Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5255/21.4T8MTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MIGUEL BALDAIA DE MORAIS
Descritores: PROCESSO DE INVENTÁRIO
SONEGAÇÃO DE BENS
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP202210245255/21.4T8MTS.P1
Data do Acordão: 10/24/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; DECISÃO CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A sonegação de bens prevista no artigo 2096º, nº 1, do Código Civil, exige a verificação cumulativa de dois requisitos: (i) um de natureza objetiva, consistente na ocultação da existência de bens da herança, que pressupõe que o herdeiro (cabeça de casal, ou não) atuou, por ação ou omissão, de modo a ocultar a existência de determinados bens da herança, o dever de os declarar por parte do omitente e que essa atuação tenha por resultado a sua ocultação; (ii) e outro, de natureza subjetiva, correspondente ao dolo na ocultação, traduzido no conhecimento do herdeiro (cabeça de casal, ou não) de que os bens que devia relacionar/indicar pertencem à herança e na vontade de não declarar esses bens e de os subtrair à partilha.
II - O ónus da prova dos factos constitutivos da sonegação de bens recai, nos termos do artigo 342º, nº 1, do Código Civil, sobre a parte que a invoca.
III - Ocorre sonegação de bens quando o cabeça de casal, apesar de saber que determinados certificados de aforro integram o acervo hereditário a partilhar, intencionalmente não os relaciona, procedendo ao resgate dos mesmos e integrando o respetivo capital no seu património para, assim, os subtrair à sua partilha com os demais interessados.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 5255/21.4T8MTS.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Matosinhos – Juízo Local Cível, Juiz 4
Relator: Miguel Baldaia Morais
1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra
2ª Adjunta Desª. Maria de Fátima Andrade
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SUMÁRIO
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I- RELATÓRIO

Nos presentes autos de inventário para partilha da herança aberta por óbito de AA, veio a interessada BB reclamar da relação de bens apresentada pela cabeça de casal CC, invocando a omissão deliberada de relacionação de parte dos bens que compõem esse acervo hereditário, requerendo outrossim a condenação desta ao abrigo do instituto da sonegação de bens.
Concedido o contraditório, a cabeça-de-casal nada disse no prazo concedido, nem arrolou qualquer prova.
Foi ouvida a testemunha indicada pela reclamante, tendo a diligência decorrido sem a presença da cabeça-de-casal ou do seu mandatário.
Seguidamente foi proferida decisão, que julgou parcialmente procedente a reclamação contra a relação de bens apresentada pela interessada BB, nos seguintes termos:
«a) considerar, como integrantes da relação de bens, os bens vertidos no facto provado n.º 1;
b) decretar a sonegação, pela cabeça-de-casal, dos certificados de aforro na quantia global de € 17.837,24 (dezassete mil oitocentos e trinta e sete euros e vinte e quatro cêntimos) e, consequentemente, determinar a perda, em benefício de todos os co-herdeiros, do direito desta àqueles bens, que deverá restituir de imediato à herança;
c) reconhecer a dívida da herança perante a interessada BB, na quantia de € 322,05 (trezentos e vinte e dois euros e cinco cêntimos).»
Não se conformando com o assim decidido, veio a cabeça de casal interpor o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito suspensivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES:
26.º
A condenação ao abrigo da sonegação de bens implica, no plano subjetivo, uma atuação ao nível do dolo, segundo o art. 2096.º, n. 1 do CC.
27.º
Nunca a cabeça-de-casal, a aqui recorrente, deixou de fora da relação de bens os certificados de aforro em causa com o fim de deles se apoderar ou gozar, porquanto o contrato-promessa não deixa clareza nesse ponto.
28.º
O tribunal ad quo dá como provado que a omissão dos certificados de aforro foi propositada, tendo atuado a cabeça-de-casal com a intenção de ocultar a sua existência no sentido de usufruir exclusivamente dos mesmos (cf. facto dado como provado 4.).
29.º
No mesmo sentido, o tribunal ad quo reforçou esta postura ao nível do plano subjetivo quando expõe a formação da sua motivação (cf. III, 3.º hífen), assim como na sua alínea b) da fundamentação de direito.
30.º
Para a sustentação da sua consideração o tribunal ad quo teve em especial consideração, como refere, a prova testemunhal, contudo nunca a testemunha que não tinha qualquer proximidade com a aqui recorrente pode sustentar o seu dolo, não tendo sequer hipótese de conhecer do ponto de vista subjetivo a atuação da cabeça-de-casal.
31.º
E a prova documental em si, em que teve papel ativo a cabeça-de-casal, demonstra que nunca esta teve a intenção de ocultar os bens (tal como resulta da declaração de imposto de selo), porquanto sempre os declarou.
32.º
Um lapso pelos outorgantes do contrato-promessa de partilha na redação da cláusula terceira conduziu a que se considerasse não serem de relacionar os certificados de aforro, pois, como dali resulta, nada mais havia a reclamar quanto a isso.
33.º
A cabeça-de-casal conhecia dos certificados de aforro, não estando isso em causa, considerando, por não corresponder à verdade, que a sua não relação deveu-se a uma atuação dolosa da sua parte.
34.º
No máximo, o comportamento da cabeça-de-casal foi negligente, produto de uma possível errónea interpretação do contrato-promessa de partilha.
35.º
Dada a atuação da cabeça-de-casal se dever a uma negligência esta não deve ser condenada ao abrigo do regime da sonegação de bens.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil.
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, a questão a decidir consiste em saber se, in casu, se verificam, ou não, os pressupostos da sonegação de bens da herança.
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III- FUNDAMENTOS DE FACTO

O tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1. À data da sua morte, AA tinha:
a. no seu quarto principal:
i. 1 (um) leitor de DVD
ii. 1 cama de casal com luz de leitura na cabeceira
iii. 1 colchão de cama de casal
iv. 2 mesas de cabeceira
v. 2 candeeiros
vi. 1 TV – LCD
vii. vários jogos de lençóis + edredões
viii. 2 tapetes de quarto
ix. 1 termo ventilador
x. 1 camiseiro
xi. 1 relógio
b. na sala de estar
i. 1 (um) móvel de TV
ii. 1 (uma) mesa de apoio
iii. 1 (uma) mesa jogo + 4 (quatro) cadeiras
iv. 2 (dois) sofás
v. 1 TV plasma
vi. 1 candeeiro de pé alto
vii. 2 candeeiros de teto
viii. 1 aparelho sintonizador de música com colunas
ix. 1 ar condicionado
x. 1 tabuleiro de xadrez em vidro
xi. várias garrafas de bebida
xii. 2 carpetes na sala
xiii. 1 carpete do hall de entrada
c. na cozinha:
i. 1 (um) frigorífico
ii. 1 (uma) mesa, com 2 (duas) cadeiras e 1 (um) banco
iii. 1 máquina de lavar roupa
iv. 1 microondas
v. 1 doseador com filtro de água
vi. 1 TV
vii. copos
viii. talheres
ix. 1 máquina de café
d. no hall de entrada
i. 1 (uma) Sapateira
e. no quarto
i. 1 cama de solteiro
ii. 1 mesa de cabeceira
f. no anexo
i. 1 (um) armário
ii. 1 (um) móvel
iii. 1 TV
g. 1 (um) automóvel de marca Volkswagen, modelo ..., com matrícula ..-..-SM
h. dois certificados de aforro, com os nºs ... e ..., numa conta aforro com o n.º ..., junto da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP), no valor global, à data da morte de AA, de € 17.837,24.
2. Os certificados de aforro identificados no facto 1 h. foram resgatados por DD, filho da cabeça-de-casal, após a morte de AA.
3. A cabeça-de-casal não relacionou nos presentes autos os bens identificados nos factos 1, a ii. a x., b v. a xiii., c iii. a ix., e. i. e ii., f. iii., e h.
4. A omissão dos certificados de aforro identificados no facto 1.h). foi propositada, tendo a cabeça-de-casal a intenção de ocultar a sua existência, por forma a poder, bem assim como o seu filho DD, deles usufruir em exclusivo, o que têm feito desde o levantamento dos certificados de aforro por este último, em conluio com aquela.
5. A interessada BB pagou o imposto no valor de € 322,05, que cabia à herança por óbito de AA.
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IV. FUNDAMENTOS DE DIREITO

Como se notou, na decisão recorrida considerou-se, para além do mais, ter ocorrido sonegação por parte da cabeça de casal relativamente aos certificados de aforro de que o inventariado AA era titular.
A apelante rebela-se contra esse segmento decisório, argumentando, fundamentalmente, que a omissão de relacionação desse ativo da herança não se ficou a dever a qualquer atuação dolosa da sua parte, como é suposto para que possa ser aplicada a sanção civil que a lei comina para a sonegação de bens.
Que dizer?
A propósito desta matéria rege o art. 2096º do Cód. Civil, que no seu nº 1 dispõe que “[O] herdeiro que sonegar bens da herança, ocultando dolosamente a sua existência, seja ou não cabeça-de-casal, perde em benefício dos co-herdeiros o direito que possa ter a qualquer parte dos bens sonegados, além de incorrer nas mais sanções que forem aplicáveis”.
Malgrado o transcrito inciso normativo esteja integrado no capítulo que trata da administração da herança e esta se encontrar normalmente a cargo do cabeça de casal, certo é que, como emerge do seu enunciado linguístico, o facto ilícito nele previsto tanto pode provir do cabeça de casal, como de qualquer herdeiro que não exerça semelhante função. O que se pretende punir é a ocultação pelo herdeiro (exerça ou não o cabeçalato) da existência de bens com o específico desígnio de os subtrair à sua partilha com os demais interessados.
Ora, dada a gravidade da sanção civil[1] aí contemplada (perda a favor dos demais co-herdeiros do direito que “possa ter a qualquer parte dos bens sonegados”), exige-se um particular rigor na identificação e preenchimento dos pressupostos normativos necessários para que a mesma possa operar, sendo que o respetivo ónus de prova, por mor do critério estabelecido no art. 342º do Cód. Civil (que, segundo entendimento dominante, enuncia o pensamento fundamental da teoria das normas), impenderá sobre o interessado que convoque a sua aplicação.
Desde logo, torna-se mister demonstrar a ocorrência de um fenómeno de ocultação de bens, o que pressupõe um facto negativo (uma omissão), cumulado com um facto jurídico de carácter positivo (o dever de declarar, por parte do omitente, a existência do bem). Trata-se, pois, de um requisito de natureza objetiva, consistente na ocultação da existência de bens da herança, que pressupõe que o herdeiro (cabeça de casal, ou não) atuou, por ação ou omissão, de modo a ocultar a existência de determinados bens da herança, o dever de os declarar e que essa atuação tenha por resultado a sua ocultação.
De igual modo, exige-se a verificação de um requisito de natureza subjetiva, correspondente ao dolo na ocultação, traduzido no conhecimento do herdeiro (cabeça de casal, ou não) de que os bens que devia relacionar/indicar pertencem a herança e na vontade de não declarar esses bens e de os subtrair à partilha do respetivo acervo.
A propósito dos enunciados requisitos (de verificação cumulativa) a jurisprudência pátria[2] tem considerado que, para este efeito, o dolo se revela na existência de uma atuação tendo em vista o apossamento ilícito ou fraudulento de bens em detrimento dos demais herdeiros; que aquele requisito subjetivo se preenche quando fica evidenciado o desígnio fraudulento de apropriação dos bens, de os fazer exclusivamente seus; e só existir sonegação de bens quando a sua ocultação é intencional, sendo inequívoca a obrigação de os relacionar/declarar.
Nesse desígnio fraudulento é ainda reconhecida, pela doutrina[3], a necessidade de uma atuação do sonegador representada por artifícios, dissimulações ou sugestões com intenção ou consciência de enganar os co-herdeiros, bem como sugestões, artifícios ou dissimulações empregues que resultem numa ocultação de bens da herança.
Assim sendo, neste contexto, parece evidente que a mera existência de divergências entre os interessados acerca da integração ou não de determinados bens na herança indivisa, seguida da sua resolução jurisdicional[4] num determinado sentido, não pode implicar automaticamente para o interessado vencido a aplicação dos efeitos gravosos que a lei prescreve para os casos de sonegação de bens da herança. Para que tal aconteça, é necessário que da matéria de facto apurada se possa confirmar que o herdeiro atuou, por ação ou omissão, de modo a, na expressão legal, “ocultar dolosamente a existência de determinados bens da herança que deveriam ser relacionados ou identificados para efeitos de partilha[5].
Isto posto, revertendo ao caso sub judicio, apelando ao tecido fáctico apurado, verifica-se que a cabeça de casal (ora apelante), apesar de estar legalmente obrigada (cfr. arts. 24º e 25º do Regime Jurídico do Processo de Inventário) a declarar, com verdade e completude, os bens que integravam o património do inventariado, não relacionou, contudo, dois certificados de aforro de que este era titular (no valor global, à data do seu decesso, de € 17.837,24). E fê-lo sabendo que esses ativos integravam o acervo a partilhar.
Perante tal omissão, foi apresentada reclamação à relação de bens por banda da interessada BB, na qual imputava à cabeça de casal a ação intencional de ocultar a existência dos mencionados certificados de aforro. Certo é que esta (estando patrocinada por advogado), no momento processualmente oportuno, não respondeu a essa imputação, quedando-se por uma atitude silente, o que, para alguns, implicaria, desde logo, a produção do efeito cominatório estabelecido no art. 567º, por aplicação do disposto no art. 293º, nº 3 e 549º, do Cód. Processo Civil, ou seja, considerar-se-iam confessados os factos articulados pela reclamante.
Como quer que seja, na peça recursória que apresentou, a apelante não impugnou validamente (mormente por inobservância dos ónus previstos no art. 640º do Cód. Processo Civil) a materialidade que o decisor de 1ª instância considerou provada, designadamente o enunciado fáctico vertido no ponto nº 4, limitando-se, conclusivamente, a sustentar que, na sua perspetiva, o denominado “contrato promessa de partilha” junto aos autos não permite afirmar a intencionalidade na ocultação dos referidos certificados de aforro, intencionalidade essa que, como igualmente advoga, não pode resultar do depoimento que foi prestado pela testemunha EE, porque “esta testemunha não tinha qualquer proximidade com a aqui recorrente”.
Como deflui da motivação da decisão de facto, relativamente à mencionada proposição factual, o juiz a quo, na formação da sua convicção, não relevou o referido suporte documental (que, note-se, não se mostra sequer assinado pela interessada BB), filiando o respetivo juízo probatório primordialmente no depoimento da aludida testemunha – que, como se escreve no ato decisório recorrido, “soube identificar os bens pertença do inventariado à data da morte, conhecendo os meandros dos relacionamentos familiares entre os interessados nos autos, muito em particular a questão do levantamento dos certificados de aforro, que atestou de forma cabal, esclarecedora e credível” – concatenado com os documentos emitidos pela Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública.
Nas suas alegações vem agora a apelante articular um conjunto de factos (cfr., v.g., os nºs 15, 17, 27 e 32 dessa peça processual) alegadamente demonstrativos de que a omissão no relacionamento dos referidos ativos se terá ficado a dever “a um lapso pelos outorgantes do contrato-promessa de partilha (…) que conduziu a que se considerasse não serem de relacionar os certificados de aforro”, estando “convencida que não os teria de relacionar”.
Trata-se, contudo, de factualidade que poderia – e, porventura, deveria - ter sido alegada na resposta à acusação da falta de relacionação dos bens (onde teria a oportunidade de discutir e justificar o seu comportamento omissivo); não o tendo feito, sibi imputet, sendo que assumindo o presente recurso de apelação natureza de recurso de reponderação[6] não pode este tribunal ad quem levar em consideração as referidas afirmações de facto por tal extravasar o seu poder de cognição que, como é consabido, está circunscrito às questões (seja de facto, seja de direito) já submetidas ao tribunal de categoria inferior.
Consequentemente, na presença do substrato factual que o tribunal a quo considerou provado, ter-se-á de concluir que a referida falta de relacionação dos mencionados ativos foi consciente e intencional, visando a cabeça de casal, com essa omissão, afastar esses bens da partilha, tanto assim que, em conluio com o seu filho, procedeu ao resgate desses títulos, sem conhecimento dos demais interessados, integrando a quantia assim recebida no seu património para, dessa forma, evitar que o mesmo fosse relacionado, malgrado soubesse que não possuía qualquer título (entendida a expressão no seu sentido civilístico, isto é, enquanto fundamento ou causa da titularidade de determinado direito) para esse embolso.
Mostra-se, por conseguinte, justificada a conclusão firmada pelo decisor de 1ª instância no sentido de que, no caso vertente, se encontram cabalmente provados quer o requisito da ocultação de bens, quer o requisito da conduta dolosa, razão pela qual a decisão recorrida não é passível de censura que justifique a alteração do sentido decisório nela acolhido.
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V. DISPOSITIVO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela apelante.

Porto, 24.10.2022
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
Fátima Andrade
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[1] Sem prejuízo das “mais sanções que forem aplicáveis”, que assumem, designadamente, natureza criminal e fiscal.
[2] Cfr., inter alia, acórdãos do STJ de 1.07.2010 (processo nº 1315/05.7TCLRS.L1.S1), de 28.04.2018 (processo nº 155/11.9TBPVZ.P1.S1), de 4.10.2018 (processo nº 2630/14.4T8VIS.C1.S1) e de 8.10.2019 (processo nº 13452/15.5T8PRT.P1.S1), acórdão da Relação de Coimbra de 15.05.2018 (processo nº 719/12.3TBFND-A.C1), acórdão desta Relação de 16.04.2013 (processo nº 133/08.5TBMGD-C.P1) e acórdão da Relação de Lisboa de 12.11.2009 (processo nº 3158/07-2), acessíveis em www.dgsi.pt.
[3] Cfr., por todos, CAPELO DE SOUSA, in Lições de Direito das Sucessões, vol. II, Coimbra Editora, 2013, pág. 59 e PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, in Código Civil Anotado, vol. VI, Coimbra Editora, 1998, pág. 157, onde escrevem que “sob o invólucro civilístico do dolo (art. 253º do Cód. Civil) cabem tanto as manobras ativas (sugestões ou artifícios) tendentes a induzir ou a manter em erro os destinatários da relação de bens, quanto à existência de certos bens hereditários, como a atitude (passiva) da dissimulação do erro (…). Por outro lado, interessa ter presente que, de acordo com a escala valorativa das condutas humanas próprias do direito, à figura do dolo direto (violação direta, consciente ou intencional da norma) se equiparam as situações afins do dolo indireto e do chamado dolo eventual”.
[4] De acordo com o que postula o nº 4 do art. 35º do Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei nº 23/13, de 5.03 (em vigor ao tempo da apresentação da ajuizada relação de bens), a existência de sonegação de bens, nos termos da lei civil, “é apreciada conjuntamente com a acusação da falta de bens relacionados”.
[5] Já ALBERTO DOS REIS (in Código de Processo Civil Anotado, 2ª edição, Coimbra Editora, pág. 884) alertava para as dificuldades de demonstração dos pressupostos normativos integrantes da figura sonegação e justificativos da aplicação da aludida sanção civil, concluindo que tudo passará por saber se o interessado procedeu de boa ou má fé, tendo em conta “as alegações mais ou menos verosímeis, mais ou menos plausíveis, consoante as circunstâncias de facto que o juiz, em seu prudente arbítrio, avaliará”.
[6] Cfr., sobre a questão e para maior desenvolvimento, ABRANTES GERALDES, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição, Almedina, págs. 27 e seguintes e RUI PINTO, in Manual do Recurso Civil, vol. I, AAFDL Editora, 2020, págs. 62 e seguintes.