade é que o Tribunal a quo forma a sua convicção sem qualquer sustento probatório, dado a prova testemunhal e documental que o mesmo referiu não se pode considerar, como supra demonstrado e justificado, credíveis válidas em toda a sua extensão, por não se afigurar minimamente credíveis, tampouco lógicas. Q. Parece-nos assim que, salvo melhor opinião, não há um elemento probatório nos autos que alicerce a veracidade dos factos dados como provados. R. Como bem se sabe o preceituado no artigo 127.º do Código de Processo Penal deve ter-se por cumprido quando a convicção a que o Tribunal chegou se mostra objeto de um procedimento lógico e coerente de valoração, com motivação bastante, e onde não se vislumbre qualquer assumo de arbítrio na apreciação da prova, o que não sucedeu. S. O Douto Tribunal a quo olvidou-se dos mais elementares princípios em Processo Penal, desde logo, do Princípio In Dubio Pro Reo, que estabelece que na decisão de factos incertos, a dúvida favorece o arguido; ou seja, o julgador deve valorar sempre em favor do arguido um non liquet. T. Carecendo assim de fundamentação, quer de facto e como anteriormente aludido de uma errada aplicação de direito, entendendo por todo o exposto que não se deverão dar como provados factos descritos nos pontos 21, 23, 24, 28 do Acórdão que agora se recorre. U. Deveria a Arguida ter sido absolvida se não por total falta de prova e insuficiente fundamentação, pelo menos ao abrigo do princípio in dubio pro reo. V. Face ao exposto, quanto ao crime de ofensas á integridade física qualificada, pelo qual foi condenada a arguida, impõe-se a sua obrigatória e imediata absolvição por manifesta ausência de prova e contradição entre os depoimentos das testemunhas - na esteira do princípio in dubio pro reo, além da sua absolvição imediata do pedido de indemnização cível deduzido. W. Sem prescindir, face ao diminuto impacto das lesões, não se afigura proporcional fixar a indemnização em 12.000,00 eur, pelo que esta nunca poderia ser superior a 3.000,00 eur. Princípios e disposições legais violadas ou incorretamente aplicadas: > Artigo 32º n.º 2 da CRP; > Artigos 143, n.º 1; 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal; > Artigo 127º do Código de Processo Penal; > Artigo 128º do Código de Processo Penal; > Artigo 374º n.º 2 do Código de Processo Penal. NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, QUE V. EXAS. DOUTAMENTE MELHOR SUPRIRÃO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DISSO, SER ALTERADA A DECISÃO RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE CONTEMPLE AS CONCLUSÕES ATRÁS ADUZIDAS. DECIDINDO DESTE MODO, FARÃO V. EXAS., ALIÁS COMO SEMPRE, UM ATO DE INTEIRA E SÃ JUSTIÇA (…)” * I.2.7 Arguida EE:“(…) Conclusões: A. O presente recurso pretende dar nota de um veemente dissenso em matéria de facto. B. Efetivamente, o que se extrai das provas produzidas em audiência, nomeadamente do depoimento das testemunhas é que as lesões sofridas pela Demandante, nomeadamente, cicatriz na cara, no nariz e a perda de um dente, não foram consequência do puxão de cabelos pela Arguida DD, matéria de facto dada como provada pela sentença objeto do presente recurso. C. Essas lesões devem-se ao pontapé desferido por um homem, avistado por uma testemunha, assim sendo, nada tendo conexão com a Arguida DD, que somente se limitou a defender-se, dado que a Demandante lhe puxou os cabelos, tendo sido salva por uma das testemunhas que a conseguiu libertar de tais agressões. D. Tampouco tem conexão com a Arguida EE, dado o facto de esta nem sequer ter puxado o cabelo, pelo que, não obstante a esta se encontra-se no local, não agrediu ninguém, nem foi avistada por ninguém a agir de tal modo. E. Ora, ao contrário da decisão ora recorrida, não foram relatados factos pelas várias testemunhas que permitissem concluir ao Tribunal a quo, com a certeza que é exigível, que a Arguida DD tenha desferido socos, pontapés e joelhadas à Demandante, tampouco a Arguido EE. F. Dadas as agressões de que a Arguida DD estava a ser alvo, apenas exerceu a defesa necessária para repelir essas mesmas agressões e sempre numa atitude de "defendendi", como a própria testemunha RR referiu por diversas vezes em julgamento. G. Tendo em conta as declarações prestadas pelas testemunhas, não poderiam nunca servir para que o Tribunal a quo formasse a sua convicção no sentido de que as Arguidas tenham praticado qualquer crime. H. Foram extremamente titubeante, incoerente e pouco convictos os depoimentos prestados pelas testemunhas, tendo-se o julgamento pautado pela mentira guarnecida, pelo que muitos deles foram adulterados face aos laços afetivos com a Demandante. I. Quanto à prova testemunhal, a testemunha PP dissertou incongruências de tal modo que afetou todo e qualquer silogismo lógico possível, não devendo ter qualquer valor devido à insuficiência de credibilidade; A testemunha VV limitou-se a reproduzir o que ouviu dizer, pelo que não tem qualquer valor, devendo o Tribunal declarar nulo o seu depoimento; A testemunha GGG, não obstante a ter avistado as agressões quando a Demandante estava de pé, até ao momento que esta cai no chão, não conseguir identificar nenhum dos agressores; A testemunha RR não obstante a ter avistado a Arguida no local, não a viu agredir alguém; As testemunhas HHH, III e JJJ, bombeiros, não lograram identificar as Arguidas EE e DD, apenas versaram sobre sujeitos não identificadas; A testemunha NN depôs de forma tal incoerente que não se concebe como pode ter o Tribunal a quo ter valorado tal depoimento. J. Um ponto fundamental será pontapé desferido na cara da Demandante, que depois acaba por confessar que não sabe se foi um pontapé ou não, supõe, tampouco viu quem o desferiu. K. Este ponto tem extrema importância, porque as lesões que a mesma diz ter tido, nomeadamente, cicatriz na cara, no nariz e a perda de um dente, devem-se ao pontapé desferido por um homem (avistado por uma testemunha como supra referido), assim sendo, nada tendo conexão com a Arguida EE, dado o facto de esta apenas estar no local, como várias outras pessoas, facto exposto pelas testemunhas. L. A própria Demandante admitiu que estavam mais pessoas no local, não conseguindo identificar quem disferiu o pontapé. M. A mesma chega à conclusão que lhe foi desferido um pontapé não por se recordar exatamente de tal acontecimento, mas sim porque “eu vi no vídeo era que era mais gente”, ora, não tendo assim conhecimento direto dos factos, apenas tentando reproduzir o que viu num vídeo. N. Quanto à prova documental, da visualização do vídeo, nada leva a concluir que a Arguida agrediu a Demandante, porque nada se visualiza no mesmo, dado a baixa qualidade do vídeo, o ser um local com pouca luz e pouca visibilidade, não se conseguindo visualizar quem lá se encontrava. O. Não sendo assim percetível na imagem a Arguida a agredir a Demandante. P. O Douto Tribunal a quo fez presunções sem qualquer suporte fáctico. Q. A verdade é que o Tribunal a quo forma a sua convicção sem qualquer sustento probatório, dado a prova testemunhal e documental que o mesmo referiu não se pode considerar, como supra demonstrado e justificado, credíveis válidas em toda a sua extensão, por não se afigurar minimamente credíveis, tampouco lógicas. R. Parece-nos assim que, salvo melhor opinião, não há um elemento probatório nos autos que alicerce a veracidade dos factos dados como provados. S. Como bem se sabe o preceituado no artigo 127.º do Código de Processo Penal deve ter-se por cumprido quando a convicção a que o Tribunal chegou se mostra objeto de um procedimento lógico e coerente de valoração, com motivação bastante, e onde não se vislumbre qualquer assumo de arbítrio na apreciação da prova, o que não sucedeu. T. O Douto Tribunal a quo olvidou-se dos mais elementares princípios em Processo Penal, desde logo, do Princípio In Dubio Pro Reo, que estabelece que na decisão de factos incertos, a dúvida favorece o arguido; ou seja, o julgador deve valorar sempre em favor do arguido um non liquet. U. Carecendo assim de fundamentação, quer de facto e como anteriormente aludido de uma errada aplicação de direito, entendendo por todo o exposto que não se deverão dar como provados factos descritos nos pontos 21, 23, 24, 28 do Acórdão que agora se recorre. V. Deveria a Arguida ter sido absolvida se não por total falta de prova e insuficiente fundamentação, pelo menos ao abrigo do princípio in dubio pro reo. W. Face ao exposto, quanto ao crime de ofensas á integridade física qualificada, pelo qual foi condenada a arguida, impõe-se a sua obrigatória e imediata absolvição por manifesta ausência de prova e contradição entre os depoimentos das testemunhas - na esteira do princípio in dubio pro reo, além da sua absolvição imediata do pedido de indemnização cível deduzido. X. Sem prescindir, face ao diminuto impacto das lesões, não se afigura proporcional fixar a indemnização em 12.000,00 eur, pelo que esta nunca poderia ser superior a 3.000,00 eur. Princípios e disposições legais violadas ou incorretamente aplicadas: > Artigo 32º n.º 2 da CRP; > Artigos 143, n.º 1; 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal; > Artigo 127º do Código de Processo Penal; > Artigo 128º do Código de Processo Penal; > Artigo 374º n.º 2 do Código de Processo Penal. NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, QUE V. EXAS. DOUTAMENTE MELHOR SUPRIRÃO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DISSO, SER ALTERADA A DECISÃO RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE CONTEMPLE AS CONCLUSÕES ATRÁS ADUZIDAS. DECIDINDO DESTE MODO, FARÃO V. EXAS., ALIÁS COMO SEMPRE, UM ATO DE INTEIRA E SÃ JUSTIÇA (…)” * I.2.8 Arguida FF: “(…) CONCLUSÕES: A- Ao limitar-se na sua fundamentação que “Conjugando as declarações da demandante com a prova testemunhal e os relatórios de alta médica de fls. 149 e ss. e de perícia médico-legal de fls. 591 e ss., pode asseverar-se que aquela foi vítima das agressões que se consideraram provadas, com as consequências apuradas. No que respeita à autoria, para além da descrição feita pela própria demandante, consideraram-se as filmagens constantes da Câmara da CMTV agressões 1, onde claramente se identificam as arguidas DD, EE e FF envolvidas na agressão, visualizando-se também na Câmara E69 quando o arguido BB se junta a elas, que as mesmas estão próximo do local onde se encontra caída a demandante.” “Das provas quanto aos factos objetivos, se extrai também a intenção de as arguidas atuarem do modo descrito, aproveitando-se claramente da superioridade numérica.”, o Douto Acordão de que aqui se recorre é nulo por falta de exame crítico da prova (arts. 374º, nº 2 e 379º, nº1, CPP); B- A arguida, aqui recorrente, vem condenada pela prática em co-autoria e na forma consumada de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, no entanto, entende a defesa que a matéria de facto considerada provada, pelo tribunal a quo, não o foi, em relação à recorrente, quer através da prova testemunhal oferecida quer através das filmagens constantes da Câmara da CMTV agressões 1, quer da Câmara E69. C- Por tudo o que vem demonstrado nas presentes alegações de recurso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, não se pode de forma alguma dizer, pelo menos, que não existem dúvidas que a Recorrente terá praticado os factos de que vem acusada, pelo que a mesma terá de ser necessariamente absolvida. D- Não existe, pois, prova suficiente nos autos que permita dar como provados os factos supra transcritos sob os números 22, 23, 24 e 28, sem prescindir da liberdade da apreciação de prova (artigo 127º do CPP), a qual terá de assentar e fundamentar em prova diretamente produzida em julgamento; E- Inexistindo suporte probatório suficientes à luz da lógica e experiência comuns, que alicerçasse a condenação da recorrente, esta deveria ter sido absolvida. F- Além disso, o Tribunal a quo, face à prova direta produzida, abstraiu-se da aplicação do princípio constitucionalmente protegido do “in dúbio por reu” (art.º 32 n.º 2 da CRP). G- Pois, demonstrou-se claramente, por tudo quanto foi supra referido que os fundamentos em que se baseou o Tribunal, de cujo douto acordão se recorre, são no mínimo suscetíveis de provocarem dúvidas acerca dos reais autores material do crime que se discute. H- Não existe, pois, prova suficiente nos autos que permita dar como provados os factos supra transcritos sob os números 22, 23, 24 e 28, devendo ter-se por não provados. I- Dúvidas essas que não poderão prevalecer como fundamento de uma sentença condenatória da recorrente, sobe pena de violação do princípio da presunção de inocência. J- Assim, feriu a douta sentença o art.º 127 do CPP, art.º 143/1, 154/1 e 155 do CP e artigo 32º n.º 2 da CRP. K- Por todo o exposto, deverá a recorrente ser absolvida do que crime pelo qual foi condenada, bem como do pedido cível formulado, uma vez que, atendendo à prova produzida em audiência de julgamento, não se provaram, sem margem para dúvidas, os factos constantes do Acórdão do Tribunal a quo. L- Existe erro de julgamento capaz de conduzir à modificação da matéria de facto pelo Tribunal de recurso, nos termos dos artigos 412º, nº 3 e 431º, alínea b), ambos do Código de Processo Penal, porquanto: - o Tribunal a quo deu como provado os factos com base nas declarações da Assistente, a qual em momento algum identificou a Arguida Recorrente como co-autora material e deu como provados factos com base em provas insuficientes ou não bastantes para prova desses mesmos factos, nomeadamente com violação das regras de prova; - E nas demais situações em que do texto da decisão e da prova concretamente elencada na mesma e que vem supra questionada especificadamente as filmagens, se permite concluir, fora do contexto da livre convicção, que o tribunal errou, de forma flagrante, no julgamento da matéria de facto em função das provas produzidas. M- A diferente valoração da prova não se confunde com o erro de julgamento ou com qualquer dos vícios do artigo 410º, nº 2 do Código de Processo Penal. N- A livre convicção tem que ser objetiva e motivada de modo a permitir um controlo pelos destinatários da mesma, pela sociedade e pelos tribunais de recurso, mas, verificada tal motivação, a mesma só nos casos excecionais legalmente previstos (erro de julgamento e vícios) ou situações de arbitrariedade ou juízos puramente subjectivos e imotiváveis, é possível ser sindicada por um tribunal de recurso. Termos em que, dando provimento ao presente recurso e, em consequência, revogando o douto Acordão proferido na primeira instância, V. Exas, absolvendo a Recorrente farão Justiça! (…)” * I.2.8 Arguido GG:“(…) Conclusões: 1. Decidiu o tribunal a quo condenar o arguido pela prática, de um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de €8,00 (oito euros), no montante global de 1.440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros). 2. Não pode o arguido conformar-se com a pena aplicada, que no seu entender se revela excessiva por violação, desde logo, do disposto no artigo 71.º CP. 3. Entende a defesa que foi violado o princípio da proporcionalidade latu sensu. 4. A arma (borboleta, com características letais muito pouco relevantes) encontrava-se na casa do arguido, foi encontrada na sequência de uma busca domiciliária, depositada em más condições, não tendo sido utilizada ou usada pelo próprio o que no nosso entendimento mitiga a sua culpa minimizando a. 5. A arma não tem qualquer conexão/relação causa efeito com os restantes crimes, pelo que no caso não existem razões de prevenção, o que ate é assinalado na fundamentação, veja-se que se considera ainda que no meio da residência que se trata de local com pouca conflitualidade reitera se em nada comparável aos factos objeto dos demais co arguido que no âmbito deste processo estiveram a ser julgados, pelo que na quantificação dos dias deveria ter militado a seu favor as inúmeras atenuantes, violam-se ainda critérios de adequação e proporcionalidade entre o decidido e o apurado 6. O arguido não tem quaisquer antecedentes criminais por crimes desta natureza. 7. O Supremo Tribunal de Justiça, no seu douto Acórdão de 11/02/2021, processo n.º 762/19.1GBAGD.P1.S1 tece algumas considerações acerca da reparação das consequências do crime, apelando a que sejam ponderadas as necessidades de prevenção geral e especial neste âmbito. 8. Foram valoradas as declarações do próprio arguido, que demonstrou uma cooperação na descoberta da verdade material e um arrependimento face aos mesmos. 9. Isto é, o arguido confessou integralmente e sem reservas, revelando um colossal arrependimento. 10. A este propósito, o Tribunal da Relação de Lisboa escreve no seu Acórdão de 04/10/2011, processo n.º 1484/10.4PFL que “a confissão integral e sem reservas, desde que espontânea e desinteressada (…) constitui um sinal poderoso no sentido da inexistência de necessidades preventivas”. 11. Se é verdade que as condutas do arguido devem ser punidas, também é verdade que as penas a aplicar devem revestir os concretos factos que praticou, bem como a sua postura após o seu cometimento que, in casu, foi de arrependimento e consciencialização crítica. 12. Face a toda esta factualidade, é suficiente para realizar a tutela dos bens jurídicos protegidos a aplicação ao arguido de uma pena de multa por um menor número de dias. 13. Relativamente ao quantitativo diário da multa, importa relembrar que de acordo com o nº 2 do artigo 47º do Código Penal "cada dia de multa corresponde a uma quantia entre €5 e €500, que o Tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos familiares". 14. A aplicação da pena tem em vista, que o efeito da pena se faça sentir, mas sem que coloque em causa a sobrevivência do arguido e, bem assim, que não seja de tal modo desproporcionada que o arguido não tenha possibilidades de a cumprir, mesmo que em prestações, como é o caso concreto. 15. Considera-se que não foram devidamente consideradas as condições económico-financeiras do arguido e que o valor da multa é desproporcional às suas capacidades para a cumprir mantendo a razoável estabilidade da vida familiar. 16. Dentre os factos que o tribunal tem de apurar, por via dos princípios da investigação e verdade material, constam aqueles relativos à situação económica do condenado, essenciais à fixação da taxa da pena de multa, quando seja esta a opção do tribunal. 17. Relativamente às regras de fixação da taxa diária da pena de multa, dada a técnica usada pelo legislador num primeiro momento há que quantificar a pena de multa a aplicar ao caso, determinada segundo os critérios estabelecidos no art. 71º, e depois fixar a respetiva taxa diária. 18. E quanto a isto a lei apenas diz, no nº 2 do art. 47º do Código Penal, que cada dia de multa corresponde uma quantia entre 5 e 500 €, «que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais». 19. Resulta do Relatório Social, que sustentou a fundamentação do douto acórdão, que o arguido, ora recorrente, encontra-se atualmente numa situação de desemprego. 20. Reside com a progenitora, de 57 anos, empregada de limpeza, e irmão, de 34 anos, assistente operacional em unidade Hospitalar. O núcleo familiar reside há cerca de 15 anos em apartamento camarário. Que o progenitor do arguido também presta solidariedade ao mesmo. 21. À data dos factos, assim como presentemente, GG não dispõe de rendimentos próprios, beneficiando do suporte financeiro e habitacional da progenitora. 22. O agregado dispõe de uma situação económica modesta, subsistindo dos rendimentos de trabalho da progenitora (atualmente com incapacidade temporária para o trabalho) e do irmão do arguido, que suportam as despesas fixas mensais decorrentes dos encargos com a renda da habitação, cerca de 39Euros, consumos domésticos (água e eletricidade), cerca de 140Euros, telecomunicações, cerca de 75Euros, e alimentação. 23. O arguido, de 24 anos, encontra-se desempregado desde há cerca de 2 anos, pese embora efetue trabalhos pontuais na área da mecânica. 24. Os factos constates do RS demonstram que o arguido não dispõe de condições económicas para assumir o pagamento da multa fixada. 25. Se é verdade que a pena de multa terá de representar uma censura do facto e, ao mesmo tempo, uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada, não é menos certo que deverá sempre ser assegurado ao condenado o nível existencial mínimo adequado às suas condições sócioeconómicas, que no caso concreto são parcas. 26. O tribunal tem que atender à situação presente para adequar a pena de multa de modo a não fixar uma pena nem que seja de cumprimento impossível, nem que se traduza numa quase absolvição: se o montante for desajustado porque demasiado elevado o que resulta é que o condenado não poderá, simplesmente, cumprir, mesmo que nisso faça questão; se for demasiado baixo o cumprimento da pena não gera nem sacrifício, nem desconforto, e acaba por não se fazer sentir. 27. Pelo que, sempre deverá o Venerando Tribunal da Relação, ponderar pela fixação do quantitativo pelo mínimo diário. 28. Que no caso concreto nunca seria considerado demasiado baixo, atendendo à sua parca condição económica, e aos factos constantes do Relatório Social. 29. Uma pena fixada em número inferior de dias seria aquela que melhor se coaduna com as finalidades da pena e pela taxa diária mínima, sempre significaria um esforço para o recorrente, e não tornaria impossível o cumprimento. 30. Acresce que a pena atualmente fixada se encontra em claro desrespeito pelo artigo 18.º, n.º1 e 2 CRP, e sempre deveria ter em consideração este princípio orientador e constitucionalmente previsto. Normas que considera violadas: artigos 40º, 70º, 71.º, 72.º, n.º2, al. c), e 47º do Código Penal, bem como artigo 18.º, n.º1 e 2 da Constituição da República Portuguesa. Nestes termos, requer que V. Exa. dê provimento ao presente recurso, reduzindo se o quantum da pena cominado e o valor diário do pagamento de multa, por mais proporcional aos factos apurados. (…)” » I.3 Recurso interlocutório Inconformado com o despacho proferido na sessão de julgamento de 7 de Março de 2024, que indeferiu a diligência de tomada de declarações aos peritos requerida pelo arguido AA – arts. 401º, n.º 1, al. b), e 411º, n.ºs 1 e 3, Código Processo Penal, dele interpôs recurso o referido arguido, para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respectiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]: Os recursos do acórdão final foram admitidos, nos termos do despacho proferido a 15/07/2024, com os efeitos de subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo. # O recurso interlocutório interposto pelo arguido AA do despacho proferido na sessão de julgamento de 7 de Março de 2024, que indeferiu a diligência de tomada de declarações aos peritos requerida pelo mesmo – arts. 401, n.º 1, al. b), e 411, n.ºs 1 e 3, Código Processo Penal, foi admitido, nos termos do despacho proferido a 10/04/2024, com os efeitos de subir com o recurso que vier a ser interposto da decisão que puser termo à causa e nos próprios autos e com efeito não suspensivo – arts. 406, n.º 1, 407, n.ºs 1, 2, a contrario, e 3, e 408, a contrario, do Código Processo Penal. No seu recurso do acórdão final, veio o arguido recorrente AA, manifestar a sua manutenção de interesse no recurso interlocutório. » Efectuadas as legais notificações, foram juntas aos autos as respostas aos recursos que seguem. O Ministério Público junto da 1ª Instância, a seu tempo (16/04/2024 – refª Citius nº 38770871), respondeu ao recurso interlocutório interposto pelo arguido AA, pugnando pela sua improcedência, nos termos seguintes [transcrição]: “(…) EM CONCLUSÃO: 1. O recorrente não pode invocar a nulidade (sanável) por omissão de diligências essências para a descoberta da verdade, nos termos do disposto no artigo 120º do CPP e, por outro lado, recorrer da decisão de indeferimento; 2. Não constituindo, pois, a arguição de tal nulidade (sanável), o meio adequado decorrente da inobservância do disposto no nº1 do artigo 340º do C.P.P.; 3. As declarações das Peritas que levaram a efeito a autópsia que o recorrente apenas pretendeu ouvir após a produção da prova testemunhal da acusação, foram apenas indicadas, atempadamente, pela assistente, devendo o recorrente e caso entendesse tê-lo feito em sede própria; 4. A justificação por parte do Tribunal Coletivo sobre o indeferimento da sua pretensão é pacífica e assertiva sobre a desnecessidade de produção dessa diligência porquanto eventuais esclarecimentos, encontram-se bem explicitas no próprio relatório e era há muito conhecida, desde o seu primeiro interrogatório judicial, a sua versão no desferimento das facadas; 5. Sendo um poder discricionário do Tribunal Coletivo, bem andou o Tribunal ao concluir que o arguido tem direito à produção de prova mas esse direito está limitado pela sua admissibilidade, relevância jurídica e necessidade (artigos 124º e 340º, nº 1 e 4 do Código de Processo Penal); 6. Sendo essa concretização inútil para os autos, o princípio da necessidade impõe que não se admita, devendo a decisão do Tribunal recorrido manter-se; 7. Inexistindo qualquer violação legal. Porém, Vªs Exªs, como sempre farão JUSTIÇA (…)” #
O Ministério Público junto da 1ª Instância respondeu ao recurso interposto pelos arguidos, do acórdão final, pugnando pela sua improcedência, nos termos seguintes [transcrição]: “(…) A) Vêm os presentes recursos interpostos pelos arguidos acima mencionados por não se conformarem com o acórdão proferido em 08/5/2024, que condenou cada um dos arguidos recorrentes e passamos a esquematizar: 1. a arguida FF pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, e 4, do Dec. Lei 401/82, de 23.09, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, mediante: a) regime de prova orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); b) pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; 2. A arguida DD pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, mediante: a) regime de prova orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); b) pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; 3. A arguida EE pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, e 4, do Dec. Lei 401/82, de 23.09, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, mediante: a) regime de prova orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); b) pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; 4. O arguido GG pela prática, no dia 8/6/2022, de um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de €8,00 (oito euros), no montante global de 1.440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros). 5. O arguido AA pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, na pena de 20 (vinte) anos de prisão; 6. O arguido BB pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, na pena de 18 (anos) anos de prisão; 7. O arguido CC pela prática, no dia 8/5/2022, de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, na pena de 18 (anos) anos de prisão. O âmbito dos recursos são limitados pelas conclusões extraídas pelos recorrentes das respetivas motivações, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, como sejam os vícios do artigo 410º nº2, do Código de Processo Penal (Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal III, 3ª edição, pag.347 e jurisprudência uniforme do S.T.J. acórdão de 7/95, de 19/10/995, in DR, série I-A de 28/12/95). Assim, Delimitado pelas conclusões - art. 412.º n.º 1 do CPP - (apud Leal Henriques e Simas Santos “Recursos em Processo Penal”. 3ª ed., p. 48; e Acs. do STJ de 16.1.95, in BMJ 451 – 279; de 31.10.96, in BMJ 453 – 338 e de 19.04.99. in CJ, A II, 2. p. 189). B) Recurso de FF: 1. O recurso interposto pela arguida FF, inconformada, alega -de direito e de facto, Em síntese, o recurso desta arguida, atentas as conclusões (de A a N) que balizam o respetivo objeto, sustenta o seguinte: i. Invoca dúvida sobre a matéria dada como provada nos números 22,23,24 e 28, por inexistir suporte probatório suficiente, sem prescindir da liberdade de apreciação da prova do artigo 127º do CPP, à luz da logica e experiência comuns; ii. Daí que propugne pela sua absolvição, invocando o principio constitucional do “in dúbio pro reo” do artigo 32º da CRP; iii. Devendo aqueles factos dados como provados, serem dados como não provados; iv. Entende violados os artigos 127º do CPP, 143/1, 154/1 e 155 do CP e 32º nº2, da CRP. C) Recurso de DD: 2. O recurso interposto pela arguida DD, inconformado, alega - de facto e de direito- Em síntese, o recurso por esta arguida, atentas as conclusões (de A a V) que balizam o respetivo objeto, sustenta o seguinte: i. Entende ter existido dissenso entre a matéria de facto quanto ao depoimento das testemunhas já que as lesões sofridas pela demandante, na cara, nariz e perda de um dente, não foram consequência de puxão de cabelos por parte da arguida, que só se limitou a defender, mas devido a pontapé desferido por um homem, nada tendo de conexão com a arguida; ii. Como não terem sido relatados factos que permitissem concluir que a arguida tenha desferido socos, pontapés e joelhados à demandante; iii. Invoca ter atuado apenas com atitude “defendendi” para repelir essas mesmas agressões de que estava a ser alvo; iv. Entende incoerentes os depoimentos prestados pelas testemunhas PP, porque dissertou incoerências; VV por ter-se limitado a reproduzir o que ouviu dizer; GGG, por não ter conseguido identificar nenhum dos agressores; RR que a assistiu; HHH, III e JJJ, bombeiros que não a identificaram e a incoerente NN; 4 v. Dizendo que esta não conseguiu identificar de que foram foi atingida por um pontapé, que ninguém viu e desferido por um homem, apenas procurou e tentou reproduzir aquilo que viu num vídeo, não tendo conhecimento direto dos factos; vi. Que quanto à prova documental e da visualização do vídeo nada se ter visualizado; vii. Entende que nada foi percetível na imagem de ter agredido a demandante e que o Tribunal fez presunções sem qualquer suporte facto; viii. Invoca os artigos 127º do CPP e o princípio do in dúbio pro reo, que deveria ter sido valorado a seu favor; ix. Não devendo terem sido dados como provados os pontos 21,23,24, 28 do acórdão; x. Propugna pela sua absolvição; xi. Disposições violadas: 32º n.º 2 da CRP; Artigos 143, n.º 1; 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal; Artigo 127º do Código de Processo Penal; Artigo 128º do Código de Processo Penal; Artigo 374º n.º 2 do Código de Processo Penal. D) Recurso de EE: 3.O recurso interposto pela arguida EE, inconformada, alega - de facto e de direito- Em síntese, o recurso por esta arguida, em tudo idêntico o da anterior arguida, sua progenitora, atentas as conclusões (de A a W) que balizam o respetivo objeto, sustenta o seguinte: i. Entende ter existido dissenso entre a matéria de facto quanto ao depoimento das testemunhas já que as lesões sofridas pela demandante, na cara, nariz e perda de um dente, não foram consequência de puxão de cabelos por parte da arguida DD, que só se limitou a defender, mas devido a pontapé desferido por um homem, nada tendo de conexão com a arguida DD; ii. Como não terem sido relatados factos que permitissem concluir que a arguida DD tenha desferido socos, pontapés e joelhados à demandante, ou tampouco por ela própria; iii. Entende incoerentes os depoimentos prestados pelas testemunhas PP, porque dissertou incoerências; VV por ter-se limitado a reproduzir o que ouviu dizer; GGG, por não ter conseguido identificar nenhum dos agressores; RR que a assistiu; HHH, III e JJJ, bombeiros que não a identificaram e a incoerente NN; iv. Dizendo que esta não conseguiu identificar de que foram foi atingida por um pontapé, que ninguém viu e desferido por um homem, apenas procurou e tentou reproduzir aquilo que viu num vídeo, não tendo conhecimento direto dos factos; v. Entende que as lesões que disser ter sofrido o foram por um pontapé desferido por um homem, nada tendo de conexão consigo; vi. Dizendo que quanto à prova documental e da visualização do vídeo nada se ter visto; vii. Entende que nada foi percetível na imagem de ter agredido a demandante e que o Tribunal fez presunções sem qualquer suporte facto; viii. Invoca os artigos 127º do CPP e o princípio do in dúbio pro reo, que deveria ter sido valorado a seu favor; ix. Não devendo terem sido dados como provados os pontos 21,23,24, 28 do acórdão; x. Propugna pela sua absolvição; xi. Disposições violadas: 32º n.º 2 da CRP; Artigos 143, n.º 1; 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal; Artigo 127º do Código de Processo Penal; Artigo 128º do Código de Processo Penal; Artigo 374º n.º 2 do Código de Processo Penal. E) Recurso do arguido GG: 4. O recurso interposto pelo arguido GG, inconformado, alega de direito-, Em síntese, o recurso por este arguido, atentas as conclusões (de 1 a 30) que balizam o respetivo objeto, sustenta o seguinte: i. Assenta a sua discordância na multa aplicada que entende como excessiva, violando o disposto no artigo 71º do Código Penal; ii. Não tendo a arma – em mau estado-encontrada em sua casa, qualquer conexão com os restantes crimes; iii. Não tem qualquer antecedente criminal por crimes desta natureza; iv. Ter colaborado com a descoberta da verdade material e denotado arrependimento; v. Face ao disposto no artigo 47º nº2 do Código Penal e dado as suas condições económico-financeiras e familiares que constam do seu relatório social, a fixação do quantitativo diária deveria ser pelo mínimo; vi. Dispositivo violado: artigo 18º nºs 1 e 2 da CRP e 40º, 70º, 71º, 72º nº2 al.c) e 47, do Código Penal. F) Recurso de recurso de AA: 5. O recurso interposto pelo arguido AA, inconformado, alega - de facto e de direito-, Em síntese, o recurso por este arguido, atentas as conclusões (de I. a CCLXIX) que balizam o respetivo objeto, sustenta e em síntese o seguinte: i. Incorretamente provados os pontos 1, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 25, 34, 35, 36, 37 e 38; ii. Fala em factos reportados a um evento inesperado e fugaz, ocorrido num local com reduzida luminosidade, num momento ascendente em que é vista a vitima na Alameda ... e aquele em que é visto, já desfalecido no centro dela e onde existiam outras pessoas; iii. Por isso contesta que com segurança se possa afirmar que o resultado morte tem de ser-lhe exclusivamente imputado, dizendo não ter tido possibilidade do Tribunal atribuir a mesma a outros indivíduos; iv. Contesta a perícia médico-legal que apenas atestou o número de facadas; v. Desconsiderando as declarações dos arguidos e considerando os depoimentos de testemunhas, amigas e próximas do falecido, apesar de alguns totalmente contraditórios entre si; vi. Entende que o MP não trouxe a julgamento uma acusação sustentada e justifica a situação de nenhum dos arguidos ter conseguido explicarem o momento em que foram produzidas as 18 facadas, por não terem estado presentes durante todo o evento. vii. Contesta os primeiros pontos provados por entender não ser ele e o seu agregado que mantinha um conflito com o OO, mas o contrário, tal como na troca de palavras entre QQ e OO, apenas ter terminado quando este voltou para junto de seus amigos, como disse resultar provado dos depoimentos deles; não concordando que a DD tivesse pretendido alertar o ser pai para a presença do OO no local; Não concorda com o ponto 7, porque não pretenderam tal coisa (ponto que deveria ser dado como não provado); tal como o ponto 9, face ao depoimento às suas declarações, dos restantes dois condenados familiares (BB e CC) e depoimento da sua namorada RR; viii. E, por imposição do principio do “in dúbio pro reo”, deveria ser também dado como não provado o ponto 11, tal como o 12 por não ter sido possível detetar as horas referentes ao vídeo da camara E069; existindo também erro de julgamento referentes aos pontos 13ª 18, por má sustentação do Tribunal nos depoimentos das testemunhas SS, ZZ, PP, AAA, UU, TT, BBB, CCC, XX e YY; ix. Dissecando os depoimentos das visadas testemunhas em conjunto com as câmaras de CCTV, ter existido erro de julgamento nos pontos provados 13 a 18, os quais deveriam terem sido dados como não provados; tal como o ponto 25; x. Igualmente os pontos 34ª 38 que levaram à consideração e qualificação como tratando-se do cometimento de um crime de homicídio qualificado, pelo que também estes deveriam terem sido dados como não provados; xi. Já quanto à alegada questionada matéria de direito por virtude da violação do prescrito no artigo 375º nº1, do CPP, alega concomitantemente a violação dos artigos 97º nº1 al. a) e nº2 e nº5 do CPP e 374º nº2 do CPP, por não explicitar a não aplicação do Regime Especial dos Jovens Adultos, bem como a falta de qualquer fundamentação para a concreta medida da pena aplicada, pelo que entende também violado o disposto no artigo 379º do CPP; xii. Termina dizendo inexistir qualquer nexo causal entre a conduta praticada e o resultado verificado morte, pelo que apenas deveria ter sido condenado pelo crime de ofensa à integridade física; xiii. Questionando também a atuação dos restantes dois arguidos condenados, porque a atuação dos três ter sido independente. xiv. Continuando a contestar a qualificação do homicídio em função da utilização de qualquer meio insidioso; xv. Normas violadas: 410º nºs 1 e 2 als. a) e b) do CPP; 131º e 132º do CP; 26ºCP; 40º, 70º e 71º do CP; 374º nº2, 375º, 97º nº1 al. a) e nº5 e 379º nº1 al. a) do CPP e 32º da CRP. G) Recurso de recurso de BB: 6. O recurso interposto pelo arguido BB, inconformado, alega - de facto e de direito-, em síntese, o recurso por este arguido, em tudo idêntico ao do anterior condenado, seu filho, atentas as conclusões (de I. a CCXX) que balizam o respetivo objeto, sustenta e em síntese o seguinte: i. Como questão prévia, alega irregularidade de representação quanto à pessoa da assistente, dizendo que o mandatário desta não deveria representá-la, por virtude de ate há pouco tempo ter sido seu mandatário (noutros processos) tendo, inclusive, aparecido em imagens consigo em vários canais televisivos e daí ter um conhecimento profundo da sua vida, pelo que entende não estar em igualdade de armas na sua defesa, pelo que existirá uma irregularidade de mandato naquele sujeito processual e nos termos do artigo 48º do C. P. Civil; ii. Incorretamente provados os pontos 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 25, 34, 35, 36, 37 e 38; iii. Entende que deveria ter sido credibilidade às declarações de todos os arguidos/condenados, bem como das duas condenadas/arguidas DD e testemunhas RR (companheira de AA) e QQ, sua irmã, devendo os primeiros factos provados de 1 a 12 não o terem sido; xvi. Não concorda com a sustentação dos restantes pontos provados – de 13,15,16,17, por ter sido sustentada em testemunhos dos amigos do falecido OO, como sejam, SS, ZZ, PP, AAA, UU, TT, BBB, CCC, XX e YY; xvii. Dissecando os depoimentos das visadas testemunhas, bem como os registos telefónicos e localizações das BTE´s de algumas delas, como sejam do PP; entendendo que, os pontos em causa deveriam terem sido dados como não provados; xviii. Tal como os pontos 34ª 38 que levaram à consideração e qualificação como tratando-se do cometimento de um crime de homicídio qualificado, pelo que também estes deveriam terem sido dados como não provados; xix. Já quanto à alegada questionada matéria de direito, invoca insuficiência de matéria para a decisão, vício a que alude o disposto no artigo 410º al. a) do CPP; xx. Contestando a qualificação do homicídio referente à qualificação por força das alíneas h) e i), nº2 do artigo 132º do Código Penal; xxi. Para além de invocar falta de fundamentação na aplicação da pena concreta; xxii. Normas violadas: 32º nº1 e 205, da CRP; 26º do C.P.; 40º, 70º e 71º do C.P.; 131º e 132º do CP; 48º do CRC e 4º do CPP; 410º nºs 1 e 2 als. a) e b) do CPP; 374º nº2, 375º, 97º nº1 al. a) e nº5 e 379º nº1 al. a) do CPP. H) Recurso de recurso de CC: 7. O recurso interposto pelo arguido CC, inconformado, alega - de facto e de direito-, em síntese, o recurso por este arguido, em tudo similar ao do anterior condenado, seu cunhado, atentas as conclusões (de 1. a 71) que balizam o respetivo objeto, sustenta e em síntese o seguinte: i. Alega irregularidade de representação quanto à pessoa da assistente, por parte do seu mandatário, por ter representado em processos judiciais e anteriores a estes o arguido BB e por nestes o mesmo aquando do debate instrutório e no inicio do julgamento – entre outros atos processuais-, se ter oposto a requerimentos apresentados pela defesa dos arguidos, pelo que entende que a intervenção deste causídico nestes autos é irregular por violação dos preceitos 99º e 92º do Estatuto da Ordem dos Advogados; invocando, assim, desigualdade de armas da sua defesa; ii. Entende como incorretamente julgada a matéria de facto provada por ocorrência de erros de julgamento, nos termos do artigo 412º nºs 3 e 4 do CPP, face à prestação das suas próprias declarações, bem como dos depoimentos da sua companheira, da câmara E069 e das testemunhas TT e YY; iii. Invoca o vicio do disposto no artigo 410º al. a) e c), do CPP; iv. Sem prescindir entende como demasiada e desproporcional a pena aplicada, devendo ter-se optado por uma pena no mínimo de 12 anos; v. Normas violadas: 71º do C.P.; 131º e 132º do CP; 4º, 379º e 410º, do CPP, 18º, 20º e 32º da CRP. I) Passando a responder: QUESTÃO PREVIA Quanto à matéria de facto: Nos termos do art.412º, nºs 3 e 4 do C.P.P, pois e conforme impõe este Nº3- quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, …deverá especificar: a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) as provas que devem ser renovadas; 4- quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do numero anterior fazem-se por referencia ao consignado na acta, nos termos do disposto no nº2 do artigo 364º, devendo do recorrente indicar correctamente as passagens em que se funda a impugnação; Esta norma descreve o iter procedimental a cumprir em caso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, O cuidado da lei ao fixar os pressupostos de uma impugnação vitoriosa deve-se à circunstância de o recurso sobre matéria de facto, não obstante incidir sobre a prova produzida e o seu reflexo na matéria assente, não configurar um novo julgamento, Conforme os tribunais superiores repetidamente afirmam o recurso sobre matéria de facto é um remédio e como remédio que é o que pretende é corrigir os erros de julgamento no que à matéria de facto respeita, Ou seja, é um remédio dirigido a um mal (op. cit, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 3-3-2010, in processo comum colectivo nº251/07.7GBPNF, do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Penafiel). 1,2,3: Ora, as condenadas/arguidas recorrentes, particularmente a arguida FF, não respeitou- minimamente-, esta legal formulação, ainda que dizendo impugnar matéria de facto, apenas refere e lança dúvidas sobre a matéria de facto provada, entendendo não ter suporte facto suficiente para a sua incriminação, tendo o critério da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do CPP sido mal orientado, pugnado pela sua absolvição e face ao princípio constitucional a que se refere o artigo 32º, pelo que os facto dados como provados nos itens 22,23,24 e 28º deveriam terem sido não provados. Sem apontar qual factualidade que pretendia ver provada e, sobretudo, apontar qual o erro na apreciação destes testemunhos e respetiva restante indicada prova; Daí que por falta de observância legal, dele não se deverá conhecer-se. Recapitulando, Foi a seguinte a matéria dada como provada e em relação aos questionados pontos por parte dos arguidos/condenados e aqui recorrentes FF, DD, EE, AA, BB e CC: “……………………………………………………………………………………………………… 1-Desde o início do ano de 2022 que o arguido AA, o seu agregado familiar, constituído pelos arguidos BB, seu progenitor, DD, sua progenitora, e EE, sua irmã, e CC, companheiro da sua tia paterna (QQ), mantinham um clima de conflito com OO. 2-No mês de janeiro de 2022 ocorreram conflitos físicos numa discoteca entre AA e OO, que prosseguiram com um novo episódio, aquando da ..., envolvendo OO e os arguidos AA e EE. 3-Na sequência deste último episódio, o arguido BB deslocou-se ao Bairro ... à procura de OO, tendo aí ocorrido desacatos. 4-Neste contexto, no dia 7/5/2022, durante a tarde, no Estádio 1..., em Lisboa, onde os arguidos BB e AA se encontravam por ocasião do jogo que opôs o ... ao ..., o primeiro, apercebendo-se da entrada de OO na bancada logo o desafiou para lutarem, gerando-se uma contenda que só cessou com a intervenção de terceiros. 5-Cerca das 2.00h do dia 8/5/2022, em plenos festejos da vitória do ... sobre o ... e no campeonato, junto às barracas da ... existentes no anel que rodeia o Estádio ..., OO e QQ envolveram- se numa troca de palavras que cessou quando o primeiro voltou para junto do seu grupo de amigos. 6-Depois do encontro tido com OO, a arguida DD alertou o arguido BB para a presença do OO junto ao Estádio .... 7-Na posse dessa informação, o arguido BB decidiu deslocar-se com o arguido CC para o estádio e juntamente com o arguido AA decidiram localizar, perseguir, manietar e agredir com instrumento de natureza corto- contundente OO, e, assim, fazendo-se valer do fator surpresa que o grande aglomerado de pessoas lhes proporcionava, bem como da superioridade numérica, dele se vingarem, tirando-lhe a vida. 8-Os arguidos BB e CC deslocaram-se para junto do ..., onde se encontraram com os arguidos AA, II, HH, JJ, GG, EE, FF e DD, que, entretanto, também para aí se dirigiram, descendo as escadas junto ao estádio cerca das 2.35h. 9-Após, todos os arguidos subiram as escadas do estádio pelo lado do ..., e dirigiram-se para o local onde o OO tinha sido visto próximo da rulote da .... 10-OO, alertado de que os arguidos se encontravam no local à sua procura, tinha já iniciado o regresso a casa, subindo a Alameda ..., pelo que já não se encontrava no local. 11-Como não conseguiram encontrar o OO, os arguidos AA e BB e CC, acompanhados dos demais arguidos, desembocaram na Rua ..., onde os três primeiros continuaram a procurá-lo entre o aglomerado de pessoas que lá se encontravam, prosseguindo em direção à Alameda ..., passando junto ao .... 12-A determinado momento, os arguidos AA, BB e CC avançaram por debaixo do viaduto da Rua ..., tendo localizado pelas 2.42.45h o OO, no sentido ascendente da Alameda .... 13-Nesse instante, os arguidos AA e BB e CC moveram uma perseguição desenfreada a OO. 14-O arguido AA seguia à frente de um grupo de pessoas não concretamente identificadas empunhando e manuseando uma faca com uma lâmina de comprimento não apurado em concreto. 15-O arguido AA logrou alcançar OO quando este ainda corria pela faixa de rodagem da Alameda ..., no sentido ascendente, e esfaqueou-o pelo menos duas vezes, tendo a agressão sido presenciada pelos arguidos BB e CC. 16-Alguns metros mais à frente, já junto à berma do lado esquerdo da dita Alameda, no sentido ascendente, o OO foi novamente alcançado pelos arguidos BB e CC e quando este conseguiu agarrá-lo pelas pernas, aquele prendeu- o pelos braços, manietando-o, impedindo-o de fugir e de se defender, fazendo-o cair ao chão. 17-Nessa altura, o arguido AA, fazendo uso da faca de que se encontrava munido, novamente desferiu golpes no OO. 18-Entretanto, por via da intervenção de PP, que agarrou o arguido BB, e de TT, OO conseguiu rastejar, libertar-se e fugir pelo meio do separador central da Alameda ..., percorrendo alguns metros até que foi de novo apanhado pelo arguido AA, que novamente o esfaqueou com a faca que trazia. 19-Já caído no chão e desfalecido o arguido BB desferiu, além do mais, um pontapé na cabeça de OO, enquanto o arguido AA se afastava sozinho. 20-Seguidamente, o arguido BB ausentou-se do local e juntou-se às arguidas DD, EE e FF e juntos deslocaram-se em direção à zona referente à entrada do ..., passaram em frente à estação do metro e prosseguiram em direção a .... * 21-Quando PP agarrou o arguido BB foi de imediato agredido. 22-Apercebendo-se que o PP estava a ser agredido, a NN tentou auxiliá-lo. 23-Enquanto tentava auxiliar PP, NN foi atingida com vários murros, socos e pontapés, assim como puxões de cabelo, que lhe foram desferidos pelas arguidas FF, DD e EE, que seguiam atrás dos demais arguidos e que logo ali gizaram um plano para, agindo de comum acordo e em conjugação de esforços e divisão de tarefas, a agredirem. 24- Além de a agredirem nos termos descritos em 23, as arguidas FF, DD e EE agarraram a cabeça de NN e empurraram-na com força contra a ambulância que lá se encontrava. * 25 - Em consequência da conduta dos arguidos AA e BB e CC, OO sofreu as seguintes lesões: Hábito externo Tórax: Oito soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 1: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, com extremidade superior romba e extremidade inferior indefinida, à qual se associa uma escoriação avermelhada irregular e desidratada com 0,6 por 0,4 cm de maiores dimensões. Esta está localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, apresentando exposição de tecido celular subcutâneo e 2,2 cm de comprimento, estando a sua extremidade superior na linha média e distando 15 cm da fúrcula esternal e 10,8 cm do mamilo direito; Lesão número 2: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo e tecido muscular, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha média clavicular, apresentando 2,9 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 23,3 cm da fúrcula esternal, 11 cm do mamilo direito e 5,3 cm da linha média; Lesão número 3: obliqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido sobre o celular subcutâneo e tecido muscular, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, apresentando 3,5 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 1,3 cm da linha média, 15 cm de la do mamilo esquerdo e 22,5 cm da fúrcula esternal; Lesão número 4: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e a inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e osso, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da fase anterior do hemitórax esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 19,5 cêntimos da fúrcula esternal, 19 cm do mamilo direito e 8 cm da linha média; Lesão número 5: ligeiramente oblíqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e cartilagem costal, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de comprimento, distando a sua extremidade superior 28,5 cm da fúrcula esternal, 22,7 cm do mamilo direito e 8,2 cm da linha média; Lesão número 6: oblíqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo as 2 extremidades angulosas, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, com múltiplos entalhes na porção posterolateral, localizada no flanco esquerdo, apresentando 11,3 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 36,5 cm da fúrcula esternal, 25 cm do mamilo direito e 8,7 cm da linha média; Lesão número 7: horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 17: Horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo virgo localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e sendo e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 18: superficial, horizontal, sendo as extremidades angulosas, tendo a mais medial uma cauda terminal de 3 cm ao nível da linha média e sem exposição de tecidos, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax direito, junto à linha média, apresentando 8 cm de comprimento, distando a extremidade lateral 5 cm da linha média, 19 cm da linha axilar posterior e 31 cm da espinha ilíaca anterosuperior direita. B - Membro superior direito: Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 8: com entalhes laterais, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada no bordo cubital da falange proximal do primeiro dedo da mão apresentando 1,5 cm de comprimento; Lesão número 9: com perda de substância, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada na polpa do segundo dedo da mão, de uma área de 0,8 por 0,4 cm, com 0,4 cm de profundidade. C- Membro superior esquerdo: Escoriação avermelhada e irregular na face posterior do terço distal do antebraço, medindo 3 por 1,5 cm de maiores dimensões; Esfacelo com fundo avermelhado ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do segundo dedo, medindo 0,8 por 0,6 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada irregular e região de esfacelo com fundo avermelhado ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do terceiro dedo, medindo 0,6 por 0,5 cm de maiores dimensões; Duas escoriações avermelhadas irregulares na face posterior da articulação metacarpofalângica do quarto dedo, uma mais superior, medindo 0,8 por 0,8 cm de maiores dimensões, e outra mais inferior, medindo 0,6 por 0,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada arredondada na face posterior da articulação interfalângica proximal do quarto dedo, medindo 0,4 por 0,3 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada irregular ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do quinto dedo, medindo 1,5 por 1 cm de maiores dimensões. Quatro soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 10: obliqua superoinferiormente de radial para cubital, sendo as 2 extremidades angulosas, apresentando a inferior uma cauda de escoriação terminal com 0,4 cm de maior eixo. Localiza-se no dorso da mão sobre o terceiro metacarpo, apresentando 3,3 cm de comprimento, com exposição de tecido celular anteromedial do joelho, medindo 5,5 por 3,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada, irregular, com crosta hemática não destacável, na face anterior do terço médio da perna, medindo 1 por 0,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada e irregular na face anterior do terço distal da perna, medindo 1,2 por 1 cm de maiores dimensões. Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 7: ligeiramente oblíqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sem possibilidade de avaliação da extremidade superior e apresentando um entalhe na extremidade inferior, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada na face anterior do terço superior da coxa ao nível da linha da sínfise pública e lateralmente à espinha ilíaca anterosuperior direita, apresentando 3,4 cm de comprimento, distando a sua extremidade superior 3,5 cm da espinha ilíaca anterosuperior, 13 cm da sínfise púbica e 11 cm da linha média; Lesão número 14: oblíqua superoinferiormente de medial para lateral, sendo as duas extremidades angulosas, associando-se à extremidade inferior uma escoriação linear vermelho-escura com 1,7 por 1,5 cm de maiores dimensões e à extremidade superior uma escoriação linear vermelha-escura com 0,7 cm de maior eixo. Localiza-se na face anterolateral do joelho, apresentando 6 cm de comprimento, com exposição de tecido celular subcutâneo e do retináculo patelar. D- Membro inferior esquerdo: Escoriação avermelhada e irregular na face lateral do terço superior da coxa, medindo 3 por 1,5 cm de maiores dimensões; Três escoriações avermelhadas e irregulares na fase anteromedial do joelho, medindo uma área total de 5,5 por 3 cm; Escoriação avermelhada e irregular na face anterolateral inferior do joelho, medindo 2,5 por 2 cm de maiores dimensões. Múltiplas escoriações avermelhadas e irregulares, dispersas pela face anterior da perna, medindo a maior delas 2,5 por 1,5 cm de maiores dimensões. Duas soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: -Lesão número 15: solução de continuidade superficial horizontal, sendo as extremidades angulosas e sem exposição de tecidos, localizada na face lateral do terço proximal da coxa esquerda, apresentando 2 cm de comprimento, distando a extremidade medial 12,5 cm da crista ilíaca anterosuperior esquerda, 23 cm da sínfise pública e 22 cm da linha média; -Lesão número 16: solução de continuidade de bordos desidratados, ligeiramente oblíqua superoinferiormente de lateral para medial, sendo a extremidade medial angulosa e a lateral romba com cauda de peixe de 0,2 cm de maior eixo, com exposição das camadas internas de pele, localizada na fase anterior do 1/3 médio da coxa esquerda, apresenta 1 cm de comprimento. Hábito interno Cabeça Encéfalo: Circunvoluções cerebrais ligeiramente aplanadas (compatível com um edema cerebral ligeiro) e parênquima com congestão nas diferentes seções de corte. Tórax Nas paredes: Ao nível do tecido celular subcutâneo, sete soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: -uma, localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; -outra, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha médio clavicular, em relação com alusão número 2 do hábito externo; -outra, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, em relação com a lesão número 3 do hábito externo; -outra, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da face anterior do hemitórax esquerdo, na linha médio clavicular, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; -outra, localizada na fase anterior do 1/3 inferior do hemitórax esquerdo, externamente a linha médio clavicular, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; -outra, localizada na fase anterolateral do terço inferior do hemitórax esquerdo, em relação com a lesão número 6 do hábito externo; -outra, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, em relação com a lesão número 17 do hábito externo. No plano muscular: Quatro soluções de continuidade de bordos regulares e filtrados de sangue, nomeadamente: -uma, localizada nem inserção inferomedial do músculo grande peitoral direito, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; -outra, atingindo a inserção inferior do músculo grande peitoral esquerdo, a inserção superior do músculo oblíquo externo à esquerda e os músculos intercostais do quinto espaço intercostal, ao nível da linha médio clavicular à esquerda, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; -outra, na transição dos músculo oblíquo externo para o músculo reto abdominal, à esquerda, junto à inserção dos mesmos, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; -outra, com infiltração sanguínea circundante, atingindo a porção lateral do músculo oblíquo externo, à esquerda e os músculos intercostais do oitavo espaço intercostal à esquerda, em relação com a lesão número 6 do hábito externo. Infiltração sanguínea do músculo latissimus dorsal à esquerda, na sua camada mais superficial, em relação com a lesão número 17 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas direitas: Duas soluções de continuidade, de bordos regulares e infiltrados de sangue: -uma, ao nível da inserção esternal da cartilagem do quinto arco costal direito, não transfixiva, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; -outra, ao nível da inserção esternal das cartilagens costais do sétimo e oitavo arcos costais, transfixiva, em relação com a lesão número 2 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas esquerdas: Três soluções de continuidade transfixivas, de bordos regulares e infiltrados de sangue: -uma, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do quinto arco costal, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; -outra, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do oitavo arco costal, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; -outra, ao nível do arco anterior da cartilagem costal do oitavo e nono arcos costais, em relação com a lesão número 6 do hábito externo. Pericárdio e cavidade pericárdica: Duas lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: -uma, na face anteromedial do pericárdio, com com 1,8 cm, em relação com a lesão número 3 do hábito externo; -outra, na face anterolateral do pericárdio, com 4 cm de comprimento em relação com a lesão número 4 do hábito externo. Coração: Duas soluções de continuidade lineares de bordos regulares e infiltrados de sangue, transmurais: -uma, na região póstero lateral do ventrículo direito, medindo 2,2 cm de cumprimento na face externa e 3,5 cm de comprimento na face interna, em correspondência com a lesão número 3 hábito esterno; -outra, na região anterolateral do ventrículo esquerdo, medindo 5 cm de comprimento na face externa e 8,3 cm da face interna, em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Pleura parietal e cavidade pleural esquerda com presença de hemotórax com 1000 cc de volume. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com as lesões números 4,5 e 6 do hábito externo. Diafragma: Três lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: -uma, na hemicúpula diafragmática direita, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; -outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, pericentimétrica, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; -outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo. C- Abdómen: Paredes: Três soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: -uma, na extremidade superior do músculo reto abdominal direito, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; -outra, na extremidade superior do músculo reto abdominal esquerdo, junto à linha média, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; -outra, atingindo a porção lateral inferior dos músculos oblíquo externo, obliquo interno e reto abdominal, à direita, em correspondência com a lesão número 7 do hábito externo. Peritoneu e cavidade peritoneal: Vestígios hemáticos peri-hepáticos. Fígado: Dimensões ligeiramente aumentadas. Contusão ao nível da face diafragmática do lobo esquerdo, medindo 2 cm de maior eixo. Solução de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, praticamente vertical, na face diafragmática do lobo direito, com 3,5 cm de cumprimento, distando 2 cm do ligamento falciforme, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Parênquima pálido e congestivo. Estômago: Laceração de bordos regulares e infiltrados de sangue, na face do antro pilórico, medindo 1 por 0,7 cm de maiores dimensões, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo. Membro: Membro inferior direito: Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: -uma, na fase anterior do terço superior da coxa, ao nível da linha da sínfise púbica e lateralmente a espinha ilíaca anterosuperior direita, atingindo o tecido celular subcutâneo e a porção lateroinferior dos músculos oblíquo externo, oblíquo interno e reto abdominal, em correspondência com a lesão número 7 do hábito externo; -outra, ao nível da face anterior do retináculo patelar, com 5 cm de comprimento, com atingimento do tecido celular subcutâneo e da face anterior da patela, em correspondência com a lesão número 14 do hábito externo. Membro inferior esquerdo: Solução de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue ao nível da fase anterior do terço médio da coxa, atingindo tecido celular subcutâneo, a aponevrose do músculo reto femural. Infiltração sanguínea do músculo reto femural, na sua camada mais superficial, em correspondência com a lesão número 16 do hábito externo. 26-As lesões tóraco-abdominais descritas determinaram como consequência direta, adequada e necessária a morte de OO, tendo o óbito ocorrido no dia 8/5/2022. 27-Em virtude das lesões sofridas OO foi assistido no local e transportado para o serviço de urgência do hospital ..., onde deu entrada em manobras de suporte avançado de vida (SAV), mas já sem sinais de vida, tendo o óbito sido verificado pelas 3.20h. * 28-Em consequência da conduta das arguidas DD, EE e FF resultaram para NN as seguintes lesões: No crânio: Tumefação de coloração levemente arroxeada na região frontal; Solução de continuidade com 1,5 cm de comprimento na região frontal à direita. Dor à palpação do couro cabeludo na região occipital. Na face: Tumefação e coloração arroxeada da fase, mais marcada à esquerda; Edema e equimose arroxeada palpebral; Escoriação com 1 por 0,5 cm no dorso do nariz; Fratura parcial da coroa do dente 45. No abdómen: Duas corações punctiformes na face lateral do flanco esquerdo; Equimose arroxeada com 4 por 2 cm e com 8 por 3 cm na face posterior do flanco esquerdo. 29-As lesões descritas provocaram de forma direta, adequada e necessária dores. 30-Demandaram 8 dias para consolidação médico-legal, com afetação da capacidade de trabalho geral em 8 dias e com igual período de afetação da capacidade de trabalho profissional. 31-Como consequência permanente adveio fratura parcial da coroa do dente 45, passível de reparação e que não é causa de desfiguração nem de afetação da capacidade de trabalho. * ………………………………………………………………………………….. 34-Os arguidos AA e BB e CC agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas acordadas condutas eram proibidas e punidas por lei. 35-Os arguidos AA, BB e CC sabiam que os golpes desferidos com a faca nos locais referidos poderiam causar a morte como causaram de OO, o que representaram e quiseram. 36-Sabiam os arguidos AA, BB e CC que ao agir da forma descrita em conjugação de esforços e divisão de tarefas, com superioridade numérica e usando de violência e de instrumentos corto-perfurantes, se constituíam em elevada desproporção relativamente a OO, impedindo-o de se defender e de fugir. 37-Os arguidos AA e BB e CC sabiam que ao perseguir, cercar, agarrar, manietar e agredir OO, impediam a sua fuga e defesa, assim como possibilitavam, como queriam, que o arguido AA desferisse repetidamente golpes com a faca no corpo de OO, atingindo-o nas costas, no peito e no abdómen, onde aqueles sabiam que se alojavam órgãos vitais. 38-Os arguidos AA, BB e CC não souberam refrear os seus impulsos violentos, atuando da forma descrita, motivados por um desejo de vingança, numa escalada de violência, por motivos relacionados com desentendimentos familiares que envolviam os arguidos AA e BB com o OO. 39-As arguidas DD, EE e FF atuaram em conjugação de esforços e acordo de vontades numa situação de superioridade numérica para melhor assegurarem o êxito das suas intenções. 40-As arguidas DD, EE e FF agiram livre, deliberada e conscientemente, com o propósito concretizado de agredirem fisicamente a ofendida NN e de lhe causarem os ferimentos escrito, dores e mal estar. 41-As arguidas DD, EE e FF bem sabiam que as suas condutas eram proibidas por lei.”
Apesar da negação total e incompreensível da atuação das três mulheres por parte das mesmas, designadamente da DD e de sua filha EE, sobre as suas atuações delituosas, na pessoa da demandante NN, certo é que as mesmas resultam à saciedade, não só face às declarações da ofendida, que assustada com a presença das arguidas, conseguiu reproduzir toda a atuação das mesmas, presenciada pelas testemunhas que se encontravam, próximas de si, PP (testemunha a quem aquela procurou defender dos ataques de que foi vítima, quando foi em socorro da falecida vitima OO), bem como da GGG, os quais constataram a produção de tais agressões por parte das três condenadas, vendo-a estendida no solo a levar pontapés delas- tendo inclusive aquele PP pedido que a largassem; como tão bem foi referido na motivação fática da decisão;
Esta atuação delituosa por parte destas mesmas arguidas, designadamente com o puxar de cabelos- inclusive admitido pela própria arguida DD-, embora alegando tratar-se de uma sua conduta defensiva, sem se perceber de quem-, foi corroborado pelos três elementos HHH, III e JJJ, que estavam dentro da ambulância que referiram a violência desta agressão, produzida pelas mesmas na pessoa desta lesada, também que a mesma foi projetada, batendo-lhe com a cabeça contra a ambulância, de forma que os obrigou a retirarem-se do local;
A atestar as imagens verdadeiramente esclarecedoras referentes aos vídeos da câmara CMTV e E69, para esclarecer a situação e se dúvidas houvesse;
Não poderemos, contudo, deixar de manifestar o desprezo e cinismo propalados pelas condenadas/recorrentes, que em uníssono referem e apelidam a ofendida e bem assim as declarações de NN de incoerente, pois apenas se limitou a reproduzir aquilo que viu em vídeo, que não teve conhecimento direto dos factos, sendo ela a vítima das agressões produzidas pelas arguidas;
Ambas insistiram que as suas lesões se deveram a um pontapé desferido por um homem. Ora, na verdade, é que foi a conduta das três arguidas/recorrentes, aqui condenadas- que no dizer da testemunha PP-, pareciam homens a bater, que provocaram as lesões e o medo provocado nesta demandante.
Assim, não lhes assiste qualquer motivo para duvidar da boa apreciação deste Tribunal, quer em termos de prova testemunhal, quer pericial e documental.
Outrossim se dirá em relação aos condenados/recorrentes AA, BB e CC os quais não se conformam com valorização e valoração dada pelo Tribunal às, por eles, questionadas testemunhas;
Antes, porém, cumpre-nos referir que os arguidos põem em causa os depoimentos das mesmas, colocando em confronto com outras e procurando desacreditá-las, mencionando trechos dos depoimentos, ainda que entrecortados e descontextualizados;
Senão vejamos:
Depoimento de SS, prestado em 15/02/2024- 202402271511_16544812_2871447, cuja testemunha acompanhou no dia dos factos a vítima ao Estádio 1..., Lisboa e esteve presente em vários momentos da contenda e como tão bem ficou consignado na decisão, com a indicação e passagem de certos extratos do seu depoimento prestado em Tribunal, o qual nos situou a contenda com a discussão inicial mantida com o falecido OO, na barraca da ..., com a indicação da presença do AA e nos precisou, num segundo e funesto momento, já na Alameda, e posicionou na movimentação do AA e da sua perseguição para com a vítima, explicitando os movimentos agressivos efetuados por aquele e que atingiram o OO;
Tal como a atitude agressora do seu pai BB e do seu tio, CC,
Só referiu e precisou aquilo que viu e que percecionou e apesar de toda a confusão que estes momentos tensos comportam, depôs com verdade a todos os sujeitos processuais, pelo que e conforme o Tribunal mencionou, todo o seu depoimento lhe emprestou credibilidade.
Depoimento de ZZ, prestado em 29/02/2024 – 20240225045457_16544812_2851445- que apareceu no ... acompanhada por uma amiga e ia no encalço do OO, seu namorado e com quem iria encontrar-se que presenciou a agressão cometida neste ultimo, identificando os principais arguidos/agressores, pormenorizando a atuação do BB e seu filho AA e bem assim o trajeto final feito pelo OO, na Alameda, mais propriamente no jardim desta. Não teve duvidas sobre a visualizada faca e da forma como foi utilizada;
Ora, dada a seriedade com que depôs em audiência, correta a valoração que lhe foi dada pelo Tribunal.
Depoimento de PP, prestado em 29/02/2024-20240229112051_16544812_2871447- que, na senda dos anteriores, mencionou a discussão na ..., bem como a atuação dos arguidos, particularmente do BB, a partir da zona do viaduto. Refira-se que esta testemunha foi agredida no momento em que se propôs defender o OO- tal como também presenciou a agressão das três arguidas particularmente a FF e DD, à pessoa da ofendida NN-;
Também este depoimento se mostrou credível ao Tribunal, cujas respostas às várias questões formuladas foram todas objetivas, apesar do tempo já decorrido desde os factos, só atribuindo aos arguidos/condenados aquilo que viu com certeza (refira-se que viu um homem agarrar-se aos pés do OO e fazê-lo cair, mas não ter conseguido identificá-lo), o que só denota honestidade;
Depoimento de AAA, prestado em 29/02/2024- 20240229144712_16544812_2871447-, que esteve num primeiro momento no Estádio 1..., que concretamente viu – já na segunda parte da contenda na zona da Alameda-, o AA, com uma faca na mão e o OO que fugia na multidão e a tentar defender-se, fugiu para o lado do jardim, perdendo as forças e caindo para trás. Tendo visto, o AA a gesticular com a faca a espetá-la no peito do OO, retirando-se, de seguida, do local, onde também se encontrava o BB;
Refira-se que as suas declarações, prestadas em sede de inquérito e nos termos do que dispõe o artigo 356º do CPP, foram lidas em audiência, que no essencial, se confirmaram.
Depoimento de UU prestado e 29/02/2024-20240229153549_16544812_2871447- que esteve no local dos trágicos acontecimentos e que confirmou a localização dos três arguidos/recorrentes/condenados AA, BB e CC, no local da agressão fatal ao OO e a forma como agrediram- particularmente o BB que lhe dava chutos – e cujo depoimento prestado em sede de inquérito, foi aqui e agora reproduzido.
Depoimento de TT, prestado em 29/02/2024- 20240229164634_16544812_2817447-que conhecia os três principais arguidos AA, BB e CC e não ter dúvidas de ter visto o CC nas pernas do OO, agarrando-as e o BB a desferir-lhe murros na cabeça, vendo de seguida, o AA a meter-lhe a faca do lado esquerdo e na zona das costas do OO e este a cair;
Este testemunho isento, honesto e credível em nada desconforme com aquele outro prestado durante a fase de inquérito e cujo depoimento foi lido em audiência.
Depoimento de BBB, prestado em 06/3/2024-20240306095445_16544812_2871447- que na noite dos factos acompanhava a namorada do OO que nada de muito relevante pôde atestar a não ser ter visto o falecido OO a tropeçar nas escadas.
Depoimento de CCC prestado em 06/3/2024-20240306115804_16544812_2871447- que no essencial atesta a bárbara agressão de que o OO foi alvo e da forma como mesmo no chão foi agredido.
Depoimento de XX prestado em 01/3/2024-20240301094819_16544812_2871447- que, no essencial e de relevante, para além de ter reconhecido os arguidos AA, BB e CC, pôde extrair-se da veracidade credibilidade (se ainda houvesse dúvidas) doutros depoimentos como sejam o de UU e SS.
Depoimento de YY, prestado em 07/3/2024-20240307095240_16544819_2871447-que com toda a credibilidade e situando os factos com a precisão possível e face ao circunstancialismo e condicionalismos em que se processou a agressão mortal, descreve as agressões perpetradas pelos três arguidos AA, BB e CC, particularmente o facto de ter visto o AA a espetar uma faca ao OO e acertar-lhe no tronco.
Refira-se ainda e quanto aos supostos alegados depoimentos contraditórios das testemunhas, que não se poderá pretender que alguém, com credibilidade, que é espetador de um cenário de horror e em movimento, com tanta violência gratuita, possa ter visto- de início ao fim e sem quebras- todo o filme e sem hiatos ou eventuais pequenas imprecisões;
Espetadores esses, num primeiro momento, desatentos pois não contavam nem se dirigiam para um combate de wrestling, ambiente de multidão visível pelas câmaras, pelo que naturalmente cada um deles apenas viu pequenos pedaços de vida, com perspetivas diversas, devido à posição em que se encontravam ou por obstáculos que se lhes deparavam ou porque e perante este macabro e supostamente irreal acontecimento, bloquearam (como aqui foi expressamente referido por algumas testemunhas);
Assim, cada uma das testemunhas – valoradas pelo Tribunal- viu, pois, partes de um único evento, como soa dizer-se em linguagem cinematográfica, “frames” de uma estória real;
É aqui que entra também a experiência dos julgadores, em sede de prova indireta, O MOTIV, assim, lançando mãos às regras da experiência comum, quem poderia ter querido agredir por forma selvática matando-o neste contexto de festa de campeões nacionais, após todo este envolvimento que já vinha de episódios anteriores- comemorações de final de ano, ..., Estádio 1...-, que não fosse AA e sua família;
Todos este valorados testemunhos foram contestados pelos recorrentes porque - naturalmente- os seus depoimentos não lhes interessam porque são contrários às suas supostas inocências.
Acresce que o Tribunal avaliou conjuntamente com esta prova testemunhal, igualmente a preciosa prova pericial, bem como a documental em vídeo e fotogramas, referente às atuações de cada um dos arguidos/condenados;
Conforme melhor se referiu no douto acórdão e passamos a citar: “(…)Visualizando as filmagens e os fotogramas e filmagens anteriormente referidos, observa-se que: Câmara E070: 2.28.11h – 2.38.55h (correspondente às imagens de fls. 2545 a 2547 e 2355): a vítima (que se distingue pelo seu tom moreno e vestuário, cuja reportagem fotográfica consta dos autos) desloca-se até junto da bola, onde permanece visualizando o telemóvel, até ir embora. Câmara E074: 2.34.31h – 2.34.58h (correspondente às imagens de fls. 671 a 673): Os arguidos AA (fls. 427: 2.34.31h casaco azul com uma faixa branca longitudinal, calças e sapatilhas escuras), II (fls. 422: 2.34.43h sweat branca com capuz preto, calções brancos, leggings pretas e sapatilhas brancas), HH (fls. 552: 2.34.51h sweatshirt preta com lista branca nas mangas, calças de ganga e sapatilhas pretas com listas brancas), JJ (fls. 556: 2.35.04h t’shirt clara, calças escuras e uma pochete a tiracolo), GG (fls. 553: 2.35.02h casaco, caças e sapatilhas escuras), DD (fls. 443 2.35.14h cabelo escuro preso t’shirt verde, calças de ganga claras e rasgadas e sapatilhas brancas – sendo que a própria admitiu estar vestida dessa forma), descem as escadas em direção ao metro, visualizando-se ainda as arguidas EE e FF (2.34.58h): a primeira, cabelo escuro, casaco preto, calças de ganga e sapatilhas brancas e pretas e a segunda, cabelo loiro, blusão escuro, calças de ganga e sapatilhas pretas e brancas); M244: 2.35.01h – 2.36.25h (correspondente às imagens de fls. 385 e 386 e 674 a 677): visualizam-se a caminhar em direção ao ..., após a descida das escadas, por ordem: os arguidos AA (destacando-se à frente), II, HH, FF e EE (juntas com um terceiro indivíduo com chapéu azul do ...) e a DD, bem como o caminho de regresso, liderado pelos arguidos AA e agora também CC (calças pelos joelhos, t’shirt verde com dizeres em cor branca à frente e sapatilhas pretas com o símbolo da Nike) que se cruzam com a arguida DD (agora com um casaco preto por cima da t’sirt verde e carteira a tiracolo) ao minuto 2.36.34h. Visualizam-se também todos os elementos do grupo e ainda o arguido BB cuja visualização se inicia ao minuto 2.36.27 (t’shirt e calças pretas e sapatilhas brancas). Finalmente, visualizam-se as duas testemunhas ZZ (namorada da vítima) e BBB (que bem se visualizam a correr atrás ao minuto 2.36.50, falando a primeira ao telefone). Câmara E145M: 2.35.45 – 2.35.59h (correspondente às imagens de fls. 2347 a 238): o arguido AA, seguido do arguido II encontra-se com os arguidos CC, que segue à frente e BB, retomando o caminho de volta. Câmara E074: 2.36.57h – 2.37.45h (correspondente às imagens de fls. 387 a 389 fotogramas 5 a 14): Os arguidos CC e AA sobem à frente as escadas que dão acesso à Alameda, sendo seguidos pela testemunha QQ, pelos arguidos HH, GG, JJ, BB, DD, FF e EE e, mais atrás, pelas testemunhas ZZ e BBB. Câmaras E120: 2.38.37h – 2.39.20h e E116: 2.38.53h – 2.39.40h (correspondente às imagens de fls. 389/92): Onde se conseguem distinguir os arguidos AA e CC à frente, caminhando atrás os arguidos BB, KKK e II continuando a caminhar frente às roulottes, e ainda as testemunhas ZZ e BBB. Câmara E070: 2.39.22h – 2.40.15h (correspondente de fls. 389 a 392): Distinguem-se os arguidos AA e CC a atravessar a estrada em direção ao ... e mais atrás os arguidos BB e DD ao seu lado e testemunhas ZZ e BBB. Câmara E069: 2.40.13h – 2.46.32h (imagens de fls. 393/4): Observa-se o movimento do grupo, liderado pelo arguido AA que se distingue pelo casaco e o grupo pelo ritmo de acompanhamento entre a multidão junto ao ...; observa-se ainda o arguido AA, seguido de um conjunto de indivíduos a dirigir-se para o lado oposto, juntando-se debaixo da ponte, onde, apesar da dificuldade o casaco azul e branco do arguido AA se continua a distinguir; observa-se de seguida a deslocação do arguido AA, sempre identificado pelo casaco azul e branco, com outros indivíduos que não se conseguem identificar em concreto no encalço em direção ao lado oposto da estrada, visualizando-se de seguida o retorno ao lado esquerdo de quem sobe e um confronto em luta junto à ambulância, vendo-se pelas 2.43.04h pela última vez nesse confronto a mancha correspondente ao padrão do casaco do arguido AA, cujo percurso se acompanhou na movimentação desta filmagem. Câmara E53: 2.44.39h – 2.46.00h (correspondente às imagens de fls. 407 – 409): Observa-se um indivíduo a passar para trás da roulotte às 2.45.02h e a sair pelas 2.45.34h, conseguindo distinguir-se uma indumentária superior azul e branca semelhante que se concilia com o casaco azul e branco do arguido AA. Câmara E146: 2.47h – 2.48.32h e câmara E099: 2.47.58h – 2.48.36h (correspondente às imagens de fls. 410/2): Observa-se o AA sozinho pelo passeio com o casaco no braço. Câmara M244: 2.53.53h – 2.54.40h (correspondente às imagens de fls. 412/414): Visualizam-se os arguidos BB, DD, FF e EE a descer em direção ao metro. Câmara E099M: 2.50.08h a 2.50.59h e E146M: 2.50.13h – 2.50. 52h (correspondente às imagens juntas com a contestação do arguido HH): Visualizam-se os arguidos HH, GG e JJ a caminhar, acompanhados de duas raparigas pelo lado direito do Estádio .... Câmara da CMTV2 – durante 36 segundos consegue distinguir-se um individuo com um vestuário que se identifica como casaco do arguido AA (com a faixa branca) e bem assim o arguido BB junto às escadas na zona central, onde ficou caída a vítima OO.(…);
Saliente-se, ainda neste contexto que a apreciação da prova obedeceu a critério estritamente legal, mais propriamente ao principio da imediação, impregnado pela livre convicção e segundo as regras da experiência comum, que levaram o Tribunal, a concluir- e bem-, pela verificação dos elementos objetivos e subjetivos no comportamento destes arguidos/recorrentes, passiveis de integrarem os imputados ilícitos penais;
Neste aspeto não poderemos, contudo, deixar de referir e em defesa do expresso pelo Tribunal recorrido quanto a tal conclusão, dir-se-á que, naturalmente assim concluiu, através de critérios de estrita legalidade democrática, que atribuem ao julgador a regra da livre apreciação da prova, expressa no artigo 127º do C.P.P.; o mesmo é dizer que é ao
Tribunal que compete valorar com total liberdade, que não arbitrariedade ou, sequer, subjetividade, o valor dos meios de prova, que não está legalmente pré-estabelecido;
Tudo isto, de acordo com a experiência comum e com a concorrência de critérios objetivos que permitam estabelecer um substrato racional da fundamentação e convicção;
Para além disto e pela nossa parte, cumpre-nos também salientar que o Tribunal apreciará a prova com estrito critério de legalidade, mas também podendo e devendo lançar mão, para uma melhor apreciação (livre) da prova, de presunções judiciais, que mais não são as ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, conforme o permite a lei substantiva;
Neste âmbito e quanto ao alegado principio de natureza constitucional prevista no artigo 32º da CRP “in dúbio pro reo”, a verdade e citando o já longínquo mas importante acórdão do STJ de 7 de Novembro de 1990, in Código Processo Penal anotado de Maia Gonçalves, 10ª edição, pagina 321,” I não pode condenar-se um arguido com base em simples presunções, que não são meios de prova, mas simples meios lógicos ou mentais..”;
Continuando a citar este Supremo Tribunal e o mesmo autor, pagina 320, da citada obra, “o principio in dúbio pró reo estabelece que, na de factos incertos, a dúvida favorece o réu. É um principio de prova que vigora em geral, isto é quando a lei, através de uma presunção, não estabelece o contrário…”.
Agora, dizemos nós, tal dúvida ou dúvidas sobre a imputação de determinados factos a um dado agente ou agentes terão de ser uma dúvida efectiva e credível e, não qualquer duvida cartesiana ou uma pequena duvida que no seu todo é pouco visível mas que serve para lançar confusão de todo e da qual os arguidos, só porque tiveram a graça de a terem por perto ou de a terem conseguido obter a seu favor consigam dela retirar fortes proventos, designadamente a sua absolvição;
À qual não têm direito;
Dúvida essa muito séria e não qualquer uma outra, omitindo –se, assim, que se faça efetiva justiça.
Inexistindo, pois, neste caso, qualquer violação do principio da presunção da inocência e como pretendem os recorrentes/arguidos;
Quanto à alegada violação e em jeito de questão prévia por parte dos arguidos BB e CC, sobre a irregularidade de representação pelo mandatário da assistente MM nos termos do artigo 48º do CPC, “ex vi” o que dispõe o artigo 4º do CPP, nem sequer se compreende ou entende que assista qualquer legitimidade aos arguidos que a invocam;
De qualquer forma e perante as pretensões dos dois arguidos BB e CC, ficamos a perceber que um mandatário apenas pode ter um cliente ou constituinte durante toda a sua vida profissional;
Designadamente se forem pessoas importantes ou ilustres, como sejam, no caso, por pertencerem a uma claque de futebol… Enfim.….
Já de direito e quanto à invocada má integração na qualificação do homicídio através das alíneas i) do nº2 do artigo 132º do Código Penal, não podiam ter menos consistência as razões apresentadas, porquanto o meio insidioso se prende- como tão bem se explicitou no douto acórdão- não com a arma utilizada para a agressão mortal em si, mas, ao modo ou forma como o vieram a assassinar, encurralando-o para um determinado local e não permitindo a sua fuga ou defesa;
Conforme tão bem se salientou no douto acórdão e sobre esta matéria: “(…) Nestas situações, o agente do crime apanha a vítima desprevenida, confiante, descuidada, descontraída. A qualificativa não se reporta, nesta parte, aos meios empregues, mas ao modo, de atuação do agente, o qual é revelador de uma relevante carga de perfídia que torna difícil ou impossível a defesa da vitima – consistente num ataque sem aviso prévio, súbito, com a vítima desprevenida para o ataque homicida. E no caso, tal qual está descrita a conduta dos arguidos AA, BB e CC, não pode deixar de considerar-se que os mesmos atuaram de forma insidiosa. Aproveitando a festa, e depois de andarem à sua procura, os arguidos AA, BB e CC moveram uma perseguição à vítima, apanhando-a numa correria súbita, quando esta já regressava a casa subindo a Alameda .... A surpresa com que numa noite de festa – com a confusão de multidão própria destes dias – se fez o ataque a OO foi um meio procurado para concretizar o resultado pretendido, revelando em concreto uma culpa acrescida merecedora de uma censura acrescida - assim fazendo subsumir a conduta dos arguidos AA, BB e CC à qualificativa prevista nesta alínea(…);
Outrossim se refira para a qualificativa, também contestada, da alínea h) do citado preceito legal;
Como tão se mencionou na douta decisão:
“(…)Embora nos crimes de homicídio haja sempre ou quase sempre uma certa desproporção entre o motivo e o resultado, no caso de motivo fútil essa desproporção é mais chocante, advindo um evento completamente distinto daquele que o cidadão comum esperaria. ”A conduta dos arguidos no caso dos autos insere-se no contexto de conflito que já se vinha instalando desde o início do ano – com conflitos físicos entre a vítima e membros da família do arguido BB – concretamente, os arguidos AA e EE. A existência deste conflito, cujos contornos e razões se desconhecem concretamente, retiram à conduta do arguido as características que permitiriam considerar que foi determinada por um motivo torpe ou fútil para efeitos de culpa acrescida, merecedora de uma censurabilidade acrescida.(…).
Também não deverá ser concedida procedência à pretensão do condenado AA que entende que deveria ter beneficiado do regime previsto no diploma do Regime Especial dos Jovens Adultos- Decreto-Lei nº401/82, de 23/9, pelos motivos que tão bem foram ponderados pelo Tribunal na douta sentença/acórdão e passamos a citar:”(…) regime dos Jovens Adultos (aquele que à data da prática do crime tiver completado 16 anos de idade sem ter ainda atingido os 21), aprovado pelo Dec. Lei 401/82, de 23.09, impõe ao juiz o poder/dever de atenuar especialmente a pena nos termos previstos na legislação penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado (art. 4). Trata-se de um regime que visa a instituição de um direito mais reeducador do que sancionador, mas que nunca poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade. Nesta perspetiva, sempre que a pena aplicável seja a de prisão e a defesa da sociedade e prevenção da criminalidade não estejam em causa, deve essa pena ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões de que assim se facilitará aquela reinserção. Para realizar tal juízo de prognose sobre o desempenho futuro da personalidade do jovem, impõe-se então ponderar, numa avaliação global dos factos apurados em cada caso concreto, a natureza e modo de execução do crime, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao facto, bem como as suas condições de vida, tudo de forma a averiguar se a moldura penal do crime em questão (concretamente a moldura da pena de prisão) é ou não excessiva tendo em vista os fins de socialização do jovem condenado. É através da ponderação das circunstâncias concretas de cada caso, que se pode chegar ou não à conclusão de que se está perante um desvio transitório e ocasional, próprio do período de latência social propiciador da delinquência juvenil, caso em que se poderá mostrar justificada a formulação de um juízo de prognose favorável à atenuação especial. “Esse juízo deve ser positivo quando as diversas variáveis a considerar (idade, situação familiar, educacional, vivências pregressas, antecedentes de formação) permitam uma prognose favorável (ou, com maior rigor, não impeçam uma prognose favorável) sobre o futuro desempenho da personalidade” – Ac. STJ de 07-11-2007 (processo n.º 07P3214)). Assim, só se justifica a referida atenuação especial se houver vantagens de reinserção, mas, importa não o esquecer, sem prejuízo da defesa do ordenamento jurídico – ou seja, salvaguardadas que sejam, naturalmente, as exigências de prevenção geral ligadas à proteção de bens jurídicos, que, sendo acentuadas, poderão obstar a essa atenuação especial da pena. No caso de absoluta incompatibilidade entre exigências de prevenção geral e especial, as exigências (mínimas) de prevenção geral funcionam como limite ao que, numa perspetiva de prevenção especial, podia ser aconselhável. De facto, nenhum ordenamento jurídico suporta pôr-se a si próprio em causa, sob pena de deixar de existir enquanto tal. “A sociedade tolera uma certa perda de efeito preventivo geral, nomeadamente conformando- se com a aplicação do regime de jovens, mas, quando essa aplicação possa ser entendida pela sociedade, no caso concreto, como uma injustificada indulgência e prova de fraqueza face ao crime, quaisquer razões de prevenção especial que aconselhassem a aplicação do regime penal especial para jovens cedem, devendo aplicar-se a pena de prisão” – Ac.TRG de 09-04-2018, proc. 1069/16.1JABRG.G1). No caso concreto, o arguido AA tinha, à data dos factos, 19 anos de idade. Pese embora não tivesse à data quaisquer antecedentes criminais, o certo é que em julgamento, apesar de todo o contexto, que como é óbvio, não podia desconhecer, admitiu uma única facada, negando qualquer intenção de matar – revelando com isso total falta de consciência crítica perante um comportamento ofensivo do bem jurídico vida. O crime é grave – muito grave – e atenta contra o bem jurídico mais importante que é a vida, sendo a sua violação incompreendida pela comunidade. Acresce no caso particular, que se trata de violência de grau elevado entre jovens, o que deixa a comunidade ainda mais receosa com a formação da personalidade e o caracter violento dos mesmos. Significa isto que apesar da conduta do arguido anterior aos factos (ser primário), a gravidade do crime, quer em termos de resultado, quer em termos de iter criminis, a personalidade nele manifestada, as várias sanções disciplinares que após reclusão tem sofrido as expectativas comunitárias, fazem concluir por uma personalidade pouco juvenil ou pouco própria da imaturidade de um jovem, antes revelando perigosidade. Neste contexto, não existem razões sérias para crer que da atenuação especial da pena resultem vantagens para a reinserção social do arguido. Não há, pois, que proceder à atenuação especial da pena quanto ao arguido AA.(..)
E quisemos mencionar aqui e agora esta exposição que consta da decisão, só por si bem significativa e bem fundamentada para a não aplicação deste Regime Jurídico, pelo que cai desde logo por terra ou pela base a alegada falta de fundamentação para a (não) explicação do motivo da não aplicação deste Regime;
Pelo que inexistirá, pois, a concomitante alegada falta de fundamentação e nesta parte da decisão condenatória, nos termos dos artigos 97ºnºs 1 al. a), 2 e 5, do CPP, 374º nº 2 e 375º, deste diploma.
Tal como se encontra devidamente fundamentada a decisão sobre a aplicação de cada uma das concretas penas aplicadas a cada um dos condenados, aqui arguidos/recorrentes: DD, EE, AA, BB e CC.
Quanto à defesa quase conjunta de todos os arguidos, nada há de razoabilidade nas pretensões de todos eles, máxime de AA que pretende que apenas lhe seja imputado um crime de ofensa à integridade física, porque o resultado morte não ter nexo causal com a sua atuação como melhor se poderá constatar de uma leitura da matéria provada.
Tal como se nos afiguram justas, ainda que muitos baixa as penas de prisão aplicadas, não apenas ao AA e BB, mas também ao arguido CC, conforme consta da motivação referente ao recurso do MP.
4) Já quanto ao recurso do condenado GG, de matéria de direito e restrita à concreta medida da pena (de 180 dias) aplicada, bem como ao seu quantum diário (de €8,00), dir-se-á que a sua pretensão, baseada no mau estado de conservação da arma apreendida, nem ter tido a mesma qualquer conexão com os factos ilícitos aqui em discussão e pelo facto do recorrente não possuir antecedentes criminais por factos desta mesma natureza, as suas pretensões falecem por completo;
Desde logo, porque o instrumento em causa é de extrema agressividade, por se tratar de uma soqueira, independentemente do seu grau de conservação, sendo certo que numa pena de prisão até 4 anos e numa pena de multa até 480 dias, ter-se optado por uma pena de multa em desfavor de uma pena de prisão foi já uma benesse, tendo em atenção que o mesmo já possuía antecedentes criminais;
Por outro lado, ao ser-lhe aplicada e em concreto uma pena de 180 dias, a mesma situação num patamar inferior a metade do montante total da medida abstrata aplicável;
O que se nos afigura correto.
Já quanto ao montante diário €8,00 o mesmo está praticamente no limiar mínimo da mesma prevista no artigo 47º nº2 do Código Penal (€5ª €500,00);
Sendo certo que a fixação num montante tão baixo foi devido à sua situação económico – financeira do arguido;
De qualquer forma refira-se e em sintonia com a jurisprudência unânime das várias Instâncias que o montante diário da multa deve ser fixado em termos de constituir um sacrifício real para o condenado sem, no entanto, deixarem de lhe serem asseguradas as disponibilidades indispensáveis ao suporte das suas necessidades e do respetivo agregado familiar;
Concordando-se que o montante diário, por um lado, não deverá ser doseado por forma a que represente qualquer sacrifício insuportável (dizemos nós), sob pena de se desacreditar esta pena, os tribunais e a própria justiça, gerando um sentimento de insegurança, de inutilidade e de impunidade;
Que neste caso, foi inteiramente respeitado, sob pena de o direito contra-ordenacional ser mais gravoso do que o direito penal.
Quanto aos supostos e indicados vícios de natureza formal a que alude o disposto no artigo 410º nºs 1 e 2 als. a) e c) do CPP, passível de inquinar a decisão nos termos do artigo 374º do mesmo diploma, que dispõe o artigo 374º nº1, do Código de Processo Penal que a sentença começa por um relatório que contem al. d), a indicação sumária das conclusões contidas na contestação, se tiver sido apresentada;
No entanto, refira-se que, este nosso acórdão fundamenta a decisão da matéria de facto e revela os motivos que conduziram à mesma através da análise que o art.374º nº2, do CPP exige. Fá-lo em termos dos quais resulta explanado o processo de convicção do tribunal no tocante à razão porque chegou ao resultado dos factos arrolados como “provados” e “não provados”.
Os factos supra descritos resultaram provados e não provados pela convicção criada com a análise conjugada do teor das declarações prestadas pelos arguidos com os demais meios de prova coligidos e produzidos em audiência de discussão e julgamento, a qual segundo as regras da experiência, foi suficiente para, além da dúvida razoável, dar por assentes os factos que resultaram provados, nomeadamente quanto à matéria imputada aos arguidos.
Neste sentido, refira-se o acórdão, já remoto mas significativo, de 06/03/1991, desta nossa Relação do Porto, que é para nós significativo, porque já então se fixou que e passamos a citar: ” …A sentença apenas terá que enumerar os factos dados como não provados quando tenham sido alegados factos com interesse para a decisão que, realmente, se não tenham provado.II - A nulidade resultante da falta de fundamentação da decisão - n. 2 do artigo 374, do Código de Processo Penal - só opera se de todo em todo faltar essa fundamentação e não quando apenas se mostra insuficiente….”.Assim, resta-nos dizer que deverá manter-se esta mesma matéria.
Quanto ao reivindicado vício da insuficiência da matéria de facto, a qual todos os três principais arguidos-AA, BB e CC- contestam no seu todo, dizendo e no essencial que a mesma é insuficiente para suportar a presunção de serem os recorrentes/condenados, autores de crime de homicídio, o mesmo não se verifica;
Pela nossa parte sempre diremos que qualquer um dos invocados, ainda que não fundamentados erros-vicio da decisão, os quais são de conhecimento oficioso, por parte do Tribunal Superior, a correspondente anulação da decisão com repetição da prova, só existirão em situações extremas, muito graves;
Não se vislumbrando qualquer um dos vícios invocados, bem como violação dos citados dispositivos legais, atenta a matéria de facto provados nos itens 1-41;
Na verdade, considerar-se que a matéria fáctica carregada para uma decisão, constituirá uma insuficiência da matéria de facto provada – al. a) do nº2 do art. 410º do CPP- a qual só pode existir e ser manifestado na própria decisão judicial, sem ter de se recorrer a outros elementos a ela estranhos ou externos, salvo as regras da experiencia comum ou elementos de prova vinculada, carreados no processo, designadamente exames, perícias, documentos autênticos, relatórios;
O aludido vicio perfectibiliza-se quando dos factos constantes da decisão recorrida, se evidencia a ausência de elementos que, podendo e devendo ser indagados, se tornam imprescindíveis para a formulação de um juízo inabalável de condenação ou de absolvição, designadamente quando os factos provados são escassos para fundamentar a decisão, quando o tribunal recorrido, podendo fazê-lo, omitiu a investigação de toda a matéria de facto relevante e sem a qual não é possível a aplicação do direito ao caso sub judice e, por ultimo, quando deixou de averiguar factos essenciais para lograr uma solução justa. Nesta hipótese, o tribunal descorou a norma do art.340º do CPP, ou seja, quando o tribunal deixou de investigar toda a matéria de facto relevante para a decisão da questão que foi submetida à sua apreciação – acórdão da Relação do Porto, de 03/03/2004, in www.dgsi.pt;
Esta mencionada insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, também se não confunde com a insuficiência da prova para a matéria de facto provada, tema do campo da livre apreciação da prova, e que é in sindicável em sede de reexame da matéria de facto, como resulta da doutrina dos Acrs. Do STJ de 13/01/1993 e de 23/03/1998, in AJ 15-16 e BMJ nº479-252 e de 15-02-2007;
Como também decidiu o STJ de 13/07/2005, in processo nº3174-5ª “…a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (artigo 410ºnº2, alínea a) do CPP) supõe que os factos provados não constituem suporte bastante para a decisão que foi tomada, quer porque não permite integrar todos os elementos materiais do tipo de crime, quer porque deixem espaços não preenchidos relativamente a elementos essenciais à determinação da ilicitude, da culpa ou outros necessários para a fixação da medida da pena”;
A insuficiência significa, por outro lado, que não seja também possível uma decisão diversa da que foi tomada; se não for o caso, os factos podem não ser bastantes para constituir a base da decisão que foi tomada, mas permitir suficientemente uma decisão alternativa, mesmo de non liquet em matéria de facto;
Por fim, a insuficiência da matéria de facto tem de ser objetivamente avaliada perante as varias soluções possíveis e plausíveis dentro do objeto do processo, e não na perspetiva subjetiva decorrente da interpretação pessoal do interessado perante os factos provados e as provas produzidas que permitiram a decisão sobre a matéria de facto”;
Tal como se expressou no acórdão desta nossa Relação, no processo nº469/11.8JPRT a propósito deste mesmo erro, “…a afirmação do vício ora em causa, importa, sim, sempre, uma adequada perspetiva do objeto do processo, cujos confins são fixados pela acusação e ou pronuncia complementada pela pertinente defesa. A partir daí, impõe-se o confronto de tal objeto processual com o que o tribunal de julgamento em concreto indagou, independentemente do resultado dessa indagação. Importando que esses factos pertinentes do objeto do processo tenham sido averiguados em julgamento do facto e obtido a necessária resposta, seja positiva ou negativa. Se se constatar que o tribunal averiguou toda a matéria de facto postulada pela acusação /defesa pertinente – o objeto do processo- ainda que toda ela tenha obtido resposta de “não provado”, então o vício da insuficiência está afastado. Se os factos pertinentes obtiveram resposta do tribunal, a matéria de facto é bastante para a decisão “;
Assim e face a tudo o que acima ficou exposta e perante a aludida motivação do Tribunal, certo se torna concluir que a valoração feira por esta entidade, através dos depoimentos dos agentes policiais, concatenadas com a própria prova pericial e documental feita nos autos, conjugada com a regras da experiencia e da leitura do texto da decisão recorrida, outro não poderia deixar de ser o entendimento do Tribunal que não seja aquele que determinou a condenação deste arguido e nos termos em que o fez e deu como provado os questionados parágrafos da dita matéria;
Refira-se, complementando que o Tribunal recorrido apreciou a prova trazida a julgamento, fazendo, naturalmente apelo às regras da experiência comum expressa na norma prevista na lei penal adjetiva, mais propriamente no seu 127º;
No entanto, sempre se acrescentara que a apreciação judicial e a valoração destes depoimentos foi feita nos termos e dentro dos ditames do principio da livre apreciação da prova e segundo os critérios da livre convicção e das regras da experiencia comum, de acordo com o disposto no art.126º do C. P. Penal, em obediência ao principio da imediação da prova, que impregna todo o direito processual penal e que é concedido, precisamente, ao Tribunal do julgamento da primeira instancia;
Daí que bem andou o Tribunal ao considerar e segundo o livre critério de avaliação da prova (artigo 127º do CPP), ao considerar como provados a matéria referente à conduta deste recorrente arguido (para alem dos restantes arguidos, não recorrentes), a qual se nos afigura irrepreensível e quanto ao visado arguido, não ocorrendo, pois, qualquer insuficiência probatória na matéria apresentada em julgamento e que levou à comprovação de tais factos que possa invalidar esta douta decisão, por verificação do vício de forma traduzido no art.410º nº2 als. a), do CPP.
Ora, no caso em análise nada disto ocorreu porquanto o douto acórdão está perfeitamente perceptível e inteligível para todos os que com atenção o leram e estiveram atentos à produção de prova em audiência de discussão e julgamento;
Não tendo ocorrido o invocado vício a que alude o disposto no art.410º nº2, do C.P.P., mais propriamente o do erro notório na apreciação da prova;
Refira-se que para que se os vícios enunciados no artigo 410º nº2, do C.P.P.,” possam proceder, necessário se torna que eles resultem do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, sem possibilidade, de recorrer a outros elementos do processo, que não seja o texto da decisão recorrida”(Ac. do STJ de 19/6/94, in SJ199406290455303),
Mencione-se também, neste mesmo sentido, o Ac. do STJ de 19/07/2006, in SJ200607190019323 e de 16/10/2008, in SJ2008110160028515;
Melhor precisando, mencione-se, em extrato, …. "erro notório na apreciação da prova" constitui uma insuficiência que só pode ser verificada no texto e no contexto da decisão recorrida, quando existam e se revelem distorções de ordem lógica entre os factos provados e não provados, ou que traduza uma apreciação manifestamente ilógica, arbitrária, de todo insustentável, e por isso incorrecta, e que, em si mesma, não passe despercebida imediatamente à observação e verificação comum do homem médio. A incongruência há-de resultar de uma descoordenação factual patente que a decisão imediatamente revele, por incompatibilidade no espaço, de tempo ou de circunstâncias entre os factos, seja natural e no domínio das correlações imediatamente físicas, ou verificável no plano da realidade das coisas, apreciada não por simples projecções de probabilidade, mas segundo as regras da ‘experiência comum’. Na dimensão valorativa das "regras da experiência comum" situam-se as descontinuidades imediatamente apreensivas nas correlações internas entre factos, que se manifestem no plano da lógica, ou da directa e patente insustentabilidade ou arbitrariedade; descontinuidades ou incongruências ostensivas ou evidentes que um homem médio, com a sua experiência da vida e das coisas, facilmente apreenderia e delas se daria conta. Na passagem de um facto conhecido para a aquisição (ou para a prova) de um facto desconhecido, têm de intervir as presunções naturais, como juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam fundadamente afirmar, segundo as regras da experiência, que determinada facto, não anteriormente conhecido nem directamente provado, é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido”;
Ora e pela nossa parte se dirá que os recorrentes querem impugnar a matéria de facto, mas sem o pretenderem fazer, apegando-se a meros e supostos erros de natureza formal e previstos no artigo 410º do CPP, os quais, alias, como supra se referiu, são de conhecimento oficioso! Finalmente cumpre-nos salientar, ainda neste contexto que a apreciação da prova obedeceu a critério estritamente legal, mais propriamente ao principio da imediação, impregnado pela livre convicção e segundo as regras da experiencia comum, que levaram o Tribunal, a concluir- e bem-, pela verificação dos elementos objetivos e subjetivos no comportamento destes condenados /recorrentes, passiveis de integrarem o imputado ilícito penal; Pelo que as condenações impostas aos arguidos, aqui recorrentes, deverão serem mantidas. Pelo que e em CONCLUSÃO: Em toda a sua linha os presentes recursos e consequentes pretensões dos recorrentes deverão serem recusadas e julgado – integralmente- improcedente, porque a decisão coletiva mostra-se irrepreensível, quer em termos de facto, como de direito, a qual deverá ser, no essencial, mantida! Porem, Vªs Exªs, como sempre, Farão inteira e sã JUSTIÇA (…)” * A assistente MM respondeu ao recurso interposto pelo arguido AA, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) Conclusão: 1 – Bem decidiu o tribunal ao proferir a decisão que proferiu, pecando um pouco por defeito no quantum da pena ao recorrente aplicada, pois que a mesma deveria ser superior. 2 – Com efeito, da prova produzida em audiência e julgamento, resultou como provado a prática por parte do arguido do crime pelo qual se encontrava acusado. 3 – Em julgamento exige-se a formulação de juízos de certeza, e um especial cuidado na valoração das provas efetivamente produzidas em audiência de discussão e julgamento, algo que aconteceu nos moldes descritos no Douto Acordão. 4 – O acórdão deverá ser mantido na íntegra, negando provimento do recurso. Assim se fazendo inteira e sã justiça. (…)” * A assistente MM respondeu ao recurso interposto pelo arguido BB, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) Conclusões: 1 – Bem decidiu o tribunal ao proferir a decisão que proferiu, pecando por defeito apenas no quantum da pena aplicada que deveria ser superior. 2 – Com efeito, da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, resultou como provado a prática por parte do arguido do crime pelo qual se encontrava acusado. 3 – Em julgamento exige-se a formulação de juízos de certeza, e um especial cuidado na valoração das provas efetivamente produzidas em audiência de discussão e julgamento, algo que aconteceu nos moldes descritos no Douto Acórdão. 4 – O acórdão deverá ser mantido na íntegra, negando provimento do recurso. Assim se fazendo inteira e sã justiça. (…)” * A assistente MM respondeu ao recurso interposto pelo arguido CC, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) Conclusão: 1 – Bem decidiu o tribunal ao proferir a decisão que proferiu, quiçá pecando por defeito no quantum de pena ao recorrente aplicado. 2 – Com efeito, da prova produzida em audiência e julgamento, resultou como provado a prática por parte do arguido do crime pelo qual se encontrava acusado. 3 – Em julgamento exige-se a formulação de juízos de certeza, e um especial cuidado na valoração das provas efetivamente produzidas em audiência de discussão e julgamento, algo que aconteceu nos moldes descritos no Douto Acórdão. 4 – O acórdão deverá ser mantido na íntegra, negando provimento do recurso. Assim se fazendo inteira e sã justiça. R.E.D O Advogado (…)” * O arguido AA respondeu ao recurso interposto pelo Ministério Público, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) Concluindo: O MP entende que o facto de o arguido utilizar o argumento de conflitos familiares entre a sua família e o falecido OO, se demostra suficiente para se subsumir à qualificativa de motivo torpe. Não lhe assiste qualquer razão. Como se refere na decisão proferida, não foi possível determinar o motivo e os contornos desses problemas, pelo que, não podemos confirmar que se trata efetivamente de um motivo fútil ou torpe. Mesmo após a produção da prova manteve-se a dúvida em relação ao motivo que levou aos episódios relatados nos autos (passagem do ano, ... e Estádio ...) e que infelizmente culminou na morte da vítima, pelo que não pode o Tribunal a quo dar como subsumido o motivo torpe ou fútil. Ora, o motivo torpe ou fútil é aquele que se demostra não ter qualquer relevo, nem chega a ser uma justificativa, por ténue que seja, para o comportamento do agente. Isto é, um motivo que se demostra manifestamente desproporcional às conceções da comunidade, que não é capaz de explicar a razão que levou o agente a cometer o ilícito. A razão pela qual o arguido levou a cabo a sua conduta não se enquadra no conceito de motivo torpe ou fútil pelo que, nestes especto concreto, bem andou o Tribunal a quo ao não condenar o arguido pela alínea e) do artigo 132.º n.º 2 do CP. No que à medida da pena concreta, entende o MP que a pena aplicada ao arguido foi “demasiado benévola ou branda”, afirmando de seguida que se tratou de “um homicídio monstruoso e macabro”. Também neste aspeto não assiste ao recorrente razão. O relatório social do arguido relata bem, e de forma isenta, o percurso de vida do AA. Á data dos factos era pautado pela atividade profissional de lavador de vidros e pela convivência com a sua companheira, filho de 3 meses e restante núcleo familiar. No que à finalidade das penas concerne, nomeadamente as questões de prevenção especial, pois as de prevenção geral estão mais do que asseguradas com a pena aplicada, cumpre afirmar que, não obstante a gravidade do crime, convém não esquecer que a moldura penal do mesmo é de 12 a 25 anos e a pena aplicada já se situa num patamar extremamente elevado. Em suma, o Tribunal atendeu a todos os fatores juridicamente atendíveis e na escolha da medida da pena, se pecou, foi claramente por excesso. Nestes termos, deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo Recorrente por não lhe assistir qualquer razão. V.Ex.as, porém, decidirão como for de JUSTIÇA (…)” * O arguido BB respondeu ao recurso interposto pelo Ministério Público, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) Concluindo: O MP entende que o facto de o arguido utilizar o argumento de conflitos familiares entre a sua família e o falecido OO, se demostra suficiente para se subsumir à qualificativa de motivo torpe. Não lhe assiste qualquer razão. Como se refere na decisão proferida, não foi possível determinar o motivo e os contornos desses problemas, pelo que, não podemos confirmar que se trata efetivamente de um motivo fútil ou torpe. Mesmo após a produção da prova manteve-se a dúvida em relação ao motivo que levou aos episódios relatados nos autos (passagem do ano, ... e Estádio ...) e que infelizmente culminou na morte da vítima, pelo que não pode o Tribunal a quo dar como subsumido o motivo torpe ou fútil. Ora, o motivo torpe ou fútil é aquele que se demostra não ter qualquer relevo, nem chega a ser uma justificativa, por ténue que seja, para o comportamento do agente. Isto é, um motivo que se demostra manifestamente desproporcional às conceções da comunidade, que não é capaz de explicar a razão que levou o agente a cometer o ilícito. A razão pela qual o arguido levou a cabo a sua conduta não se enquadra no conceito de motivo torpe ou fútil pelo que, nestes especto concreto, bem andou o Tribunal a quo ao não condenar o arguido pela alínea e) do artigo 132.º n.º 2 do CP. No que à medida da pena concreta, entende o MP que a pena aplicada ao arguido BB – 18 anos – foi “demasiado benévola ou branda”, afirmando de seguida que se tratou de “um homicídio monstruoso e macabro”. Também neste aspeto não assiste ao recorrente razão. O relatório social do arguido relata bem, e de forma isenta, o percurso de vida do BB. Daí não se retira nem que tinha um modo de vida destruturado – vivia com a esposa e os dois filhos, e estava a trabalhar no estabelecimento De Karas. Quanto ao facto de o arguido ter defendido os filhos, que pai o não faria? Aqui sim, podemos fazer uso das regras da experiência. Claro que não se trata de um cidadão “modelo”, mas também não é o criminoso “de carreira” que se pretende fazer crer. Em suma, o Tribunal atendeu a todos os fatores juridicamente atendíveis e na escolha da medida da pena, se pecou, foi claramente por excesso. Nestes termos, deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo Recorrente por não lhe assistir qualquer razão. V.Ex.as, porém, decidirão como for de JUSTIÇA (…)” * As arguidas DD e EE responderam ao recurso interposto pelo Ministério Público, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) Concluindo: A discordância do MP prende-se com a medida da pena que foi aplicada às arguidas, a suspensão dessa mesma pena no caso da arguida DD, e a aplicação do regime jovem à arguida EE. Considera que a medida concreta das penas deveria ter sido mais severa, e no caso da DD ser uma pena efetiva. Não assiste qualquer razão ao Ministério Público. O Tribunal a quo levou em consideração no apuramento da ilicitude da conduta, tal como ficou demostrado na fundamentação para a determinação, quer do grau de culpa da arguida, quer do grau de ilicitude da mesma. O simples facto de a arguida ser mãe de família não pode ser um facto que leve a agravante da ilicitude, nem da culpa da agente. Acima de tudo, a arguida antes de se apresentar como mãe, apresenta-se como um ser humano, e, infelizmente, como sabemos todos os seres humanos são capazes, em dado momento, de proceder com de que se arrependem mais tarde. O recorrente MP ignora completamente o relatório médico pericial constante dos autos que refere que como consequência da alegada conduta da arguida, a ofendida NN apresenta uma fratura parcial de uma coroa do dente 45 e duas cicatrizes de 2 cm. As consequências não foram graves o suficiente para a moldura penal concreta da pena da arguida aumentasse, consoante é demostrado pelo relatório médico. Sendo que foi o alto grau de ilicitude da mesma, intimamente relacionado com a finalidade pelo qual o crime foi praticado, sendo que foi este fator que o Tribunal a quo levou em consideração, no momento da aplicação da medida de pena concreta. O Tribunal a quo, na escolha da medida de pena concreta, teve em mente que a arguida tinha finalidades, além do ofender a integridade física da ofendida, de auxiliar os restantes arguidos a proceder à retirada da vida do OO. Porém, a medida concreta da pena, nunca pode ir além da culpa da agente. E como consta do Acórdão, no critério da escolha da pena concreta, todos estes fatores suprarreferidos foram tidos em consideração de forma a conseguir concretizar as exigências de prevenção geral, que das exigências de prevenção especial, tendo esta como limite a culpa da arguida. Do relatório social da arguida consta o percurso de vida DD, onde é demostrado que não mantinha uma vida destruturada. Vivia com o seu agregado familiar, constituído do seu companheiro, filho e filha e ainda o filho do companheiro, fruto de outra relação, onde estava responsável das responsabilidades domésticas, como familiares, tentando sempre arranjar oportunidades de trabalho, demostrando o seu teor trabalhador. À data da prática destes factos não tinha antecedentes criminais. Demostrando-se a pena aplicada pelo Tribunal a quo proporcional e adequada às medidas de prevenção especial e as medidas de prevenção especial ao caso concreto da arguida. Embora o regime jovem não seja de aplicação imediata, como bem refere o MP, o acórdão justifica o porquê da sua aplicação pelo que não assiste razão ao MP. Como bem se refere no Acórdão, no artigo 44.º, n.º 1, do Código Penal o legislador reage contra as penas curtas de prisão, estabelecendo a sua substituição pela pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade A suspensão aplicada à arguida está sujeita a várias condições, cumprindo dessa forma todas as necessidades de prevenção geral e especial das penas. Deve assim o recurso do MP ser declarado totalmente improcedente. Nestes termos, deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo Recorrente por não lhe assistir qualquer razão. V.Ex.as, porém, decidirão como for de JUSTIÇA (…)” * A demandante NN respondeu ao recurso da demandada EE, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) CONCLUSÕES I. Foi a Recorrente condenada pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art.132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, e 4, do Dec. Lei 401/82, de 23.09, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, bem como no que toca ao pedido de indemnização cível, a Recorrente foi condenada no pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; foi condenada solidariamente com as restantes co arguidas no pagamento à demandante da quantia total de 12,000,00€ (doze mil euros) para compensação dos danos não patrimoniais. II. Inconformada com a decisão, veio dela interpor recurso peticionando a sua absolvição quanto ao crime e quanto ao pedido de indemnização cível, sem prescindir que a indemnização não deveria ser fixada em valor superior a 3.000,00€ (três mil euros) III. No entanto, atento toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, não restaram dúvidas ao Tribunal a quo que a Recorrente foi co-autora das agressões perpetradas na Demandante. IV. Quanto à indemnização, a Recorrente em sede de recurso limitou-se a transcrever as lesões constantes do relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito penal a fls. 591 a 593 dos presentes autos e usar o seu espírito crítico atribuindo-lhes designações, tais como “ínfimas cicatrizes” e ainda, lesões de “diminuto impacto” e de “fácil reparação”. V. Em virtude das agressões que a Demandante sofreu resultaram lesões físicas e psicológicas que se perpetuam até ao dia de hoje para o resto da vida da mesma. VI. Da análise do relatório pericial, das fotos do mesmo junto a fls 64, bem como as fotos juntas sob DOCS 1 a 10 do PIC, pelo contrário, extraise clara e perentoriamente, a selvajaria a que a Recorrida foi sujeita as mãos da Arguidas, através dos danos físicos que a mesma sofreu, lá melhor discriminados, factos dados como provados sob os pontos 28 a 31 do douto acórdão. VII. Onde é notório o estado deplorável em que a Demandante ficou na sequência das agressões que foi alvo por parte da Recorrente e das restantes arguidas. VIII. Recorde-se ainda o depoimento da Testemunha HHH, bombeiro, de onde se extraiu a impetuosidade com que a Demandante foi agredida., bastando para tal a leitura do acórdão na pagina 94. IX. Em virtude das agressões de que foi vítima, a Demandante sofreu momentos de desespero e sofrimento que se perpetuam na memória da mesma até aos dias de hoje. X. Aliás, atento a prova produzida resultaram os seguintes factos como provados em relação a Recorrida, factos 57 a 62. XI. A Demandante aqui Recorrida no seu depoimento deixou claro, tal como consta do acórdão pagina 93 das sequelas inesquecíveis com que ficou fruto da conduta das arguidas. XII. O que a Recorrente desvaloriza, designando de “ínfimas cicatrizes”, para além de configurarem um dano estético, são e serão para sempre uma constante reminiscência do evento traumático que Demandante vivenciou. XIII. Posto isto, deverá ser negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se o douto acórdão recorrido. Termos em que deve ser negado provimento ao presente recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se o douto acórdão recorrido. Assim decidindo, farão V. Exas., nos termos e nos melhores de Direito que doutamente suprirão, a mais lídima JUSTIÇA! (…)” * A demandante NN respondeu ao recurso da demandada FF, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) CONCLUSÕES I. Foi a Recorrente condenada pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art.132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, e 4, do Dec. Lei 401/82, de 23.09, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, bem como no que toca ao pedido de indemnização cível, a Recorrente foi condenada no pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; foi condenada solidariamente com as restantes co arguidas no pagamento à demandante da quantia total de 12,000,00€ (doze mil euros) para compensação dos danos não patrimoniais. II. Inconformada com a decisão, veio dela interpor recurso peticionando a sua absolvição quanto ao crime e quanto ao pedido de indemnização cível. III. No entanto, não assiste qualquer razão à Recorrente. IV. O acórdão em recurso está doutamente fundamentado e faz uma correcta analise dos factos e aplicação do Direito, não merecendo qualquer reparo. V. Deve, pois, ser mantido o douto acórdão recorrido, julgando-se totalmente improcedente todas as conclusões das alegações da Recorrente e consequentemente o peticionado. Termos em que deve ser negado provimento ao presente recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se o douto acórdão recorrido. Assim decidindo, farão V. Exas., nos termos e nos melhores de Direito que doutamente suprirão, a mais lídima JUSTIÇA! (…)” * A demandante NN respondeu ao recurso da demandada DD, concluindo nos termos seguintes [transcrição]: “(…) CONCLUSÕES I. Foi a Recorrente condenada pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art.132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 (dois) anos, bem como no que toca ao pedido de indemnização cível, a Recorrente foi condenada no pagamento à demandante da quantia de €4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação; foi condenada solidariamente com as restantes co arguidas no pagamento à demandante da quantia total de 12,000,00€ (doze mil euros) para compensação dos danos não patrimoniais. II. Inconformada com a decisão, veio dela interpor recurso peticionando a sua absolvição quanto ao crime e quanto ao pedido de indemnização cível, sem prescindir que a indemnização não deveria ser fixada em valor superior a 3.000,00€ (três mil euros) III. No entanto, atento toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, não restaram dúvidas ao Tribunal a quo que a Recorrente foi co-autora das agressões perpetradas na Demandante. IV. Quanto à indemnização, a Recorrente em sede de recurso limitou-se a transcrever as lesões constantes do relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito penal a fls. 591 a 593 dos presentes autos e usar o seu espírito crítico atribuindo-lhes designações, tais como “ínfimas cicatrizes” e ainda, lesões de “diminuto impacto” e de “fácil reparação”. V. Em virtude das agressões que a Demandante sofreu resultaram lesões físicas e psicológicas que se perpetuam até ao dia de hoje para o resto da vida da mesma. VI. Da análise do relatório pericial, das fotos do mesmo junto a fls 64, bem como as fotos juntas sob DOCS 1 a 10 do PIC, pelo contrário, extraise clara e perentoriamente, a selvajaria a que a Recorrida foi sujeita as mãos da Arguidas, através dos danos físicos que a mesma sofreu, lá melhor discriminados, factos dados como provados sob os pontos 28 a 31 do douto acórdão. VII. Onde é notório o estado deplorável em que a Demandante ficou na sequência das agressões que foi alvo por parte da Recorrente e das restantes arguidas. VIII. Recorde-se ainda o depoimento da Testemunha HHH, bombeiro, de onde se extraiu a impetuosidade com que a Demandante foi agredida., bastando para tal a leitura do acórdão na pagina 94. IX. Em virtude das agressões de que foi vítima, a Demandante sofreu momentos de desespero e sofrimento que se perpetuam na memória da mesma até aos dias de hoje. X. Aliás, atento a prova produzida resultaram os seguintes factos como provados em relação a Recorrida, factos 57 a 62. XI. A Demandante aqui Recorrida no seu depoimento deixou claro, tal como consta do acórdão pagina 93 das sequelas inesquecíveis com que ficou fruto da conduta das arguidas. XII. O que a Recorrente desvaloriza, designando de “ínfimas cicatrizes”, para além de configurarem um dano estético, são e serão para sempre uma constante reminiscência do evento traumático que Demandante vivenciou. XIII. Posto isto, deverá ser negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se o douto acórdão recorrido. Termos em que deve ser negado provimento ao presente recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se o douto acórdão recorrido. Assim decidindo, farão V. Exas., nos termos e nos melhores de Direito que doutamente suprirão, a mais lídima JUSTIÇA! (…)” » Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, nesta instância a Exmª. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, nos termos do qual, aderindo à posição da Digna Magistrada do Ministério Público na primeira instância, em suma, pronunciou-se no sentido da improcedência dos recursos interpostos pelos arguidos e da procedência do recurso interposto pela assistente e Ministério Público junto da 1ª instância “quer quanto à prova produzida, à sua apreciação e respetiva fundamentação, quer no que concerne à medida e escolha das penas a aplicar, in casu”.
» Pese embora tenha sido dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal (doravante também designado CPP), não foram apresentadas respostas ao dito parecer. » Por despacho proferido em 29/10/24, refª Citius nº 18662419, foram indeferidos os pedidos de realização da audiência prevista no nº 5, do art. 411º do CPP, formulados pelos arguidos recorrentes AA, BB e CC, por não cumprirem os requisitos legalmente exigíveis. » I.8 Concluído o exame preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento do recurso em conferência, nos termos do artigo 419.º do Código de Processo Penal. Cumpre, agora, apreciar e decidir. » Conforme decorre do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal (doravante CPP), bem como da jurisprudência pacífica e constante [designadamente, do STJ[1]], e da doutrina[2], são as conclusões apresentadas pelo recorrente que definem e delimitam o âmbito do recurso e, consequentemente, os poderes de cognição do Tribunal ad quem, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a que alude o artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal[3], relativas a vícios que devem resultar directamente do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, a nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito), ou quanto a nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do C.P.P.). » Face às conclusões extraídas pelos recorrentes das motivações dos respectivos recursos interpostos nos autos, as questões decidendas a apreciar são as seguintes [enumeradas em termos de precedência lógico-jurídica e não pela ordem da sua invocação, nos autos e nas peças recursivas]:
- Da rejeição do recurso da assistente
- Do recurso interlocutório do arguido AA: se o despacho proferido pelo Tribunal a quo, na sessão de julgamento do dia 07/03/2024, que indeferiu o requerimento do arguido AA para inquirição, em audiência, dos peritos subscritores do relatório de autópsia junto aos autos, padece de nulidade, nos termos da alínea d), do nº 2, do artigo 120º do CPP.
- Da invocada irregularidade do mandato forense do mandatário da assistente.
Dos recursos interpostos do acórdão final
Quanto ao recurso do arguido AA: - se a decisão recorrida padece de nulidade, nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1 alínea a) do CPP, por violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 375.º, 97.º, n.º 1, alínea a), n.º 2 e n.º 5 do CPP e artigos 32.º, n.º 1 e 205.º da CRP, por falta de fundamentação da concreta medida da pena aplicada; - se a decisão recorrida padece dos vícios previstos no art. 410.º n.º 1 e n.º 2, alíneas a) e b) do CPP; - se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, nos termos do disposto no art. 412º do CPP, quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 25, 34, 35, 36, 37 e 38; - se a decisão recorrida violou o princípio in dubio pro reo; - se, na sequência da impugnação da matéria de facto, deverá fazer-se a subsunção jurídica dos factos praticados pelo recorrente ao crime de ofensa à integridade física simples, por falta de nexo de causalidade entre a actuação do arguido AA (que se limitou a desferir uma facada na zona lombar da vítima) e o resultado morte; - subsidiariamente, do não preenchimento das qualificativas do crime de homicídio previstas nas h) e i) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal, tendo, além disso, o tribunal recorrido desconsiderado a sua não operabilidade automática; - se deverá ser aplicado ao recorrente o regime especial para Jovens; - se a pena aplicada é exagerada, desproporcional e desadequada, nunca devendo ser superior a 15 anos de prisão. * Quanto ao recurso do arguido BB: - se a decisão recorrida padece de nulidade, nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1 alínea a) do CPP, por violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 375.º, 97.º, n.º 1, alínea a), n.º 2 e n.º 5 do CPP e artigos 32.º, n.º 1 e 205.º da CRP, por falta de fundamentação da concreta medida da pena aplicada; - se a decisão recorrida padece dos vícios previstos no art. 410.º n.º 1 e n.º 2, alíneas a) e b) do CPP; - se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, nos termos do disposto no art. 412º do CPP, quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 25, 34, 35, 36, 37, 38; - se a decisão recorrida violou o princípio in dubio pro reo; - se, na sequência da impugnação da matéria de facto, deverá fazer-se a subsunção jurídica dos factos praticados pelo recorrente ao crime de ofensa à integridade física simples; - subsidiariamente, do não preenchimento das qualificativas do crime de homicídio previstas nas h) e i) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal e sua não operabilidade automática, com a consequente subsunção jurídica dos factos no crime de homicídio simples; - se a pena aplicada é exagerada, desproporcional e desadequada, nunca devendo ser superior a 14 anos e 3 meses de prisão. * Quanto ao recurso do arguido CC: - se a decisão recorrida está ferida de nulidade, por violação do que dispõe a alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, porquanto o recorrente na sua contestação alega que não fugiu do local, que não conhecia o OO e quando o viu esfaqueado tentou ajudá-lo, o que foi ignorado pelo Tribunal a quo; - se a decisão recorrida padece dos vícios previstos no art. 410.º n.º 1 e n.º 2, als. a), b) e c) do CPP; - se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, nos termos do disposto no art. 412º do CPP, quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 7, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 25, 34, 35, 36, 37 e 38; - se a decisão recorrida violou o princípio in dubio pro reo; - se a pena aplicada é desproporcional, devendo situar-se próxima do mínimo “ a rondar os 12 anos de prisão”. * Quanto ao recurso da arguida DD: - na nulidade da decisão recorrida, por insuficiente fundamentação (art. 374º, nº 2 e 379º, ambos do CPP); - do erro de julgamento quanto aos factos provados descritos sob os nºs 21, 23, 24 e 28 da decisão recorrida, que deveriam deveriam ter sido dados como não provados, por falta de prova; - da violação do princípio in dubio pro reo, com a consequente absolvição da arguida do crime pelo qual foi condenada e, bem assim, também do pedido de indemnização civil; - subsidiariamente, se a indemnização civil fixada em € 12.000,00, face ao diminuto impacto das lesões, revela-se manifestamente desproporcional, nunca devendo ser superior a € 3.000,00. * Quanto ao recurso da arguida EE: - na nulidade da decisão recorrida, por insuficiente fundamentação (art. 374º, nº 2 e 379º, ambos do CPP); - do erro de julgamento quanto aos factos provados descritos sob os nºs 21, 23, 24 e 28 da decisão recorrida, que deveriam deveriam ter sido dados como não provados, por falta de prova; - da violação do princípio in dubio pro reo, com a consequente absolvição da arguida do crime pelo qual foi condenada e, bem assim, também do pedido de indemnização civil; - subsidiariamente, se a indemnização civil fixada em € 12.000,00, face ao diminuto impacto das lesões, revela-se manifestamente desproporcional, nunca devendo ser superior a € 3.000,00 * Quanto ao recurso da arguida FF: - da nulidade da decisão recorrida, por insuficiente fundamentação (art. 374º, nº 2 e 379º, ambos do CPP); - do erro de julgamento quanto aos factos provados descritos sob os nºs 22, 23, 24 e 28 da decisão recorrida, que deveriam deveriam ter sido dados como não provados, por falta de prova; - da violação do princípio in dubio pro reo, com a consequente absolvição da arguida do crime pelo qual foi condenada e, bem assim, também do pedido de indemnização civil. * Quanto ao recurso do arguido GG: - se a pena de multa aplicada ao arguido é excessiva, devendo ser reduzida, quer quanto ao número de dias, quer quanto ao quantitativo diário. * Quanto ao recurso do Ministério Público: - se os arguidos AA, BB e CC deveriam ter sido também condenados pela qualificativa prevista na al. e), do nº2 do artigo 132º do Código Penal; - se as penas de prisão aplicadas aos arguidos AA, BB e CC foram demasiado baixas, devendo aqueles ter sido condenados em penas, o primeiro não inferior a 23 anos; e os restantes dois não inferior a 20 anos; - se a pena aplicada à arguida DD deverá ser agravada e não suspensa; - da não aplicação do regime de jovens adultos (Decreto-Lei nº401/82, 23/9) às arguidas EE e FF e consequente agravação das penas que lhes foram concretamente aplicadas.
» “ (…) Fundamentação de facto. Factos provados Com relevância para a decisão e com exclusão da matéria de direito ou de natureza conclusiva, provaram-se os seguintes factos: Da responsabilidade criminal 1- Desde o início do ano de 2022 que o arguido AA, o seu agregado familiar, constituído pelos arguidos BB, seu progenitor, DD, sua progenitora, e EE, sua irmã, e CC, companheiro da sua tia paterna (QQ), mantinham um clima de conflito com OO. 2- No mês de janeiro de 2022 ocorreram conflitos físicos numa discoteca entre AA e OO, que prosseguiram com um novo episódio, aquando da ..., envolvendo OO e os arguidos AA e EE. 3- Na sequência deste último episódio, o arguido BB deslocou-se ao Bairro ... à procura de OO, tendo aí ocorrido desacatos. 4- Neste contexto, no dia 7/5/2022, durante a tarde, no Estádio 1..., em Lisboa, onde os arguidos BB e AA se encontravam por ocasião do jogo que opôs o ... ao ..., o primeiro, apercebendo-se da entrada de OO na bancada logo o desafiou para lutarem, gerando-se uma contenda que só cessou com a intervenção de terceiros. 5- Cerca das 2.00h do dia 8/5/2022, em plenos festejos da vitória do ... sobre o ... e no campeonato, junto às barracas da ... existentes no anel que rodeia o Estádio ..., OO e QQ envolveram-se numa troca de palavras que cessou quando o primeiro voltou para junto do seu grupo de amigos. 6- Depois do encontro tido com OO, a arguida DD alertou o arguido BB para a presença do OO junto ao Estádio .... 7- Na posse dessa informação, o arguido BB decidiu deslocar-se com o arguido CC para o estádio e juntamente com o arguido AA decidiram localizar, perseguir, manietar e agredir com instrumento de natureza cortocontundente OO, e, assim, fazendo-se valer do fator surpresa que o grande aglomerado de pessoas lhes proporcionava, bem como da superioridade numérica, dele se vingarem, tirando-lhe a vida. 8- Os arguidos BB e CC deslocaram-se para junto do ..., onde se encontraram com os arguidos AA, II, HH, JJ, GG, EE, FF e DD, que, entretanto, também para aí se dirigiram, descendo as escadas junto ao estádio cerca das 2.35h. 9- Após, todos os arguidos subiram as escadas do estádio pelo lado do ..., e dirigiram-se para o local onde o OO tinha sido visto próximo da rulote da .... 10- OO, alertado de que os arguidos se encontravam no local à sua procura, tinha já iniciado o regresso a casa, subindo a Alameda ..., pelo que já não se encontrava no local. 11- Como não conseguiram encontrar o OO, os arguidos AA e BB e CC, acompanhados dos demais arguidos, desembocaram na Rua ..., onde os três primeiros continuaram a procurá-lo entre o aglomerado de pessoas que lá se encontravam, prosseguindo em direção à Alameda ..., passando junto ao .... 12- A determinado momento, os arguidos AA, BB e CC avançaram por debaixo do viaduto da Rua ..., tendo localizado pelas 2.42.45h o OO, no sentido ascendente da Alameda .... 13- Nesse instante, os arguidos AA e BB e CC moveram uma perseguição desenfreada a OO. 14- O arguido AA seguia à frente de um grupo de pessoas não concretamente identificadas empunhando e manuseando uma faca com uma lâmina de comprimento não apurado em concreto. 15- O arguido AA logrou alcançar OO quando este ainda corria pela faixa de rodagem da Alameda ..., no sentido ascendente, e esfaqueou-o pelo menos duas vezes, tendo a agressão sido presenciada pelos arguidos BB e CC. 16- Alguns metros mais à frente, já junto à berma do lado esquerdo da dita Alameda, no sentido ascendente, o OO foi novamente alcançado pelos arguidos BB e CC e quando este conseguiu agarrá-lo pelas pernas, aquele prendeu-o pelos braços, manietando-o, impedindo-o de fugir e de se defender, fazendo-o cair ao chão 17- Nessa altura, o arguido AA, fazendo uso da faca de que se encontrava munido, novamente desferiu golpes no OO. 18- Entretanto, por via da intervenção de PP, que agarrou o arguido BB, e de TT, OO conseguiu rastejar, libertar-se e fugir pelo meio do separador central da Alameda ..., percorrendo alguns metros até que foi de novo apanhado pelo arguido AA, que novamente o esfaqueou com a faca que trazia. 19- Já caído no chão e desfalecido o arguido BB desferiu, além do mais, um pontapé na cabeça de OO, enquanto o arguido AA se afastava sozinho. 20- Seguidamente, o arguido BB ausentou-se do local e juntou-se às arguidas DD, EE e FF e juntos deslocaram-se em direção à zona referente à entrada do ..., passaram em frente à estação do metro e prosseguiram em direção a .... * 21- Quando PP agarrou o arguido BB foi de imediato agredido. 22- Apercebendo-se que o PP estava a ser agredido, a NN tentou auxiliá-lo. 23- Enquanto tentava auxiliar PP, NN foi atingida com vários murros, socos e pontapés, assim como puxões de cabelo, que lhe foram desferidos pelas arguidas FF, DD e EE, que seguiam atrás dos demais arguidos e que logo ali gizaram um plano para, agindo de comum acordo e em conjugação de esforços e divisão de tarefas, a agredirem. 24- Além de a agredirem nos termos descritos em 23, as arguidas FF, DD e EE agarraram a cabeça de NN e empurraram-na com força contra a ambulância que lá se encontrava. * 25 - Em consequência da conduta dos arguidos AA e BB e CC, OO sofreu as seguintes lesões: Hábito externo Tórax: Oito soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 1: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, com extremidade superior romba e extremidade inferior indefinida, à qual se associa uma escoriação avermelhada irregular e desidratada com 0,6 por 0,4 cm de maiores dimensões. Esta está localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, apresentando exposição de tecido celular subcutâneo e 2,2 cm de comprimento, estando a sua extremidade superior na linha média e distando 15 cm da fúrcula esternal e 10,8 cm do mamilo direito; Lesão número 2: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo e tecido muscular, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha média clavicular, apresentando 2,9 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 23,3 cm da fúrcula esternal, 11 cm do mamilo direito e 5,3 cm da linha média; Lesão número 3: obliqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido sobre o celular subcutâneo e tecido muscular, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, apresentando 3,5 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 1,3 cm da linha média, 15 cm de la do mamilo esquerdo e 22,5 cm da fúrcula esternal; Lesão número 4: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e a inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e osso, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da fase anterior do hemitórax esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 19,5 cêntimos da fúrcula esternal, 19 cm do mamilo direito e 8 cm da linha média; Lesão número 5: ligeiramente oblíqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e cartilagem costal, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de comprimento, distando a sua extremidade superior 28,5 cm da fúrcula esternal, 22,7 cm do mamilo direito e 8,2 cm da linha média; Lesão número 6: oblíqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo as 2 extremidades angulosas, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, com múltiplos entalhes na porção posterolateral, localizada no flanco esquerdo, apresentando 11,3 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 36,5 cm da fúrcula esternal, 25 cm do mamilo direito e 8,7 cm da linha média; Lesão número 7: horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 17: Horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo virgo localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e sendo e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 18: superficial, horizontal, sendo as extremidades angulosas, tendo a mais medial uma cauda terminal de 3 cm ao nível da linha média e sem exposição de tecidos, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax direito, junto à linha média, apresentando 8 cm de comprimento, distando a extremidade lateral 5 cm da linha média, 19 cm da linha axilar posterior e 31 cm da espinha ilíaca anterosuperior direita. B - Membro superior direito: Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 8: com entalhes laterais, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada no bordo cubital da falange proximal do primeiro dedo da mão apresentando 1,5 cm de comprimento; Lesão número 9: com perda de substância, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada na polpa do segundo dedo da mão, de uma área de 0,8 por 0,4 cm, com 0,4 cm de profundidade. C- Membro superior esquerdo: Escoriação avermelhada e irregular na face posterior do terço distal do antebraço, medindo 3 por 1,5 cm de maiores dimensões; Esfacelo com fundo avermelhado ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do segundo dedo, medindo 0,8 por 0,6 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada irregular e região de esfacelo com fundo avermelhado ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do terceiro dedo, medindo 0,6 por 0,5 cm de maiores dimensões; Duas escoriações avermelhadas irregulares na face posterior da articulação metacarpofalângica do quarto dedo, uma mais superior, medindo 0,8 por 0,8 cm de maiores dimensões, e outra mais inferior, medindo 0,6 por 0,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada arredondada na face posterior da articulação interfalângica proximal do quarto dedo, medindo 0,4 por 0,3 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada irregular ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do quinto dedo, medindo 1,5 por 1 cm de maiores dimensões. Quatro soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 10: obliqua superoinferiormente de radial para cubital, sendo as 2 extremidades angulosas, apresentando a inferior uma cauda de escoriação terminal com 0,4 cm de maior eixo. Localiza-se no dorso da mão sobre o terceiro metacarpo, apresentando 3,3 cm de comprimento, com exposição de tecido celular anteromedial do joelho, medindo 5,5 por 3,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada, irregular, com crosta hemática não destacável, na face anterior do terço médio da perna, medindo 1 por 0,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada e irregular na face anterior do terço distal da perna, medindo 1,2 por 1 cm de maiores dimensões. Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 7: ligeiramente oblíqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sem possibilidade de avaliação da extremidade superior e apresentando um entalhe na extremidade inferior, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada na face anterior do terço superior da coxa ao nível da linha da sínfise pública e lateralmente à espinha ilíaca anterosuperior direita, apresentando 3,4 cm de comprimento, distando a sua extremidade superior 3,5 cm da espinha ilíaca anterosuperior, 13 cm da sínfise púbica e 11 cm da linha média; Lesão número 14: oblíqua superoinferiormente de medial para lateral, sendo as duas extremidades angulosas, associando-se à extremidade inferior uma escoriação linear vermelho-escura com 1,7 por 1,5 cm de maiores dimensões e à extremidade superior uma escoriação linear vermelha-escura com 0,7 cm de maior eixo. Localiza-se na face anterolateral do joelho, apresentando 6 cm de comprimento, com exposição de tecido celular subcutâneo e do retináculo patelar. D- Membro inferior esquerdo: Escoriação avermelhada e irregular na face lateral do terço superior da coxa, medindo 3 por 1,5 cm de maiores dimensões; Três escoriações avermelhadas e irregulares na fase anteromedial do joelho, medindo uma área total de 5,5 por 3 cm; Escoriação avermelhada e irregular na face anterolateral inferior do joelho, medindo 2,5 por 2 cm de maiores dimensões. Múltiplas escoriações avermelhadas e irregulares, dispersas pela face anterior da perna, medindo a maior delas 2,5 por 1,5 cm de maiores dimensões. Duas soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: - Lesão número 15: solução de continuidade superficial horizontal, sendo as extremidades angulosas e sem exposição de tecidos, localizada na face lateral do terço proximal da coxa esquerda, apresentando 2 cm de comprimento, distando a extremidade medial 12,5 cm da crista ilíaca anterosuperior esquerda, 23 cm da sínfise pública e 22 cm da linha média; - Lesão número 16: solução de continuidade de bordos desidratados, ligeiramente oblíqua superoinferiormente de lateral para medial, sendo a extremidade medial angulosa e a lateral romba com cauda de peixe de 0,2 cm de maior eixo, com exposição das camadas internas de pele, localizada na fase anterior do 1/3 médio da coxa esquerda, apresenta 1 cm de comprimento. Hábito interno Cabeça Encéfalo: Circunvoluções cerebrais ligeiramente aplanadas (compatível com um edema cerebral ligeiro) e parênquima com congestão nas diferentes seções de corte. Tórax Nas paredes: Ao nível do tecido celular subcutâneo, sete soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha médio clavicular, em relação com alusão número 2 do hábito externo; - outra, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, em relação com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da face anterior do hemitórax esquerdo, na linha médio clavicular, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterior do 1/3 inferior do hemitórax esquerdo, externamente a linha médio clavicular, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterolateral do terço inferior do hemitórax esquerdo, em relação com a lesão número 6 do hábito externo; - outra, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, em relação com a lesão número 17 do hábito externo. No plano muscular: Quatro soluções de continuidade de bordos regulares e filtrados de sangue, nomeadamente: - uma, localizada nem inserção inferomedial do músculo grande peitoral direito, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, atingindo a inserção inferior do músculo grande peitoral esquerdo, a inserção superior do músculo oblíquo externo à esquerda e os músculos intercostais do quinto espaço intercostal, ao nível da linha médio clavicular à esquerda, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, na transição dos músculo oblíquo externo para o músculo reto abdominal, à esquerda, junto à inserção dos mesmos, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, com infiltração sanguínea circundante, atingindo a porção lateral do músculo oblíquo externo, à esquerda e os músculos intercostais do oitavo espaço intercostal à esquerda, em relação com a lesão número 6 do hábito externo. Infiltração sanguínea do músculo latissimus dorsal à esquerda, na sua camada mais superficial, em relação com a lesão número 17 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas direitas: Duas soluções de continuidade, de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, ao nível da inserção esternal da cartilagem do quinto arco costal direito, não transfixiva, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, ao nível da inserção esternal das cartilagens costais do sétimo e oitavo arcos costais, transfixiva, em relação com a lesão número 2 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas esquerdas: Três soluções de continuidade transfixivas, de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do quinto arco costal, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do oitavo arco costal, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, ao nível do arco anterior da cartilagem costal do oitavo e nono arcos costais, em relação com a lesão número 6 do hábito externo. Pericárdio e cavidade pericárdica: Duas lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na face anteromedial do pericárdio, com com 1,8 cm, em relação com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, na face anterolateral do pericárdio, com 4 cm de comprimento em relação com a lesão número 4 do hábito externo. Coração: Duas soluções de continuidade lineares de bordos regulares e infiltrados de sangue, transmurais: - uma, na região póstero lateral do ventrículo direito, medindo 2,2 cm de cumprimento na face externa e 3,5 cm de comprimento na face interna, em correspondência com a lesão número 3 hábito esterno; - outra, na região anterolateral do ventrículo esquerdo, medindo 5 cm de comprimento na face externa e 8,3 cm da face interna, em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Pleura parietal e cavidade pleural esquerda com presença de hemotórax com 1000 cc de volume. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com as lesões números 4,5 e 6 do hábito externo. Diafragma: Três lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na hemicúpula diafragmática direita, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; - outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, pericentimétrica, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo. C- Abdómen: Paredes: Três soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na extremidade superior do músculo reto abdominal direito, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; - outra, na extremidade superior do músculo reto abdominal esquerdo, junto à linha média, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, atingindo a porção lateral inferior dos músculos oblíquo externo, obliquo interno e reto abdominal, à direita, em correspondência com a lesão número 7 do hábito externo. Peritoneu e cavidade peritoneal: Vestígios hemáticos peri-hepáticos. Fígado: Dimensões ligeiramente aumentadas. Contusão ao nível da face diafragmática do lobo esquerdo, medindo 2 cm de maior eixo. Solução de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, praticamente vertical, na face diafragmática do lobo direito, com 3,5 cm de cumprimento, distando 2 cm do ligamento falciforme, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Parênquima pálido e congestivo. Estômago: Laceração de bordos regulares e infiltrados de sangue, na face do antro pilórico, medindo 1 por 0,7 cm de maiores dimensões, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo. Membro: Membro inferior direito: Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na fase anterior do terço superior da coxa, ao nível da linha da sínfise púbica e lateralmente a espinha ilíaca anterosuperior direita, atingindo o tecido celular subcutâneo e a porção lateroinferior dos músculos oblíquo externo, oblíquo interno e reto abdominal, em correspondência com a lesão número 7 do hábito externo; - outra, ao nível da face anterior do retináculo patelar, com 5 cm de comprimento, com atingimento do tecido celular subcutâneo e da face anterior da patela, em correspondência com a lesão número 14 do hábito externo. Membro inferior esquerdo: Solução de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue ao nível da fase anterior do terço médio da coxa, atingindo tecido celular subcutâneo, a aponevrose do músculo reto femural. Infiltração sanguínea do músculo reto femural, na sua camada mais superficial, em correspondência com a lesão número 16 do hábito externo. 26- As lesões tóraco-abdominais descritas determinaram como consequência direta, adequada e necessária a morte de OO, tendo o óbito ocorrido no dia 8/5/2022. 27- Em virtude das lesões sofridas OO foi assistido no local e transportado para o serviço de urgência do hospital ..., onde deu entrada em manobras de suporte avançado de vida (SAV), mas já sem sinais de vida, tendo o óbito sido verificado pelas 3.20h. * 28- Em consequência da conduta das arguidas DD, EE e FF resultaram para NN as seguintes lesões: No crânio: Tumefação de coloração levemente arroxeada na região frontal;
Solução de continuidade com 1,5 cm de comprimento na região frontal à direita; Dor à palpação do couro cabeludo na região occipital. Na face: Tumefação e coloração arroxeada da fase, mais marcada à esquerda; Edema e equimose arroxeada palpebral; Escoriação com 1 por 0,5 cm no dorso do nariz; Fratura parcial da coroa do dente 45. No abdómen: Duas corações punctiformes na face lateral do flanco esquerdo; Equimose arroxeada com 4 por 2 cm e com 8 por 3 cm na face posterior do flanco esquerdo. 29- As lesões descritas provocaram de forma direta, adequada e necessária dores. 30- Demandaram 8 dias para consolidação médico-legal, com afetação da capacidade de trabalho geral em 8 dias e com igual período de afetação da capacidade de trabalho profissional. 31- Como consequência permanente adveio fratura parcial da coroa do dente 45, passível de reparação e que não é causa de desfiguração nem de afetação da capacidade de trabalho. * 32- No dia 8/6/2022, na residência sita na Rua ..., ..., em Vila Nova de Gaia, a arguida LL tinha: Na sala, num armário de arrumos: - Um bastão extensível, constituído por 3 segmentos em metal, encaixando-se sucessivamente, sendo que os 2 correspondentes a parte mais distante do punho são constituídos em espiral metálica (mola), com a parte correspondente ao punho revestida em metal polímero de cor preta, em razoável estado de conservação, medindo cerca de 20 cm quando fechado e 52 cm quando estendido. * 33- No dia 8 de junho de 2022, na residência sita na Rua ..., entrada ..., casa ..., no Porto, o arguido GG tinha:
- um boxer (vulgo, soqueira) de produção artesanal e de modelo em metal, com 4 anéis para inserção dos dedos e uma base de apoio para a palma da mão, com as dimensões de 9,5 x 6,5 x 1,3 cm, em bom estado e perfeitamente funcional. * 34- Os arguidos AA e BB e CC agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas acordadas condutas eram proibidas e punidas por lei. 35- Os arguidos AA, BB e CC sabiam que os golpes desferidos com a faca nos locais referidos poderiam causar a morte como causaram de OO, o que representaram e quiseram. 36- Sabiam os arguidos AA, BB e CC que ao agir da forma descrita em conjugação de esforços e divisão de tarefas, com superioridade numérica e usando de violência e de instrumentos corto-perfurantes, se constituíam em elevada desproporção relativamente a OO, impedindo-o de se defender e de fugir. 37- Os arguidos AA e BB e CC sabiam que ao perseguir, cercar, agarrar, manietar e agredir OO, impediam a sua fuga e defesa, assim como possibilitavam, como queriam, que o arguido AA desferisse repetidamente golpes com a faca no corpo de OO, atingindo-o nas costas, no peito e no abdómen, onde aqueles sabiam que se alojavam órgãos vitais. 38- Os arguidos AA, BB e CC não souberam refrear os seus impulsos violentos, atuando da forma descrita, motivados por um desejo de vingança, numa escalada de violência, por motivos relacionados com desentendimentos familiares que envolviam os arguidos AA e BB com o OO. 39- As arguidas DD, EE e FF atuaram em conjugação de esforços e acordo de vontades numa situação de superioridade numérica para melhor assegurarem o êxito das suas intenções. 40- As arguidas DD, EE e FF agiram livre, deliberada e conscientemente, com o propósito concretizado de agredirem fisicamente a ofendida NN e de lhe causarem os ferimentos escrito, dores e mal estar. 41- As arguidas DD, EE e FF bem sabiam que as suas condutas eram proibidas por lei. 42- Os arguidos LL e GG conheciam as características das armas que detinham, sabendo que as não podiam deter, tendo atuado de forma livre, deliberada e consciente. 43- Os arguidos LL e GG sabiam que a sua conduta era proibida e punida por lei. ** Do pedido de indemnização civil da demandante MM 44- OO sempre residiu com a mãe. 45- À data dos factos OO tinha 26 anos de idade. 46- Tinha alegria de viver. 47- Convivia com os amigos, namorada, irmãos e mãe. 48- Era protetor da família, principalmente da mãe, e meigo. 49- OO era o filho com quem a demandante mais tonha afinidade. 50- OO acudia a mãe fosse qual fosse a sua necessidade. 51- OO era bem disposto e extrovertido. 52- Nunca mais nenhum aniversário, natal ou outras celebrações foram feitas da mesma forma. 53- A assistente desloca-se todos os dias ao cemitério, duas vezes por dia. 54- Com a morte do filho a assistente passou a ser uma pessoa triste, sem vontade de viver. 55- Necessita de medicação para dormir e tratamento psicológico. Do pedido de indemnização civil da demandante NN 56- As arguidas arrancaram cabelos a Demandante. 57- A demandante tornou-se uma pessoa mais nervosa. 58- Fruto da atuação bárbara das Arguidas/Demandadas, a demandante passou a dormir com dificuldade. 59- Deixou de andar sozinha na rua com medo, utilizando o UBER para as suas deslocações ou então pedia a amigos que a acompanhassem. 60- A Demandante ficou e está angustiada, psicologicamente abalada, com um enorme sentimento de injustiça e ao mesmo tempo com bastante revolta. 61- A Demandante nunca mais na sua vida se irá esquecer pelo que passou fruto da atuação das arguidas. 62- Ainda hoje se recorda de tudo o que se passou de forma nítida e presente. 63- Inclusive ainda no chão depois das agressões a Demandante lembra se de ouvir de alguém que estava com o pulso fraco. 64- A Demandante, à data dos factos, trabalhava como aprendiz de empregada de balcão no ..., conforme contrato de trabalho por tempo indeterminado. 65- Devido as lesões que as arguidas lhe causaram, a demandante teve de ser colocada noutra função, pela entidade patronal, porquanto o aspeto visual que tinha afastava a clientela. ** Das condições de vida dos arguidos 66- HH alterna entre o agregado paterno, composto pelo pai (HH, 52 anos de idade, mediador imobiliário) e o agregado materno, composto pela mãe (LLL, 47 anos de idade, massoterapeuta). Os períodos de permanência nos dois agregados são variáveis. Esta alternância de agregados decorre desde o divórcio dos progenitores, quando o arguido contava 13 anos de idade, mantendo os pais uma relação cordial. As dinâmicas intrafamiliares são pautadas por laços de afetividade e de coesão. O arguido manifesta ainda proximidade afetiva com a irmã mais velha e os dois sobrinhos, menores de idade. O arguido tem o 12º ano de escolaridade com média de 16,5, formação profissional certificada: no ano letivo 2019/2020 concluiu o curso profissional ..., o qual lhe atribuiu dupla certificação. Em março de 2023 integrou a empresa A... na área de logística – picking, tendo rescindido contrato por mútuo acordo, encontrando-se desempregado desde 21/09/2023, tendo efetuado, em 2/10/2023, inscrição no Instituto de Emprego e Formação Profissional ..., beneficiando do subsídio de desemprego, com cessação prevista para maio do corrente ano. Desde então o arguido tem auxiliado na sociedade constituída pelo progenitor, B..., Lda, cuja atividade se prende com transporte individual de passageiros em veículos descaracterizados a partir da plataforma eletrónica (TVDE), e da qual refere ser sócio, com uma participação de 25%, dedicando-se às tarefas de limpeza, manutenção e gestão dos dois veículos automóvel. Colabora também na agência imobiliária do progenitor, com a designação comercial de C..., ao nível da gestão das redes sociais. No que concerne a projetos futuros, HH pretende exercer funções como motorista de TVDE na empresa familiar. Relativamente à data dos factos constantes nos autos, trabalhava desde 6/05/2022 na fábrica de ração – D..., com contrato de trabalho. O arguido inseriu-se no mercado de trabalho aos 18 anos de idade como motorista de uber eats, inicialmente por conta própria e posteriormente por conta de outrem. Decorrido, sensivelmente, um ano e meio, relatou experiências profissionais, com vínculo laboral, num centro de sondagens telefónicas pelo período de quatro meses, num supermercado pelo período de três meses e como consultor imobiliário na agência do progenitor. Recebe 509.30 euros/mês (subsídio do desemprego). Valor dos rendimentos líquidos do agregado paterno: cerca de 1300 euros/mês (valor bruto). O arguido não comparticipa na economia doméstica por opção do progenitor, que avalia a situação económica como estável. O arguido está a pagar à figura paterna o montante mensal de 250 euros, relativamente a despesa associada aos serviços do mandatário, avaliando a sua atual situação económica como deficitária. Valor dos rendimentos líquidos do agregado materno: cerca de 600 euros/mês. Valor total das despesas/encargos fixos do agregado materno: cerca de 327 euros/mês. A progenitora do arguido encontra-se desempregada, auferindo o subsídio de desemprego, no valor referido pela própria de cerca de 600 euros/mês, realizando trabalhos em regime informal, como terapeuta, obtendo rendimentos médios mensais variáveis. O arguido colabora na economia doméstica do agregado materno, assegurando a despesa do serviço tv/net/voz e consoante os dias que permanece no domicílio, responsabiliza-se pelo pagamento da parte correspondente ao valor da renda da habitação. HH tem ocupado o seu quotidiano colaborando nas duas empresas do progenitor, no convívio com a família, mencionando ter-se afastado do grupo de amigos, no qual inclui alguns dos coarguidos, com quem estabeleceu relação de amizade na infância e em contexto escolar e com quem costumava estar com frequência, nomeadamente em espaços recreativos. O arguido possui uma imagem positiva junto dos progenitores, que enfatizam os valores pró-sociais que lhe incutiram. À data dos factos HH geria o quotidiano em função do exercício da atividade profissional, do convívio com a família e com os amigos, alguns dos quais coarguidos. O arguido praticou natação, danças de salão, karaté e dos 12 aos 18 anos de idade foi federado na modalidade de basquetebol. HH sinalizou o início de consumo de haxixe aos 13/14 anos de idade, em contexto de grupo e recreativo, com carácter diário a partir dos 18 anos de idade, adição que mantém até ao presente, sendo a situação desconhecida pelos progenitores. O arguido não avalia o consumo como problemático, reportando efeitos positivos na sua sintomatologia ansiosa, queixas que refere desde a altura em que foi detido à ordem dos presentes autos. O arguido manifesta ansiedade, constrangimento e inconformismo com o presente processo e com as diligências processuais, assim como preocupação com as eventuais consequências que o mesmo possa acarretar, não obstante, mostrar-se expectante de que a situação seja esclarecida em sede de Tribunal, não equacionando outro desfecho senão a absolvição, posição também assumida pelos progenitores. O arguido apresenta um discurso de vitimização, percecionando-se como alvo de uma injustiça, identificando impacto negativo a nível psicoemocional, a nível profissional, assim como a nível familiar, pela preocupação e constrangimentos suscitados, potenciados, no seu entendimento, pela exposição mediática associada ao presente processo, o que também foi sinalizado pelas fontes familiares. O arguido expressa ainda receio de ser alvo de eventuais retaliações por parte de terceiros relacionados com a vítima, situação que o tem inibido de frequentar determinados locais públicos e de não exercer funções como motorista na empresa familiar ou colaborar como consultor imobiliário na agência do progenitor, para evitar ser reconhecido. Os progenitores expressam apoio incondicional ao arguido, referindo que este apoio é extensível à irmã. 67- À data da factualidade subjacente aos presentes autos, DD residia com os dois filhos (AA e EE, com 21 e 19 anos de idade, respetivamente, coarguidos) e, de forma intermitente, com o companheiro (BB, 41 anos, coarguido) na morada supra identificada – trata-se de um apartamento camarário de tipologia três, descrito como adequado em termos de condições de habitabilidade e de conforto, inserido em zona residencial de configuração suburbana conotada com problemáticas sociais e criminais. O agregado contaria ainda com a presença frequente da namorada do filho (RR, 27 anos), da filha desta (MMM, 9 anos) e do neto (NNN, 1 ano). O agregado familiar reside nesta morada há nove anos, sendo a arguida a titular do contrato de arrendamento. As dinâmicas familiares foram caracterizadas como satisfatórias no eixo filioparental, mas instáveis no eixo conjugal, com conflitualidade e separações recorrentes ao longo da história relacional devido aos comportamentos de infidelidade e de omissão da figura masculina. A partir de meados de 2023, o filho mais novo do companheiro da arguida (OOO, 18 anos) passou a integrar formalmente o agregado familiar, no âmbito da intervenção de promoção e proteção de que estava a ser alvo à época. O companheiro e o filho estão em cumprimento da medida de coação de prisão preventiva decretada nos presentes autos. DD tem habilitações literárias ao nível do 6º ano de escolaridade. A arguida abandonou o sistema formal de ensino antes dos 14 anos de idade para apoiar a avó paterna, sua cuidadora primária, na sequência de um problema de saúde incapacitante. Ainda durante a adolescência, iniciou união de facto com o atual companheiro na casa da avó, na sequência de gravidez do filho mais velho. Trabalhando a partir dessa idade em funções pouco diferenciadas, a arguida ingressou na fábrica metalúrgica onde o pai trabalhava, dedicando-se a esta atividade a maior parte da sua vida adulta, com alguns períodos de desemprego subsidiado. O pai acabou por ficar com a fábrica, mantendo-a como funcionária até ao final de 2022, data a partir da qual se encontra em situação de desemprego. À época da factualidade em apreço nos autos, os rendimentos familiares eram obtidos através da atividade profissional de DD, complementados por contribuições económicas variáveis do filho, que prestava serviços de limpeza de vidros. Desde que está desempregada e o filho preso, os rendimentos provêm do subsídio de desemprego (552 euros) e de trabalhos informais ocasionais na área das limpezas (alegadamente na ordem dos 150 euros). A arguida destacou como despesas fixas mensais a renda da habitação (32 euros) e os serviços de fornecimento de eletricidade (130 euros), água (15 euros) e televisão e comunicações (140 euros). A situação económica foi autoavaliada como difícil, permitindo responder com limitações às despesas correntes e necessidades básicas, pelo que recorrerá quando necessário à ajuda de familiares e amigos. DD descreveu um quotidiano organizado em função das responsabilidades domésticas e familiares, trabalhando sempre que tem oportunidade e visitando o companheiro e o filho regularmente no estabelecimento prisional. O seu projeto de vida passa pela sua reinserção laboral estável, estando a ponderar projeto migratório para a Alemanha, onde vive um irmão, assim que a situação jurídico-penal (sua e dos familiares) fique resolvida. A arguida é trabalhadora, com uma personalidade forte e obstinada. O agregado familiar mantém uma imagem negativa na vizinhança, embora a arguida seja apontada como a menos difícil no contacto interpessoal. A relação com os coarguidos não familiares seria meramente circunstancial, identificando-os como amigos dos filhos. DD teve um confronto anterior com o sistema de administração da justiça penal, por crimes de ofensa à integridade física simples e de ameaça agravada, sofrendo condenação em pena de 160 dias de multa (trânsito em julgado em 09.05.2022). A arguida solicitou a substituição de multa por trabalho, tendo integrado em fevereiro de 2023 a Associação ... para cumprimento das 160 horas de trabalho a favor da comunidade aos sábados. A informação periódica elaborada pela DGRSP em 18.01.2024 deu conta da execução de 147 horas pela arguida, estando a cumprir a medida com assiduidade e adequação. No que concerne aos presentes autos, DD verbalizou consternação relativamente às consequências penais que poderão advir dos autos, em especial relativamente ao filho. Perante condenação, verbalizou disponibilidade para aderir a uma medida de execução na comunidade. A situação jurídico-penal teve um impacto negativo na vida pessoal e familiar da arguida, pelas medidas de coação aplicadas e por ela e a filha estarem a sofrer alegadas ameaças e represálias de proveniências diversas. 68- À data da factualidade subjacente aos presentes autos, BB residia intermitentemente com a companheira (DD, 37 anos, coarguida) e os dois filhos de ambos (AA e EE, 21 e 19 anos, respetivamente, coarguidos) na habitação social titulada pela figura feminina – trata-se de um apartamento camarário de tipologia três, descrito como adequado em termos de condições de habitabilidade e de conforto, inserido em zona residencial de configuração suburbana conotada com problemáticas sociais e criminais. O agregado contaria ainda com a presença frequente da namorada do filho (RR, 27 anos), respetiva filha (MMM, 9 anos) e do neto (NNN, 1 ano). O arguido tem ainda um filho mais novo (OOO, 18 anos), gerado no seio de uma relação externa. As dinâmicas familiares foram caracterizadas como satisfatórias no eixo filioparental, mas instáveis no eixo conjugal, com conflitualidade e separações recorrentes ao longo da história relacional, devido aos comportamentos de infidelidade e de omissão protagonizados pelo arguido. Deste modo, BB ia transitando entre os contextos habitacionais dos agregados materno e constituído. Com o falecimento da ascendente em 2020, o arguido passou a ser o titular do contrato de arrendamento da casa da mãe (morada dos autos), que mantém formalmente como a sua residência – trata-se de um apartamento camarário de tipologia dois inserido em zona residencial de configuração suburbana conotada com problemáticas sociais e criminais. Com habilitações escolares ao nível do 6º ano, BB descreveu uma trajetória laboral irregular e essencialmente marcada por informalidade, destacando um período de trabalho “nas obras do metro” (sic.), algumas ingressões na área da segurança privada e um projeto migratório para a Islândia. A prática de futebol foi assumida pelo arguido como prioritária desde a infância, tendo jogado em vários clubes onde, na idade adulta, passou a receber ajudas de custo, entre 300 e 400 euros mensais. Constituindo formalmente agregado unipessoal, foi recorrendo ao rendimento social de inserção (RSI) em períodos menos favoráveis da sua vida. À data da factualidade em apreço nos autos, o arguido jogava no ... e a trabalhar informalmente, à experiência, num restaurante/bar em Vila Nova de Gaia, sendo ainda beneficiário do RSI. Como despesas fixas mensais, tem a prestação do carro, que pagava com as ajudas de custo do futebol. A sua situação económica mostrava-se suficiente para custear as suas necessidades básicas e despesas correntes, não fazendo contribuições para despesas do agregado constituído. BB assume a sua vida como “muito boa”, baseada na prática desportiva regular (futebol e ginásio), no convívio social com amigos e na participação nas atividades da claque dos “...”, que integra desde 2010. BB foi preso preventivamente em junho de 2022 à ordem do presente processo, dando entrada inicial no estabelecimento prisional ..., do qual foi transferido para o de .... Em janeiro de 2023, foi transferido para o atual estabelecimento prisional, onde não aderiu a outras atividades para além do ginásio e desporto. O arguido tem visitas regulares da família nuclear e alargada e de alguns amigos mais próximos, contando até ao momento com duas sanções disciplinares, a última cumprida em setembro de 2023. A rede informal de suporte de BB é constituída pela companheira, pelos três filhos, pela irmã QQ e por dois grandes amigos, que referencia como de longa data (PPP e QQQ). A relação com os coarguidos não familiares seria meramente circunstancial identificando-os como amigos dos filhos. Os seus projetos de vida em liberdade passam por emigrar para a Alemanha, país onde terá o apoio inicial de um cunhado. BB tem confrontos com o sistema de administração da justiça penal pelo menos desde 2000, por crimes de condução de veículo sem habilitação legal, desobediência, ameaça agravada, injúria agravada e ofensa à integridade física qualificada, sofrendo condenações em medidas não privativas da liberdade. Na última condenação, o arguido teve acompanhamento técnico da DGRSP entre 2019 e 2021 (suspensão da pena com regime de prova), cumprindo minimamente as obrigações judicialmente impostas, embora com manutenção de fraca inserção laboral. BB desvalorizou o seu histórico criminal, circunscrevendo-o a incidentes contingenciais à atividade desportiva e da claque e relacionados com condução sem habilitação legal. No que concerne aos presentes autos, o arguido verbalizou incomodidade com a sua constituição como arguido e expetativa por um desfecho processual que lhe seja favorável. A atual situação jurídico-penal teve um impacto negativo pronunciado na sua vida pessoal, familiar e social, devido principalmente à medida de coação que lhe foi aplicada. 69- No espaço temporal dos factos pelos quais vem acusada, EE residia em apartamento camarário na morada que consta nos autos, sendo o seu agregado familiar composto pelos progenitores/coarguidos (DD, 37 anos de idade; BB, 41 anos de idade) e o irmão/coarguido (AA, 21 anos de idade). A progenitora da arguida é a titular do contrato de arrendamento da habitação, de tipologia 3, com adequadas condições de habitabilidade, inserida no bairro 1..., zona conotada com problemáticas sociais e criminais. À data dos factos a subsistência do agregado familiar era assegurada essencialmente pelos rendimentos da atividade profissional da progenitora como operária fabril, sendo que o irmão da arguida também contribuía, embora sem montante específico, com os rendimentos decorrentes do seu trabalho na área de lavagem/limpeza de vidros em regime de prestação de serviços. O processo socioeducativo de EE decorreu junto do agregado de origem, com envolvimento da bisavó e uma tia, ambas maternas. As dinâmicas intrafamiliares são caracterizadas como positivas e unidas, não obstante a instabilidade na relação dos progenitores por questões associadas a infidelidades por parte da figura paterna, que originaram períodos de rutura e reconciliação e consequente integração intermitente do progenitor no agregado. A arguida tem um irmão consanguíneo de 18 anos de idade, com quem referiu manter um bom relacionamento. Tem como figuras de referência afetiva o progenitor, a bisavó materna e o irmão (AA, coarguido) e embora denote proximidade afetiva com a mãe, responsabiliza-a, de certa forma, pelas divergências com o progenitor devido às suas manifestações de ciúmes. EE teve um percurso escolar com reprovações e desinteresse pelas atividades e matérias escolares, acrescendo que durante a frequência do 7º ano de escolaridade decidiu integrar um curso profissional na área de comércio, que lhe permitiria obter a equivalência ao nível do 9º ano de escolaridade aos 16/17 anos de idade, mas que não concluiu, tendo começado a trabalhar como empregada de andares em unidade hoteleira. A arguida apresenta características de impulsividade. Paralelamente ao percurso escolar, EE praticou a modalidade de MMA (arte marcial mista) desde os 8 anos de idade, tendo desistido em meados de 2021 por desinteresse. Não prosseguiu os estudos devido ao seu objetivo de independência financeira, pelo que começou a trabalhar em 2021 em hotéis, inicialmente na receção e posteriormente como empregada de andares, que constituíram experiências laborais de curta duração. Trabalhou aos 16 anos de idade, nas férias de verão, no atendimento ao público num solário. Posteriormente, trabalhou nos camarotes no Estádio ..., que situou em 2022. Em agosto de 2022 teve uma curta experiência como lojista em centro comercial e durante o mês de setembro de 2022 permaneceu nos Estados Unidos da América junto da madrinha/tia paterna. Em agosto de 2023 EE realizou um curso de 12 horas, design de sobrancelhas e pigmentação, dedicando-se a essa área no salão de cabeleireiro RRR, em regime informal, local onde trabalhou desde os 16 anos de idade, na época de verão. O agregado familiar na atualidade, é constituído pela progenitora, pela arguida, pela namorada do irmão e sobrinho, que desde a prisão preventiva de AA têm permanecido com alguma regularidade no agregado e pelo irmão consanguíneo (OOO, 18 anos de idade, estudante). Apesar deste irmão ter ficado à guarda e cuidados da mãe da arguida e integrado formalmente o agregado, o mesmo tem permanecido maioritariamente em casa da sua progenitora ou da namorada. Atualmente em termos profissionais EE referiu que se desloca ao salão de cabeleireiro quando tem marcações, estimando obter um rendimento mensal médio entre 200 a 300 euros, em regime informal. A arguida pretende um emprego preferencialmente na área das telecomunicações e em particular em call-center, tendo já realizado de duas entrevistas. Os rendimentos que obtém são canalizados para os seus gastos pessoais, colaborando na economia doméstica, mediante as necessidades, contando ainda que apoia economicamente o sobrinho, o progenitor e o irmão. Presentemente, a subsistência do agregado familiar é assegurada pelo subsídio de desemprego da progenitora, no montante mensal de 552 euros, e de rendimentos provenientes de trabalhos de limpeza que a mesma efetua, em regime informal, estimando um rendimento médio mensal de cerca de 150 euros. Foram identificadas como despesas fixas mensais do agregado as relacionadas com a manutenção da habitação, designadamente a renda (31.51 euros), o fornecimento de eletricidade (cerca de 130 euros) e de água (cerca de 15 euros), o serviço tv/net/voz (cerca de 140 euros) estimando-se o gasto médio mensal de cerca de 317 euros. A progenitora avaliou a situação económica do agregado familiar como exigente, recorrendo ao apoio de familiares e de amigos próximos em caso de necessidade. Ao nível da gestão do quotidiano, EE, para além dos trabalhos no salão de cabeleireiro, convive com a família, com a madrinha/tia materna e com as amigas mais próximas, entre as quais destacou a coarguida FF. Para além dos elementos da família, a arguida tem alguns dos coarguidos como amigos. No que concerne a projetos de vida, EE verbalizou que pretende emigrar para os Estados Unidos da América, para junto da outra madrinha/tia paterna, realizar um curso profissional de maquilhagem e inserir-se profissionalmente nessa área. Na deslocação ao meio socio residencial, a arguida e o agregado familiar possuem uma imagem negativa associada ao trato difícil no relacionamento interpessoal. A arguida manifesta inconformismo pela sua situação jurídico-penal, não obstante expressar tranquilidade face ao desfecho do mesmo. Apresenta um discurso centrado no impacto negativo a nível pessoal e familiar pela situação jurídico-penal do progenitor e do irmão, que encara como penosa e angustiante para a família. Expressa ainda ser alvo de ameaças e receia retaliações, tendo alterado as suas rotinas, deixando de frequentar determinados locais públicos, assim como se distanciou de algumas relações de amizade, reportando sintomatologia ansiosa com toma de medicação prescrita. Na sequência do receio suprarreferido, procura um emprego que lhe possibilite um espaço mais reservado, sem contacto presencial com os clientes, diminuindo a probabilidade de poder ser reconhecida. EE não equaciona a possibilidade de condenação. 70- No espaço temporal dos factos pelos quais vem acusado, AA residia em apartamento camarário na rua ..., Entrada ..., Casa ... - Porto, sendo o seu agregado a progenitora/coarguida (DD, 37 anos de idade) e a irmã/coarguida (EE, 19 anos de idade). A relação afetiva com a namorada mostra-se satisfatória, embora exista alguma instabilidade decorrente da diferença de idades, que potencia discordâncias entre ambos. A progenitora do arguido é a titular do contrato de arrendamento da habitação, de tipologia 3, descrito com adequadas condições de habitabilidade, inserida no bairro 1..., zona conotada com problemáticas sociais e criminais. À data dos factos a subsistência do agregado familiar era assegurada essencialmente pelos rendimentos da atividade profissional da progenitora como operária fabril, sendo que o arguido também contribuía, embora sem montante específico, com os rendimentos decorrentes do seu trabalho na área de lavagem/limpeza de vidros em regime de prestação de serviços. Como ocupação dos tempos livres AA praticava futebol no ..., participando diariamente nos treinos e jogos aos fins-de-semana. Fazia parte da claque dos ..., sendo sócio do ... desde criança, acompanhando todos os jogos do clube, convivendo também com os amigos, que conhece desde a infância e em contexto escolar, designadamente alguns dos coarguidos e em particular o coarguido JJ, padrinho do seu filho. O processo socioeducativo de AA decorreu junto do agregado de origem, com envolvimento da bisavó materna e de uma tia materna. As dinâmicas intrafamiliares foram caracterizadas como positivas e unidas, não obstante a instabilidade na relação dos progenitores por questões associadas a infidelidades por parte da figura paterna, que originaram períodos de rutura e reconciliação. O arguido tem um irmão consanguíneo de 18 anos de idade, com quem mantém um bom relacionamento. Os progenitores são as figuras de referência afetiva e educativa do arguido, que se identifica particularmente com a figura paterna, que considera como modelo e pilar da família, não obstante, estabelecer laços afetivos significativos com a figura materna e com a irmã. A instabilidade relacional dos progenitores é sinalizada pelo arguido como um aspeto negativo no seu processo de crescimento, ressalvando que o progenitor se assumiu como uma figura presente na sua vida, que integrava o agregado de forma intermitente. O percurso escolar de AA foi pautado pela inconstância em termos da assiduidade, com registo de reprovações, sanções disciplinares e comportamentos disruptivos, situação que despoletou intervenção ao nível da promoção e proteção, com aplicação de medida de acolhimento residencial em IPSS, assim como também foi alvo de intervenção no âmbito tutelar educativo. Na instituição integrou o sistema de ensino, tendo concluído o 6º ano de escolaridade e, decorrido sensivelmente 10 meses, o reintegrou o agregado familiar de origem, assim como o sistema escolar, realizando um curso profissional na área de “Administração e Comércio”, que concluiu, tendo obtido a equivalência ao 9º ano de escolaridade. AA ainda efetuou inscrição em curso profissional na área de Segurança e Salvamento em Meio Aquático, cuja conclusão lhe permitiria obter a equivalência ao 12º ano de escolaridade, mas que desistiu quando foi convidado por um amigo para trabalhar numa empresa cuja atividade se prendia com a limpeza/lavagem de vidros, o que constituiu a sua primeira experiência profissional. O arguido, passado um mês adquiriu essa empresa, cuja identificação formal refere não se recordar, tendo desenvolvido a atividade de limpeza/lavagem de vidros, com outros dois funcionários, em superfícies comerciais, em regime de prestação de serviços, referindo obter um vencimento mensal de cerca de 800 euros, até ser preso preventivamente à ordem dos presentes autos. Ainda a nível profissional, efetuou alguns serviços de limpezas em hipermercado, aos fins-de-semana, no ano de 2020. Iniciou o consumo de haxixe na fase da adolescência com carácter diário, tendo passado para consumos ocasionais, que manteve até ser preso preventivamente. Consumia bebidas alcoólicas em contexto recreativo, não os avaliando como problemáticos. AA autoavalia-se como uma pessoa revoltada e ansiosa desde criança, tendo beneficiado de acompanhamento pedopsiquiátrico no Hospital 1..., com respetiva terapêutica medicamentosa, até aos 18 anos de idade, o qual, segundo a mãe, abandonou sem alta clínica por sentir vergonha pela natureza do acompanhamento. O arguido foi sinalizado em contexto escolar e encaminhado para a especialidade de pedopsiquiatria por diagnóstico de perturbação de hiperatividade e com défice de atenção. O arguido assume fragilidades pessoais ao nível da gestão das emoções e da tolerância à frustração, sendo que situações que envolvam a sua família e os amigos mais próximos afetam negativamente o seu nervosismo (sic), verbalizando (...) eu tenho surtos, eu apago e não sei o que faço (sic), denotando ainda défices no pensamento consequencial. Anteriormente à reclusão efetuava medicação ansiolítica prescrita por médico privado. No que concerne a projeto de vida, AA pretende reintegrar o agregado familiar e retornar à atividade profissional de lavagem/limpeza de vidros, por considerar ser uma atividade calma e tranquila. Simultaneamente, verbaliza que pretende emigrar por recear eventuais retaliações de terceiros relacionados com a vítima. O arguido e respetivo agregado familiar possuem uma imagem negativa associada ao trato difícil no relacionamento interpessoal. AA beneficiou da aplicação de duas suspensões provisórias do processo, pelos crimes de condução sem habilitação legal e de venda irregular de títulos de ingresso, com acompanhamento pela Equipa Porto Penal 1 desta DGRSP, que cumpriu, tendo pendente o processo nº 21/22.2PASJM do DIAP de S. João da Madeira. No âmbito do presente processo, AA foi preso preventivamente em 10/05/2022 no estabelecimento prisional ..., sendo transferido em 17/05/2022 para o Estabelecimento Prisional instalado junto à Polícia Judiciária ..., onde se encontra na atualidade, assim como o seu progenitor. Em meio prisional AA regista 10 sanções disciplinares, a última das quais datada de 19/12/2023. Não está integrado em atividade estruturada (escolar, formativa ou profissional) e embora esteja inscrito na escola do EP, o arguido manifesta desmotivação/desinteresse na sua frequência. Face ao presente processo, AA embora procure apresentar uma postura conformista, manifesta apreensão e receio face às eventuais consequências penais do mesmo, em particular para si e para o progenitor, expressando sentimentos de revolta pela situação jurídico-penal da figura paterna. O arguido identifica impacto negativo a nível pessoal e familiar pela situação de reclusão e consequente afastamento do seio familiar, designadamente do descendente e a sua ausência no seu processo de crescimento. A situação jurídico-penal de AA tem suscitado preocupação e angústia junto da família, conservando o apoio incondicional dos mesmos. No decurso da prisão preventiva, o arguido tem beneficiado de apoio familiar, essencialmente da namorada, progenitora e irmã, a nível de visitas, contactos telefónicos e apoio financeiro. 71- À data dos factos na origem do presente processo, o arguido JJ permanecia integrado no agregado familiar constituído pelos pais (pai, 61 anos, vigilante; mãe, 59 anos, rececionista), sendo descrita uma dinâmica familiar positiva. Pernoitas alternadamente em casa da namorada. Os pais residem em apartamento que adquiriram com recurso a empréstimo bancário, de tipologia 2+1, que consideram disponibilizar boas condições de habitabilidade, situado em zona periférica da cidade que não é conotada com especial incidência de problemáticas criminais. Por força da atividade laboral dos pais, durante vários anos o arguido no período do dia permanecia a cargo dos avós paternos, tendo frequentado os estabelecimentos de ensino próximos de casa dos mesmos, residentes em bairro social na zona oriental da cidade, onde fez amigos que mantém até ao presente, alguns dos quais coarguidos no presente processo. JJ apresenta como habilitação literária apenas o 9º ano de escolaridade. Abandonou os estudos durante a frequência do último ano de um curso de formação profissional que o habilitaria com o 12º ano, com o objetivo de apoiar economicamente os pais e coincidentemente lhe ter aparecido uma oportunidade de trabalho. JJ praticou, desde os 9 anos, futebol de onze, tendo chegado a integrar equipas de futebol federadas, como foi o caso do ..., ... e o .... Na altura em que começou a trabalhar para além de ter abandonado a frequência escolar, também abandonou a prática de futebol. Iniciou atividade laboral aos 18 anos, tendo durante três anos trabalhado como operador de caixa num espaço comercial, permanecendo desde 13 janeiro de 2021 a trabalhar por conta do grupo A... - E..., S.A., inicialmente como operador de cargas e descargas em horário noturno, tendo passado para a condição de trabalhador efetivo, decorrido um ano. Mudou para a categoria profissional de operador de cargas e recentemente passou a trabalhar em horário diurno, porém, por vezes, alteram-lhe o horário de trabalho. JJ avalia positivamente a sua inserção laboral, auto avaliando-se como um funcionário responsável, disponibilizando-se sempre que é necessário a prestar trabalho extraordinário, apresentando como objetivo a progressão na carreira. Aufere um salário líquido no valor de 919.95€, onde se inclui o cartão de alimentação. Como despesa fixa mensal o arguido indica o contributo para a economia doméstica (200 Euros) e o valor do cartão de alimentação (154 Euros), uma vez que a mãe é a responsável pela preparação das suas refeições. Como despesas pessoais JJ indica a amortização de um crédito referente à compra de um automóvel (147 Euros) e de um crédito pessoal (148 Euros) a que se acresce algum contributo para a economia doméstica de casa da namorada, que não quantificou, mas que refere traduzir-se na comparticipação em algumas despesas com a alimentação, descrevendo uma situação económica que lhe exige gestão criteriosa dos recursos. O arguido mantém um relacionamento de namoro há três anos. Pernoitando maioritariamente em casa da namorada, durante o período do dia desloca-se a casa dos pais com o objetivo de apoiar o pai que se encontra doente. No que respeita aos tempos livres, refere privilegiar a companhia da namorada e as visitas que efetuam em conjunto aos seus pais e mãe da namorada. Informou que desde que ocorreram os factos que estão na origem do presente processo, abandonou a frequência do grupo alargado de pares com quem acompanhava. Segundo referiu, o afastamento do grupo pares já se vinha verificando desde a data dos factos pelos quis está acusado no âmbito do um outro processo (n.º 435/19.5PASTS do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo local Criminal de Santo Tirso - Juiz 2), situação reforçada pela medida de coação de proibição de contactos que foi aplicada no presente processo. JJ tem especial relação com alguns dos coarguidos, nomeadamente com o coarguido AA, sendo o padrinho de um filho deste último. Como projeto de vida o arguido indicou o de estabelecer união de facto com a namorada e de se autonomizarem, assim como vir a habilitar-se com a licença de condução de veículos pesados, como forma de aumentar as alternativas laborais e retomar a prática de futebol de 11, considerando que o atual horário de trabalho lhe permitirá a presença nos treinos. O arguido é visto como tendo promovido alterações importantes no modo de vida desde a sua constituição como arguido no processo supra identificado, destacando a dedicação ao trabalho e à família que passou a evidenciar. É considerado como educado no relacionamento interpessoal, não sendo revisto a assumir comportamentos agressivos ou confrontativos. É tido como assumindo uma atitude educada e cujo comportamento nunca suscitou reparo na vizinhança. Por despacho de 30.06.2017, e por factos enquadrados no crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, o arguido beneficiou do instituto da suspensão provisoria do processo pelo período de 12 meses, sujeita à injunção de prestar 70 horas de serviço socialmente útil, com o acompanhamento por parte de Equipa do Porto penal desta DGRSP. Cumpriu a injunção no período compreendido entre 06.09.2017 a 28.12.2017, de modo que mereceu avaliação positiva por parte da entidade beneficiária do trabalho. Por factos praticados em 06.10.2018, JJ encontra-se acusado pela prática, em coautoria, de um crime de furto qualificado, no âmbito do processo n.º 435/19.5PASTS do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo local Criminal de Santo Tirso - Juiz 2, cuja audiência de julgamento vem sendo adiada. JJ identifica como principal impacto decorrente do presente processo o facto de ter sido constituído arguido, expressado preocupação com as consequências que da mesma podem advir. Refere, ainda, que decorrente da mediatização de que foi alvo o processo, passou a receber mensagens e imagens intimidatórias nas redes sociais, com consequente alteração do seu modo de vida, a par da experimentação de sentimentos de insegurança e ansiedade. Nesta sequência teve necessidade de se socorrer de apoio psicológico, com frequência de consulta da especialidade. A nível familiar o arguido possui um suporte apoiante, não tendo sido prejudicada a sua integração social e profissional, sendo que não revelou neste último contexto a sua atual situação judicial. 72- LL mantém agregado unifamiliar, com o nascimento da filha ocorrido em 18/02/2024, resultado de relacionamento afetivo que durou cerca de um ano, e que cessou no decurso da gestação. A arguida é proveniente de Vila Nova de Famalicão, onde reside a família de origem, a incluir a progenitora, avó materna e tia materna, com quem estabelece relacionamento de proximidade e apoiante, e onde permaneceu temporariamente durante o último trimestre de gestação, de modo a poder beneficiar do apoio destes elementos familiares. No presente, a arguida mantém esse mesmo enquadramento residencial e familiar, ainda que temporário, por força da recente maternidade. Perspetiva o regresso ao concelho de Vila Nova de Gaia, com a descendente, logo que considere reunidas as condições pessoais para retomar a atividade laboral como esteticista. À data dos factos a arguida embora residisse sozinha, mantinha uma relação afetiva, sem coabitação, com o coarguido II, que durou cerca de 2 anos, e que cessou com a reclusão deste, ocorrida em 09/06/2022, à ordem de outro processo, não mantendo desde então qualquer contacto com aquele. Reside em apartamento t2 com condições de habitabilidade, arrendado em seu nome, inserido em contexto residencial urbano, sem associação significativa a problemáticas sociais e que oferece condições de habitabilidade e conforto. A vigência do namoro com o coarguido II foi um dos fatores que terá motivado a deslocação da arguida do seu concelho de origem para o concelho de Vila Nova de Gaia, de modo a consolidar o relacionamento. Tem formação profissional certificada: Cursos profissionais de estética, pestanas, limpeza de rosto, unhas (pés e mãos) obtidos através das empresas F... e G.... A arguida desenvolveu sempre atividade no ramo da estética, em regime informal, tendo adaptado um dos quartos da habitação para gabinete de estética, onde realiza trabalhos desse setor. No presente, não está a exercer, por ter sido mãe recentemente. À data dos factos, a arguida estava laboralmente ativa, no mesmo ramo de atividade (estética), com caráter permanente, ainda que informal. Tem um valor total das despesas/encargos fixos do agregado: 318.16€ referentes a renda (€218.16) e consumos domésticos (€100). Atualmente a arguida não tem rendimento próprio, dependendo integralmente do apoio da família de origem, predominantemente da progenitora, laboralmente ativa como operária fabril, para fazer face às despesas e encargos com as necessidades de subsistência pessoal e familiar, onde se inclui a descendente recém-nascida. A arguida referiu ter sido orientada pelos serviços da segurança social para requerer a prestação social de Rendimento Social de Inserção, bem como a prestação de abono de família, que irá diligenciar. À data dos factos, a arguida apresentava encargos fixos de menor valor e estava laboralmente ativa, auferindo a quantia média mensal variável de €400/€500. LL testemunha quotidiano estruturado em função da atividade laboral e recentemente da maternidade, denotando ajustada integração familiar e sociocomunitária, com aceitação social no meio de residência. Apresenta como referências sociais significativas as de índole familiar, no seu concelho de origem, e sem referência a grupos de pares associados a problemáticas criminais e/ou sociais. No concelho de Vila Nova de Gaia as interações estabelecidas assentam nas relações de natureza laboral. Referente aos coarguidos, LL conhece alguns dos coarguidos na sequência do relacionamento afetivo que teve com II, sem contacto com os mesmos no presente. O presente processo representa o primeiro confronto da arguida com o sistema da administração da justiça penal. LL considera que a sua constituição como arguida tem tido repercussões ao nível pessoal, perante a mediatização e natureza criminal do presente processo, vivenciando com preocupação o desfecho do mesmo, nomeadamente pelas consequências de uma eventual condenação no seu projeto de vida pessoal e familiar, a incluir a recente maternidade. Ao nível familiar, não assinala repercussões decorrentes do presente processo, continuando a beneficiar do apoio do agregado de origem. 73- À data dos factos pelos quais vem acusado, o arguido KK residia na morada constante dos autos, integrando o agregado dos progenitores (53 e 56 anos de idade, ambos feirantes), do qual também faz parte uma irmã (SSS, 26 anos de idade, desempregada), situação que se mantém na atualidade. O relacionamento intrafamiliar é descrito como equilibrado, sendo que o agregado de origem continua, na atualidade, a disponibilizar apoio ao arguido. O arguido acrescentou que, à data dos factos, alternava a sua permanência entre o agregado familiar de origem e o agregado familiar da namorada, onde por vezes pernoitava, residente na rua ..., Porto. Desta relação, que durou cerca de três anos, o arguido tem um descendente (TTT, 1 ano de idade), com quem não mantém atualmente contacto uma vez que a relação com a mãe deste terminou de forma litigiosa. O agregado familiar do arguido reside em habitação social de tipologia 2, descrita com adequadas condições de habitabilidade, situada numa zona da cidade conotada com algumas problemáticas sociais e criminais. KK possui o 6º ano de escolaridade, não apresenta hábitos de trabalho estruturados e estáveis, encontrando-se à data dos factos desempregado, beneficiando da atribuição do rendimento social de inserção. Atualmente refere que desenvolve atividade laboral através de subcontratação informal, por constar no seu registo criminal averbamentos que o impedem de ter licença na plataforma de entrega de refeições e alimentos online, Uber Eats e auxilia os progenitores nas feiras que por vezes realizam. Como rendimento mensal o arguido refere o valor do RSI atribuído, 206,34 euros mensais, o montante semanal auferido na sua atividade informal, 150 euros, o RSI dos progenitores no valor de 356,97 Euros mensais, o valor do RSI da irmã, no valor de 190,89 euros mensais e o que conseguem auferir através das vendas nas feiras, montante que não conseguem quantificar por ser variável. Como despesas fixas mensais, o agregado tem os gastos com a renda da habitação, 10,70 euros, do fornecimento de eletricidade, cerca de 75 euros e da água, cerca de 40 euros. O arguido e progenitora referem que a gestão do orçamento familiar é feita de forma contida para satisfazer as necessidades do agregado. KK ocupa o seu quotidiano no convívio com familiares e amigos, assumindo gostar de frequentar bares e discotecas, referindo que relativamente aos coarguidos apenas tinha relação de proximidade com um deles (II), contando que os restantes eram apenas seus conhecidos. O arguido tem mais um filho (UUU, 7 anos de idade) fruto de uma ligação afetiva que estabeleceu com 23 anos e que perdurou cerca de 5 anos, mantendo um relacionamento próximo com o descendente. O arguido não entrega qualquer quantia a nível da pensão de alimentos aos descendentes que são pagas pelo fundo de garantia devido a menores. Aquele relacionamento terminou de forma conturbada, situação que deu origem à instauração de processo judicial 606/20.1PDVNG, do Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia – Juiz 2. Em contexto sociocomunitário, o arguido é tido como um individuo tranquilo e respeitador, não sendo alvo de qualquer tipo de rejeição. KK verbaliza preocupação, receando as eventuais consequências penais do desenrolar do presente processo, uma vez que regista, desde 2016, diversos contactos com o sistema da justiça penal por crimes de roubo, associação criminosa e furtos, sendo condenado a medidas de execução na comunidade. O arguido não identifica qualquer repercussão negativa advinda da existência do presente processo na sua integração social e familiar, mantendo a este nível um suporte apoiante. 74- À data a que se reportam os factos de que vem acusado no presente processo, o arguido II mantinha residência junto do agregado de origem, constituído pelos progenitores, VVV, reformado por invalidez e WWW, auxiliar no Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto, bem como, pela irmã do arguido, XXX, de 18 anos de idade, estudante. Este núcleo familiar estava domiciliado, tal como atualmente, em bairro camarário da cidade do Porto, “Bairro 2...”, em apartamento de tipologia T4, com adequadas condições de habitabilidade, tratando-se de uma zona residencial de configuração urbana, conotada com problemáticas sociais e criminais. Não obstante a forte ligação afetiva entre todos os elementos do agregado de origem do arguido, os modelos educativos familiares caracterizaram-se pela permissividade e pela fraca supervisão e imposição de regras de conduta e comportamentos pro sociais. O arguido tinha pendente um mandado de detenção, pernoitando, por diversas vezes, em locais alternados, de forma a não ser detetado pelos Órgãos de Policia Criminal (OPC). Mantinha relação afetiva com a coarguida LL, relação essa terminada, entretanto. Detentor do 6º ano de escolaridade e tendo desenvolvido atividade laboral indiferenciada e pouco regular, à data, II desempenhava funções laborais de caracter esporádico nos armazéns do “Mercado ...”, contudo, sem vinculo laboral, o que lhe permitia alguma autonomia financeira. Neste contexto mantinha um quotidiano pouco estruturado, direcionado para o convívio com os seus pares alguns associados a comportamentos pro criminais e para a frequência de espaços de diversão noturna, situação justificada pelo próprio como consequência da sua situação jurídica resultante dos confrontos judiciais que apresenta e que previa a sua iminente detenção e consequente reclusão. Relativamente aos coarguidos, II mantinha relação de proximidade com AA que caracteriza como um amigo de longa data, sendo que por inerência e no decorrer dessa amizade, atendendo ás ligações familiares, conhecia o arguido BB (pai do AA), DD (mãe do AA) e EE (irmã do AA). Os restantes coarguidos conhece-os em contexto social, por frequentarem o mesmo estabelecimento comercial de restauração (café) no “Bairro 3...”. Não tem qualquer ligação com a claque dos “...”. O arguido tem duas descendentes de dois (2) e seis (6) anos de idade de uniões de facto distintas, sendo que à data não mantinha qualquer relacionamento com as progenitoras das descendentes, ainda que, mantendo proximidade afetiva com as menores. II regista um histórico criminal e de comportamentos desviantes significativo, cujo inicio remonta ao ano de 2012, mediante aplicação de medida tutelar educativa, pela qual cumpriu 10 meses de internamento no Centro Educativo .... Mais tarde, entre 2015 e 2020, viria a ser condenado em vários processos, em medidas alternativas á prisão, nomeadamente, penas de prisão substituídas por dias de multa e penas de prisão suspensas na sua execução, pela prática dos crimes de ofensas à integridade física qualificada, furto, furto qualificado, roubo, tráfico de estupefacientes e condução de veículo sem habilitação legal. Em 09.06.2022, II deu entrada no estabelecimento prisional ... à ordem do processo nº 61/18.6SLPRT, condenado a dois (2) anos e seis (6) meses de prisão pela autoria de um crime de furto qualificado. Viu ainda ser-lhe revogada uma pena de um (1) ano e oito (8) meses que se encontrava suspensa na sua execução, a qual se encontra a cumprir atualmente, no Estabelecimento Prisional 1.... Tem ainda o pendente processo, acusado de homicídio qualificado em coautoria. Como principais repercussões da sua situação jurídico-penal, refere os vários transtornos inerentes à privação da liberdade, num discurso onde enfatiza os prejuízos pessoais e familiares. Durante o cumprimento da pena, o arguido vinha mantendo um comportamento tendencialmente adaptado às normas institucionais do sistema que integra, traduzido numa conduta investida na aquisição de competências pessoais e formativas, através da frequência dos programas psicoeducativos “...” e “...” e a frequentar o ensino com vista a obter 9º ano de escolaridade, contudo, registou em 24.09.2023, uma sanção disciplinar, por posse de telemóvel. II mantém o apoio incondicional da família de origem, nomeadamente, progenitores e irmãs, as mais velhas já autonomizadas, bem como, agora, da companheira YYY, mãe da sua descendente mais velha e com a qual reatou relacionamento afetivo e que mantem elevadas expectativas quanto ao breve regresso do arguido a meio livre. 75- À data dos factos pelos quais vem acusada, tal como presentemente FF vive junto do agregado composto pelo progenitor, de 40 anos, operário da construção civil, e irmão, de 21 anos, criador de conteúdos digitais e jogador de futebol. O agregado reside há cerca de 6 anos em apartamento camarário, tipologia 3, descrito como dispondo de condições de habitabilidade, localizado no bairro 4..., zona conotada com residual incidência de problemáticas sociais e criminais. As dinâmicas familiares são retratadas como globalmente positivas e apoiantes, pese embora o progenitor adote uma posição crítica face ao quotidiano atualmente protagonizado pela arguida e pares que esta acompanha. A arguida mantém uma relação positiva e contatos regulares com a progenitora que se encontra presentemente a residir e trabalhar no estrangeiro. FF encontra-se habilitada com o 9º ano de escolaridade. Iniciou atividade laboral aos 18 anos de idade como empregada de limpeza em hotel e em hospital, experiências de curta duração. À data dos factos pelos quais vem acusada, a arguida encontrava-se recentemente integrada como lojista em sapataria, vindo a ser dispensada, após episódio em que terá sido agredida no exercício das suas funções, situação que terá sido reportada ao competente OPC. Após cerca de um ano inativa, integrou-se como empregada de limpeza no Instituto Português do Sangue, durante cerca de 3 meses, encontrando-se desempregada desde há cerca de 2/3 meses. À data dos factos pelos quais vem acusada, FF subsistia dos rendimentos do seu trabalho, reportando contribuir em valor indeterminado para a economia doméstica, igualmente suportada pelos rendimentos do progenitor (prestação do rendimento social de inserção e biscates na área da construção civil) e irmão desta (jogador de futebol e criador de conteúdos digitais). Presentemente, a arguida beneficia da prestação do rendimento social de inserção no valor de 215Euros, beneficiando ainda de rendimentos oscilantes da venda de roupa online, cerca de 150Euros semanais, apresentando como despesas pessoais os encargos com a manutenção do veículo automóvel. O agregado subsiste dos rendimentos dos seus elementos, sobretudo do progenitor. A situação financeira do agregado é modesta, sendo que o progenitor é quem gere a economia familiar, suportada sobretudo nos seus proventos decorrentes da prestação do rendimento social de inserção de que beneficia e nos rendimentos oscilantes dos “biscates” que efetua, com o apoio esporádico dos descendentes apoiarão no pagamento de algumas despesas. O agregado tem como principais despesas fixas mensais os encargos com a renda da habitação, cerca de 20Euros, fornecimento de eletricidade e água, cerca de 180Euros, telecomunicações, cerca de 60Euros e alimentação. FF apresenta um quotidiano desestruturado, ocupando-se com o convívio com as amigas, entre as quais destaca a coarguida EE, e a procura de emprego. O progenitor tem a arguida como uma jovem com “bom coração” (sic.) e responsável, ainda que algo impulsiva. No meio sócio residencial, pese embora não haja relatos de comportamentos desadaptativos naquele contexto, a arguida é conotada com o seu envolvimento em situações de conflito. Sendo este o seu primeiro confronto com o sistema da administração da justiça penal, FF manifesta um impacto negativo significativo ao nível pessoal, familiar e profissional, narrando que a própria e seus familiares têm sido alvo de represálias e ameaças (que terá comunicado ao competente OPC), decorrentes da sua ligação ao presente processo, receando que as mesmas se mantenham, o que afeta o seu normal quotidiano e a aceitação de algumas propostas de trabalho que impliquem atendimento ao público. 76- À data dos factos pelos quais se encontra acusado, GG mantinha idêntica inserção familiar e habitacional à atual. O arguido reside com a progenitora, de 57 anos, empregada de limpeza, e irmão, de 34 anos, assistente operacional em unidade Hospitalar. O núcleo familiar reside há cerca de 15 anos em apartamento camarário, tipologia 3, descrito como tendo condições de habitabilidade, localizado no bairro 5..., zona com moderada incidência de problemáticas sociais e criminais. As dinâmicas familiares são tidas como afetivamente gratificantes e apoiantes. O progenitor do arguido também presta solidariedade ao mesmo, inclusivamente apoiando-o nas despesas decorrentes da sua defesa no presente processo. GG habilitou-se com o 12º ano, através da frequência do curso profissional de Técnico de Instalações Elétricas, que concluiu com cerca de 18 anos de idade. Regista experiência profissional na área de mecânica e limpador de vidros, ambas experiências por alguns meses. À data dos factos pelos quais vem acusado, encontrava-se recentemente desempregado, situação que mantém até à atualidade. Encontra-se inscrito no Instituto de Emprego e Formação Profissional a fazer alguns trabalhos pontuais/residuais na área de mecânica. À data dos factos, assim como presentemente, GG não dispõe de rendimentos próprios, beneficiando do suporte financeiro e habitacional da progenitora. O agregado dispõe de uma situação económica modesta, subsistindo dos rendimentos de trabalho da progenitora (atualmente com incapacidade temporária para o trabalho) e do irmão do arguido, que suportam as despesas fixas mensais decorrentes dos encargos com a renda da habitação, cerca de 39Euros, consumos domésticos (água e eletricidade), cerca de 140Euros, telecomunicações, cerca de 75Euros, e alimentação. Ao nível dos comportamentos aditivos, GG referiu que à data dos factos pelos quais vem acusado mantinha consumos esporádico de canabinoides, que terá abandonado há cerca de um ano sem recurso a acompanhamento médico. À data dos factos o arguido mantinha um quotidiano pouco organizado, ocupando-se com trabalhos pontuais e convívio com amigos, dois dos quais coarguidos no presente processo, JJ e HH. Atualmente ocupa o seu quotidiano primordialmente em casa, na companhia da mãe, e ainda no convívio com alguns amigos e jogos semanais de futebol com estes. Junto do meio sócio- residencial GG foi descrito como adequado e educado. GG apresenta antecedentes criminais por crime de burla, tendo sido condenado em pena de multa substituída por 150 horas de trabalho a favor da comunidade, que de acordo com a avaliação da entidade beneficiária e desta DGRSP cumpriu entre 25.05.2020 e 17.08.2020, de forma adequada. O presente confronto com o sistema da administração da justiça penal é percecionado pelo arguido como tendo significativo impacto negativo ao nível pessoal e familiar, pela angústia sentida. A progenitora assinala considerável alteração no bem-estar do arguido, descrevendo sintomatologia depressiva e ansiosa. 77- À data dos factos descritos nos presentes autos, o arguido CC mantinha-se integrado, desde 24.10.2017, data em que foi colocado em liberdade após o cumprimento da segunda pena de prisão - pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes - no agregado familiar constituído por si, pela companheira, à data vendedora ambulante e empregada de limpeza e pelos dois filhos do casal, então com 17 e 13 anos de idade, estudantes. O núcleo familiar residia, como no presente, na Rua ... – ... – Porto, tratando-se de uma habitação arrendada, de construção antiga, tipologia 2, com precárias condições de habitabilidade, não sendo a zona de residência conotada com problemáticas sociais de relevo. O arguido e respetivo agregado residiam no local desde fevereiro de 2022, uma vez que, aquando a sua libertação, o núcleo familiar vivia no Bairro 6... e posteriormente, após ordem de despejo decorrente do seu envolvimento na prática do crime suprarreferido, residiu provisoriamente no agregado dos pais da companheira, no mesmo bairro social, e, depois, numa habitação arrendada inserida num aglomerado de casas, designado por “ilha” na Travessa ..., zona residencial com fenómenos de exclusão social mas não conotado com práticas de marginalidade. A dinâmica familiar era caracterizada por um bom relacionamento entre os seus elementos. Em termos laborais, CC exercia trabalhos em regime informal na área da construção civil uma vez que havia sofrido um acidente de trabalho que despoletou o seu despedimento da “H...” e o beneficio de subsidio de desemprego, empresa esta, também, da construção civil na qual o mesmo desempenhava funções contratualmente vinculadas no sul de França, condição que lhe permitia usufruir de uma situação económica estável, com um rendimento mensal entre os 2000 a 5000EUR, conforme as horas mensais de trabalho executadas. Neste sentido, para além dos valores variáveis que o arguido auferia pelos referidos trabalhos em regime informal, o agregado sobrevivia, equilibradamente, através do subsídio de desemprego do arguido, no valor de cerca de 800 EUR e dos proventos angariados pela companheira como empregada de limpeza e como vendedora ambulante, assim como, pelo apoio social para ajuda do pagamento da rendada habitação. CC é simpatizante do ..., mas não pertence às claques dos “...”. Não conhecia a vítima, apenas os coarguidos BB e DD seus cunhados, AA e EE seus sobrinhos, com quem não mantém um relacionamento próximo, sendo o quotidiano centrado na atividade laboral e convívio familiar. CC, ainda que detentor de reduzidas habilitações académicas, 5º ano de escolaridade, concluído cerca dos 16 anos de idade, num percurso caracterizado pelo desinvestimento ao nível das aprendizagens curriculares, comportamento desajustado, elevado absentismo e várias retenções, desde cedo se revelou um indivíduo com motivação para o trabalho, tendo evidenciado, tendencialmente, investimento ao nível laboral ao longo da vida. CC regista antecedentes criminais, tendo sido preso pela primeira vez em 2001 e mais tarde em 2013, condenado por crimes de tráfico de estupefacientes agravado. CC deu entrada no Estabelecimento Prisional (E.P.) do Porto em 09.06.2022, à ordem dos presentes autos. Como principais impactos face à sua situação jurídico-penal, o arguido menciona a perda da liberdade, considerando esta situação uma injustiça, bem como choque que causou na família, em especial nos descendentes. Na família, o impacto sentido tem sido gerido com dificuldade por se encontrarem não só numa situação económica precária, beneficiando de subsídios estatais, nomeadamente do rendimento social de inserção, abono de família relativo ao filho mais novo, apoio à renda da habitação e pela ajuda dos irmãos do arguido, em alimentos, assim como por se verem, mais uma vez, privados do convívio com o arguido e percecionarem a presente situação jurídicopenal como injusta. CC encontra-se em regime de segurança, no E.P. 1..., desde 14.11.2023, transferido nesta data do E.P. ..., na sequência de apreensão de vários objetos não autorizados e comportamento agressivo, intimidatório e ameaçador para com elementos da vigilância, aquando da “busca” à sua cela. CC continua a dispor do apoio da companheira e filhos que o visitam com regularidade, os quais mantêm elevadas expectativas quanto ao breve regresso do arguido a meio livre. Dos antecedentes criminais dos arguidos: 78- Não se conhecem condenações anteriores aos arguidos AA, EE, HH, FF e LL. 79- O arguido BB sofreu as seguintes condenações: No processo 25/99.7SFPRT, pela prática em 8/2/1999 de um crime de condução sem habilitação legal, por decisão de 22/11/2002, transitada em julgado em 13/12/2002, a condenação na pena de 75 dias de multa, já extinta; No processo 553/00.3SLPRT, pela prática em 22/7/2000 de um crime de condução sem habilitação legal e de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, por decisão de 3/11/2003, transitada em julgado em 18/11/2003, a condenação na pena única de 200 dias de multa, já extinta; No processo 422/08.9PTPRT, pela prática em 13/3/2008 de um crime de desobediência, de um crime de ameaça e de um crime de injúria agravada, por decisão de 8/4/2008, transitada em julgado em 28/4/2008, a condenação na pena de 280 dias de multa, substituída posteriormente por trabalho comunitário, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, já extintas; No processo 14554/10.0TDPRT, pela prática em 2010 de um crime de falsidade de testemunho, por decisão de 29/3/2012, transitada em julgado em 7/5/2012, a condenação na pena de 150 dias de multa, já extinta; No processo 475/12.5PYLSB, pela prática em 2/3/2012 de um crime de injúria agravada, por decisão de 25/1/2013, transitada em julgado em 16/4/2013, a condenação na pena de 75 dias de multa, já extinta; No processo 29/08.0SFPRT, pela prática em 5/3/2008 de um crime de distribuição irregular de títulos de ingresso na forma tentada, por decisão de 19/6/2013, transitada em julgado em 13/9/2013, a condenação na pena de 180 dias de multa, já extinta; No processo 304/16.0T8FLG, pela prática em 1/9/2013 de um crime de distribuição e venda de títulos de ingresso falsos ou irregulares, por decisão de 17/4/2018, transitada em julgado em 1/10/2018, a condenação na pena de 120 dias de multa, já extinta; No processo 422/17.8PEGDM, pela prática em 2/4/2017 de um crime de ofensa à integridade física qualificada, por decisão de 30/11/2018, transitada em julgado em 6/6/2019, a condenação na pena de 11 meses de prisão, suspensa na execução por 24 meses, com a condição de pagamento da indemnização e proibição de frequência de estádios de futebol durante o período de 11 meses, já extinta. 80- O arguido CC sofreu as seguintes condenações: No processo 108/10.4PEPR, pela prática em 3/9/2010 de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, por decisão de 27/2/2015, transitada em julgado em 9/3/2015, a condenação na pena de 6 anos de prisão, já extinta. 81- O arguido KK sofreu as seguintes condenações: No processo 368/15.4SMPRT, pela prática em 9/5/2015 de dois crimes de roubo na forma tentada e de 2 crimes de roubo, por decisão de 31/5/2017, transitada em julgado em 8/2/2018, a condenação na pena de 2 anos e 9 meses de prisão suspensa na execução pelo mesmo período, já extinta; No processo 145/14.0SLPRT, pela prática em 8/3/2014 de um crime de coação, por decisão de 6/6/2017, transitada em julgado em 6/7/2017, a condenação na pena de 120 dias de multa, já extinta; No processo 15/15.4JACBR, pela prática em 12/4/2015 de um crime de roubo qualificado, por decisão de 24/7/2017, transitada em julgado em 24/8/2017, a condenação na pena de 4 anos e 6 meses de prisão suspensa na execução pelo mesmo período com vigilância e apoio da DGRS, já extinta; No processo 8012/16.6T9PRT, pela prática em 24/5/2016 de um crime de violência depois da subtração, por decisão de 30/10/2017, transitada em julgado em 29/11/2017, a condenação na pena de 1 ano e 4 meses de prisão suspensa na execução pelo mesmo período; No processo 566/20.9GBVNG, pela prática em 8/6/2020 de um crime de desobediência, por decisão de 6/9/2021, transitada em julgado em 11/10/2021, a condenação na pena de 4 meses de prisão suspensa na execução pelo período de 1 ano 82- O arguido JJ sofreu as seguintes condenações: No processo 66/20.7SMPRT, pela prática em 28/1/2020 de um crime de furto qualificado, por decisão de 19/2/2020, transitada em julgado em 15/6/2020, a condenação na pena de 130 dias de multa, já extinta 83- O arguido GG sofreu as seguintes condenações: No processo 806/17.1PFAMD, pela prática em 5/2017 de um crime de burla, por decisão de 5/12/2019, transitada em julgado em 17/1/2020, a condenação na pena de 130 dias de multa, já extinta. 84- A arguida DD sofreu as seguintes condenações: No processo 1391/18.2PAVNG, pela prática em 21/8/2018 de um crime de ameaça agravada e de ofensa à integridade física, por decisão de 31/1/2022, transitada em julgado em 9/5/2022, a condenação na pena única de 160 dias de multa, já extinta. 85- O arguido II sofreu as seguintes condenações: No processo 682/13.3SMPRT, pela prática em 26/9/2013 de um crime de ofensa à integridade física qualificada, por decisão de 8/4/2015, transitada em julgado em 8/5/2015, a condenação na pena de 3 meses de prisão substituída por 90 dias de multa, já extinta; No processo 739/15.6PHMTS, pela prática em 11/6/2015 de um crime de furto, por decisão de 1/2/2016, transitada em julgado em 1/2/2016, a condenação na pena de 60 dias de multa, já extinta; No processo 224/14.3SMPRT, pela prática em 9/6/2013 de dois crimes de roubo na forma tentada e de dois crimes de roubo, por decisão de 19/5/2016, transitada em julgado em 20/6/2016, a condenação na pena de 2 anos e 2 meses de prisão suspensa na execução pelo mesmo período, já extinta; No processo 739/15.6PHMTS, pela prática em 11/6/2015 de um crime de furto, por decisão de 8/11/2016, transitada em julgado em 8/11/2016, a condenação na pena de 60 dias de multa, já extinta; No processo 78/15.2SFPRT, pela prática em 20/10/2015 de um crime de furto qualificado, por decisão de 27/9/2017, transitada em julgado em 27/10/2017, a condenação na pena de 1 ano 8 meses de prisão suspensa na execução por idêntico período. A suspensão da execução da pena de prisão foi revogada, tendo sido declarado perdoado 1 ano da pena; No processo 46/20.2SGPRT, pela prática em 1/6/2020 de um crime de condução sem habilitação legal, por decisão de 3/6/2020, transitada em julgado em 3/7/2020, a condenação na pena de 150 dias de multa, já extinta; No processo 739/15.6PHMTS, pela prática em 11/6/2015 de um crime de furto, por decisão de 1/2/2016, transitada em julgado em 1/2/2016, a condenação na pena de 60 dias de multa, já extinta; No processo 61/18.6SLPRT, pela prática em 10/2/2018 de um crime de furto qualificado, por decisão de 16/12/2020, transitada em julgado em 23/8/2021, a condenação na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, tendo sido declarado perdoado 1 ano de prisão; No processo 65/20.9SGPRT, pela prática em 26/7/2020 de um crime de condução sem habilitação legal, por decisão de 15/10/2020, transitada em julgado em 16/11/2020, a condenação na pena de 7 meses de prisão suspensa na execução pelo período de um ano, já extinta; No processo 42/20.0SGPRT, pela prática em 21/5/2020 de um crime de condução sem habilitação legal, por decisão de 20/10/2020, transitada em julgado em 19/11/2020, a condenação na pena de 150 dias de multa, já extinta; No processo 80/21.5PTPRT, pela prática em 16/3/2021 de um crime de condução sem habilitação legal e de um crime de consumo de estupefacientes, por decisão de 3/11/2021, transitada em julgado em 3/12/2021, a condenação na pena de 9 meses de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade, tendo apena sido declarada perdoada; No processo 702/19.8SMPRT, pela prática em 4/10/2019 de um crime de furto, por decisão de 15/3/2022, transitada em julgado em 27/3/2022, a condenação na pena de 10 meses de prisão, declarada perdoada; No processo 132/20.9SGPRT, pela prática em 29/10/2020 de um crime de condução sem habilitação legal, por decisão de 28/4/2022, transitada em julgado em 24/10/2022, a condenação na pena de 4 meses de prisão.
Factos não provados. Com relevância para a decisão da causa não se provaram quaisquer outros factos, designadamente que: Regressados à cidade do Porto, cerca das 2.00h do dia 8/5/2022, durante os festejos do ..., os arguidos AA, II, JJ, GG, HH, DD e EE também se envolveram em acesa troca de palavras com OO. Já depois de cessada aquela troca de palavras, o arguido AA ao deparar-se com ZZZ, que conhecia a vítima e os arguidos por residir no Bairro 6..., exibiu uma faca à frente de todos os presentes e disse-lhe para avisar o OO que “não estava para brincadeiras”. A arguida EE, assim como QQ, alertaram os arguidos BB e CC para a presença do OO junto ao Estádio ..., inclusivamente tendo sido dito que ele as tinha agredido, o que aquelas sabiam não ser verdade. A arguida DD alertou também o arguido CC, tendo dito a este e ao arguido BB que o OO as tinha agredido. A faca que o arguido AA empunhava e manuseava tinha o comprimento de cerca de 15 a 20 cm. Os arguidos JJ, GG e HH seguiram os arguidos AA e BB e CC na perseguição desenfreada na Alameda .... Quando o arguido BB prendeu OO pelos braços, II, JJ, GG e HH desferiram murros, socos e pontapés em OO. Os arguidos II, JJ, GG, HH presenciaram as duas primeiras facadas do arguido AA. As primeiras facadas dadas pelo arguido AA foram nas costas. A determinado momento, na Alameda, enquanto o agarrava pelos braços, BB disse ao OO “Agora bate-me”. No dia 8/6//2022 o arguido II tinha o bastão extensível identificado nos factos provados. Em data não concretamente apurada do período compreendido entre os dias 8/5/2022 e 24/5/2022, o arguido KK, fazendo uso da rede social Instagram, enviou a ZZZ uma Mensagem escrita, em formato autodestrutivo com o seguinte conteúdo: “juro pelos meus filhos que te vou matar”.
Os arguidos II, JJ, GG e HH, atuaram de forma livre, voluntária e consciente, conjugada e concertadamente com os arguidos o AA, BB e CC nos termos descritos no despacho de pronúncia, querendo tirar a vida OO. O arguido II conhecia as características da arma que detinha, sabendo que a não podia deter, tendo atuado de forma livre, deliberada e consciente. O arguido II sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei. O arguido KK agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei. Ao agir da forma descrita através do envio de mensagem autodestrutiva ao ZZZ, o arguido KK quis amedrontá-lo bem sabendo que a expressão por si proferida era adequada a provocar-lhe medo e inquietação e a prejudicar a sua liberdade de determinação e afazê-lo recear por aquilo que o arguido lhe pudesse vir a fazer no futuro contra a sua vida. OO tinha hábitos de vida saudável, praticando exercício físico diária e regularmente. Tinha uma namorada com quem pretendia constituir família e elaborar projeto de vida comum. Tinha aspirações futuras profissionais de abrir um bar em nome próprio. OO dormiu com a mãe até aos 15/16 anos. A demandante nunca mais voltou a ter a qualidade de cabelo que tinha, tendo o cabelo em constante queda, mais fraco e tendo inclusive “peladas”. Fruto de toda esta situação a Demandante acabou por ser despedida, fruto do facto de ter de ser varias vezes mudada de local de trabalho pela entidade patronal por medo de represálias, face ao mediatismo que estes acontecimentos provocaram. Fruto das agressões de que foi vitima às mãos das arguidas a demandante ficou com a camisola que trazia vestida, na data dos factos, estragada, cujo valor é de 10,00€ (dez euros) bem como as calças de ganga que trajava, no valor de 25,00€ (vinte e cinco euros), tudo no valor de 35,00€ (trinta e cinco euros).
O telemóvel SAMSUNG ... que NN tinha mão à data dos factos ficou totalmente destruído, devido as agressões das arguidas, cujo valor do telemóvel ascende a 269,00€.
Motivação. Da responsabilidade criminal O tribunal formou a convicção com base na prova produzida em audiência de julgamento, analisada de forma conjugada e crítica à luz das regras da experiência comum. Com a prova por declarações de arguidos e demandantes e prova testemunhal, conjugou-se toda a prova pericial e documental constante dos autos, designadamente a indicada na acusação: Pericial: - Relatório n.º ...-NLC de fls. 23 a 89; - Exames de fls. 591 a 593 (relatório de perícia de avaliação do dano corporal da demandante NN), 667/668 (relatório perícia de avaliação do dano corporal do arguido CC), 2408 a 2413 (relatório perícia de avaliação do dano corporal do arguido CC) 1117 a 1145 (reportagem fotográfica dos objetos e vestuário apreendidos aos arguidos – vestuário usado pelos arguidos no dia dos factos), 1719/1720 (perfil genético de zaragatoas subungueais esquerda da vítima OO),1750/1752 (relatório pericial criminalística biológica), 1753 a 1769 (relatório de autópsia), 2095 a 2103 (relatório de exame pericial biológico para deteção de vestígios de sangue – onde, para além do mais, consta que no vestuário do arguido AA (polo, calças e sapatilhas) foi detetado sangue da vítima OO), 2576 a 2578 (relatório perícia de avaliação do dano corporal do arguido CC), 2587 a 2589 (relatório final perícia de avaliação do dano corporal do arguido CC); Documental: - auto de inspeção judiciária de fls. 2 a 11; - auto de visionamento e suporte de fls. 100 a 120 (visionamento das mensagens trocadas entre a vítima OO e a testemunha ZZ; - auto de exame de cadáver de da vítima OO de fls. 130 a 138; - boletim de informação clínica ou circunstancial de fls. 140 a 142; - autos de apreensão de fls. 143 (vestuário e calçado da vítima OO), 144 (vestuário e objetos encontrados na Alameda), 181/182 (apreensão e fotografia da navalha entregue por AAAA), 219/220 (termo de entrega e auto de apreensão do vestuário e calçado usado pelo arguido AA na noite dos factos), 332 (apreensão dos DVD no Estádio 1...), 352 (apreensão de pendrive contendo 3 ficheiros relativos às imagens de videovigilância do Estádio ...), 493 (apreensão de navalha), 1380 a 1386 (apreensão d conteúdo extraído do telemóvel do arguido CC); - relatório de alta de fls. 149 a 150; - reportagem fotográfica de fls. 225 a 231 (do arguido AA e do vestuário usado por si no dia dos factos), 789 a 791 (reportagem efetuada no quarto do arguido GG); - cópia do auto de notícia do nuipc 336/22.0SLPRT de fls. 324 (denúncia apresentada por EE contra OO por factos ocorridos no dia 2/5/2022); - exames de fls. 343 a 344 (dispensa de sigilo de telecomunicações por parte do arguido CC e informação de exame do respetivo telemóvel), 490 a 492 (relatório de exame pericial da navalha apreendida a fls. 493), 769 e 802 (relatório de exame pericial do bastão apreendido); - auto de colheita de amostras de fls. 379, - auto de visionamento de imagens de fls. 381 a 406, 494 a 500, 669 a 677, 1939 a 1956, 2344 a 2373; - auto de fls. 465 a 488 (auto de leitura de conteúdo de aparelho telemóvel do arguido CC); - auto de leitura de conteúdo de aparelho telemóvel de fls. 683 a 685 (chamadas efetuadas e recebidas pelo arguido CC da arguida EE e do arguido BB), 1804 a 1846 (registos telefónicos); - auto de busca e apreensão de fls. 705/706 (arguida DD – vestuário, calçado e telemóvel); 723/724 (arguido CC – vestuário e telemóvel); 736/737 (arguido KK – calçado), 759/760 (arguido II – vestuário calçado e bastão), 780 a 782 (arguido JJ – vestuário e calçado), 788 a 791 (arguido GG – vestuário e soqueira no quarto do mesmo), 854/855 (arguido HH – auto de entrega e apreensão de vestuário e calçado). - fotografias de fls. 761 a 764 (reportagem fotográfica durante a apreensão do bastão); - informação de operadoras telefónicas fls. 1099 a 2001, 2071 a 2075, 2197 a 2199; - documento de fls. 2535 (carta remetida por pessoa identificada como LL, informando ser de sua pertença o bastão apreendido na sua casa). Estando imputadas condutas criminais diversas aos arguidos, a motivação da decisão da matéria de facto foi dividia em cinco partes: uma referente ao crime de homicídio, outra às ofensas, outra à detenção de arma proibida, outra à ameaça e, finalmente, outra referente ao pedido de indemnização civil. ____ Como princípio de análise quanto ao crime de homicídio, dir-se-á que é inequívoca, em função do relatório de autópsia de fls. 1753 a 1769 (conjugado com o boletim de informação clínica de fls. 140 e ss.), a morte de OO no dia 8/5/2022, pelas 3.20horas, em consequência, como consta das conclusões daquele relatório e dos esclarecimentos n.ºs 1 e 2 de fls. 2148/9, das lesões toracoabdominais causadas por instrumento de natureza cortante e corto-prefurante, tal como um instrumento de gume afiado, ou como tal atuando (v.g., faca) que infra se identificam: “Lesão número 1: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, com extremidade superior romba e extremidade inferior indefinida, à qual se associa uma escoriação avermelhada irregular e desidratada com 0,6 por 0,4 cm de maiores dimensões. Esta está localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, apresentando exposição de tecido celular subcutâneo e 2,2 cm de comprimento, estando a sua extremidade superior na linha média e distando 15 cm da fúrcula esternal e 10,8 cm do mamilo direito; Lesão número 2: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo e tecido muscular, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha média clavicular, apresentando 2,9 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 23,3 cm da fúrcula esternal, 11 cm do mamilo direito e 5,3 cm da linha média; Lesão número 3: obliqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido sobre o celular subcutâneo e tecido muscular, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, apresentando 3,5 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 1,3 cm da linha média, 15 cm de la do mamilo esquerdo e 22,5 cm da fúrcula esternal; Lesão número 4: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e a inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e osso, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da fase anterior do hemitórax esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 19,5 cêntimos da fúrcula esternal, 19 cm do mamilo direito e 8 cm da linha média; Lesão número 5: ligeiramente oblíqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e cartilagem costal, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de comprimento, distando a sua extremidade superior 28,5 cm da fúrcula esternal, 22,7 cm do mamilo direito e 8,2 cm da linha média; Lesão número 6: oblíqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo as 2 extremidades angulosas, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, com múltiplos entalhes na porção posterolateral, localizada no flanco esquerdo, apresentando 11,3 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 36,5 cm da fúrcula esternal, 25 cm do mamilo direito e 8,7 cm da linha média; Lesão número 7: horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 17: Horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e sendo e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 18: superficial, horizontal, sendo as extremidades angulosas, tendo a mais medial uma cauda terminal de 3 cm ao nível da linha média e sem exposição de tecidos, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax direito, junto à linha média, apresentando 8 cm de comprimento, distando a extremidade lateral 5 cm da linha média, 19 cm da linha axilar posterior e 31 cm da espinha ilíaca anterosuperior direita”. Estas lesões observadas no hábito externo do corpo de OO, encontram correspondência no hábito interno: “Tórax Nas paredes: Ao nível do tecido celular subcutâneo, sete soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, em correspondência com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha médio clavicular, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; - outra, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da face anterior do hemitórax esquerdo, na linha médio clavicular, em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterior do 1/3 inferior do hemitórax esquerdo, externamente a linha médio clavicular, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterolateral do terço inferior do hemitórax esquerdo, em correspondência com a lesão número 6 do hábito externo; - outra, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, em correspondência com a lesão número 17 do hábito externo. No plano muscular: Quatro soluções de continuidade de bordos regulares e filtrados de sangue, nomeadamente: - uma, localizada nem inserção inferomedial do músculo grande peitoral direito, em correspondência com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, atingindo a inserção inferior do músculo grande peitoral esquerdo, a inserção superior do músculo oblíquo externo à esquerda e os músculos intercostais do quinto espaço intercostal, ao nível da linha médio clavicular à esquerda, em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, na transição dos músculo oblíquo externo para o músculo reto abdominal, à esquerda, junto à inserção dos mesmos, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, com infiltração sanguínea circundante, atingindo a porção lateral do músculo oblíquo externo, à esquerda e os músculos intercostais do oitavo espaço intercostal à esquerda, em correspondência com a lesão número 6 do hábito externo. Infiltração sanguínea do músculo latissimus dorsal à esquerda, na sua camada mais superficial, em correspondência com a lesão número 17 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas direitas: Duas soluções de continuidade, de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, ao nível da inserção esternal da cartilagem do quinto arco costal direito, não transfixiva, em correspondência com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, ao nível da inserção esternal das cartilagens costais do sétimo e oitavo arcos costais, transfixiva, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas esquerdas: Três soluções de continuidade transfixivas, de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do quinto arco costal, em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do oitavo arco costal, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, ao nível do arco anterior da cartilagem costal do oitavo e nono arcos costais, em correspondência com a lesão número 6 do hábito externo. Pericárdio e cavidade pericárdica: Duas lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na face anteromedial do pericárdio, com com 1,8 cm, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, na face anterolateral do pericárdio, com 4 cm de comprimento em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo. Coração: Duas soluções de continuidade lineares de bordos regulares e infiltrados de sangue, transmurais: - uma, na região póstero lateral do ventrículo direito, medindo 2,2 cm de cumprimento na face externa e 3,5 cm de comprimento na face interna, em correspondência com a lesão número 3 do hábito esterno; - outra, na região anterolateral do ventrículo esquerdo, medindo 5 cm de comprimento na face externa e 8,3 cm da face interna, em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Pleura parietal e cavidade pleural esquerda com presença de hemotórax com 1000 cc de volume. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com as lesões números 4,5 e 6 do hábito externo. Diafragma: Três lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na hemicúpula diafragmática direita, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; - outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, pericentimétrica, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo. C- Abdómen: Paredes: Três soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na extremidade superior do músculo reto abdominal direito, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; - outra, na extremidade superior do músculo reto abdominal esquerdo, junto à linha média, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, atingindo a porção lateral inferior dos músculos oblíquo externo, obliquo interno e reto abdominal, à direita, em correspondência com a lesão número 7 do hábito externo. Peritoneu e cavidade peritoneal: Vestígios hemáticos peri-hepáticos. Fígado: Dimensões ligeiramente aumentadas. Contusão ao nível da face diafragmática do lobo esquerdo, medindo 2 cm de maior eixo. Solução de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, praticamente vertical, na face diafragmática do lobo direito, com com 3,5 cm de cumprimento, distando 2 cm do ligamento falciforme, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Parênquima pálido e congestivo. Estômago: Laceração de bordos regulares e infiltrados de sangue, na face do antro pilórico, medindo 1 por 0,7 cm de maiores dimensões, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo.” Além de permitir considerar como assente a ocorrência da morte de OO e a sua causa, o relatório de autópsia permite também asseverar que OO apresentava 6 lesões traumáticas ao nível dos membros superiores (duas no membro superior direito e quatro no membro superior esquerdo) que, pelas suas características, como pela sua localização, são compatíveis com lesões de defesa. Inequívoco é também, como consta do boletim clínico de fls. 140, que a equipa da VMER foi ativada às 2.51h do dia 8/5/2022, tendo chegado ao local onde OO se encontrava pelas 2.55h do mesmo dia, com início imediato de manobras por paragem documentada, desconhecendo-se o tempo de PCR. Assente isto, há que dizer que, atendendo às declarações dos arguidos, designadamente, dos arguidos AA e BB e CC, que negaram, além do mais, a existência de um qualquer acordo no sentido de tirarem a vida à vítima OO, assumindo o primeiro uma única facada, dada pelas costas do lado direito, o apuramento dos factos relativo à morte da vítima resultou de todo o conjunto da prova produzida e constante dos autos. Assim, tendo por certo o facto morte nos termos supra referidos, conjugaram-se: - as declarações dos arguidos, nos termos que infra se dirá relevar, e dos depoimentos testemunhais, cuja análise crítica infra se faz constar; - os fotogramas de fls. 1945 a 1956 extraídos das filmagens constantes do DVD-R com a referência na capa Vídeo CMTV Agressões 2 (identificados nos autos de visionamento de fls. 1945/6) e as próprias filmagens; - os fotogramas de fls. 671 a 677 extraídos das filmagens da câmara E074 entre as 2.34.31h e as 2.35.45h e da câmara M244 entre as 2.35.02h e as 2.36.42h (identificados nos autos de visionamento de fls. 669/70) e as próprias filmagens; - os fotogramas de folhas 385 a 414, extraídos das filmagens da câmara M244 entre as 2.36.25h e as 2.36.53h, da câmara E074 entre as 2.36.57h e as 2.37.45h, da câmara E120 entre as 2.38.37h e as 2.39.20h, da câmara E116 entre as 2.38.53h e as 2.39.40h, da câmara E070 entre as 2.39.24h e as 2.40.15h, da câmara E069 entre as 2. 40. 13 h e as 2. 46. 32 h, da câmara E053 entre as 2.44.39h e as 2.46.00h, da câmara E146 entre as 2.47.57h e as 2.48.32h, da câmara E099 entre as 2.47.58h e as 2.48.36h e da câmara M244 entre as 2.53.53h e as 2.54.40h (identificados nos autos de visionamento de fls. 581 a 584) e as próprias filmagens; - os fotogramas de fls. 2345 a 2372, contendo imagens recolhidas entre as 2.28.48h e as 2.56.32h do dia 8/5/2022, extraídas das câmaras E070M, E145M, E074F, E116M (identificados nos autos de visionamento de fls. 2344 e ss.) e as próprias filmagens; - print de imagens (infografia) que contém, uma síntese das imagens das várias câmaras na linha do tempo (que consta igualmente de suporte informático); - o relatório de exame pericial de fls. 2248 e ss., onde consta a deteção de vestígios de sangue de OO na roupa e calçado apreendidos ao arguido AA e o resultado do exame efetuado às demais peças de vestuário pertencentes aos outros arguidos; - as transcrições das mensagens enviadas constantes de fls. 467 e ss., extraídas com o seu consentimento do telemóvel apreendido ao arguido CC (fls. 472 a 487 - mensagens trocadas entre o arguido CC e um terceiro, e com os arguidos BB e EE, das quais se depreende que o primeiro assume o seu apoio ao conflito com OO e incita à violência) e de fls. 103 e ss. extraídas do telemóvel da testemunha ZZ pelas quais a mesma dialoga com o OO sobre os acontecimentos durante a tarde e sobre a presença do BB no .... A partir destes meios de prova e com recurso a eles e ainda quanto à prova que se produziu quanto aos antecedentes deste acontecimento (designadamente imagens de vídeo imagens Estádio 1..., relativos aos acontecimentos na tarde do dia 7/5/2022, no Estádio 1... - Luz Câmaras 245 e 251) e mensagens acima referidas, pôde construir-se o encadeamento dos factos, nos termos constantes dos factos provados. Previamente à abordagem em concreto das declarações dos arguidos e depoimentos das testemunhas, começar-se-á por dizer que, apesar das dissonâncias ou discordâncias, pode com segurança afirmar-se, por por todos os que aí estiveram o terem confirmado, que na noite de 7 para 8 de maio de 2022, junto ao Estádio ... e na Alameda ..., ocorreu um desentendimento que opôs a vítima OO à família de BB. Comecemos, pois, por analisar as declarações dos arguidos. Como se disse já, à semelhança dos demais arguidos, designadamente dos arguidos BB e CC, o arguido AA negou qualquer intenção de sozinho ou em comum acordo tirar a vida à vítima OO. Confirmou a existência dos conflitos anteriores (no ano novo e na ...) e o desentendimento ocorrido na … entre o seu pai e a vítima, embora tivesse dito que o OO tinha uma faca - o que não se afigura credível, tendo em conta o controlo de entrada que nos estádios se faz e o facto de, ainda que assim tivesse sido, não ter sido apreendida qualquer faca apesar da intervenção da polícia. Quanto ao ocorrido na noite, as suas declarações não mereceram qualquer credibilidade à luz das regras da experiência comum. Em primeiro lugar, o arguido coloca-se na primeira discussão, num diálogo com OO que ninguém confirma; depois, refere que pediu à mãe para chamar o pai para irem em segurança - não se compreendendo que segurança a mais o pai podia dar, até porque acaba por descer as escadas com determinação e sem qualquer problema, visualizando-se, como infra se verá nas câmaras a mesma determinação com que, acompanhado do arguido CC, segue depois em direção à Alameda. O arguido refere depois que viu o OO esfaquear o pai, pelo que foi em seu auxílio e pegando na faca deu uma facada no OO nas costelas do lado direito e fugiu - estas declarações também se não mostraram credíveis, desde logo porque a ser da forma descrita, nenhuma razão existiria para o pânico instalado (a simples agressão com uma facada nos termos assumidos não justificaria a conduta de fuga escondida que se visualiza nas câmaras, conforme infra se verá, nem a dormida em casa da sogra – à luz do normal acontecer, impõe-se a conclusão de que o arguido fugiu da maneira referida porque tinha bem a noção do estado em que tinha deixado a vítima. Acresce que, como resulta da perícia aos vestígios hemáticos, o vestuário do arguido tinha vestígios hemáticos do OO, o que não se compreende na versão deste arguido em que o mesmo disse que apenas desferiu uma faca por trás e nas costas e fugiu. As declarações deste arguido não se afiguraram pois credíveis, apenas relevando, na medida em que assume o vestuário que trajava e se coloca no local, admitindo ter estado com o OO no momento em que este foi agredido. O arguido BB descreveu o contexto em que se relacionou com a vítima, referindo que desde o primeiro contacto que tiveram um mau relacionamento por causa do filho (o arguido AA), tendo-se inclusivamente deslocado ao bairro daquela para amenizar a relação. No que respeita ao ocorrido no Estádio 1... disse que a contenda se iniciou quando, depois de dizer ao OO, quando este entrava pelo túnel, que precisavam falar, o mesmo põe a mão no bolso esquerdo e vai em direção a ele, atirando-o para dentro da bancada e fazendo cair ao chão com ele por cima. Disse ainda que a contenda terminou depois de conseguirem levar o OO para cerca de 10 m de distância. Em virtude desta contenda disse ao filho (o arguido AA) para não se deslocar aos festejos no Estádio .... Esclareceu que apenas se deslocou ao Estádio ... quando a mulher lhe ligou a dizer que o OO estava a ameaçá-la com facas e que o ia matar e que, por isso mesmo, estava com medo. Disse que foi buscar o arguido CC, uma vez que a QQ, mulher deste, estava com a sua mulher. Dirigiram-se ambos ao Estádio ..., onde começou a reunir a família até que, por causa da sua sobrinha, o arguido CC arrancou para a frente com o seu filho, subindo as escadas. Disse que foi atrás e quando chegou lá em cima deslocou-se em direção à Alameda quando apareceu um grupo vindo de cima, tendo trocado agressões com 2 rapazes. Disse ainda que sentiu 2 picadelas nas costas e quando olhou para trás viu o OO com uma faca em cada mão fazendo gestos de um lado para o outro. Nessa altura, refere, tentou fugir para a estrada e aí tropeçou e caiu com o OO que ainda lhe espetou uma faca na mão. Disse que se levantou e fugiu não sabendo o que aconteceu às facas e esclarecendo que ficou sem a camisola preta. Disse que encontrou o arguido KK (que lhe deu uma camisola que pôs na mão) e que andou atrás da família, não mais tendo visto o AA. Por fim, ao passar o ... apareceu o cunhado, o arguido CC, que, em pânico, disse que o OO tinha sido esfaqueado, tendo ao chegar ao bairro visto uma fotografia do mesmo nesse estado. O arguido II disse ser amigo do AA e do OO, embora tenha mais afinidade com o primeiro. Na noite dos festejos encontrou-se com o arguido AA e uns amigos na Praça ..., tendo aquele referido que a mulher estava no ... com o seu filho. Disse que na ... se encontraram com a família e outros amigos do AA, tendo havido um desentendimento com o grupo do OO (o BBBB, o XX, o UU e o OO). O grupo estava em discussão com um elemento feminino do grupo do AA, dizendo o OO que queria o BB. Disse que a polícia interveio e mandou dispersar as pessoas, tendo o grupo do AA descido as escadas em direção ao .... Disse que acompanhou o grupo e que, entretanto, apareceu o BB com o CC que vinham buscar a família. O BB começou a subir as escadas atrás do OO e ele foi ver o que se ia passar, pensando que ia acontecer “porrada”. Entretanto, perdeu-os de vista na ..., tendo visto o KK e uma mulher agredir o ZZZ (ZZZ) debaixo do viaduto. Saltou para o colo do ZZZ para não lhe baterem e tentou acalmá-los. Depois olhou para trás e viu mulheres agarradas umas às outras. Viu também um aglomerado de pessoas onde estava o BB e o BBBB. Aproximou-se para ver ver o que se passava e deparou-se com o OO no chão a meio metro do BB. Entretanto, chegou também o CC que se ajoelhou e pediu para chamar o Inem. O OO estava com os pés para o ... com uma rapariga agarrada à sua cabeça a chorar. Entretanto, veio embora assustado com o que viu - várias facadas no corpo do OO, que o fizeram convencer de que estava morto Esclareceu que estava convencido que apenas ia haver “porrada”. Precisou que estava com uns calções brancos e um casaco branco com as mangas e carapuço preto e o AA com um casaco do Porto, que não viu nenhuma faca na discussão que houve junto à ..., que não viu ninguém dar as facadas, que não recebeu nada do BB quando se aproximou do aglomerado que circundava o OO e que nunca soube que a família do AA tivesse ido à procura da WW (filha do CC). O arguido CC disse que no dia 7 de maio recebeu uma mensagem do BB a dizer que tinha andado a pancada, confirmando o envio da mensagem que consta de folhas 472 e ss. dos autos (designadamente a de fls. 473, querendo dizer com ela que o problema era dele). Mais tarde perguntou-lhe se estava tudo resolvido ao que o BB lhe respondeu afirmativamente. Contudo, disse, a cunhada (que não referiu isso) ligou-lhe à 1 hora da manhã a dizer que o OO estava a fazer mal à mulher e filhos. Adormeceu e, entretanto, o BB bateu-lhe à porta tendo-se ambos dirigido o Estádio .... Aí, quando a mulher lhe disse que a filha tinha ficado para trás, foi a correr atrás dela e quando chega à parte superior e se dirige à beira da paragem na Alameda foi agredido por 2 indivíduos (TT e BBBB). Ficou estendido no chão a ser agredido e quando se levanta vê o OO com um xizato. Foi pela Alameda acima, passando pelo BB que descia com um rapaz, até se aperceber do OO estendido. Após ter questionado sobre a autoria dos factos, perguntou pela filha e após saber que a mesma já tinha ido embora foi para baixo. Passados 2 dias o arguido BB foi para sua casa, tendo-lhes dito que, se andavam à procura deles é porque tinham feito mal e, portanto, não os queria lá. Esclareceu que até chegar lá em cima nunca falou com sobrinho e que nunca viu facas. Esclareceu também que vestia umas calças de fato de treino e uma t’shirt escura. O arguido HH disse que se encontrou com os arguidos GG, KKK, II e AA e familiares deste junto à barraca da .... Em determinado momento reparou que havia uma discussão na parte lateral da barraca com uma mulher, tendo, entretanto, chegada à polícia e colocar todos na zona das escadas. Acompanhou o grupo na descida e lá em baixo o AA cruzou-se com o CC (tendo corrigido em declarações posteriores que nessa altura não viu o BB), momento em que decidem voltar para a festa. Quando chega ao cimo das escadas não vê ninguém, tendo apenas o BB, que ainda não tinha visto, passado por si. Atrás de si vinham KKK e o GG. Subiu a Alameda e pus isso de frente para o cogumelo sem ter chegado às escadas. Ficou aí com o GG e o KKK e a cerca de 3/4 m estava a sua amiga CCCC que, de repente, anuncia que está a haver confusão na parte de cima. Nessa altura olhou para a ambulância e viu as confusões e spotters a correr para a parte central da Alameda. Pegou no GG e fizeram o trajeto para vir embora juntamente com o DDDD. Quando foram intercetados foi-lhe perguntado qual deles era o AA e foi-lhes feita uma revista. Sob da morte do OO quando a mãe o informou de manhã. O arguido GG Disse que estava na festa junto à ... e que depois de chegar o ZZZ vê o OO falar com a QQ, mulher do CC. Nessa altura, a polícia mandou os embora e dispersaram-se. Ia descer as escadas quando vê o AA e o BB a subir, tendo-os seguido. Dirigiu-se para a beira do cogumelo onde viu o HH com a CCCC e, quando aquele disse que estava a haver confusão, foram embora. O arguido KKK disse ter estado a confraternizar com o AA e a família junto à ... E que nessa altura viu a QQ deslocar-se para o lado e estar juntamente com OO e os amigos, após o que na polícia disse para saírem dali. Desceram as escadas, tendo sido dos últimos é chegar lá em baixo, onde os amigos e a família do AA já estão a voltar para trás. Viu também o BB e o CC a subir. Quando chega ao cogumelo já estão os jogadores ser apresentados, tendo ouvido nessa altura o comentário da CCCC no sentido de que estava a haver confusão, tendo pressentido que seria com o AA e a família. Refere que pediu a EE para apagar as fotos para proteger o filho do AA. Finalmente, a arguida DD, depois de descrever o encontro com o OO no bairro deste, disse que só voltou a estar com este no dia dos festejos. Disse que junto a ..., depois de ver o OO nas costas do AA, seu filho, percebeu que a cunhada agarrou no OO e dizia “vou matar o teu irmão”. No decurso da discussão, a polícia puxou uns para baixo e outros para cima, tendo entretanto ligado ao BB a informar que a cunhada e o OO e iam pegar. Desceram as escadas com intenção de ir à esquadra, tendo encontrado os arguidos CC e BB, a quem disse que o OO queria matar. O CC, entretanto, subiu as escadas depois de a QQ dizer que não sabia onde estava a WW, sua filha. Todos foram atrás e andaram pelo meio das pessoas à procura da WW Já estava debaixo do viaduto quando ouve dizer cuidado atrás de ti- vêm 10 a 15 homens (sendo que o ZZZ na ... já havia dito que o OO estava armado). Deu um pontapé ao ZZZ porque ficou furiosa e foi a correr atrás do AA e do BB. Quando chega à ambulância sentiu puxarem os cabelos, ouvindo gritos que diziam ele é meu cunhado. Uma rapariga que não conhecia puxava-lhe os cabelos, como ela também o fez. A EE, por seu turno, estava pegada com uma rapariga loira. O Mark também estava à sua beira e o AA não viu, continuando a tentar saber dele quando voltou para baixo. Quando está a chegar ao metro ouviu dizer que o CC desmaiou, tendo-o visto nessa altura atrás de si a correr com um golpe no braço. Ele dizia que tinha socorrido o rapaz que parecia estar morto e que não sabia quem o tinha feito. Quando estava a chegar ao bloco o filho apareceu desesperado a dizer que estava desgraçado. Quando foi confrontado com a fotografia do OO esfaqueado, o AA disse que não tinha feito aquilo tudo. Esclareceu que vestia umas calças rasgadas umas sapatilhas brancas e uma camisola verde, que o BB vestia umas calças de ganga claras sapatilhas e camisola, que o AA vestia um casaco azul e branco, que o CC vestia um fato de treino e uma camisola escura e a EE um casaco escuro. Como se vê das declarações dos arguidos prestadas em audiência de julgamento, como das prestadas em sede de interrogatório judicial, lidas em julgamento, nenhum dos arguidos esclarece o momento em que concretamente são desferidas as 18 facadas, apenas o arguido AA admitindo o desferimento de uma única, mas sempre invocando uma razão de defesa do arguido BB para o fazer, a qual, como adiante se verá da prova testemunhal, não existiu. Descrevem os momentos anteriores e posteriores, sempre fazendo apelo a agressões sofridas por si e colocando-se na generalidade distantes dos factos, sem nunca esclarecer como afinal são dadas e por quem as 18 facadas. Tais declarações, prestadas por quem tem natural interesse no desfecho do processo, além de não permitirem apurar como ocorre o resultado morte nos termos descritos no relatório de autópsia num contexto em que estavam presentes, são contrariadas quanto à intervenção dos arguidos AA, BB e CC não só pelas testemunhas, como pelos vídeos constantes dos autos, como infra se verá (desde logo, objetivamente se dirá que no vídeo da CMTV 2 se visualiza o arguido BB no local onde o OO ficou caído – assim se contrariando o relato do mesmo de que, após caírem o OO levantou-se e fugiu, enquanto ele foi ter com a família). De resto, também, o próprio arguido II disse que nunca soube que o CC e a família fossem atrás da WW e que os seguiu porque o BB ia atrás do OO e queria ver a “porrada” que se ia passar. Já a origem das lesões do arguido BB que se encontram documentadas nas fotos constantes do telemóvel e reportadas em relatório pericial é, apesar das declarações dos arguidos, desconhecida. Com efeito, o arguido BB diz que as mesmas são o resultado de facadas que o arguido OO lhe deu quando o atacou, mas como se verá da restante prova, não há qualquer ataque por parte da vítima – quando muito, a serem dessa altura (o que se não pode assegurar), as mesmas poderiam ser o resultado inadvertido da luta desenfreada que ocorreu e envolveu várias pessoas, entre as quais o arguido AA que tinha a faca (tal qual o que sucede com o arguido CC que, conforme consta do relatório médico legal, igualmente apresentava lesões que o próprio tentou tratar e cuja origem se desconhece). De resto, note-se que, sendo o OO tão destemido, como os arguidos transmitiram, dificilmente se compreende que numa luta a dois com o arguido BB e tendo o OO uma faca em cada mão, aquele tivesse conseguido fugir sem a intervenção de terceiros (e apenas com os cortes ligeiros tratados em casa que o mesmo alega terem-lhe sido feitos) – as imagens no Estádio 1... são claramente demonstrativas da força do OO e do que o mesmo seria capaz numa luta a dois. Afigurando-se interessadas (numa tentativa de desresponsabilização total por um desfecho que ocorre “às suas mãos” e que não explicam minimamente) e não credíveis, as declarações dos arguidos acabam apenas por permitir concluir que todos estiveram nos festejos do ... à hora dos acontecimentos e nas imediações do OO no momento da agressão, assim como, por permitir concluir que o arguido BB e o OO se envolveram numa contenda no Estádio 1.... Atentemos agora nos depoimentos das testemunhas identificadas nas acusações, por remissão do despacho de pronúncia, e defesa, relativamente às quais não restaram dúvidas ao tribunal que estiveram no local dos acontecimentos a que se referiram individualmente, quer por estar documentado nos vídeos, quer por serem referidas pelos próprios arguidos, quer ainda pelos pormenores que foram relatando, independentemente de a versão que apresentaram ter sido aceite como correspondendo ou não a toda a realidade dos acontecimentos, conforme análise que infra se fará. No Estádio 1... estiveram presentes as testemunhas SS, amigo do OO que conhece de vista os arguidos, AA, BB e CC, AAA AAA, que conhece de vista os arguidos AA, BB e FF, assim como o OO, conforme também referiu nas declarações que prestou em sede de inquérito a fls. 469e ss e que foram lidas ao abrigo do disposto no art. 356 do Código de Processo Penal, YY, que igualmente era amigo do OO e conhece de vista os arguidos BB, AA, DD, EE e JJ, e DDD, que conhece os arguidos BB, AA e II, por frequentarem os mesmos locais e também conhecia o OO. A primeira testemunha disse que mal entraram no Estádio 1... o BB foi logo para cima dele, com o resto dos seus amigos também a pontapear; e ainda que o OO se ficou a rir para o BB e AA, tendo este dito ainda “vou-te matar preto”. A segunda disse, em síntese, como consta das declarações prestadas no inquérito, que viajou para Lisboa com a claque dos ..., que já no Estádio 1..., na bancada junto às bandeiras, presenciou do seu lado direito uma confusão com agressões entre vários indivíduos, entre os quais reconheceu o OO e o arguido BB, que terminou sem mais incidentes, e que naquele dia seria impossível alguém entrar munido com faca no estádio uma vez que foram revistados com grande rigor. A terceira testemunha disse que foi para Lisboa de carro com o OO, que este e o BB mal se viram agarraram-se e davam socos um ao outro, tendo vindo outros amigos do BB, e que depois se separaram e foi cada um para o seu lado. Por fim, a quarta e última testemunha disse que foi ver o jogo ao Estádio 1... tendo ficado em baixo à beira da rede, encostado à direita de quem entra, lugar onde o BB também se encontrava, e que quando se apercebeu do OO, ele já estava envolvido com o BB, estando ambos agarrados e caindo, após o que foram separados, tendo ficado cada um para seu lado. Como se sabe, acontecimentos inesperados e de movimentos rápidos dificultam a memória de quem a eles assiste, ficando na maior parte das vezes apenas a imagem/ideia dos mesmos sem precisão de pormenores, que, consequentemente com dificuldade são lembrados e quantas vezes, com recurso a imagens que se compõem a partir do que se viu. No caso, não restaram dúvidas ao tribunal que estas testemunhas estiveram no local e assistiram ao que se passou, sabendo com segurança transmitir que o arguido BB e o OO se envolveram em luta. Estes depoimentos conjugados com as imagens do vídeo extraído das câmaras 245e 251 dos vídeos agressões … não deixam dúvidas quanto ao sucedido no Estádio 1.... Dando consistência àqueles depoimentos e permitindo perceber o modo como se iniciam as agressões visualiza-se no vídeo da câmara 245 a entrada de OO pelo túnel de acesso às bancadas e o arguido BB a dirigir-se logo àquele em jeito de desafio, aí se iniciando as agressões que as testemunhas referem. O declarado pelo arguido BB não tem apoio no contexto que se visualiza, nem no depoimento da testemunha BBBB, que acompanhava o OO e que disse que mal se viram se agrediram (não se percecionando nenhum pedido do BB para falarem, nem tal tendo sido referido pela testemunha). Esta prova permitiu, assim, considerar como assente o ponto 4. dos factos provados. * Junto à barra cada ... antes da subida para a Alameda estiveram as testemunhas SS, PP, que conhece os arguidos AA, BB e II, a demandante NN e conhecia o OO desde a infância, VV, que conhece o arguido II por ter sido seu vizinho e a demandante NN, UU, que conhece os arguidos de vista e era amigo de OO, YY, que conhece os arguidos BB, AA, DD, EE e JJ, apenas de vista e era amigo do OO, XX, que conhece os arguidos BB, AA, CC e JJ e era vizinho e amigo do OO desde pequeno, ZZZ, que conhece todos os arguidos, à exceção da LL, estando de relações cortadas com aqueles e era amigo do OO, RR, que conhece todos os arguidos e é namorada do AA, QQ, que disse ser irmã do arguido BB e mulher do arguido CC e conhecer todos os outros arguidos, exceto a arguida LL; era amiga do OO, EEEE, que disse ter ido festejar a vitória com a QQ, a DD a RR, a FFFF, o NNN e a GGGG, CCCC, amiga dos arguidos HH, GG, KKK e II, e a demandante NN, que conhece o arguido II, por ser amigo do pai da sua filha. Do conjunto de todos os depoimentos, e sempre tendo por base o que antes se disse a propósito de conflitos inopinados e do relato de quem a eles assiste e, no caso também, da maior ou menor proximidade ao OO ou à família do arguido AA, não restaram dúvidas de que, conforme consta do ponto 5. dos factos provados, o OO e a testemunha QQ se envolveram numa troca de palavras num clima hostil (como todas as testemunhas, nos diversos momentos em que foram aparecendo ou intervindo permitiram concluir – sendo certo que, como é sabido da experiencia, numa discussão cada parte tem a sua razão, valorizando mais uma palavra ou outra conforme o lado em que está (e daí que, o facto de os depoimentos não serem unanimes quanto ao concretamente dito e feito não retire credibilidade ao facto de as testemunhas dizerem que estiveram no local e que presenciaram tal discussão, mas também não permita apurar mais do que em concreto se provou)), tendo a arguida DD, como também consta do ponto 6. dos factos provados alertado o arguido BB para a presença do OO no local – sendo certo que tanto os arguidos BB e DD, como a testemunha QQ fizeram referência a esse telefonema em que se alerta para a presença do OO (sendo que mais nada se apurou com segurança quanto ao concreto teor do telefonema uma vez que os depoimentos são divergentes – enquanto a QQ diz que a arguida DD lhe disse que tinha ligado a avisar que o OO lhe ia bater (à QQ), a própria arguida DD disse que alertou o arguido BB pelo telefone que o OO e a QQ se iam pegar, e o arguido BB disse que mulher ligou a dizer que estava com medo de ir para casa porque o OO a estava a ameaçar com facas). * Sobre o modo como os factos ocorreram até ao desfecho final depuseram as testemunhas SS, ZZ, à data dos factos, namorada de OO, PP, VV, AAA que disse conhecer de vista os arguidos AA, BB e FF., UU, GGG, que disse ser amiga da demandante NN e do arguido II e conhecer os restantes arguidos de vista, TT, BBB, que disse conhecer o arguido BB de vista, CCC, que disse não conhecer nenhum dos intervenientes (arguidos, demandante e vítima), RR, QQ, XX, HHHH, que disse não conhecer os arguidos, DDD, IIII, que disse conhecer os arguidos BB e AA, apenas das redes sociais, ZZZ, CCCC e a demandante NN Vejamos cada uma de per si, atenta a relevância deste momento para o apuramento da autoria das facadas documentadas no relatório de autópsia: 1. Disse a testemunha SS, em síntese, que: - Após a discussão junto à barraca da ... vieram embora, tendo na subida pela Alameda sido surpreendidos com a expressão “cuidado OO”, vindo o arguido AA pelas costas dele (reconheceu-lhe a cara quando olhou para trás); - O OO tentou fugir, dá um passo a direita e foge para a esquerda para o outro lado da Alameda; - O arguido AA foi sempre atrás do lado direito do OO, tendo visto dois movimentos que identificou como facadas, pensa que terão atingido a zona do peito, atenta a posição em que estavam – disse que não viu a faca, mas viu os movimentos quando eles corriam e com a parte lateral da mão (que considerou não serem conciliáveis com murros); - Entretanto, o arguido BB agarrou o OO e começaram todos a bater-lhe, dizendo que eram muitos, mas na escuridão não conseguiu identificar mais ninguém, nem o que em concreto faziam; - Foram andando, com o OO sempre a tentar fugir; - Viu o OO cair e quando chega junto dele já todos estão a fugir, menos o BB que estava à frente a uns bons metros a dizer podem vir os amigos todos; - O arguido CC estava agachado junto ao OO; - Abriu o casaco do OO e viu que estava esfaqueado, tendo dito que “queria ver quem ia pagar por isto”; - Nessa altura quando olhou para o lado, o arguido CC já lá não estava; - Tudo aconteceu, já passava das duas horas. A testemunha depôs com tranquilidade e serenidade, relatando objetivamente o que assistiu e percebeu, esclarecendo, como é natural em situações com esta dinâmica e contexto (em que está escuro e circula muita gente para cima e para baixo, como disse), que foi vendo um bocadinho aqui e um bocadinho ali – daí que seja natural que possa não ter visto ou percecionado tudo o que se passou (como, v.g., a forma como o OO foi em concreto agredido pelo grupo de pessoas que o envolvia depois do gesto que identificou como facadas ou ter visto alguém em cima do BB). O que tudo lhe emprestou credibilidade. 2. Disse a testemunha ZZ, em síntese, que: - Chegou ao ... acompanhada da BBB pelas 2.30h; - Mandou uma foto ao OO a dizer que estava na porta ...; - Desceu a rua que vai dar ao ... por achar que não o iria encontrar no meio de tanta gente e ele não lhe respondeu; - A BBB conhecia o BB que trabalhava ao lado dela e disse-lhe que ele estava ali; - O arguido BB estava acompanhado por muita gente, cerca de 7 ou 8 pessoas; - Disse à BBB que se fossem atrás do BB iam encontrar o OO porque ele estava a incitar as pessoas que estavam com ele e sabia do mau estar existente entre ambos; - Mandou a mensagem ao OO a informá-lo e ele não respondeu, não tendo os dois chegado a comunicar; - Subiram a escadaria a passo rápido e quando chega à Alameda no meio da multidão perdeu-os de vista; - Esperou pela amiga que ficou para trás, tendo depois atravessado a estrada para a zona central da Alameda ... e subiram por aí; - Passaram a ambulância e ficou acima dela em frente à rulote de cima; - Ainda estava à procura do OO, quando o vê do lado da rulote; - Estava a sair do meio da rulote, a colocar o carapuço na cabeça e a ligar-lhe; - Vê montes de pessoas a correr atrás dele, sem conseguir identificar, e gritou OO; - Nessa altura o OO atravessou a estrada para o jardim a correr, tendo-o perdido de vista enquanto ele fazia a travessia por causa da quantidade de pessoas; - Depois o OO andava no jardim a correr de um lado para o outro até cair; - A ele distinguia-o claramente; - Conseguiu perceber que apanharam o OO e que ele tropeçou nas escadas, sendo agarrando pelo arguido BB pelo braço esquerdo; - Estava a um metro do lado direito quando ouviu o arguido BB dizer-lhe “Bateme agora filho da puta que agora não estás em Lisboa” e dar-lhe um soco; - Viu o arguido AA, que conhecia da situação da queima por fotografia, chegar e ficar ao lado do BB; - O arguido AA faz o gesto de sacar algo de lado e tira uma faca de 13 cm com que viu esfaquear uma vez o OO na zona lombar do lado esquerdo, já ele estava no chão; - Conseguiu ver a lâmina da faca; - A faca estava na mão do lado direito; - Depois de ver a primeira facada bloqueou; - Não sabe se estiveram mais pessoas, tendo pegado na cabeça do OO, deitando-a nas suas pernas dela; - Estava também um rapaz agarrado a ele a chorar e um senhor ao lado dele a dizer que era escusado aquilo; - Não se lembra se na altura da facada o arguido BB ainda segurava o braço - O arguido BB estava de t’shirt escura no ...; - Perdeu o OO de vista enquanto ele atravessava a estrada; - Confirmou as mensagens constantes do auto de visionamento de fls. 108 e ss., assim como as mensagens constantes da transcrição junta pelo arguido BB, designadamente a mensagem que enviou ao OO, dizendo “aqui acabas o resto”; - O AA trazia um casaco e um carapuço branco da camisola; - O OO disse-lhe que estava com amigos, mas viu-o sozinho; - Não se consegue recordar se havia mulheres no grupo. A testemunha demonstrou consistência no relato da sucessão de acontecimentos – de resto, consentânea, quer com o teor da mensagem de voz de fls. 118 que mandou ao OO a alertá-lo que eles estavam ali e para ir embora, pressentindo pelo comportamento e ânimo do BB a iminência do ataque, quer com as imagens dos vídeos, onde a mesma é vista a seguir o grupo até à Alameda (o que demonstra o conhecimento direto da testemunha sobre o que relatou, certo também que logo a seguir à subida da escadaria admite ter perdido de vista os arguidos). Revelando também seriedade no depoimento, a testemunha assume que, apesar de ter visto o OO ao lado da roulotte, não viu o que se passou na travessia da estrada por causa da quantidade de pessoas, só o voltando a ver na parte central. É certo que a testemunha demonstrou alguma confusão quanto ao vestuário do arguido AA, falando num carapuço azul ou branco e terminando dizendo que era branco. Todavia, tal não é decisivo para retirar credibilidade e consistência à testemunha: a mesma admitiu a dúvida sobre o facto e a verdade é que tal pode mesmo ter sido uma sua convicção subjetiva – note-se que a testemunha disse que já tinha visto uma fotografia do arguido, sendo capaz de o reconhecer e o mesmo vestia um casaco azul com uma faixa larga e branca que pode ter motivado a sua convicção (de resto, quer do relato de outras testemunhas, quer do vídeo da CMTV2 resulta claro e que o arguido AA esteve no local onde o OO ficou). E não se diga que a testemunha não estava no local porque as demais testemunhas a não identificam. Note-se que se tratou de um momento de grande perturbação e transtorno, em que as pessoas estavam e não estavam ou estavam em momentos diferentes e que a presença da testemunha no local era um mero pormenor acessório. De resto, o próprio arguido II refere que viu uma rapariga agarrada à cabeça do OO. Acresce que a testemunha JJJJ, Agente da PSP que se deslocou ao local identificou de imediato as testemunhas que se encontravam aí e que mostraram ter conhecimento do sucedido, entre ela se encontrando a testemunha ZZ, como consta de fls. 2 e 3. 3. Disse a testemunha PP, em síntese, que: - Após a discussão na ... deixou o OO; - Ficou 2 /3 minutos no local quando viu o arguido BB a correr para cima com pessoas atrás dele; - Explicou que foi atrás porque sabia que tinha havido uma confusão no Estádio 1...; - Foram logo atrás até debaixo do viaduto; - O arguido BB estava sem t’shirt em cima do passeio e ouviu-o dizer “ele está aqui”; - O arguido BB correu para o lado da estrada; - Viu o OO na faixa de rodagem e alguém a atirar-se para os pés do OO, fazendo-o cair; - O arguido BB chegou quando o OO já estava no chão;
- Quando chegou junto deles, agarrou o arguido BB pela barriga e, quando assim estava, foi agredido por alguém; - Depois o II começou em agressões com ele e largou-o quando a mulher lhe pediu; - Viu o OO sair de gatas e perde a noção do que está a acontecer e, de repente, toda a gente desaparece e fica só com o II; - Nessa altura viu a NN ser agredida pela DD, FF e outra pessoa: socos e pontapés e vê um homem dar-lhe um pontapé na boca; - Foi à beira dela e aí foi também agredido; - Depois foi toda a gente embora e nunca mais viu o OO; - Finamente, desde a ... até tudo estar terminado demorou cerca de 20 minutos; nunca viu nenhuma faca; quanto aos motivos pelos quais o II o atacou referiu que pensa que foi por estar a agarrar o BB, tratando-se apenas de conclusão sua; - Esteve com a NN no dia a seguir e ela não abria um olho e tinha peladas; - Via-se que o queixo e olho estavam magoados, tendo as lesões tido impacto em termos de trabalho; - A NN queixava-se de dores; - A NN era o sustento da família: ela, a filha e a mãe; - Vive preocupada com o mal que possam fazer à filha. A testemunha depôs com tranquilidade, respondendo serena e objetivamente às questões que lhe foram colocadas e com as hesitações próprias de quem está a ser questionado acerca de factos dinâmicos e ocorridos há cerca de 2 anos. A credibilidade que o seu depoimento assim mereceu, tendo em conta o que se disse, não se mostrou por qualquer forma afetada pelo relacionamento de amizade não muito profunda com o OO. 4. Disse a testemunha VV, em síntese, que: - Depois da confusão na ..., viu o BB a vir do mesmo sitio de onde veio o OO; - Ela, o namorado (a testemunha PP) e a amiga seguiram-no; - Debaixo do viaduto encontraram a GGG, que estava com o II, e com quem a NN ficou a falar;
- Quando olha para o lado vê o PP a subir a estrada em direção a uma confusão e foi atrás dele; - Quando chega vê o PP a puxar o arguido BB, que estava em cima do OO, estando outra pessoa a segurar os pés dele; - O arguido II e o PP envolveram-se os dois; - Depois não viu mais o OO nem o arguido BB; - Pediu ao arguido II que largasse o PP e ele largou; - De seguida o PP gritou “olha a NN” e vê-a estendida a levar pontapés e puxões de cabelos da EE, da FF e da DD (a GGG é que as identificou); - O PP foi ao meio e pediu que a largassem, mas ainda o acertaram; - A demandante está nervosa com o processo, não dormindo bem. A testemunha demonstrou serenidade e tranquilidade na exposição do que viu, mostrando honestidade quando ao ser-lhe perguntada a razão pela qual o arguido II entrou em luta com o PP disse não o poder dizer (só podendo afirmar o que em concreto viu) e ao dizer não saber como é que o OO saiu do local. A serenidade e tranquilidade referidas emprestaram a necessária credibilidade à testemunha. 5- Disse a testemunha AAA, em síntese, que: - Subiu até uma rulote no passeio do lado direito da Alameda de quem sobe; - Chegou com um colega (FFF) e pediu duas cervejas; - Ouviu gritar “sai da frente”, viu o OO a fugir e, quando estava a tentar passar no meio da multidão para ver o que se passava viu os arguidos AA e BB e outras pessoas à volta do OO, o primeiro com uma faca na mão; - O OO vinha a subir e quando o viu ele dirigiu-se para o jardim; - Os arguidos AA e BB vêm a subir também; - O OO atravessa a estrada até jardim e passam à frente da ambulância; - Ele vai igualmente para o jardim; - Tem umas escadinhas e eles criaram uma roda: os arguidos BB, AA e outros; - O OO anda ali a tentar defender-se e cai para trás nas escadas não consegue perceber porquê; - Enquanto o OO andava o AA gesticulava com uma faca, esclarecendo que diz isso porque viu uma lamina;
- Viu o AA espetar a faca uma vez no peito do OO e logo a seguir vai embora; - Ainda viu alguém dar um pontapé na cabeça do OO, mas não sabe quem foi; - O arguido BB disse-lhe que também tinha sido esfaqueado pelo OO na zona da anca; - Acha que foi o primeiro a chegar; - O BB estava com uma camisola escura; - Não viu o BB agredir ninguém. Dentro do contexto em que os factos ocorreram e tendo em consideração a surpresa que os mesmos constituíram para a testemunha que se encontrava festejar, a mesma relatou com serenidade a forma como os observou, confirmando aquilo que já havia sido dito em sede de inquérito – sendo que já nas declarações que então prestou a fls. 429 e foram lidas ao abrigo do disposto no art. 356 do Código de processo Penal, disse que viu o arguido AA fazer um gesto de esfaqueamento de cima para baixo com um pequeno objeto na mão e que apesar de não conseguir descortinar a sua natureza, não teve dúvidas pelo movimento que era uma faca. Do mesmo modo agora disse ser uma faca porque viu uma lâmina. Uma e outra coisa não estão em contradição e antes se complementam (o gesto e a lamina teriam feito a testemunha compreender que estava perante uma faca – sendo que nem no inquérito nem em julgamento a mesma teve duvidas do que se tratava). Quanto ao vestuário do arguido BB, o mesmo não foi claro na explicação da divergência, mas tal não contende com a credibilidade da testemunha, quando é certo que tal se reveste de um pormenor suscetível de ser esquecido ou cuja memória pode ser perturbada depois de 2 anos com tanta especulação. 6- Disse a testemunha UU, em síntese, que: - Depois da discussão na ..., onde estavam cerca de dez pessoas: SS, BBBB, ZZZ, TT e XX) voltaram para o mesmo sítio e, passado um bocado, foram embora; - Foram em direção à Alameda pela direita; - Iam na faixa de rodagem, mas junto ao passeio do lado direito; - Estavam a subir quando o OO os viu a vir da esquerda antes da ambulância; - O OO começou a correr e é nessa altura, quando olha para a esquerda, que os vê; - O OO correu para a esquerda e para cima, indo eles atrás dele; - Apanharam-no na zona da ambulância e começaram a bater-lhe; - Viu os arguidos BB, AA e CC; - Estava mais gente mas não identificou; - Estão em cima dele e ele só consegue perceber que estão a agredi-lo, não conseguindo dizer como; - Depois vê o OO a fugir para o jardim, tendo eles ficado no mesmo sítio; - Quando chega junto do OO só estavam os arguidos BB e CC; - O arguido BB estava a bater-lhe com chutos e dizia que podiam vir os amigos; - Viu também o arguido AA fugir para baixo e de seguida o BB, que estava sem camisola, também foi embora; - O arguido CC ficou por último; - Viu o AA com algo na mão, mas não viu o que era. As pequenas inexatidões relativamente às declarações que prestadas pela testemunha em sede de inquérito a fls. 447 a 449 (lidas ao abrigo do disposto no art. 356 do Código de Processo Penal) não comprometem a ideia geral das perseguições e agressões, sendo que quanto a estas, apesar de a testemunha agora dizer que todos agrediam, continua sem saber identificar o como e quem eram os outros todos. Não sendo as inexatidões referentes a aspetos relevantes, nem havendo dúvidas sobre a ocorrência do acontecimento e nem se vislumbrando interesse particular da testemunha no desfecho do processo, não deixou a testemunha de merecer credibilidade, contribuindo com o seu depoimento para a descoberta da verdade. 7 - Disse a testemunha GGG, em síntese, que: - Estava com a NN no viaduto e a confusão já estava a começar; - Começaram a subir, tendo perdido a NN; - Quando a voltou a ver ela já estava a ser agredida; - O II, que tinha estado consigo, entretanto seguiu o seu caminho; - Foi separar a NN e depois apareceu a VV o PP e mais pessoas (homens e mulheres); - Puxavam cabelos à NN; - A NN estava de pé e foi ao chão; - Quanto à identificação das agressoras, disse que transmitiu à NN o que lhe parecia. Tratou-se de um depoimento curto sem grande relevo quanto à descrição dos factos, mas que denuncia algum pejo na apresentação da realidade: na verdade, ninguém vai imputar um facto desta natureza a determinadas pessoas, quando não tem a certeza de que o seja. Não se afigurou, por isso, um depoimento livre – antes parecendo que a testemunha se apresentava receosa na denúncia. Daí que, apesar do depoimento, conjugando este com o da testemunha VV e com as declarações da demandante se conclua que a testemunha efetivamente disse à demandante quem foram as pessoas que a agrediram e que conhecia de vista. 8- Disse a testemunha TT, em síntese, que: - Depois da contenda na ... foram à Alameda e alguém foi às rulotes do lado direto; - Ouviu gritar “saiam da frente” e olhou para o lado esquerdo; - Antes da ambulância o OO é alcançado, tendo o arguido CC agarrado nas pernas do OO enquanto o BB lhe dava murros na cabeça; - Conseguiu puxar o OO, tendo o BB dito “eles que venham”; - O OO conseguiu gatinhar e fugir; - Entretanto, o arguido CC levantou-se e deu-lhe um soco, deixando-o tonto; - Quando recuperou do soco, foi em direção ao OO para o socorrer; - Já no jardim vê o AA vir de cima e espetar uma faca nas costelas do lado esquerdo do OO que cai; - De seguida o arguido AA foge com outro indivíduo sem camisola e com tatuagens no peito e uma faca também em direção ao metro; - O arguido BB, entretanto, foge também; - A única pessoa que ficou para trás foi o arguido CC que dizia que não fez nada, mas o SS (amigo da testemunha) disse não fizeste nada, mas alguém vai ter de responder por isto; - Viu o metal das facas perfeitamente; - O SS e o UU chegaram quase ao mesmo tempo que ele junto do OO e o arguido CC depois; A testemunha depôs com objetividade, repetindo com segurança e espontaneidade o seu depoimento. Assumiu que se dizem diversas coisas, mas ele, sendo conhecido das duas partes e não tendo outro interesse no desfecho que não o de ajudar a responsabilizar quem atuou, demonstrou isenção e credibilidade (tanto que nos limites do conhecimento que tinha com o OO admitiu que o mesmo também era reguila e tinha problemas na discoteca). Quanto às discrepâncias relativamente às declarações prestadas em sede de inquérito a fls. 454 e ss. (lidas nos termos do disposto no art. 356 do Código de Processo Penal), e concretamente quanto ao conhecimento de mensagens enviadas pelo BB, esclareceu que provavelmente se exprimiu mal ou foi mal entendido quando as prestou uma vez que só teve conhecimento do que aí refere após os factos e quanto aos pontapés dados pelo BB, esclareceu que na altura tinha a memória mais fresca – a exaltação da testemunha durante o confronto com as declarações não foi de molde a descredibilizar a testemunha, percebendo-se claramente a perturbação por estarem a colocar em causa o seu relato que assumiu não estar tão fresco como quando prestou declarações em inquérito. 9- Disse a testemunha BBB, em síntese, que: - A ZZ tinha-lhe mostrado uma foto do OO sem lhe dizer que a mesma era namorada do OO; - Chegaram ao ... cerca das 2.30/40h e estiveram lá um bocado e desceram para a beira do ...; - Junto a ..., quando iam chamar o uber, olhou e viu o BB que conhece de vista da praia onde trabalhava; - Ela já lhe tinha dito que o OO tinha tido um conflito com o BB; - A VV disse-lhe que se calhar ele estava à procura do OO e para irem atrás dele para o encontrar; - A VV começou a correr e subiu umas escadas; - Correu atrás dela para não a perder de vista; - Contornaram o estádio e passaram o viaduto para irem ter ao lado direito da Alameda de quem sobe no passeio; - Depois passaram para o lado esquerdo para o jardim e escadas; - Quando atravessou a VV foi para o mais para o meio da confusão e ela ficou para trás; - Ouviam-se berros e muita gente a correr; - Quando andava à procura da VV viu o pé de uma pessoa a tropeçar no degrau (depois do que aconteceu supôs que fosse o do OO) a tropeçar; - Depois já só viu a VV próxima do corpo; - Recuou e ficou mais atrás próxima do passeio; - Viu pessoas em confronto físico e pessoas que tentavam separar; - Recorda-se da policia ir ter com ela. A testemunha prestou um depoimento muito limitado, não descrevendo nenhum comportamento relevante que permita apurar o modo como os factos ocorreram, sabendo apenas dizer que havia muita confusão refugiou-se na falta de memória. 10- Disse a testemunha CCC, em síntese, que: - Tinham o carro estacionado perto do ...; - Ficaram por baixo do viaduto parara para ouvir as declarações do KKKK, ficando com A alameda nas costas; - Ouviu uma voz feminina a gritar e olhou, mas não viu nada; - Depois começou a ver confusão, um rapaz a subir a Alameda e muita confusão de pessoas a sair debaixo dos prédios e um grupo atrás do rapaz; - Viu que uns rapazes (três) o agarraram e batiam-lhe enquanto ele estava em pé e outros tentavam separar; - Dessas três pessoas, duas agarravam e uma de capuz escuro agredia mais; - O rapaz caiu no chão e ainda lhe deram pontapés; - Depois cerca 10 ou 20 pessoas fugiram; A testemunha, demonstrando não ter qualquer interesse no desfecho até por não conhecer qualquer quer das pessoas, revelou espontaneidade, relatando o que viu sem conseguir identificar ninguém. 11- Disse a testemunha RR, em síntese, que: - Depois de a sogra chamar o grupo de policias que mandaram dispersar após a discussão na ..., o grupo deles desceu as escadas do ..., tendo deixado de ver o OO; - Foi a ultima a chegar e viu o CC e a QQ discutir poe causa da WW - Tornaram a subir à procura da WW, filha do arguido CC e da QQ; - Ficaram por baixo do viaduto ela, os arguidos CC, DD, AA e BB e o FFF; - Ao descerem para o ... encontraram o OO com um grupo de 8/9 pessoas, indo aquele atrás do AA e começando à pancada; - A pancada começou ao lado da ambulância, caindo o AA e o BB no chão; - Os confrontos saíram da estrada e foram para o jardim; - Quando foi procurar o AA, o II estava à porrada com um rapaz; - Começaram a descer para vir embora; - O BB mostrou um corte; - A DD estava a ser agarrada pelos cabelos; - Um homem dizia separa, que elas estão a agarrar-se; - Pegou na DD para vir embora e vieram: ela os arguidos BB a FF e a EE; - Ao chegar ao viaduto chegaram à beira deles os arguidos II e o KK; - Fizeram o caminho descendo até ao metro e quando chegaram às escadas do fundo do metro viram o arguido CC que caiu no chão; - Nunca viu o AA com uma faca; - 5/6 pessoas andaram à pancada, existindo 3/4 focos de conflitos: o arguido CC está com 2 homens em cima dele e o arguido II também está esfaqueado; - Os amigos do OO estavam em confusão; - Foram embora para o bairro – os arguidos BB, CC, QQ, DD, EE, FF e o FFF; - À entrada do bairro e mal desceram, encontraram o arguido AA que começa a chorar e a dizer que ele ia matar o meu pai; - Passado 5 minutos aparece uma rapariga de cabelos castanhos compridos e mostrou uma foto do OO esfaqueado tendo o arguido AA ficado em pânico e dito que não fez aquilo; - Foram para casa dela dormir e ficaram na casa da mãe; - De manhã quando acordaram viram uma notícia a dizer que o OO tinha falecido; - Foram para casa da tia do AA, viram as imagens do OO e ficaram confusas porque o arguido AA disse que deu uma facada; - O arguido AA estava com o casaco e quando lhe perguntaram ela disse que poderia estar em casa; - Não viu o OO com nenhuma faca; - Foram ao encontro do arguido BB para irem embora e só soube do telefonema mais tarde; - Encontraram o arguido BB e depois apareceu o arguido CC e voltaram para trás à procura da WW. - Não é na estrada que o arguido AA dá uma facada; - O arguido BB tinha um corte na mão e outro na zona lombar e trazia t’shirt para estancar o sangue; - A arguida DD andava aflita à procura do filho e queria saber o que se tinha passado; - Perdeu a arguida EE de vista, não a tendo visto agredir ninguém; - O BB também ficou a dormir na casa da QQ no dia a seguir por causa de uns disparos; - O ZZZ é o leva e trás – é mentiroso; - O arguido CC estava à pancada com dois amigos do OO; - Estava transtornado e tinha uma facada no braço; Esta testemunha, namorada do arguido AA nada esclarecendo quanto à origem das facadas no OO, limitou-se a fazer referência num discurso atropelado às confusões que existiram e a dizer que o motivo do regresso foi a procura da WW com quem nunca mais se preocuparam – o que, como se disse já, não tem correspondência com as imagens do vídeo extraído das câmaras, como infra se verá, onde se visualiza o encontro entre os arguidos AA, BB e CC, que, de modo determinado e sem paragem prosseguem o caminho. 12- Disse a testemunha QQ, em síntese, que: - Foi com a filha WW para perto do estádio ainda de dia, tendo o marido, o arguido CC, ficado em casa; - Estava com uns amigas perto do estádio e quando a DD chegou e foi com ela para o lado da ...; - Sabia que tinha havido confusões e estava aborrecida porque o CC nunca a tinha defendido; - Depois da confusão, a arguida DD disse-lhe que tinha ligado ao irmão e para o arguido BB, dizendo que o OO lhe ia bater; - Já depois de estarem em baixo, voltam a subir porque o CC chegou e vai a correr à procura da filha; - Ela fugiu e foi por outro lado, tendo-lhe uma pessoa dito que a filha tinha ido embora com umas amigas; - Quando estava no meio das escadas vê o irmão, o arguido BB, com uma camisola na mão a dizer que tinha sido esfaqueado; - Quando vê o arguido CC, ele estava em pânico e, com as mãos na cabeça, perguntava quem fez isto; - No dia a seguir os arguidos BB e DD foram para sua casa porque diziam que estavam a ser ameaçados; - O arguido BB só queria namoradas nunca bateu em ninguém, para além do episódio do árbitro; - Na confusão junto à ... estavam várias pessoas com o OO. Esta testemunha, além de confirmar o que consigo se passou junto à ..., nada viu quanto aos desentendimentos ocorrido entre os arguidos e a vítima OO, sendo nessa medida, pouco relevante o seu contributo; 13- Disse a testemunha XX, em síntese, que: - Após a discussão na ..., ficou muito atrás, tendo em determinada altura visto um vulto de pessoas a correr do lado esquerdo para o lado direito, em que se incluía o arguido BB, uma pessoa de camisola azul e o arguido CC; - Quando olhou viu muita gente a agarrar o OO que, entretanto, desapareceu no meio da multidão; - Viu também movimentos de braço que lhe pareciam de esfaqueamento; - Segurou o UU que queria ir para a confusão e fugiu em direção ao estádio; - Depois voltou para a zona central da Alameda pela estrada, altura em que o OO já estava esfaqueado no chão com uma pessoa a exibir-se; - Quando se abeirou, estava o seu amigo SS a assistir o OO; - Identificou uma pessoa de camisola azul, os arguidos BB, CC, KKK, uma pessoa com uma tatuagem no pescoço. BB estava sem camisola e o arguido AA com uma camisola azul; - Depois de segurar o UU para ele não ir para a confusão nunca mais o viu (referiu que o UU nunca esteve em frente à vítima, percebendo-se, contudo, que o que o mesmo quis dizer é que nunca mais o viu). A testemunha demonstrou algum nervosismo – claramente demonstrando o receio que disse ter tido quando pela primeira vez prestou declarações (apesar de ter dito que neste momento o não tem, o referido estado de nervoso denunciou o desconforto no depoimento, causando alguma perturbação no relato de pormenores, v.g., quando referiu que o UU nunca esteve em frente à vítima, parece perceber-se, contudo, que o que o mesmo quer dizer é que nunca mais o viu no estado de tensão criado, como também disse, o que não significa que o identificado UU não tivesse estado efetivamente junto à vítima). Não obstante, na generalidade, mostrou-se coerente na sequência dos factos, tendo em consideração o momento de tensão. 14- Disse a testemunha HHHH, em síntese, que: Esteve na festa e por volta das 2 h foi atrás dos caixotes do lixo fazer necessidades. Depois desceu pela zona ajardinada e vê um grupo de jovens a fugir e um rapaz de casaco preto que dizia “bazai”, estando um rapaz no chão. Estavam lá pessoas junto do rapaz caído, mas não conhecia ninguém. A filha que estava com ele disse-lhe que viu um rapaz a dar uma “patada” na parte da cabeça. Tratou-se de um depoimento curto e sem pormenores, em que a testemunha acaba por referir que, em concretos viu uma fuga e um rapaz no chão. 15- Disse a testemunha DDD, em síntese, que: Foi aos festejos no Porto com quatro ou cinco pessoas, e estava encostado à rulote quando se apercebeu do OO a correr para cima e a cair de frente. Ele e o LLLL foram buscar auxílio; Tratou-se de um depoimento curto e parco em pormenores, em que a testemunha apenas se limita a dizer que junto a uma rulote em que se encontrava viu o OO correr, tendo ido buscar auxílio. 16- Disse a testemunha IIII, em síntese, que: - Foi para a Alameda e ficou do lado direito de quem sobe antes do viaduto, em cima do passeio; - Os festejos terminaram e vinha com dois familiares quando cruzou com o arguido BB que estava parado debaixo do viaduto; - O arguido BB estava com o filho e pensa que com a filha; - Quando se virou já só viu o arguido BB a ir no sentido ascendente; - Quando as coisas começaram a acalmar viu cerca de ou 5 pessoas a correr de forma que lhe pareceu aflita enquanto subia a Alameda para ir para o carro; - Os indivíduos que corriam estavam vestidos de t’shirt; - Viu uma pessoa caída no chão e muita gente em volta; - Não viu nessa altura o BB junto ao corpo, nem em qualquer outro lado. A testemunha depôs de forma tranquila, relatando os factos que viu de forma desinteressada relativamente aos mesmos e ao desfecho do processo. 17- Disse a testemunha ZZZ, em síntese, que: - Passado uns minutos da discussão na ..., o OO recebeu uma mensagem e disse vamos embora para cima; - Foram para a beira da Alameda e já debaixo da ponte e ouviu “olha aí olha aí”; - O arguido KK dá-lhe dois socos nesse momento e o arguido II saltou para o seu colo e disse ao ZZZ não, altura em que a arguida DD lhe dá um pontapé na barriga; - Viu depois o arguido KK a ir para o pé do OO e os arguidos KKK, o GG, o BB e o HH em forma de meia lua a dar porrada no OO na faixa de rodagem; - O OO fugiu para a Alameda e nessa altura vê o arguido AA a espetar uma faca no abdómen do lado esquerdo do OO que estava de pé; - O arguido BB deu dois socos ao OO e ele cai um bocado à frente das escadas; - Nessa altura viu todos ali: o GG o HH e o JJ que batiam no OO com socos; - O arguido II chegou com ele;
- Viu o arguido CC já com o OO no chão em pânico; - Os arguidos KK e II estavam vestidos de igual, estando o último com uma meia calça; - Quando o OO estava no chão alguém lhe deu um pontapé; - O arguido KK mandou-lhe uma mensagem em que o ameaçava que lhe batia, não se recordando se alguma vez a exibiu a alguém. Pese embora o relato feito pela testemunha, a verdade é que as contradições verificadas relativamente às declarações prestadas em sede de inquérito a fls. 455 e ss., lidas nos termos do disposto no art. 356 do Código de Processo Penal, tornaram pouco consistente o depoimento, designadamente na concreta identificação das pessoas que na zona ajardinada viu agredir – em sede de inquérito disse que foram todos os arguidos, incluindo o II que na zona ajardinada agrediam o OO, altura processual em que também não refere que o último saltou para o seu colo quando foi agredido, como disse em julgamento, quando em julgamento disse que o arguido II esteve sempre consigo, tendo-o protegido do KK dizendo-lhe “ao ZZZ não”; em sede de inquérito disse que quando o OO estava a ser agredido pelos demais arguidos, o BB agarrava-o como se estivesse a fazer uma chave de braço, tendo-o depois largado e ele caído para trás, quando em julgamento disse que o arguido BB deu dois socos ao OO e ele cai um bocado à frente das escadas. Depoimentos tão pormenorizados em que se verificam contradições relativamente a factos incompatíveis, mostram-se adequados a fragilizar um depoimento, ficando sem saber-se em que versão acreditar, certo que não foi dada uma explicação aceitável para a contradição. Acresce que mesmo o modo como refere as agressões se mostra de difícil execução. Já quanto à ameaça, disse em inquérito que as ameaças foram por intermédio de terceiros enquanto em julgamento disse que foi por mensagem no instagram que já não tem. Conquanto refira que receava o que lhe pudesse acontecer, como também consta do inquérito, e se admita como possível que continua a recear), o certo é que tal, embora possa ser uma razão para semelhantes contradições, torna o depoimento inconsistente e imprestável para a formação de uma convicção segura. 18- Disse a testemunha YY, em síntese, que: - Ficaram cerca de 5 minutos perto do local onde já estava a apresentar os jogadores, tendo sido, entretanto, opção da maioria ir embora por causa das confusões; - Foram por ali acima, uns pela estrada e outros pelo passeio; - Ia pelo passeio mais junto aos edifícios com o SS, o UU e o KK, enquanto o OO ia com uma rapariga pela estrada; - Ouviu gritos e quando olha já vê o AA a espetar uma faca tipo cozinha ao OO na parte de baixo do corpo; - Quando o AA espeta a faca no OO, este estava a voltar-se para ele; - O OO foge para o lado esquerdo para o jardim, tendo o AA ido atrás dele a correr com faca na mão, seguido de outras pessoas; - Ficaram bloqueados e quando chegaram já estava o OO esfaqueado no chão; - O arguido CC agarrava o corpo do OO; - O arguido BB estava sem camisola e com as mãos cheias de sangue e estavam os arguidos II ( – que estava sem camisola) e KK a fugir; - No corpo do OO também já havia sangue; - Estava lá mais gente que não consegue identificar; - Depois de chegarem os arguidos BB e CC começaram a correr também. Tratou-se de um depoimento objetivo e seguro, cuja apreciação tem de ter em consideração o tempo já decorrido, a dinâmica, surpresa, violência e rapidez dos factos – circunstâncias que justificam alguma confusão na identificação de pormenores pouco expressivos como sejam a roupa que as pessoas trajavam, concretamente quanto ao arguido II (admite-se como possível e seguro que a testemunha tenha confundido ou deturpado a memória de um facto tão pouco relevante no contexto, tanto mais que havia outras pessoas que se encontravam de corpo nu). 19- Disse a testemunha CCCC, em síntese, que: - Depois da discussão na ... desceram as escadas em direção ao Metro (ajudou a descer com o carrinho); - Voltaram para trás porque os amigos estavam a subir; - Quando voltaram a subir a escadaria passaram a ... atravessaram em direção as escadas do alameda e ficaram debaixo do viaduto; - Durante esse período de tempo ficou a falar com amigas de trabalho; - O HH, o GG e o JJ ficaram à beira mas um pouco afastados;
- De repente, olha para trás e já vê uma grande confusão de mulheres junto da ambulância que não percebeu, nem conseguiu identificar; - O HH estava ao seu lado dela; - O GG disse para irem embora pela direita pelo o lado oposto ao ...; - O HH e os amigos foram à frente, tendo ela encontrado o irmão junto de quem parou; - Quando retomou o caminho para baixo o HH e os amigos estavam a ser abordados pela policia na descida; - Fez o resto do percurso sempre com o HH, tendo-o levado ao carro dele; - No vídeo em que sobe as escadas identifica-se, explicando que correu como os outros e porque os outros correram; - Identifica-se também com o HH e a irmã a caminhar no passeio. Tratou-se de um depoimento tranquilo, cuja credibilidade não mereceu reparo. Identificou-se nos vídeos e nas fotografias, esclarecendo o contexto, designadamente o motivo pelo qual refere que também subiu a correr. 20- Disse a demandante NN, em síntese, que: - Aquando da discussão entre o OO e a QQ (que não conhecia e cujo nome soube depois) foram buscar o OO e colocaram-no no meio da confusão, para ajudar; - O OO estava com dois rapazes que o empurraram (tiraram-no dali); - O OO foi embora e nunca mais o viu; - Entretanto, regressaram para o muro; - O grupinho manteve-se por ali (uns 7 ou 8); - De repente vê todos a correr para cima; - O PP quis ir ver o que se passava e, 15 minutos depois deles, foram a andar para cima em direção ao viaduto; - Subiram em direção à alameda e, por baixo do viaduto, encontrou a GGG, que estava a conversar com o arguido II; - Enquanto estavam todos a conversar começou tudo a correr outra vez; - Viu um homem de t’shirt escura de manga que estava na ponta do viaduto (era o BB: muito entroncado chamou-lhe a atenção); - De repente vê esse mesmo homem passar por trás já sem camisola; - Continuou com a GGG e quando olha já o PP estava em cima desse homem; - Elas (EE e DD, disse lhe mais tarde a GGG ao telefone quem eram) estavam a ir para cima do PP e ela disse calma que só está a tentar separar; - Uma delas tinha cabelo preto e uma camisola verde e a outra tinha cabelo loiro; - Foram logo as duas para cima dela; - Puxaram-lhe o cabelo na parte lateral direita atrás; - Lembra-se de estar deitada no chão e depois pessoas que estavam na festa e de uma senhora dizer que estava com o pulso fraco; - Sentiu um chuto por uma pessoa que não identificou. Não sabe se estava de pé ou deitada; - Lembra-se de gritar na ambulância pela filha; - O OO estava caído no lugar onde estava o BB e o PP; - O PP agarrava o BB por trás e o BB estava por cima do corpo do OO; - Na cabeça do lado direito tinha duas marcas de um bico de uma faca. - Ficou com uma cicatriz no nariz, uma na testa, o cabelo mais fraco (cai na zona do puxão); - Tem vergonha das cicatrizes; - Foi despedida porque disseram que fazia má figura por causa das cicatrizes; - Deixou de sair à noite a pé, só anda de carro e não anda sozinha por ter medo; - Ficou com medo porque vive num bairro social e lá muita gente conhece os arguidos; - Sentiu muitas dores e ainda hoje sente na parte da sobrancelha; - Era feliz e hoje em dia nem mãe consegue ser direito; - Está de baixa há mais de dois meses; - Acorda várias vezes à noite com os gritos e está medicada; - Esteve de baixa 15 dias; - Não voltou a frequentar mais estes eventos; - Quando estava ser agredida ficou com receio de perder a vida; - Vestia uma camisola branca e umas calças; - Perdeu o telemóvel no meio da confusão; - O PP era amigo do OO há alguns anos; - Não se recorda como estava vestido o OO; - Estariam à volta de 50 pessoas; - A entidade patronal enviou-lhe uma carta pelo que se tinha passado; - O dente é passível de reparação, mas ainda não o pôs; - Esteve pelo menos duas horas no muro. Pese embora o interesse que naturalmente está associado à sua qualidade de demandante, as suas declarações afiguraram-se espontâneas e sentidas quanto à descrição dos acontecimentos, não sendo de olvidar que a testemunha nenhum relacionamento, sequer de amizade, tinha com a vítima OO. Sendo normal neste contexto de festa, confusão e conflito que as pessoas tenham a sua própria perceção do tempo e de pormenores, que são a sua convicção, nem sempre absolutamente coincidentes com os demais, tal não retira a credibilidade quando, no âmbito de um depoimento espontâneo, se consegue obter uma imagem global que se concilia ou mostra congruente com os demais depoimentos, independentemente de pormenores que possam não ser relatados do mesmo modo, como foi o caso, v.g. quanto ao momento da .... Sobre estes factos depuseram ainda as seguintes testemunhas, que, sendo bombeiros e agentes da PSP descreveram de forma desinteressada o que no local em que se encontravam se passou. - MMMM, agente da PSP que estando a fazer o policiamento dos festejos, disse ter visto o AA a descer a Alameda pela direita e em passo de corrida, trazendo no braço uma peça de roupa escura (de tal modo que logo suspeitou que pudesse ter a ver com a intervenção dos spotters); - NNNN, agente da PSP que estava com a testemunha MMMM, que disse que viram o AA numa esquina a olhar para baixo; - HHH, que, sendo bombeiro e não conhecendo qualquer dos intervenientes, disse que estavam parados e estavam a avaliar uma vítima quando começaram a abanar a ambulância e que nessa altura o colega andou um bocadinho. Disse ainda que o médico disse para fechar as portas que estava a haver pancadaria e que então foi à janela e viu uma rapariga ser agredida por três mulheres: era agarrada pelos cabelos, davam pontapés e batiam com a cabeça na ambulância e ainda havia pessoas que batiam na ambulância. Finalmente, disse que saíram e foram diretos para o hospital e que ao sair ouviu dizer que estava um homem no chão que tinha levado umas facadas, mas não viu. - III, bombeiro da ambulância, que com relevância disse que, de um momento para o outro, se juntaram pessoas ao pé da ambulância, que começaram a bater e a dar socos e a tentar abri-la. Viu uma mulher a ser agredida por outras que batiam com a cabeça dela na ambulância. Disse que na estrada à frente da ambulância também havia uma confusão em que se agarravam uns aos outros, havendo um que estava sem camisola. Finalmente disse que antes de saírem daquele local, os contendores desapareceram para a parte dos arbustos. - JJJ, bombeira que estava no lugar do pendura, disse que viram dois senhores à luta na frente da ambulância, enquanto na lateral uma senhora também estava a ser agredida pelos cabelos. Os dois senhores entraram para dentro do jardim e não conseguiram ver mais nada, sendo que um deles estava de tronco nu e outro tinha uma camisola com carapuço. - JJJJ, Chefe da PSP, a exercer funções na 1ª Divisão, disse que estava na Alameda ... quando cerca de 10 indivíduos correram na sua direção deles. Disse também que os intercetaram e que eles disseram que estavam assustados porque estava a haver confusão na Alameda (sendo a linguagem corporal própria de quem estava assustado. Disse depois viu um individuo no chão com sangue e várias pessoas à volta, tendose isolado o local. Nessa altura várias pessoas (sete) mencionaram que tinha havido um desaguisado e que tinha sido o AA a desferir facadas no corpo do OO, tendo essas pessoas sido isoladas e encaminhadas para preservação da prova – conforme se identificam no auto de notícia de fls. 12. Finalmente, quanto a estes factos, despuseram ainda as testemunhas: OOOO, Inspetor Chefe da PJ OOOO, que teve intervenção e confirmou que participou na detenção do AA, referindo que nessa altura recolheram roupas e o telemóvel dele, da mulher e da filha. Confirmou também ter participado na busca à casa do BB e DD de fls. 705/706.
PPPP, Inspetor que titulou o processo, e que disse que se dirigiu ao local, tendo efetuado a inspeção judiciária, inspeções, exame ao cadáver; disse que efetuou igualmente o visionamento de imagens, obtendo a infografia efetuado pelo LPC junta aos autos, e elaborou o relatório final. Disse que participou na busca domiciliária do arguido KK – conforme auto supra identificado em julgamento alguns vídeos, fazendo a respetiva descrição. Uma última nota apenas para esclarecer que, sem grande relevância porque a prova produzida já mencionada se bastou, depôs a testemunha QQQQ, dizendo que entregou seu telefone à RR porque o AA teria levado o dela e depôs a testemunha RRRR dizendo que mais tarde a filha encontrou a navalha de fls. 182 na parte relvada da alameda – o que também, em concreto, é inconsequente porquanto se desconhece a origem e a propriedade da navalha, que também não tinha quaisquer vestígios. Igualmente irrelevante se mostrou o depoimento da testemunha SSSS, namorado da arguida FF – certo que o mesmo não transmitiu o conhecimento de quaisquer factos relevantes para o apuramento do ocorrido. Vejamos agora como se conjuga esta prova com a demais produzida nos autos, tendo em consideração sempre o que inicialmente se disse já, no sentido de que é indesmentível que a morte de OO (causada pelo conjunto das lesões toraco-abdominais) se dá na sequência das agressões perpetradas desde o momento em que ocorre a luta na faixa de rodagem até ao momento em que caí nas escadas na zona central da Alameda. Tendo presente que os depoimentos têm sempre de ser encarados como tentativa de reprodução/reconstituição de um acontecimento inesperado, dinâmico, fugaz em cada momento e traumatizante e dessa forma conjugados, daquilo que é seguro e não contraditório, pode dizer-se com base inter-coerência dos depoimentos das testemunhas referidas (com exclusão de ZZZ que, disse-se já, não foi suficientemente consistente e, consequentemente, credível, de RR, cujo depoimento se mostrou atrapalhado e sem qualquer contributo para a descoberta da verdade, relatando uma versão que nem sequer coincide com a dos arguidos e da testemunha QQ que nada viu na parte superior das escadas) que: - na sequência da discussão junto à barraca da ... desceram as escadas em direção ao ... os arguidos AA e DD e as testemunhas QQ e RR e que, logo de seguida, tornaram a subir os mesmos arguidos e ainda os arguidos BB e CC e as mesmas testemunhas; - que em determinada altura o OO e os seus amigos decidiram subir a Alameda, pelo lado direito, e que de repente um grupo de indivíduos surge atrás do OO, que começa a fugir para cima e para a esquerda em direção à zona central, sendo alcançado primeiro pelo arguido AA que lhe dá pelo menos duas facadas no lado direito (como referiu a testemunha SS – que refere a existência de dois movimentos conciliáveis com isso que terão atingido a zona do peito e depois pelo resto do grupo, sendo agarrado pelas pernas pelo arguido CC e pelos braços pelo arguido BB (com referiu a testemunha TT), começando a ser agredido também por outros indivíduos, que as testemunhas não identificaram em concreto (e sendo certo que o depoimento da testemunha ZZZ não mereceu credibilidade); - que o OO ainda conseguiu rastejar e fugir para a zona central, sendo sempre perseguido pelos arguidos AA e BB e outros indivíduos, e atingido por uma facada na zona lombar do lado esquerdo (como referiram as testemunhas ZZ e TT), tendo caído na parte de cimento junto a umas escadas), onde ainda levou um pontapé do BB. Visualizando as filmagens e os fotogramas e filmagens anteriormente referidos, observa-se que: Câmara E070: 2.28.11h – 2.38.55h (correspondente às imagens de fls. 2545 a 2547 e 2355): a vítima (que se distingue pelo seu tom moreno e vestuário, cuja reportagem fotográfica consta dos autos) desloca-se até junto da bola, onde permanece visualizando o telemóvel, até ir embora. Câmara E074: 2.34.31h – 2.34.58h (correspondente às imagens de fls. 671 a 673): Os arguidos AA (fls. 427: 2.34.31h casaco azul com uma faixa branca longitudinal, calças e sapatilhas escuras), II (fls. 422: 2.34.43h sweat branca com capuz preto, calções brancos, leggings pretas e sapatilhas brancas), HH (fls. 552: 2.34.51h sweatshirt preta com lista branca nas mangas, calças de ganga e sapatilhas pretas com listas brancas), JJ (fls. 556: 2.35.04h t’shirt clara, calças escuras e uma pochete a tiracolo), GG Costa (fls. 553: 2.35.02h casaco, caças e sapatilhas escuras), DD (fls. 443 2.35.14h cabelo escuro preso t’shirt verde, calças de ganga claras e rasgadas e sapatilhas brancas – sendo que a própria admitiu estar vestida dessa forma), descem as escadas em direção ao metro, visualizando-se ainda as arguidas EE e FF (2.34.58h): a primeira, cabelo escuro, casaco preto, calças de ganga e sapatilhas brancas e pretas e a segunda, cabelo loiro, blusão escuro, calças de ganga e sapatilhas pretas e brancas); M244: 2.35.01h – 2.36.25h (correspondente às imagens de fls. 385 e 386 e 674 a 677): visualizam-se a caminhar em direção ao ..., após a descida das escadas, por ordem: os arguidos AA (destacando-se à frente), II, HH, FF e EE (juntas com um terceiro indivíduo com chapéu azul do ...) e a DD, bem como o caminho de regresso, liderado pelos arguidos AA e agora também CC (calças pelos joelhos, t’shirt verde com dizeres em cor branca à frente e sapatilhas pretas com o símbolo da Nike) que se cruzam com a arguida DD (agora com um casaco preto por cima da t’sirt verde e carteira a tiracolo) ao minuto 2.36.34h. Visualizam-se também todos os elementos do grupo e ainda o arguido BB cuja visualização se inicia ao minuto 2.36.27 (t’shirt e calças pretas e sapatilhas brancas). Finalmente, visualizam-se as duas testemunhas ZZ (namorada da vítima) e BBB (que bem se visualizam a correr atrás ao minuto 2.36.50, falando a primeira ao telefone). Câmara E145M: 2.35.45 – 2.35.59h (correspondente às imagens de fls. 2347 a 238): o arguido AA, seguido do arguido II encontra-se com os arguidos CC, que segue à frente e BB, retomando o caminho de volta. Câmara E074: 2.36.57h – 2.37.45h (correspondente às imagens de fls. 387 a 389 fotogramas 5 a 14): Os arguidos CC e AA sobem à frente as escadas que dão acesso à Alameda, sendo seguidos pela testemunha QQ, pelos arguidos HH, GG, JJ, BB, DD, FF e EE e, mais atrás, pelas testemunhas ZZ e BBB. Câmaras E120: 2.38.37h – 2.39.20h e E116: 2.38.53h – 2.39.40h (correspondente às imagens de fls. 389/92): Onde se conseguem distinguir os arguidos AA e CC à frente, caminhando atrás os arguidos BB, KKK e
II continuando a caminhar frente às roulottes, e ainda as testemunhas ZZ e BBB. Câmara E070: 2.39.22h – 2.40.15h (correspondente de fls. 389 a 392): Distinguem-se os arguidos AA e CC a atravessar a estrada em direção ao ... e mais atrás os arguidos BB e DD ao seu lado e testemunhas ZZ e BBB. Câmara E069: 2.40.13h – 2.46.32h (imagens de fls. 393/4): Observa-se o movimento do grupo, liderado pelo arguido AA que se distingue pelo casaco e o grupo pelo ritmo de acompanhamento entre a multidão junto ao ...; observa-se ainda o arguido AA, seguido de um conjunto de indivíduos a dirigir-se para o lado oposto, juntando-se debaixo da ponte, onde, apesar da dificuldade o casaco azul e branco do arguido AA se continua a distinguir; observa-se de seguida a deslocação do arguido AA, sempre identificado pelo casaco azul e branco, com outros indivíduos que não se conseguem identificar em concreto no encalço em direção ao lado oposto da estrada, visualizando-se de seguida o retorno ao lado esquerdo de quem sobe e um confronto em luta junto à ambulância, vendo-se pelas 2.43.04h pela última vez nesse confronto a mancha correspondente ao padrão do casaco do arguido AA, cujo percurso se acompanhou na movimentação desta filmagem. Câmara E53: 2.44.39h – 2.46.00h (correspondente às imagens de fls. 407 – 409): Observa-se um indivíduo a passar para trás da roulotte às 2.45.02h e a sair pelas 2.45.34h, conseguindo distinguir-se uma indumentária superior azul e branca semelhante que se concilia com o casaco azul e branco do arguido AA. Câmara E146: 2.47h – 2.48.32h e câmara E099: 2.47.58h – 2.48.36h (correspondente às imagens de fls. 410/2): Observa-se o AA sozinho pelo passeio com o casaco no braço. Câmara M244: 2.53.53h – 2.54.40h (correspondente às imagens de fls. 412/414): Visualizam-se os arguidos BB, DD, FF e EE a descer em direção ao metro. Câmara E099M: 2.50.08h a 2.50.59h e E146M: 2.50.13h – 2.50. 52h (correspondente às imagens juntas com a contestação do arguido HH): Visualizam-se os arguidos HH, GG e JJ a caminhar, acompanhados de duas raparigas pelo lado direito do Estádio .... Câmara da CMTV2 – durante 36 segundos consegue distinguir-se um individuo com um vestuário que se identifica como casaco do arguido AA (com a faixa branca) e bem assim o arguido BB junto às escadas na zona central, onde ficou caída a vítima OO. Estas filmagens e fotogramas, vistos sequencialmente (sendo a infografia anexa aos autos uma sua síntese), permitem em imagem dinâmica sustentar o descrito pelas testemunhas com exclusão das já mencionadas, conciliando-se com os depoimentos referidos. Permitem, tendo em consideração o que se visualiza, identificar o percurso de um grupo cujos elementos, após uma repetição de visualizações e com o auxílio dos fotogramas, legendagens e autos, se consegue identificar e caracterizar pelo vestuário, modo de caminhar e atitude até à bola antes da Alameda. Consegue perceber-se que os arguidos descem as escadas em direção ao Metro após a discussão junto à barraca da ..., o encontro entre os arguidos AA (que trajava um casaco azul com uma faixa branca, como o mesmo esclareceu e que é facilmente identificável em todas as imagens no ambiente sombrio ou mais iluminado) e II (também facilmente identificável pelo vestuário branco que usava com calções e meias pretas) e os arguidos CC (encorpado e facilmente identificável sempre junto ao arguido AA) e BB (inicialmente de t’shirt preta, como se visualiza nas imagens e mais tarde também sem t’shirt e também facilmente identificável à aproximação, quer pela estrutura e altura, quer pelo traje escuro) e a nova subida das mesmas escadas em direção à Alameda (aí, nas escadas, se reconhecendo os arguidos AA, CC, BB, DD, FF, EE, HH, II, GG e JJ, porque mais próximo e em ambiente iluminado). Permitem reconhecer o percurso dos arguidos AA e CC, sempre liderando um grupo de pessoas (que se vão identificando conforme descrito supra), e o início das agressões junto à ambulância com uma corrida prévia na estrada pela Alameda acima. Igualmente permitem observar na zona ajardinada uma perseguição movida pelo arguido AA (que é facilmente identificável, como se disse), que depois se vê a abandonar o local onde OO fica caído e aí permanecendo o arguido BB. Permitem do mesmo modo observar a forma como o arguido AA se afasta do local, descendo pelo lado direito da Alameda tendo em conta esse sentido, escondendo-se atrás de uma roulotte e prosseguindo com o casaco na mão, visualizando-se nessa altura a t’shirt que o mesmo também disse que usava com o número 27 nas costas. E, finalmente, a descida também pelo lado direito dos arguidos HH, GG e JJ, e a aproximação do arguido BB ao desentendimento ocorrido com a ofendida NN e posterior percurso de regresso à zona do metro. Assente a morte da vítima que apresentava 18 facadas que ocorreram neste enquadramento fáctico e temporal (entre as 2.34.31h e as 2.55h (hora da chegada da VMER)) e no decurso destas movimentações, há que analisar o que a demais prova permite. Ainda atendendo à prova testemunhal, há que referir que as testemunhas apenas referem facadas dadas pelo arguido AA, não podendo ser surpresa para o mesmo que o tenham visto com uma faca, certo que o próprio admite que teve uma na sua mão (que inclusivamente diz ter usado). Depois, não pode olvidar-se que o arguido AA adotou, na verdade, um comportamento individual de fuga escondida, como se visualiza nas imagens. De todos os que abandonam o local e regressam à zona do Estádio, o arguido foi o único que teve a preocupação de se esconder. Teve também a preocupação de fazer desaparecer o casaco que envergava, fazendo já o caminho sem ele vestido – não se mostra crível que após um desentendimento, que inclusivamente o levou a fugir à socapa do local, o arguido estivesse preocupado com o facto de o casaco estar rasgado, como disse. Intimamente ligado com este facto, está a circunstância de a t’shirt que vestia, as calças e as sapatilhas conterem vestígios hemáticos da vítima – facto que não é conciliável com a versão do arguido que diz que após ver o OO esfaquear o pai pegou na faca espetou-a nas costelas do lado direito e fugiu (numa dinâmica dessas dificilmente o arguido ficaria com sangue em todas as peças de vestuário, incluindo as sapatilhas). De resto, se a t’shirt, tinha vestígios hemáticos, tendo o casaco por cima, este muito mais teria (e seria muito seguramente essa preocupação do arguido). De igual modo, o próprio arguido assumiu perante a mãe (a arguida DD), como foi referido por esta, que estava desgraçado. E, finalmente, o arguido teve necessidade de abandonar a sua residência para ir dormir para casa da tia. Sendo inegável a existência de facadas naquele contexto de agressões à vítima, sem que tenha sido adiantada uma explicação plausível e séria para a sua existência, impõe-se necessariamente a conclusão de que alguém no grupo, munido de uma faca as desferiu.
E todos os elementos supra conduzem seguramente à conclusão de que as facadas foram produzidas naquele contexto de agressão pelo arguido AA, conforme foram sendo vistas pelas testemunhas ZZ, SS, TT, YY e AAA – desde que as agressões se iniciaram ainda junto à ambulância, conforme referem as testemunhas SS e YY até ao desfalecimento na zona central, conforme referem as testemunhas ZZ e TT (estas testemunhas conseguiram ver estas facadas, mas seguramente durante a luta as outras houve (as restantes), inclusivamente em zonas compatíveis com atuação de defesa da vítima, como se refere no relatório de autópsia, as quais, não tendo sido visualizadas (pela confusão, pela multidão, pela hora da noite e iluminação), estão pericialmente documentadas. Aqui chegados, porque o arguido AA se não encontrava sozinho, houve que analisar a motivação dos factos. De toda a prova resultou manifestamente a existência de um ambiente absolutamente hostil e violento entre a vítima OO e a família do arguido BB desde pelo menos o início do ano. Inicialmente entre os filhos deste e posteriormente, como resulta da agressão no Estádio 1... e das mensagens de fls. 472 e ss., estendendo-se ao próprio e ao arguido CC. A agressão ocorrida horas antes no Estádio 1... (onde se encontravam os três arguidos: BB, AA e EE) e a troca de mensagens e chamadas que se seguiu (seja entre a vítima e a testemunha ZZ, seja entre o arguido BB e o arguido CC e as demais deste designadamente com a arguida EE) são demonstrativas da animosidade e da agressividade que pairava e da ansia de vingança. Seria expectável, embora não seguro em absoluto, que a vítima estivesse nos festejos do Porto e é disso – pelo menos da presença do OO nos festejos – que a arguida DD dá notícia ao arguido BB pelo telefone, aí se dando início ao plano. O arguido BB vai buscar o arguido CC a casa (sendo que este já havia demonstrado por mensagens a sua ânsia de vingança e que entretanto fala ao telefone com a arguida EE, como se vê do registo de chamadas) e juntos dirigem-se para as imediações do Estádio ..., onde se vão juntar às mulheres e arguido AA, que já se encontrava necessariamente munido da faca que mais tarde utilizou (só assim se explica que o mesmo já na corrida tivesse espetado a faca no OO), estando acompanhados dos demais arguidos. Embora resulte claro que todos os demais arguidos tinham (em maior ou menor grau) conhecimento dos desentendimentos e do desejo de vingança (tal resulta não só dos depoimentos, como também do próprio facto de os arguidos circularem acompanhando aqueles que, como se visualiza nas imagens, claramente caminham em jeito de perseguição), nenhum meio de prova permitiu concluir com segurança que os mesmos soubessem que se deslocavam para um ataque à vida do OO. Os arguidos AA e CC sempre liderando o grupo avançam determinados, como se consegue visualizar, trazendo atrás de si um conjunto de pessoas, entre as quais se inclui o arguido BB. Logo que a vítima é avistada, inicia-se a perseguição e os três que se juntaram acabam por alcançar e dominar a vítima em jeito de emboscada, agarrando-o os arguidos BB e CC, um pelos braços e outro pelas pernas, fazendo o arguido AA uso da faca, que não podia deixar de ser vista por aqueles. Enquanto outras pessoas que não se identificaram individualmente se envolveram de modo também não concretamente apurado. E apesar de a vítima ter conseguido fugir daquele local, vem novamente a ser apanhada pelos arguidos BB e AA, que prosseguem com as agressões, incluindo facadas, até ao desfalecimento da vítima – visualizando ainda a testemunha AAA um pontapé na cabeça, sendo que apesar de não identificar a autoria, é referido pela testemunha UU que quando a vítima se encontrava no chão, o arguido BB desferia nela xutos. Temos, pois, por certo neste contexto que à atuação conjunta dos arguidos AA, BB e CC presidiu a intenção de matar – as facadas em número e local do corpo onde foram desferidas, e só conseguidas pela atuação conjunta dos três naquele contexto de emboscada, perseguindo e aproveitando propositadamente a confusão da multidão e da festa, são claramente demonstrativas dessa intenção. Tudo isto se considerou provado, independentemente do caráter violento alegado pelos arguidos quando juntam a fotografia de OO com uma faca ou realçam as mensagens trocadas entre OO e a namorada referentes a atitudes violentas tidas pelo mesmo com terceiros, que para o caso, em concreto, nada relevam, uma vez que se não se demonstrou ligação entre os mesmos e os arguidos intervenientes neste processo. Os factos não provados mereceram resposta negativa em função do que da análise da prova se disse e da ausência de prova e prova segura noutro sentido. Concretamente quanto à participação dos arguidos HH, GG, KKK e II, apesar de terem sido vistos momentos antes nas câmaras – quer as descer as escadas, quer a caminhar junto ao Alameda, quer a atravessar junto ao viaduto - o certo é que, além deles se visualizam várias pessoas tomando o mesmo percurso como que em seguimento. E se nesse início os mesmos são relativamente fáceis de identificar, já num momento posterior torna-se difícil ou impossível o seu reconhecimento – concretamente na travessia da Alameda, nas agressões ou na filmagem da CMTV agressões 2. Neste contexto, as testemunhas que assistiram às agressões, que identificaram os arguidos BB, AA e CC e que referiram que existiram ouras pessoas a agredir não foram capazes de identificar ninguém. É certo que a testemunha ZZZ identifica também estes arguidos, mas a mesma, disse-se já não mereceu credibilidade – não o pode merecer a testemunha que num depoimento diz que um arguido (no caso o II) participou nas agressões e noutro, sem qualquer explicação, diz que não; um depoimento desta natureza não merece segurança e consequentemente credibilidade. E depois, pode até dizer-se que o facto de terem sido vistos inicialmente a acompanhar os arguidos BB, AA e CC indiciaria que os mesmos participaram do mesmo plano e atuação correndo pela Alameda e agredindo, mas tal não é seguro: a razão não obriga a que, àquele simples acompanhamento nos momentos iniciais, se sigam os demais em correria pela Alameda, nem as agressões por parte dos arguidos HH, GG, KKK e II em comunhão de esforços e vontades com aqueles. Aliás, estes arguidos são referidos por duas testemunhas como estando em local diverso quando se iniciam as confusões, v.g. testemunhas CCCC disse que o arguido HH, GG e KKK estavam próximo dela quando se apercebe de uma confusão, e a testemunha GGG e demandante NN que dizem que o arguido II se encontrava com elas quando, a confusão se inicio. Quanto ao local das facadas, sendo certo que não restaram dúvidas que as mesmas ocorreram nos termos que se provaram, não se mostra possível assegurar sem dúvida o local exato que as mesmas atingiram, concretamente as duas primeiras identificadas nos factos provados, sabendo-se como se sabe que tudo ocorreu em instantes e de forma dinâmica, apresentando a vítima várias facadas em diversos locais. Será arrojado afirmar sem sombra de dúvida qual o local específico do corpo que as facadas vistas pelas testemunhas atingiram (considerando-se que as mesmas referiram muito naturalmente apenas a perceção que tiveram a partir do local em que estavam). Neste contexto também, as declarações do arguido AA, que só assume uma facada, não são suficientemente credíveis para concluir que essa que assume como sendo a primeira e única atingiu as costas, até porque a testemunha BBBB refere que no momento em que o AA dar a facada o OO se voltou para ele. Importa também salientar que testemunha ZZ que referiu que o arguido BB disse “Bate-me agora filho da puta que agora não estás em Lisboa”, mas nessa altura encontravam-se já na zona ajardinada e não nas circunstâncias de tempo e lugar referidas no despacho de pronúncia. Quanto aos alertas dados para a presença do OO no ..., apenas se provou o que a arguida DD assumiu ter feito. Importa ainda dizer que a faca utilizada pelo arguido AA utilizou não foi apreendida – razão pela qual não existe o respetivo exame que permita apurar as suas características – razão pela qual se considerou não provado que a lâmina tinha entre 13 e 15 cm. ** As agressões que se consideraram provadas à demandante NN, resultaram também do que daqueles depoimentos se extrai. Não restam dúvidas de toda a prova da existência de agressões à demandante NN no contexto referido, sendo que são as próprias testemunhas que se encontram na ambulância que, sem qualquer interesse confirmam estar uma mulher as ser agredida por três mulheres, que inclusivamente batiam com a cabeça dela na ambulância. Conjugando as declarações da demandante com a prova testemunhal e os relatórios de alta médica de fls. 149 e ss. e de perícia médico-legal de fls. 591 e ss., pode asseverar-se que aquela foi vítima das agressões que se consideraram provadas, com as consequências apuradas. No que respeita à autoria, para além da descrição feita pela própria demandante, consideraram-se as filmagens constantes da Câmara da CMTV agressões 1, onde claramente se identificam as arguidas DD, EE e FF envolvidas na agressão, visualizando-se também na Câmara E69 quando o arguido BB se junta a elas, que as mesmas estão próximo do local onde se encontra caída a demandante. Das provas quanto aos factos objetivos, se extrai também a intenção de as arguidas atuarem do modo descrito, aproveitando-se claramente da superioridade numérica. ** Sobre os factos respeitantes ao crime de detenção de arma proibida imputados à arguida LL resultaram os mesmos do auto de apreensão. Consta dos autos o auto de apreensão do bastão a fls. 759/760. A residência onde o bastão, que estava num armário de arrumos sito na respetiva sala, foi apreendido pertencia à arguida LL, não havendo conhecimento de que a mesma vivesse habitualmente com alguém. A arguida LL prestou declarações em sede de inquérito a fls. 2561/2562 (lidas em sede de julgamento). Em tais declarações a arguida assume não só que o objeto que foi apreendido é seu, esclarecendo a razão pela qual o adquiriu e quem lho deu, como também a autoria da missiva que consta de fls. 2535, onde também assume que o bastão lhe pertence. Impõe-se, pois, a conclusão de que o bastão pertencia e era detido pela arguida, conhecendo a mesma as suas características e querendo detê-lo. Já quanto ao arguido II, não houve qualquer prova – sendo que, conforme consta das declarações da arguida aquele tinha dormido em sua casa naquela noite, mas não era habitua fazê-lo nem partilhar a residência (tendo o mesmo efetivamente prestado TIR noutra morada). Quanto a ele por isso mereceram os factos resposta negativa. ** Sobre os factos respeitantes ao crime de detenção de arma proibida imputados ao arguido GG resultaram os mesmos do auto de apreensão de fls. 788 a 791 – na primeira gaveta da secretária existente no seu quarto, onde também estavam as peças de vestuário a si pertencentes. A localização e apreensão da soqueira em local privado a si pertencente faz concluir que lhe pertencia, não podendo o mesmo deixar de saber as suas características, querendo ainda assim detê-la. ** Sobre os factos respeitantes à ameaça imputada ao arguido KK não foi produzida prova e prova consistente. O arguido negou o seu envio nas declarações que prestou a fls. 2553 e a testemunha ZZZ, além de não ter merecido credibilidade ao tribunal, também não foi capaz de identificar a ameaça que teria sido proferida –nenhuma prova documental ou digital existindo que comprove o seu envio. ** Do pedido de indemnização civil Os factos provados relativamente ao pedido de indemnização civil formulado pela demandante MM resultaram das declarações da própria, que, nada sabendo sobre a forma como os factos ocorreram, descreveu o seu sofrimento, dos depoimentos das testemunhas RR, TTTT, UUUU e VVVV, cunhadas de OO, CCCC, WWWW, XXXX, YYYY e AAAA, irmãs e irmãos de OO, todos com relacionamento próximo à demandante e OO, os quais deram a conhecer o enquadramento familiar, a importância de OO na família e o natural sofrimento daquela. Tudo conjugado, naturalmente, com toda a antecedente prova. Os factos não provados mereceram resposta negativa por sobre eles não ter sido produzido prova e prova convincente. Os factos provados relativos ao pedido de indemnização civil formulado pela demandante NN, resultaram do teor das suas declarações, conjugadas com a prova já anteriormente mencionada e com o depoimento das testemunhas PP e VV, os quais demonstraram ter conhecimento em geral do estado em que a demandante ficou. Ainda conjugadamente atendeu-se ao teor dos documentos juntos com o pedido de indemnização civil. Tudo, analisado, necessariamente à luz das regras da experiência comum, designadamente tendo em consideração a natureza das agressões. Os factos não provados mereceram resposta negativa por sobre eles não ter incidido prova consistente e esclarecedora – designadamente quanto ao telemóvel a demandante disse que se perdeu na confusão (e não que ficou destruído), não sendo possível perceber em que momento da confusão (se antes ou depois das agressões em que já intervém ajudando o PP – o que leva a que se não possa concluir que foi necessariamente em consequência da conduta das arguidas) e quanto ao trabalho, também não foi suficientemente esclarecedora, apenas permitindo concluir o que se considerou provado. Quanto às consequências permanentes no cabelo, apesar do provado quanto à conduta das arguidas que na altura arrancaram cabelo à demandante (e se considerou provado), não foi possível tê-las por seguras, não havendo prova consistente para além da sensação que a própria tem, a qual se entende não poder permitir concluir pela alteração das qualidades genéticas do cabelo. *** Os relatórios sociais e certificados de registo criminal constam dos autos. *** Enquadramento jurídico-penal Subsunção jurídico-penal Os arguidos AA, BB, CC, II, HH, GG e JJ encontram-se pronunciados pela prática de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos arts. 131, e 132, nºs. 1 e 2, als. e), h) e i), do Código Penal. Contra os mesmos foi ainda deduzida acusação particular, imputando-lhes os mesmos factos, com a qualificação do crime de homicídio qualificado também pelo art. 132, n.º 2, al. j), do Código Penal. (Com o despacho de não pronúncia do arguido KK pela prática do crime de homicídio decai também a imputação desse crime feita na acusação particular, visto que se trata de crime de natureza pública, cujo procedimento dependia da acusação pública). * O art. 131 do Código Penal tipifica e criminaliza o homicídio nos seguintes termos: “Quem matar outra pessoa é punido com pena de prisão de 8 a 16 anos.” Por seu turno, o art. 132, n.º 1, do Código Penal prevê a qualificação do homicídio quando a morte seja produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, exemplificando o respectivo n.º 2 situações em que tal especial censurabilidade ou perversidade pode ocorrer. O bem jurídico protegido por este tipo de crime é a vida humana, que é o bem supremo. O tipo objectivo do ilícito consiste em matar outra pessoa. Para que o crime se verifique terá, pois, o agente de praticar um acto adequado a produzir a morte da vítima, independentemente dos meios utilizados e do momento em que a morte ocorra (imediatamente ou em momento posterior). Trata-se de um tipo de crime doloso, que admite o dolo em qualquer uma das suas modalidades – dolo directo, necessário ou eventual. Os arguidos encontram-se pronunciados pela prática do crime em co-autoria.
“I - A jurisprudência define a co-autoria como envolvendo um acordo prévio com vista à realização do facto, acordo esse que pode ser expresso ou implícito, a inferir razoavelmente dos factos materiais comprovados, ao qual se pode aderir inicial ou sucessivamente, não sendo imprescindível que o co-autor tome parte na execução de todos os actos, mas que aqueles em que participa sejam essenciais à produção do resultado. II - No plano objectivo, o co-autor torna-se senhor do facto, que domina globalmente, tanto pela positiva, assumindo um poder de direcção, preponderante na execução conjunta do facto, como pela negativa, podendo impedi-lo, sem que se torne necessária, para a comparticipação estabelecida, a prática de todos os actos que integram o iter criminis. III - No plano subjectivo, é imprescindível, à comparticipação como co-autor, que subsista a consciência da cooperação na acção comum.” – Ac. STJ de 5/6/2012, in www.dgsi.pt * Antes de mais, dir-se-á que quanto ao crime de homicídio qualificado não se provaram os factos que estavam imputados aos arguidos HH, II, JJ e GG – ou seja a adesão a um acordo e a prática de quaisquer atos causadores da morte de OO. Donde, terão estes arguidos de ser absolvidos da prática de tal crime. * Atentemos agora na conduta dos arguidos AA e BB e CC. Da factualidade provada resulta, em síntese, que no dia 8/5/2022, após as 2.30h, os arguidos AA, BB e CC, na sequência de um acordo entre si destinado a tirar a vida a OO por vingança, o perseguiram, manietaram e agrediram nos termos descritos nos factos provados: após perseguição, o arguido AA desferiu pelo menos duas facadas em OO em corrida, após o que os arguidos CC e BB seguraram a vítima, o primeiro pelos braços e o segundo pelas pernas, enquanto o arguido AA o esfaqueou, enfraquecendo-o; esfaqueamento que prosseguiu quando, após ter conseguido fugir, ter tropeçado e ter sido novamente alcançado. Das 18 facadas que OO sofreu, 6 foram na região toraco-abdominal, tendo as mesmas provocado as lesões descritas nos factos provados que foram causa adequada da morte do mesmo pelas 3.20h do mesmo dia.
Os arguidos atuaram de forma livre, voluntária e consciente com base num acordo a que todos aderiram no sentido de tirar a vida a OO, estando, por isso cometido o crime de homicídio. O crime de homicídio foi imputado aos arguidos na forma qualificada nos termos do disposto no art. 132, nºs 1 e 2, do Código Penal. O homicídio qualificado não é mais que uma forma agravada do homicídio simples previsto no art. 131 do Código Penal, tendo por base uma imagem global do facto agravada. Como diz Figueiredo Dias, CJ XII, IV, pag. 51, “sendo essas circunstâncias elementos da culpa (dado o seu funcionamento não automático e a sua não taxatividade) teremos aqui um tipo de culpa qualificado resultante de uma “imagem global do facto agravada”. E, porque se trata de elementos da culpa não são de funcionamento automático: pode verificar-se qualquer das circunstâncias referidas nas várias alíneas, e nem por isso se poder concluir pela especial censurabilidade ou perversidade do agente, o qual nos termos do art.º 29º, do CP apenas é responsabilizado na medida da sua própria culpa nos casos de autoria plural. Por outro lado, como a enumeração é meramente exemplificativa, outras circunstâncias não descritas são suscetíveis de revelar aquela especial censurabilidade ou perversidade.” Atentemos nos concretos factos provados relativos ao contexto e forma de atuação. Sabe-se, então que: Desde o início do ano de 2022 que o arguido AA, o seu agregado familiar, constituído pelos arguidos BB, seu progenitor, DD, sua progenitora, e EE, sua irmã, e CC, companheiro da sua tia paterna (QQ), mantinham um clima de conflito com OO. No mês de janeiro de 2022 ocorreram conflitos físicos numa discoteca entre AA e OO, que prosseguiram com um novo episódio, aquando da ..., envolvendo OO e os arguidos AA e EE. Na sequência deste último episódio, o arguido BB deslocou-se ao Bairro ... à procura de OO, tendo aí ocorrido desacatos. Neste contexto, no dia 7/5/2022, durante a tarde, no Estádio 1..., em Lisboa, onde os arguidos BB e AA se encontravam por ocasião do jogo que opôs o ... ao ..., o primeiro, apercebendo-se da entrada de OO na bancada logo o desafiou para lutarem, gerando-se uma contenda que só cessou com a intervenção de terceiros. Cerca das 2.00h do dia 8/5/2022, em plenos festejos da vitória do ... sobre o ... e no campeonato, junto às barracas da ... existentes no anel que rodeia o Estádio ..., OO e QQ envolveramse numa troca de palavras que cessou quando o primeiro voltou para junto do seu grupo de amigos. Depois do encontro tido com OO, a arguida DD alertou o arguido BB para a presença do OO junto ao Estádio .... Na posse dessa informação, o arguido BB decidiu deslocar-se com o arguido CC para o estádio e juntamente com o arguido AA localizar, perseguir, manietar e agredir com instrumento de natureza corto-contundente OO, e, assim, fazendo-se valer do fator surpresa que o grande aglomerado de pessoas lhes proporcionava, bem como da superioridade numérica, dele se vingarem, tirando-lhe a vida. Os arguidos BB e CC deslocaram-se para junto do ..., onde se encontraram com os arguidos AA, II, HH, JJ, GG, EE, FF e DD, que, entretanto, também para aí se dirigiram, descendo as escadas junto ao estádio cerca das 2.35h. Após, todos os arguidos subiram as escadas do estádio pelo lado do ..., e dirigiram-se para o local onde o OO tinha sido visto próximo da roulotte da .... OO, alertado de que os arguidos se encontravam no local à sua procura, tinha já iniciado o regresso a casa, subindo a Alameda ..., pelo que já não se encontrava no local. Como não conseguiram encontrar o OO, os arguidos AA e BB e CC, acompanhados dos demais arguidos, desembocaram na Rua ..., onde os três primeiros continuaram a procurá-lo entre o aglomerado de pessoas que lá se encontravam, prosseguindo em direção à Alameda ..., passando junto ao ....
A determinado momento, os arguidos AA, BB e CC avançaram por debaixo do viaduto da Rua ..., tendo localizado pelas 2.42.45h o OO, no sentido ascendente da Alameda .... Nesse instante, os arguidos AA e BB e CC moveram uma perseguição desenfreada a OO. O arguido AA seguia à frente de um grupo de pessoas não concretamente identificadas empunhando e manuseando uma faca com uma lâmina de comprimento não concretamente apurado. O arguido AA logrou alcançar OO quando este ainda corria pela faixa de rodagem da Alameda ..., no sentido ascendente, e esfaqueou-o pelo menos duas vezes, tendo a agressão sido presenciada pelos arguidos BB e CC. Alguns metros mais à frente, já junto à berma do lado esquerdo da dita Alameda, no sentido ascendente, o OO foi novamente alcançado pelos arguidos BB e CC e quando este conseguiu agarrá-lo pelas pernas, aquele prendeu-o pelos braços, manietando-o, impedindo-o de fugir e de se defender, fazendo-o cair ao chão. Nessa altura, o arguido AA, fazendo uso da faca de que se encontrava munido, novamente desferiu golpes no OO. Entretanto, por via da intervenção de PP, que agarrou o arguido BB, e de TT, OO, este conseguiu rastejar, libertar-se e fugir pelo meio do separador central da Alameda ..., percorrendo alguns metros até que foi de novo apanhado pelo arguido AA que novamente o esfaqueou com a faca que trazia. Já caído no chão e desfalecido o arguido BB desferiu, além do mais, um pontapé na cabeça de OO, enquanto o arguido AA se afastava sozinho. Seguidamente, o arguido BB ausentou-se do local e juntou-se às arguidas DD, EE e FF e deslocaram-se em direção à zona referente à entrada do ..., passaram em frente à estação do metro e prosseguiram em direção a .... As lesões tóraco-abdominais descritas determinaram como consequência direta, adequada e necessária a morte de OO, tendo o óbito ocorrido no dia 8/5/2022.
Os arguidos AA e BB e CC agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas acordadas condutas eram proibidas e punidas por lei. Os arguidos AA, BB e CC sabiam que os golpes desferidos com a faca nos locais referidos poderiam causar a morte como causaram de OO, o que representaram e quiseram. Sabiam os arguidos AA, BB e CC que ao agir da forma descrita em conjugação de esforços e divisão de tarefas, com superioridade numérica e usando de violência e de instrumentos corto-perfurantes, se constituíam em elevada desproporção relativamente a OO, impedindo-o de se defender e de fugir. Os arguidos AA e BB e CC sabiam que ao perseguir, cercar, agarrar, manietar e agredir OO, impediam a sua fuga e defesa, assim como possibilitavam, como queriam, que o arguido AA desferisse repetidamente golpes com a faca no corpo de OO, atingindo-o nas costas, no peito e no abdómen, onde aqueles sabiam que se alojavam órgãos vitais. Os arguidos AA, BB e CC não souberam refrear os seus impulsos violentos, atuando da forma descrita, motivados por um desejo de vingança, numa escalada de violência, por motivos relacionados com desentendimentos familiares que envolviam os arguidos AA e BB com o OO . Vista a factualidade, de acordo com a imputação feita, a qualificação do homicídio resulta da subsunção da conduta dos arguidos às als. e), h), i) (no despacho de pronúncia) e j), (acusação particular) do Código Penal: “al. e): Ser determinado por avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou para satisfação do instinto sexual ou por qualquer motivo torpe ou fútil.” Estando excluídos todos as demais circunstâncias qualificativas desta alínea que no caso não têm cabimento, nem em abstrato, atentemos no motivo torpe ou fútil. Lê-se no Ac. TRP de 19/1/2022, in www.dgsi.pt., que: “Motivo fútil é o que não é ou nem sequer chega a ser motivo. Cf. Ac.STJ de 06.06.90, BMJ 398, 269, de tal forma que o facto surge como produto de um profundo desprezo pelo valor da vida humana, o que não é manifestamente o caso dos autos, como acima se expressou. Motivo torpe é o motivo infame, indecoroso, repugnante, baixo, sórdido, ignóbil, asqueroso, profundamente imoral, que repugna à generalidade das pessoas. Por seu lado, a doutrina tem atribuído ao motivo fútil o alcance de uma razão incompreensível para a generalidade das pessoas, que não tem relevo, que é insignificante, gratuito, frívolo, sem valor, que não pode razoavelmente explicar (e muito menos justificar) o crime, revelando o facto, inteiramente desproporcionado e repudiado pelo homem médio, uma profunda insensibilidade e inconsideração pela vida humana, um egoísmo intolerante, prepotente e mesquinho. E a jurisprudência também não se afasta desse entendimento, ao considerar como motivo fútil não tanto aquele que tem pouco valor ou importância, mas o que é notoriamente desproporcionado ou inadequado aos olhos do homem médio, denotando o agente egoísmo, intolerância, prepotência e mesquinhez. É, pois, fútil o motivo frívolo, leviano, o que revela uma inteira desproporção entre o motivo e a reação homicida. Para além da desproporção notória, deve acrescer a insensibilidade moral, que tem a sua manifestação mais alta na brutal malvadez ou na insignificância ou frivolidade desproporcionada com a reação homicida. Ac STJ de 7.12.99, BMJ, 492, p.168. Embora nos crimes de homicídio haja sempre ou quase sempre uma certa desproporção entre o motivo e o resultado, no caso de motivo fútil essa desproporção é mais chocante, advindo um evento completamente distinto daquele que o cidadão comum esperaria.” . A conduta dos arguidos no caso dos autos insere-se no contexto de conflito que já se vinha instalando desde o início do ano – com conflitos físicos entre a vítima e membros da família do arguido BB – concretamente, os arguidos AA e EE. A existência deste conflito, cujos contornos e razões se desconhecem concretamente, retiram à conduta do arguido as características que permitiriam considerar que foi determinada por um motivo torpe ou fútil para efeitos de culpa acrescida, merecedora de uma censurabilidade acrescida. al. h) Praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas ou utilizar meio particularmente perigoso ou que se traduza na prática de crime de perigo comum;
Não sendo a faca considerada um meio particularmente perigoso no âmbito do cometimento do crime de homicídio, nem integrando o seu uso a prática de um crime de perigo comum, atentemos na primeira parte desta qualificativa – praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas. Lê-se no Ac. TRG de 113/2018, in www.dgsi.pt, que: “É que, como assertivamente ensina Figueiredo Dias (14), não é a comparticipação, em si e por si mesma, que constitui o exemplo-padrão em causa (prática do facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas), “mas apenas se e quando ela determinar uma particular perigosidade do “meio” (no sentido amplo da “situação” e não apenas no sentido estrito do “instrumento”) e uma consequente dificuldade particular da vítima de dele se defender.”. A que acresce ainda - sublinha o mesmo Mestre - “dever o aplicador, mesmo depois de ter considerado que uma concreta situação da vida integra, segundo o pensamento da lei, a circunstância em análise, ser particularmente severo e exigente ao determinar se ela revela ou não no caso, em definitivo, uma especial censurabilidade ou perversidade do agente (...)””. No caso, é indiscutível o cometimento do crime por cada um dos arguidos com mais duas pessoas. Mas não só se verifica o facto objetivo, como no caso o mesmo torna maior a ilicitude e culpa dos arguidos – é que foi precisamente aquela atuação conjunta que enfraqueceu, subjugou e diminuiu OO, tornando-o um alvo ainda mais vulnerável perante um grupo que já se apresentava munido de um instrumento que lhe conferia superioridade só por si. “al. i) Utilizar veneno ou qualquer outro meio insidioso.” Nos autos, excluído que está o uso de veneno, está naturalmente em causa o uso de meio insidioso que abrange: a armadilha, a cilada, espera, a emboscada, o disfarce, a surpresa, a traição, a aleivosia, o excesso de poder o abuso de poder ou qualquer fraude (vide, Código Penal, Parte Geral e Especial, edição 2014, fl. 512, M. MIGUEZ GARCIA, J.M. Castela Rio). Nestas situações, o agente do crime apanha a vítima desprevenida, confiante, descuidada, descontraída. A qualificativa não se reporta, nesta parte, aos meios empregues, mas ao modo, de atuação do agente, o qual é revelador de uma relevante carga de perfídia que torna difícil ou impossível a defesa da vitima – consistente num ataque sem aviso prévio, súbito, com a vítima desprevenida para o ataque homicida.
E no caso, tal qual está descrita a conduta dos arguidos AA, BB e CC, não pode deixar de considerar-se que os mesmos atuaram de forma insidiosa. Aproveitando a festa, e depois de andarem à sua procura, os arguidos AA, BB e CC moveram uma perseguição à vítima, apanhando-a numa correria súbita, quando esta já regressava a casa subindo a Alameda .... A surpresa com que numa noite de festa – com a confusão de multidão própria destes dias – se fez o ataque a OO foi um meio procurado para concretizar o resultado pretendido, revelando em concreto uma culpa acrescida merecedora de uma censura acrescida - assim fazendo subsumir a conduta dos arguidos AA, BB e CC à qualificativa prevista nesta alínea “al. j) Agir com frieza de ânimo, com reflexão sobre os meios empregados ou ter persistido na intenção de matar por mais de vinte e quatro horas.” “Agir com frieza de ânimo significa atuar com serenidade, com o espírito límpido de emoções. E agir com reflexão sobre os meios empregados significa acuar depois de escolher e preparar cuidadosamente o modo de praticar o facto, revelando uma vontade especialmente determinada de cometer o crime e uma maior perigosidade, pela significativa diminuição das possibilidades de defesa da vítima” – vide Acórdão do STJ de 06.09.2010, in www.dgsi.pt. No caso, não se provaram factos que permitam concluir pela frieza de ânimo, reflexão dos meios empregues ou persistência da intenção de matar por mais de 24 horas. Objetivamente, não se provou que os arguidos tivessem mantido o propósito de matar por mais de 24 horas e os factos provados, também, por si só, não permitem concluir pela frieza de ânimo ou reflexão sobre os meios empregues. Tudo se passou num relativo curto espaço de tempo, no contexto de perturbação vivido horas antes (por causa de antecedentes conflituosos), com o aproveitamento momentâneo de um contexto favorável que pretenderam (e que fez subsumir a conduta dos arguidos à alínea i), conforme já visto) – a situação, tal como provada, revela a conduta de alguém que decide matar e pratica os respetivos atos nesse sentido. Nenhum facto extraordinário permite alcançar um estado de espirito revelador de uma frieza de ânimo merecedora de uma especial censurabilididade para além daquela que o crime de homicídio já encerra. Assim como, no mesmo sentido, não permite concluir que houve uma especial reflexão sobre o meio usado.
Assim, subsumida, pode, pois, concluir-se que os arguidos AA, BB e CC incorreram na prática de um crime de homicídio qualificado, p.p. pelos art. 131 e 132, n.ºs 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal (qualificará a primeira das qualificativas, enquanto a segunda, será considerada em termos de medida da pena). ** As arguidas DD, EE e FF encontram-se pronunciadas pela prática, também em co-autoria de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal. Diz-se, no art. 143, n.º 1, do Código Penal, que “quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa”. Trata-se de um crime material (ou de dano), cuja consumação depende da verificação da ofensa entendida como efeito - e não como ação de ofender (GG Carlos Pereira, Os Crimes Contra a integridade Física na Revisão do Código Penal, em Jornadas Sobre a Revisão do Código Penal, AAFDL, 1998, p. 185, nota 5). Daí que, conforme decidiu o STJ no Acórdão (de uniformização de jurisprudência) de 18 de dezembro de 1991 (DR, I Série-A, de 8 de fevereiro de 1992), “integra o crime do art. 142 do Código Penal a agressão voluntária e consciente cometida à bofetada sobre uma pessoa ainda que essa pessoa não sofra por via disso lesão, dor ou incapacidade para o trabalho”. À semelhança do crime de homicídio, a ofensa será qualificada se for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, sendo suscetíveis de o revelarem precisamente as enumeradas no n.º 2 do art. 132 do Código Penal (designadamente, quando o crime é praticado com pelo menos mais duas pessoas) – art. 145, n.º 1. al. a), do Código Penal. Por seu turno, o elemento subjetivo há-de referir-se não só aos elementos objetivos do tipo previsto no art. 143 mas também às circunstâncias qualificativas. Em face do quadro fáctico que está, não restam dúvidas de que as três arguidas, atuando conjuntamente, cometeram o crime de ofensa à integridade física sobre a ofendida NN quando com as agressões descritas nos factos provados, praticadas de forma livre, voluntária e consciente, lhe provocaram as lesões também aí descritas.
Quanto às concretas circunstâncias e modo de atuação provou-se, então que: Quando PP agarrou o arguido BB foi de imediato agredido. Apercebendo-se que o PP estava a ser agredido, a NN tentou auxiliá-lo. Enquanto tentava auxiliar PP, NN foi atingida com vários murros, socos e pontapés, assim como puxões de cabelo, que lhe foram desferidos pelas arguidas FF, DD e EE, que seguiam atrás dos demais arguidos e que logo ali gizaram um plano para, agindo de comum acordo e em conjugação de esforços e divisão de tarefas, a agredirem. Além de a agredirem nos termos descritos, as arguidas FF, DD e EE agarraram a cabeça de NN e empurraram-na com força contra a ambulância que lá se encontrava. As arguidas DD, EE e FF atuaram em conjugação de esforços e acordo de vontades numa situação de superioridade numérica para melhor assegurarem o êxito das suas intenções. As arguidas DD, EE e FF agiram livre, deliberada e conscientemente, com o propósito concretizado de agredirem fisicamente a ofendida NN e de lhe causarem os ferimentos escrito, dores e mal estar. As arguidas DD, EE e FF bem sabiam que as suas condutas eram proibidas por lei. Também aqui a superioridade numérica, que igualmente contou com o fator surpresa, constituiu acrescida ilicitude e culpa das arguidas e, consequentemente, acrescida censurabilidade – na verdade, atuando nesse conjunto melhor conseguiram o seu objetivo de impedir o auxílio que a ofendida pretendia prestar, agredindo-a com uma violência só possível dessa forma, intencionalmente procurada para potenciar os efeitos. Mostra-se, por isso, cometido o crime de ofensa à integridade física qualificada imputado às arguidas DD, EE e FF. ** Aos arguidos II, LL e GG está imputada a prática de um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das armas e munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02. Dispõe o referido preceito legal que “Quem, sem se encontrar autorizado, fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente, detiver, transportar, importar, guardar, comprar, adquirir a qualquer meio ou obtiver por fabrico, transformação, importação ou exportação, usar ou trouxer consigo: (…) d) Arma da classe E, arma branca dissimulada sob a forma de outro objeto, faca de abertura automática, estilete, faca de borboleta, faca de arremesso, estrela de lançar, boxers, outras armas brancas ou engenhos ou instrumentos sem aplicação definida que possam ser usados como arma de agressão e o seu portador não justifique a sua posse, aerossóis de defesa não constantes da alínea a) do n.º 7 do artigo 3.º, armas lançadoras de gases, bastão, bastão extensível, bastão elétrico, armas elétricas não constantes da alínea b) do n.º 7 do artigo 3.º, quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão, silenciador, partes essenciais da arma de fogo, artigos de pirotecnia, exceto os fogos-de-artifício de categoria 1, bem como munições de armas de fogo independentemente do tipo de projétil utilizado, é punido com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias.” Conforme se provou, os arguidos LL e GG detinham, respetivamente, um bastão extensível e uma soqueira (boxer), tendo atuado livre, voluntária e conscientemente, conhecendo as características das identificadas armas e a sua proibição. Cometerem, pois, o crime que lhes foi imputado. Ao arguido II estava também imputada a prática do mesmo crime. Quanto a ele não se provaram os factos que lhe estavam imputados, pelo que se impõe a sua absolvição. ** Ao arguido KK encontra-se imputada a prática de um crime de ameaça agravada, p.p. pelo art. 153, n.º 1, e 155, n.º 1, al. a), do Código Penal. Incorre na prática de um crime de ameaça agravada, p.p. pelos arts. 153 e 155, n.º 1, al. a), do Código Penal “quem ameaçar outra pessoa com a prática de crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação” e “quando os factos previstos nos artigos 153 e 154 forem realizados: a) Por meio de ameaça com a prática de crime punível com pena de prisão superior a três anos;(…)”. No caso não se provou qualquer dos factos imputados ao arguido KK, pelo que, quanto a ele, se impõe sem necessidade de outras considerações a absolvição. ** Medida da pena. Regime Especial para Jovens À data dos factos os arguidos AA, EE e FF não tinham ainda completado 21 anos de idade, pelo que se impõe apreciar a aplicabilidade do mesmo quanto a eles. O regime dos Jovens Adultos (aquele que à data da prática do crime tiver completado 16 anos de idade sem ter ainda atingido os 21), aprovado pelo Dec. Lei 401/82, de 23.09, impõe ao juiz o poder/dever de atenuar especialmente a pena nos termos previstos na legislação penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado (art. 4). Trata-se de um regime que visa a instituição de um direito mais reeducador do que sancionador, mas que nunca poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade. Nesta perspetiva, sempre que a pena aplicável seja a de prisão e a defesa da sociedade e prevenção da criminalidade não estejam em causa, deve essa pena ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões de que assim se facilitará aquela reinserção. Para realizar tal juízo de prognose sobre o desempenho futuro da personalidade do jovem, impõe-se então ponderar, numa avaliação global dos factos apurados em cada caso concreto, a natureza e modo de execução do crime, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao facto, bem como as suas condições de vida, tudo de forma a averiguar se a moldura penal do crime em questão (concretamente a moldura da pena de prisão) é ou não excessiva tendo em vista os fins de socialização do jovem condenado. É através da ponderação das circunstâncias concretas de cada caso, que se pode chegar ou não à conclusão de que se está perante um desvio transitório e ocasional, próprio do período de latência social propiciador da delinquência juvenil, caso em que se poderá mostrar justificada a formulação de um juízo de prognose favorável à atenuação especial.
“Esse juízo deve ser positivo quando as diversas variáveis a considerar (idade, situação familiar, educacional, vivências pregressas, antecedentes de formação) permitam uma prognose favorável (ou, com maior rigor, não impeçam uma prognose favorável) sobre o futuro desempenho da personalidade” – Ac. STJ de 07-11-2007 (processo n.º 07P3214)). Assim, só se justifica a referida atenuação especial se houver vantagens de reinserção, mas, importa não o esquecer, sem prejuízo da defesa do ordenamento jurídico – ou seja, salvaguardadas que sejam, naturalmente, as exigências de prevenção geral ligadas à proteção de bens jurídicos, que, sendo acentuadas, poderão obstar a essa atenuação especial da pena. No caso de absoluta incompatibilidade entre exigências de prevenção geral e especial, as exigências (mínimas) de prevenção geral funcionam como limite ao que, numa perspetiva de prevenção especial, podia ser aconselhável. De facto, nenhum ordenamento jurídico suporta pôr-se a si próprio em causa, sob pena de deixar de existir enquanto tal. “A sociedade tolera uma certa perda de efeito preventivo geral, nomeadamente conformandose com a aplicação do regime de jovens, mas, quando essa aplicação possa ser entendida pela sociedade, no caso concreto, como uma injustificada indulgência e prova de fraqueza face ao crime, quaisquer razões de prevenção especial que aconselhassem a aplicação do regime penal especial para jovens cedem, devendo aplicar-se a pena de prisão” – Ac.TRG de 09-04-2018, proc. 1069/16.1JABRG.G1). No caso concreto, o arguido AA tinha, à data dos factos, 19 anos de idade. Pese embora não tivesse à data quaisquer antecedentes criminais, o certo é que em julgamento, apesar de todo o contexto, que como é óbvio, não podia desconhecer, admitiu uma única facada, negando qualquer intenção de matar – revelando com isso total falta de consciência crítica perante um comportamento ofensivo do bem jurídico vida. O crime é grave – muito grave – e atenta contra o bem jurídico mais importante que é a vida, sendo a sua violação incompreendida pela comunidade. Acresce no caso particular, que se trata de violência de grau elevado entre jovens, o que deixa a comunidade ainda mais receosa com a formação da personalidade e o caracter violento dos mesmos. Significa isto que apesar da conduta do arguido anterior aos factos (ser primário), a gravidade do crime, quer em termos de resultado, quer em termos de iter criminis, a personalidade nele manifestada, as várias sanções disciplinares que após reclusão tem sofrido e as expectativas comunitárias, fazem concluir por uma personalidade pouco juvenil ou pouco própria da imaturidade de um jovem, antes revelando perigosidade. Neste contexto, não existem razões sérias para crer que da atenuação especial da pena resultem vantagens para a reinserção social do arguido. Não há, pois, que proceder à atenuação especial da pena quanto ao arguido AA. Já quanto às arguidas EE e FF, o crime cometido, apesar da concreta violência, insere-se naquele grupo em que se admite, na ausência de condenações anteriores, seja fruto da imaturidade e do contexto, podendo as arguidas ainda beneficiar da atenuação da pena como fator de ressocialização. As arguidas EE e FF beneficiarão, assim, da atenuação especial da pena prevista no Regime Especial Para Jovens, nos termos dos arts. 72 e 73 do Código Penal: sendo o limite máximo da pena de prisão reduzido de um terço e o limite mínimo da pena de prisão é reduzido a um quinto se for igual ou superior a 3 anos e ao mínimo legal se for inferior. * Molduras penais O crime de homicídio qualificado, previsto nos arts. 131 e 132, n.ºs 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, imputado aos arguidos AA, BB e CC é punível com pena de prisão de 12 a 25 anos. O crime de ofensa à integridade física qualificada previsto nos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal e, imputado à arguida DD é punido com prisão até quatro anos. O crime de ofensa à integridade física qualificada previsto nos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, imputado às arguidas EE e FF é punido com prisão até 2 anos e 8 meses (por força da aplicação do Regime Especial para Jovens Adultos, aprovado pelo Dec. Lei 401/82, de 23.09). O crime de detenção de arma proibida previsto no art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das armas e munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02, é punido com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias. Determinação concreta das penas
Prescreve o art. 70 do Código Penal que “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, de onde decorre que deverá ser privilegiada a aplicação da pena não detentiva, desde que a mesma proteja adequadamente o bem jurídico protegido com a incriminação e promova a reintegração social do agente. Na determinação concreta da medida da pena ter-se-á em conta, dentro da moldura abstrata definida na lei, todas as circunstâncias referidas no artigo 71 do Código Penal que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o arguido, fixando-se o limite máximo da pena de acordo com a culpa do arguido. O limite mínimo deve ser encontrado de acordo com as exigências de prevenção geral positiva ou de integração, sob a forma de proteção de bens jurídicos e para realizar a necessária pacificação social, reforçando contrafacticamente a confiança da sociedade nas normas violadas. A pena a aplicar deve adequar-se às necessidades de prevenção especial, visando a ressocialização e a consequente reinserção social do arguido. Desta forma se realizam as finalidades da punição, com pleno respeito pela dignidade da pessoa humana, tomando em consideração a culpa como limite máximo, e fazendo atuar as exigências de prevenção geral e especial que no caso concreto se façam sentir - cfr. art. 40 do Cód. Penal. No caso dos autos, haverá que considerar todas as circunstâncias referidas no artigo 71, n.º 2, do Código Penal, para encontrar a pena concreta, referindo-se, desde já, que o grau de culpa, há-de resultar da valoração do facto ilícito praticado pelo arguido. A ilicitude dos factos e culpa do agente é elevadíssima nos crimes de homicídio e ofensa à integridade física qualificada. A forma de atuação dos agentes com a violência usada e no crime de homicídio ainda com a insídia presente – quer em termos de perseguição, quer em termos de surpresa, quer ainda em termos de absoluta desconsideração pelo sofrimento nos termos descritos nos factos provados – fazem elevar exponencialmente a culpa e ilicitude dos arguidos. Nos crimes de detenção de arma proibida é reduzida a ilicitude e culpa – as armas encontravam-se na casa dos arguidos e desconhece-se qualquer utilização das mesmas pelos arguidos. As exigências de prevenção geral são elevadíssimas em todos os crimes: verifica-se um aumento destes tipos de criminalidade não só entre jovens, mas sobretudo entre eles, revelando o desprezo perante os bens jurídicos alheios mais valiosos com que crescem, desta forma colocando a comunidade em sobressalto – todos os dias os cidadãos comuns despertam para novas notícias dando conta de crimes violentos praticados com ou sem móbil, tornando a sociedade mais exposta ao perigo, com medo e vulnerável. Em específico, quanto aos crimes de homicídio, veja-se o sumário do Ac.STJ, de 23/3/2017, proferido no processo 267/15.0PAPTS.L1.S1, in jurisprudência.pt: “(…) II - Nos crimes de homicídio, ainda que na forma tentada, as exigências de prevenção geral positiva são sempre especialmente intensas porque a violação do bem jurídico fundamental ou primeiro – a vida – é, em geral, fortemente repudiada pela comunidade.” e o teor do Ac.STJ de 12/1/2022, in www.dgsi.pt: “No que se refere à proteção de bens jurídicos, que constitui uma das finalidades das penas (art. 40º, nº 1, do CP), no caso o bem jurídico protegido no tipo em causa é a vida humana, bem supremo que a Constituição da República Portuguesa declara inviolável no seu art.º 24.º. Por isso, as necessidades de prevenção são muito elevadas.” Quanto às exigências de prevenção especial há que considerar os antecedentes criminais dos arguidos AA e CC, descritos nos factos provados, a ausência de condenações transitadas em julgado quanto aos demais arguidos, não sendo de olvidar que a arguida DD tem uma condenação por ameaça e ofensa à integridade física transitada em julgado um dia após os factos e ainda o que quanto ao mesmo se apurou quanto a condições de vida e que se pode sintetizar nos termos que seguem: - AA registou um percurso escolar pautado por absentismo, insucesso escolar e comportamentos desajustados, ao nível da promoção e proteção, com aplicação de medida de acolhimento residencial em IPSS, assim como também foi alvo de intervenção no âmbito tutelar educativo. Beneficiou ainda de acompanhamento pedopsiquiátrico, por lhe ter sido diagnosticada perturbação de hiperatividade com défice de atenção, que abandonou sem alta clínica. O arguido habilitou-se com o 9º ano de escolaridade, mediante a realização de um curso profissional, iniciando percurso profissional na área de lavagem/limpeza de vidros. Iniciou o consumo de haxixe na fase da adolescência com carácter diário, mantendo consumos ocasionais, assim como consumos de bebidas alcoólicas, em contexto recreativo, até à sua reclusão. Beneficiou de duas suspensões provisórias de processo, que cumpriu. O arguido sempre integrou o agregado familiar de origem, tendo encetado relação afetiva, da qual resultou um descendente atualmente com 1 ano de idade. Atualmente, AA, que se encontra preso preventivamente, tem registado várias sanções disciplinares, a última das quais datada de 19/12/2023. Não se encontra integrado em atividade estruturada (escolar, formativa ou profissional), uma vez que não manifesta motivação para esse efeito. Beneficia da retaguarda familiar, sendo que os progenitores e a irmã são coarguidos nos presentes autos. BB à data da factualidade integrava intermitentemente o agregado familiar constituído pela companheira e pelos dois filhos (todos coarguidos), mantendo residência formal no apartamento camarário originariamente titulado pela mãe, falecida em 2020. As dinâmicas familiares indiciavam instabilidade, em especial no eixo conjugal, com sucessivas separações e reconciliações. O arguido tem um filho mais novo, gerado fora desta relação. Com habilitações escolares ao nível do 6º ano, BB teve uma trajetória laboral irregular e marcada por informalidade. O futebol foi assumido pelo arguido como prioritário na sua vida. Os seus rendimentos pessoais proviriam da prática desportiva (ajudas de custo), de trabalhos informais e do RSI. O arguido considera a sua vida como “muito boa”, baseada na prática desportiva regular (futebol e ginásio), no convívio social com os amigos e na participação nas atividades da claque, que integrará desde 2010. BB desvaloriza as condenações anteriores, circunscrevendo-o a incidentes contingenciais à atividade desportiva e da claque e relacionados com condução sem habilitação legal. CC apesar de apresentar reduzidas qualificações académicas e os períodos de reclusão vivenciados ao longo do seu percurso de vida foi adquirindo competências profissionais e hábitos de trabalho, que lhe conferiram um percurso laboral regular, pese embora em fase mais recente se encontrasse formalmente em situação de desemprego desenvolvendo, contudo, trabalhos em regime informal. No presente contexto prisional manifestou dificuldades no cumprimento das regras do estabelecimento prisional o que originou a sua colocação em regime de segurança, onde permanece. Ao longo deste período tem mantido apoio por parte do agregado familiar, constituindo-se como importantes elementos de suporte e estabilidade para o arguido. DD residia à data dos factos com os filhos e, intermitentemente, com o companheiro, havendo ainda indicadores de presença regular da namorada do filho, respetiva filha e do neto no contexto habitacional. O agregado familiar reside num bairro social conotado com problemáticas sociais e criminais, contando com uma imagem social negativa. Desde a aplicação das medidas de coação de prisão preventiva ao filho e ao companheiro, a arguida reside apenas com a filha. DD inseriu-se no mercado de trabalho durante a adolescência, mantendo inserção laboral ativa durante a maior parte da sua vida adulta, com períodos de desemprego, o último dos quais vigente, desde janeiro de 2023. A situação económica foi autoavaliada como limitada. O seu quotidiano é alegadamente organizado em função das responsabilidades domésticas e familiares, da execução de trabalhos informais e das visitas ao filho e ao companheiro no estabelecimento prisional. EE dispõe de retaguarda familiar, existindo vínculos afetivos entre os diferentes elementos que constituem a sua rede de suporte. A arguida não possui a escolaridade obrigatória. Apresenta características de impulsividade e paralelamente ao percurso escolar praticou a modalidade de MMA (arte marcial mista) desde os 8 anos de idade, tendo desistido em meados de 2021 por desinteresse. Desde que deixou de estudar, foi desenvolvendo atividades laborais com vista à independência financeira. FF, de 19 anos de idade, com o 9º ano de escolaridade, encontra-se formalmente desempregada, subsiste da prestação do rendimento social de inserção e proventos de atividade de venda de roupa online, avaliando a sua situação financeira como modesta. A arguida ocupa o seu quotidiano no convívio com as amigas e a procura de emprego, sendo que referiu constrangimentos nomeadamente ao nível da inserção laboral decorrentes da sua constituição como arguida no presente processo. Ao nível familiar beneficia do suporte do progenitor que adota uma postura crítica face ao estilo de vida protagonizado pela arguida. FF apresenta um quotidiano desestruturado, ocupando-se com o convívio com as amigas, entre as quais destaca a coarguida EE, e a procura de emprego. No meio sócio residencial, pese embora não haja relatos de comportamentos desadaptativos naquele contexto, a arguida é conotada com o seu envolvimento em situações de conflito.
Neste contexto, quanto aos crimes de homicídio e ofensa à integridade física, considerando a elevada ilicitude e culpa dos arguidos, traduzida no modo cruel, insidioso e violento como foi executada a morte de OO e impostas as agressões à ofendida NN, as prementes exigências de prevenção geral, traduzidas na necessidade de proteção dos bens jurídicos violados e, consequentemente, da sociedade, que espera a revalidação contrafáctica da norma violada, e as elevadas exigências de prevenção especial, traduzidas no factos provados quanto ao seu percurso de vida e personalidade, Reputam-se adequadas as seguintes penas: - AA: 20 anos de prisão - BB: 18 anos de prisão - CC 18 anos de prisão - DD 1 ano e 8 meses de prisão - EE 1 ano de prisão - FF 1 ano de prisão. A maior pena aplicada ao arguido AA teve em consideração o facto de ter sido este o arguido quem, com apenas 19 anos de idade ao tempo dos factos, executou as concretas facadas, ultrapassando aquele limiar de valores e sensibilidade próprios de qualquer ser humano – assim tornando o seu comportamento de ainda mais acrescida censurabilidade (por maior ilicitude e culpa). No art. 44, n.º 1, do Código Penal o legislador reage contra as penas curtas de prisão, estabelecendo a sua substituição pela pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, exceto se a execução da prisão for exigível pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. No caso, face à gravidade dos crimes não se ponderará a substituição das penas das arguidas DD, EE e FF por multa ou trabalho a favor da comunidade. Todavia, tendo em consideração a ausência de antecedentes criminais, reputa-se adequado, por ora suspender a execução da pena de prisão pelo período de dois anos quanto a todas as arguidas, nos termos do disposto no art. 50 do Código Penal (“O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”). Acredita-se que por esta forma, com a censura do facto e ameaça de pena de prisão se alcançarão as finalidades da punição. Esta suspensão será sujeita a regime de prova (que para as arguidas EE e FF é legalmente obrigatório nos termos do disposto no art. 53, n.º 3, do Código Penal) orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais). A suspensão será ainda condicionada ao pagamento à demandante NN por cada uma das arguidas de 1/3 da quantia indemnizatória que vier a ser fixada até ao final do período de suspensão, devendo todos os meses ser entregue àquela por cada uma das arguidas e por conta dessa quantia 1/12 do valor total a suportar por cada uma. Quanto aos crimes de detenção de arma proibida, face à ausência de antecedentes criminais dos arguidos LL e GG por crimes da mesma natureza (a arguida LL sequer por qualquer crime) e os seus percursos de vida, é de entender que a pena de multa ainda se mostra suficiente para alcançar as finalidades da punição. Na determinação da pena, é de considerar que a atuação imputada é a de detenção de armas, sem que se saiba que os arguidos as tenham utilizado, as já referidas elevadas exigências de prevenção geral e as reduzidas exigências de prevenção especial quanto à arguida LL e pouco elevadas exigências de prevenção especial quanto ao arguido GG. Neste contexto, considera-se adequada a aplicação ao arguido de uma pena de 180 dias de multa para cada um, à taxa diária de € 8,00 – atento a situação económica dos arguidos. *** Pedido de indemnização civil MM formulou pedido de indemnização civil, nos termos e com os fundamentos constantes do requerimento que apresentou e que aqui se dá por reproduzido, pedindo a condenação dos arguidos no pagamento da quantia de €225.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, sendo:
- €75.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos por OO até à morte (dano intercalar); - €50.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela assistente; - €100.000,00 a título de indemnização pela perda do direito à vida. NN formulou pedido de indemnização civil, nos termos e com os fundamentos constantes do requerimento que apresentou e que aqui se dá por reproduzido, pedindo a condenação dos arguidos no pagamento da quantia de €25.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, sendo: Nos termos do disposto no art. 71 do Código de Processo Penal “o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respetivo” (princípio da adesão). Deste modo, no pedido cível deduzido no processo penal, a causa de pedir é constituída pelo facto criminoso (Tolda Pinto, O novo Processo Penal, 2ª ed. pág. 169). De acordo com o disposto no art. 129 do Código Penal, “[a] indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil”. Trata-se, portanto, do instituto da responsabilidade civil. Ora, são pressupostos da responsabilidade civil: um facto voluntário do agente, a ilicitude desse facto (contratual ou extracontratual), a culpa (exceto na responsabilidade pelo risco), o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano (art. 483 do Código Civil). Pressupostos esses que se verificam in casu, quanto aos arguidos AA, BB e CC relativamente aos danos decorrentes do crime de homicídio que cometeram e quanto às arguidas DD, EE e FF relativamente aos danos decorrentes do crime de ofensa à integridade física que cometeram. Pese embora o pedido de indemnização civil tenha sido formulado também contra o arguido KK, a prolação de despacho de não pronúncia que fez cair quanto a ele o crime de homicídio (imputado na acusação pública e, consequentemente na acusação particular, como já referido) impediu o prosseguimento da instância cível quanto a si.
Já os demais arguidos (HH, II, GG e KKK) terão de ser absolvidos dos pedidos de indemnização civil contra eles dirigido por se não ter provada a prática pelos mesmos de qualquer ilícito gerador da obrigação de indemnizar. Os danos podem ser de natureza patrimonial ou não patrimonial. A indemnização por danos patrimoniais visa repor o lesado na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse tido lugar, mediante a reconstituição natural ou atribuição de uma indemnização se aquela não for possível (art. 566 do Código Civil). No dano não patrimonial está em causa “uma ofensa a bens de carácter imaterial – desprovidos de conteúdo económico, insuscetíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro[17]; é o prejuízo que, sendo insusceptível de avaliação pecuniária, porque atinge bens que não integram o património do lesado que apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária.” – Ac. TRC de 21/3/2013, in www.dgsi.pt. Na fixação da indemnização por danos de natureza não patrimonial deve atender-se àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, nos termos do disposto no artigo 496, nº 1, do Código Civil. De acordo com o preceituado no artigo 496, nº 3, 1ª parte, do Código Civil, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal. Como tal, há que recorrer à equidade para quantificar o montante das compensações por danos não patrimoniais, atendendo às pertinentes circunstâncias do caso. Das várias interpretações que têm sido dadas aos nºs 2 e 3 do art. 496 do Código Civil, em caso de morte, afigura-se mais acertada a sustentada por Dario Martins de Almeida, in Da Responsabilidade Civil em Matéria de Acidentes de Viação, Almedina, 3ª Edição, pág. 178 e ss., onde, aliás, é dada conta das principais correntes doutrinais e jurisprudenciais sobre a questão. Defende este autor que: no nº 2 daquele preceito prevêemse os danos emergentes da dor moral sofrida pelas pessoas aí referidas com a morte de uma outra; no nº 3 tem-se em vista a lesão do direito à vida e outros sofrimentos físicos e morais que precedam a morte, danos que entram no património da vítima por aquisição. Assim, no primeiro caso o direito à indemnização nasce diretamente na esfera patrimonial da pessoa que a ela tem direito, enquanto que no segundo nasce no património da vítima, transmitindose aos seus herdeiros pela ordem estabelecida no art. 2133 do Código Civil. Importa então apreciar a responsabilidade civil dos demandados.
Do pedido de indemnização civil da demandante MM Vejamos, pois, qual o montante a atribuir à demandante para compensação dos danos não patrimoniais que são alegados. Tendo em conta o grau de afetividade existente entre a vítima e a demandante, sua mãe, com quem sempre viveu, as consequências que relativamente a esta se consideraram provadas (o sofrimento com a perda desde o momento em que esta ocorreu nas circunstâncias provadas até ao presente), considera-se justo e adequado fixar a compensação por danos não patrimoniais da demandante no montante de €25.000,00. No que respeita ao dano intercalar – sofrimento até à morte – há que sublinhar, como é referido pela demandante, a relevância do sofrimento – desde a surpresa inicial com a perceção do ataque seguido das facadas, passando pela privação subsequente dos movimentos quando é agarrado, vendo-se sujeitado a suportar renovadas agressões, até ao desfalecimento após a queda com outras agressões com faca e pontapé e faca. Terão sido momentos intermináveis de sofrimento atroz, acompanhados necessariamente da consciência do que se estava a passar. Tendo em conta a natureza deste sofrimento e o espaço de tempo que terá mediado até à perda da consciência com a violência sofrida durante o mesmo, reputa-se adequado o montante de €60.000,00. Resta a indemnização pela perda do direito à vida. Sobre esta, pode ler-se no recente AcTRP, de 27/2/2023, in www.dgsi.pt que: “Inexistindo, assim, uma tabela a aplicar pelos tribunais que fixe, quer o montante correspondente à perda da vida, quer os quantitativos adequados a indemnizar danos de natureza não patrimonial, a fim de tornar as indemnizações tão equilibradas quanto possível, e com vista a introduzir segurança no sistema, há que proceder a uma análise comparativa (leia-se no ac. da Relação do Porto de 24-2-2022 - proc. 2374/20.8T8PNF.P1, Judite Pires: a determinação da compensação pecuniária devida pelo dano morte e correspondente lesão do direito à vida deve fazer-se com recurso à equidade, ponderando critérios de uniformidade na jurisprudência para situações similares, sem descurar, todavia, a especificidade do caso concreto.
Tomemos em atenção que a vida é um bem para o próprio, mas também, dada a natureza intrinsecamente social do homem, um bem para todos os elementos da comunidade, principalmente para os que lhe são mais próximos, normalmente os pais, o cônjuge, os filhos. Nessa dimensão social o bem vida é também tutelado. No que diz respeito ao dano perda do direito à vida pela vítima e para efeitos de cálculo em concreto da indemnização, discute-se se haverá que atender a critérios tais como a idade, a saúde, o valor da vítima em termos de vida social e familiar. Procederemos a um breve excurso do que de mais substancial tem vindo a ser a evolução jurisprudencial neste capítulo. No ac. da Relação de Lisboa, de 18-6-2009 (proc. 337/2007-8, Bruto da Costa) expendeu-se que na violação do direito à vida estão em causa danos não patrimoniais que são relativamente pouco influenciados pela idade da vítima e que sendo mais chocante ver um jovem de 20 ou 30 anos morrer, a sua morte e principalmente o valor do bem supremo que lhe foi subtraído (a vida) é basicamente o mesmo do que o de uma pessoa idosa. Conclui que se deve levar em conta o critério dominante para a fixação da indemnização para qualquer idade, admitindo-se uma maior severidade desse critério nos casos em que a vítima é ainda jovem, mas não parecendo admissível a mitigação ou desvalorização da indemnização apenas porque a vítima é uma pessoa idosa. No ac. do S.T.J. de 14-7-2009 (proc. 1541/06.1TBSTS.S1, Sebastião Póvoas) defendeu-se que tendo a vida um valor absoluto, o seu valor para efeitos indemnizatórios não depende da idade, condição sócio-cultural ou estado de saúde da vítima. A corrente que se foi, porém, firmando foi no sentido que entender que pese embora o facto de a vida ser um direito absoluto, tal não dever ser impeditivo de, em concreto e por razões de equidade, serem ponderados factores como a idade, a condição sócio-cultural ou o estado de saúde da vítima, na determinação do montante da indemnização (Dário Martins de Almeida, in Manual de acidentes de viação, Almedina, 1980, p. 186). No ac. do S.T.J. de 3-11-2016 (proc. 492/10.0TBBAO.P1.S1, António Joaquim Piçarra), citando extensa jurisprudência, constata-se que a reparação do dano morte é hoje inquestionável na jurisprudência, situando-se, em regra e com algumas oscilações, entre os € 50.000,00 e € 80.000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos até €100.000,00. Neste acórdão, para um homem de 52 anos, fixou-se uma indemnização de € 60.000,00.
No ac. do S.T.J. de 02-02-2017 (proc. 658/07.0TBBRR.L2.S1, Abrantes Geraldes, in O dano morte na jurisprudência das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça - Sumários de Acórdãos de 2016 a dezembro de 2021, https://www.stj.pt/wp content/uploads/2022/03/danomorte.pdf), tendo o sinistrado 78 anos, considerou-se que tinha já esgotada a esperança de vida, entendendo-se como equilibrada in casu a fixação da indemnização de € 40.000 aos autores a título de direito à vida da vítima. No ac. do S.T.J. de 01-06-2017 (proc. 1112/15.1T8VCT.G1.S1, Lopes do Rego, nos mesmos Sumários de Acórdãos) lê-se: I- O fundamento e o objectivo da indemnização pela perda do direito à vida não é o mesmo que preside à indemnização por danos não patrimoniais de que beneficia o próprio lesado. II - Embora seja exacto que o direito à vida é o mais valioso de todos os direitos, os valores indemnizatórios que os tribunais vêm atribuindo por morte – que, na maioria dos casos, oscilam entre os € 50.000 e os € 80.000 – não são limitativos das indemnizações fixadas por danos não patrimoniais, nomeadamente, em casos em que os lesados sobreviveram com lesões de extrema gravidade e fortemente incapacitantes. II - O recurso à equidade para a determinação da indemnização a atribuir por danos não patrimoniais nos termos do art. 496.º, n.os 1 e 3, do CC, não afasta a necessidade de observar as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uma uniformização de critérios naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias do caso. No ac. do S.T.J. de 08-06-2017 (proc. 2104/05.4TBPVZ.P1.S2, Maria dos Prazeres Beleza, nos mesmos Sumários de Acórdãos) consta: em sede de indemnização por danos não patrimoniais, o critério à adotar, à luz do disposto no art. 494.º ex vi do art. 496.º, n.º 4, do CC, é o da compensação do lesado em termos de lhe proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão, relevando ainda como sanção à conduta culposa do agente na produção do dano. No ac. do S.T.J. de 08-06-2017 (proc. n.º 1524/10.7TBOAZ.P1.S1, Tomé Gomes, nos mesmos Sumários de Acórdãos) sumariou-se: I - O juízo de equidade das instâncias, essencial à determinação do montante indemnizatório por danos não patrimoniais, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspetiva atualística, generalizadamente vêm sendo adotados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade. No ac. do S.T.J. de 28-09-2017 (proc. 1181/05.2TBFND.C2.S1, Távora Victor, nos mesmos Sumários de Acórdãos) enuncia-se: considerando a idade da vítima, à data do acidente (32 anos), bem como o sentido da jurisprudência do STJ em casos análogos, entende-se adequado o montante de € 70.000 a título de indemnização pela perda da vida. No ac. do S.T.J. de 05-06-2018 (proc. 370/12.8TBOFR.C1.S2, Salreta Pereira, nos mesmos Sumários de Acórdãos): a reparação do dano da morte, na jurisprudência do STJ, situa-se, em regra entre € 50.000 e € 80.000 ou, em alguns arestos mais recentes, € 100.000. Tendo a vítima, à data da morte, 78 anos de idade, mas gozava de boa saúde e grande vitalidade, garantindo, com autonomia, o desenvolvimento de múltiplas atividades económicas, não se considera excessivo o montante de € 60.000, arbitrado para reparação do dano de morte. E ainda: - no ac. do S.T.J. de 06-12-2018 (proc. 1685/15.9T8CBR.C1.S1, Hélder Almeida, nos mesmos Sumários de Acórdãos): na fixação da indemnização decorrente da perda do direito à vida pesam as circunstâncias de cada caso, sendo que, no caso de uma vítima de 61 anos de idade, estimada e inserida no meio em que vivia e susceptível de ganhar o seu sustento, mostra-se adequado fixar a indemnização a título do dano morte no montante de € 60.000,00; - no ac. S.T.J. de 11-04-2019 (proc. 465/11.5TBAMR.G1.S1, Oliveira Abreu nos mesmos Sumários de Acórdãos): provando-se que a vítima, à data da morte, tinha 72 anos, era uma pessoa activa, gozava de boa saúde, era sociável e alegre, dedicava-se a uma agricultura para consumo familiar, sendo estimado e considerado no meio onde vivia, fazendo parte de uma tuna, e era bom marido, pai e avô, deverá ser fixado em € 70.000,00 o montante (anteriormente fixado em € 60.000,00) pela perda do direito à vida; - no ac. S.T.J. de 19-05-2020 (proc. 572/09.4TBVLN.G1.S1, Maria Olinda Garcia nos mesmos Sumários de Acórdãos): em sede de compensação pela perda do direito à vida, tendo em conta que o falecido marido da autora tinha 53 anos e se dedicava à sua atividade profissional, quando foi vitimado por um acidente de viação da exclusiva responsabilidade do condutor do veículo objeto do seguro firmado na ré, à luz dos parâmetros mais recente da jurisprudência do STJ, tem-se por razoável arbitrar a quantia de € 80.000,00;
- no ac. S.T.J. de 11-02-2021 (proc. 625/18.8T8AGH.L1.S1, Abrantes Geraldes, nos mesmos Sumários de Acórdãos), tendo a vítima de 53 anos, atribuiu-se uma indemnização de € 80.000,00; - no ac. do S.T.J. de 03-03-2021 (proc. 3710/18.2T8FAR.E1.S1, Maria do Rosário Morgado, nos mesmos Sumários de Acórdãos), tendo a vítima 45 anos, atribuiu-se uma indemnização no valor de € 80.000,00; - no ac. do S.T.J. de 17-12-2020 (proc. 5306/16.4T8GMR.G2.S1, Jorge Dias, nos mesmos Sumários de Acórdãos), tendo a vítima 7 anos de idade, fixou-se uma indemnização de € 100.000,00; (…).” Atenta a evolução jurisprudencial e tendo em conta a idade da vítima, por um lado, e, por outro, o cotexto familiar em que vivia, sendo um homem feliz, reputa-se adequado pela perda do direito à vida o montante de €80.000,00. A demandante peticionou ainda juros de mora desde a data da notificação para contestar, sobre o montante global de todos os danos peticionados. Tendo em consideração que está em causa a indemnização por danos não patrimoniais, a fixação da mesma é feita por referência à data do presente acórdão, pelo que os juros serão devidos à taxa legal atual a contar da presente data. Do pedido de indemnização civil da demandante NN Tendo em consideração que não se provaram os danos não patrimoniais, as demandadas terão de serem absolvidas do peticionado a esse título. Quantos aos danos não patrimoniais, tendo em consideração os critérios antes referidos, bem como os factos que se consideraram provados, não só relativamente à conduta, sua violência, exposição e dores, mas também às consequências de natureza mais ou menos permanente – dente e cicatrizes –, reputa-se adequado fixar a indemnização em 12.000,00, a que acrescerão os juros peticionados a contar da presente data. ** As armas apreendidas aos arguidos são de natureza proibida, pelo que a sua devolução fará os arguidos incorrer em nova prática do crime, pelo que se declaram as mesmas perdidas a favor do Estado. *** Atentas as concretas penas aplicadas não se verificam os pressupostos de aplicação da Lei 38-A/2023, de 2/8. (…)” » Considerando o número de recursos em análise e a extensão das questões a apreciar, seguiremos uma ordem de precedência lógico-jurídica, nos termos que seguem. Veio a assistente MM, não se conformando com o acórdão que aplicou as penas de prisão de 20 anos ao arguido AA e 18 anos aos arguidos BB e CC, interpor recurso para este Tribunal da Relação, tendo por base a medida da pena em que cada um dos referidos arguidos foi condenado, peticionando a aplicação àqueles, respectivamente, das penas de 25, 24 e 23 anos de prisão. Cumpre analisar. A legitimidade do assistente para interpor recurso em caso de sentença condenatória, desacompanhado do Mº Pº, maxime, colocando em causa a medida concreta da pena, foi objecto de longa controvérsia, tendo-se desenhado três soluções na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça: Uma, negando essa possibilidade, considerando que a decisão não o afetava ou por não ter interesse em agir, de que são exemplos os acórdãos de 23-03-1995, CJSTJ 1995, tomo 2, 165; de 25-05-1995, CJSTJ 1995, tomo 2, 219 e BMJ 447, 365; de 22-11-1995, CJSTJ 1995, tomo 3, 240; de 09-10-1997, BMJ 470, 364; de 30-10-1997, BMJ 470, 462; de 06-11-1997, CJSTJ 1997, tomo 3, 231; de 18-12-1997, CJSTJ 1997, tomo 3, 216. Uma segunda, reconhecendo legitimidade ao assistente – como nos casos dos acórdãos de 03-07-1991, BMJ 409, 355; de 22-09-1993, CJSTJ 1993, tomo 1, 210; de 22-05-1996, processo 243/96; de 09-04-2007, CJSTJ 1997, tomo 2, 172 e BMJ 466, 366. Uma terceira posição, defendendo que a solução para decidir da legitimidade ou ilegitimidade para o recurso deve ser encontrada, apreciando, caso a caso, se a sua posição é afetada pela natureza da condenação ou pela espécie da medida da pena aplicada ao arguido - acórdãos de 30-03-1995, CJSTJ 1995, tomo 1, 235; de 15-01-1997, CJSTJ 1997, tomo 1, 188; de 09-04-1997, CJSTJ 1997, tomo 2, 177.
O acórdão do STJ de 30 de Outubro de 1997, proferido no recurso n.º 1151/96 - “assento” n.º 8/99 (publicado no Diário da República, I Série-A, n.º 185, de 10/08/1999, págs. 5192 e segs.), veio entretanto tomar posição sobre esta problemática, firmando a seguinte jurisprudência obrigatória: «O assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar um concreto e próprio interesse em agir». O conceito de tal “interesse” veio a ser desbravado na situação jurídica que culminou no subsequente “assento” n.º 5/2011, de 09/02/2011, publicado no Diário da República, I Série, n.º 50, de 11/03/2011, págs. 1410 e segs., que fixou a seguinte jurisprudência: “Em processo por crime público ou semipúblico, o assistente que não deduziu acusação autónoma nem aderiu à acusação pública pode recorrer da decisão de não pronúncia, em instrução requerida pelo arguido, e da sentença absolutória, mesmo não havendo recurso do Ministério Público”. Ali se discutiu mais claramente a questão da distinção entre legitimidade para recorrer e interesse em recorrer, considerando-se que “para o assistente poder recorrer, não há que fazer-lhe outras exigências para além das que o artigo 401.º, n.º 1, alínea b), comporta: que a decisão seja relativa a um crime pelo qual se constituiu assistente (legitimidade) e seja contra ele proferida (interesse em agir)”, decidindo no sentido que «o inconformismo do assistente, manifestado na interposição do recurso, à luz do que se disse, serve ainda o interesse público da definição do melhor direito para o caso, tenha ou não recorrido o Ministério Público» No alinhamento desta questão, seguiu-se, em 13/02/2020, novo “assento”, com o nº 2/2020, publicado no Diário da República, I Série, n.º 61, de 26/03/2020, que fixou a seguinte jurisprudência: “O assistente, ainda que desacompanhado do Ministério Público, pode recorrer para que a suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado fique condicionada ao pagamento, dentro de certo prazo, da indemnização que lhe foi arbitrada”.
Note-se que a legitimidade, enquanto pressuposto processual para recorrer, não é problema diferente da legitimidade para a constituição de assistente, isto é, o recorrente só pode recorrer de decisões na medida da sua legitimidade, ou seja, pelos crimes em que se tenha constituído assistente. Já o interesse em agir, igualmente verdadeiro pressuposto processual e também designado de interesse processual, conceito oriundo da processualística civil, consiste na necessidade de recorrer à via judiciária com vista a reagir contra uma decisão que comporte uma desvantagem para o recorrente e que só por esse meio possa ser acautelada[4]. Por isso mesmo foi firmado o entendimento levado ao último destes “assentos” referidos, de que tal interesse em agir existe no caso (ali em apreço) de uma pretensão autónoma dos assistentes (diversa de qualquer agravação da pena ou de alteração da qualificação jurídico-penal), relacionada com a reparação do prejuízo por eles sofridos com a prática do crime e cuja condição da suspensão não deixa de estar associada às finalidades preventivas da pena, de forma a melhor defender os interesses patrimoniais lesados. Não se olvida, como foi referido no Acórdão do Colendo STJ, de 20.11.2014, que se tem assistido, quer na doutrina, quer na jurisprudência a um reforço da posição processual do assistente a partir de novo enfoque sobre a figura do ofendido/lesado “olhando a outra margem do crime, ao nível do resultado, do ofendido, não apenas do seu autor, mas da vítima”. Tão-pouco se olvida que, por força do direito comunitário, a Lei n.º 130/2015, de 04.09, ao transpor a Directiva 2012/29/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25.10.2012, deu foros de cidadania à “vítima”, aprovando o respectivo Estatuto e aditando à sistemática do CPP um novo título sob a epígrafe “vítima” composto pelo artigo 67.º -A (artigo 4.º, n.º 2) em cujo n.º 4, além do mais, se afirma o direito de “participação activa no processo penal”, o que vai de encontro à possibilidade de o assistente enquanto vítima/lesado/ofendido poder lançar mão do recurso em situações em que o assistente tem não só legitimidade para o recurso, como interesse em agir. Ocorre, no entanto, que, na análise da presente questão, resulta igualmente fundamental atentar que o estatuto processual do Ministério Público é distinto do estatuto do assistente e, assim, enquanto o Ministério Público tem legitimidade para recorrer de quaisquer decisões (alínea a), n.º do art.401.º do C.P.P.), o assistente só pode recorrer de decisões contra ele proferidas (alínea b), n.º do art.401.º do C.P.P.). Ora, a matéria da espécie e medida da pena aplicada – como, no fundo, decidiu o “assento” n.º 8/99 – é essencialmente guiada por razões de interesse público, visando a realização dos fins assinalados à punição criminal (aos «fins das penas»), pois que só assim se pode entender que, quanto a ela, o assistente só possa recorrer se, como aí se decidiu, “demonstrar um concreto e próprio interesse em agir”. O interesse em agir consiste na necessidade de usar o processo, de instaurar ou fazer prosseguir a acção para tutelar um direito; se os recorrentes não alcançam com o recurso qualquer efeito útil, concreto e pessoal, não têm interesse em agir. A possibilidade de recurso autónomo por banda do assistente — artigo 69.º, n.º 2, c), do CPP refere -se, pois, e tão só, às situações processuais em que aquele é directamente afectado, a decisão directamente o desfavorece, enfim, atinge algum «concreto próprio interesse» seu, digno de protecção e é, nessa medida, contra si proferida - o que, sem estar inteiramente arredado na acção penal por crime público, naturalmente com mais frequência, terá oportunidade de acontecer quando o procedimento criminal é instaurado nos termos dos artigos 49.º e (ou) 50.º, do CPP. A punição do arguido está dominada por um interesse público, pelo que se a posição do assistente no recurso, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, conflituar com a posição assumida a esse respeito pelo Ministério Público, aquele só terá legitimidade demonstrando que foi afectado pela decisão recorrida e que tem um concreto e próprio interesse em agir. É que, como bem se assinala no “assento n.º 8/99”, «…se o assistente não demonstrar um real e verdadeiro interesse, um seu pedido de agravação da pena (em termos de espécie ou de medida) tem um cunho, ou, pelo menos, aparenta tê-lo, de regresso à vindicta privada, o que de há muito felizmente desapareceu das nossas leis…». Portanto, não competindo ao assistente ser o intérprete do interesse colectivo na questão da espécie e medida da pena, só a demonstração de um concreto e real interesse na punição permitirá ao mesmo recorrer sem subordinação ao Ministério Público.
Ora, transpondo estes ensinamentos para a situação em análise, logo resulta evidente que a assistente, dispondo de legitimidade para recorrer, precisamente por se ter constituído assistente nos autos, carece, no entanto, in concreto, de interesse em agir, não tendo demonstrado, na sua peça recursiva, que foi afectada pela decisão recorrida, nem demonstrado um concreto e próprio interesse em agir ao pugnar pela aplicação de outra medida da pena, no que aos arguidos AA, BB e CC concerne. Resulta claro que a disciplina consagrada no último dos indicados “assentos” não tem aplicação in casu, precisamente pela indicada ausência de manifestação de interesse em agir, por parte da assistente. No caso dos autos, na sequência da condenação, pelo Tribunal recorrido, dos arguidos AA, BB e CC, nas penas de 20 anos de prisão para o primeiro e 18 anos de prisão para os segundo e terceiro, veio o Ministério Público recorrer, pedindo, entre o mais, a agravação daquelas para pena não inferior a 23 anos (quanto ao primeiro) e penas não inferiores a 20 anos (quanto aos segundo e terceiro); e, autonomamente, veio também a assistente recorrer pedindo a agravação daquelas penas, respectivamente, para 25, 24 e 23 anos de prisão. Logo se vê, pois, que a posição da assistente, nesta matéria da medida da pena, não está alinhada com a posição a este respeito assumida pelo Ministério Público, pelo que aquela só poderia recorrer demonstrando ser titular de um interesse próprio, atendível, a defender; de outro modo, como supra se expendeu e como resulta do “assento” n.º 8/99, “se o assistente não demonstrar um real e verdadeiro interesse, um seu pedido de agravação da pena (em termos de espécie ou de medida) tem um cunho, ou, pelo menos, aparenta tê-lo, de regresso à vindicta privada”. In casu, a assistente não demonstra ter qualquer interesse concreto e próprio atendível que permita dizer que a decisão recorrida foi proferida contra si (e, portanto, que em relação a ela tem necessidade de – leia-se, interesse em – recorrer); tal significa, assim, que falta, à assistente nos autos, «interesse em agir». A assistente, no seu recurso, confinou-se à invocação do interesse geral da justiça na punição do delinquente, sendo este um interesse colectivo, e não pessoal, seu. Em face disto, não deveria o recurso da assistente ter sido recebido, mas, antes, logo rejeitado na 1ª instância, por falta dos necessários pressupostos – no caso, por fata de interesse em agir. Ocorre que tal recebimento da 1ª instância não vincula o Tribunal superior, - vd. art. 414.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, pelo que nada obsta a que proceda esta Relação à rejeição do recurso interposto pela assistente, o que, consequentemente, se decide, nos termos dos arts. 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, alínea b), 420.º, alínea b), todos do Código de Processo Penal), ficando assim prejudicado o conhecimento da pretensão por ela aqui formulada. »
Veio o arguido AA, no âmbito do seu recurso do acórdão final proferido pelo Tribunal da 1ª instância, manifestar a sua manutenção de interesse no recurso interlocutório por si interposto em sede de audiência de julgamento, na sessão do dia 07 de Março de 2024 e que lhe indeferiu a invocada inquirição, em sede de audiência, dos peritos subscritores do relatório do INML junto aos autos. Naquele recurso, entende o arguido recorrente AA que o Tribunal a quo violou o art. 340º, nº 1 do CPP e por via dela, o princípio da investigação, na sequência do indeferimento do esclarecimento de prova pericial, padecendo, assim, a respectiva decisão de nulidade sanável, nos termos da alínea d), do nº 2, do artigo 120º do CPP. Em resposta, o Ministério Público junto da 1ª instância [no que foi acompanhado pela Exmª Procuradora-Geral Adjunta, no seu parecer, junto deste Tribunal da Relação], pugnou pelo indeferimento da questão levantada, com a argumentação expendida na respectiva resposta e parecer, para onde aqui nos permitimos remeter, por brevidade. Cumpre apreciar. Ocorre que, como resulta claro da referida perícia médico-legal (autópsia), foi o conjunto das lesões tóraco-abdominais sofridas pela vítima, ali discriminadamente caracterizadas e descritas, que conduziu ao resultado morte. Acompanha, pois, este Tribunal de recurso, o decidido pelo Tribunal a quo, ao considerar não se revelar, aquela diligência requerida pelo arguido AA, essencial ou indispensável à descoberta da verdade material, por pretender-se, com ela, desde logo, demonstrar algo que, cientificamente, será indemonstrável. Acresce que o arguido se encontra pronunciado, juntamente com outros co-arguidos (BB e CC), de uma actuação conjunta, em comunhão de esforços, portanto, em co-autoria material. Ora, como já atrás se expendeu, na co-autoria material, todos são responsáveis pela totalidade da conduta, independentemente do grau de actuação de cada um, porquanto as suas condutas visavam o objectivo comum: alcançar a vítima e tirar-lhe a vida. Note-se que, se para a verificação da comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria são essenciais a verificação de uma decisão conjunta visando a obtenção de determinado resultado (elemento subjectivo) e uma execução igualmente conjunta, já para a verificação dos elementos objectivos do crime (aqueles que se prendem com a sua execução propriamente dita) não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos a praticar. Isto porque, na comparticipação, cada um dos co-autores responde pela totalidade do evento não sendo indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos a praticar para obtenção do resultado pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo indispensável à produção do resultado (cfr., v.g., Ac. do S.T.J. de 18/7/84, B.M.J. 339, pág. 276). No caso, estando o arguido AA, como se disse, pronunciado pela prática dos factos descritos na pronúncia, em co-autoria material, resultaria, para além de indemonstrável, também inócua a prova de que foi a facada desferida pelo mesmo que causou a morte à vítima. Por fim, e como igualmente foi considerado pelo Tribunal a quo, os pedidos de esclarecimento, relativamente à perícia realizada, deveriam ter sido suscitados ao Tribunal recorrido, após notificação das partes do resultado da mesma, o que não aconteceu, apenas se justificando a sua colocação em momento posterior, em sede de audiência de julgamento, caso ali se tivesse entretanto, no decurso da produção da prova, levantado qualquer questão nova que implicasse uma tal prestação “póstuma” de esclarecimentos, o que também não foi o caso. Pelo que ficou dito, não se vislumbra qualquer mácula na decisão de indeferimento do requerido, por parte do Tribunal a quo, ao abrigo das als. b) e c) do nº 4, do art. 340º do CPP, não se descortinando a invocada nulidade decorrente da alínea d), do nº 2, do artigo 120º do mesmo diploma legal. Improcede, pois, o recurso interlocutório interposto pelo arguido recorrente AA. »
No que concerne à presente questão decidenda, ressalta, desde logo e manifestamente, que a mesma está materialmente arredada do campo das competências deste Tribunal de recurso, nada havendo a apreciar ou decidir, nessa parte. Não se verificou um qualquer conflito de interesses intraprocessual, que, a existir, esse sim teria de ser logo sindicado pelo Tribunal a quo. O que se poderá, em tese, discutir no cenário invocado pelos arguidos recorrentes BB e CC, restringe-se ao plano ético, quiçá disciplinar, cuja apreciação reside na competência da Ordem dos Advogados. Improcede, pois, neste segmento, os recursos dos arguidos, sem necessidade de mais considerandos, dada a facilidade da questão.
»
Alegam os arguidos recorrentes AA e BB que, na tarefa de fundamentação das penas que lhes foram aplicadas, o Tribunal a quo limitou-se a, com recurso a meros argumentos genéricos, concluir que lhes devem ser aplicadas, respectivamente, as penas de 20 e de 18 anos de prisão, o que acarreta a nulidade do acórdão recorrido. Cumpre apreciar. O citado artigo 379º estabelece um regime específico das nulidades da sentença. Assim, de acordo com as três alíneas do seu nº 1, é nula a sentença penal quando, não contenha as menções previstas no nº 2 e na alínea b) do nº 3 do art. 374º, quando condene por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, fora dos casos previstos nos arts. 358º e 359º, e quando o tribunal omita pronúncia ou exceda pronúncia. Os recorrentes na invocação que fazem da nulidade trazem à liça o disposto no número 2 do artigo 374º. Sendo a sentença o acto decisório do juiz por excelência, este último dispositivo legal enuncia os seus requisitos, dispondo o seguinte: “Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.”. O dever de fundamentação das decisões judiciais é hoje um imperativo constitucional, dispondo o art. 205º, nº 1, da Lei Fundamental que, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei. A fundamentação deve conter as razões da bondade da decisão, permitindo que ela se imponha, dentro e fora do processo, sendo uma exigência da sua total transparência já que através dela se faculta aos respectivos destinatários e à comunidade, a compreensão dos juízos de valor e de apreciação levados a cabo pelo julgador. Para além disso, é ainda através da fundamentação da sentença que é viabilizado o controlo da actividade decisória pelo tribunal de recurso designadamente, no que respeita à validade da prova, à sua valoração, e à impugnação da matéria de facto. Na lei ordinária o dever de fundamentação encontra-se genericamente consagrado no art. 97º, nº 5, do C. Processo Penal – os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão. A fundamentação da sentença penal, como decorre desta norma, é composta por duas vertentes: uma delas consiste na enumeração dos factos provados e não provados e outra consiste na exposição, concisa, mas completa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que contribuíram para a formação da convicção do tribunal. Consiste pois, tal fundamentação, na exposição dos motivos de facto (motivação sobre as provas e sobre a decisão em matéria de facto) e de direito (enunciação das normas legais que foram consideradas e aplicadas) que determinaram o sentido («fundamentaram») a decisão. As decisões judiciais, com efeito, não podem impor-se apenas em razão da autoridade de quem as profere, mas antes pela razão que lhes subjaz (Cfr. Germano Marques da Silva, "Curso de processo penal", III, pág. 289). No que tange à enumeração dos factos provados e dos factos não provados, mais não é do que a narração de forma metódica, dos factos que resultaram provados e dos factos que não resultaram provados, com referência aos que constavam da acusação ou da pronúncia, da contestação, e do pedido de indemnização, e ainda dos factos provados que, com relevo para a decisão, e não constando de nenhuma daquelas peças processuais, resultaram da discussão da causa. É esta enumeração de factos que permite concluir se o tribunal conheceu ou não, de todas as questões de facto que constituíam o objecto do processo. Já relativamente à exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, trata-se de enunciar de forma concisa as provas que serviram para fundar a convicção alcançada pelo tribunal – sem que tal tenha de passar no que tange à prova por declarações pela assentada dos depoimentos produzidos em audiência – bem como de proceder a uma análise crítica de tais provas. Esta análise crítica deve consistir na explicitação do processo de formação da convicção do julgador, concretizada na indicação das razões pelas quais, e em que medida, determinado meio de prova ou determinados meios de prova, foram valorados num certo sentido e outros não o foram, ou seja, a explicação dos motivos que levaram o tribunal a considerar certos meios de prova como idóneos e/ou credíveis e a considerar outros meios de prova como inidóneos e/ou não credíveis, e, ainda, na exposição e explicação dos critérios, lógicos e racionais, utilizados na apreciação efectuada (neste sentido, Ac. da Relação de Lisboa, de 18/1/2011, em que foi Relator o Juiz Desembargador Vasques Osório).
Volvendo-nos ao caso concreto, e sendo certo que os arguidos recorrentes AA e BB, na presente questão recursiva, colocam em causa unicamente a fundamentação do Tribunal a quo no que à medida da pena concerne, vejamos o que, nesta matéria, e concretamente em relação a estes arguidos recorrentes, se diz, na decisão recorrida: “(…) O crime de homicídio qualificado, previsto nos arts. 131 e 132, n.ºs 1 e 2, als. h) e i), do Código Penal, imputado aos arguidos AA, BB e CC é punível com pena de prisão de 12 a 25 anos. (…) Determinação concreta das penas (…) Na determinação concreta da medida da pena ter-se-á em conta, dentro da moldura abstrata definida na lei, todas as circunstâncias referidas no artigo 71 do Código Penal que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o arguido, fixando-se o limite máximo da pena de acordo com a culpa do arguido. O limite mínimo deve ser encontrado de acordo com as exigências de prevenção geral positiva ou de integração, sob a forma de proteção de bens jurídicos e para realizar a necessária pacificação social, reforçando contrafacticamente a confiança da sociedade nas normas violadas. A pena a aplicar deve adequar-se às necessidades de prevenção especial, visando a ressocialização e a consequente reinserção social do arguido. Desta forma se realizam as finalidades da punição, com pleno respeito pela dignidade da pessoa humana, tomando em consideração a culpa como limite máximo, e fazendo atuar as exigências de prevenção geral e especial que no caso concreto se façam sentir - cfr. art. 40 do Cód. Penal. No caso dos autos, haverá que considerar todas as circunstâncias referidas no artigo 71, n.º 2, do Código Penal, para encontrar a pena concreta, referindo-se, desde já, que o grau de culpa, há-de resultar da valoração do facto ilícito praticado pelo arguido. A ilicitude dos factos e culpa do agente é elevadíssima nos crimes de homicídio (…). A forma de atuação dos agentes com a violência usada e no crime de homicídio ainda com a insídia presente – quer em termos de perseguição, quer em termos de surpresa, quer ainda em termos de absoluta desconsideração pelo sofrimento nos termos descritos nos factos provados – fazem elevar exponencialmente a culpa e ilicitude dos arguidos. (…) As exigências de prevenção geral são elevadíssimas em todos os crimes: verifica-se um aumento destes tipos de criminalidade não só entre jovens, mas sobretudo entre eles, revelando o desprezo perante os bens jurídicos alheios mais valiosos com que crescem, desta forma colocando a comunidade em sobressalto – todos os dias os cidadãos comuns despertam para novas notícias dando conta de crimes violentos praticados com ou sem móbil, tornando a sociedade mais exposta ao perigo, com medo e vulnerável. Em específico, quanto aos crimes de homicídio, veja-se o sumário do Ac.STJ, de 23/3/2017, proferido no processo 267/15.0PAPTS.L1.S1, in jurisprudência.pt: “(…) II - Nos crimes de homicídio, ainda que na forma tentada, as exigências de prevenção geral positiva são sempre especialmente intensas porque a violação do bem jurídico fundamental ou primeiro – a vida – é, em geral, fortemente repudiada pela comunidade.” e o teor do Ac.STJ de 12/1/2022, in www.dgsi.pt: “No que se refere à proteção de bens jurídicos, que constitui uma das finalidades das penas (art. 40º, nº 1, do CP), no caso o bem jurídico protegido no tipo em causa é a vida humana, bem supremo que a Constituição da República Portuguesa declara inviolável no seu art.º 24.º. Por isso, as necessidades de prevenção são muito elevadas.” Quanto às exigências de prevenção especial há que considerar os antecedentes criminais dos arguidos AA (…), descritos nos factos provados, (…) (…) quanto ao mesmo se apurou quanto a condições de vida e que se pode sintetizar nos termos que seguem: - AA registou um percurso escolar pautado por absentismo, insucesso escolar e comportamentos desajustados, ao nível da promoção e proteção, com aplicação de medida de acolhimento residencial em IPSS, assim como também foi alvo de intervenção no âmbito tutelar educativo. Beneficiou ainda de acompanhamento pedopsiquiátrico, por lhe ter sido diagnosticada perturbação de hiperatividade com défice de atenção, que abandonou sem alta clínica. O arguido habilitou-se com o 9º ano de escolaridade, mediante a realização de um curso profissional, iniciando percurso profissional na área de lavagem/limpeza de vidros. Iniciou o consumo de haxixe na fase da adolescência com carácter diário, mantendo consumos ocasionais, assim como consumos de bebidas alcoólicas, em contexto recreativo, até à sua reclusão. Beneficiou de duas suspensões provisórias de processo, que cumpriu. O arguido sempre integrou o agregado familiar de origem, tendo encetado relação afetiva, da qual resultou um descendente atualmente com 1 ano de idade. Atualmente, AA, que se encontra preso preventivamente, tem registado várias sanções disciplinares, a última das quais datada de 19/12/2023. Não se encontra integrado em atividade estruturada (escolar, formativa ou profissional), uma vez que não manifesta motivação para esse efeito. Beneficia da retaguarda familiar, sendo que os progenitores e a irmã são coarguidos nos presentes autos. BB à data da factualidade integrava intermitentemente o agregado familiar constituído pela companheira e pelos dois filhos (todos coarguidos), mantendo residência formal no apartamento camarário originariamente titulado pela mãe, falecida em 2020. As dinâmicas familiares indiciavam instabilidade, em especial no eixo conjugal, com sucessivas separações e reconciliações. O arguido tem um filho mais novo, gerado fora desta relação. Com habilitações escolares ao nível do 6º ano, BB teve uma trajetória laboral irregular e marcada por informalidade. O futebol foi assumido pelo arguido como prioritário na sua vida. Os seus rendimentos pessoais proviriam da prática desportiva (ajudas de custo), de trabalhos informais e do RSI. O arguido considera a sua vida como “muito boa”, baseada na prática desportiva regular (futebol e ginásio), no convívio social com os amigos e na participação nas atividades da claque, que integrará desde 2010. BB desvaloriza as condenações anteriores, circunscrevendo-o a incidentes contingenciais à atividade desportiva e da claque e relacionados com condução sem habilitação legal. (…) Neste contexto, quanto aos crimes de homicídio (…), considerando a elevada ilicitude e culpa dos arguidos, traduzida no modo cruel, insidioso e violento como foi executada a morte de OO (…) as prementes exigências de prevenção geral, traduzidas na necessidade de proteção dos bens jurídicos violados e, consequentemente, da sociedade, que espera a revalidação contrafáctica da norma violada, e as elevadas exigências de prevenção especial, traduzidas no factos provados quanto ao seu percurso de vida e personalidade, Reputam-se adequadas as seguintes penas: - AA: 20 anos de prisão - BB: 18 anos de prisão (…) A maior pena aplicada ao arguido AA teve em consideração o facto de ter sido este o arguido quem, com apenas 19 anos de idade ao tempo dos factos, executou as concretas facadas, ultrapassando aquele limiar de valores e sensibilidade próprios de qualquer ser humano – assim tornando o seu comportamento de ainda mais acrescida censurabilidade (por maior ilicitude e culpa). (…)”
Ora, adiantamos já que, analisada a decisão recorrida, no segmento acima transcrito, atinente à fundamentação de direito ao nível da medida da pena, logo se conclui que a mesma é suficiente, não padecendo, pois, da invocada falta de fundamentação, nos termos preconizados pelo n.º 2 do art.º 374.º e al. a), do nº 1, do art. 379.º, do CPP. O Tribunal a quo logrou explicar a formação do processo mental que percorreu, tal como o exige o supracitado nº 2, do art. 374º, do C.P.P., até chegar à determinação da medida concreta da pena. E, na explanação de tal processo mental, resulta que o Tribunal a quo valorou, desde logo, o muito elevado grau de ilicitude dos factos e da culpa dos arguidos, destacando o concreto modo de actuação conjunta dos mesmos como sendo cruel, violenta e insidiosa – quer em termos de perseguição, quer em termos de surpresa, quer ainda em termos de absoluta desconsideração pelo sofrimento causado à vítima – de notar que, tal como frisou a decisão recorrida, tendo resultado o crime de homicídio qualificado pela al. h), do nº 2, do art. 132º do CP, sobrerrestou a al. i) do mesmo normativo para ser considerada em termos de medida concreta da pena. Considerou também o Tribunal recorrido o grau muito elevado das exigências de prevenção geral, traduzidas na necessidade de proteção dos bens jurídicos violados e, consequentemente, da sociedade, que espera a revalidação contrafáctica da norma violada. Destacou o aumento dos crimes de homicídio entre jovens, revelando desprezo perante os bens jurídicos alheios mais valiosos com que crescem, desta forma colocando a comunidade em sobressalto – todos os dias os cidadãos comuns despertam para novas notícias dando conta de crimes violentos praticados com ou sem móbil, tornando a sociedade mais exposta ao perigo, com medo e vulnerável. A decisão recorrida sublinhou e bem que, nos crimes de homicídio, as exigências de prevenção geral positiva são sempre especialmente intensas porque a violação do bem jurídico fundamental ou primeiro – a vida – é, em geral, fortemente repudiada pela comunidade.” Por sua vez, destacou também, a decisão recorrida, as elevadas exigências de prevenção especial, traduzidas nos factos provados quanto ao percurso de vida e personalidade dos arguidos, enfatizando o seguinte: Quanto ao arguido recorrente AA: - o seu percurso escolar pautado por absentismo, insucesso escolar e comportamentos desajustados, ao nível da promoção e proteção, com aplicação de medida de acolhimento residencial em IPSS, assim como também foi alvo de intervenção no âmbito tutelar educativo_ - beneficiou ainda de acompanhamento pedopsiquiátrico, por lhe ter sido diagnosticada perturbação de hiperatividade com défice de atenção, que abandonou sem alta clínica; - o arguido habilitou-se com o 9º ano de escolaridade, mediante a realização de um curso profissional, iniciando percurso profissional na área de lavagem/limpeza de vidros; - iniciou o consumo de haxixe na fase da adolescência com carácter diário, mantendo consumos ocasionais, assim como consumos de bebidas alcoólicas, em contexto recreativo, até à sua reclusão; - beneficiou de duas suspensões provisórias de processo, que cumpriu; - sempre integrou o agregado familiar de origem, tendo encetado relação afectiva, da qual resultou um descendente atualmente com 1 ano de idade; - o arguido encontra-se preso preventivamente, à ordem dos autos e tem registadas várias sanções disciplinares, a última das quais datada de 19/12/2023; - não se encontra integrado em nenhuma actividade estruturada (escolar, formativa ou profissional), uma vez que não manifesta motivação para esse efeito; e - beneficia de rectaguarda familiar, sendo que os progenitores e a irmã são coarguidos nos presentes autos.
E, quanto ao arguido recorrente BB: - à data da factualidade integrava intermitentemente o agregado familiar constituído pela companheira e pelos dois filhos (todos co-arguidos), mantendo residência formal no apartamento camarário originariamente titulado pela mãe, falecida em 2020; - as dinâmicas familiares indiciavam instabilidade, em especial no eixo conjugal, com sucessivas separações e reconciliações; - o arguido tem um filho mais novo, gerado fora desta relação; - com habilitações escolares ao nível do 6º ano, BB teve uma trajetória laboral irregular e marcada por informalidade, sendo que o futebol foi assumido pelo arguido como prioritário na sua vida; - os seus rendimentos pessoais proviriam da prática desportiva (ajudas de custo), de trabalhos informais e do RSI; - o arguido considera a sua vida como “muito boa”, baseada na prática desportiva regular (futebol e ginásio), no convívio social com os amigos e na participação nas atividades da claque, que integrará desde 2010; - BB desvaloriza as condenações anteriores, circunscrevendo-o a incidentes contingenciais à atividade desportiva e da claque e relacionados com condução sem habilitação legal.
Aqui chegados, logo se vê, pois, que, da leitura da fundamentação de direito, da decisão recorrida, no que à determinação da medida concreta da pena concerne, percebe-se qual o processo mental seguido pelo Tribunal a quo para concluir no sentido das penas concretas aplicadas. Impõe-se, pois, concluir que a decisão recorrida cumpre suficientemente com as exigências de fundamentação, vertidas no nº 2, do art. 374.º, n.º 2, do C.P.P.. Portanto, por todo o exposto, analisado o texto da decisão recorrida, na sua fundamentação de direito atinente à medida concreta da pena, não se constata a invocada nulidade consubstanciada na falta de fundamentação, nos termos previstos nos arts. 374.º, nº 2 e 379.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código de Processo Penal. Improcedendo, pois, nesta parte, os recursos dos arguidos AA e BB. *
Ora, desde logo, no tocante à circunstância de o arguido recorrente CC não conhecer a vítima OO, antes dos factos, ao contrário do alegado, a mesma não só acolheu apreciação como foi levada à factualidade apurada pelo Tribunal a quo – vd ponto 77) dos factos provados. Quanto às demais circunstâncias apontadas pelo arguido recorrente CC, por si abordadas na sua contestação e não levadas ao elenco factual da decisão recorrida, sublinha-se que as mesmas não consubstanciam senão meros elementos pontuais, parcelares, meramente circunstanciais, descritivos de uma versão que globalmente não foi acolhida pelo Tribunal a quo, por não ter merecido credibilidade a sua alegação pelo arguido recorrente, no âmbito da prestação das suas declarações. Impõe-se, pois, concluir pela não verificação, in concreto, da nulidade invocada, decorrente da violação do disposto na al. c), do n.º 1, do artigo 379.º do CPP. Assim e sem necessidade de demais considerandos, improcede este segmento recursivo, invocado pelo arguido recorrente CC. *
Vieram as arguidas recorrentes DD, EE e FF aduzir que a decisão recorrida carece de fundamentação de facto, relativamente à matéria factual apurada descrita nos pontos 21, 22, 23, 24 e 28. Cumpre apreciar. Antes de mais, recorda-se aqui, em suma, o que já supra se expendeu [no âmbito da análise dogmática da nulidade da decisão, levantada nos recursos dos arguidos AA, BB e CC], quanto à invocada nulidade por falta de fundamentação da decisão, nos termos dos arts. 374º, nº 2 e 379º, do CPP, dando-se aqui por reproduzido o que mais ali se expôs, para evitar repetições, que em nada abonam à eficaz leitura do presente aresto pelos seus principais destinatários. Como dissemos, o citado artigo 379º estabelece um regime específico das nulidades da sentença. Assim, de acordo com as três alíneas do seu nº 1, é nula a sentença penal quando, não contenha as menções previstas no nº 2 e na alínea b) do nº 3 do art. 374º, quando condene por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, fora dos casos previstos nos arts. 358º e 359º, e quando o tribunal omita pronúncia ou exceda pronúncia. As recorrentes na invocação que fazem da nulidade trazem à liça o disposto no número 2 do artigo 374º. O dever de fundamentação das decisões judiciais é hoje um imperativo constitucional, dispondo o art. 205º, nº 1, da Lei Fundamental que, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei. A fundamentação deve conter as razões da bondade da decisão, permitindo que ela se imponha, dentro e fora do processo, sendo uma exigência da sua total transparência já que através dela se faculta aos respectivos destinatários e à comunidade, a compreensão dos juízos de valor e de apreciação levados a cabo pelo julgador. A fundamentação da sentença penal, como decorre desta norma, é composta por duas vertentes: uma delas consiste na enumeração dos factos provados e não provados e outra consiste na exposição, concisa, mas completa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que contribuíram para a formação da convicção do tribunal. Consiste pois, tal fundamentação, na exposição dos motivos de facto (motivação sobre as provas e sobre a decisão em matéria de facto) e de direito (enunciação das normas legais que foram consideradas e aplicadas) que determinaram o sentido («fundamentaram») a decisão. No que tange à exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão (que concretamente é a que ora nos ocupa), trata-se de enunciar de forma concisa as provas que serviram para fundar a convicção alcançada pelo tribunal – sem que tal tenha de passar no que tange à prova por declarações pela assentada dos depoimentos produzidos em audiência – bem como de proceder a uma análise crítica de tais provas. Esta análise crítica deve consistir na explicitação do processo de formação da convicção do julgador, concretizada na indicação das razões pelas quais, e em que medida, determinado meio de prova ou determinados meios de prova, foram valorados num certo sentido e outros não o foram, ou seja, a explicação dos motivos que levaram o tribunal a considerar certos meios de prova como idóneos e/ou credíveis e a considerar outros meios de prova como inidóneos e/ou não credíveis, e, ainda, na exposição e explicação dos critérios, lógicos e racionais, utilizados na apreciação efectuada (neste sentido, Ac. da Relação de Lisboa, de 18/1/2011, em que foi Relator o Juiz Desembargador Vasques Osório).
Ora, baixando ao caso e analisando a motivação de facto do Tribunal recorrido, no que à matéria factual indicada pelas arguidas recorrentes concerne, logo se conclui que aquela, não sendo sobejante, é suficiente, tendo o Tribunal a quo logrado explicar a formação do processo mental que percorreu, tal como o exige o supracitado nº 2, do art. 374º, do C.P.P., até chegar à decisão que tomou quanto àquela matéria factual. O Tribunal a quo, conjugada toda a prova que foi produzida em audiência, nos moldes que ficaram descritos na respectiva motivação, convenceu-se que tal factualismo resultou provado, explicitando as razões da sua convicção, explicando o juízo que formou sobre a credibilidade ou falta de credibilidade das declarações/depoimentos prestados em audiência, até chegar à decisão que tomou quanto ao tratamento a dar a tal elenco factual e fê-lo de forma que se percebe, tornando, assim, o processo de decisão transparente. Do que se expôs, impõe-se concluir que não padece, pois, a decisão recorrida, da invocada falta de fundamentação, nos termos preconizados pelo n.º 2 do art.º 374.º e al. a), do nº 1, do art. 379.º, do CPP. Improcedem, assim, neste segmento, os recursos das arguidas DD, EE e FF. »
Cumpre, ora, analisar se a decisão recorrida padece de um qualquer vício decisório, sendo certo que e ainda que sendo de conhecimento oficioso, vieram os arguidos AA, BB e CC invocar os vícios previstos nas als. a) e b) e, o arguido CC também na al. c), do nº 2, do art. 410º do CPP, relativamente à seguinte matéria factual que impugnaram: - arguido recorrente AA: quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 25, 34, 35, 36, 37 e 38; - arguido recorrente BB: quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 25, 34, 35, 36, 37, 38; e - arguido recorrente CC: quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 7, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 25, 34, 35, 36, 37 e 38: Vejamos. Em processo penal, por vezes, nos recursos faz-se uma inadequada abordagem do que seja o recurso da matéria de facto, pois que o recurso em tal vertente apenas pode ser interposto, com potencialidade para ter êxito, pela via do recorte no texto decisório de algum dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2 do Código de Processo Penal (que, aliás, como se sabe, até podem ser apreciados oficiosamente), ou, como via também possível prevista na lei (artigo 431º, alínea b) daquele código), se a prova tiver sido impugnada nos termos do artigo 412º, nº 3. Efectivamente, como vem sendo unanimemente defendido na jurisprudência a matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: através do âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal ou mediante a impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.ºs 3, 4 e 6, do referido diploma legal. 1) No primeiro caso estamos perante a arguição dos vícios formais, também designados de vícios decisórios, que se encontram previstos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, que, conforme decorre do referido preceito legal, devem resultar do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, não se estendendo, pois, a outros elementos, nomeadamente que resultem do processo, mas que não façam parte daquela decisão, sendo, portanto, inadmissível o recurso a elementos àquela estranhos para o fundamentar, como por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento[5]. Tratam-se, portanto, de vícios intrínsecos da sentença que visam o erro na construção do silogismo judiciário. São, tais vícios, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação da prova (als. a), b) e c), do nº 2, do citado art. 412º, do CPP. A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo Penal, ocorrerá quando a matéria de facto provada seja insuficiente para fundamentar a decisão de direito e quando o tribunal não investigou toda a matéria de facto com interesse para a decisão – diga-se, contudo, que este vício reporta-se à insuficiência da matéria de facto provada para a decisão de direito e não com a falta de prova para a decisão da matéria de facto provada. Trata-se de uma insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito, de um “vício de confecção da matéria de facto”, (…) impeditivo de bem se decidir, tanto no plano objectivo como subjectivo, o julgador quedou –se por uma investigação lacunar, deixou de indagar factos essenciais à decisão de direito, figurando na acusação, defesa ou resultantes da decisão da causa, impedindo de bem decidir no plano do direito, comprometendo a conclusão final do silogismo judiciário”. A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, vício previsto no artigo 410º, n.º 2, al. b) do Código de Processo Penal, consiste na incompatibilidade, insuscetível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão. O que ocorre quando um mesmo facto com interesse para a decisão da causa seja julgado como provado e não provado, ou quando se considerem como provados factos incompatíveis entre si, de modo a que apenas um deles pode persistir, ou quando for de concluir que a fundamentação conduz a uma decisão contrária àquela que foi tomada. Finalmente, o erro notório na apreciação da prova, vício previsto no artigo 410º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Penal, verifica-se quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente percebe que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efetuou uma apreciação manifestamente incorreta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios. O erro notório também se verifica quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das legis artis. Trata-se de um erro de raciocínio na apreciação das provas que se evidencia aos olhos do homem médio pela simples leitura da decisão, e que consiste basicamente, em decidir-se contra o que se provou ou não provou ou dar-se como provado o que não pode ter acontecido. “Com a invocação do vício de erro notório questiona-se, não o conteúdo da prova em si, nomeadamente do que foi dito no depoimento ou nas declarações prestadas, cujo teor se aceita, mas a utilização que foi dada à referida prova, no sentido de a mesma suportar a demonstração de um determinado facto, na medida em que o tribunal valorizou a prova contra as regras da experiência comum ou contra critérios legalmente fixados ou então quando da decisão se extrai de modo óbvio que optou por decidir, na dúvida, contra o arguido”. Resumindo, “o erro notório traduz-se, basicamente, em se dar como provado algo que notoriamente está errado, que não pode ter acontecido, ou quando determinado facto é incompatível ou contraditório com outro facto positivo ou negativo”. Tal erro já não se verifica se a discordância resulta da forma como o tribunal teria apreciado a prova produzida – o simples facto de a versão do recorrente sobre a matéria de facto não coincidir com a versão acolhida pelo tribunal não conduz ao referido vício[. Importa, porém, não esquecer, quando a este vício – erro notório na apreciação da prova – que, salvo no caso de prova vinculada, o tribunal aprecia a prova segundo as regras da experiência e a sua livre convicção, tal como o dispõe o artigo 127.º do Código de Processo Penal. Rege, pois, o princípio da livre apreciação da prova, significando este princípio, por um lado, a ausência de critérios legais predeterminados de valor a atribuir à prova [salvo exceções legalmente previstas, como sucede com a prova pericial] e, por outro lado, que o tribunal aprecia toda a prova produzida e examinada com base exclusivamente na livre convicção da prova e na sua convicção pessoal. O que sempre se impõe é que explique e fundamente a sua decisão, pois só assim é possível saber se fez a apreciação da prova de harmonia com as regras comuns da lógica, da razão e da experiência acumulada, sempre sem esquecer que a liberdade conferida ao julgador na apreciação da prova não visa criar um poder arbitrário e incontrolável. Por fim, relembre-se, os erros da decisão, para poderem ser apreciados ou mesmo conhecidos oficiosamente, devem detectar-se, sem esforço de análise, a partir do teor da própria sentença, sem recurso a elementos externos como seja o cotejo das provas disponíveis nos autos e/ou produzidas em audiência de julgamento.
2) No segundo caso estamos perante um erro do julgamento [designadamente na apreciação da prova] cuja apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova produzida em audiência de julgamento, sempre tendo presente os limites fornecidos pelo recorrente em obediência ao ónus de especificação imposto pelos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal. Como realçou o STJ, no acórdão de 12-06-2008[6], a sindicância da matéria de facto, na impugnação ampla, ainda que se debruçando sobre a prova produzida em audiência de julgamento, sofre quatro tipos de limitações: - a que decorre da necessidade de observância pelo recorrente do mencionado ónus de especificação, pelo que a reapreciação é restrita aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, sendo necessário que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam; - a que decorre da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o «contacto» com as provas ao que consta das gravações; - a que resulta da circunstância de a reponderação de facto pela Relação não constituir um segundo/novo julgamento, cingindo-se a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso; - a que tem a ver com o facto de ao tribunal de 2ª instância, no recurso da matéria de facto, só ser possível alterar o decidido pela 1ª instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida [al. b), do nº 3, do citado artigo 412.º do Código de Processo Penal]. Não se poderá esquecer, portanto, que o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, agora com base na audição das gravações, antes constituindo um mero remédio jurídico com vista a colmatar erros do julgamento na forma como apreciou a prova, na perspectiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente, sendo, portanto, manifestamente errado pensar que basta ao recorrente formular discordância quanto ao julgamento da matéria de facto para o tribunal de recurso fazer «um segundo julgamento», com base na gravação da prova. Tem sido este o sentido defendido quer pela doutrina, quer pela jurisprudência. Assim, refere Germano Marques da Silva[7] que “o poder de cognição do Tribunal da Relação, em matéria de facto, não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento e faça tábua rasa da livre apreciação da prova, da oralidade e da imediação, apenas constitui remédio para os vícios do julgamento em 1ª instância”. No mesmo sentido se pronuncia Damião Cunha[8], ao afirmar que os recursos são entendidos como juízos de censura crítica e não como «novos julgamentos». “O recurso de facto para a Relação não é um novo julgamento em que a 2ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes se deve afirmar que os recursos, mesmo em matéria de facto, são remédios jurídicos destinados a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros[9].
Transpondo estes ensinamentos para a situação in casu, constata-se, desde logo, que os arguidos recorrentes AA, BB e CC confundem, na sua quase globalidade, os vícios decisórios previstos nas als. a), b) e c) do nº 2, do art. 410º do CPP, com o erro de julgamento, previsto no nº 3, do art. 412º do mesmo diploma legal. Relembramos que a apreciação dos vícios decisórios não implica qualquer sindicância à prova produzida no tribunal de 1ª instância – estando excluída qualquer tarefa de valoração da prova produzida em audiência ou fora dela, tal como a valoração de depoimentos gravados, de documentos ou outro tipo de provas -, apenas envolvendo o texto da decisão recorrida, na sua globalidade, sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, ainda que constem do processo. Em face do teor do texto da decisão, apenas as regras de experiência comum podem, se necessário, servir de critério de aferição da existência, ou não, de tais vícios. Sendo de salientar o retrato feito no Acórdão do STJ de 15/12/2011 do relator Raúl Borges (no processo 17/09.0TELSB.L1.S1 em www.dgsi): “(...)Os vícios do art. 410º, nº 2, do CPP, são vícios da lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que tornam impossível uma decisão logicamente correcta e conforme à lei (…) O objecto da apreciação será sempre a decisão e não o julgamento”. Vejamos, então. O arguido AA não concretizou a invocação de tais vícios. O arguido BB concretiza a invocação do vício previsto na al. a) do normativo citado (vd. pontos CI a CVI das suas conclusões recursivas), alegando que não matou o OO nem contribuiu para esse infeliz acontecimento, não existindo matéria suficientemente segura para poder condenado o arguido nos moldes em que o foi. O arguido CC concretiza a invocação dos vícios previstos nas als. a), b) e c) do normativo citado (vd. pontos 53 a 62 das suas conclusões recursivas), alegando existir, desde logo, uma contradição insanável entre os pontos 1 e 77 da matéria de facto, porquanto naquele se dá como provado que o recorrente, juntamente com os arguidos AA, BB, DD e EE mantinham um clima de conflito com OO e, neste, é referido que o recorrente não conhecia a vítima. Por outro lado, alega o arguido recorrente CC ter ficado patente dos depoimentos das testemunhas que não ocorreu qualquer esfaqueamento na faixa de rodagem da Alameda ..., assim como que aquele tenha observado qualquer esfaqueamento. E mais alega que, na motivação dos factos, o Tribunal a quo refere expressamente que o recorrente e o arguido BB dominam a vítima, enquanto o arguido AA fazendo uso de uma faca esfaqueia o OO, considerando tal conclusão desfasada da realidade e dos depoimentos das testemunhas, havendo erro notório na apreciação da prova, assim como insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada.
Atentemos, antes de mais, ao invocado (pelo recorrente CC) vício de contradição entre o ponto 1 e o ponto 77 dos factos provados Reza assim o ponto 1 dos factos provados: “(…) 1- Desde o início do ano de 2022 que o arguido AA, o seu agregado familiar, constituído pelos arguidos BB, seu progenitor, DD, sua progenitora, e EE, sua irmã, e CC, companheiro da sua tia paterna (QQ), mantinham um clima de conflito com OO.(…)” E, por sua vez, reza assim o ponto 77 daquele mesmo elenco, onde se descreve o relatório social do arguido CC: “(…) 77- (…) Não conhecia a vítima, apenas os coarguidos BB e DD seus cunhados, AA e EE seus sobrinhos, com quem não mantém um relacionamento próximo, sendo o quotidiano centrado na atividade laboral e convívio familiar. (…)” Com interesse para a análise a que ora se procede, veja-se o que a este propósito refere a decisão recorrida, em sede de motivação da decisão de facto: “(…) De toda a prova resultou manifestamente a existência de um ambiente absolutamente hostil e violento entre a vítima OO e a família do arguido BB desde pelo menos o início do ano. Inicialmente entre os filhos deste e posteriormente, como resulta da agressão no Estádio 1... e das mensagens de fls. 472 e ss., estendendo-se ao próprio e ao arguido CC. A agressão ocorrida horas antes no Estádio 1... (onde se encontravam os três arguidos: BB, AA e EE) e a troca de mensagens e chamadas que se seguiu (seja entre a vítima e a testemunha ZZ, seja entre o arguido BB e o arguido CC e as demais deste designadamente com a arguida EE) são demonstrativas da animosidade e da agressividade que pairava e da ansia de vingança. (…)” Ora, vistos os segmentos acima transcritos, da decisão recorrida, efectivamente constata-se uma deficiência na redacção do ponto 1 dos factos provados. Há uma infelicidade na redacção do texto, pela diversidade das fontes, tendo-se o Tribunal recorrido limitado a reproduzir, no ponto 77, o que consta do relatório social, sem cuidar de atentar a um qualquer desacerto que dali pudesse provir com o restante elenco factual. Da leitura do segmento acima transcrito da motivação de facto da decisão recorrida, constata-se que igual deficiência ali se repete, percebendo-se a técnica de redacção (imperfeita) usada pelo Tribunal a quo. É que, da leitura da frase que se lhe segue, percebe-se que o Tribunal a quo, primeiro, generalizou, para depois especificar, ou seja, começou por referir que de toda a prova resultou manifestamente a existência de um ambiente absolutamente hostil e violento entre a vítima OO e a família do arguido BB desde pelo menos o início do ano, especificando, depois, que tal ocorreu, inicialmente entre os filhos do arguido BB e a vítima e posteriormente, localizando já na agressão no Estádio 1..., estendeu-se também ao arguido BB e ao arguido CC. Ocorre que tal especificação feita na motivação de facto, extraída da inicial generalização, não consta da redacção do ponto 1 dos factos provados, o que, admite-se, pode gerar alguma confusão de interpretação [isto não obstante tal especificação se poder descortinar da redacção dos pontos factuais apurados que se lhe seguem, mormente os nºs. 2 a 7…]. No entanto, tal falha de redacção da decisão recorrida não carrega o peso da patologia invocada pelo arguido recorrente CC (vício de contradição insanável). É que, sendo perceptível, pela simples leitura do texto da decisão, que houve um claro lapso de escrita e/ou ambiguidade da redacção, susceptível de ser suprido/eliminado pelo tribunal de recurso, através do expediente previsto no art. 380º do CPP, será neste patamar que tal deficiência deverá ser colocada. Correcção esta que o tribunal ad quem pode e deve efectuar para deixar de persistir tal aparente contradição. Assim, corrigindo o ponto nº 1 dos factos provados, ao abrigo do disposto no art. 380º, nº 2, do CPP, passará o mesmo a ter a seguinte redacção: “Desde o início do ano de 2022 que o arguido AA e o seu agregado familiar, constituído pelos arguidos BB, seu progenitor, DD, sua progenitora, e EE, sua irmã, e CC, companheiro da sua tia paterna (QQ), mantinham um clima de conflito com OO, o qual se iniciou entre o AA e a EE e posteriormente, se estendeu aos restantes familiares.” O que é por dizer que, quando o conflito se estendeu ao arguido recorrente CC, este não conhecia (pelo menos pessoalmente) o falecido OO. Note-se que, da leitura da decisão recorrida, resulta patente que foi, aliás, nesta perspectiva que sempre laborou o Tribunal recorrido, em termos de análise de facto e de direito. Improcede, pois, a invocação do vício da contradição insanável, quanto ao apontado ponto factual, o qual vai corrigido, por este Tribunal de recurso, nos moldes acabados de expor. Quanto à demais argumentação dos arguidos recorrentes, AA, BB e CC, na invocação dos vícios decisórios, logo ressalta que a mesma implica uma incursão na análise da prova, o que, como já sobejamente se esclareceu, está vedado, na análise dos vícios decisórios.
Por todo o exposto, percorrido todo o manancial fáctico apurado e considerando a apreciação jurídica que o Tribunal a quo veio a formular, não se descortina, desde logo, qualquer insuficiência na matéria de facto provada, para fundamentar a decisão jurídica, tendo o tribunal investigado toda a matéria de facto essencial, com interesse e pertinência para a decisão de direito. Não se constata qualquer lacuna na “confecção da matéria de facto”, seja no plano factual objectivo, seja no plano factual subjetivo, que tenha, no momento posterior, da fundamentação jurídica, impedido o julgador de decidir. De igual forma também não se constata qualquer contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, ou seja, qualquer incompatibilidade entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão. E, bem assim, igualmente não se constata qualquer erro notório de apreciação ou de raciocínio, qualquer asserção contrária às regras da experiência comum ou qualquer juízo ilógico, arbitrário ou contraditório. Não vislumbramos, pois, na análise da decisão recorrida, onde é que exista qualquer uma daquelas patologias, razão porque se impõe concluir que a decisão recorrida não padece de qualquer um dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP..
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Vieram também os arguidos recorrentes AA, BB e CC invocar o erro de julgamento nos termos que seguem: Veio o arguido recorrente AA argumentar que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 25, 34, 35, 36, 37 e 38, fazendo uma incursão pela análise da prova produzida em audiência. Por sua vez, veio também o arguido recorrente BB argumentar que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 25, 34, 35, 36, 37, 38, fazendo igualmente uma incursão pela análise da prova produzida em audiência. E veio também o arguido recorrente CC argumentar que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento quanto aos factos dados como provados sob os nºs. 1, 7, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 25, 34, 35, 36, 37 e 38, fazendo uma incursão pela análise da prova produzida em audiência. Vejamos. Antes de mais, permitimo-nos, aqui, para evitar repetições, sempre fastidiosas e desnecessárias, remeter para o que supra já se expendeu quanto à abordagem dogmática dos vícios decisórios e erro de julgamento e sua frequente confusão, no âmbito dos recursos. Analisaremos, então, ora, a matéria factual que os arguidos recorrentes impugnam, à luz do erro de julgamento. Para o Tribunal de recurso poder reexaminar a prova produzida em audiência de julgamento, com vista a aferir se foi ou não produzida prova suficiente para se concluir no sentido daquela factualidade que indica, só o poderá por via da análise do erro de julgamento, previsto no art. 412.º, nº 3, do Código de Processo Penal. Rezam assim os nºs. 1, 3 e 4 do referido normativo: “1 - A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. (…) 3 - Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas. 4 - Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação (…). A especificação dos «concretos pontos de facto» traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorretamente julgados. A especificação das «concretas provas» só se satisfaz com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essas «provas» impõem decisão diversa da recorrida. Finalmente, a especificação das provas que devem ser renovadas implica a indicação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em 1.ª instância cuja renovação se pretenda, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal e das razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo [cfr. artigo 430.º do Código de Processo Penal].
No caso, como dissemos supra, da leitura das peças recursivas dos arguidos AA, BB e CC, maxime das suas conclusões, e bem assim, também das respectivas motivações, depreende-se que os mesmos pretendem lançar mão da impugnação ampla da matéria de facto. Para o efeito, impõe-se o cumprimento do ónus de impugnação especificada, vertido no nº 3, do art. 412º do CPP. Os recorrentes, entendendo que o Tribunal a quo não apreciou devidamente a prova, para além da indicação da matéria fáctica que consideram incorrectamente julgada (o que fizeram, indicando os pontos da matéria de facto atrás referidos), teriam também que especificar as concretas provas que impunham decisão diversa da recorrida e que indicar, tendo a prova sido gravada, as concretas passagens em que se funda a impugnação. Ora, in casu, e quanto a esta última exigência, ainda que os arguidos recorrentes não o tenham feito na íntegra, no âmbito das respectivas conclusões recursivas, pois que apenas o arguido recorrente AA indicou, naquela sede, algumas daquelas concretas passagens da gravação (vd. pontos conclusivos LXXXIV, XCI e CXLI), certo é que o fizeram integralmente nas respectivas motivações, pelo que se aceitará a opção por tal técnica, que, no entender deste Tribunal ad quem, se revela mais consentânea com o pleno respeito pelo exercício do direito constitucional ao recurso (resultando, em nosso entender, in concreto, um eventual convite à correcção das conclusões para nelas fazer constar aqueles elementos que se encontram integralmente nas motivações, um caminho intoleravelmente formal, que iria alongar, ainda mais, o processo, tanto quanto é certo que nele se encontram presos preventivamente três arguidos, desde Maio e Junho de 2022). Iremos, pois, considerar cumprido o exigido ónus de impugnação especificada, quanto a todos os arguidos.
Ocorre que, ouvida, por este Tribunal ad quem, a gravação da prova produzida em audiência, e analisada a fundamentação de facto do Tribunal recorrido, resulta clarividente, ao contrário do defendido pelos recorrentes AA, BB e CC que, da motivação da matéria de facto provada decorre com clareza e limpidez a razão pela qual o Tribunal a quo deu como provada a matéria factual descrita naqueles controvertidos pontos factuais indicados - 1, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 25, 34, 35, 36, 37 e 38 (pelo AA); 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 25, 34, 35, 36, 37, 38 (pelo BB) e 1, 7, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 25, 34, 35, 36, 37 e 38 (pelo CC), explicando, de forma lógica, racional e plausível, porque assim o fez. Da audição de toda a prova testemunhal produzida em audiência, destacamos os depoimentos das seguintes testemunhas: - SS, presente no local, que descreveu o momento em que a vítima OO foi surpreendida pelas costas pelo arguido AA, aquando da subida pela Alameda, altura em que estavam a ir embora, tendo aquele tentado fugir, sendo seguido pelo arguido AA, acabando por se aperceber, quando este alcançou aquele, de dois movimentos que identificou como facadas, e que pensa que terão atingido a zona do peito, atenta a posição em que estavam, tendo, entretanto, o arguido BB agarrado o OO, começando todos a bater-lhe, dizendo que eram muitos, mas na escuridão não conseguiu identificar mais ninguém, nem o que em concreto faziam; - ZZ, namorada da vítima, presente no local, que descreveu o cenário que conseguiu percepcionar, de grande confusão e perseguição ao OO, deixando claro que não assistiu a todos os acontecimentos (o que só abona em favor da sua credibilidade), logrando descrever uma agressão do arguido BB ao OO, desferindo-lhe um soco, e afirmou claramente ter visto o arguido AA a esfaqueá-lo; - BBB, que estava na companhia da ZZ, a qual, ainda que algo desmemoriada (ou receosa…), permitiu, ao menos, dar suporte a algumas das descrições esta última, confirmando os seus passos e a capacidade de percepção do que se estava a passar; - TT, presente no local, que viu a vítima a ser alcançada pelo arguido CC, que o agarrou nas pernas, e pelo arguido BB, que logo lhe desferiu murros na cabeça. Acabou também por ser agredido, com um murro, pelo arguido CC, quando tentou ajudar o OO; viu também o arguido AA a desferir uma facada nas costas do OO; confrontado com as declarações em inquérito, ao abrigo do disposto no art. 356º do CPP, acabou por “relembrar” também os pontapés que o arguido BB desferiu sobre a vítima; - YY, presente no local, na companhia da vítima e das testemunhas SS, UU e KK, descreveu um momento em que, quando aqueles se estavam a ir embora do estádio, ouviu gritos e se apercebeu do AA a espetar uma faca ao OO. Que viu o mesmo a fugir para o jardim, tendo sido perseguido pelo AA, com a referida faca na mão, e por outras pessoas. Que viu o CC a agarrar o corpo do OO e o BB sem camisola e com as mãos cheias de sangue; - AAA, presente no local, que disse que, a dada altura, ouviu gritar “sai da frente”, viu o OO a fugir, acabando por ver os arguidos AA e BB e outras pessoas à volta do OO, estando o primeiro com uma faca na mão; viu, então, o arguido AA fazer um gesto de esfaqueamento de cima para baixo em direcção ao peito daquele, com um pequeno objecto na mão, e que apesar de não conseguir descortinar a sua natureza, não teve dúvidas pelo movimento que era uma faca, até porque viu uma lâmina; - UU, presente no local, com o OO e outros, referiu que depois de uma discussão junto ao ponto de venda da «...», voltaram para a zona onde inicialmente tinham estado, mas que rapidamente decidiram ir embora, seguindo em direção à Alameda. A dada altura, o OO começou a correr, acabando por ser interceptado pelo BB, AA e CC e por outras pessoas que não conseguiu identificar. A testemunha percebeu que o OO estava a ser agredido, naquele contexto, sem conseguir melhor descrever, dada a confusão. Viu o OO a fugir para o jardim. Quando conseguiu aproximar-se deste, já só estavam com ele o BB e o CC. Que o primeiro ainda lhe desferia pontapés e dizia que podiam vir «os amigos». Que se apercebeu do AA a fugir e que, de seguida, o pai deste (sem camisola) também o fez. Que viu que o AA transportava algo na mão, mas não conseguiu precisar que tipo de objecto; - CCC, presente no local e que não conhecia nenhuma das partes envolvidas, referiu que, a dada altura, apercebeu-se de uma confusão e de um indivíduo a subir a Alameda, com um grupo de indivíduos atrás dele, acabando por ser agarrado por três indivíduos, que o agrediram mesmo quando este já tinha caído; - HHHH, presente no local e que não conhecia nenhuma das partes envolvidas, referiu ter visto um grupo de pessoas a fugir e um indivíduo de casaco preto a dizer «basai», perante um rapaz inanimado no chão; - XX, presente no local, referiu que, a determinada altura viu várias pessoas, entre as quais, o BB, o CC e um outro indivíduo que envergava uma camisola azul, a agarrar o OO, tendo-se apercebido de movimentos de braço que pareciam de esfaqueamento.
A factualidade apurada e impugnada pelos arguidos, como resulta claro da motivação do Tribunal a quo, resulta da conjugação de todos estes depoimentos e sua intersepção com demais prova apresentada em audiência, maxime as filmagens obtidas e seus fotogramas [vistos sequencialmente, permitindo, em imagem dinâmica, sustentar o descrito pelas testemunhas consideradas credíveis pelo Tribunal recorrido, conciliando-se com os seus depoimentos], e a prova pericial, tudo devidamente sindicado por este Tribunal de recurso. E, como bem referiu o Tribunal recorrido, no âmbito da sua motivação de facto: “ A partir destes meios de prova e com recurso a eles e ainda quanto à prova que se produziu quanto aos antecedentes deste acontecimento (designadamente imagens de vídeo imagens Estádio 1..., relativos aos acontecimentos na tarde do dia 7/5/2022, no Estádio 1... - Luz Câmaras 245 e 251) e mensagens acima referidas, pôde construir-se o encadeamento dos factos, nos termos constantes dos factos provados”. De notar que ainda que, pontualmente, aqui e ali, tivesse ocorrido uma ou outra imprecisão por parte de uma ou outra testemunha - como com a descrição do vestuário do arguido AA, ou com a alusão do sentido ascendente ou descendente da alameda, entre outros factos meramente circunstanciais – tal não afecta ou inquina (como muito interessadamente o pretendem os arguidos recorrentes), de forma alguma, a credibilidade dos depoimentos, antes lhes imprime realidade, o que sustenta a sua credibilidade. Temos que ter presente que resultou claro que os factos ocorreram num momento de grande festejo desportivo do ..., à noite, destacando-se a enorme confusão no local, ao qual acorreu uma multidão de adeptos. Acresce que foi patente, nos depoimentos de algumas testemunhas, algum receio, por vezes mascarado em invocados desmemoriamentos, o que lhes terá impedido de ser mais claros, ou até de “irem mais além”, em alguns momentos dos seus depoimentos, mas que, mesmo assim, permitiram ao Tribunal a quo e, agora, ao Tribunal ad quem, construir o quadro fáctico certo e seguro, no qual decorreu a prática dos factos que conduziram à morte do OO. Sublinha-se que a afirmação, por parte da testemunha TT, de ter visto duas facas, a que o AA possuía e outra, na posse de um indivíduo que fugiu com este a correr (de tronco nu), conjugada com a afirmação da testemunha UU, de ter visto o AA a fugir e que, de seguida, o pai deste (sem camisola) também o fez, permite concluir que era o arguido BB a pessoa que foi vista a fugir com o arguido AA. No que concerne às declarações dos arguidos AA, BB e CC, e, bem assim, aos depoimentos das testemunhas seus amigos e familiares, que os secundaram em audiência, resulta clarividente a sua inidoneidade para criar o mínimo de credibilidade, quer por se revelarem, em si mesmos, inverosímeis, quer por colidirem frontalmente com a versão acusatória, que obteve adesão de prova, nos moldes sobreditos. Veja-se a afirmação do Tribunal a quo, a dado momento da sua motivação de facto: “Como se vê das declarações dos arguidos prestadas em audiência de julgamento, como das prestadas em sede de interrogatório judicial, lidas em julgamento, nenhum dos arguidos esclarece o momento em que concretamente são desferidas as 18 facadas, apenas o arguido AA admitindo o desferimento de uma única, mas sempre invocando uma razão de defesa do arguido BB para o fazer, a qual, como adiante se verá da prova testemunhal, não existiu.” A versão dos arguidos, quer em sede de 1º interrogatório judicial, quer em sede de audiência de julgamento e quer nesta sede recursiva, foi sempre de um “empurrar de culpas” para a vítima mortal, com invocação de uma legítima defesa manifestamente inexistente do arguido BB e de um quase desconcertante “alibi”, com a invocação de um pretenso desaparecimento de uma tal WW [este a desafiar as mais elementares regras da normalidade e da lógica], tudo inidóneo a criar credibilidade, em si mesmo e por colidir frontalmente com tudo o que resultou da prova credível produzida em audiência.
Portanto, pelo que se expôs, só pode este Tribunal de recurso concluir que a análise crítica da prova produzida em audiência é inegável, sendo que o grau de credibilidade, ou de descrédito, atribuído à mesma mostra-se devidamente exposto e motivado, de acordo com a percepção própria permitida pelo imediatismo que acompanhou a produção daqueles meios de prova. Expuseram os referidos arguidos recorrentes, no âmbito das respectivas conclusões recursivas, a sua própria leitura da prova produzida em audiência, extraindo da mesma o seu entendimento que nenhuma prova se fez no sentido da matéria factual que impugnou, ou, pelo menos, no mínimo, não ultrapassou a dúvida, o que deveria levar à sua absolvição. Ocorre que não foi esse o entendimento do Tribunal recorrido. Resulta, com clarividência, que as declarações negatórias dos arguidos não lograram criar credibilidade ao Tribunal recorrido, antes pelo contrário, foram manifestamente contraditadas pelos depoimentos testemunhais reputados credíveis, indicados na fundamentação de facto. O Tribunal a quo valorou as provas constituendas de acordo com o que lhe pareceu ser a credibilidade emanada pelos depoimentos das testemunhas ali mencionadas, explicitando o processo lógico subjacente à formação da sua convicção para dar como assente a factualidade que deu como provada. É, pois, manifesto, que os referidos arguidos recorrentes não lograram demonstrar, em recurso, que a decisão do Tribunal a quo se mostra desajustada ou incoerente face à prova produzida no julgamento e, neste sentido, não demonstraram a existência de provas produzidas em audiência, que impusessem decisão diversa da que foi tomada pelo Tribunal recorrido. Foi mormente notório o esforço dos arguidos recorrentes, face à importância da testemunha para a descoberta da verdade material, para colocar em causa a credibilidade conferida pelo Tribunal a quo ao depoimento testemunhal prestado por ZZ, namorada da vítima OO, chamando a atenção para o facto de a mesma (na sessão do dia 29.02.2024, das 9h54 às 11h18, minuto a 27:45 a minuto 27:48), quando expressamente perguntada sobre o local de onde surge a faca que a testemunha diz ter visto na mão do recorrente, ter referido “falou-se qualquer coisa do bolso do casaco, porque no meio daquela escuridão…”. Argumenta o arguido recorrente AA que, com tal resposta, e ainda que não pretendendo colocar em questão a presença de tal testemunha no local, esta revelou “ (…) ainda que de modo sub-reptício, que os factos que ora relata podem não ser os que efetivamente visualizou, sendo antes produto de um qualquer relato que lhe terá sido feito por terceiro, e que esta se dedicou a reproduzir.” Recordemos o que consta da motivação da decisão recorrida, quanto à credibilidade atribuída àquela testemunha, pelo Tribunal a quo [transcrição]: “(…) A testemunha demonstrou consistência no relato da sucessão de acontecimentos – de resto, consentânea, quer com o teor da mensagem de voz de fls. 118 que mandou ao OO a alertá-lo que eles estavam ali e para ir embora, pressentindo pelo comportamento e ânimo do BB a iminência do ataque, quer com as imagens dos vídeos, onde a mesma é vista a seguir o grupo até à Alameda (o que demonstra o conhecimento direto da testemunha sobre o que relatou, certo também que logo a seguir à subida da escadaria admite ter perdido de vista os arguidos). Revelando também seriedade no depoimento, a testemunha assume que, apesar de ter visto o OO ao lado da roulotte, não viu o que se passou na travessia da estrada por causa da quantidade de pessoas, só o voltando a ver na parte central. É certo que a testemunha demonstrou alguma confusão quanto ao vestuário do arguido AA, falando num carapuço azul ou branco e terminando dizendo que era branco. Todavia, tal não é decisivo para retirar credibilidade e consistência à testemunha: a mesma admitiu a dúvida sobre o facto e a verdade é que tal pode mesmo ter sido uma sua convicção subjetiva – note-se que a testemunha disse que já tinha visto uma fotografia do arguido, sendo capaz de o reconhecer e o mesmo vestia um casaco azul com uma faixa larga e branca que pode ter motivado a sua convicção (de resto, quer do relato de outras testemunhas, quer do vídeo da CMTV2 resulta claro e que o arguido AA esteve no local onde o OO ficou). E não se diga que a testemunha não estava no local porque as demais testemunhas a não identificam. Note-se que se tratou de um momento de grande perturbação e transtorno, em que as pessoas estavam e não estavam ou estavam em momentos diferentes e que a presença da testemunha no local era um mero pormenor acessório. De resto, o próprio arguido II refere que viu uma rapariga agarrada à cabeça do OO. Acresce que a testemunha JJJJ, Agente da PSP que se deslocou ao local identificou de imediato as testemunhas que se encontravam aí e que mostraram ter conhecimento do sucedido, entre ela se encontrando a testemunha ZZ, como consta de fls. 2 e 3. (…)” Ora, adiantamos já, ouvido, por este Tribunal de recurso, o depoimento da testemunha em causa, prestado em audiência de julgamento e lida a motivação descrita pelo Tribunal recorrido, quanto à credibilidade atribuída à mesma, nos termos que acima revisitámos, que resulta clarividente que não assiste qualquer razão aos recorrentes. A testemunha mostrou-se certa e segura e com conhecimento pessoal e directo quanto a uma pluralidade de factos, designadamente quanto ao facto de ter visto o recorrente com uma faca na mão. Já não assim, quanto à pergunta que lhe foi feita, quanto ao local de onde surge a faca (o que não é descabido, pois necessariamente terá que ter ocorrido em momento anterior, o qual a testemunha poderá não ter presenciado), à qual aquela respondeu “falou-se qualquer coisa do bolso do casaco, porque no meio daquela escuridão…”. Ora, quem responde assim sabe perfeitamente que está a responder implicitamente que não sabe a resposta a tal pergunta, “atirando” o que terá ouvido sobre o assunto. Assim como quem ouve esta resposta, naturalmente, também dali retira, com toda a facilidade, que a testemunha está indirecta, mas claramente, a responder que, pessoalmente, não sabe. Argumenta o arguido recorrente AA que, com tal resposta, e ainda que não pretendendo colocar em questão a presença de tal testemunha no local, esta revelou “ (…) ainda que de modo sub-reptício, que os factos que ora relata podem não ser os que efetivamente visualizou, sendo antes produto de um qualquer relato que lhe terá sido feito por terceiro, e que esta se dedicou a reproduzir.” Não se olvide que o comum do cidadão não sabe que, em tribunal, não serve a resposta indirecta ou de “ouvir dizer”, socorrendo-se amiúde deste tipo de resposta, que cabe ao tribunal filtrar, na tarefa da fundamentação da matéria factual, não podendo, sem mais, concluir-se, com uma resposta desta natureza, que a pessoa nada viu ou nada sabe quanto ao demais. Pretende-se, num claro aproveitamento indevido, que não pode este Tribunal ad quem, aceitar - alargar ou generalizar uma tal resposta, para, com isso, “minar” todo o restante depoimento da testemunha em causa, sugerindo que este pode ter sido um mero produto de relatos que lhe foram feitos por terceiros e não de factos que lhe advieram do seu próprio conhecimento – aproveitamento a que certamente não será alheio o facto de esta testemunha se ter revelado essencial à descoberta da verdade material. Pretendeu-se também colocar em causa a credibilidade conferida pelo Tribunal a quo ao depoimento testemunhal de ZZ, chamando a atenção para o facto de a mesma (na sessão do dia 29.02.2024, das 9h54 às 11h18, minuto 26:13 a minuto 26:47), ter referido nunca antes ter visto o arguido recorrente, excepto através de fotografia, mais reforçando que não existe qualquer sinal distintivo na sua pessoa (cfr. depoimento na sessão do dia 29.02.2024, das 9h54 às 11h18, minuto 26:13 a minuto 26:47). Questiona o arguido recorrente AA, perante a confusão que a testemunha fez em relação à descrição da roupa que este envergava na altura, se aquela testemunha, no meio da confusão, do momento traumático que terá vivido, não poderia ter confundido o arguido AA com um outro sujeito que usaria capuz branco, rebatendo o facto de o Tribunal a quo ter considerado dispor de elementos suficientes para afirmar, sem margem para dúvidas, que apenas se tratou de uma confusão na cor da roupa, em vez de ter dúvidas quanto à identificação do arguido, podendo ter equacionado o facto de poder ter sido uma outra pessoa com intervenção no desfecho final. Não lhe assiste razão. Com efeito, da audição do depoimento da testemunha resulta claro que a mesma nunca se mostrou confusa na identificação do arguido recorrente, na prática dos factos que descreveu [que referiu ser capaz de reconhecer, pois já o tinha visto em fotografia, da anterior situação da queima], apenas se tendo mostrado confusa quanto à cor do capuz do recorrente, não estando certa se seria azul ou branco, acabando por escolher, na sua indecisão, pelo branco. Ocorre que, e como bem frisou o tribunal a quo, na motivação de facto, a própria testemunha deixou claro que não estava certa quanto a tal facto, acabando por optar por uma resposta que, na sua subjectividade, provavelmente lhe pareceu ser mais viável, mas sem pretensões a que estivesse a responder de forma acertada. Acresce que, como também refere a decisão recorrida, o arguido AA vestia, na altura, um casaco azul com uma faixa larga e branca (vd. reportagem fotográfica a fls. 225 a 231 – roupa usada pelo arguido AA na altura dos factos), que pode ter motivado a confusão da testemunha. Repare-se que tal acontece com muita frequência, nos depoimentos testemunhais em tribunal, em que as testemunhas, na pressão das perguntas, amiúde perante a insistência sobre pormenores que escapam aos filtros normais da memória, ainda mais de quem vivencia momentos traumáticos, acabam por “atirar” respostas, ora como defesa natural para terminar a pressão das perguntas, ora acreditando que alguma resposta teria que ser dada e que um “não sei” ou “não me lembro” poderia de alguma forma afectar a verdade do seu relato (o que é um receio legítimo para quem está a falar a verdade…). No cenário da prestação de um depoimento em audiência, são naturais momentos, pontuais e não essenciais (como é o caso em apreço), de hesitações ou descrições imprecisas ou menos precisas, por parte das testemunhas, que mais não reflectem senão a dinâmica da prestação do depoimento, com algumas imprecisões, muitas vezes explicadas (como claramente aconteceu no caso) pela forte tensão e nervosismo do momento, destacando-se a tentativa, no nosso entender, séria, por parte da concreta testemunha em causa, em esclarecer os factos, admitindo não se lembrar ou não ter presenciado determinados momentos – o que, claramente, contribuiu para a credibilidade que se lhe terá que reconhecer. Portanto, o apontado desacerto da testemunha, relativamente à cor do vestuário usado pelo recorrente, não é, de todo, idóneo a abalar a sua credibilidade, no cenário global do seu depoimento, em que a mesma se revelou consistente e firme no essencial, além de séria e consentânea com demais prova produzida (como salienta, aliás, a decisão recorrida). Mais se diga, que, sendo certo que a existência de “sinais distintivos” numa pessoa podem ser fundamentais e de grande auxílio ao seu reconhecimento ou identificação por terceiros, também não é menos certo que tal circunstância não se revela, de forma alguma, como uma “conditio sine qua non” para a acuidade de tal identificação ou reconhecimento, que pode bem acontecer sem aquele “auxílio extra”, pelas mais diversas razões. Quantas vezes, basta ver um rosto uma vez, para nunca mais o esquecer – como acontece frequentemente em situações profundamente traumáticas. De sublinhar que ouvidos os demais depoimentos testemunhais prestados em audiência, referidos pelos arguidos recorrentes, nas respectivas impugnações da matéria factual, não pode, de todo, este Tribunal ad quem acompanhar as conclusões, plenamente parciais e interessadas, retiradas pelos mesmos. E não pode fazê-lo, quer considerando cada um deles isoladamente, quer, muito menos, conjugado com a restante prova que depôs no sentido carreado aos pontos factuais em questão e clara e sobejamente fundamentados pelo Tribunal recorrido. Revisitemos, de novo, a motivação da decisão recorrida, na parte que, ora, releva: “(…) Tendo presente que os depoimentos têm sempre de ser encarados como tentativa de reprodução/reconstituição de um acontecimento inesperado, dinâmico, fugaz em cada momento e traumatizante e dessa forma conjugados, daquilo que é seguro e não contraditório, pode dizer-se com base inter-coerência dos depoimentos das testemunhas referidas (com exclusão de ZZZ que, disse-se já, não foi suficientemente consistente e, consequentemente, credível, de RR, cujo depoimento se mostrou atrapalhado e sem qualquer contributo para a descoberta da verdade, relatando uma versão que nem sequer coincide com a dos arguidos e da testemunha QQ que nada viu na parte superior das escadas) que: - na sequência da discussão junto à barraca da ... desceram as escadas em direção ao ... os arguidos AA e DD e as testemunhas QQ e RR e que, logo de seguida, tornaram a subir os mesmos arguidos e ainda os arguidos BB e CC e as mesmas testemunhas; - que em determinada altura o OO e os seus amigos decidiram subir a Alameda, pelo lado direito, e que de repente um grupo de indivíduos surge atrás do OO, que começa a fugir para cima e para a esquerda em direção à zona central, sendo alcançado primeiro pelo arguido AA que lhe dá pelo menos duas facadas no lado direito (como referiu a testemunha SS – que refere a existência de dois movimentos conciliáveis com isso que terão atingido a zona do peito e depois pelo resto do grupo, sendo agarrado pelas pernas pelo arguido CC e pelos braços pelo arguido BB (com referiu a testemunha TT), começando a ser agredido também por outros indivíduos, que as testemunhas não identificaram em concreto (e sendo certo que o depoimento da testemunha ZZZ não mereceu credibilidade); - que o OO ainda conseguiu rastejar e fugir para a zona central, sendo sempre perseguido pelos arguidos AA e BB e outros indivíduos, e atingido por uma facada na zona lombar do lado esquerdo (como referiram as testemunhas ZZ e TT), tendo caído na parte de cimento junto a umas escadas), onde ainda levou um pontapé do BB. (….)” Esclarece, ainda, o Tribunal a quo, na motivação de facto, e como já supra aludimos, que as filmagens e fotogramas juntos aos autos e ali referidos, vistos sequencialmente, permitem em imagem dinâmica sustentar o que foi descrito em audiência pelas testemunhas mencionadas na decisão recorrida, com exclusão daquelas também ali discriminadas, concluindo que aquelas se conciliam e são consentâneas com os depoimentos referidos. E assim também o conclui este Tribunal de recurso, após reanálise e visualização de tais elementos probatórios. Não lograram, também, os três arguidos recorrentes, AA, BB e CC, demonstrar a pretendida ausência de actuação conjunta, no circunstancialismo que culminou na morte da infeliz vítima, trazendo à colacção partes desgarradas de depoimentos testemunhais, como de YY, PP, TT e UU, que não permitem, diga-se, nem por si só, e muito menos conjugadas com a restante prova explicitada na motivação da decisão recorrida, concluir, pela actuação meramente isolada do arguido recorrente AA. Não é porque, num momento ou outro, descrito pelas testemunhas, em que os arguidos são vistos separadamente, que se pode concluir que não actuaram em conjunto. Da conjugação de toda a prova produzida em audiência, escalpelizada pelo Tribunal recorrido na fundamentação de facto e reanalisada por este Tribunal de recurso, resulta clarividente que os arguidos AA, BB e CC não estiveram sempre juntos, na dinâmica do circunstancialismo temporal e espacial em que se desenrolou a situação de conflito, que vinha já desde Lisboa (Estádio 1...) e que prosseguiu para o Porto (Estádio ...) mas, sem qualquer dúvida, aqueles coprotagonizaram o culminar da contenda que veio a encontrar o seu desfecho na morte da infeliz vítima. Como assinalado pelo Tribunal a quo, da conjugação de toda a prova produzida em audiência resultou demonstrada a existência de um ambiente hostil e violento entre a vítima OO e a família do arguido BB, desde pelo menos o início do ano e, inicialmente apenas entre aquele e os filhos deste, e, depois, como resulta da agressão no Estádio 1... e das mensagens de fls. 472 e ss., estendendo-se também aos arguidos BB e CC. Da prova produzida em audiência, é inquestionável que, na altura dos factos, os ânimos estavam bastante inflamados, desde a agressão ocorrida horas antes no Estádio 1..., em Lisboa, sendo manifesta a animosidade e agressividade que pairava e a ânsia de vingança, por parte dos arguidos, contra a vítima OO. Demonstra a prova credível produzida em audiência que, já no Porto e depois de a arguida DD ter dado notícia ao arguido BB pelo telefone, da presença da vítima, nos festejos junto ao Estádio ..., este foi buscar o arguido CC a casa e estes, juntamente, dirigiram-se para as imediações do Estádio ..., onde se foram juntar ao arguido AA, e outros familiares. A partir dali a prova é cabal no sentido de demonstrar que os arguidos AA, BB e CC agem como líderes, no grupo familiar, avançando os três de forma determinada e destacada, no sentido da perseguição da vítima OO (vejam-se os depoimentos prestados em audiência e descritos na fundamentação de facto da decisão recorrida, e as imagens e vídeos visualizados). E tal perseguição, na sua dinâmica, desdobra-se numa diversidade de momentos em que cada um dos arguidos tanto é visualizado em grupo, como, por vezes, em pares e até mesmo, noutros momentos, isoladamente (certamente por isso é que algumas testemunhas descreveram momentos em que assim os visualizaram…). Tal não invalida o facto de os três arguidos terem também sido visualizados, posteriormente, a actuar conjuntamente, maxime, nos momentos das agressões à vítima, em que os três se reagruparam e actuaram em conjugação de esforços, aderindo, assim, cada um deles aos actos praticados pelos outros. Resulta inequívoco, dos relatos testemunhais destacados na fundamentação fáctica da decisão recorrida, que, após a referida inicial perseguição, em que andaram todos, digamos assim, “uns para cada lado”, na confusão dos festejos, em que se encontravam muitas pessoas e era noite, os três arguidos, AA, BB e CC, acabaram por se reencontrar/reagrupar, quando alcançaram a vítima, acabando por dominá-la, desde logo, face à manifesta superioridade numérica dos perseguidores e agressores, tendo os arguidos BB e CC agarrado a vítima, um pelos braços e outro pelas pernas, permitindo ao arguido AA o uso da faca, que não podia deixar de ser vista por aqueles. Conclui, pois, este Tribunal ad quem, ao contrário do pretendido pelo recorrente, que não só os arguidos OOO e CC presenciaram o esfaqueamento da vítima pelo arguido AA, num primeiro momento, em que aquela ainda corria pela faixa de rodagem da Alameda ..., no sentido ascendente – tal como descrito no controvertido ponto 15 dos factos provados -, como o coadjuvaram na referida agressão, como vem, depois, a descrever-se, complementarmente, na restante matéria fáctica apurada. Portanto, sempre se diga que tal actuação conjunta dos três arguidos não se quedou nesse momento inicial, antes veio a prosseguir nos momentos subsequentes, ainda que se desenrolando em diferentes modos de actuação, como resulta da prova produzida em audiência, nos termos plenamente explanados pelo Tribunal recorrido. Face à prova produzida em audiência, resulta inequívoco que as facadas foram sendo desferidas, naquele contexto conjugado de agressão (com a colaboração e entre-ajuda dos arguidos BB e CC), pelo arguido AA [o que foi visualizado por diversas testemunhas presentes no local, em pontos e momentos diversos - ZZ, SS, TT, YY e AAA], desde que as agressões se iniciaram ainda junto à ambulância, conforme referem as testemunhas SS e YY até ao desfalecimento na zona central, conforme referem as testemunhas ZZ e TT. Estas testemunhas conseguiram ver as facadas que mencionaram, mas seguramente durante a luta outras houve (as restantes), inclusivamente em zonas compatíveis com actuação típica de defesa da vítima, como se refere no relatório de autópsia, as quais, não tendo sido visualizadas (pela confusão, pela multidão, pela hora da noite e iluminação), estão pericialmente documentadas. Portanto, pelo que resultou da análise da prova produzida em audiência, conjugada com as regras da experiência, lógica e senso comum, as 18 facadas descritas no relatório pericial, de autópsia, não podem senão ser imputadas ao mesmo cenário de agressão que foi provado em audiência, protagonizado, em comunhão de esforços, pelos arguidos AA, BB e CC, não se tendo apurado que eventualmente estivesse a ocorrer um qualquer outro conflito paralelo, em que fossem intervenientes outros protagonistas (ao contrário do pretendido demonstrar pelos arguidos recorrentes). Portanto, o que os arguidos recorrentes fazem, nos seus argumentários recursivos, é discordar da avaliação probatória que o tribunal recorrido fez da apreciação da prova produzida em audiência de julgamento, pretendendo substituir a convicção do Tribunal pela sua. O que está verdadeira e unicamente em causa no recurso em apreço é que os recorrentes não se conformam com a circunstância de a sua posição sobre os factos relatados ao Tribunal não corresponder à que foi acolhida no julgamento da 1ª instância. Da concreta argumentação expendida nas respectivas conclusões de recurso, complementadas com as correspondentes motivações, decorre que os recorrentes limitam-se a extrair as ilações que têm por pertinentes da prova produzida, que contrapõem à do julgador, sem que, nem da análise da prova, nem da leitura do próprio texto da sentença recorrida, decorra a existência de qualquer ilogismo de percurso ou conclusão contrária à lógica das coisas, ao alcance, pela sua evidência, do homem comum. O que realmente resulta das conclusões do recurso, é a divergência entre a convicção pessoal dos arguidos recorrentes sobre a prova produzida em audiência e aquela que o Tribunal recorrido firmou, e que no entendimento dos recorrentes não deveria ter firmado, sobre os factos, o que se prende com a apreciação da prova em conexão com o princípio da livre apreciação da mesma consagrado no artigo 127.º do Código de Processo Penal, do qual decorre que, salvo no caso de prova vinculada, o Tribunal aprecia a prova segundo as regras da experiência e a sua livre convicção. A apreciação da prova não pode deixar de ser “... uma convicção pessoal - até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais -, mas em todo o caso, também ela (deve ser) uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros.”[10] A convicção do Tribunal a quo é formada da conjugação dialéctica de dados objectivos fornecidos por documentos e outras provas constituídas, com as declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento, em função das razões de ciência, das certezas, das lacunas, contradições, inflexões de voz, serenidade e outra linguagem do comportamento, que ali transparecem.[11] Se o Tribunal a quo, que beneficiou plenamente da imediação e da oralidade da prova, explicou racionalmente a opção tomada, e o Tribunal da Relação entender que da reapreciação da prova não se impõe decisão diversa, nos termos do art.127.º do Código de Processo Penal, deve manter a decisão recorrida. Ou seja, como é jurisprudência corrente dos nossos Tribunais Superiores, o Tribunal de recurso só poderá censurar a decisão do julgador, fundamentada na sua livre convicção e assente na imediação e na oralidade, se se evidenciar que a solução por que optou, de entre as várias possíveis, é ilógica e inadmissível face às regras da experiência comum. Se a decisão sobre a matéria de facto do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção”[12] “Dos ensinamentos da doutrina e da jurisprudência, podemos concluir que a valoração das provas, reportada à credibilidade dos depoimentos que é eminentemente subjetiva, depende, essencial e substancialmente, da imediação, princípio que, pressupondo a oralidade, domina a recolha das provas de índole testemunhal, permite, num quadro de emissão e receção de sinais de comunicação - que não apenas de palavras, mas também de gestos ou outras formas de ação/reação, como o próprio silêncio - potenciar a adequada apreciação dos depoimentos”[13], sendo as declarações indissociáveis da atitude e postura de quem as presta, dos seus olhares, trejeitos, hesitações, pausas e demais reações comportamentais às diversas perguntas e questões abordadas, isoladas ou entre si combinadas, bem como a regras de experiência e senso comuns à luz da normalidade dos comportamentos humanos. Tal não significa que a apreciação, eminentemente subjectiva, conducente a conferir maior ou menor credibilidade de um depoimento, é insindicável, pois ao julgador é imposto o dever de explicitar as razões da sua convicção pessoal, na fundamentação da decisão, isto é, que revele não só os motivos por que certo depoimento mereceu maior credibilidade do que outro, mas também que explicite o raciocínio lógico que utilizou na apreciação global e lógica de toda a prova, e, no presente caso, o Tribunal a quo fê-lo. E se os critérios subjectivos expressos pelo julgador se apresentarem com o mínimo de consistência para a formulação do juízo sobre a credibilidade dos depoimentos apreciados e, com base no seu teor, alicerçar uma convicção sobre a verdade dos factos, para além da dúvida razoável, tal juízo há de sempre sobrepor-se às convicções pessoais dos restantes sujeitos processuais, como corolário do princípio da livre apreciação da prova ou da liberdade do julgamento. Não interessa, assim, neste recurso, o que os juízes desta Relação decidiriam se tivessem efectuado o julgamento em primeira instância. Também não está em causa o modo como decidiria o recorrente se fosse o Juiz a quo. Na verdade, o recurso em matéria de facto não tem por finalidade a realização de um segundo julgamento, mas tão só a apreciação da decisão proferida na 1ª instância, apreciação essa limitada ao exame [controlo] dos elementos probatórios valorados pelo tribunal recorrido e feita à luz das regras da lógica e da experiência, mas sempre sem colidir com os fundamentos da decisão que só a imediação e a oralidade permitem atingir - imediação e oralidade que não estão presentes no julgamento do recurso, porque aos juízes do tribunal superior apenas são facultados registos [em suporte magnético]. Por isso ao Tribunal superior cumpre verificar a existência da prova e controlar a legalidade da respectiva produção, nomeadamente, no que respeita à observância dos princípios da igualdade, oralidade, imediação, contraditório e publicidade, verificando, outrossim, a adequação lógica da decisão relativamente às provas existentes. E só em caso de inexistência de provas, para se decidir num determinado sentido, ou de violação das normas de direito probatório [nelas se incluindo as regras da experiência e/ou da lógica] cometida na respectiva valoração feita na decisão da primeira instância, esta pode ser modificada, nos termos do artigo 431.º do Código de Processo Penal. Assim, o que esta instância pode e deve fazer em tal matéria, em sede de recurso [precisamente porque o seu propósito é, essencialmente, o de remédio jurídico], é verificar, controlar, se o Tribunal a quo, ao formar a sua convicção, fez um bom uso do princípio de livre apreciação da prova, aferindo da legalidade do caminho que prosseguiu para chegar à matéria fáctica dada como provada e não provada, verificar, ponto por ponto, se os concretos erros de julgamento indicados pelo recorrente, de facto, existem e, na afirmativa, proceder à sua correção. Por tudo o que supra se expôs, impõe-se concluir que, ante a prova produzida em audiência de julgamento e a valoração que a mesma criou no espírito do julgador, não passível de qualquer censura, nos termos supra explanados, não colhe o alegado pelo arguido recorrente AA, relativamente aos factos provados sob os nºs 1, 5, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 25, 34, 35, 36, 37 e 38; pelo arguido BB relativamente aos factos provados sob os nºs 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 25, 34, 35, 36, 37, 38 e pelo arguido CC relativamente aos factos provados sob os nºs 1, 7, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 25, 34, 35, 36, 37 e 38; e, assim, não colhe o entendimento de que tal matéria factual deveria ser considerada não provada ou conter uma qualquer das redacções alternativas sugeridas. O que é por dizer que a decisão recorrida não se encontra ferida de qualquer erro de julgamento, nos termos do art. 412º, nº 3 do C.P.P.. Improcedem, assim, os recursos dos arguidos AA, BB e CC, nestes segmentos, de impugnação da matéria de facto. *
Vieram também as arguidas recorrentes DD, EE e FF invocar o erro de julgamento nos termos que seguem: As referidas arguidas recorrentes vieram argumentar que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento quanto aos factos dados como provados sob os nºs 21/ 22, 23, 24 e 28 da decisão recorrida, que, no seu entendimento, deveriam ter sido dados como não provados, por falta de prova. Em suma, entendem que a arguida recorrente DD apenas actuou em defesa própria, para repelir as agressões de que estava a ser alvo, por parte da demandante e que, da prova produzida em audiência, deverá concluir-se que as lesões sofridas por esta última, na cara, nariz e perda de um dente, não foram consequência de puxão de cabelos por parte da arguida DD, mas devido a um pontapé desferido por um homem (não identificado), nada tendo de conexão com a arguida. Mais entendem que não foram relatados factos que permitissem concluir que a arguida tenha desferido socos, pontapés e joelhadas à demandante. Cumpre apreciar.
Em matéria de abordagem introdutiva dogmática sobre o erro de julgamento, para evitar repetições, damos aqui por reproduzido o que acima já se aflorou, quanto à análise de questão idêntica abordada pelo co-arguidos recorrentes AA, BB e CC. Vieram as arguidas recorrentes DD, EE e FF, nos seus argumentários recursivos, fazer uma incursão pela prova produzida em audiência de julgamento, quanto aos pontos factuais provados que indicam - nºs 21/ 22, 23, 24 e 28 -, descrevendo e opinando sobre o crédito que lhes mereceram diversos depoimentos testemunhais prestados em audiência, que mencionam, considerando ter sido tal prova erradamente valorada pelo Tribunal a quo. Para o Tribunal de recurso poder reexaminar a prova produzida em audiência de julgamento, com vista a aferir se foi ou não produzida prova suficiente para se concluir no sentido daquela factualidade que indica, só o poderá por via da análise do erro de julgamento, previsto no art. 412.º, nº 3, do Código de Processo Penal. E, como já anteriormente se expendeu, com a análise do erro de julgamento, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova produzida em audiência, sempre tendo presente os limites fornecidos pelo recorrente em obediência ao ónus de especificação imposto pelos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal.
No caso, como dissemos supra, da leitura das peças recursivas das arguidas DD, EE e FF, maxime das suas conclusões, e bem assim, também das respectivas motivações, depreende-se que as mesmas pretendem lançar mão da impugnação ampla da matéria de facto. Para o efeito, impõe-se o cumprimento do ónus de impugnação especificada, vertido no nº 3, do art. 412º do CPP. As recorrentes, entendendo que o Tribunal a quo não apreciou devidamente a prova, para além da indicação da matéria fáctica que consideram incorrectamente julgada (o que fizeram, indicando os pontos da matéria de facto atrás referidos), teriam também que especificar as concretas provas que impunham decisão diversa da recorrida e que indicar, tendo a prova sido gravada, as concretas passagens em que se funda a impugnação. Ora, in casu, e quanto a esta última exigência, tal como ocorreu com os recursos dos arguidos AA, BB e CC (nos termos supra analisados), ainda que as arguidas recorrentes não o tenham feito no âmbito das respectivas conclusões recursivas, certo é que o fizeram nas respectivas motivações, pelo que se aceitará a opção por tal técnica, que, no entender deste Tribunal ad quem, se revela mais consentânea com o pleno respeito pelo exercício do direito constitucional ao recurso (resultando, em nosso entender, in concreto, um eventual convite à correcção das conclusões para nelas fazer constar aqueles elementos que se encontram integralmente nas motivações, um caminho intoleravelmente formal, que iria alongar, ainda mais, o processo, tanto quanto é certo que nele se encontram presos preventivamente três arguidos, desde Maio e Junho de 2022). Iremos, pois, aqui e de forma consentânea com o que acima já se decidiu, quanto aos recursos dos arguidos AA, BB e CC, considerar cumprido o exigido ónus de impugnação especificada, quanto a todas as arguidas.
Analisando. Revisitemos, então, a decisão recorrida, concretamente, o teor dos pontos da matéria de facto apurada, que as recorrentes entendem ter sido erradamente valorados: “(…) 21- Quando PP agarrou o arguido BB foi de imediato agredido. 22- Apercebendo-se que o PP estava a ser agredido, a NN tentou auxiliá-lo. 23- Enquanto tentava auxiliar PP, NN foi atingida com vários murros, socos e pontapés, assim como puxões de cabelo, que lhe foram desferidos pelas arguidas FF, DD e EE, que seguiam atrás dos demais arguidos e que logo ali gizaram um plano para, agindo de comum acordo e em conjugação de esforços e divisão de tarefas, a agredirem. 24- Além de a agredirem nos termos descritos em 23, as arguidas FF, DD e EE agarraram a cabeça de NN e empurraram-na com força contra a ambulância que lá se encontrava. 28- Em consequência da conduta das arguidas DD, EE e FF resultaram para NN as seguintes lesões: No crânio: Tumefação de coloração levemente arroxeada na região frontal; Solução de continuidade com 1,5 cm de comprimento na região frontal à direita; Dor à palpação do couro cabeludo na região occipital. Na face: Tumefação e coloração arroxeada da fase, mais marcada à esquerda; Edema e equimose arroxeada palpebral; Escoriação com 1 por 0,5 cm no dorso do nariz; Fratura parcial da coroa do dente 45. No abdómen: Duas corações punctiformes na face lateral do flanco esquerdo; Equimose arroxeada com 4 por 2 cm e com 8 por 3 cm na face posterior do flanco esquerdo. (…)”
Recordemos, ora, o que, a propósito, refere o Tribunal a quo, em sede de motivação da decisão de facto: “(…) As agressões que se consideraram provadas à demandante NN, resultaram também do que daqueles depoimentos se extrai. Não restam dúvidas de toda a prova da existência de agressões à demandante NN no contexto referido, sendo que são as próprias testemunhas que se encontram na ambulância que, sem qualquer interesse confirmam estar uma mulher as ser agredida por três mulheres, que inclusivamente batiam com a cabeça dela na ambulância. Conjugando as declarações da demandante com a prova testemunhal e os relatórios de alta médica de fls. 149 e ss. e de perícia médico-legal de fls. 591 e ss., pode asseverar-se que aquela foi vítima das agressões que se consideraram provadas, com as consequências apuradas. No que respeita à autoria, para além da descrição feita pela própria demandante, consideraram-se as filmagens constantes da Câmara da CMTV agressões 1, onde claramente se identificam as arguidas DD, EE e FF envolvidas na agressão, visualizando-se também na Câmara E69 quando o arguido BB se junta a elas, que as mesmas estão próximo do local onde se encontra caída a demandante. Das provas quanto aos factos objetivos, se extrai também a intenção de as arguidas atuarem do modo descrito, aproveitando-se claramente da superioridade numérica. (…)” Ora, ouvida, por este Tribunal ad quem, a gravação da prova produzida em audiência, e analisada a fundamentação de facto do Tribunal recorrido, resulta aqui também clarividente, ao contrário do defendido pelas recorrentes DD, EE e FF, que, da motivação da matéria de facto provada decorre com clareza e limpidez a razão pela qual o Tribunal a quo deu como provada a matéria factual descrita naqueles controvertidos pontos factuais indicados - 21/ 22, 23, 24 e 28, explicando, de forma lógica, racional e plausível, porque assim o fez. A análise crítica da prova produzida em audiência é inegável, sendo que o grau de credibilidade, ou de descrédito, atribuído à mesma mostra-se devidamente exposto e motivado, de acordo com a percepção própria permitida pelo imediatismo que acompanhou a produção daqueles meios de prova. Expuseram as referidas arguidas recorrentes, no âmbito das respectivas conclusões recursivas, a sua própria leitura da prova produzida em audiência, extraindo da mesma o seu entendimento que nenhuma prova se fez no sentido da matéria factual que impugnaram, ou, pelo menos, no mínimo, não ultrapassou a dúvida, o que deveria levar à sua absolvição. Ocorre que não foi esse o entendimento do Tribunal recorrido. Resulta, com clarividência, que as declarações negatórias e explicativas das arguidas não lograram criar credibilidade ao Tribunal recorrido, antes pelo contrário, foram manifestamente contraditadas pelos depoimentos testemunhais reputados credíveis, indicados na fundamentação de facto. Basearam as arguidas recorrentes a sua argumentação num “empurrar de culpas” para um homem que desferiu um pontapé na boca da ofendida, pretendendo, com isso, demonstrar que as lesões sofridas por esta última, na cara, nariz e perda de um dente, não foram consequência de puxão de cabelos por parte da arguida DD, mas devido a um pontapé desferido pelo tal indivíduo. Não colhe, porém, e de todo, a pretensão das recorrentes. Com efeito, a prova é inequívoca no sentido de que as três arguidas, em comunhão de esforços, agrediram a ofendida com murros, socos, pontapés, puxões de orelhas e, além de tudo, ainda agarraram a cabeça de NN e empurraram-na com força contra uma ambulância que se encontrava no local. Ora, as lesões apresentadas pela ofendida são claramente compatíveis com esta espécie de agressões. Assim, se, a dado momento da contenda, apareceu um outro indivíduo que também desferiu um pontapé na boca da ofendida, tal circunstância não pode ter a pretendida virtualidade de afastar a responsabilidade das arguidas nas lesões apresentadas pela ofendida. Quanto muito, aquele foi mais um colaborante no cenário de agressão, mas que, por não ser sido identificado, não respondeu à justiça pelo seu comportamento. Por outro lado, não resulta, de todo, da prova produzida em audiência, que a arguida DD ou qualquer uma das restantes, tenha agido em atitude defensiva. Pelo contrário, o comportamento agressivo e conjugado das três arguidas é evidente e manifesto. Portanto, o Tribunal a quo valorou as provas constituendas de acordo com o que lhe pareceu ser a credibilidade emanada pelos depoimentos das testemunhas ali mencionadas, explicitando o processo lógico subjacente à formação da sua convicção para dar como assente a factualidade que deu como provada. É manifesto, que as referidas arguidas recorrentes não lograram demonstrar, em recurso, que a decisão do Tribunal a quo se mostra desajustada ou incoerente face à prova produzida no julgamento e, neste sentido, não demonstraram a existência de provas produzidas em audiência, que impusessem decisão diversa da que foi tomada pelo Tribunal recorrido.
Portanto, o que as arguidas recorrentes fazem, nos seus argumentários recursivos, é discordar da avaliação probatória que o tribunal recorrido fez da apreciação da prova produzida em audiência de julgamento, pretendendo substituir a convicção do Tribunal pela sua. Também aqui, o que está verdadeira e unicamente em causa no recurso em apreço é que as recorrentes não se conformam com a circunstância de a sua posição sobre os factos relatados ao Tribunal não corresponder à que foi acolhida no julgamento da 1ª instância. Da concreta argumentação expendida nas respectivas conclusões de recurso, complementadas com as correspondentes motivações, decorre que as recorrentes limitam-se a extrair as ilações que têm por pertinentes da prova produzida, que contrapõem à do julgador, sem que, nem da análise da prova, nem da leitura do próprio texto da decisão recorrida, decorra a existência de qualquer ilogismo de percurso ou conclusão contrária à lógica das coisas, ao alcance, pela sua evidência, do homem comum. Também quanto às arguidas recorrentes, como acima igualmente se concluiu, na análise dos recursos dos arguidos AA, BB e CC, o que realmente resulta das respectivas conclusões do recurso, é a divergência entre a convicção pessoal sobre a prova produzida em audiência e aquela que o Tribunal recorrido firmou, e que no entendimento das recorrentes não deveria ter firmado, sobre os factos, o que se prende com a apreciação da prova em conexão com o princípio da livre apreciação da mesma consagrado no artigo 127.º do Código de Processo Penal, do qual decorre que, salvo no caso de prova vinculada, o Tribunal aprecia a prova segundo as regras da experiência e a sua livre convicção. Permitimo-nos, uma vez mais, remeter, para evitar fastidiosas repetições, para o que já supra se expôs, no tocante à abordagem da apreciação da prova como uma convicção pessoal, mas objectivável e motivável e sua formação por parte da conjugação dialéctica de dados objectivos fornecidos pela prova produzida em audiência. Portanto, se o Tribunal a quo, que beneficiou plenamente da imediação e da oralidade da prova, explicou racionalmente a opção tomada, e o Tribunal da Relação entender que da reapreciação da prova não se impõe decisão diversa, nos termos do art.127.º do Código de Processo Penal, deve manter a decisão recorrida, o que, claramente acontece in casu. O que a instância de recurso pode e deve fazer em tal matéria, é tão-só verificar, controlar, se o Tribunal a quo, ao formar a sua convicção, fez um bom uso do princípio de livre apreciação da prova, aferindo da legalidade do caminho que prosseguiu para chegar à matéria fáctica dada como provada e não provada, verificar, ponto por ponto, se os concretos erros de julgamento indicados pelo recorrente, de facto, existem e, na afirmativa, proceder à sua correção. Por tudo o que supra se expôs, impõe-se concluir que, ante a prova produzida em audiência de julgamento e a valoração que a mesma criou no espírito do julgador, não passível de qualquer censura, nos termos supra explanados, não colhe o alegado pelas arguidas recorrentes DD, EE e FF, relativamente aos factos provados sob os nºs 21, 22, 23, 24 e 28 e, assim, não se aceita o entendimento de que tal matéria factual deveria ser considerada como não provada. O que é por dizer que a decisão recorrida não se encontra ferida de qualquer erro de julgamento, nos termos do art. 412º, nº 3 do C.P.P.. Improcedem, pois, neste segmento, os recursos das arguidas DD, EE e FF. * Tem-se, pois, por definitivamente fixada a matéria factual constante da decisão recorrida. » Vieram, ainda, os acima referidos arguidos recorrentes, em jeito de subsidiariedade, invocar a violação do princípio in dubio pro reo, com a consequente absolvição dos mesmos pelos crimes por que foram condenados, e, bem assim, também as arguidas, do pedido de indemnização civil. Ora, como analisámos supra, o que acontece, in casu, é que os arguidos recorrentes não concordam com a análise que o Tribunal a quo fez da prova produzida em audiência de julgamento, não se conformando com a circunstância de a sua posição sobre os factos relatados ao tribunal não corresponder à que foi acolhida no julgamento da 1ª instância, ou que, pelo menos, não tenha suscitado a dúvida no julgador. Já atrás referimos e voltamos a sublinhar que o Tribunal a quo, imbuído da imediação, explicitou, de forma lógica e ponderada, as razões da sua convicção, explicou a formulação do juízo que formou sobre a falta de credibilidade ou de credibilidade das declarações/depoimentos apreciados e, da respectiva fundamentação não decorre que tenha ficado com quaisquer dúvidas quanto à matéria de facto que veio a considerar provada, pelo que não lhe cumpria fazer qualquer uso do invocado princípio in dubio pro reo. O Tribunal a quo, conjugada toda a prova que foi produzida em audiência, nos moldes que se descreveram na respectiva motivação do acórdão, convenceu-se, quanto a nós de forma lógica e justificada, que tal factualismo resultou provado, ou seja, portanto, sem subsistência de quaisquer dúvidas que implicassem o recurso a tal instituto. Como se pode ler no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça[14] “«a prova, mais do que uma demonstração racional, é um esforço de razoabilidade»: «no trabalho de verificação dos enunciados factuais, a posição do investigador - juiz pode, de algum modo, assimilar-se à do historiador: tanto um como o outro, irremediavelmente situados num qualquer presente, procuram reconstituir algo que se passou antes e que não é reprodutível». Donde que «não seja qualquer dúvida sobre os factos que autoriza sem mais uma solução favorável ao arguido», mas apenas a chamada dúvida razoável (…). Pois que «nos actos humanos nunca se dá uma certeza contra a qual não militem alguns motivos de dúvida». «Pedir uma certeza absoluta para orientar a actuação seria, por conseguinte, o mesmo que exigir o impossível e, em termos práticos, paralisar as decisões morais». Enfim, «a dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal».” In casu, como vimos, nenhuma dúvida subsistiu no espírito do julgador, depois da tarefa de avaliação, ponderação e análise da prova produzida em audiência. Improcedem, pois, também nesta parte os recursos dos arguidos AA, BB, CC, DD, EE e FF. »
Argumenta o arguido recorrente AA que, na sequência da impugnação da matéria de facto, deverá fazer-se a subsunção jurídica dos factos pelo mesmo praticados ao crime de ofensa à integridade física simples, por falta de nexo de causalidade entre a sua actuação, que segundo o recorrente se limitou ao desferir de uma facada na zona lombar da vítima e o resultado morte. E argumenta, por sua vez, o arguido recorrente BB que deveria apenas ser condenado pela prática do crime de ofensas à integridade física, fazendo alusão a uma eventual “legítima defesa”, que, no entanto, e simultaneamente, conclui nem dever ser abordada neste recurso (?...). Ora, no tocante a estes segmentos recursivos, destes dois arguidos recorrentes, em face da improcedência do invocado erro de julgamento relativamente à matéria factual que contraditaram e, bem assim, da improcedência dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP, tendo, em consequência, resultado definitivamente fixada a matéria factual constante da decisão recorrida, resulta manifestamente indeferida a pretensão dos recorrentes quanto à pretendida subsunção jurídica dos factos praticados pelos mesmos ao crime de ofensa à integridade física simples. Como é bom de ver, a questão da invocada subsunção dos factos ao crime de ofensa à integridade física simples sempre estaria condicionada à questão da alteração da matéria de facto provada, maxime no sentido de ficar a constar da mesma que os arguidos recorrentes, AA e BB, apenas ofenderam e pretenderam ofender a integridade física da vítima OO, tendo-se limitado aquele (AA) ao desferir de uma facada na zona lombar deste, dali expurgando todo o factualismo não consentâneo (que passaria ao elenco factual não provado), o que não aconteceu, como vimos, nos termos supra expendidos. Resulta, pois, totalmente desnecessária, face à estabilização da matéria factual provada e não provada, da decisão recorrida, nos termos anteriormente analisados, qualquer apreciação ou dissertação sobre a alegada falta de nexo de causalidade entre a actuação do arguido recorrente AA e o resultado morte da vítima; tal como resultaria também totalmente prejudicada qualquer análise de uma eventual legítima defesa, por parte do arguido BB, se tivesse sido invocada pelo mesmo, o que foi aflorado, sem ter sido invocado… Assim, improcedem, também nestes segmentos recursivos, os recursos dos arguidos recorrentes AA e BB. * II.4.7.2 Do invocado não preenchimento das qualificativas do crime de homicídio previstas nas h) e i) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal e sua não operabilidade automática, com a consequente subsunção jurídica dos factos no crime de homicídio simples - [questão invocada pelos arguidos recorrentes AA e BB]
Antes de mais e numa breve incursão dogmática, sublinha-se que o crime de homicídio do art. 131º do Código Penal constitui o tipo legal fundamental dos crimes contra a vida (cfr. Jorge Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, I, pág. 3, e autores ali citados). Perante casos especiais de homicídio doloso resultantes da verificação de circunstâncias ligadas à ilicitude e à culpa, o legislador previu a existência de tipos com moldura penal diversa, qualificado ou privilegiado em função da existência de circunstâncias especiais agravativas ou atenuativas. É neles que se integra o tipo legal do art. 132º do Código Penal, uma forma agravada de homicídio em resultado da existência de circunstâncias que revelem, por parte do agente, especial censurabilidade ou perversidade na respectiva actuação. Haverá, pois, conforme refere Figueiredo Dias, que “recusar logo à partida quer que o homicídio qualificado constitua o tipo legal básico dos crimes dolosos contra a vida, de que o homicídio simples constituiria apenas uma forma atenuada, quer que o homicídio e homicídio qualificado constituam tipos legais autónomos, com autónomos «conteúdos de ilícito», se bem que protectores do mesmo bem jurídico”. (op. cit., pág. 25). É também neste sentido que o Colendo STJ se tem pronunciado, como fez no Ac. de 23/10/2008, Proc nº 2856/08: “É preciso recordar que o crime base neste domínio é o de homicídio simples, no qual o agente manifesta, quase sempre, o tal “profundo desprezo pela vida humana”, já que, por definição, age com dolo (na maioria das vezes directo, isto é, pretende e tem o desejo de matar) e fá-lo por um motivo qualquer, que quase nunca se pode avaliar positivamente, por exemplo, por vingança, por vaidade ou por afirmação de grupo. O homicídio qualificado há-de ter, por isso, algo que se deva acrescentar a essa culpa já intensa, que a torne especialmente censurável.” A qualificação resulta, assim, ainda segundo a lição de Figueiredo Dias, “da verificação de um tipo de culpa agravado, assente numa cláusula geral extensiva e descrito com recurso a conceitos indeterminados: a «especial censurabilidade ou perversidade» do agente.” Sendo certo que, “dominantemente, entende-se que só se pode decidir que a morte foi causada em circunstâncias que revelam especial censurabilidade ou perversidade do agente através de uma ponderação global das circunstâncias externas e internas presentes no facto concreto” (Teresa Serra, Homicídio Qualificado – Tipo de Culpa e Medida da Pena, pág. 63). Para esta autora, qualquer homicídio simples, enquanto lesão do bem jurídico fundamental que é a vida humana, revela já a censurabilidade ou perversidade do agente que o comete. No homicídio qualificado o que está em causa é uma diferença essencial de grau que permite ao juiz concluir pela aplicação do art. 132º ao caso concreto, após a ponderação da circunstância indiciadora presente ou de outra circunstância susceptível de preencher o chamado Leitbild dos exemplo-padrão. Veja-se, ainda, a este respeito, o Ac. do STJ, datado de 07/07/2005, P. nº 1670/05, onde se preconiza que: “é preciso que, autonomamente, o intérprete se certifique de que, da ocorrência de qualquer daquelas circunstâncias resultou em concreto a especial censurabilidade ou perversidade. Como inversamente, não será um maior desvalor da acção do agente ou um aspecto especialmente desvalioso da sua personalidade documentado no facto que dará origem ao preenchimento do tipo de culpa agravado, sendo necessário que essa atitude se concretize em qualquer dos exemplos-padrão ou em qualquer circunstância substancialmente análoga. É que estes são elementos típicos, embora atinentes ao tipo de culpa e não ao tipo de ilícito e daí que, mesmo no caso de ocorrência de outra circunstância que não a exactamente prevista, esta tenha de assentar numa estrutura valorativa correspondente à do respectivo exemplo-padrão.” Importa agora subsumir tal entendimento abstracto à policromia que nos apresenta o caso vertente. Desde logo quanto à circunstância qualificativa prevista na citada al. h), alegam os arguidos recorrentes AA e BB (sendo certo que também o recorrente CC o aduz na sua peça recursiva, mas apenas em sede de argumentação do erro de julgamento e não de contraditação da qualificativa do crime de homicídio), que não ficou demonstrada a existência da co-autoria, o que previamente se impunha, para o preenchimento desta agravante, além de igualmente não se ter analisado se tal co-autoria, a existir, é susceptível de revelar uma maior censurabilidade ou perversidade. Argumentam os arguidos recorrentes que não foi feita prova da existência de qualquer acordo prévio entre os arguidos AA, BB e CC tendente à prática de qualquer acto ilícito contra OO, como também não existiu qualquer adesão a um plano em curso, sendo a actuação dos três arguidos independente. Vejamos. Revisitemos a decisão recorrida, na parte que ora releva, destacando os factos provados com interesse para a presente questão recursiva: “(….) 7- Na posse dessa informação, o arguido BB decidiu deslocar-se com o arguido CC para o estádio e juntamente com o arguido AA decidiram localizar, perseguir, manietar e agredir com instrumento de natureza cortocontundente OO, e, assim, fazendo-se valer do fator surpresa que o grande aglomerado de pessoas lhes proporcionava, bem como da superioridade numérica, dele se vingarem, tirando-lhe a vida. (…) 11- Como não conseguiram encontrar o OO, os arguidos AA e BB e CC, acompanhados dos demais arguidos, desembocaram na Rua ..., onde os três primeiros continuaram a procurá-lo entre o aglomerado de pessoas que lá se encontravam, prosseguindo em direção à Alameda ..., passando junto ao .... 12- A determinado momento, os arguidos AA, BB e CC avançaram por debaixo do viaduto da Rua ..., tendo localizado pelas 2.42.45h o OO, no sentido ascendente da Alameda .... 13- Nesse instante, os arguidos AA e BB e CC moveram uma perseguição desenfreada a OO. 14- O arguido AA seguia à frente de um grupo de pessoas não concretamente identificadas empunhando e manuseando uma faca com uma lâmina de comprimento não apurado em concreto. 15- O arguido AA logrou alcançar OO quando este ainda corria pela faixa de rodagem da Alameda ..., no sentido ascendente, e esfaqueou-o pelo menos duas vezes, tendo a agressão sido presenciada pelos arguidos BB e CC. 16- Alguns metros mais à frente, já junto à berma do lado esquerdo da dita Alameda, no sentido ascendente, o OO foi novamente alcançado pelos arguidos BB e CC e quando este conseguiu agarrá-lo pelas pernas, aquele prendeu-o pelos braços, manietando-o, impedindo-o de fugir e de se defender, fazendo-o cair ao chão. 17- Nessa altura, o arguido AA, fazendo uso da faca de que se encontrava munido, novamente desferiu golpes no OO. 18- Entretanto, por via da intervenção de PP, que agarrou o arguido BB, e de TT, OO conseguiu rastejar, libertar-se e fugir pelo meio do separador central da Alameda ..., percorrendo alguns metros até que foi de novo apanhado pelo arguido AA, que novamente o esfaqueou com a faca que trazia. 19- Já caído no chão e desfalecido o arguido BB desferiu, além do mais, um pontapé na cabeça de OO, enquanto o arguido AA se afastava sozinho. (…) 25 - Em consequência da conduta dos arguidos AA e BB e CC, OO sofreu as seguintes lesões: Hábito externo Tórax: Oito soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 1: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, com extremidade superior romba e extremidade inferior indefinida, à qual se associa uma escoriação avermelhada irregular e desidratada com 0,6 por 0,4 cm de maiores dimensões. Esta está localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, apresentando exposição de tecido celular subcutâneo e 2,2 cm de comprimento, estando a sua extremidade superior na linha média e distando 15 cm da fúrcula esternal e 10,8 cm do mamilo direito; Lesão número 2: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo e tecido muscular, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha média clavicular, apresentando 2,9 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 23,3 cm da fúrcula esternal, 11 cm do mamilo direito e 5,3 cm da linha média; Lesão número 3: obliqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido sobre o celular subcutâneo e tecido muscular, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, apresentando 3,5 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 1,3 cm da linha média, 15 cm de la do mamilo esquerdo e 22,5 cm da fúrcula esternal; Lesão número 4: obliqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e a inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e osso, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da fase anterior do hemitórax esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 19,5 cêntimos da fúrcula esternal, 19 cm do mamilo direito e 8 cm da linha média; Lesão número 5: ligeiramente oblíqua superoinferiormente da esquerda para a direita, sendo a extremidade superior romba e é inferior angulosa, com exposição de tecido celular subcutâneo, músculo e cartilagem costal, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, na linha média clavicular, apresentando 3,6 cm de comprimento, distando a sua extremidade superior 28,5 cm da fúrcula esternal, 22,7 cm do mamilo direito e 8,2 cm da linha média; Lesão número 6: oblíqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sendo as 2 extremidades angulosas, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, com múltiplos entalhes na porção posterolateral, localizada no flanco esquerdo, apresentando 11,3 cm de cumprimento, distando a sua extremidade superior 36,5 cm da fúrcula esternal, 25 cm do mamilo direito e 8,7 cm da linha média; Lesão número 7: horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 17: Horizontal, sendo a extremidade medial angulosa com entalhe e a extremidade lateral romba, com exposição de tecido celular subcutâneo e músculo virgo localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, apresentando 3 cm de comprimento, distando a sua extremidade medial 15 cm da linha média, 29 cm da espinha ilíaca anteroposterior esquerda e sendo e 7 cm da linha axilar posterior; Lesão número 18: superficial, horizontal, sendo as extremidades angulosas, tendo a mais medial uma cauda terminal de 3 cm ao nível da linha média e sem exposição de tecidos, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax direito, junto à linha média, apresentando 8 cm de comprimento, distando a extremidade lateral 5 cm da linha média, 19 cm da linha axilar posterior e 31 cm da espinha ilíaca anterosuperior direita. B - Membro superior direito: Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 8: com entalhes laterais, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada no bordo cubital da falange proximal do primeiro dedo da mão apresentando 1,5 cm de comprimento; Lesão número 9: com perda de substância, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada na polpa do segundo dedo da mão, de uma área de 0,8 por 0,4 cm, com 0,4 cm de profundidade. C- Membro superior esquerdo: Escoriação avermelhada e irregular na face posterior do terço distal do antebraço, medindo 3 por 1,5 cm de maiores dimensões; Esfacelo com fundo avermelhado ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do segundo dedo, medindo 0,8 por 0,6 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada irregular e região de esfacelo com fundo avermelhado ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do terceiro dedo, medindo 0,6 por 0,5 cm de maiores dimensões; Duas escoriações avermelhadas irregulares na face posterior da articulação metacarpofalângica do quarto dedo, uma mais superior, medindo 0,8 por 0,8 cm de maiores dimensões, e outra mais inferior, medindo 0,6 por 0,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada arredondada na face posterior da articulação interfalângica proximal do quarto dedo, medindo 0,4 por 0,3 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada irregular ao nível da face posterior da articulação interfalângica proximal do quinto dedo, medindo 1,5 por 1 cm de maiores dimensões. Quatro soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 10: obliqua superoinferiormente de radial para cubital, sendo as 2 extremidades angulosas, apresentando a inferior uma cauda de escoriação terminal com 0,4 cm de maior eixo. Localiza-se no dorso da mão sobre o terceiro metacarpo, apresentando 3,3 cm de comprimento, com exposição de tecido celular anteromedial do joelho, medindo 5,5 por 3,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada, irregular, com crosta hemática não destacável, na face anterior do terço médio da perna, medindo 1 por 0,5 cm de maiores dimensões; Escoriação avermelhada e irregular na face anterior do terço distal da perna, medindo 1,2 por 1 cm de maiores dimensões. Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, nomeadamente: Lesão número 7: ligeiramente oblíqua superoinferiormente da direita para a esquerda, sem possibilidade de avaliação da extremidade superior e apresentando um entalhe na extremidade inferior, com exposição de tecido celular subcutâneo, localizada na face anterior do terço superior da coxa ao nível da linha da sínfise pública e lateralmente à espinha ilíaca anterosuperior direita, apresentando 3,4 cm de comprimento, distando a sua extremidade superior 3,5 cm da espinha ilíaca anterosuperior, 13 cm da sínfise púbica e 11 cm da linha média; Lesão número 14: oblíqua superoinferiormente de medial para lateral, sendo as duas extremidades angulosas, associando-se à extremidade inferior uma escoriação linear vermelho-escura com 1,7 por 1,5 cm de maiores dimensões e à extremidade superior uma escoriação linear vermelha-escura com 0,7 cm de maior eixo. Localiza-se na face anterolateral do joelho, apresentando 6 cm de comprimento, com exposição de tecido celular subcutâneo e do retináculo patelar. D- Membro inferior esquerdo: Escoriação avermelhada e irregular na face lateral do terço superior da coxa, medindo 3 por 1,5 cm de maiores dimensões; Três escoriações avermelhadas e irregulares na fase anteromedial do joelho, medindo uma área total de 5,5 por 3 cm; Escoriação avermelhada e irregular na face anterolateral inferior do joelho, medindo 2,5 por 2 cm de maiores dimensões. Múltiplas escoriações avermelhadas e irregulares, dispersas pela face anterior da perna, medindo a maior delas 2,5 por 1,5 cm de maiores dimensões. Duas soluções de continuidade de bordos regulares infiltrados de sangue, nomeadamente: - Lesão número 15: solução de continuidade superficial horizontal, sendo as extremidades angulosas e sem exposição de tecidos, localizada na face lateral do terço proximal da coxa esquerda, apresentando 2 cm de comprimento, distando a extremidade medial 12,5 cm da crista ilíaca anterosuperior esquerda, 23 cm da sínfise pública e 22 cm da linha média; - Lesão número 16: solução de continuidade de bordos desidratados, ligeiramente oblíqua superoinferiormente de lateral para medial, sendo a extremidade medial angulosa e a lateral romba com cauda de peixe de 0,2 cm de maior eixo, com exposição das camadas internas de pele, localizada na fase anterior do 1/3 médio da coxa esquerda, apresenta 1 cm de comprimento. Hábito interno Cabeça Encéfalo: Circunvoluções cerebrais ligeiramente aplanadas (compatível com um edema cerebral ligeiro) e parênquima com congestão nas diferentes seções de corte. Tórax Nas paredes: Ao nível do tecido celular subcutâneo, sete soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, localizada no terço médio do esterno, à direita da linha média, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterior do terço inferior do hemitórax direito, na linha médio clavicular, em relação com alusão número 2 do hábito externo; - outra, localizada sobre o rebordo costal esquerdo, junto à linha média, em relação com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, localizada na transição do terço médio para o terço inferior da face anterior do hemitórax esquerdo, na linha médio clavicular, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterior do 1/3 inferior do hemitórax esquerdo, externamente a linha médio clavicular, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, localizada na fase anterolateral do terço inferior do hemitórax esquerdo, em relação com a lesão número 6 do hábito externo; - outra, localizada na fase posterior do terço inferior do hemitórax esquerdo, em relação com a lesão número 17 do hábito externo. No plano muscular: Quatro soluções de continuidade de bordos regulares e filtrados de sangue, nomeadamente: - uma, localizada nem inserção inferomedial do músculo grande peitoral direito, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, atingindo a inserção inferior do músculo grande peitoral esquerdo, a inserção superior do músculo oblíquo externo à esquerda e os músculos intercostais do quinto espaço intercostal, ao nível da linha médio clavicular à esquerda, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, na transição dos músculo oblíquo externo para o músculo reto abdominal, à esquerda, junto à inserção dos mesmos, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, com infiltração sanguínea circundante, atingindo a porção lateral do músculo oblíquo externo, à esquerda e os músculos intercostais do oitavo espaço intercostal à esquerda, em relação com a lesão número 6 do hábito externo. Infiltração sanguínea do músculo latissimus dorsal à esquerda, na sua camada mais superficial, em relação com a lesão número 17 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas direitas: Duas soluções de continuidade, de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, ao nível da inserção esternal da cartilagem do quinto arco costal direito, não transfixiva, em relação com a lesão número 1 do hábito externo; - outra, ao nível da inserção esternal das cartilagens costais do sétimo e oitavo arcos costais, transfixiva, em relação com a lesão número 2 do hábito externo. Clavícula, cartilagens e costelas esquerdas: Três soluções de continuidade transfixivas, de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do quinto arco costal, em relação com a lesão número 4 do hábito externo; - outra, ao nível da extremidade esternal da cartilagem costal do oitavo arco costal, em relação com a lesão número 5 do hábito externo; - outra, ao nível do arco anterior da cartilagem costal do oitavo e nono arcos costais, em relação com a lesão número 6 do hábito externo. Pericárdio e cavidade pericárdica: Duas lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na face anteromedial do pericárdio, com com 1,8 cm, em relação com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, na face anterolateral do pericárdio, com 4 cm de comprimento em relação com a lesão número 4 do hábito externo. Coração: Duas soluções de continuidade lineares de bordos regulares e infiltrados de sangue, transmurais: - uma, na região póstero lateral do ventrículo direito, medindo 2,2 cm de cumprimento na face externa e 3,5 cm de comprimento na face interna, em correspondência com a lesão número 3 hábito esterno; - outra, na região anterolateral do ventrículo esquerdo, medindo 5 cm de comprimento na face externa e 8,3 cm da face interna, em correspondência com a lesão número 4 do hábito externo. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Pleura parietal e cavidade pleural esquerda com presença de hemotórax com 1000 cc de volume. Laceração pleural de bordos regulares e infiltrados de sangue, em correspondência com as lesões números 4,5 e 6 do hábito externo. Diafragma: Três lacerações de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na hemicúpula diafragmática direita, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; - outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, pericentimétrica, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, na hemicúpula diafragmática esquerda, com 2 cm de comprimento, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo. C- Abdómen: Paredes: Três soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na extremidade superior do músculo reto abdominal direito, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo; - outra, na extremidade superior do músculo reto abdominal esquerdo, junto à linha média, em correspondência com a lesão número 3 do hábito externo; - outra, atingindo a porção lateral inferior dos músculos oblíquo externo, obliquo interno e reto abdominal, à direita, em correspondência com a lesão número 7 do hábito externo. Peritoneu e cavidade peritoneal: Vestígios hemáticos peri-hepáticos. Fígado: Dimensões ligeiramente aumentadas. Contusão ao nível da face diafragmática do lobo esquerdo, medindo 2 cm de maior eixo. Solução de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue, praticamente vertical, na face diafragmática do lobo direito, com 3,5 cm de cumprimento, distando 2 cm do ligamento falciforme, em correspondência com a lesão número 2 do hábito externo. Parênquima pálido e congestivo. Estômago: Laceração de bordos regulares e infiltrados de sangue, na face do antro pilórico, medindo 1 por 0,7 cm de maiores dimensões, em correspondência com a lesão número 5 do hábito externo. Membro: Membro inferior direito: Duas soluções de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue: - uma, na fase anterior do terço superior da coxa, ao nível da linha da sínfise púbica e lateralmente a espinha ilíaca anterosuperior direita, atingindo o tecido celular subcutâneo e a porção lateroinferior dos músculos oblíquo externo, oblíquo interno e reto abdominal, em correspondência com a lesão número 7 do hábito externo; - outra, ao nível da face anterior do retináculo patelar, com 5 cm de comprimento, com atingimento do tecido celular subcutâneo e da face anterior da patela, em correspondência com a lesão número 14 do hábito externo. Membro inferior esquerdo: Solução de continuidade de bordos regulares e infiltrados de sangue ao nível da fase anterior do terço médio da coxa, atingindo tecido celular subcutâneo, a aponevrose do músculo reto femural. Infiltração sanguínea do músculo reto femural, na sua camada mais superficial, em correspondência com a lesão número 16 do hábito externo.
26- As lesões tóraco-abdominais descritas determinaram como consequência direta, adequada e necessária a morte de OO, tendo o óbito ocorrido no dia 8/5/2022. (…) 34- Os arguidos AA e BB e CC agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas acordadas condutas eram proibidas e punidas por lei. 35- Os arguidos AA, BB e CC sabiam que os golpes desferidos com a faca nos locais referidos poderiam causar a morte como causaram de OO, o que representaram e quiseram. 36- Sabiam os arguidos AA, BB e CC que ao agir da forma descrita em conjugação de esforços e divisão de tarefas, com superioridade numérica e usando de violência e de instrumentos corto-perfurantes, se constituíam em elevada desproporção relativamente a OO, impedindo-o de se defender e de fugir. 37- Os arguidos AA e BB e CC sabiam que ao perseguir, cercar, agarrar, manietar e agredir OO, impediam a sua fuga e defesa, assim como possibilitavam, como queriam, que o arguido AA desferisse repetidamente golpes com a faca no corpo de OO, atingindo-o nas costas, no peito e no abdómen, onde aqueles sabiam que se alojavam órgãos vitais. 38- Os arguidos AA, BB e CC não souberam refrear os seus impulsos violentos, atuando da forma descrita, motivados por um desejo de vingança, numa escalada de violência, por motivos relacionados com desentendimentos familiares que envolviam os arguidos AA e BB com o OO. (…)” E revisitemos, ora, a decisão recorrida, destacando o que, a propósito do preenchimento desta circunstância qualificativa, na sua análise jurídica, referiu o Tribunal a quo: “(…) al. h) Praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas ou utilizar meio particularmente perigoso ou que se traduza na prática de crime de perigo comum; Não sendo a faca considerada um meio particularmente perigoso no âmbito do cometimento do crime de homicídio, nem integrando o seu uso a prática de um crime de perigo comum, atentemos na primeira parte desta qualificativa – praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas. Lê-se no Ac. TRG de 113/2018, in www.dgsi.pt, que: “É que, como assertivamente ensina Figueiredo Dias (14), não é a comparticipação, em si e por si mesma, que constitui o exemplo-padrão em causa (prática do facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas), “mas apenas se e quando ela determinar uma particular perigosidade do “meio” (no sentido amplo da “situação” e não apenas no sentido estrito do “instrumento”) e uma consequente dificuldade particular da vítima de dele se defender.”. A que acresce ainda - sublinha o mesmo Mestre - “dever o aplicador, mesmo depois de ter considerado que uma concreta situação da vida integra, segundo o pensamento da lei, a circunstância em análise, ser particularmente severo e exigente ao determinar se ela revela ou não no caso, em definitivo, uma especial censurabilidade ou perversidade do agente (...)””. No caso, é indiscutível o cometimento do crime por cada um dos arguidos com mais duas pessoas. Mas não só se verifica o facto objetivo, como no caso o mesmo torna maior a ilicitude e culpa dos arguidos – é que foi precisamente aquela atuação conjunta que enfraqueceu, subjugou e diminuiu OO, tornando-o um alvo ainda mais vulnerável perante um grupo que já se apresentava munido de um instrumento que lhe conferia superioridade só por si. (…)”
Analisemos. Transcrita a parte que ora releva do manancial fáctico apurado, acima constante, logo se vê não assistir qualquer razão ao arguido recorrente. É que, visto o cenário fáctico apurado, atinente à co-autoria, temos que: - No plano objectivo, resultou provado nos autos que, a partir do momento em que os arguidos BB e CC se deslocaram para as imediações do Estádio ... e se reuniram com o AA, os três decidiram conjuntamente localizar, perseguir, manietar e agredir com instrumento de natureza cortocontundente a vítima OO, fazendo-se valer do factor surpresa que o grande aglomerado de pessoas lhes proporcionava, bem como da superioridade numérica, para dele se vingarem, tirando-lhe a vida. Descreve-se, na factualidade apurada, toda uma actuação sequencial, conjunta e concertada, dos arguidos em causa, que se consubstanciou, inicialmente, numa procura e perseguição desenfreada pela vítima, tendo os três, para o efeito, e de início juntos, percorrido várias artérias, até que o arguido AA passou a seguir um pouco mais à frente, logrando alcançar o OO e esfaqueou-o pelo menos duas vezes, o que foi presenciado pelos arguidos BB e CC. Tendo-se conseguido escapar, logo, pouco metros à frente, veio a vítima a ser novamente alcançada, desta feita pelos arguidos BB e CC, tendo sido agarrado pelas pernas pelo CC e preso pelos braços, pelo BB, acabando por ser por estes manietado, impedido de fugir e de se defender, caindo ao chão, altura em que o arguido AA surge e, fazendo uso da faca de que se encontrava munido, novamente desferiu golpes no OO. E, novamente tendo conseguido libertar-se, acabou a vítima, de novo, por ser apanhada pelo arguido AA, que, novamente o esfaqueou com a faca que trazia, tendo o arguido BB, já com a vítima desfalecida e caída no chão, ainda desferido um pontapé na cabeça da mesma. Das 18 facadas que OO sofreu, 6 foram na região toraco-abdominal, tendo as mesmas provocado as lesões descritas nos factos provados que foram causa adequada da morte do mesmo pelas 3.20h do mesmo dia. - E, no plano subjectivo, resultou provado que estes três arguidos, AA e BB e CC, agiram bem sabendo que as suas acordadas condutas eram proibidas e punidas por lei; que agiram da forma descrita, em conjugação de esforços e divisão de tarefas. Estes arguidos sabiam que ao perseguir, cercar, agarrar, manietar e agredir OO, impediam a sua fuga e defesa, assim como possibilitavam, como queriam, que o arguido AA desferisse repetidamente golpes com a faca no corpo de OO. Isto posto, outra não pode ser a conclusão deste Tribunal de recurso senão a de que, no que se refere à co-autoria dos arguidos AA, BB e CC, ao contrário do alegado pelo arguido recorrente, a mesma resulta de forma clara e bastante da decisão recorrida, do seu elenco factual apurado, e quer na sua vertente objectiva, quer subjectiva, nos termos que acabamos de expor. Daquele manancial resulta manifesto que os três arguidos referidos actuaram de forma concertada, em comunhão de esforços, todos tomando parte directa na sua execução, conjuntamente, mediante acordo entre si, nos termos previstos no art. 26º do Código Penal, sendo todos responsáveis pela totalidade da conduta, independentemente do grau de actuação de cada um, porquanto as suas condutas visavam o objectivo comum: alcançar a vítima e tirar-lhe a vida. Note-se que, se para a verificação da comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria são essenciais a verificação de uma decisão conjunta visando a obtenção de determinado resultado (elemento subjectivo) e uma execução igualmente conjunta, já para a verificação dos elementos objectivos do crime (aqueles que se prendem com a sua execução propriamente dita) não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos a praticar. Isto porque, na comparticipação, cada um dos co-autores responde pela totalidade do evento não sendo indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos a praticar para obtenção do resultado pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo indispensável à produção do resultado (cfr., v.g., Ac. do S.T.J. de 18/7/84, B.M.J. 339, pág. 276). A imputação basta-se com a mera consciência de colaboração na actividade dos demais, por parte de cada co-agente, desde que tenha havido um acordo prévio para a execução integral do crime, ainda que por mero acordo tácito fundado na adesão da vontade de cada um à execução do crime. Basta, por vezes, o próprio desenrolar da acção e a adesão de cada um aos actos dos demais para se entender que se está perante um projecto conjunto e de uma actuação coordenada. A co-autoria corresponde a “um exercício conjunto no domínio do facto, uma contribuição objectiva para a realização, que tem que ver com a causalidade, embora possa não fazer parte da «execução»” (cfr. Leal-Henriques - Simas Santos, Código Penal anotado, 1º vol. pág. 258). Na co-autoria, todos os participantes detêm conjuntamente o domínio do facto, sendo o essencial que exista um “domínio funcional do facto”, o qual ocorre “quando o contributo do agente – segundo o plano de conjunto – põe, no estádio da execução, um pressuposto indispensável à realização do evento intentado, quando, assim, todo o empreendimento ou resulta ou falha” (Prof. Figueiredo Dias, Direito Penal, sumários e notas das Lições ao 1º ano do Curso Complementar de Ciências Jurídicas da Faculdade de Direito de Coimbra de 1975-1976, pág. 59). Ora, in casu, vistos os factos provados, deles resulta manifesta a adesão dos três arguidos ao propósito/plano comum, sendo que as acções de cada um foram praticadas com vista à produção do resultado pretendido por todos. Conclui-se, pois, que os arguidos AA, BB e CC actuaram em co-autoria material (cfr. art. 26.º do Cód. Penal), ao contrário do pretendido pelos mesmos, que seguiram uma taticidade de defesa assente em actuações isoladas, sem intervenção dos restantes - tudo face à estabilização da matéria factual, da decisão recorrida, decorrente da prova produzida em audiência, tudo nos termos sobreditos.
Acrescentam, ainda, os arguidos recorrentes AA e BB, nos respectivos argumentários recursivos, que haveria também que se apurar se a prática do crime nas condições de co-autoria é ou não susceptível de revelar uma maior censurabilidade ou perversidade, o que, no seu entender, não foi feito, pelo Tribunal recorrido. Alegam os arguidos recorrentes que, não existindo qualquer facto provado, nem alegando o Tribunal a quo qualquer circunstância de onde considere que exista uma especial censurabilidade e/ou perversidade na actuação, devem os mesmos ser absolvidos da prática do crime de homicídio qualificado p. e p. pela alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º. Vejamos. Uma leitura atenta da decisão recorrida, na parte da análise jurídica relativamente ao preenchimento da circunstância qualificativa em apreço, e que acima revisitámos, demonstra que não assiste razão aos arguidos recorrentes. É que, ainda que de uma forma que possa considerar-se não modelar, porque por mero acompanhamento doutrinal e jurisprudencial, que reproduziu, sobre tal matéria, terá que se concluir que o Tribunal recorrido se pronunciou, ainda assim, sobre a verificação in concreto da exigida especial censurabilidade ou perversidade na co-actuação dos arguidos. A decisão recorrida, invocou, implicitamente acompanhando, a posição sufragada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no seu douto aresto, no âmbito do P. nº 113/2018, destacando, designadamente, os segmentos em que, parafraseando o insigne Professor Figueiredo Dias, ali se refere que “(…) não é a comparticipação, em si e por si mesma, que constitui o exemplo-padrão em causa (prática do facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas), “mas apenas se e quando ela determinar uma particular perigosidade do “meio” (no sentido amplo da “situação” e não apenas no sentido estrito do “instrumento”) e uma consequente dificuldade particular da vítima de dele se defender.”; concluindo-se no sentido de “(…) dever o aplicador, mesmo depois de ter considerado que uma concreta situação da vida integra, segundo o pensamento da lei, a circunstância em análise, ser particularmente severo e exigente ao determinar se ela revela ou não no caso, em definitivo, uma especial censurabilidade ou perversidade do agente (...)””. E, no seguimento de tal acompanhamento, concluiu o Tribunal recorrido que “(…) No caso, é indiscutível o cometimento do crime por cada um dos arguidos com mais duas pessoas. Mas não só se verifica o facto objetivo, como no caso o mesmo torna maior a ilicitude e culpa dos arguidos – é que foi precisamente aquela atuação conjunta que enfraqueceu, subjugou e diminuiu OO, tornando-o um alvo ainda mais vulnerável perante um grupo que já se apresentava munido de um instrumento que lhe conferia superioridade só por si. Aliás, tal análise do Tribunal recorrido fora já plasmada nos pontos 36) a 38) dos factos provados, ao considerar apurado que os arguidos AA, BB e CC, ao agirem em conjugação de esforços e divisão de tarefas, perseguindo, cercando, agarrando, manietando e agredindo, com superioridade numérica, usando de violência e de instrumentos corto-perfurantes, em elevada desproporção relativamente à vítima, impedindo-a de se defender e de fugir, possibilitando, assim, como queriam, que o arguido AA desferisse repetidamente golpes com a faca no corpo de OO, atingindo-o nas costas, no peito e no abdómen, onde aqueles sabiam que se alojavam órgãos vitais; não sabendo refrear os seus impulsos violentos, actuando motivados por um desejo de vingança, numa escalada de violência. Conclui-se, pois, como já acima adiantámos, que o Tribunal recorrido se pronunciou sobre a verificação in concreto da exigida especial censurabilidade ou perversidade na co-actuação dos arguidos, quer na descrição dos pontos de facto referidos [(36) a 38)], quer na subsunção jurídica dos factos, em sede de análise de direito. E não teria que o consignar expressamente nos factos provados, ao contrário do pretendido pelos arguidos recorrentes, porquanto uma tal análise é meramente conclusiva e não factual.
Por tudo o que acabou de se expor, impõe-se concluir pelo preenchimento da qualificativa do crime de homicídio prevista na al. h), do nº 2, do art. 132º do CP.
# Quanto à circunstância qualificativa prevista na al. i), também aqui argumentam os arguidos recorrentes AA e BB que o Tribunal a quo coloca nas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar os três arguidos quando as suas actuações foram independentes e isoladas. Alegam que não se verificou uma procura e perseguição dos três arguidos à vítima, negando ter existido qualquer traição, emboscada e impossibilidade de a vítima se defender e que o Tribunal a quo traz, agora, um novo elemento que, até ao momento, não tinha sido referido: que os arguidos “escolheram” um dia de festa para, assim, conseguirem concretizar o efeito pretendido... Questionam se a circunstância de haver um grupo que se desloca, em corrida, de uma ponta da Alameda ... para o outro lado, em direção a um outro grupo, constitui um “ataque” traiçoeiro, encoberto e que impediu a vítima de se defender. Acrescentam que a mesma circunstância de perseguição/emboscada ou actuação conjunta não pode contribuir para o preenchimento de duas qualificativas diversas (referindo-se a esta e à anteriormente apreciada), sob pena de violação do princípio ne bis in idem. Mais aduzem que o Tribunal a quo desconsiderou completamente, o que é de “enorme relevância”, o facto de o arguido BB, na sequência do confronto, ter ficado com as “lesões que se encontram documentadas a fls. 466 a 470 do Processo – ou seja, facadas!.” Alegam os arguidos recorrentes que “Se a vítima ainda teve possibilidade de atacar, ripostar e envolver-se em confronto físico, logicamente não se viu numa situação de ataque “surpresa” e impedida de reagir!” E, também aqui, invocam os arguidos recorrentes que a decisão recorrida se basta com a referência a “uma culpa acrescida, merecedora de uma censura acrescida”, questionando de onde decorre a especial censurabilidade/perversidade que lhes foi imputada. Vejamos. Antes de descermos à situação in concreto, façamos uma breve análise dogmática da qualificativa em apreço, porquanto a mesma, ao contrário da anterior, pode revelar-se de mais difícil apreensão. A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a entender o alcance do meio insidioso, previsto na alínea i) do n.º 2, do art. 132º do CP, em sentido convergente, considerando-se que aquele conceito, de difícil definição, tem subjacente a ideia de utilização de meio dissimulado, oculto, em relação ao qual se torna mais precária, ou ténue, uma reacção de defesa por parte da vítima. Veja-se, entre outros, o Ac. STJ, datado de 25/10/2017, Rel.: Isabel São Marcos, P. nº 3080/16.3JAPRT.S1, que reza assim: « I - O meio insidioso compreende não tão-só o meio particularmente perigoso usado pelo agente mas também as condições escolhidas pelo mesmo para utilizá-lo de jeito a que, colocando a vítima numa situação que a impeça de resistir em face da surpresa, da dissimulação, do engano, da traição, lhe permita tirar vantagem dessa situação de vulnerabilidade.» Consubstancia, o meio insidioso, um modo incomum de perpetrar a agressão, mas também a impossibilidade de defesa da vítima pelo efeito surpresa e de traição de que se reveste, isto é, constitui meio insidioso todo o meio cuja forma de actuação sobre a vítima assuma características análogas à do veneno - do ponto de vista do seu carácter enganador, traiçoeiro, sub-reptício, dissimulado ou oculto, elegendo o agente as condições favoráveis para apanhar a vítima desprevenida, ou seja, o agente actua com aproveitamento consciente da ingenuidade ou da incapacidade da defesa da vítima no momento do início da execução do crime. Portanto, o meio insidioso compreende o meio particularmente perigoso usado pelo agente, e também as condições escolhidas pelo mesmo para utilizá-lo de jeito a que, colocando a vítima numa situação que a impeça de resistir em face da surpresa, da dissimulação, do engano, da traição, lhe permita tirar vantagem dessa situação de vulnerabilidade. O significado de meio insidioso, está naturalmente ligado ao sentido original de insídia (cilada, emboscada), abarcando no seu conteúdo todos os meios que se possam considerar traiçoeiros, dissimulados, ardilosos, através dos quais o agente coloca a vítima numa situação em que praticamente não tem meio de defesa e, por vezes, conseguindo até a colaboração da própria vítima. Segundo Mantovani “Insidiosos são os meios que, pela sua própria natureza enganadora ou pelo modo ou circunstâncias em que são usados, são de difícil identificação (armadilhas, fragmentos de vidro na comida, sabotagem do motor de um avião ou dos travões de um automóvel, carregamento de um objecto com corrente eléctrica de alta tensão, instalação em local radioactivo, etc.)” ou seja, situações em que a vítima está completamente indefesa. O exemplo mais óbvio de meio insidioso, que aliás constitui o padrão da alínea i), é a utilização de veneno, que assume essa natureza não porque seja mais mortífero do que qualquer outro, mas porque não é detectável, ou é dificilmente detectável pela vítima. A qualificação de outros meios como insidiosos terá naturalmente como referência esse padrão, por forma a poder considerar-se equivalente quanto ao “…seu carácter enganador, subreptício, dissimulado ou oculto”, sendo de relevar que a insídia não se refere apenas e /ou necessariamente ao meio ou instrumento concretamente utilizado para provocar a morte, mas podendo tal qualificação resultar apenas das circunstâncias que rodearam o evento – veja-se o Ac. do Colendo STJ, datado de 20/02/2019, Proc. n. º 25/17GEEVR.S1, de 20.02.2019-, onde são citados outros acórdãos no mesmo sentido. O que é por dizer que o meio insidioso compreende, necessariamente, as condições escolhidas pelo arguido para utilizar meio ou instrumento particularmente perigoso, de jeito que, colocando a vítima numa situação que a impeça de resistir em face da surpresa, da dissimulação, do engano, da traição, lhe permita tirar vantagem dessa situação de vulnerabilidade e praticar o crime. Veja-se, ainda, a propósito, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 20/2019, que refere que: “com a adjetivação de uma ação como “insidiosa” quer-se sempre - ou, pelo menos, numa fração esmagadora de casos - significar uma conduta eivada de uma carga negativa, mais especificamente traiçoeira, oculta, sub-reptícia (vd., usando poucos mais adjetivos que estes, ibid., p. 70, ou JOÃO CURADO NEVES, "Indícios de Culpa ou Tipos de Ilícito? A Difícil Relação entre o n.º 1 e o n.º 2 do Artigo 132.º do CP", in Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra Editora, 2003, p. 735)”.
Descendo, ora, ao caso, revisitemos a decisão recorrida, destacando o que, a propósito do preenchimento desta circunstância qualificativa, na sua análise jurídica, referiu o Tribunal a quo: “(….) al. i) Utilizar veneno ou qualquer outro meio insidioso.” Nos autos, excluído que está o uso de veneno, está naturalmente em causa o uso de meio insidioso que abrange: a armadilha, a cilada, espera, a emboscada, o disfarce, a surpresa, a traição, a aleivosia, o excesso de poder o abuso de poder ou qualquer fraude (vide, Código Penal, Parte Geral e Especial, edição 2014, fl. 512, M. MIGUEZ GARCIA, J.M. Castela Rio). Nestas situações, o agente do crime apanha a vítima desprevenida, confiante, descuidada, descontraída. A qualificativa não se reporta, nesta parte, aos meios empregues, mas ao modo, de atuação do agente, o qual é revelador de uma relevante carga de perfídia que torna difícil ou impossível a defesa da vítima – consistente num ataque sem aviso prévio, súbito, com a vítima desprevenida para o ataque homicida. E no caso, tal qual está descrita a conduta dos arguidos AA, BB e CC, não pode deixar de considerar-se que os mesmos atuaram de forma insidiosa. Aproveitando a festa, e depois de andarem à sua procura, os arguidos AA, BB e CC moveram uma perseguição à vítima, apanhando-a numa correria súbita, quando esta já regressava a casa subindo a Alameda .... A surpresa com que numa noite de festa – com a confusão de multidão própria destes dias – se fez o ataque a OO foi um meio procurado para concretizar o resultado pretendido, revelando em concreto uma culpa acrescida merecedora de uma censura acrescida - assim fazendo subsumir a conduta dos arguidos AA, BB e CC à qualificativa prevista nesta alínea. (…)”
Ora, analisada toda a factualidade apurada, no que concerne à co-actuação dos três arguidos, AA, BB e CC, que culminou na morte da vítima OO, e que nos iremos abster de aqui reproduzir, para não tornar a leitura do presente aresto fastidiosa, limitando-nos apenas a para ali remeter, teremos, sem dúvida, que acompanhar a argumentação do Tribunal recorrido, nesta matéria. Com efeito, da descrição daquela factualidade, resulta com clarividência que toda a dinâmica factual envolvente das condutas concertadas dos arguidos AA, BB e CC, não pode deixar de considerar-se como sendo de cariz insidioso/matreiro. Antes de mais, registamos que não nos demoraremos mais nos argumentários recursivos dos arguidos recorrentes, relativamente à actuação isolada e não concertada de cada um dos arguidos, que, como vimos, não obteve adesão probatória, estando consolidado o elenco factual da decisão recorrida, nos termos sobreditos. Isto posto, claramente os arguidos aproveitaram-se da circunstância de estar a decorrer, na altura dos factos, uma festa ou momento de celebração desportivo, no que esta trouxe de confusão e afluência de pessoas, servindo de palco para o desenrolar dos comportamentos dos arguidos, sem que estes ressaltassem facilmente aos olhos de terceiros, diluindo-se na natural confusão dos festejos, ainda mais sendo noite. E, diga-se, tal conclusão a que o Tribunal a quo chegou e que, como dissemos, acompanhamos, não consubstancia aquilo que o arguido recorrente denomina de um “novo elemento que, até ao momento, não tinha sido referido: que os arguidos “escolheram” um dia de festa para, assim, conseguirem concretizar o efeito pretendido”. Isto porque, quando se diz que os arguidos aproveitaram a festa, não se pretende, com isso, dizer-se que estes terão antecipadamente escolhido tal data do calendário para melhor poder concretizar o objectivo comum – senão, poderíamos estar perante a qualificativa prevista na al. j), do nº 2, do art. 132º - persistência na intenção de matar por mais de 24 horas (constante da acusação particular e que o Tribunal recorrido indeferiu – não sendo objecto do presente recurso). O aproveitamento da festa aconteceu no momento. Sublinhe-se que a elaboração de um plano conjunto tanto pode ser expressa, como meramente tácita ou implícita, e tanto pode ser atempada, com requintes de preparação planeada e pré-desenvolvida no tempo, como meramente espontânea ou por adesão no momento, imediata). Na altura em que os três arguidos se reuniram, junto ao Estádio ..., todos enfurecidos e com vontade de vingança contra a vítima, os mesmos viram certamente naquele cenário festivo uma oportunidade para atingirem o seu objectivo comum, de forma mais facilitada, porque não esperada, matreira, de surpresa e, assim, tacitamente formularam e aderiram a um plano conjunto. Foi naquele cenário de festa, à noite, com uma multidão de gente no local, que os arguidos se agruparam e concertaram, e, assim, procuraram e perseguiram a vítima, percorrendo até diferentes artérias, até a alcançarem e conseguirem agredir, maxime com facadas desferidas pela mão do arguido AA, em momentos diversos, tudo manifestamente mascarado ou diluído pela confusão do momento. Toda a forma de execução dos actos praticados pelos arguidos em causa, descrita nos factos provados, seria impensável de acontecer, num juízo de normalidade, num dia dito “normal” ou “não festivo”. Conclui-se, pois, sem grande esforço de raciocínio, perante tal forma de execução dos actos praticados concertadamente pelos arguidos AA, BB e CC, que estes agiram usando de surpresa, de dissimulação, de traição, que lhes foi facilitado pelo palco festivo, que, de algum modo, os “camuflou”, reduzindo substancialmente as possibilidades de reacção e defesa da vítima, para assim melhor conseguir chegar a esta e tirar-lhe a vida. E mais se conclui também, como o fez o Tribunal recorrido, que tal actuação revela em concreto uma culpa acrescida dos arguidos, merecedora de uma censura acrescida, ficando, assim, também fundamentada a especial censurabilidade dos arguidos (ao contrário do alegado pelo arguido recorrente). Por outro lado, não se vê, como o alegam os arguidos recorrentes, que a mesma factualidade tenha permitido o preenchimento da qualificativa anteriormente analisada – prevista na al. h), do nº 2, do art. 132º do CP – e a qualificativa ora em análise – al. i) do mesmo normativo. Na verdade, se aquela ficou preenchida, no plano objectivo, pela prática do facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas, já esta última, que temos vindo a analisar, preencheu-se pela actuação dissimulada, de surpresa, de embuste, de forma insidiosa. Não se reconhece, pois, qualquer violação do princípio ne bis in idem, sem necessidade de mais considerandos, atento o óbvio ou facilidade da questão. Acresce que vieram, ainda, os arguidos recorrentes, invocar, no âmbito desta questão recursiva, factos que não integram o elenco factual apurado nos autos. Com efeito, questionam os arguidos recorrentes se a circunstância de haver um grupo que se desloca, em corrida, de uma ponta da Alameda ... para o outro lado, em direção a um outro grupo, constitui um “ataque” traiçoeiro, encoberto e que impediu a vítima de se defender. Ora, uma tal pretendida “guerra de grupos” não faz parte do quadro factual que integra o objecto do processo – veja-se o elenco da matéria de facto apurada - ficando, assim, votado a quedar-se no argumentário recursivo dos arguidos recorrentes, sem possibilidade de qualquer apreciação por parte deste Tribunal superior. Mais aduziram os arguidos recorrentes que o Tribunal a quo desconsiderou completamente, o facto de o arguido BB, na sequência do confronto, ter ficado com as “lesões que se encontram documentadas a fls. 466 a 470 do Processo – ou seja, facadas!” Alega o arguido recorrente que “Se a vítima ainda teve possibilidade de atacar, ripostar e envolver-se em confronto físico, logicamente não se viu numa situação de ataque “surpresa” e impedida de reagir!” Ora, também aqui não assiste razão aos arguidos recorrentes. Com efeito, tal factualidade não só foi considerada pelo Tribunal recorrido, como apreciada criticamente, apenas não o tendo sido claramente no sentido pretendido pelos arguidos. Relembremos o que diz a decisão recorrida, a propósito: “(…) Já a origem das lesões do arguido BB que se encontram documentadas nas fotos constantes do telemóvel e reportadas em relatório pericial é, apesar das declarações dos arguidos, desconhecida. Com efeito, o arguido BB diz que as mesmas são o resultado de facadas que o arguido OO lhe deu quando o atacou, mas como se verá da restante prova, não há qualquer ataque por parte da vítima – quando muito, a serem dessa altura (o que se não pode assegurar), as mesmas poderiam ser o resultado inadvertido da luta desenfreada que ocorreu e envolveu várias pessoas, entre as quais o arguido AA que tinha a faca (tal qual o que sucede com o arguido CC que, conforme consta do relatório médico legal, igualmente apresentava lesões que o próprio tentou tratar e cuja origem se desconhece). De resto, note-se que, sendo o OO tão destemido, como os arguidos transmitiram, dificilmente se compreende que numa luta a dois com o arguido BB e tendo o OO uma faca em cada mão, aquele tivesse conseguido fugir sem a intervenção de terceiros (e apenas com os cortes ligeiros tratados em casa que o mesmo alega terem-lhe sido feitos) – as imagens no Estádio 1... são claramente demonstrativas da força do OO e do que o mesmo seria capaz numa luta a dois. (…)” O argumento recursivo, ora em análise, invocado pelos arguidos recorrentes AA e BB, de que a vítima teve possibilidade de atacar e ripostar, no caso, contra o arguido BB, para afastar a qualificativa do ataque surpresa e sem possibilidade de reagir, não decorre, de todo, da factualidade apurada nos autos, antes pelo contrário [note-se que as declarações dos arguidos, em audiência de julgamento – momentos em que tal factualismo foi abordado - não foram merecedoras de credibilidade, por parte do Tribunal a quo]. Está, pois, também votado ao natural insucesso, nesta sede recursiva, um tal argumento da defesa.
Por tudo o que acabou de se expor, impõe-se concluir pelo preenchimento também da qualificativa do crime de homicídio prevista na al. i), do nº 2, do art. 132º do CP.
Improcedem, pois, também nestes segmentos, os recursos dos arguidos AA e BB. *
Entende o recorrente Ministério Público que, perante a matéria dada como provada [destacando os pontos 8º, 9º 10,11,13,14, 15,16,17,18 e 19], só se pode concluir que existiu motivo fútil na actuação dos três arguidos, dada a desproporcionalidade dos meios e do motivo que determinou as agressões mortais impostas ao falecido OO. Argumenta que perante tal factualidade, a motivação dos arguidos revela-se especialmente desproporcionada, particularmente desajustada à gravidade das suas condutas, contra a vítima, configurando-se, assim, o plus que acresce à normal desproporcionalidade dos crimes de homicídio. Conclui, assim, que a qualificação do homicídio com base na al. e) do n.º 2 do art.132.º CP deverá acrescer às duas outras pelas quais os arguidos foram condenados. Vejamos. Revisitemos, de novo, a decisão recorrida, na parte que ora releva e que levou o Tribunal a quo a não considerar preenchida a qualificativa em análise: “(...) “al. e): Ser determinado por avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou para satisfação do instinto sexual ou por qualquer motivo torpe ou fútil.” Estando excluídos todos as demais circunstâncias qualificativas desta alínea que no caso não têm cabimento, nem em abstrato, atentemos no motivo torpe ou fútil. Lê-se no Ac. TRP de 19/1/2022, in www.dgsi.pt., que: “Motivo fútil é o que não é ou nem sequer chega a ser motivo. Cf. Ac.STJ de 06.06.90, BMJ 398, 269, de tal forma que o facto surge como produto de um profundo desprezo pelo valor da vida humana, o que não é manifestamente o caso dos autos, como acima se expressou. Motivo torpe é o motivo infame, indecoroso, repugnante, baixo, sórdido, ignóbil, asqueroso, profundamente imoral, que repugna à generalidade das pessoas. Por seu lado, a doutrina tem atribuído ao motivo fútil o alcance de uma razão incompreensível para a generalidade das pessoas, que não tem relevo, que é insignificante, gratuito, frívolo, sem valor, que não pode razoavelmente explicar (e muito menos justificar) o crime, revelando o facto, inteiramente desproporcionado e repudiado pelo homem médio, uma profunda insensibilidade e inconsideração pela vida humana, um egoísmo intolerante, prepotente e mesquinho. E a jurisprudência também não se afasta desse entendimento, ao considerar como motivo fútil não tanto aquele que tem pouco valor ou importância, mas o que é notoriamente desproporcionado ou inadequado aos olhos do homem médio, denotando o agente egoísmo, intolerância, prepotência e mesquinhez. É, pois, fútil o motivo frívolo, leviano, o que revela uma inteira desproporção entre o motivo e a reação homicida. Para além da desproporção notória, deve acrescer a insensibilidade moral, que tem a sua manifestação mais alta na brutal malvadez ou na insignificância ou frivolidade desproporcionada com a reação homicida. Ac STJ de 7.12.99, BMJ, 492, p.168. Embora nos crimes de homicídio haja sempre ou quase sempre uma certa desproporção entre o motivo e o resultado, no caso de motivo fútil essa desproporção é mais chocante, advindo um evento completamente distinto daquele que o cidadão comum esperaria.”. A conduta dos arguidos no caso dos autos insere-se no contexto de conflito que já se vinha instalando desde o início do ano – com conflitos físicos entre a vítima e membros da família do arguido BB – concretamente, os arguidos AA e EE. A existência deste conflito, cujos contornos e razões se desconhecem concretamente, retiram à conduta do arguido as características que permitiriam considerar que foi determinada por um motivo torpe ou fútil para efeitos de culpa acrescida, merecedora de uma censurabilidade acrescida. (…)”
O conceito de motivo fútil, previsto na al. e), do nº 2, do art. 132º do CP tem vindo a ser entendido na nossa jurisprudência, maxime pelo Supremo Tribunal de Justiça, como o motivo de importância mínima, o motivo frívolo, leviano, a «ninharia», o que nem chega a ser motivo e que leva o agente à prática do crime de homicídio, numa aberrante desproporção entre o motivo e a extrema reacção homicida. Como, com eloquência e clareza, se descreve no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça; Relator: Santos Carvalho, datado de 23/10/2008, “É preciso recordar que o crime base neste domínio é o de homicídio simples, no qual o agente manifesta, quase sempre, o tal “profundo desprezo pela vida humana”, já que, por definição, age com dolo (na maioria das vezes directo, isto é, pretende e tem o desejo de matar) e fá-lo por um motivo qualquer, que quase nunca se pode avaliar positivamente, por exemplo, por vingança, por vaidade ou por afirmação de grupo. O homicídio qualificado há-de ter, por isso, algo que se deva acrescentar a essa culpa já intensa, que a torne especialmente censurável”. E, como se lê também no Ac STJ, datado de 19/02/2014, P. nº 168/11.0GCCUB.S1, Rel. Santos Cabral, in www.dgsi.pt, “ O vector fulcral que identifica o «motivo fútil» não é, pois, tanto o que imprime a ideia de tão pouco ou imperceptível relevo, quase que pode nem chegar a ser motivo, mas aquele que realce a inadequação e faça avultar a desproporcionalidade entre o que impulsionou a conduta desenvolvida e o grau de expressão criminal com que ela se objectivou: no fundo, em essência, o que prefigure a especial censurabilidade que decorre da futilidade, sendo que esta pressupõe um motivo por ela rotulável e que dela e por ela se envolva.”
No caso vertente, analisada a factualidade apurada, sublinhando-se os pontos 1 (com a redacção já supra corrigida) e 2, constata-se a existência de uma relação de causalidade, facilmente perceptível, entre a prévia conflitualidade existente entre o arguido AA e sua família - pai, mãe, irmã, tia e tio - e a vítima falecida OO, desde o início do ano de 2022 [com confrontos físicos numa discoteca, em Janeiro e, depois, na ..., e, depois, mais próximo do evento fatídico, na tarde do dia 7/5/2022, no Estádio 1..., em Lisboa] e a prática do crime de homicídio, às 3.20h do dia 8/5/2022. Ora, este quadro factual, descrevendo, é certo, um primitivismo de reacções em que emergem pulsões primárias que indicam a desproporcionalidade entre o motivo que despoleta o itinerário criminoso e a acção, não aponta, apesar disso, para uma total ausência de racionalidade ou, dito por outras palavras, para uma total ausência de um processo compreensível (no sentido de que se percebe a perspectividade do seu desfecho) que, minimamente, convoque a lógica como explicação da conduta dos arguidos. Linearmente, a actuação dos arguidos convoca um dos motivos mais habituais neste tipo de crime que é a procura da vingança. Entende-se, assim, que os factos apurados são insusceptíveis de integrar a circunstância de qualificação do crime de homicídio vertida na al. e) do n.º 2 do art. 132.º do CP. Bem andou, pois, o Tribunal recorrido ao afastar a mesma. Improcede, assim, neste segmento, o recurso do Ministério Público. *
Argumenta o arguido recorrente que é necessário que se conclua que há razões para crer que da atenuação especial decorrente da aplicação do regime penal de jovens adultos, resultam vantagens para a reinserção social do jovem, sem ser afectada a exigência de prevenção geral, isto é, a garantia de protecção de bens jurídicos e, por isso, a validade das normas. Cumpre apreciar. Revisitando a decisão recorrida, vejamos o que ali se refere a propósito da (não) aplicação do regime penal especial para jovens: “(…) À data dos factos os arguidos AA, EE e FF não tinham ainda completado 21 anos de idade, pelo que se impõe apreciar a aplicabilidade do mesmo quanto a eles. O regime dos Jovens Adultos (aquele que à data da prática do crime tiver completado 16 anos de idade sem ter ainda atingido os 21), aprovado pelo Dec. Lei 401/82, de 23.09, impõe ao juiz o poder/dever de atenuar especialmente a pena nos termos previstos na legislação penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado (art. 4). Trata-se de um regime que visa a instituição de um direito mais reeducador do que sancionador, mas que nunca poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade. Nesta perspetiva, sempre que a pena aplicável seja a de prisão e a defesa da sociedade e prevenção da criminalidade não estejam em causa, deve essa pena ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões de que assim se facilitará aquela reinserção. Para realizar tal juízo de prognose sobre o desempenho futuro da personalidade do jovem, impõe-se então ponderar, numa avaliação global dos factos apurados em cada caso concreto, a natureza e modo de execução do crime, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao facto, bem como as suas condições de vida, tudo de forma a averiguar se a moldura penal do crime em questão (concretamente a moldura da pena de prisão) é ou não excessiva tendo em vista os fins de socialização do jovem condenado. É através da ponderação das circunstâncias concretas de cada caso, que se pode chegar ou não à conclusão de que se está perante um desvio transitório e ocasional, próprio do período de latência social propiciador da delinquência juvenil, caso em que se poderá mostrar justificada a formulação de um juízo de prognose favorável à atenuação especial. “Esse juízo deve ser positivo quando as diversas variáveis a considerar (idade, situação familiar, educacional, vivências pregressas, antecedentes de formação) permitam uma prognose favorável (ou, com maior rigor, não impeçam uma prognose favorável) sobre o futuro desempenho da personalidade” – Ac. STJ de 07-11-2007 (processo n.º 07P3214)). Assim, só se justifica a referida atenuação especial se houver vantagens de reinserção, mas, importa não o esquecer, sem prejuízo da defesa do ordenamento jurídico – ou seja, salvaguardadas que sejam, naturalmente, as exigências de prevenção geral ligadas à proteção de bens jurídicos, que, sendo acentuadas, poderão obstar a essa atenuação especial da pena. No caso de absoluta incompatibilidade entre exigências de prevenção geral e especial, as exigências (mínimas) de prevenção geral funcionam como limite ao que, numa perspetiva de prevenção especial, podia ser aconselhável. De facto, nenhum ordenamento jurídico suporta pôr-se a si próprio em causa, sob pena de deixar de existir enquanto tal. “A sociedade tolera uma certa perda de efeito preventivo geral, nomeadamente conformando-se com a aplicação do regime de jovens, mas, quando essa aplicação possa ser entendida pela sociedade, no caso concreto, como uma injustificada indulgência e prova de fraqueza face ao crime, quaisquer razões de prevenção especial que aconselhassem a aplicação do regime penal especial para jovens cedem, devendo aplicar-se a pena de prisão” – Ac.TRG de 09-04-2018, proc. 1069/16.1JABRG.G1). No caso concreto, o arguido AA tinha, à data dos factos, 19 anos de idade. Pese embora não tivesse à data quaisquer antecedentes criminais, o certo é que em julgamento, apesar de todo o contexto, que como é óbvio, não podia desconhecer, admitiu uma única facada, negando qualquer intenção de matar – revelando com isso total falta de consciência crítica perante um comportamento ofensivo do bem jurídico vida. O crime é grave – muito grave – e atenta contra o bem jurídico mais importante que é a vida, sendo a sua violação incompreendida pela comunidade. Acresce no caso particular, que se trata de violência de grau elevado entre jovens, o que deixa a comunidade ainda mais receosa com a formação da personalidade e o caracter violento dos mesmos. Significa isto que apesar da conduta do arguido anterior aos factos (ser primário), a gravidade do crime, quer em termos de resultado, quer em termos de iter criminis, a personalidade nele manifestada, as várias sanções disciplinares que após reclusão tem sofrido e as expectativas comunitárias, fazem concluir por uma personalidade pouco juvenil ou pouco própria da imaturidade de um jovem, antes revelando perigosidade. Neste contexto, não existem razões sérias para crer que da atenuação especial da pena resultem vantagens para a reinserção social do arguido. Não há, pois, que proceder à atenuação especial da pena quanto ao arguido AA. (…)”
Desde já adiantamos que se concorda inteiramente com a decisão recorrida, não consentindo a gravidade do caso presente a opção por tal regime legal mais benévolo, pois tal medida em nada favoreceria a ressocialização do agente, que poderia até ver premiada a sua indizível conduta por ser jovem [o que não impede, naturalmente, o tribunal de valorar a idade e a juventude do arguido em sede de determinação da medida concreta da pena]. Relativamente ao enquadramento legal do regime penal especial para jovens, atente-se ao preâmbulo do DL 401/82, de 23/9, bem como aos seus artigos 1.º e 4.º. Refere-se no mencionado preâmbulo que: «7. As medidas propostas não afastam a aplicação - como ultima ratio - da pena de prisão aos imputáveis maiores de 16 anos, quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade, e esse será o caso de a pena aplicada ser a de prisão superior a 2 anos. Para além desta pena, deve, todavia, o juiz dispor de um arsenal de medidas de correcção, tratamento e prevenção que tornem possível uma luta eficaz contra a marginalidade criminosa juvenil.». E nos arts. 1.º e 4.º, respectivamente com as epígrafes Âmbito de aplicação e Da atenuação especial relativa a jovens, que: «1 - O presente diploma aplica-se a jovens que tenham cometido um facto qualificado como crime. 2 - É considerado jovem para efeitos deste diploma o agente que, à data da prática do crime, tiver completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos. 3 - O disposto no presente diploma não é aplicável a jovens penalmente inimputáveis em virtude de anomalia psíquica.»
«Se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73.º e 74.º do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.»
Desde sempre se considerou que o regime penal especial dos jovens não é de aplicação automática, o que aliás se depreende com clareza do disposto na 2 ª parte do art. 4.º e do próprio preâmbulo do DL 401/82. O regime penal relativo a jovens constitui um poder dever do julgador, tendo que ser aplicado sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos (cfr. Ac. STJ 27/10/2004, CJACSTJ XII, T. 3, pág. 212), pressupostos esses que o juiz deve averiguar mesmo oficiosamente. A aplicação do referido regime pressupõe a verificação cumulativa de vários requisitos, a saber: - a prática de facto qualificado como crime (n.º 1 do art. 1.º do DL 401/82); - o arguido tem que ter, à data do crime, completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos (n.º 2 do art. 1.º do DL 401/82); - acentuada diminuição da ilicitude, da culpa e da necessidade da pena (art.º 4.º, 1.ª parte, do DL 401/82; n.º 1 do art. 72.º do CP)[29]; - existência de sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado (art.º 4.º, 2.ª parte, do DL 401/82).
No caso em análise, não há dúvidas quanto à verificação dos dois primeiros requisitos: estamos em presença de factos qualificados como crime e o arguido, na data da prática dos mesmos, tinha 19 anos de idade. Ocorre, porém, que não se verifica uma acentuada diminuição da ilicitude, da culpa ou da necessidade da pena, por parte do arguido AA, antes pelo contrário, conforme resulta de todo o supra exposto no âmbito da análise da subsunção jurídica dos factos ao crime de homicídio qualificado, com preenchimento das agravantes previstas nas als. h) e i), do nº 2, do art. 132º do CP. – praticadas com especial censurabilidade ou perversidade, e em co-autoria. Acresce que as circunstâncias concretas da prática dos factos manifestam um brutal desprezo pela vida humana e pelos valores que enformam a sociedade. É tal a gravidade do crime, que seria incompreensível, para qualquer cidadão médio, que o tribunal lançasse mão, no caso em análise, do regime atenuativo previsto no regime penal especial dos jovens. Isto mesmo que, eventualmente, se perfilasse a hipótese de vantagens da atenuação especial para a reinserção social do jovem arguido. Na verdade, conforme se escreve no Ac. STJ de 4/5/2016, Proc. 1101/12.8TDPRT. P1. S1, Rel. Oliveira Mendes: «com o entendimento maioritário do STJ, a atenuação especial da pena fundada no art. 4.º, do DL 401/82, só pode ocorrer quando o tribunal tiver estabelecido positivamente que há razões sérias para crer que dessa atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do jovem delinquente e, simultaneamente, se considerar a atenuação compatível com as exigências de prevenção geral, sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico e garantia de protecção dos bens jurídicos. Daqui resulta que, não obstante a emissão de um juízo de prognose favorável incidente sobre o jovem delinquente, pode o mesmo revelar-se insuficiente para aplicação do regime previsto no art. 4.º, do DL 401/82.» Mais se vejam, entre outros, os Acs. do Colendo STJ, de 18/02/2009, P. nº 100/09 -3.ª. e de 12/03/2009, Proc. nº 3773/08 -5.ª, onde, perante situações de homicídio qualificado, se decidiu pela não aplicação da atenuação especial da pena decorrente do regime penal dos jovens, considerando que, em casos graves e com contornos de violência [como manifestamente ocorre in casu], não pode o julgador alhear-se da seriedade do comportamento ajuizado, olvidando que estamos perante um homicídio qualificado – porque produzido em circunstâncias que revelam especial censurabilidade e perversidade do agente -, que tem como fundamento uma agravação da culpa, uma culpa mais grave. Não é possível compaginar um quadro com tais contornos, de elevada ilicitude e elevada culpa, com a necessária culpa mitigada que deve ancorar a solução da atenuação, em geral, e, no que se reporta à situação dos jovens, com a existência de razões sérias que possam projetar um futuro conforme ao direito, com a completa subalternização daqueles parâmetros. Pelo exposto, não é aplicável ao caso o regime penal especial dos jovens. Improcede, pois, neste segmento, o recurso do arguido.
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Entende o arguido recorrente AA que a pena de prisão de 20 anos em que foi condenado é exagerada, desproporcional e desadequada, nunca devendo ser superior a 15 anos. Argumenta que o Tribunal recorrido não ponderou circunstâncias que, no seu entender, lhe atenuaram a culpa e a ilicitude, como as sucessivas agressões que OO perpetrou contra si, referindo, a título de exemplo: no ano novo e no episódio ocorrido na ..., escassos dias antes, no qual OO atacou não só o arguido AA como a sua irmã, EE; as ameaças constantes de OO de que iria matar o seu pai, o arguido BB, as quais foram, inclusive, ouvidas e reproduzidas, em sede de audiência de julgamento, pela Testemunha QQ; as agressões, correspondentes a facadas, que o arguido BB sofreu junto do Estádio ... levadas a cabo por OO; a forma como OO agrediu o arguido BB no Estádio 1...; o próprio estado alterado de OO, o qual foi devidamente relatado pelos seus amigos, os quais destacaram que foi necessário retirá-lo do confronto com QQ. Acrescenta o arguido recorrente que o Tribunal a quo desconsiderou também, completamente, nem o referindo, o pedido de desculpas sincero e honesto que o mesmo efectuou no início da audiência de julgamento. Mais aduz o arguido recorrente que, para além disso, a pena de 20 anos de prisão em que foi condenado é uma pena claramente exagerada, situando-se fora da média aplicada pelos nossos tribunais. Alega, ainda, que não tem antecedentes criminais, tem enquadramento familiar, hábitos de trabalho, mostrando-se inserido familiarmente. Conclui, assim, o arguido recorrente que tais circunstâncias deviam ter sido ponderadas, nomeadamente ao abrigo do artigo 71.º do CP, convocando as finalidades das penas em relação ao agente: ressocializar, o reintegrar, o educar para o direito.
# Por sua vez, entende o arguido recorrente BB que a pena de 18 anos que lhe foi aplicada é desadequada e desproporcional à medida da culpa, sendo ostensivamente exagerada. Argumenta que as exigências de prevenção geral não podem nunca se sobrepor ao limite da culpa e acima de tudo nunca podemos esquecer que o fim último de uma condenação é a ressocialização do arguido. Mais acrescenta que o Tribunal a quo pretende “dar o exemplo” com uma pena muito severa como é a dos autos, o que não é o caminho para resolver esta realidade, cuja solução passará certamente por caminhos educacionais das crianças/jovens. Alega, ainda, o arguido recorrente BB que tem antecedentes criminais, mas por condução sem habilitação legal, por venda de bilhetes, e uma condenação por ofensas à integridade física a um árbitro de futebol, durante um jogo. Entende que esta agressão é um facto do qual não se orgulha e que não devia ter acontecido, mas trata-se de um ainda jovem pai, com três filhos, um neto, com uma vida pessoal, profissional e social estabilizada. Conclui, assim, que, a ser condenado nos moldes em que o acórdão o fez a pena deveria “rondar os 14 anos e 3 meses”. # E, por seu lado, entende o arguido CC que a pena de prisão que lhe foi aplicada é desproporcional, tendo em conta que se encontra socialmente inserido e nunca foi condenado pela prática de crime contra a vida ou integridade física de outrem. Conclui, assim, que, a ser condenado, deveria ser numa pena próxima do mínimo, a “rondar os 12 anos de prisão”. # E, por fim, entende o Ministério Público que as penas de prisão aplicadas aos arguidos AA, BB e CC foram demasiado baixas, devendo aqueles ter sido condenados em penas, o primeiro não inferior a 23 anos; e os restantes dois não inferior a 20 anos.
Cumpre apreciar. Antes de mais, impõe-se dizer que, no que respeita à apreciação das penas fixadas pela 1.ª instância, deverá atentar-se, seguindo o paralelismo da jurisprudência quanto à intervenção do Supremo Tribunal de Justiça, no seguinte: “A intervenção do Supremo Tribunal de Justiça em sede de concretização da medida da pena, ou melhor, do controle da proporcionalidade no respeitante à fixação concreta da pena, tem de ser necessariamente parcimoniosa, porque não ilimitada, sendo entendido de forma uniforme e reiterada que “no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada”. A censura que o tribunal de recurso pode opinar sobre a decisão respeitante à determinação da sanção, incide sobre todos os elementos fornecidos pelo tribunal que, não tendo sido considerados para a questão da culpabilidade, são relevantes para a determinação da sanção, bem como sobre todos os elementos que considerou “adquiridos” (e porque considerou adquiridos uns e outros não) e ainda sobre a forma, fundamentada, porque valorou esses factores na decisão final. É função do recurso (…), antes de tudo, analisar criticamente, os “parâmetros” da determinação de sanções.[15]” “Os poderes cognitivos do STJ, como se sabe, abrangem no tocante a esta matéria, entre outras, a avaliação dos factores que devam considerar-se relevantes para a determinação da pena: a questão do limite ou de moldura da culpa, a actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, e também o quantum da pena, ao menos quando se encontrarem violadas regras de experiência ou quando a quantificação operada se revelar de todo desproporcionada”.[16] Perante tais considerandos, forçoso será concluir que o Tribunal de 2ª Instância apenas deverá intervir alterando o quantum da pena concreta quanto ocorrer manifesta desproporcionalidade na sua fixação ou os critérios de determinação da pena concreta imponham a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso. Ou seja, mostrando-se respeitados os princípios basilares e as normas legais aplicáveis no que respeita à fixação do quantum da pena e respeitando esta o limite da culpa, não deverá o Tribunal de 2ª Instância intervir, alterando a pena fixada na decisão recorrida, pela simples razão de que, nesse caso, aquela decisão não padece de qualquer vício que cumpra reparar. Não se olvide que a fixação do quantum da pena concreta aplicada em cada caso não é uma operação aritmética em que os factores a ponderar possam assumir um coeficiente numérico ou uma valoração tabelada.
Posto isto, cumpre-nos, ora, destacar que, na tarefa de determinação da medida concreta da pena, no que ao crime de homicídio concerne, não se pode olvidar o valor do respectivo bem jurídico. O bem jurídico protegido com a incriminação do homicídio é a vida humana, a vida de outra pessoa. A vida é o mais valioso dos direitos fundamentais individuais. Sem a vida nenhum outro direito existe que a pessoa, ela mesma, por si própria, possa usufruir. A Constituição da República elegeu como direito fundamental primeiro o direito à vida humana – art. 24º - garantindo a sua inviolabilidade (n.º 1), isto é, o direito a não ser privado da vida, a não ser morto. Nas palavras de J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, “o direito à vida é um direito prioritário, pois é condição de todos os outros direitos fundamentais, sendo material e valorativamente o bem mais importante do catálogo de direitos fundamentais e da ordem jurídico-constitucional no seu conjunto”. Por isso, o legislador tem de conferir à vida humana a mais forte tutela penal. Reconhecimento e proteção também inscritos nos principais instrumentos convencionais internacionais sobre direitos fundamentais de que o nosso país é parte. Assim sucede na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, a qual, começando por estabelecer a inviolabilidade da dignidade do ser humano e impor o dever de respeito e a obrigação de proteção (art. 1º), logo de seguida, no art. 2º n.º 1, consagra que “todas as pessoas têm direito à vida”. Outro tanto sucede na Convenção Europeia dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais, que consagra como direito fundamental essencial a vida humana – art. 2°-, estabelecendo que “ninguém poderá ser intencionalmente privado da vida”, e impõe aos Estados parte a obrigação de proteger, por lei, a vida de qualquer pessoa (n.º 1) O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, pronunciando-se sobre a “proteção internacional do direito à vida”, “observa, em primeiro lugar, que no decorrer do desenvolvimento dessa proteção, as convenções relevantes e outros instrumentos têm afirmado constantemente a preeminência do direito à vida. O Artigo 3º da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 10 de dezembro de 1948, por exemplo, consagra que “toda pessoa tem direito à vida”. Direito confirmado pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 16 de dezembro de 1966 que, no Artigo 6 estabelece: “Todo ser humano tem o direito inerente à vida” e “Ninguém será arbitrariamente privado de sua vida”. Também está incluído na Convenção, cujo artigo 2º, § 1º, prevê: “Todo o individuo tem direito à vida, e deve ser protegido por lei. Ninguém deve ser privado da sua vida intencionalmente (…).” A convergência dos instrumentos acima mencionados é significativa: indica que o direito à vida é um atributo inalienável dos seres humanos e constitui o valor supremo na hierarquia dos direitos humanos. Mas não somente o legislador, também a jurisprudência está vinculada a refletir essa tutela adequada e eficaz em cada caso de atentado voluntário daquele direito inarredável das sociedades modernas, e que, inigualavelmente, melhor densifica o Estado de direito e o respeito pela dignidade da pessoa humana. Sem descurar a obrigatoriedade de firmar a mais elevada proteção penal à via humana não deve descurar-se, como plasmou o legislador na Exposição de Motivos do DL n.º 48/95 de 15/03 que, “na verdade, mais do que a moldura penal abstratamente cominada na lei, é a concretização da sanção que traduz a medida da violação dos valores pressupostos na norma, funcionando, assim, como referência para a comunidade”. Reflectindo a protecção constitucional e dos instrumentos de direito internacional, o nosso regime penal (à semelhança de todos os regimes civilizados) incrimina o homicídio, sendo o crime de homicídio previsto no art. 131º do Cód. Penal, punível com a moldura penal abstracta de 8 a 16 anos de prisão e o crime de homicídio qualificado, previsto nos arts. 131º e 132º, do mesmo diploma, punível com pena de prisão de 12 a 25 anos. A moldura penal abstracta do crime de homicídio qualificado é muito ampla, pois existe uma margem de 13 anos entre os seus limites mínimo e máximo. Mas tal sucede para permitir ao julgador distinguir, de entre os casos de homicídio que já se estabeleceu previamente ter sido cometido com especial censurabilidade, os que são mais graves dos que são menos graves. Estabelecida a moldura penal, o primeiro e decisivo factor a considerar no procedimento de determinação da medida concreta da pena é o que decorre das finalidades da punição, firmadas pelo legislador no art. 40.º do Código Penal, e que são: a proteção do bem jurídico violado e a ressocialização do agente (n.º 1); e tem como limite inultrapassável “a medida da culpa” –n.º 2. No Código Penal de 1982 não existia uma norma que direta e autonomamente estatuísse sobre as “finalidades das penas”. Paradigma que o legislador do Código Penal de 1995 inverteu. O legislador, na exposição de motivos do DL n.º 48/95 de 15 de março, plasmou, clara e inequivocamente aquela solução, nos seguintes termos: «Necessidade, proporcionalidade e adequação são os princípios orientadores que devem presidir à determinação da pena aplicável à violação de um bem jurídico fundamental De destacar, a este propósito, a inovação constante do artigo 40.º ao consagrar que a finalidade a prosseguir com as penas e medidas de segurança é "a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade". Sem pretender invadir um domínio que à doutrina pertence - a questão dogmática do fim das penas -, não prescinde o legislador de oferecer aos tribunais critérios seguros e objetivos de individualização da pena, quer na escolha, quer na dosimetria, sempre no pressuposto irrenunciável, de matriz constitucional, de que em caso algum a pena pode ultrapassar a culpa». Portanto, o parâmetro primordial do modelo de determinação da pena judicial é primariamente fornecido pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos violados estabelecendo, in concreto, o limiar mínimo abaixo do qual se perde aquela função tutelar ou, noutra expressão, não satisfaz a necessidade de reafirmação estabilizadora das normas, isto é, a pena aplicada não alcança a necessária, suficiente e adequada “prevenção geral positiva ou prevenção de integração”. Parâmetro co-determinante do modelo de determinação da medida da pena judicial é também a culpa na execução do facto, estabelecendo o “teto” ou limiar máximo acima do qual a pena aplicada é excessiva, subalternizando à «paz» comunitária a dignidade humana do agente. E, entre aquele limiar mínimo e este limiar máximo, o modelo de determinação da medida da pena completa-se com a finalidade de reintegração do agente na sociedade, ou finalidade de prevenção especial de socialização. Por sua vez, o Código Penal, no art. 71.º estabelece “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção” (nº 1), atendendo o tribunal “a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando” as circunstâncias que enuncia, exemplificativamente, nas alíneas do n.º 2, e que se reportam resumidamente ao facto ou ao agente (à culpa ou à prevenção), às quais a doutrina adiciona outros fatores, designadamente relativos à vitima. Factores enunciados no art. 71.º n.º 2 que, grosso modo, podem respeitar ao facto ou ao agente, designadamente: - à execução do concreto facto cometido pelo agente, agrupando circunstâncias que caracterizam a gravidade da violação jurídico-penal cometida, que servem para caracterizar a medida da censurabilidade, e (quando for o caso) o grau de violação dos deveres impostos ao agente; - à personalidade do agente revelada no facto, agrupando as condições pessoais, sociais e económicas, a sensibilidade à pena e à influência que esta pode exercer, as qualidades da personalidade comparadas com as do «homem fiel ao direito». - à conduta anterior e posterior ao facto, agrupando a história vivencial e criminal do agente e o comportamento posterior empreendido no sentido de assumir as consequências do crime cometido e, estando ao seu alcance, contribuir para que os comparticipantes não restem impunes e a “governar-se” com o proventos ilícitos assim obtidos.
No caso, como vimos, estriba, desde logo, o arguido recorrente AA a sua argumentação de que a pena em que foi condenado é exagerada, desproporcional e desadequada, na alegação de uma série de circunstâncias que, no seu entender, deveriam ter sido consideradas pelo Tribunal recorrido (e não o foram), como atenuantes da sua actuação. Relembrando, invoca o arguido recorrente sucessivas agressões que o falecido OO perpetrou contra si, referindo, a título de exemplo: no ano novo e no episódio ocorrido na ..., escassos dias antes, no qual OO atacou não só o arguido AA como a sua irmã, EE; as ameaças constantes de OO de que iria matar o seu pai, o arguido BB, as quais foram, inclusive, ouvidas e reproduzidas, em sede de audiência de julgamento, pela Testemunha QQ; as agressões, correspondentes a facadas, que o arguido BB sofreu junto do Estádio ... levadas a cabo por OO; a forma como OO agrediu o arguido BB no Estádio 1...; o próprio estado alterado de OO, o qual foi devidamente relatado pelos seus amigos, os quais destacaram que foi necessário retirá-lo do confronto com QQ. Ressalta, portanto, do cenário tecido pelo arguido recorrente AA, uma inversão das posições de agressor e vítima, apresentando-se o arguido como a vítima e indicando este como o agressor, o falecido OO. Ora, tal factualismo não colheu credibilidade perante o Tribunal a quo, colidindo frontalmente com a restante prova (considerada credível) produzida nos autos e, assim, com o elenco factual provado. Tratam-se de situações abordadas em audiência, maxime pelos arguidos AA, BB e CC, nas suas declarações, num claro e censurável sentido de desresponsabilização, não tendo, como dissemos, logrado convencer o Tribunal a quo, quanto à sua veracidade, como facilmente se constata da motivação da decisão de facto. Acrescenta o arguido recorrente AA que o Tribunal a quo desconsiderou também, completamente, nem o referindo, o pedido de desculpas sincero e honesto que o mesmo efectuou no início da audiência de julgamento. Também aqui, uma vez mais, pretende o arguido convocar a seu favor uma circunstância em que apenas o mesmo acredita, não constando igualmente do manancial fáctico apurado. Não podem, pois, tais circunstâncias, naturalmente e ao contrário do pretendido pelo arguido recorrente AA, ser consideradas por este Tribunal de recurso.
Prosseguindo. Na decisão recorrida, as penas de prisão decretadas aos arguidos recorrentes AA, BB e CC vêm motivadas, considerando o Tribunal a quo os parâmetros seguintes: - a elevadíssima ilicitude dos factos e culpa dos arguidos, destacando-se a forma de actuação, a violência, a crueldade, a insídia presente – quer em termos de perseguição, quer em termos de surpresa, quer ainda em termos de absoluta desconsideração pelo sofrimento da vítima, nos termos descritos nos factos provados, que fazem elevar exponencialmente a culpa e ilicitude; - as elevadíssimas exigências de prevenção geral, destacando-se que se tem verificado um aumento deste tipo de criminalidade não só entre jovens, mas sobretudo entre eles, revelando o desprezo perante os bens jurídicos alheios mais valiosos com que crescem, desta forma colocando a comunidade em sobressalto – todos os dias os cidadãos comuns despertam para novas notícias dando conta de crimes violentos praticados com ou sem móbil, tornando a sociedade mais exposta ao perigo, com medo e vulnerável; e - quanto às exigências de prevenção especial, considerou o Tribunal recorrido os antecedentes criminais dos arguidos AA e CC, descritos nos factos provados e a ausência de condenações transitadas em julgado quanto aos demais arguidos, mais considerando as condições de vida de cada um, que sintetizou nos termos seguintes: Quanto ao arguido AA: registou um percurso escolar pautado por absentismo, insucesso escolar e comportamentos desajustados, ao nível da promoção e proteção, com aplicação de medida de acolhimento residencial em IPSS, assim como também foi alvo de intervenção no âmbito tutelar educativo. Beneficiou ainda de acompanhamento pedopsiquiátrico, por lhe ter sido diagnosticada perturbação de hiperatividade com défice de atenção, que abandonou sem alta clínica. O arguido habilitou-se com o 9º ano de escolaridade, mediante a realização de um curso profissional, iniciando percurso profissional na área de lavagem/limpeza de vidros. Iniciou o consumo de haxixe na fase da adolescência com carácter diário, mantendo consumos ocasionais, assim como consumos de bebidas alcoólicas, em contexto recreativo, até à sua reclusão. Beneficiou de duas suspensões provisórias de processo, que cumpriu. O arguido sempre integrou o agregado familiar de origem, tendo encetado relação afetiva, da qual resultou um descendente atualmente com 1 ano de idade. Atualmente, AA, que se encontra preso preventivamente, tem registado várias sanções disciplinares, a última das quais datada de 19/12/2023. Não se encontra integrado em atividade estruturada (escolar, formativa ou profissional), uma vez que não manifesta motivação para esse efeito. Beneficia da retaguarda familiar, sendo que os progenitores e a irmã são coarguidos nos presentes autos. E mais considerou, o Tribunal recorrido, o facto de ter sido este o arguido quem, com apenas 19 anos de idade ao tempo dos factos, executou as concretas facadas, ultrapassando aquele limiar de valores e sensibilidade próprios de qualquer ser humano – assim tornando o seu comportamento de ainda mais acrescida censurabilidade (por maior ilicitude e culpa). Quanto ao arguido BB: à data da factualidade integrava intermitentemente o agregado familiar constituído pela companheira e pelos dois filhos (todos coarguidos), mantendo residência formal no apartamento camarário originariamente titulado pela mãe, falecida em 2020. As dinâmicas familiares indiciavam instabilidade, em especial no eixo conjugal, com sucessivas separações e reconciliações. O arguido tem um filho mais novo, gerado fora desta relação. Com habilitações escolares ao nível do 6º ano, BB teve uma trajetória laboral irregular e marcada por informalidade. O futebol foi assumido pelo arguido como prioritário na sua vida. Os seus rendimentos pessoais proviriam da prática desportiva (ajudas de custo), de trabalhos informais e do RSI. O arguido considera a sua vida como “muito boa”, baseada na prática desportiva regular (futebol e ginásio), no convívio social com os amigos e na participação nas atividades da claque, que integrará desde 2010. BB desvaloriza as condenações anteriores, circunscrevendo-o a incidentes contingenciais à atividade desportiva e da claque e relacionados com condução sem habilitação legal. Quanto ao arguido CC: apesar de apresentar reduzidas qualificações académicas e os períodos de reclusão vivenciados ao longo do seu percurso de vida foi adquirindo competências profissionais e hábitos de trabalho, que lhe conferiram um percurso laboral regular, pese embora em fase mais recente se encontrasse formalmente em situação de desemprego desenvolvendo, contudo, trabalhos em regime informal. No presente contexto prisional manifestou dificuldades no cumprimento das regras do estabelecimento prisional o que originou a sua colocação em regime de segurança, onde permanece. Ao longo deste período tem mantido apoio por parte do agregado familiar, constituindo-se como importantes elementos de suporte e estabilidade para o arguido.
A estas circunstâncias concretamente consideradas pelo Tribunal recorrido, na fundamentação da medida concreta das penas aplicadas aos arguidos recorrentes AA, BB e CC, acrescenta este Tribunal ad quem a circunstância [que ali devia também ter sido mencionada, diga-se, ainda que sem consequências por não o ter sido] de os arguidos, em declarações em audiência de julgamento, terem pautado a sua postura por uma flagrante ausência de arrependimento, insistindo numa versão (que não colheu a mínima credibilidade) de desresponsabilização pessoal, exibindo-se cada um deles (e sua família) como a verdadeira vítima dos acontecimentos, sendo a real vítima o “agressor”. Considerou o Tribunal recorrido, na motivação da decisão de facto, que as declarações dos arguidos, para além de não credíveis, revelaram-se uma “tentativa de desresponsabilização total por um desfecho que ocorre “às suas mãos” e que não explicam minimamente. É certo que o arguido tem a total liberdade de prestar as declarações que entender, assim como de não as prestar de todo, decorrente do seu estatuto processual, mas também não se olvide que o tribunal decide em obediência ao princípio da livre apreciação da prova, decorrente do disposto no art. 127º do Código de Processo Penal, onde se incluem mormente as conclusões que retira das características de personalidade do arguido, face à sua postura em relação aos actos praticados, espelhada, muitas vezes, nas suas declarações em audiência, com as consequências daí advenientes. Concomitantemente, não se olvide também que os arguidos recorrentes AA, BB e CC cometeram um crime de homicídio agravado, que é legalmente classificado de criminalidade especialmente violenta –art. 1º al.ª l) do CPP e que, como se expendeu supra, a pena de prisão tem de alcançar uma medida necessária a repor o sentimento de validade do bem jurídico violado e da reafirmação da suficiência da sua proteção penal e, com o limite traçado pela medida da culpa, que seja adequada a servir de advertência individual ou intimidação [e que, naturalmente, não seja tão drástica que não possa cumprir o desiderato da reintegração na comunidade]. Terá de ser encontrada uma pena judicial que reafirme a validade do mais valioso dos bens jurídico-penais protegidos – a vida -, que no caso foi violado, contendo-se nos limites da censurabilidade que comporta a atitude do arguido, e que seja adequada a satisfazer a exigências de prevenção especial de ressocialização que no caso se fazem sentir.
Em face de todo o exposto, quanto aos arguidos recorrentes, AA, BB e CC, conclui este Tribunal de recurso que: - perante, por um lado, a evidente carência de circunstâncias atenuativas gerais – para além da idade/juventude do arguido recorrente AA, com 19 anos na altura dos factos [o que não tendo sido suficiente, nos termos sobreditos, para justificar a aplicação do regime especial para jovens, terá, sem dúvida, que ser atendido ao nível da determinação da medida concreta da pena]; e - perante, por outro lado, o cenário de ilicitude e culpa muito elevadas (ou elevadíssimas, usando a terminologia do Tribunal recorrido), e, bem assim, também muito elevadas as exigências de prevenção geral; sendo igualmente relevantes as exigências de prevenção especial, maxime dada a postura dos três arguidos, de total desresponsabilização perante os factos, e considerando os seus percursos de vida pessoais, denotando preocupante instabilidade, particularmente quanto aos arguidos AA e BB; - cumprindo encontrar um equilíbrio entre todos estes vectores, julgamos ajustadas as penas aplicadas pelo Tribunal de 1ª instância aos arguidos recorrentes, ou seja, de 20 (vinte) anos de prisão ao arguido AA; e 18 (dezoito) anos de prisão aos arguidos BB e CC, o que se declara.
Entende este Tribunal ad quem que, de conformidade com a finalidade das penas e a máxima carência de protecção do bem jurídico protegido – a vida, o bem dos bens, condição para o gozo de qualquer outro -, de conformidade com os critérios consignados no art.º 71º do Código Penal e ainda com os parâmetros do caso concreto que se vem de realçar, as penas de 20 anos de prisão, aplicada ao arguido recorrente AA e 18 anos de prisão aplicadas aos arguidos recorrentes BB e CC, decretadas no acórdão recorrido, revelam-se medidas ajustadas, suficientes e adequadas a cumprir aquelas finalidades e a advertirem os arguidos, seriamente, instando-os a reflectir sobre o seu comportamento futuro, preparando-os para serem capazes de se reintegrarem na comunidade das pessoas fiéis ao direito.
Resulta, então, do exposto, que não procede nem a redução de penas reclamada pelos arguidos recorrentes, nos termos supra fundamentados, nem a sua agravação, alvitrada pelo Ministério Público recorrente. Rebatendo a agravação das penas pretendida pelo Ministério Público recorrente, relembramos, como já acima se expôs, que a moldura penal abstracta do crime de homicídio qualificado – de 12 a 25 anos de prisão - é muito ampla, existindo uma margem de 13 anos entre os seus limites mínimo e máximo, precisamente para permitir ao julgador distinguir, de entre os casos de homicídio que já se estabeleceu previamente ter sido cometido com especial censurabilidade, os que são mais graves dos que são menos graves. Estabelecida a moldura penal, o primeiro e decisivo factor a considerar no procedimento de determinação da medida concreta da pena é o que decorre das finalidades da punição, firmadas pelo legislador no art. 40.º do Código Penal, e que são: a proteção do bem jurídico violado e a ressocialização do agente (n.º 1); e tem como limite inultrapassável “a medida da culpa” –n.º 2. Balizando-se nestes parâmetros, e como o destacou Santos Cabral, no Acórdão do STJ, datado de 27/03/2008, também já ali citado, “ (…) o julgador deve ser muito exigente quanto opta por uma pena máxima ou próxima da máxima, pois o princípio da igualdade está intimamente ligado ao da justiça relativa e, portanto, há que reservar tais penas para os casos excepcionais de rara violência.(…)” (negrito nosso) Ora, atenta a fundamentação do Tribunal a quo, para a aplicação das penas de prisão de 20 anos ao arguido AA e 18 anos aos arguidos BB e CC, nos moldes atrás analisados, forçoso será concluir que este Tribunal de 2ª Instância não deverá intervir alterando o quantum daquelas penas concretas, aumentando-as, como o pretende o recorrente Ministério Público, por não se vislumbrar a invocada desproporcionalidade na sua fixação e não impondo, os critérios de determinação da pena concreta, a sua correcção, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso. Mais uma vez se recorda que a fixação do quantum da pena concreta aplicada em cada caso não é uma operação aritmética em que os factores a ponderar possam assumir um coeficiente numérico ou uma valoração tabelada. Assim, mostrando-se respeitados os princípios basilares e as normas legais aplicáveis no que respeita à fixação do quantum da pena e respeitando esta o limite da culpa, não se descortinam motivos que pudessem justificar uma intervenção correctiva, por parte deste Tribunal de recurso, sobre o quantum das penas aplicadas pelo Tribunal a quo aos arguidos recorrentes AA, BB e CC. Improcedem, pois, os recursos dos arguidos referidos e, bem assim, do Ministério Público, neste segmento. »
Veio o arguido recorrente GG alegar que a pena de multa em que foi condenado é excessiva, devendo ser reduzida, quer quanto ao número de dias, quer quanto ao quantitativo diário. Vejamos se lhe assiste razão. Relembramos aqui e antes de mais, o que acima já se expendeu (no âmbito da análise do quantum penal aplicado aos arguidos recorrentes AA, BB e CC e para onde aqui nos permitimos remeter, para evitar repetições), no que respeita à apreciação das penas fixadas pela 1.ª instância, seguindo o paralelismo da jurisprudência quanto à intervenção do Supremo Tribunal de Justiça. Assim e sublinhando, o Tribunal de 2ª Instância apenas deverá intervir alterando o quantum da pena concreta quanto ocorrer manifesta desproporcionalidade na sua fixação ou os critérios de determinação da pena concreta imponham a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso.
Em primeiro lugar, porque se refere às finalidades das penas e medidas de segurança, importa ter em conta o disposto no artigo 40.º, nº 1 do Código Penal do qual decorre que “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”, decorrendo, por sua vez, do seu n.º 2 que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”. Por sua vez, decorre do artigo 71.º, n.º 1, do Código Penal que a determinação da pena concreta, dentro da moldura penal cominada nos respetivos preceitos legais, far-se-á “em função da culpa do agente e das exigências de prevenção” geral e especial do agente, determinando o n.º2 do mesmo preceito legal que, para o efeito, se atenda a todas as circunstâncias que deponham contra ou a favor do agente, desde que não façam parte do tipo legal de crime [para que não se viole o princípio “ne bis in idem”, uma vez que tais circunstâncias já foram tomadas em consideração pela própria lei para a determinação da moldura penal abstrata], “considerando, nomeadamente: a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; b) A intensidade do dolo ou da negligência; c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica; e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.”. Decorre, por fim, do n.º3 do citado preceito legal, que “na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena”. Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28-09-2005[17], “na dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e os critérios do artigo 71º do Código Penal têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha da medida da pena; tais elementos e critérios devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (circunstâncias pessoais do agente; a idade, a confissão; o arrependimento) ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente”. A culpa traduz-se num juízo de reprovação da conduta do agente, censurando-a em face do ordenamento jurídico-penal. Com efeito, o facto punível não se esgota na desconformidade da conduta do agente perante o ordenamento jurídico-penal, com a ação ilícita-típica, sendo, ainda, necessário que a conduta do agente seja culposa, isto é, que o facto por si praticado possa ser pessoalmente censurado, traduzindo-se, assim, numa atitude pessoal e juridicamente desaprovada, pela qual o agente terá de responder. Por seu lado, as exigências de prevenção têm a ver com a proteção dos bens jurídicos [prevenção geral] e a reintegração do agente na sociedade [prevenção especial], as quais nos termos do disposto no artigo 40º, n.º 1 do Código Penal constituem as finalidades da aplicação das penas e das medidas de segurança, conforme já referimos supra. “A medida da pena há de ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva e ser definida e concretamente estabelecida em função de exigências de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial positiva ou de socialização, não podendo ultrapassar em caso algum a medida da culpa. É o próprio conceito de prevenção geral de que se parte – proteção de bens jurídicos alcançada mediante a tutela das expectativas comunitárias na manutenção (e no reforço) da validade da norma jurídica violada - que justifica que se fale de uma moldura de prevenção. Proporcional à gravidade do facto ilícito, a prevenção não pode ser alcançada numa medida exata, uma vez que a gravidade do facto ilícito é aferida em função do abalo daquelas expectativas sentido pela comunidade. A satisfação das exigências de prevenção terá certamente um limite definido pela medida da pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena. Que constituirá, do mesmo passo, o ponto ótimo de realização das necessidades preventivas da comunidade, que não pode ser excedido em nome de considerações de qualquer tipo, ainda quando se situe abaixo do limite máximo consentido pela culpa. Mas, abaixo daquela medida (ótima) de pena (da prevenção), outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas - até ao que considere que é o limite do necessário para assegurar a proteção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral”.[18] “Em suma, o limite mínimo da pena deve corresponder às exigências e necessidades de prevenção geral que no caso se façam sentir, de modo a que a sociedade continue a acreditar na validade da norma punitiva, ao passo que o limite máximo não deve exceder a medida da culpa do agente revelada no facto, sob pena de degradar a condição e dignidade humana do mesmo; e, dentro desses limites mínimo e máximo, a pena deve ser individualizada no quantum necessário e suficiente para assegurar a reintegração do agente na sociedade, com respeito pelo mínimo ético a todos exigível, sendo, pois, as razões de prevenção especial que servem para encontrar o quantum de pena a aplicar.”[19] Assim sendo, atribui-se à culpa a função única de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração positiva das normas e valores) a função de fornecer uma moldura de prevenção cujo limite máximo é dado pela medida óptima da tutela dos bens jurídicos - dentro do que é considerado pela culpa - e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto da pena, dentro da referida moldura de prevenção, que melhor sirva as exigências de socialização do agente. Conclui-se, portanto, que estaremos perante uma pena justa e proporcional quando esta satisfizer as exigências de prevenção geral e especial, atentando-se no caso concreto, e não exceder a medida da culpa do agente.
Desçamos ao caso concreto. Do quantum da pena de multa aplicada O arguido recorrente GG foi condenado pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23.02, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros), no montante global de 1.440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros). Este crime, feita que se encontra a opção por pena de multa, o que não foi contraditado em recurso, é punível com a moldura penal abstracta de 10 até 480 dias.
A actuação ilícita do arguido recorrente GG encontra-se descrita, na sua vertente objectiva, no ponto 33 dos factos provados, nos termos seguintes: “ (…) 33- No dia 8 de junho de 2022, na residência sita na Rua ..., entrada ..., casa ..., no Porto, o arguido GG tinha: - um boxer (vulgo, soqueira) de produção artesanal e de modelo em metal, com 4 anéis para inserção dos dedos e uma base de apoio para a palma da mão, com as dimensões de 9,5 x 6,5 x 1,3 cm, em bom estado e perfeitamente funcional. (…)” E os seus antecedentes criminais encontram-se descritos no ponto 83 dos factos provados, nos termos seguintes: “(…) 83- O arguido GG sofreu as seguintes condenações: No processo 806/17.1PFAMD, pela prática em 5/2017 de um crime de burla, por decisão de 5/12/2019, transitada em julgado em 17/1/2020, a condenação na pena de 130 dias de multa, já extinta. (…)”
Veio, então, o Tribunal a quo a decidir, em matéria de quantum penal, nos termos seguintes: “(…) No caso dos autos, haverá que considerar todas as circunstâncias referidas no artigo 71, n.º 2, do Código Penal, para encontrar a pena concreta, referindo-se, desde já, que o grau de culpa, há-de resultar da valoração do facto ilícito praticado pelo arguido. (…) Nos crimes de detenção de arma proibida é reduzida a ilicitude e culpa – as armas encontravam-se na casa dos arguidos e desconhece-se qualquer utilização das mesmas pelos arguidos. As exigências de prevenção geral são elevadíssimas em todos os crimes: Quanto às exigências de prevenção especial há que considerar os antecedentes criminais dos arguidos AA e CC, descritos nos factos provados, a ausência de condenações transitadas em julgado quanto aos demais arguidos, (…) Quanto aos crimes de detenção de arma proibida, face à ausência de antecedentes criminais dos arguidos LL e GG por crimes da mesma natureza (a arguida LL sequer por qualquer crime) e os seus percursos de vida, é de entender que a pena de multa ainda se mostra suficiente para alcançar as finalidades da punição. Na determinação da pena, é de considerar que a atuação imputada é a de detenção de armas, sem que se saiba que os arguidos as tenham utilizado, as já referidas elevadas exigências de prevenção geral e as reduzidas exigências de prevenção especial quanto à arguida LL e pouco elevadas exigências de prevenção especial quanto ao arguido GG. Neste contexto, considera-se adequada a aplicação ao arguido de uma pena de 180 dias de multa para cada um, à taxa diária de € 8,00 – atento a situação económica dos arguidos. (…)”
Apreciando. Ainda que nos mereça, a decisão recorrida, algum acerto quanto à qualificação dos parâmetros a atender ao nível da determinação da medida concreta da pena, quanto ao arguido recorrente GG, como: - o grau de ilicitude e de culpa, que reputamos de medianos [e não de reduzidos, como o considerou o Tribunal a quo – mesmo considerando que a arma se encontrava na casa do arguido e desconhecendo-se qualquer utilização da mesma pelo arguido]; - o grau elevado das exigências de prevenção geral [sendo que estas foram consideradas, pelo tribunal recorrido, de elevadíssimas, colocadas ao mesmo nível das considerações feitas, neste parâmetro, quanto aos restantes crimes apreciados, como o homicídio e as ofensas à integridade física qualificada); e - a consideração do antecedente criminal apresentado pelo arguido, ainda que por crime de diversa natureza [o que comporta, em si, sempre e ainda que num grau meramente residual ou reflexo –inferior ao que resultaria de se tratar de um crime da mesma natureza -, uma valoração a considerar, quanto à personalidade do agente, já com alguma propensão para o crime – o que não foi considerado pelo Tribunal a quo]; tudo conjugado, acompanha, este Tribunal de recurso, a dosimetria penal aplicada pelo Tribunal recorrido ao arguido recorrente GG - a pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa. Com efeito, atentando nas circunstâncias supra enunciadas, à moldura penal abstracta prevista [situando-se a pena concreta aplicada abaixo do meio da moldura] e os referidos critérios de determinação da pena concreta, entende este Tribunal de recurso que se revela justa, adequada e proporcional à culpa do recorrente e às necessidades de prevenção geral e especial, a referida pena aplicada pelo Tribunal a quo. Improcede, assim, neste segmento, o recurso do arguido recorrente GG.
Do quantitativo diário da pena de multa Com interesse para a questão ora a decidir, revisitemos a decisão recorrida, no que concerne às apuradas condições pessoais, de vida, do arguido recorrente GG, as quais se encontram descritas no ponto 76 dos factos provados: “(…) 76- À data dos factos pelos quais se encontra acusado, GG mantinha idêntica inserção familiar e habitacional à atual. O arguido reside com a progenitora, de 57 anos, empregada de limpeza, e irmão, de 34 anos, assistente operacional em unidade Hospitalar. O núcleo familiar reside há cerca de 15 anos em apartamento camarário, tipologia 3, descrito como tendo condições de habitabilidade, localizado no bairro 5..., zona com moderada incidência de problemáticas sociais e criminais. As dinâmicas familiares são tidas como afetivamente gratificantes e apoiantes. O progenitor do arguido também presta solidariedade ao mesmo, inclusivamente apoiando-o nas despesas decorrentes da sua defesa no presente processo. GG habilitou-se com o 12º ano, através da frequência do curso profissional de Técnico de Instalações Elétricas, que concluiu com cerca de 18 anos de idade. Regista experiência profissional na área de mecânica e limpador de vidros, ambas experiências por alguns meses. À data dos factos pelos quais vem acusado, encontrava-se recentemente desempregado, situação que mantém até à atualidade. Encontra-se inscrito no Instituto de Emprego e Formação Profissional a fazer alguns trabalhos pontuais/residuais na área de mecânica. À data dos factos, assim como presentemente, GG não dispõe de rendimentos próprios, beneficiando do suporte financeiro e habitacional da progenitora. O agregado dispõe de uma situação económica modesta, subsistindo dos rendimentos de trabalho da progenitora (atualmente com incapacidade temporária para o trabalho) e do irmão do arguido, que suportam as despesas fixas mensais decorrentes dos encargos com a renda da habitação, cerca de 39Euros, consumos domésticos (água e eletricidade), cerca de 140Euros, telecomunicações, cerca de 75Euros, e alimentação. Ao nível dos comportamentos aditivos, GG referiu que à data dos factos pelos quais vem acusado mantinha consumos esporádico de canabinoides, que terá abandonado há cerca de um ano sem recurso a acompanhamento médico. À data dos factos o arguido mantinha um quotidiano pouco organizado, ocupando-se com trabalhos pontuais e convívio com amigos, dois dos quais coarguidos no presente processo, JJ e HH. Atualmente ocupa o seu quotidiano primordialmente em casa, na companhia da mãe, e ainda no convívio com alguns amigos e jogos semanais de futebol com estes. Junto do meio sócio- residencial GG foi descrito como adequado e educado. GG apresenta antecedentes criminais por crime de burla, tendo sido condenado em pena de multa substituída por 150 horas de trabalho a favor da comunidade, que de acordo com a avaliação da entidade beneficiária e desta DGRSP cumpriu entre 25.05.2020 e 17.08.2020, de forma adequada. O presente confronto com o sistema da administração da justiça penal é percecionado pelo arguido como tendo significativo impacto negativo ao nível pessoal e familiar, pela angústia sentida. A progenitora assinala considerável alteração no bem-estar do arguido, descrevendo sintomatologia depressiva e ansiosa. (…)”
Entendeu o Tribunal recorrido aplicar ao arguido recorrente GG a taxa diária de € 8,00. Ocorre que, considerando, maxime, a situação apurada nos autos de desemprego do arguido, que não dispõe de rendimentos próprios, beneficiando do suporte financeiro e habitacional da sua progenitora, de cujos rendimentos de trabalho depende a sua subsistência, e atendendo às despesas do agregado, atrás mencionadas, a taxa diária aplicada revela-se, in concreto, algo desadequada, por excessiva. Aqui, importa considerar os ensinamentos do Supremo Tribunal de Justiça constantes no Acórdão datado de 02/10/1997, onde se decidiu que “o montante diário da multa deve ser fixado em termos de se constituir um sacrifício real para o condenado sem, no entanto, deixar de lhe serem asseguradas as disponibilidades indispensáveis ao suporte das suas necessidades e do respectivo agregado familiar”. Há que realçar que a multa terá de constituir, de algum modo, um sacrifício para o arguido e não um encargo mensal, como se de uma qualquer despesa se tratasse, sob pena de deixar de ter qualquer efeito penalizador e dissuasor e perder a sua eficácia. Partilhamos o entendimento que o limite mínimo está reservado para situações de pobreza extrema. No entanto, outras há que, não sendo deste patamar, se situam ainda num nível de considerável dificuldade financeira, que justificam o seu não muito afastamento do mínimo legal – o que é o caso do arguido recorrente GG, em que já de antemão se receia e perspectiva que será a sua progenitora a carregar tal despesa -, mesmo sendo certo que para acautelar as situações de maior dificuldade consagrou a lei a possibilidade do alargamento do prazo para o seu pagamento ou o seu pagamento em prestações [artigo 47.º, n.º 3, do Código Penal]. Ora, este será o caso do arguido recorrente GG Tudo visto e ponderado, entende este Tribunal de recurso que se afigura mais criteriosa, adequada e ajustada a taxa diária de 6,00 € (seis euros), o que se determina, revogando-se a aplicada pelo Tribunal recorrido. Procede, assim, neste segmento, o recurso do arguido recorrente GG.
» Veio também o Ministério Público, no seu recurso, manifestar a sua não concordância com a pena aplicada à arguida DD, a qual entende que deverá ser agravada, assim como com a suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada. Argumenta, em suma, que o dolo desta arguida foi “intensíssimo” e a ilicitude dos factos demasiado grave, tratando-se de uma agressão “deveras cobarde da parte da arguida DD, mãe de família”, não tanto perante a qualificativa de ter sido levada a cabo por três pessoas, mas sobretudo pelo facto de a ofendida NN ter sido atacada e impiedosamente agredida apenas por virtude daquela pretender evitar uma agressão e defender um seu amigo (testemunha PP), que estava a ser agredido, pelo facto deste último procurar auxiliar o falecido OO (item 23 da matéria provada). Entende o Ministério Público que esta atitude por parte desta arguida, juntamente com as duas outras agressoras, sua filha EE e uma amiga desta, FF, torna-se tanto mais grave quanto ela, como mulher mais velha, mãe de família, mãe e mulher dos arguidos AA e BB, ciente da gravidade das actuações destes dois arguidos seus familiares, deveria ter tentado parar as agressões que estavam a ser produzidas contra a vítima mortal e sobretudo, mais grave se torna pelo facto de, também ela própria, agredir uma outra pessoa/mulher, que estava numa nobre missão de procurar obstaculizar uma outra agressão a quem tentava proteger a infeliz vítima. Acrescenta a “desfaçatez e sobranceria” com que, em audiência de julgamento, a arguida DD prestou declarações perante o Tribunal e, assim, a sua falta de assunção dos factos; além de que foi a atitude desta arguida que esteve na origem e nessa noite, de toda esta actuação criminosa por parte dos três arguidos e que conduziu à morte do OO. Destaca, ainda, o Ministério Público recorrente “a imagem negativa que a arguida possui no bairro onde habita, contando com uma imagem social negativa, conforme resulta do seu relatório social”. Conclui, assim, o Ministério Público recorrente que a pena concreta de 1 ano e 8 meses de prisão aplicada à arguida DD é demasiado branda e benévola, devendo ter-lhe sido aplicada uma pena de prisão relativamente próxima do seu limite máximo, nunca inferior a dois anos e oito meses, devendo a mesma ser efectiva, por falta do pressuposto material para aplicação da suspensão da pena. Em resposta, veio a arguida DD aduzir, em suma, que, do seu relatório social não resulta que a mesma mantinha uma vida destruturada, sendo que vivia com o seu agregado familiar, constituído pelo seu companheiro, filho e filha e ainda o filho do companheiro, fruto de outra relação, onde estava responsável pelas lides domésticas e responsabilidades familiares, tentando sempre arranjar oportunidades de trabalho, demostrando o seu teor trabalhador. À data da prática destes factos não tinha antecedentes criminais. Razão porque entende que a pena aplicada pelo Tribunal a quo se revela proporcional e adequada. Cumpre apreciar.
A arguida DD foi condenada pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.e p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 anos, mediante: a) regime de prova orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); e b) pagamento à demandante da quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros), correspondentes a 1/3 da quantia fixada a título de indemnização, até ao final do período de suspensão, entregando-se, mensalmente 1/24 desse montante (€ 166,66) até ao dia 8 de cada mês subsequente ao trânsito em julgado desta condenação.
O crime de ofensa à integridade física qualificada previsto nos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132, n.º 2, al. h), todos do Código Penal, imputado à arguida DD, é punível com pena de prisão de 1 mês até 4 anos. A actuação ilícita, e em conjugação de esforços com mais duas pessoas (as co-arguidas EE e FF), da arguida DD encontra-se descrita, na sua vertente objectiva, nos pontos 21, 22, 23 e 24, dos factos provados, nos termos seguintes: “ (…) 21- Quando PP agarrou o arguido BB foi de imediato agredido. 22- Apercebendo-se que o PP estava a ser agredido, a NN tentou auxiliá-lo. 23- Enquanto tentava auxiliar PP, NN foi atingida com vários murros, socos e pontapés, assim como puxões de cabelo, que lhe foram desferidos pelas arguidas FF, DD e EE, que seguiam atrás dos demais arguidos e que logo ali gizaram um plano para, agindo de comum acordo e em conjugação de esforços e divisão de tarefas, a agredirem. 24- Além de a agredirem nos termos descritos em 23, as arguidas FF, DD e EE agarraram a cabeça de NN e empurraram-na com força contra a ambulância que lá se encontrava. (…)”
Tendo, daquela actuação concertada da arguida DD (com as arguidas EE e FF), resultado apuradas as seguintes consequências para a vítima (a ofendida e demandante NN): “ (…) 28- Em consequência da conduta das arguidas DD, EE e FF resultaram para NN as seguintes lesões: No crânio: Tumefação de coloração levemente arroxeada na região frontal; Solução de continuidade com 1,5 cm de comprimento na região frontal à direita; Dor à palpação do couro cabeludo na região occipital. Na face: Tumefação e coloração arroxeada da fase, mais marcada à esquerda; Edema e equimose arroxeada palpebral; Escoriação com 1 por 0,5 cm no dorso do nariz; Fratura parcial da coroa do dente 45. No abdómen: Duas corações punctiformes na face lateral do flanco esquerdo; Equimose arroxeada com 4 por 2 cm e com 8 por 3 cm na face posterior do flanco esquerdo. 29- As lesões descritas provocaram de forma direta, adequada e necessária dores. 30- Demandaram 8 dias para consolidação médico-legal, com afetação da capacidade de trabalho geral em 8 dias e com igual período de afetação da capacidade de trabalho profissional. 31- Como consequência permanente adveio fratura parcial da coroa do dente 45, passível de reparação e que não é causa de desfiguração nem de afetação da capacidade de trabalho. (…)”
E mais resultaram provados os seguintes danos não patrimoniais, sofridos pela vítima: “(…) 56- As arguidas arrancaram cabelos a Demandante. 57- A demandante tornou-se uma pessoa mais nervosa. 58- Fruto da atuação bárbara das Arguidas/Demandadas, a demandante passou a dormir com dificuldade. 59- Deixou de andar sozinha na rua com medo, utilizando o UBER para as suas deslocações ou então pedia a amigos que a acompanhassem. 60- A Demandante ficou e está angustiada, psicologicamente abalada, com um enorme sentimento de injustiça e ao mesmo tempo com bastante revolta. 61- A Demandante nunca mais na sua vida se irá esquecer pelo que passou fruto da atuação das arguidas. 62- Ainda hoje se recorda de tudo o que se passou de forma nítida e presente. 63- Inclusive ainda no chão depois das agressões a Demandante lembra se de ouvir de alguém que estava com o pulso fraco. 64- A Demandante, à data dos factos, trabalhava como aprendiz de empregada de balcão no ..., conforme contrato de trabalho por tempo indeterminado. 65- Devido as lesões que as arguidas lhe causaram, a demandante teve de ser colocada noutra função, pela entidade patronal, porquanto o aspeto visual que tinha afastava a clientela. (…)”
Por sua vez, os antecedentes criminais da arguida DD encontram-se descritos no ponto 84 dos factos provados, nos termos seguintes: “(…) 84- A arguida DD sofreu as seguintes condenações: No processo 1391/18.2PAVNG, pela prática em 21/8/2018 de um crime de ameaça agravada e de ofensa à integridade física, por decisão de 31/1/2022, transitada em julgado em 9/5/2022, a condenação na pena única de 160 dias de multa, já extinta. (…)”
Revisitada a decisão recorrida, relembremos o que ali se diz, com relevo para a determinação da medida concreta da pena aplicada à arguida DD: “(…) As exigências de prevenção geral são elevadíssimas em todos os crimes (…) Quanto às exigências de prevenção especial há que considerar os antecedentes criminais dos arguidos (…) não sendo de olvidar que a arguida DD tem uma condenação por ameaça e ofensa à integridade física transitada em julgado um dia após os factos e ainda o que quanto ao mesmo se apurou quanto a condições de vida e que se pode sintetizar nos termos que seguem: (…) DD residia à data dos factos com os filhos e, intermitentemente, com o companheiro, havendo ainda indicadores de presença regular da namorada do filho, respetiva filha e do neto no contexto habitacional. O agregado familiar reside num bairro social conotado com problemáticas sociais e criminais, contando com uma imagem social negativa. Desde a aplicação das medidas de coação de prisão preventiva ao filho e ao companheiro, a arguida reside apenas com a filha. DD inseriu-se no mercado de trabalho durante a adolescência, mantendo inserção laboral ativa durante a maior parte da sua vida adulta, com períodos de desemprego, o último dos quais vigente, desde janeiro de 2023. A situação económica foi autoavaliada como limitada. O seu quotidiano é alegadamente organizado em função das responsabilidades domésticas e familiares, da execução de trabalhos informais e das visitas ao filho e ao companheiro no estabelecimento prisional. (…) Neste contexto, quanto aos crimes de (…) ofensa à integridade física, considerando a elevada ilicitude e culpa dos arguidos, traduzida no modo cruel, insidioso e violento como foi (…) impostas as agressões à ofendida NN, as prementes exigências de prevenção geral, traduzidas na necessidade de proteção dos bens jurídicos violados e, consequentemente, da sociedade, que espera a revalidação contrafáctica da norma violada, e as elevadas exigências de prevenção especial, traduzidas no factos provados quanto ao seu percurso de vida e personalidade, Reputam-se adequadas as seguintes penas: (…) - DD 1 ano e 8 meses de prisão (…)”
E mais se decidiu, nos termos seguintes: “(…) No art. 44, n.º 1, do Código Penal o legislador reage contra as penas curtas de prisão, estabelecendo a sua substituição pela pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, exceto se a execução da prisão for exigível pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. No caso, face à gravidade dos crimes não se ponderará a substituição das penas das arguidas DD, EE e FF por multa ou trabalho a favor da comunidade. Todavia, tendo em consideração a ausência de antecedentes criminais, reputa-se adequado, por ora suspender a execução da pena de prisão pelo período de dois anos quanto a todas as arguidas, nos termos do disposto no art. 50 do Código Penal (“O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”). Acredita-se que por esta forma, com a censura do facto e ameaça de pena de prisão se alcançarão as finalidades da punição. Esta suspensão será sujeita a regime de prova (que para as arguidas EE e FF é legalmente obrigatório nos termos do disposto no art. 53, n.º 3, do Código Penal) orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais). A suspensão será ainda condicionada ao pagamento à demandante NN por cada uma das arguidas de 1/3 da quantia indemnizatória que vier a ser fixada até ao final do período de suspensão, devendo todos os meses ser entregue àquela por cada uma das arguidas e por conta dessa quantia 1/12 do valor total a suportar por cada uma. (…)”
Isto posto. Uma vez mais relembramos e aqui damos por reproduzido o que acima já se expendeu (no âmbito da análise do quantum penal aplicado aos arguidos recorrentes AA, BB e CC e ao arguido recorrente GG e para onde aqui nos permitimos remeter, para evitar repetições), no que respeita à apreciação das penas fixadas pela 1.ª instância, seguindo o paralelismo da jurisprudência quanto à intervenção do Supremo Tribunal de Justiça. Assim e sublinhando, de novo, o Tribunal de 2ª Instância apenas deverá intervir alterando o quantum da pena concreta quanto ocorrer manifesta desproporcionalidade na sua fixação ou os critérios de determinação da pena concreta imponham a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso. Igualmente renovamos aqui, para evitar fastidiosas repetições, o que acima também já se expendeu, no que concerne à dogmática jurídica a considerar, em sede de determinação da medida concreta da pena, maxime quanto às exigências legais decorrentes dos arts. 40º e 71º do CP.
No caso revidendo, e tendo sempre presente que a aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (art. 40º, nº 1, do CP), foram os seguintes os concretos parâmetros atendidos pelo Tribunal a quo, na tarefa de determinação da medida concreta da pena (art. 71º do CP): - a elevada ilicitude e culpa das arguidas, traduzida no modo cruel, insidioso e violento como foram perpetradas as agressões à ofendida NN, o que ainda mais se intensifica, acrescentamos nós, considerando a circunstância de esta última ter sido agredida quando tentava auxiliar uma outra pessoa que estava a ser agredida por tentar agarrar o arguido BB; - o grau muito elevado das exigências de prevenção geral; - o grau elevado das exigências de prevenção especial, sendo que a arguida DD tem uma condenação por crimes de ameaça e ofensa à integridade física, transitada em julgado um dia após os factos – o que, acrescentamos nós, sempre terá, de qualquer forma, de ser atendido, pois denuncia já, ainda que num grau inferior ao que resultaria se se tratasse de uma condenação transitada em julgado em data anterior aos factos, uma personalidade da arguida com alguma propensão para o crime, ainda mais tratando-se, um dos crimes, de idêntica natureza]. Neste parâmetro considera-se, ainda, o que se apurou quanto às condições de vida da arguida, descritas no competente relatório social, que denotam alguma instabilidade pessoal, laboral e familiar – [embora não possamos deixar de consignar que a afirmação do recorrente Ministério Público carece de algum acerto, pois que o que consta do relatório social é que “O agregado familiar mantém uma imagem negativa na vizinhança, embora a arguida seja apontada como a menos difícil no contacto interpessoal”]. Ainda e, por fim, a elevar este parâmetro das exigências de prevenção especial, também acrescentamos nós, considera-se a atitude de desresponsabilização decorrente da postura da arguida em audiência, claramente decorrente das suas declarações, não credíveis, espelhando total ausência de espírito crítico e auto-censura – o que também denuncia os seus traços de personalidade, com propensão para a anormatividade, o que não pode deixar de ser considerado, como já supra exposto neste aresto, ao abrigo do disposto no art. 127º do CPP e sem que, com isso, se belisque o direito dos arguidos à sua liberdade de declarações. E mais acrescenta, este Tribunal de recurso, ao circunstancialismo atendido pelo Tribunal recorrido, na tarefa de determinação da medida concreta da pena a aplicar à arguida DD, o que decorre do factualismo apurado nos autos, descrito nos pontos 6 e 7, ou seja, ter sido esta arguida a alertar o arguido BB (que não estava, então, no Estádio ...), para a presença do falecido OO no local, sabendo de todas as desavenças anteriormente ocorridas, acabando por trazê-lo para a contenda [que veio a culminar na morte do OO], em vez de, e como seria expectável por parte de uma “mãe de família”, ocultar tal situação e tentar “pôr água na fervura”, protegendo o seu agregado, em vez de “pôs achas para a fogueira”.
Ora, todo este circunstancialismo conjugado, não pode deixar de se vislumbrar alguma brandura na dosimetria penal encontrada pelo Tribunal a quo, ao condenar a arguida DD na pena de 1 ano e 8 meses de prisão, numa moldura penal abstracta de 1 mês até 4 anos. Entende este Tribunal ad quem justo, proporcional e adequado condenar a arguida DD na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão. # Entendeu, como vimos, o Tribunal a quo, tendo em consideração a ausência de antecedentes criminais das arguidas, suspender a execução das respectivas penas de prisão pelo período de 2 (dois anos), nos termos do disposto no art. 50º do Código Penal, acreditando que por esta forma, com a censura do facto e ameaça de pena de prisão se alcançarão as finalidades da punição. Ficou tal suspensão sujeita a regime de prova (que para as arguidas EE e FF é legalmente obrigatório nos termos do disposto no art. 53, n.º 3, do Código Penal) orientado para inserção laboral e melhoria das qualificações escolares e/ou profissionais, bem como para a aquisição de competências pessoais e sociais (e.g., autorregulação emocional e comportamental, pensamento consequencial, empatia, resolução de conflitos interpessoais); e, ainda, condicionada ao pagamento à demandante NN por cada uma das arguidas de 1/3 da quantia indemnizatória que vier a ser fixada até ao final do período de suspensão, devendo todos os meses ser entregue àquela por cada uma das arguidas e por conta dessa quantia 1/12 do valor total a suportar por cada uma. O art.º 50º, nº 1, do CP, impõe ao Tribunal a suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. A verificação do pressuposto material de aplicação desta pena, substitutiva da pena de prisão concretamente aplicada, segundo o ensinamento do Prof. Figueiredo Dias, pressupõe desde logo a existência de um juízo de “prognóstico favorável” relativamente ao comportamento do delinquente, no sentido de se poder concluir “que a simples censura do facto e a ameaça da pena – acompanhadas ou não da imposição de deveres e (ou) regras de conduta(…) bastarão para afastar o delinquente da criminalidade”. Sendo que para a realização de um tal juízo “não poderá bastar nunca a consideração ou só da personalidade, ou só das circunstâncias de facto - o tribunal atenderá especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto”.
Ora, no caso revidendo, no que à arguida DD concerne, e não obstante o peso negativo, na sua globalidade, dos parâmetros de avaliação da actuação ilícita da mesma, considerados na tarefa de determinação da medida concreta da pena, nos termos supra expendidos, não podemos deixar de acompanhar o Tribunal recorrido, ao considerar, maxime face à história criminal da arguida, ainda viável a suspensão da respectiva pena de prisão. Apesar do atrás exposto, não se verificam, por ora, indicadores que afastem, de forma incontornável, a possibilidade de ainda se fazer um juízo de prognose favorável, no que respeita à arguida DD, dada a sua história criminal. Assim, acompanha este Tribunal de recurso o entendimento do Tribunal recorrido, de que a suspensão da pena de prisão revela-se, por ora, ainda suficiente para dar satisfação às necessidades de prevenção geral e especial que o caso concretamente reclama, finalidades estas que só se mostrarão alcançadas quando a pena, por referência ao momento da sua aplicação, permite fundamentalmente alcançar a “tutela das expectativas da comunidade na manutenção (ou mesmo no reforço) da validade da norma infringida”, enquanto que na prevenção especial, o seu alcance resultará essencialmente pela sua dimensão positiva, isto é no efeito de socialização que permita produzir no agente. Pelo exposto, mantém este Tribunal ad quem a suspensão declarada pelo Tribunal a quo, da pena de prisão em que foi condenada a arguida DD, ao abrigo do disposto no art. 50º do CP, apenas se alterando o período de suspensão, necessariamente e por força da agravação do quantum penal, nos termos sobreditos, para 4 anos – nº 5, do normativo legal citado. Mantém-se, no mais, a decisão recorrida, quanto ao regime de prova e condição de pagamento à demandante NN, que não foram objecto de recurso. * Veio também o Ministério Público, no seu recurso, manifestar a sua discordância quanto à aplicação que o Tribunal a quo fez do regime de jovens adultos (Decreto-Lei nº401/82, 23/9) às arguidas EE e FF, pugnando pela consequente agravação das penas que lhes foram concretamente aplicadas. Em suma, argumenta o Ministério Público tal discordância face a todo o contexto em que ocorreu e decorreu a agressão sobre a ofendida NN, não só atendendo à gravidade da própria agressão em si, mas também sobre o circunstancialismo de tempo, lugar e modo em que foi perpetrada e invocando também razões de prevenção geral. A este recurso respondeu apenas a arguida EE, limitando-se a afirmar que não assiste razão ao Ministério Público, e que, embora o regime de jovens não seja de aplicação imediata, o acórdão justifica o porquê da sua aplicação. Cumpre apreciar.
Uma vez mais, para evitar repetições que poderiam decorrer da multiplicidade de vezes que algumas questões são colocadas à apreciação deste Tribunal de recurso, remetemo-nos, aqui, para a análise dogmática sobre o Regime penal especial para Jovens, previsto no DL 401/82, de 23/9 de Jovens, já supra expendida aquando da apreciação do recurso do arguido AA. Revisitemos, então, a decisão recorrida, atentando, desta feita, ao que ali se decidiu a propósito da aplicação do regime penal especial para Jovens às arguidas EE e FF: “(…) À data dos factos os arguidos AA, EE e FF não tinham ainda completado 21 anos de idade, pelo que se impõe apreciar a aplicabilidade do mesmo quanto a eles. (…) … quanto às arguidas EE e FF, o crime cometido, apesar da concreta violência, insere-se naquele grupo em que se admite, na ausência de condenações anteriores, seja fruto da imaturidade e do contexto, podendo as arguidas ainda beneficiar da atenuação da pena como fator de ressocialização. As arguidas EE e FF beneficiarão, assim, da atenuação especial da pena prevista no Regime Especial Para Jovens, nos termos dos arts. 72 e 73 do Código Penal: sendo o limite máximo da pena de prisão reduzido de um terço e o limite mínimo da pena de prisão é reduzido a um quinto se for igual ou superior a 3 anos e ao mínimo legal se for inferior. (…)”
Concorda-se com a decisão recorrida. Com efeito, não obstante o que supra se analisou, quanto à actuação grave destas arguidas EE e FF, em co-autoria material com a arguida DD, considera este Tribunal ad quem e ainda que no limite, que tal gravidade do caso, maxime face à natural imaturidade das duas arguidas em causa, com 17 e 18 anos, na altura dos factos, ainda consente a opção por tal regime legal mais benévolo, sendo, in concreto, de considerar que tal medida favorecerá a ressocialização das arguidas. Pelo exposto, considerando este Tribunal de recurso e ainda que no limite, aplicável às arguidas EE e FF o regime penal especial para Jovens, mantém-se a decisão recorrida, nesta parte. Prejudicada fica, pois, a também invocada pelo Ministério Público agravação das respectivas penas, que apenas seria de apreciar caso se decidisse este Tribunal ad quem pela não aplicação do regime em causa. Improcede, pois, neste segmento, o recurso do Ministério Público.
»
Subsidiariamente, alegaram as arguidas recorrentes DD e EE que a indemnização civil fixada em € 12.000,00, face ao diminuto impacto das lesões sofridas pela demandante NN, revela-se manifestamente desproporcional, nunca devendo ser superior a € 3.000,00. Cumpre apreciar.
A demandante NN formulou pedido de indemnização civil nos autos contra as arguidas DD, EE e FF, pedindo a condenação destas no pagamento, na parte que ora releva, de quantia não inferior a € 25.000, para compensação dos danos não patrimoniais sofridas. O Tribunal a quo veio, então, “tendo em consideração os critérios antes referidos, bem como os factos que se consideraram provados, não só relativamente à conduta, sua violência, exposição e dores, mas também às consequências de natureza mais ou menos permanente – dente e cicatrizes –“ a fixar a indemnização pelos danos não patrimoniais na quantia de €12.000,00 (acrescida dos juros peticionados a contar da data da decisão). Antes de se ajuizar da justeza do valor fixado pelo Tribunal recorrido, em matéria de indemnização por danos não patrimoniais, façamos, previamente, uma breve abordagem teórica sobre a questão. Os danos não patrimoniais, por natureza, são insusceptíveis de avaliação ou medição pecuniária, não se ignorando que a indemnização a eles referente não visa a reposição das coisas no “statu quo ante”, mas tão só dar ao lesado uma satisfação ou compensação pelos padecimentos sofridos. Traduzem-se, por isso, na atribuição de uma quantia em dinheiro que permita a aquisição de bens materiais ou a satisfação de necessidades que de algum modo compensem ou neutralizem tais padecimentos – neste conspecto, cfr. Vaz Serra, in Bol. n.º 83, p. 83, Galvão Telles, in Direito das Obrigações, 7ª ed., C. Editora, pp. 378 e ss, e, i. a., Ac. do STJ de 24.02,2015, proferido no Proc. n.º 2147/07 e acessível in Sumários, Fev./2015, p. 48. Sem olvidar que visa ainda tal indemnização reprovar ou castigar no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente – vide, por todos, Manuel Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, I Vol., 9 ª ed., Almedina, p. 630 e, entre outros, Ac. do STJ de 10-2-98, in Col./STJ, Tomo I, p. 67. Segundo o art. 496º, nº 1, do Cód. Civil, apenas são atendíveis, para efeitos de ressarcimento, os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, ou seja –conforme explicita Dario Martins de Almeida [20]- “aqueles que afectem profundamente os valores ou interesses da personalidade moral”, que o mesmo é dizer, evidenciem algum tipo de dor, angústia, desgosto ou sofrimento, inexigíveis em termos de resignação. Conforme desde o paradigmático Ac. do STJ de 6-7-2000[21] se passou a ver insistentemente proclamado, a doutrina e a jurisprudência vêm distinguindo no âmbito do dano em presença várias vertentes, parâmetros ou modos de expressão, entre eles avultando, pelo seu significado ou relevância, o “quantum doloris” – que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária -, o “dano estético” – que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima -, o “prejuízo de afirmação social” – dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado nas suas variadíssimas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica) -, o “prejuízo da saúde geral e da longevidade” – aqui avultando o dano da dor e o défice de bem estar, valorizando-se os danos irreversíveis da saúde e bem estar da vítima e corte na expectativa de vida -, e, por fim, o “pretium juventutis” – que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a primavera da vida. E consoante também se elucida nesse douto aresto, esta actualmente tão detalhada visão do dano não patrimonial “é o resultado dos avanços do conhecimento do ser humano, em matérias como a medicina, a psicologia, a sociologia, a antropologia, contribuindo para uma mais conscienciosa ponderação dos efeitos danosos do acto gerador de responsabilidade.” Ora, como facilmente se alcança, estes danos não patrimoniais são pela sua específica natureza (imaterial) insusceptíveis de medida certa, absoluta, e uma vez que não têm valor venal, o chamado dano de cálculo não funciona em relação a eles. Como judiciosamente se expende no Ac. deste Supremo de 12.03.2015[22], “[o]s interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis - a vida, a integridade física, psíquica, sexual, a saúde, a liberdade, o bem-estar físico e psíquico, a alegria de viver, a beleza – e não podem ser reintegrados por equivalente; não se calcula um “preço da dor” ou um “preço da incapacidade” ou a falta de saúde, mas visa-se proporcionar, à pessoa lesada, uma satisfação que, em certa medida, possa contrabalançar aquele dano.” E por assim ser, o art. 496º, nº 3, do Cód. Civil, manda fixar o quantitativo da indemnização correspondente aos enfocados danos segundo critérios de equidade, devendo atender-se às circunstâncias enunciadas no art.º 494º, nº 3 e, designadamente, a determinados elementos de referência ou índices, entre os quais, os padrões geralmente adoptados na jurisprudência, a flutuação do valor da moeda, etc, tudo como fundamental expressão “das regras de boa prudência, de bom sendo prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida” - A. Varela, in ob. cit., pág. 628. E tudo também, e por fim, nuclearmente endereçado a alcançar a compensação apropriada, a justa indemnização, que, como vem sendo veementemente salientado - por todos, Ac. do S.T.J. de de 27-01-2005[23] -, jamais se poderá inspirar numa óptica miserabilista, conducente a valores puramente simbólicos e, para inaceitável prejuízo dos lesados, totalmente desfasados da realidade. Bem ao invés, e como outrossim vem sendo assinalado pela nossa jurisprudência, e até assumido a nível do Parlamento Europeu, a indemnização pelos prejuízos em foco deve traduzir o prestígio dos valores e direitos fundamentais [dignidade] da pessoa humana.
Traçado, “grosso modo”, este quadro legal e doutrinário relativo à caracterização/valorização dos danos não patrimoniais, e volvendo à situação in casu, constatamos que na decisão recorrida, o Tribunal a quo verteu, ainda que de forma sumária, mas no fundamental, os considerandos necessários, atendendo às circunstâncias concretas do caso versado. Entendeu o Tribunal recorrido, no seguinte sentido, que se passa a transcrever: “(…) Quantos aos danos não patrimoniais, tendo em consideração os critérios antes referidos, bem como os factos que se consideraram provados, não só relativamente à conduta, sua violência, exposição e dores, mas também às consequências de natureza mais ou menos permanente – dente e cicatrizes –, reputa-se adequado fixar a indemnização em 12.000,00, a que acrescerão os juros peticionados a contar da presente data. (…)”
Recordemos a natureza e extensão das lesões sofridas pela demandante NN, descritas nos pontos 28, 29, 30 e 31 da matéria de facto provada, que, de novo, se transcreve: “28- Em consequência da conduta das arguidas DD, EE e FF resultaram para NN as seguintes lesões: No crânio: Tumefação de coloração levemente arroxeada na região frontal; Solução de continuidade com 1,5 cm de comprimento na região frontal à direita; Dor à palpação do couro cabeludo na região occipital. Na face: Tumefação e coloração arroxeada da fase, mais marcada à esquerda; Edema e equimose arroxeada palpebral; Escoriação com 1 por 0,5 cm no dorso do nariz; Fratura parcial da coroa do dente 45. No abdómen: Duas corações punctiformes na face lateral do flanco esquerdo; Equimose arroxeada com 4 por 2 cm e com 8 por 3 cm na face posterior do flanco esquerdo. 29- As lesões descritas provocaram de forma direta, adequada e necessária dores. 30- Demandaram 8 dias para consolidação médico-legal, com afetação da capacidade de trabalho geral em 8 dias e com igual período de afetação da capacidade de trabalho profissional. 31- Como consequência permanente adveio fratura parcial da coroa do dente 45, passível de reparação e que não é causa de desfiguração nem de afetação da capacidade de trabalho. (…)”
E, bem assim, também nos pontos factuais que seguem: “(…) Do pedido de indemnização civil da demandante NN 56- As arguidas arrancaram cabelos a Demandante. 57- A demandante tornou-se uma pessoa mais nervosa. 58- Fruto da atuação bárbara das Arguidas/Demandadas, a demandante passou a dormir com dificuldade. 59- Deixou de andar sozinha na rua com medo, utilizando o UBER para as suas deslocações ou então pedia a amigos que a acompanhassem. 60- A Demandante ficou e está angustiada, psicologicamente abalada, com um enorme sentimento de injustiça e ao mesmo tempo com bastante revolta. 61- A Demandante nunca mais na sua vida se irá esquecer pelo que passou fruto da atuação das arguidas. 62- Ainda hoje se recorda de tudo o que se passou de forma nítida e presente. 63- Inclusive ainda no chão depois das agressões a Demandante lembra se de ouvir de alguém que estava com o pulso fraco. 64- A Demandante, à data dos factos, trabalhava como aprendiz de empregada de balcão no ..., conforme contrato de trabalho por tempo indeterminado. 65- Devido as lesões que as arguidas lhe causaram, a demandante teve de ser colocada noutra função, pela entidade patronal, porquanto o aspeto visual que tinha afastava a clientela. (…)”
Tais lesões decorreram, de acordo com a matéria factual apurada, de um episódio de agressões físicas protagonizado pelas arguidas recorrentes DD, EE e FF, que actuaram conjuntamente e em comunhão de esforços, num cenário de superioridade numérica para melhor assegurarem o êxito das suas intenções, no âmbito do qual desferiram sobre aquela vários murros, socos e pontapés, assim como puxões de cabelo e, ainda, agarraram a cabeça da ofendida e empurraram-na com força contra a ambulância que lá se encontrava, tudo Tais agressões vieram a ser consideradas pelo Tribunal a quo como integrantes de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.e p. pelos arts. 143, n.º 1, 145, n.ºs 1, al. a), e 2, com referência ao art. 132º, n.º 2, al. h), todos do Código Penal [não estando tal qualificação posta em crise pela argumentação recursiva de nenhuma das recorrentes]. Por tudo quanto foi dito, conjugando todo o circunstancialismo que vem de se expor e analisadas as circunstâncias concretas do caso, conclui este Tribunal ad quem no sentido de se afigurar adequado e equilibrado manter, como quantitativo indemnizatório dos danos em apreço, o valor fixado pelo Tribunal da 1ª instância, ou seja, de € 12.000,00. » Uma vez que os arguidos AA, BB, CC, DD, EE e FF decaíram totalmente nos recursos por si interpostos, são os mesmos responsáveis pelo pagamento da taxa de justiça e dos encargos a que a sua actividade deu lugar, destacando-se, in concreto, a especial complexidade dos autos (artigos 513.º e 514.º do Código de Processo Penal. Assim, nos termos do disposto no art.º 8º, nº 9, Regulamento das Custas Processuais e da Tabela III a ele anexa, a taxa de justiça varia entre 3 a 6 UC, devendo ser fixada pelo juiz tendo em vista a complexidade da causa, dentro dos limites fixados pela tabela III. Tendo em conta a complexidade do processo, julga-se adequado fixar essa taxa, no que aos atrás referidos arguidos recorrentes, em 4 UC. » Pelo exposto, acordam os Juízes da 2.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto, no seguinte:
Rejeitar o recurso interposto pela assistente MM. Custas pela assistente (artigo 515.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal). * Corrigir o ponto nº 1 dos factos provados, ao abrigo do disposto no art. 380º, nº 2, do CPP, que passará o mesmo a ter a seguinte redacção: “Desde o início do ano de 2022 que o arguido AA e o seu agregado familiar, constituído pelos arguidos BB, seu progenitor, DD, sua progenitora, e EE, sua irmã, e CC, companheiro da sua tia paterna (QQ), mantinham um clima de conflito com OO, o qual se iniciou entre o AA e a EE e posteriormente, se estendeu aos restantes familiares.” * Negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos AA, BB, CC, DD, EE e FF, mantendo-se, quanto a eles, o acórdão proferido pelo Tribunal a quo nos seus precisos termos. Custas pelos recorrentes, fixando a taxa de justiça em 4 UCS [artigos 513º, n.ºs 1 e 3 e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e artigo 8º, nº 9, do RCP, com referência à Tabela III]. * Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido GG, reduzindo-se a taxa diária da pena de multa em que foi condenado para € 6,00 (seis euros), mantendo-se, no mais, quanto a ele, o acórdão proferido pelo Tribunal a quo nos seus precisos termos. Sem custas. * Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, revogando-se a pena de 1 ano e 8 meses de prisão em que foi condenada a arguida DD e substituindo-se a mesma pela pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 (quatro) anos, mantendo-se, no mais, a decisão recorrida. Sem custas. * Notifique nos termos legais. * (O presente acórdão foi processado em computador pela relatora, sua primeira signatária, e integralmente revisto por si e pelos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos – art. 94.º, n.º 2 do Código de Processo Penal - encontrando-se escrito de acordo com a antiga ortografia) Os Juízes Desembargadores, Fernanda Sintra AmaralJorge Langweg Cláudia Rodrigues ________________ [1] Indicam-se, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ, de 15/04/2010 e 19/05/2010, in http://www.dgsi.pt. [2] Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág.335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos Penais, 8.ª ed., Rei dos Livros, 2011, pág.113. [3] Conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada pelo Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95 de 19/10/1995, publicado no DR/I 28/12/1995. [4] Acórdão do STJ de 18.01.2012, Proc. 1740/10.1JAPRT.P1.S1, em www.dgsi.pt. [5] Cfr. Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado, 10ª ed., pág. 279; Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed. Pág. 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª ed., págs. 77 e ss.. [6] Proc. nº 07P4375, acessível in www.dgsi.pt [7] In Forum Iustitiae, Ano I, Maio de 1999. [8] In «O caso Julgado Parcial», 2002, pág. 37. [9] Cfr, neste sentido, Acórdão do STJ de 15-12-2005, Proc. nº 05P2951 e Ac. do STJ de 9-03-2006, Proc. nº 06P461, acessíveis em www.dgsi.pt [10] Prof. Figueiredo Dias, in “Direito Processual Penal”, 1º volume, Coimbra, ed. 1974, pág. 203 a 205. [11] Cfr. Acórdão do TRC, de 16-09.2015, in www.dgsi.pt. [12] Cfr. Acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa, de 02.11.2021, Processo nº 477/20.8PDAMD.L1-5, disponível em www.dgsi.pt. [13] Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13-02-2008, Processo nº 07P4729, acessível em www.dgsi.pt. [14] Datado de 10-01-2008, Proc. n.º 07P4198, in www.dgsi.pt [15] Cfr. Acórdãos do STJ de 09-05-2002, in CJ do STJ, 2002, Tomo 2, pág. 193 e de 27-05-2009, Processo n.º 09P0484, acessível em www.dgsi.pt [16] Cfr. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime”, pág. 197 [17] In CJ do STJ, ano 2005, tomo 3, pág. 173. [18] De acordo com os ensinamentos de Anabela Miranda Rodrigues, In “O Modelo de Prevenção na Determinação da Medida Concreta da Pena”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, n.º 2, Abril/Junho de 2002, págs. 147 e ss. [19] Cfr. Figueiredo Dias, ob. cit., págs. 227 e ss. [20] Cfr. Manual de Acidentes de Viação, 3.ª ed., Almedina, p. 272. [21] Cfr. Col./STJ, Tomo II, p.145. [22] Proferido no Proc. n.º 1988/05, e acessível in Sumários, Mar./2015, p. 23. [23] Proferido no Proc. nº 04B4135, e acessível in dgsi.pt. |