Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2258/24.0T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ISABEL SILVA
Descritores: NULIDADES PROCESSUAIS
NULIDADES DA SENTENÇA
ARGUIÇÃO
Nº do Documento: RP202507102258/24.0T8VNG.P1
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 3. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Há que distinguir entre nulidades processuais (que podem ser principais ou secundárias, e sujeitas ao regime dos artigos 186º a 202º do CPC) das nulidades da decisão (elencadas no art.º 615º do CPC), pois são diversos os regimes de arguição e os respetivos efeitos ou consequências.
II - A preterição de uma qualquer formalidade legal no iter processual já não tem a ver com a sentença, exatamente por lhe ser prévia ou por se tratar de um vício a montante, que não a jusante.
III - As nulidades da sentença respeitam ao conteúdo que a lei prescreve para essa peça processual, em íntima conexão com o art.º 607º e 608º do CPC, e não podem confundir-se com as nulidades decorrentes da prática de um ato indevido ou omissão de um ato processualmente relevante, estas subsumíveis ao regime do art.º 195º do CPC.
IV - Tratando-se duma nulidade secundária, e em consonância com a máxima tradicional “dos despachos recorre-se, das nulidades reclama-se”, as nulidades decorrentes da preterição de uma formalidade legal terão de ser sempre suscitadas perante o Tribunal de 1ª instância, competindo a este decidir se a nulidade se verifica (art.º 199º nº 2 e 200º nº 3 do CPC).
V - Em sede de recurso, o Tribunal da Relação só pode pronunciar-se sobre a decisão que recaiu sobre a nulidade reclamada e nunca sobre a arguição da nulidade “em si mesma” pois tal integraria uma decisão em 1ª instância.
VI - Só assim não será se a nulidade estiver a coberto duma decisão judicial que ordene, autorize ou sancione o ato ou omissão contra o qual se reage.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 2258/24.0T8VNG.P1

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I – Resenha do processado

1. AA instaurou ação contra A..., Lda, pedindo:

i. Condenar a RÉ a pagar ao AUTOR, a título de honorários pelos serviços prestados, a quantia € 10.275,73 (dez mil, duzentos e setenta e cinco euros e setenta e três cêntimos);

ii. Condenar a RÉ a pagar ao AUTOR, a título de despesas por conta de cliente, a quantia € 1.250,33 (mil, duzentos e cinquenta euros e trinta e três cêntimos);

iii. Condenar a RÉ no pagamento de juros de mora já vencidos, no montante de € 646,72 (seiscentos e quarenta e seis euros e setenta e dois cêntimos), e os que se vierem a vencer, até ao efetivo e integral pagamento.

Alicerçou tais pedidos alegando que na qualidade de advogado prestou serviços forenses à Ré, em regime de avença, que ela não pagou.

Em contestação, a Ré invocou o pagamento e a prescrição, impugnando ainda parcialmente a factualidade alegada.

O Autor respondeu às exceções, pugnando pela sua improcedência.

Em despacho saneador julgou-se a prescrição improcedente, por decisão transitada em julgado.

No decurso da audiência de julgamento,

«foi pelo ilustre mandatário do autor pedida a palavra, que no seu uso disse requerer, em síntese, a junção aos autos de documentos.

Foi dada a palavra ao ilustre mandatário da ré que no seu uso disse não prescindir do prazo de vista dos documentos.

Foi então proferido o seguinte: DESPACHO

Indefere-se ao requerido, considerando que os documentos devem ser juntos com os articulados, sendo que aqueles que foram exibidos datam de 2021, três anos antes da entrada em juízo da petição inicial.

Acresce que o Tribunal não consegue afirmar se a ré não respondeu aos emails que foram agora exibidos, porquanto basta o autor não juntar essas possíveis respostas para poder dizer que não foram respondidos. Por tudo, indefere-se.»

Foi então proferida sentença com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, por provada, condenando a ré A..., Lda., a pagar ao autor a quantia de AA a quantia de 11.526,06€, acrescido de juros de mora, à taxa de juros civis, desde a data da presente decisão até integral pagamento, absolvendo do demais peticionado.

2. Para assim decidir, foi considerada a seguinte factualidade:

Factos provados

1) O autor é um profissional liberal, que se dedica ao exercício da advocacia em prática individual, com cédula profissional n.º 49605p, emitida pela Ordem dos Advogados.

2) Em agosto de 2016, autor e ré celebraram um contrato de prestação de serviços por tempo indeterminado, mediante o qual o autor obrigou-se perante a ré a prestar vários serviços jurídicos e a exercer o mandato forense.

3) Como contrapartida, a ré obrigou-se a pagar mensalmente ao autor a quantia de 300€.

4) E sempre que estivesse em causa contencioso relativo a obrigações pecuniárias, a ré obrigou-se a pagar ao autor, a título de honorários, uma percentagem em função do resultado obtido, que fixaram em 20% do capital, os juros de mora vencidos e a quantia que a viesse a ser recuperar a título de despesas de contencioso.

5) Por conta da remuneração variável acorada, o autor tem direito a receber da ré as seguintes quantias:

a) 203,84€, por referência à ação judicial que correu termos sob o n.º

b) 481,18€, por referência ao processo n.º 5155/14.4TBVNG, que correu termos no Juízo de Execução do Porto – J3;

c) 327,92€, atinente à ação n.º 15307/16.7YIPRT;

d) 197,79€, por referência ao montante recuperado na ação n.º 527/2019-JP, que correu termos no Julgado de Paz de Vila Nova de Gaia.

6) Entretanto, em fevereiro de 2018, as partes fixaram o valor da avença mensal no montante de 250€.

7) Valor esse em vigor à data da cessação do contrato de avença, em janeiro de 2022.

8) No processo que correu termos sob o n.º 7101/07.2TBMTS, no Juízo de Execução do Porto – J5, o autor procedeu, a título de despesa por conta da ré, ao pagamento do montante de 321,16€, relativo aos honorários do Sr. Agente de Execução.

9) Correu no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Local Cível de Lisboa – J5, sob o n.º 75192/17.9YIPRT, uma ação judicial contra a ré, tendo o autor liquidado, a título de despesa por conta de cliente, o valor de 10,20€, atinente a uma certidão de sentença.

10) Na execução para pagamento de quantia certa que correu termos no Juízo de Execução do Porto – J3, sob o n.º 8577/16.2T8PRT, o autor pagou, por conta da ré, a fase III, no montante de 49,98€.

11) Na ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias com n.º 202142/14.3YIPRT, o autor liquidou, a título de despesa por conta de cliente, o valor de 51€ a título de taxa de justiça.

12) No processo n.º 8684/16.1T8PRT, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução do Porto – J7, o autor liquidou, por conta da ré, 99,96€, inerentes à fase III da execução.

13) Na ação com n.º 102554/13.6YIPRT – Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia, o autor pagou, por conta da ré, o montante de 102€ de taxa de justiça.

14) Na execução n.º 5154/14.6TBVNG – juízo de execução do Porto – J6 -, o autor liquidou, a título de despesa por conta de cliente, o valor de 83,59€, atinente a honorários do Sr. Agente de Execução.

15) Na injunção n.º 15307/16.7YIPRT, que correu termos no juízo local cível de Gaia – J2, o autor liquidou, por conta da ré, 51€ de taxa de justiça.

16) E pagou, por conta da ré, uma outra taxa de justiça, por conta da ré, no valor de 204€, no processo n.º 184/20.1GFVNG (Juízo Local Criminal de V. N. de Gaia – J2).

17) Na execução sumária n.º 8684/16.1T8PRT, que correu termos no Juízo de Execução do Porto – J7, o autor liquidou, a título de despesa por conta de cliente, a taxa de justiça inicial de execução e a fase I dessa mesma execução, no montante global de 100,47€.

18) Na injunção com n.º 102256/13.3YIPRT, o autor pagou, por conta da ré, o valor global de 102€ em taxas de justiça.

19) Na ação executiva que correu termos sob o n.º 9342/14.7T8PRT, no Juízo de Execução do Porto – J7, o autor liquidou a fase I do Sr. Agente de Execução, na quantia de 74,97€.

Matéria de facto não provada

20) a ré pagou ao autor as avenças mensais entre janeiro de 2019 e janeiro de 2022, inclusive.

21) A ré pagou ao autor os montantes referidos em 5) e 8) a 19).

3. Inconformada com a sentença, dela apelou a Autora, formulando as seguintes conclusões:

1ª - Em Audiência de Julgamento e durante a prestação de declarações por banda do legal representante da Ré, foi requerida a junção de documentos por parte do A.

2ª – Da Ata consta que o mandatário da Ré, aqui subscritor, o mesmo “no seu uso disse não prescindir do prazo de vista dos documentos”, relegando para se pronunciar no prazo geral legal;

3ª – Foi indeferida por Douto Despacho a junção requerida, considerando que os documentos devem ser juntos com os articulados, sem respeitar o direito ao contraditório;

4ª - A imposição de audição das partes em momento anterior à decisão é determinada por um objetivo concreto – o de permitir às partes intervirem ativamente na construção da decisão, chamando-as a trazerem aos autos a solução para que apontam;

5ª – Na obediência ao princípio do contraditório, e salvo casos de manifesta desnecessidade, devidamente justificada, o juiz não deve proferir nenhuma decisão, ainda que interlocutória, sobre qualquer questão, processual ou substantiva;

6ª - Na pronúncia sobre documentos, mesmo cabendo ao Tribunal, no momento de apreciar da sua “relevância probatória”, nunca pode ser negado o direito de pronúncia quanto aos mesmos;

7ª - Sempre se impõe a observância de tal princípio, até elevado à categoria de princípio constitucional, nunca podendo ser preterido;

8ª – E para que seja respeitado o princípio do contraditório não é necessário que a parte tome posição, mas essencial é que à parte seja dada possibilidade de se pronunciar;

9ª - Constituindo uma omissão grave, representando uma nulidade processual tudo nos termos do art. 195º, do CPC.

Nestes termos e assim decidindo revogarão V.Exas. a Douta Decisão proferida e farão sã Justiça como é timbre deste Venerando Tribunal!

4. O Autor contra-alegou, sustentando a improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

5. Apreciando o mérito do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas questões suscitadas nas conclusões dos recorrentes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: art.º 615º nº 1 al. d) e e), ex vi do art.º 666º, 635º nº 4 e 639º nº 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC).

No caso, invoca-se uma nulidade processual, decorrente da violação do contraditório.

Decidindo:

§ 1º - Antes de prosseguir, não pode deixar de assinalar-se o inusitado do presente recurso.

Na verdade, invocando uma nulidade processual, a Recorrente termina pedindo a revogação da sentença.

Em 1ª instância, também o Mmº Juiz estranhou, tendo convidado a Recorrente a esclarecer se o recurso visava o indeferimento da junção dos documentos — o que levaria à rejeição do recurso por manifesta ilegitimidade, pois que foi o Autor quem requereu essa junção — ou a sentença.

E dúvidas não há que se recorre da sentença, pois que assim esclareceu a Recorrente.

Porém, como resulta da leitura das conclusões, em ponto algum se ataca a sentença, seja no tocante à matéria de facto, seja quanto à matéria de direito…

§ 2º - O que resulta claro das conclusões, é que a Recorrente considera que foi preterida no exercício do contraditório quanto à junção dos documentos suscitada pelo Autor no decurso da audiência de julgamento.

A Recorrente invoca expressamente o art.º 195º do CPC, que prescreve:

1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.

2 - Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.

3 - Se o vício de que o ato sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o ato se mostre idóneo.

Como se sabe, há que distinguir entre nulidades processuais (que podem ser principais ou secundárias, e sujeitas ao regime dos artigos 186º a 202º do CPC) e nulidades da decisão (elencadas no art.º 615º do CPC).

São diversos os regimes de arguição e os respetivos efeitos ou consequências.

A preterição de uma qualquer formalidade legal no iter processual já não tem a ver com a sentença, exatamente por lhe ser prévia ou por se tratar de um vício a montante, que não a jusante.

As nulidades da sentença respeitam ao conteúdo que a lei prescreve para essa peça processual, em íntima conexão com o art.º 607º e 608º do CPC, e não podem confundir-se com as nulidades decorrentes da prática de um ato indevido ou omissão de um ato processualmente relevante, estas subsumíveis ao regime do art.º 195º do CPC.

«A nulidade do ato processual, (…), distingue-se das nulidades específicas das sentenças e dos despachos (…), bem como do erro material (…) e do erro de julgamento (de facto e de direito). Enquanto estes casos respeitam a vícios de conteúdo, o vício gerador da nulidade do art.º 195º, (…), respeitam à própria existência do ato ou às suas formalidades.» [[1]]

§ 3º - No que toca à nulidade invocada, decorrente da violação do direito ao contraditório.

Se existisse, integraria a omissão duma formalidade prescrita por lei, portanto sujeita ao regime do art.º 195º CPC.

Significando que, nos termos do art.º 199º nº 1 do CPC, a nulidade teria de ter sido arguida na própria audiência de julgamento (pois foi esse o momento da ocorrência e a Recorrente estava presente através do seu mandatário) ou nos 10 dias posteriores (art.º 149º nº 1 CPC).

Mesmo que se ponderassem os 10 dias, há muito que foram ultrapassados, pois que a audiência de julgamento teve lugar em 17/12/2024 e o recurso foi interposto em 24/01/2025.

§ 4º - A Recorrente suscitou a questão da nulidade pela 1ª vez em sede de recurso e diretamente perante este Tribunal da Relação.

Tratando-se duma nulidade secundária, e em consonância com a máxima tradicional “dos despachos recorre-se, das nulidades reclama-se”, as nulidades decorrentes da preterição de uma formalidade legal terão de ser sempre suscitadas perante o Tribunal de 1ª instância, competindo a este decidir se a nulidade se verifica (art.º 199º nº 2 e 200º nº 3 do CPC).

A não ser assim, o Tribunal de recurso ver-se-ia na contingência de decidir a questão pela primeira vez, ao arrepio do nosso sistema de recursos. [[2]]

Em sede de recurso, o Tribunal da Relação só pode pronunciar-se sobre a decisão que recaiu sobre a nulidade reclamada e nunca sobre a arguição da nulidade “em si mesma” pois tal integraria uma decisão em 1ª instância.

E os 10 dias também já se mostravam ultrapassados para efeitos do nº 3 do art.º 199º do CPC.

Portanto, é de questionar se é este o meio e o momento próprios para reagir contra a nulidade.

Na verdade, como refere Anselmo de Castro, «Tradicionalmente, entende-se que a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está, ainda que indirecta ou implicitamente, coberta por qualquer despacho judicial; se há um despacho que pressuponha o acto viciado, diz-se, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respectivo despacho pela interposição do competente recurso, conforme a máxima tradicional – das nulidades reclama-se, dos despachos recorre-se. A reacção contra a ilegalidade volver-se-á então contra o próprio despacho do juiz; ora o meio idóneo para atacar ou impugnar despachos ilegais é a interposição do respectivo recurso (…), por força do princípio legal de que, proferida a decisão, fica esgotado o poder jurisdicional.» [[3]]

E, se bem o interpretamos, quando Alberto dos Reis aborda a hipótese de a nulidade não ter ocorrido “ao abrigo de qualquer despacho judicial”, está a ponderar situações em que o juiz, apesar de não ter conhecido expressamente da questão que provoca a nulidade, emite despacho a ordenar a prática do ato nulo. [[4]]

Terá sido também essa a interpretação efetuada por Manuel de Andrade [[5]] quando, referindo o entendimento de Alberto dos Reis escreve: «Mas se a nulidade está coberta por uma decisão judicial (despacho), que ordenou, autorizou ou sancionou o respectivo acto ou omissão em tal caso o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente, a deduzir (interpor) e tramitar como qualquer outro do mesmo tipo.»

Em sede de recurso, o Tribunal da Relação só pode pronunciar-se sobre a decisão “em si mesma” e, como refere Miguel Teixeira de Sousa [[6]] «[n]os vícios da decisão incluem-se apenas aqueles que a ela respeitam directamente. Quer isto dizer que não é considerado um vício da decisão a realização de um acto não permitido ou a omissão de um acto obrigatório antes do seu proferimento: tais situações são nulidades processuais, submetidas, na falta de qualquer regulamentação específica, ao respectivo regime geral (art. 201º, nº 1; cfr. STJ – 14/1/1993, BMJ 423,406).»

No caso, impunha-se que o exercício do contraditório fosse efetuado antes da prolação da sentença, pelo que o vício é extrínseco à decisão.

Portanto, não é este recurso o meio próprio, nem o momento, para reagir contra a eventual nulidade.

§ 5º - Acresce que a nulidade não se verifica.

O princípio do contraditório (art.º 3º nº 3 do CPC), traduz-se em (i) facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre todas as questões, de direito ou de facto, que em cada momento se mostram em discussão nos autos, de forma que cada uma possa contra-argumentar aos fundamentos invocados pela contraparte e, bem assim, (ii) quando o juiz, de sua iniciativa, pondere decidir com base “em fundamento que não tenha sido previamente considerado pelas partes”, a dita decisão-surpresa. [[7]]

Na verdade, o contraditório foi conferido pelo Sr. Juiz, e foi expressamente exercido pela Recorrente.

Como se viu do relatório acima, o Autor pretendeu juntar documentos em sede de audiência de julgamento. E logo de seguida deu-se a palavra à Recorrente para se pronunciar sobre esse requerimento/pretensão. Do que se depreende, a posição da Recorrente foi de não se opor à junção, mas não prescindir do prazo de vista dos documentos.

Portanto, quanto ao requerimento, o contraditório foi cumprido.

Sucede que o Mmº Juiz indeferiu a junção dos documentos.

Assim, a Recorrente nada tinha que se pronunciar sobre o teor dos documentos, posto que nenhuns foram juntos.

Concluindo, não se imputando qualquer outro vício à sentença, seja quanto à matéria de facto, seja na subsunção dos factos ao direito, resulta a improcedência do recurso.

6. Sumariando (art.º 663º nº 7 do CPC)

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III. DECISÃO

7. Pelo que fica exposto, acorda-se nesta secção cível da Relação do Porto em julgar improcedente a apelação, mantendo-se integralmente a sentença.

Tendo sucumbido no recurso, ficam a cargo da Recorrente as respetivas custas: art.º 527º nº 1 e 2 do CPC.

Porto, 10 de julho de 2025

Relatora: Isabel Silva

1º Adjunto: Álvaro Monteiro

2º Adjunto: Paulo Dias da Silva

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[[1]] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 3ª edição, 2014, Coimbra Editora, pág. 384 (anotação 7 ao art.º 195º).

[[2]] O regime consagrado entre nós para os recursos ordinários é de «(…) reponderação e não de reexame, visto que o tribunal superior não é chamado a apreciar de novo a acção e a julga-la, como se fosse pela primeira vez, indo antes controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido, face aos elementos averiguados por este último.» - José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 3º, Tomo I, 2ª edição, 2008, Coimbra Editora, pág. 7/8.

No mesmo sentido, António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2ª edição, 2014, Almedina, pág. 27.

[[3]] In “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, 1982, Almedina, pág. 134.

[[4]] Cf. José Alberto dos Reis, “Comentário ao Código de Processo Civil”, vol. 2º, 1945, Coimbra Editora, pág. 507 a 513.

[[5]] Manuel A. Domingues de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, 1979, Coimbra Editora, pág. 183.

[[6]] In “Estudos sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 2ª edição, 1997, pág. 216.

[[7]] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 3ª edição, 2014, Coimbra Editora, pág. 9.