Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
600/25.6T8LOU-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RAQUEL CORREIA LIMA
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE TUTELA DA PERSONALIDADE
MEDIDAS PROVISÓRIAS
Nº do Documento: RP20251126600/25.6T8LOU-B.P1
Data do Acordão: 11/26/2025
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A protecção da personalidade é garantida pelo Processo Especial de Tutela da Personalidade, um procedimento judicial célere previsto no Código de Processo Civil (Artigos 878.º a 880.º). Através dele, uma pessoa pode pedir ao tribunal medidas para prevenir ameaças (provisórias e definitivas) ou atenuar os efeitos de ofensas já ocorridas, como violações do direito à imagem, honra ou vida privada.
II - No âmbito desta acção (ou antes dela), o tribunal pode fixar medidas provisórias ou cautelares, destinadas a Impedir a continuação da violação, evitar danos graves e de difícil reparação ou garantir a eficácia da decisão final.
III - Em face de um acordo provisório em que as obrigações acordadas são, essencialmente de “facere, e que se pretende sejam cumpridas, parece-nos claro que não é de admitir o pedido de indemnização por danos sofridos e a realização de uma perícia.

(Sumário da responsabilidade da Relatora)
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo: 600/25.6T8LOU-B.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este

Juízo de Execução de Lousada - Juiz 2

ACÓRDÃO

I. RELATÓRIO

Nos autos de execução de sentença instaurada por AA contra “A..., Unipessoal”, sendo o título executivo a sentença homologatória do acordo provisório alcançado entre as partes no processo 1433/24.2T8PRD proferido no Juízo Local Cível de Paredes – Juízo 2, foram deduzidos embargos de executado.

Os autos seguiram os seus termos e aquando do Despacho Saneador foi proferida decisão que considerou que o pedido formulado pela exequente no sentido da condenação da executada no pagamento de indemnização no montante de €40.000,00, alegadamente a título de compensação por danos morais decorrentes do ruído e perturbações causadas pela executada, não encontra qualquer fundamento no título executivo apresentado, uma vez que a sentença exequenda não fixou qualquer indemnização, nem condenou a executada ao pagamento de quantia certa ou ilíquida a esse título. O pedido de indemnização formulado no requerimento executivo extravasa os limites do título executivo, nos termos do artigo 10.º do Código de Processo Civil, sendo matéria própria de acção declarativa autónoma e não de execução baseada em sentença que impõe obrigações de facto.

Em consequência, parte da prova solicitada pela Exequente extravasa o âmbito da presente demanda.

Qualquer apuramento técnico ou médico relativo à existência de ruído ou ao estado psicológico da exequente extravasa claramente o âmbito da presente execução e só poderá ser objeto de apreciação em ação declarativa própria, onde se discutam, em sede de cognição plena, os alegados danos e a eventual responsabilidade civil da ora executada.

Assim, não poderão tais perícias ser ordenadas ou realizadas no presente processo executivo, por se reportarem a matéria não abrangida pelo título executivo apresentado.

No que se refere à prova requerida ao abrigo do artigo 432.º do Código de Processo Civil – a notificação do contabilista certificado da executada para apresentar os ficheiros SAF-T (PT) da sociedade, bem como uma relação de todas as faturas emitidas com indicação dos respetivos dias e horas, desde 25 de outubro de 2024, com vista a provar os factos constantes dos pontos 2.º a 7.º do requerimento executivo, considerou que não era meio idóneo nem necessário para apurar o eventual incumprimento da prestação de facto em causa, nomeadamente a violação dos horários estabelecidos na sentença. Trata-se, na realidade, de um expediente instrutório de natureza declarativa, mais próprio de uma ação de responsabilidade civil onde se discutissem danos, lucros ou atividade económica, mas que não encontra enquadramento legal no contexto de uma execução por obrigação de facto infungível.

RECURSO

Não se conformando com o teor desta decisão, veio a exequente recorrer.

Após motivação, termina com as seguintes CONCLUSÕES

A. Apelante vem requerer a revogação dos segmentos do Douto Despacho de fls....,

(Ref. citius 99105747), do qual a Apelante foi notificada a 03/07/2025 (Ref. citius 99164338), pelos seguintes fundamentos:

1. Da rejeição de meios de prova

B. O presente recurso tem a montante a execução de sentença nos próprios autos que foi instaurada pela, aqui, Apelante contra "A..., Unipessoal" apresentando como título executivo a sentença homologatória do acordo alcançado entre as partes no âmbito do Processo n.º 1433/24.2T8PRD proferido no Juízo Local Cível de Paredes -Juízo 2;

C. Na ação executiva, ora, instaurada para execução de sentença proferida no âmbito de ação especial de tutela da personalidade, visa-se unicamente o apuramento do cumprimento da prestação de facto a que a ré foi condenada, conforme decisão transitada em julgado;

D. A sentença em execução determina que a ré, executada e embargante, observe o horário de funcionamento do seu estabelecimento comercial nos termos seguintes:

a. De terça a sábado, horário de almoço das 12h00 às 15h00, jantares das 19h00 às 22h00, com encerramento às 00h00;

b. Aos domingos, funcionamento apenas das 12h00 às 15h00, com encerramento no mesmo horário;

c. Proibição de servir alimentos ou bebidas após as 22h00, de terça a sábado;

d. Proibição de realizar operações de limpeza entre as 22h00 e as 09h00 do dia seguinte, devendo estas ocorrer após esse horário.

Ora,

E. Tendo sido proferida e transitado em julgado uma sentença no âmbito de ação especial de tutela da personalidade, na qual a ré/Embargante foi condenada a observar determinados horários de funcionamento, de encerramento e de limpeza do seu estabelecimento, a execução tem por objeto garantir que essa obrigação seja efetivamente respeitada, de forma a salvaguardar os direitos de personalidade da aqui Apelante;

F. Trata-se, portanto, de uma execução de prestação de facto infungível, prevista no artigo 829.°-A do Código Civil e regulada nos artigos 868.° e seguintes do Código de Processo Civil, visando verificar e, se necessário, compelir a parte vencida a cumprir a obrigação fixada pela decisão judicial;

G. Sendo que, desde já, pelo que se reflete nos articulados, as partes têm posições antagónicas e incompatíveis;

H. Daí que, ab initio, a Apelante no seu requerimento executivo tenha, no seu requerimento de prova, requerido:

REQUERIMENTO(s):

EM PODER DE TERCEIROS

10-Ao abrigo do art.° 432.° do CPC, e com vista a provar os factos 2.° a 7.° do presente articulado, requer-se que, após identificação pelo Executado do seu Contabilista Certificado, seja este notificado para apresentar todos os ficheiros SAF-T AT da sociedade comercial executada, desde 25 de outubro de 2024 e, bem assim, de uma relação de todas as faturas emitidas pela sociedade com menção dos dias e horas da sua emissão, desde 25 de outubro de 2024.

I. Ou seja, enformado com o justificativo legal a Apelante requer a junção de prova documental que se encontra em poder de terceiros, com vista a fazer prova do incumprimento do horário estabelecido em Sentença homologatória;

J. Sobre este âmbito, discorreu o Douto Despacho do Tribunal a quo, contra o qual se apela e se requer a sua revogação, por outro que admita, o respetivo meio de prova:

A produção de prova documental relativa a dados contabilísticos e faturação eletrónica, como sejam ficheiros SAF-T ou horários de emissão de faturas, não constitui meio idóneo nem necessário para apurar o eventual incumprimento da prestação de facto em causa, nomeadamente a violação dos horários estabelecidos na sentença. Trata-se, na realidade, de um expediente instrutório de natureza declarativa, mais próprio de uma ação de responsabilidade civil onde se discutissem danos, lucros ou atividade económica, mas que não encontra enquadramento legal no contexto de uma execução por obrigação de facto infungível.

Acresce que tal diligência pode representar uma violação do princípio da adequação e da proporcionalidade, nos termos do artigo 6º do CPC, impondo um ónus injustificado à executada e terceiros (neste caso, ao contabilista certificado), sem que tal se revele necessário ou útil para aferir o cumprimento das obrigações tituladas pela sentença.

Nestes termos, vai indeferido por manifesta impertinência e irrelevância para a boa decisão da causa executiva o pedido em analise. (negrito e sublinhado nosso)

K. E, desde logo, atendível que é o próprio Tribunal a quo a reconhecer que o meio de prova é admissível para discutir a atividade económica da embargante, veja-se a negrito «..._ onde se discutissem danos, lucros ou atividade económica,» ;

L. Que é, precisamente, o que se eleva nos Autos executivos, o exercício de uma atividade em violação do acordado e sentenciado, nos termos já expostos e melhor reproduzidos no Requerimento Executivo, o incumprimento dos horários acordados e o desenvolvimento de atividades além e aquém desses mesmos horários;

M. Sendo que a obtenção de uma relação das faturas após a lavra do acordo judicial, para prova deste incumprimento, bem como dos ficheiros SAFT (um por cada mês corrido), não é senão o meio mais capaz e menos oneroso para a descoberta da verdade material, face à posição antagónica que as partes verteram nos seus articulados;

N. Ora, nos pressupostos de admissão de prova documental contam-se a sua pertinência para o objeto da prova a produzir («os temas da prova enunciados», ou os factos necessários «ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio» que seja lícito ao Tribunal conhecer, nos termos do art.° 5.° e 6.0, do CPC); e o seu carácter não dilatório (isto é, não ter a apresentação do documento apenas o propósito de dilatar o termo do processo).

O. Não sendo, o requerimento de probatório e, consequente, prova documental a extrair, nem impertinente, nem dilatória, nem irrelevante para a boa decisão da causa, como expressa o art.° 6.° do CPC, mas tratando-se tão só de apuramento da verdade material;

P. Veja-se, Venerandos(as) Senhores(as) Juízes Desembargadores(as), que o Douto Despacho de não admissão deste requerimento probatório e respetivo meio de prova, e a sua não revogação imediata por outro que admita os meios de prova, é de suprema relevância, pois que tem influência no normal devir dos presentes Autos, influenciando a boa decisão da causa, sendo que a sua impugnação com a decisão final, revelar-se-ia totalmente inútil;

Q. Pois que, se o executado/embargante continuar. (e continuará!) a incumprir a Sentença homologatória, continuará a lesar os direitos da Apelante ao uso pleno da habitação, da sua saúde, da integridade física, sono e descanso, de forma permanente e, quiçá, irreversível, retirando toda a eficácia à ação executiva e ao seu título;

R. Tanto que, ficaram cristalizadas, pois que não foram feridas de reclamação, quer o da violação de qualquer uma das obrigações assumidas pela Exequente na decisão provisória realizado no processo no 1433/24.2T8PRD que corre termos no Juízo Local Cível de Paredes —Juiz 2. » e, ainda, os temas da prova - « 1. Apurar se a executada viola a decisão provisória fixada no processo no 1433/24.2T8PRD que corre termos no Juízo Local Cível de Paredes — Juiz 2, designadamente se: - a executada abre o estabelecimento procedendo a trabalhos vários de limpeza producentes de ruído, antes das 09h00m fixadas no acordo, uns dias às 06h3Om outros pelas 07h00m; - a executada não encerra o estabelecimento todos os dias, excluindo Domingo, às 24h00m conforme o acordo fixado, servindo sempre os clientes para lá das 22h00m fixadas em acordo; 2. Apurar se 09 de abril de 2025, o Embargante já tinha o estabelecimento aberto ao público às 08h33m 3. Apurar se a 14 de maio de 2025, o Embargante já tinha o estabelecimento aberto ao público, até antes das 08h06m — Cfr. doc. 8 4. Apurar se a 23 de maio de 2025, o Embargante já tinha o estabelecimento a trabalhar, até antes das 06h26m 5. Apurar se a 18 de maio de 2025, o Embargante já tinha o estabelecimento aberto, até antes das 08h28m 6. Apurar se a 20 de maio de 2025, o Embargante já tinha o estabelecimento aberto, até antes das 07h21m E assim, sucessivamente, o Embargante não cumpre o Acordo, pois que começa a fazer trabalhos no seu estabelecimento, logo pelas 06h00, pelas 06h30, 07h00, 07h30, 08h00, 08h30m, isto praticamente todos os dias, atendendo e servindo os clientes, mantendo a porta aberta ao público, muito para além do horário fixado no Acordo; 7. Conduta processual das partes. 8. Fixação de sanção pecuniária compulsória e seu valor.

S. Seguindo-se de perto a melhor doutrina e jurisprudência, e por todos cita-se a fundamentação do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 12-10-2023,, no âmbito do Processo n.º 100/22.6T8MDR-C.G1, relatora Maria João Matos, disponível em www.dgsi.pt ;

T. Em corolário, ao não ter admitido o requerimento probatório e a sua consequente, junção de documentos essenciais para a descoberta da verdade face à matéria alegada e objeto dos temas de prova, o Tribunal recorrido violou os princípios da aquisição processual e da descoberta da verdade material e o disposto nos artigos 1., 20, 3., 4., 5., 6.,a 9° e a 9°-A, 193°, 411°, 414.°, 417°, 423° e 436°, todos do CPC, e ainda o art.° 342.° e 346.° do Código Civil, tendo interpretado tais preceitos e princípios em violação do disposto nos artigos 1°, 2.°, 13° e 18.° n.º 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa e dos princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da confiança e do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva;

U. O Tribunal recorrido deveria ter interpretado os princípios da aquisição processual e da descoberta da verdade material, o disposto nos artigos 1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 6°, 7° 8° 9° e a 9°-A, 193°, 411°, 414.°, 417°, 423° e 436°, todos do CPC, em conformidade com o disposto nos artigos 1°, 2.°, 13° e 18.° n.º 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa e. com os princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da confiança e do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, admitindo o requerimento probatório e os, consequentes, documentos essenciais para a descoberta da verdade material;

V. Destarte, e porque se afigura pertinente e relevante para a boa decisão da causa, e, mais, porque nesse se apura a boa decisão e verdade material da causa, e não a meramente formal, que se torna expedita para o julgador, porque se enquadra no objeto do litígio e nos temas da prova, deve o segmento do Despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que admita o requerimento probatório e o meio de prova requerido pela Apelante no seu requerimento executivo;

W. Ordenando, consequentemente, que ao abrigo do art.° 432.° do CPC, e com vista a provar os factos 2.° a 7.° do requerimento executivo, após identificação pelo Executado do seu Contabilista Certificado, seja este notificado para apresentar todos os ficheiros SAF-T AT da sociedade comercial executada, desde 25 de outubro de 2024 e, bem assim, de uma relação de todas as faturas emitidas pela sociedade com menção dos dias e horas da sua emissão, desde 25 de outubro de 2024.

Mais, ainda,

X. Vem, ainda, o Despacho recorrido não admitir o pedido de indemnização, a título de compensação por danos não patrimoniais, com o seguinte segmento:

Y. Contudo, no requerimento executivo, a exequente formula pedido de pagamento de indemnização no montante de €40.000,00, alegadamente a título de compensação por danos morais decorrentes do ruído e perturbações causadas pela executada. Ora, tal pedido não encontra qualquer fundamento no título executivo apresentado, uma vez que a sentença exequenda não fixou qualquer indemnização, nem condenou a executada ao pagamento de quantia certa ou ilíquida a esse título. Tão-pouco a sentença deferiu a existência de danos ou quantificou prejuízos indemnizáveis. Assim, o pedido de indemnização formulado no requerimento executivo extravasa os limites do título executivo, nos termos do artigo 10º do Código de Processo Civil, sendo matéria própria de ação declarativa autónoma e não de execução baseada em sentença que impõe obrigações de facto. Nestes termos, reconhece-se que a execução só pode prosseguir para efetivar o cumprimento coercivo da obrigação de facto constante da sentença, não podendo incluir-se no processo executivo a pretensão indemnizatória formulada, por carecer de título executivo.

Z. Ou seja, o Tribunal a quo, no seu Douto Despacho, labora num pressuposto errado, de que o pedido de indemnização, carece de título executivo, quando ele ocorre cristalinamente ope leges

AA. Pois que, reza o art.° 868.° do CPC: 1 - Se alguém estiver obrigado a prestar um facto em prazo certo e não cumprir, o credor pode requerer a prestação por outrem, se o facto for fungível, bem como a indemnização moratória a que tenha direito, ou a indemnização do dano sofrido com a não realização da prestação; pode também o credor requerer o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória, em que o devedor tenha sido já condenado ou cuja fixação o credor pretenda obter no processo executivo. [negrito nosso]

BB. E, ainda, reza o art.° 876.° do CPC: 1 - Quando a obrigação do devedor consista em não praticar algum facto, o credor pode requerer, no caso de violação, que esta seja verificada por meio de perícia e que o juiz ordene:

a) A demolição da obra que eventualmente tenha sido feita;

b) A indemnização do exequente pelo prejuízo sofrido; e

c) O pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória, em que o devedor tenha sido já condenado ou cuja fixação o credor pretenda obter na execução.

CC. Ou seja, socorrendo-se do petitório da Apelante, quer o expresso no seu requerimento executivo, bem como da sua Contestação aos presentes Autos, que assenta nos preceitos legais aduzidos, a Apelante peticionou, para além da sanção pecuniária compulsória, a indemnização por danos não patrimoniais;

DD. Não porque ela está líquida no título executivo, mas porque a lei ad substandam assim o prevê, desde que, como foi, seja inclusa no petitório;

EE. Com efeito, estando em causa a violação de uma obrigação de facto negativo- de abstenção (non facere), se a mesma redundar numa situação não repristinável, pode a exequente, ora Apelante, de acordo com o art. 876° do CPC, formular pedido de indemnização pelo prejuízo sofrido, cumulativamente com o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória;

FF. Em conformidade, e por todos, veja-se a Douta lição deste Tribunal da Relação, no âmbito do Processo n.º 12485/22.0T8PRT-A.P2 de acórdão de 19-11-2024, relatora Maria da Luz Seabra;

GG. E assim, também, nos ensina Calvão da Silvai, "E porque os direitos de personalidade são direitos pessoais, de conteúdo e função não patrimonial, a sua adequada e eficaz tutela passa pela prevenção do acto ilícito lesivo e não pela repressão e remedeio da violação', sendo "imprescindível a condenação inibitória, a injunção de cessação do facto ilícito perdurante e de prevenção de fado ilícito futuro, isto é, noutra formulação, a ordem judicial de condenação no cumprimento futuro do dever de abstenção. lnjunção a que o titular do direito de personalidade ofendido ou ameaçado tem o direito (...), como o juiz tem o poder-dever de a pronunciar, a fim de impedir a consumação da ameaça ilícita, a continuação da lesão ou a repetição do ilícito no futuro (...)"

HH. Laborando em pressuposto errado, que se impugna, o Tribunal a quo em consonância não admite o requerimento de prova da perícia médico legal, que melhor se transcreve do requerimento executivo:

12- Requer-se que seja realizada avaliação do dano corporal, no INMLF, no âmbito da avaliação médico-legal do dano corporal no domínio do direito civil, de modo a quantificar o dano de que padece a Exequente, de modo a provar o facto 18.° do presente articulado, com o seguinte objeto: orientado pelos critérios de avaliação de dano corporal para efeitos civis que afeções e danos morais sofre a Exequente.

II. Ao não admitir o requerimento, ora transcrito, no pressuposto, que consideramos

errado, de que não é admitida a pretensão indemnizatória, porque carente de título executivo, quando em verdade ela decorre ope leges, como já delongamente se expôs, o Douto Despacho enferma, entre outros, em violação do Princípio da Tutela efetiva e do acesso ao Direito, e da descoberta da verdade material;
JJ. Com efeito, verificando-se uma violação da Sentença homologatória, a sua violação acarreta a violação de Direito de Personalidade da, ora, Apelante;

KK. Em corolário, ao não admitir a pretensão indemnizatória e consequente apreciação da matéria de facto, subjacente a esta pretensão, bem como a prova requerida nesta sede, o Douto Tribunal a quo violou os princípios da aquisição processual e da descoberta da verdade material e violou, interpretou e aplicou, erradamente, o disposto nos artigos 1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 6°, 7° 8°. 9° e a 9°-A, 193°, 411°, 414.°, 417°, 423°, 436°, 868.° e 876.°, todos do CPC, tendo interpretado tais preceitos e princípios em violação do disposto nos artigos 1°, 2.°, 13° e 18.° n.° 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa e dos princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da confiança e do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva;

LL. O Tribunal recorrido deveria ter admitido a pretensão indemnizatória da Apelante; ainda que valorada por recurso à equidade, e bem assim, admitido o requerimento probatório subjacente, de perícia no INMLF, interpretando os princípios da aquisição processual e da descoberta da verdade material, de acordo com o disposto nos 1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 6°, 7° 8°. 9° e a 9°-A, 193°, 411°, 414.°, 417°, 423°, 436°, 868.° e 876.°, todos do CPC, e em conformidade com o disposto nos artigos 1°, 2.°, 13° e 18.° n.° 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa e com os princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da confiança e do acesso ao direito e a urna tutela jurisdicional efetiva, que expressamente se convocam para todos os efeitos legais, admitindo o requerimento probatório e os, consequentes, documentos essenciais para a descoberta da verdade material;

MM. Deste modo, deve o Despacho recorrido ser revogado por outro que admita a pretensão indemnizatória, nos termos requeridos no requerimento executivo e expostos na Contestação dos presentes Autos, como permite e no sentido previsto no art.° 876.°, n.° 1 al. b) do CPC, admitindo-se por extensão o requerimento probatório atinente, com todas as legais consequências.

Nestes termos, por todo o exposto, rogando sempre com o Mui Douto suprimento de Vaas Exas. nos melhores de Direito, deverá o presente recurso merecer provimento e impõe-se:

1. A revogação do Despacho recorrido, nos segmentos que:

a. Rejeita a admissão do requerimento probatório da Apelante, por outro que o admita, nos seguintes termos, que se extraem do requerimento executivo:

EM PODER DE TERCEIROS

10- Ao abrigo do art.° 432.° do CPC, e com vista a provar os factos 2.° a 7.° do requerimento executivo, requer-se que, após identificação pelo Executado do seu Contabilista Certificado, seja este notificado para apresentar todos os ficheiros SAF-T AT da sociedade comercial executada, desde 25 de outubro de 2024 e, bem assim, de uma relação de todas as faturas emitidas pela sociedade com menção dos dias e horas da sua emissão, desde 25 de outubro de 2024.

b. Rejeita o pedido de indemnização, quanto à pretensão por danos não patrimoniais, por outro que admita a pretensão indemnizatória, nos termos formulados no petitório da Apelante; e consequentemente,

c. Rejeita a admissão do requerimento probatório de perícia médico legal, no INMLF, por outro que o admita, nos seguintes termos, que se extraem do requerimento executivo:

12- Requer-se que seja realizada avaliação do dano corporal, no INMLF, no âmbito da avaliação médico-legal do dano corporal no domínio do direito civil, de modo a quantificar o dano de que padece a Exequente, de modo a provar o facto 18.° do requerimento executivo, com o seguinte objeto: orientado pelos critérios de avaliação de dano corporal para efeitos civis que afeções e danos morais sofre a Exequente.

2. Tudo com as necessárias consequências legais;

E, ASSIM, FAZENDO-0 ESTARÃO V. EXAS., VENERANDOS DESEMBARGADORES, A FAZER INTEIRA, SADIA E ALMEJADA JUSTIÇA!!!


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Não houve contra-alegações.


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Colhidos os vistos, cumpre decidir.


II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil

No caso vertente, em face das conclusões do recurso, a questão a apreciar é saber se no âmbito de execução de uma medida provisória tomada numa acção especial de tutela da personalidade:

· A produção de prova documental relativa a dados contabilísticos e facturação eletrónica, como sejam ficheiros SAF-T ou horários de emissão de faturas, é o meio idóneo e necessário para apurar o eventual incumprimento da prestação de facto em causa, nomeadamente a violação dos horários estabelecidos na sentença.

Se é de admitir:

· o pedido de condenação da ré numa indemnização por danos não patrimoniais sofridos

· a realização de perícias, designadamente no INMLF, no âmbito da avaliação médico-legal do dano corporal no domínio do direito civil, de modo a quantificar o dano de que padece a Exequente.


III. FUNDAMENTAÇÃO


A. OS FACTOS

· No âmbito do Processo n.º 1433/24.2T8PRD do Tribunal da Comarca de Porto Este, no Juízo Local Cível de Paredes - Juiz 2, foi homologada uma transação provisória, já transitada em julgado, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais, comprometendo-se o executado a proceder ao seguinte:

a. Cumprimento do horário de funcionamento:
i. De terça-feira a sábado, serviço de almoço entre 12h00m e as 15h00m, e serviço de jantar entre as 19h00m e as 22h00m, com a proibição de serviço de alimentos ou bebidas, após as 22h00m e encerramento obrigatório às 00h00m;
ii. Domingos, serviço de almoço entre 12h00m e as 15h00m, com encerramento obrigatório pela mesma hora;
b. Proibição de serviços de limpezas a partir das 22h00m até às 09h00m do dia seguinte;

· AA, Autora naqueles Autos, veio requerer, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 880.º do Código do Processo Civil, a execução do despacho homologatório, alegando que o executado persiste na violação do acordo fixado;

· Depois de alegar a actuação da executada, termina requerendo:

1. A realização de perícia, por perito averiguador, nos termos e efeitos do n.º 1 do art.º 876.º do CPC, que afira do alegado em 1.º a 4.º do presente articulado, que aqui por economia se dão reproduzidos;

2. No caso de se verificar por perícia, melhor descrita em 1. deste pedido, o incumprimento do acordo homologado, a aplicação imediata e sem contraditório de uma sanção pecuniária compulsória, à razão de € 500,00 (quinhentos euros) diários, desde a sua averiguação;

3. A condenação do executado em indemnização não inferior ao montante de 40.000,00 (quarenta mil euros) por danos não patrimoniais;

4. A prossecução dos termos subsequentes da presente execução para pagamento de quantia certa, ex vi n.º 2 do art.º 877.º do CPC, seguindo-se os demais termos até final.

5. A notificação do Contabilista Certificado da executada para apresentar todos os ficheiros SAF-T AT da sociedade comercial executada, desde 25 de outubro de 2024 e, bem assim, de uma relação de todas as faturas emitidas pela sociedade com menção dos dias e horas da sua emissão, desde 25 de outubro de 2024.

· Em sede de embargos de executado e aquando do Despacho Saneador foi proferida decisão que considerou que o pedido formulado pela exequente no sentido da condenação da executada no pagamento de indemnização no montante de €40.000,00, alegadamente a título de compensação por danos morais decorrentes do ruído e perturbações causadas pela executada, não encontra qualquer fundamento no título executivo apresentado, uma vez que a sentença exequenda não fixou qualquer indemnização, nem condenou a executada ao pagamento de quantia certa ou ilíquida a esse título. O pedido de indemnização formulado no requerimento executivo extravasa os limites do título executivo, nos termos do artigo 10.º do Código de Processo Civil, sendo matéria própria de acção declarativa autónoma e não de execução baseada em sentença que impõe obrigações de facto.

· No que respeita aos meios de prova, designadamente, realização de avaliação do dano corporal, no INMLF, no âmbito da avaliação médico-legal do dano corporal no domínio do direito civil, de modo a quantificar o dano de que padece a Exequente, a citada avaliação é manifestamente incompatível com a natureza e os limites da presente ação executiva, cujo objeto é exclusivamente a realização coerciva da prestação de facto determinada na sentença exequenda.

· Mais se disse que qualquer apuramento técnico ou médico relativo à existência de ruído ou ao estado psicológico da exequente extravasa claramente o âmbito da presente execução e só poderá ser objeto de apreciação em ação declarativa própria, onde se discutam, em sede de cognição plena, os alegados danos e a eventual responsabilidade civil da ora executada.

· Assim, não poderão tais perícias ser ordenadas ou realizadas no presente processo executivo, por se reportarem a matéria não abrangida pelo título executivo apresentado.

· Quanto à junção de documentos em poder de terceiro - ficheiros SAF-T AT da sociedade comercial executada, desde 25 de outubro de 2024 e, bem assim, de uma relação de todas as faturas emitidas pela sociedade com menção dos dias e horas da sua emissão, desde 25 de outubro de 2024, inferiu o requerido porquanto o mesmo não constitui meio idóneo nem necessário para apurar o eventual incumprimento da prestação de facto em causa, nomeadamente a violação dos horários estabelecidos na sentença. Trata-se, na realidade, de um expediente instrutório de natureza declarativa, mais próprio de uma ação de responsabilidade civil onde se discutissem danos, lucros ou atividade económica, mas que não encontra enquadramento legal no contexto de uma execução por obrigação de facto infungível.

B. O DIREITO

Assentes os factos mais relevantes e o despacho recorrido, constata-se que a única divergência entre o pedido efectuado e a decisão do tribunal tem a ver com o “timing” do processo.

Aquando da prolação do despacho recorrido o título executivo era apenas e tão só um acordo homologatório conseguido no âmbito de uma acção especial de tutela da personalidade, mas que não pôs termo ao processo, consistindo, sim, numa transacção provisória, que vigoraria enquanto o processo principal corria os seus termos.

Alegando a aqui recorrente que a executada não está a cumprir os termos desse acordo, parece-nos lapalissiano que apenas se pode pedir a execução do que foi efectivamente acordado.

A protecção da personalidade é garantida pelo Processo Especial de Tutela da Personalidade, um procedimento judicial célere previsto no Código de Processo Civil (Artigos 878.º a 880.º). Através dele, uma pessoa pode pedir ao tribunal medidas para prevenir ameaças (provisórias e definitivas) ou atenuar os efeitos de ofensas já ocorridas, como violações do direito à imagem, honra ou vida privada.

A medida provisória na ação especial de tutela da personalidade é uma decisão urgente e cautelar para proteger direitos como o nome, a imagem ou a intimidade, que pode ser tomada antes de uma decisão final. O objectivo é evitar ou atenuar os efeitos de uma ameaça aos direitos de personalidade, sendo irrecorrível e sujeita a confirmação posterior no próprio processo. Este mecanismo permite uma resposta rápida quando há a necessidade de proteger o direito do requerente.

No âmbito desta acção (ou antes dela), o tribunal pode fixar medidas provisórias ou cautelares, destinadas a:

• Impedir a continuação da violação;

• Evitar danos graves e de difícil reparação;

• Ou garantir a eficácia da decisão final.

Nos presentes autos de execução de medidas provisórias decretadas no âmbito de acção especial de tutela da personalidade, veio a exequente formular pedido de indemnização e requerer a realização de perícia, alegando a ocorrência de danos decorrentes do incumprimento das referidas medidas.

Se a parte contra quem a medida foi decretada não cumpre voluntariamente, há lugar à execução dessas medidas.

A execução faz-se através de processo executivo, mas não é necessário novo processo autónomo — aplica-se o regime das decisões condenatórias (art. 85.º, 86.º e 861.º do CPC), dependendo do tipo de obrigação:

a) Se a medida impõe uma obrigação de fazer ou não fazer, aplica-se o artigo 868.º e seguintes do CPC.

O tribunal pode fixar uma sanção pecuniária compulsória — art. 829.º-A do Código Civil; ordenar a execução coerciva por outrem (por exemplo, remoção de conteúdo, retirada de publicação, etc.); impor medidas coercivas adequadas à natureza da obrigação.

b) Se há obrigação de entrega ou restituição, segue-se o regime de execução para entrega de coisa certa (art. 861.º e segs. CPC).

O tribunal pode, portanto: fixar multa diária por cada dia de incumprimento; autorizar o requerente a executar diretamente a providência, às custas do requerido; em casos de ofensa continuada, ordenar a intervenção da autoridade policial para garantir o cumprimento.

Na acção especial de tutela da personalidade (art. 878.º CPC), o tribunal pode determinar medidas provisórias destinadas a proteger o direito ameaçado ou violado. Essas medidas, uma vez decretadas, têm força executiva imediata, independentemente do trânsito em julgado da decisão.

Não cabe no âmbito deste recurso, nem foi posto em causa, a análise do processo onde deve decorrer a execução das medidas aplicadas.

O artigo 880º nº 2 refere-se às medidas definitivas.

Esta questão está bem desenvolvida, havendo até, em contraponto, um voto de vencido – no Acórdão da Relação de Lisboa de 16-01-2025, tirado no processo 2150/24.9T8FNC-A.L1-2, relator JOÃO PAULO RAPOSO.

Aqui, independente da forma adoptada, só está em causa saber se em face de um acordo provisório, celebrado entre as partes no âmbito de uma acção especial prevista no artigo 878º, e que se pretende fazer cumprir, é de admitir o pedido de indemnização por danos sofridos e a realização de uma perícia com vista a determinar esses mesmos danos.

Parece-nos claro que não.

Nas alegações do recurso cita a recorrente o Acórdão da Relação do Porto de 19-11-2024, tirado no processo 12485/22.0T8PRT-A.P2, relatora Maria da Luz Seabra, onde se pode ler. “ I - A mera observância do Regulamento do Ruído ou mesmo a obtenção de licença especial de ruído, visa apenas e só o cumprimento de normativos de natureza administrativa, o que não invalida que esse ruído possa consubstanciar um acto ilícito se apesar da emissão da licença forem violados direitos absolutos de terceiros, como o direito ao repouso.

II - No âmbito de execução de sentença, caso tenha ocorrido violação de uma obrigação de facto negativo- de abstenção (non facere)-, se a mesma redundar numa situação não repristinável, pode nela o exequente formular pedido de indemnização pelo prejuízo sofrido cumulativamente com o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória na qual a executada havia sido condenada, nos termos do art. 876º do CPC.”

Tais diligências e averiguações, no caso em apreço, farão todo o sentido na acção declarativa, mas não neste âmbito “cautelar”.

A possibilidade do exequente pedir indemnização na execução - cumulativamente com sanção pecuniária compulsória só é válida quando existe uma violação de obrigação de facto negativo (abstenção) imposta por sentença ou decisão executiva com natureza definitiva, e quando a situação é não repristinável.

No caso, há um acordo provisório, ainda dentro de uma acção que está a decorrer, e a violação alegada (horários de abertura/fecho) não integra uma obrigação típica de “non facere” com efeitos irreversíveis.

A obrigação violada é uma obrigação de facto positivo? Horários de abertura/fecho são uma obrigação de fazer (facto positivo). Mesmo que envolva “abstenção de abrir em certas horas”, a obrigação dominante é: cumprir um horário, o que é essencialmente uma prestação positiva.

Portanto, não encaixa na lógica típica do art. 876.º CPC, que é centrado em “non facere” puro.

Além disso, o acordo é uma decisão provisória, não definitiva.

A situação do Acórdão supra citado não tem em vista execução de decisões provisórias, cautelares ou acordos temporários e, muito menos, quando o processo principal ainda não decidiu nada. Não se aplica o art. 876.º na sua plenitude, porque o título não é definitivo.. A violação dos horários é uma situação reversível e repristinável

Abrir um estabelecimento meia hora mais cedo ou mais tarde não causa, em regra, dano irreversível, não gera efeitos permanentes, não constituindo uma lesão de personalidade intrinsecamente não reparável.

Mesmo que haja incómodo, isto não é uma situação não repristinável, condição essencial para indemnização na execução.

Portanto, não é adequado pedir indemnização por danos não patrimoniais na execução, quando o único objeto é discutir o incumprimento do acordo. O acordo provisório pode ser alterado e só a decisão definitiva permitirá ao exequente, com segurança e eficácia, pedir, em caso de incumprimento, uma indemnização substitutiva.

Entendemos que a decisão proferida pelo Tribunal “ a quo” está bem fundamentada, não havendo muito mais a acrescentar.

Ali escreveu-se:” Como se disse nesta acção executiva tem como título executivo a decisão provisoria dada no processo 1433/24.2T8PRD proferido no Juízo Local Cível de Paredes – Juízo 2, decisão esta alcançada por acordo que foi homologada judicialmente. Na presente execução de sentença proferida no âmbito de ação especial de tutela da personalidade, visa-se unicamente o apuramento do cumprimento da prestação de facto a que a ré foi condenada, conforme decisão transitada em julgado. A sentença em execução determina que a ré, aqui executada, observe o horário de funcionamento do seu estabelecimento comercial nos termos seguintes:

1. De terça a sábado, horário de almoço das 12h00 às 15h00, jantares das 19h00 às 22h00, com encerramento às 00h00;

2. Aos domingos, funcionamento apenas das 12h00 às 15h00, com encerramento no mesmo horário;

3. Proibição de servir alimentos ou bebidas após as 22h00, de terça a sábado;

4. Proibição de realizar operações de limpeza entre as 22h00 e as 09h00 do dia seguinte, devendo estas ocorrer após esse horário.

Esclarece-se, assim, que a presente execução não tem por objeto a apreciação de eventual violação de direitos de personalidade, matéria essa que será, se for o caso, apreciada em sede de ação declarativa própria.

A execução de sentença, no presente caso, tem como finalidade assegurar o cumprimento coercivo de uma prestação de facto fixada por sentença judicial, concretamente o cumprimento dos horários de funcionamento do estabelecimento comercial da ré. Tendo sido proferida e transitado em julgado uma sentença no âmbito de ação especial de tutela da personalidade, na qual a ré foi condenada a observar determinados horários de funcionamento, de encerramento e de limpeza do seu estabelecimento, a execução tem por objeto garantir que essa obrigação seja efetivamente respeitada. Trata-se, portanto, de uma execução de prestação de facto infungível, prevista no artigo 829.º-A do Código Civil e regulada nos artigos 868.º e seguintes do Código de Processo Civil, visando verificar e, se necessário, compelir a parte vencida a cumprir a obrigação fixada pela decisão judicial. Neste contexto, a execução não tem por objetivo reapreciar a existência ou violação de direitos de personalidade — essa matéria está ainda em apreciação na ação declarativa. A execução serve apenas para verificar se a ré está a cumprir a obrigação concreta imposta pela sentença e, em caso de incumprimento, para fazer valer judicialmente a sua observância designadamente com a fixação de uma sanção pecuniária compulsória. De facto, na acção executiva à qual os presentes embargos estão apensos, o título dado à execução é a dita sentença proferida em sede de ação especial de tutela da personalidade, que impôs à ré (ora executada) obrigações de facto concretas, consistentes no cumprimento de determinados horários de funcionamento e regras de limpeza do seu estabelecimento comercial. Contudo, no requerimento executivo, a exequente formula pedido de pagamento de indemnização no montante de €40.000,00, alegadamente a título de compensação por danos morais decorrentes do ruído e perturbações causadas pela executada. Ora, tal pedido não encontra qualquer fundamento no título executivo apresentado, uma vez que a sentença exequenda não fixou qualquer indemnização, nem condenou a executada ao pagamento de quantia certa ou ilíquida a esse título. Tão-pouco a sentença deferiu a existência de danos ou quantificou prejuízos indemnizáveis. Assim, o pedido de indemnização formulado no requerimento executivo extravasa os limites do título executivo, nos termos do artigo 10.º do Código de Processo Civil, sendo matéria própria de ação declarativa autónoma e não de execução baseada em sentença que impõe obrigações de facto. Nestes termos, reconhece-se que a execução só pode prosseguir para efetivar o cumprimento coercivo da obrigação de facto constante da sentença, não podendo incluir-se no processo executivo a pretensão indemnizatória formulada, por carecer de título executivo.


***

E nessa medida parte da prova solicitada pela Exequente extravasa o âmbito da presente demanda. De facto, no requerimento executivo, a exequente requer a realização de perícias com vista a apurar, por um lado, se se verifica a violação da sentença e, por outro, o seu próprio estado psicológico. Ora, esta ultima diligencia – realização de avaliação do dano corporal, no INMLF, no âmbito da avaliação médico-legal do dano corporal no domínio do direito civil, de modo a quantificar o dano de que padece a Exequente, de modo a provar o facto 18.º do presente articulado, com o seguinte objeto: orientado pelos critérios de avaliação de dano corporal para efeitos civis que afeções e danos morais sofre a Exequente – é manifestamente incompatível com a natureza e os limites da presente ação executiva, cujo objeto é exclusivamente a realização coerciva da prestação de facto determinada na sentença exequenda. Nos termos do disposto no artigo 10.º do Código de Processo Civil, a execução só pode ter por base um título que reconheça, de forma certa, exigível e líquida (ou suscetível de liquidação), a obrigação a executar. A sentença em causa limitou-se a impor à executada determinadas obrigações de facto (nomeadamente, o cumprimento de horários e limitações de funcionamento do estabelecimento), não tendo apreciado nem declarado a existência de danos, muito menos determinado qualquer indemnização ou valor a esse título. Consequentemente, qualquer apuramento técnico ou médico relativo à existência de ruído ou ao estado psicológico da exequente extravasa claramente o âmbito da presente execução e só poderá ser objeto de apreciação em ação declarativa própria, onde se discutam, em sede de cognição plena, os alegados danos e a eventual responsabilidade civil da ora executada.

Assim, não poderão tais tipo de perícias ser ordenadas ou realizadas no presente processo executivo, por se reportarem a matéria não abrangida pelo título executivo apresentado. Mais se assinala que o pedido formulado pela exequente nos termos do n.º 1 do artigo 876.º do Código de Processo Civil, no qual requer a nomeação de agente de execução para, sem prévia notificação do executado, “aferir e comprovar o alegado nos pontos 1.º a 4.º do articulado”, deve ser liminarmente indeferido. Tal diligência não se coaduna com a finalidade da perícia prevista no referido normativo nem com a realização de atos instrutórios para comprovação de factos alegados, nomeadamente obrigações de facto que dependem de verificação continuada ou de condutas passadas e não diretamente observáveis no momento. Com efeito, o eventual incumprimento da prestação de facto a que a executada foi condenada (cumprimento de horários, limitação de ruído, etc.) só pode ser apurado com base em prova documental e/ou testemunhal idónea, que ateste a violação concreta dessas obrigações em momentos determinados. A intervenção de um agente de execução para “comprovar” factos passados ou que não estejam a ocorrer no momento da diligência não tem respaldo legal nem processual. Por conseguinte, a nomeação de agente de execução com essa finalidade reveste-se de natureza meramente investigatória ou instrutória, o que não é admissível no âmbito da ação executiva. Nestes termos, indefere-se ainda o pedido de perícia em analise.”

Acrescentando que, na execução dessas medidas não se reaprecia a existência, extensão ou violação do direito de personalidade (isso pertence à fase declarativa principal); não se reavalia o mérito da decisão que fixou a medida provisória. O tribunal executivo não pode modificar ou revogar a providência — apenas assegurar o seu cumprimento. O objecto da execução limita-se à verificação do cumprimento da obrigação concreta imposta pela decisão judicial.

Assim, em conclusão, as medidas provisórias previstas no artigo 878.º do Código de Processo Civil têm natureza essencialmente cautelar e preventiva, destinando-se a assegurar a tutela imediata e efectiva de direitos de personalidade ameaçados ou violados, não visando a reparação de danos patrimoniais ou não patrimoniais já ocorridos.

Nesta sede executiva, o objeto do processo restringe-se à verificação do cumprimento da obrigação concreta imposta pela decisão e, em caso de incumprimento, à adopção de medidas coercivas adequadas, designadamente a fixação de sanção pecuniária compulsória, ao abrigo do disposto no artigo 829.º-A do Código Civil e nos artigos 85.º e 868.º do Código de Processo Civil.

No âmbito desta execução, não tem cabimento o pedido de indemnização, questão que apenas poderá ser deduzida em acção declarativa autónoma, se a exequente entender que lhe assistem direitos indemnizatórios. Do mesmo modo, não se justifica a realização de perícia, uma vez que a produção de prova pericial, destinada à averiguação ou quantificação de danos, é alheia à natureza sumária e instrumental do presente incidente executivo.

No que respeita à junção e documentos em poder de terceiro, ou seja, junção dos ficheiros SAF-T por parte do contabilista, entendeu o tribunal “ a quo” que não constitui meio idóneo nem necessário para apurar o eventual incumprimento da prestação de facto em causa, nomeadamente a violação dos horários estabelecidos na sentença. Trata-se, na realidade, de um expediente instrutório de natureza declarativa, mais próprio de uma ação de responsabilidade civil onde se discutissem danos, lucros ou atividade económica, mas que não encontra enquadramento legal no contexto de uma execução por obrigação de facto infungível.

Na verdade, no estrito cumprimento do dever de gestão processual previsto no artigo 6º do Código de processo Civil, o tribunal orientar-se pelo andamento célere do processo, promovendo oficiosamente, as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório.

Tal como o tribunal “a quo”, afigura-se-nos que esta diligência, que terá cabimento no âmbito da acção declarativa, mostra-se desajustada nesta fase de execução de um acordo provisório, sendo que o incumprimento invocado pode ser comprovado por outros meios menos invasivos.

A decisão de não admitir, por ora, a junção dos documentos requeridos não enferma de qualquer violação dos princípios da aquisição processual e da descoberta da verdade material, nem contraria o regime estabelecido nos artigos 1.º, 20.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 9.º e 9.º-A, 193.º, 411.º, 414.º, 417.º, 423.º e 436.º do Código de Processo Civil, bem como nos artigos 342.º e 346.º do Código Civil. Com efeito, o Tribunal fez correta interpretação e aplicação desses preceitos, em conformidade com a natureza instrumental das regras atinentes à produção de prova e com a necessidade de assegurar a normal tramitação processual, não se mostrando afectado o objetivo de descoberta da verdade material, o princípio do inquisitório ou o equilíbrio das posições processuais das partes.

Assim, a decisão recorrida não viola, nem directa nem indirectamente, o disposto nos artigos 1.º, 2.º, 13.º e 18.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa, nem os princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da protecção da confiança e do acesso ao direito a uma tutela jurisdicional efectiva. Pelo contrário, a solução adoptada harmoniza-se com tais parâmetros constitucionais, assegurando que o exercício dos direitos processuais das partes decorra de forma proporcional, equilibrada e conforme às regras procedimentais legalmente fixadas, não se verificando qualquer restrição desnecessária ou excessiva do direito à prova ou do direito à tutela jurisdicional.

Deste modo, o recurso é totalmente improcedente.

IV. DECISAO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente

DN

Porto, 26 de Novembro de 2025

(Elaborado e revisto pela relatora, revisto pelos signatários e com assinatura digital de todos)

Por expressa opção da relatora, não se segue o Acordo Ortográfico de 1990.

Raquel Correia Lima (Relatora)

Anabela Andrade Miranda (1º Adjunto)

Maria do Céu Silva (2º Adjunto) [Voto de vencido: Discordo da manutenção da decisão recorrida na parte em que foi decidido que não pode “incluir-se no processo executivo a pretensão indemnizatória formulada, por carecer de título executivo”, porque a possibilidade de pedido de indemnização (pelos prejuízos causados pela violação da obrigação exequenda) na execução para prestação de facto resulta da própria lei (arts. 868º e 876º do C.P.C.), sendo irrelevante que o título executivo seja uma decisão provisória, pois esta tem total força executória enquanto vigorar (www.dgsi.pt Acórdão da Relação de Guimarães de 5 de junho de 2025, processo 444/25.5T8VNF-A.G1).

Discordo da manutenção da decisão recorrida na parte em que indeferiu a requerida notificação do contabilista certificado da executada para apresentar documentos, porque poder a violação da obrigação ser comprovada por outros meios de prova não é fundamento para indeferir a notificação requerida (cf. Acórdão da Relação de Lisboa de 15 de setembro de 2022, processo 739/22.0T8PDL-A.L1-2, e Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11 de maio de 2020, processo 992/20.3T8CTB-A.C1, acessíveis em www.dgsi.pt).]