Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ANABELA MIRANDA | ||
Descritores: | PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO HOMOLOGAÇÃO DO PLANO REGRAS NÃO NEGLIGENCIÁVEIS CUMPRIMENTO | ||
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Nº do Documento: | RP202504082584/24.9T8VNG-C.P1 | ||
Data do Acordão: | 04/08/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - O Processo Especial de Revitalização (PER) destina-se a alcançar um acordo entre o devedor e os credores, tendo como desiderato a recuperação do devedor, o qual se encontra em situação económica difícil ou de insolvência iminente mas com possibilidade de recuperação. II - A homologação do plano depende do cumprimento das regras não negligenciáveis designadamente no que concerne às informações tidas por relevantes pelo legislador. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 2584/24.9T8VNG-C.P1
Relatora: Anabela Andrade Miranda Adjunto: Ramos Lopes Adjunto: Alberto Taveira * Sumário ……………………………… ……………………………… ……………………………… * Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I—RELATÓRIO “A..., Lda.”, com sede na Praça ...–Edifício..., Piso 5, ... Porto, melhor identificada no processo, impulsionou os presentes autos de revitalização, tendo em vista a aprovação do plano de recuperação. O Sr. Administrador Judicial Provisório apresentou a lista provisória de créditos em 3/05/2024, publicitada a 13 de Maio. Não foram apresentadas impugnações, mas apenas propostas de alteração do plano. Manifestaram-se contra a aprovação do plano: - o Banco 1..., S. A. no sentido de recusar categoricamente o perdão de 95% da dívida e sugerindo alterações. - A B... - A Banco 2..., SA por violação de regras de conteúdo, nos termos dos art.ºs 215º e 195º d). f). h) do nº 2 do art.º 195º do CIRE - O Ministério Público, porque o plano é omisso quanto às dívidas ao Estado designadamente a título de custas, sendo que o perdão do capital e juros não lhe é oponível. A Devedora manteve o plano que foi objeto de votação. Em 9/09 foi publicitada a não junção de nova versão do plano. Manifestaram-se no sentido da não homologação os seguintes credores e com os seguintes argumentos: a) O Banco 3... manifestou-se neste sentido: “- Da não aceitação do voto favorável do ISS, IP porque o plano não o afeta; - Da falta de cumprimento do art. 17º-c, nº1, do CIRE: porque os alegados credores que subscreveram a declaração inicial não constam da lista provisória de créditos e nem reclamaram créditos. - Violação do princípio da igualdade na medida em que o ISS, IP recebe a totalidade e os restantes credores 5% do capital, incluindo trabalhadores. b) O Ministério Público porque - Não contem os elementos mínimos, previstos no nº 1, do artº 17º-f do CIRE para um plano de revitalização; - viola o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários (onde se Englobam as custas processuais), ao mencionar um perdão de 95% do valor, bem como pela inexistência de apresentação de regime de regularização prestacional. c) a Banco 2... por violação do disposto nas alíneas d), f) e h) do n.º 2 do artigo 195.º CIRE. - O plano prevê a manutenção da atividade da empresa na titularidade da devedora; no entanto, não apresenta “o plano de investimentos, a conta de exploração previsional, a demonstração previsional de fluxos de caixa pelo período de ocorrência daqueles pagamentos, especificando fundamentadamente os principais pressupostos subjacentes a essas previsões, e o balanço pró-forma, em que os elementos do ativo e do passivo, tal como resultantes da homologação do plano de insolvência, são inscritos pelos respetivos valores” (alínea d) do n.º 2 do artigo 195.º do CIRE). - Refere, tão só e apenas, que o “plano de pagamento a apresentar aos restantes credores dependa da possibilidade de cobrança de parte das dívidas efetivas e da dívida contingente com ação pendente contra a comissão de coordenação regional do norte, o certo é que, mesmo que tal plano não se venha a concretizar no período em análise, a empresa liberta meios (estimados em 184.502€) suficientes que permitirão ainda assim cumprir com esse compromisso em período posterior”. - A ausência dos referidos documentos inviabiliza o cabal cumprimento da alínea d) do n.º 2 do artigo 195.º cire, não permitindo a apresentação de um verdadeiro plano de recuperação devidamente estruturado, suscetível de evitar a insolvência ou garantir a viabilidade da empresa. - Não existe evidência de um plano de negócios estruturado, bem como que não estão minimamente espelhadas no plano quais as alterações nos princípios de gestão que a devedora se propõe adotar que marquem uma rutura com a atuação passada e que contribuíram para a situação de (verdadeira) insolvência, pelo que o plano apresentado não é merecedor de suficiente credibilidade. - Por outro lado, contrariando o disposto na alínea e) do n.º 2 do artigo 195.º do CIRE, o Plano não contempla “as formas de informação e consulta dos representantes dos trabalhadores, a posição dos trabalhadores na empresa e, se for caso disso, as consequências gerais relativamente ao emprego, designadamente despedimentos, redução temporária dos períodos normais de trabalho ou suspensão dos contratos de trabalho”. - Por último, o plano não demonstra o impacto expectável das alterações propostas, por comparação com a situação que se verificaria na ausência do plano, nos termos da Alínea f) do n.º 2 do artigo 195.º do CIRE. d) - o Banco 1... SA veio igualmente pedir a não homologação do plano alegando que existiu um PER anterior da mesma empresa que foi aprovado e que incluía já os créditos da segurança social. A empresa está em estado de insolvência, sem qualquer possibilidade de recuperação, sem liquidez e direito a crédito e ativos reais e, sendo liquidado o património na insolvência, os credores sairão mais beneficiados. * Foi apresentado, pelo Sr. AJP o resultado das votações nos seguintes termos: Considerando que o total dos créditos com direito de voto ascende a euros 1.945, 930,52, foram emitidos votos que representam 94,83% daquele valor. Recorda-se também que neste processo, não existem créditos de natureza subordinada. Nestes pressupostos, o resultado da votação foi o seguinte: Credores que votaram a favor: Nome do credor direito de voto AA 0,00 € C... lda 0,00 € D... s.a. 0,00 € E..., lda 0,00 € Instituto da segurança social, i.p. 0,00 € F... limited 1.059.630,64 € G... lda 0,00 € Total dos votos a favor 1.059.630,64 € B. Credores que votaram contra: Nome do credor direito de Voto Banco 1..., S.A. 415.141,67 € Banco 2... 52.304,28 € Banco 4..., S.A. 125.636,15 € B... - sociedade de garantia mútua, S.A. 75.009,58 € Banco 3..., S.A. 117.640,33 € Ministério Público, em representação da AT e IGFEJ 0,00 € Total dos votos contra 785.732,01 € C. Outras considerações sobre os votos emitidos: I. Os credores a seguir indicados não constam na lista de créditos Provisória, pelo que não possuem direito de voto (o seu valor de voto Ascende a euros 0,00): 1. AA 2. C... lda 3. D... s.a. 4. E..., lda 5. G... lda 6. Ministério público, em representação da at e igfej Ii. O plano de revitalização objecto de votação não afecta o crédito reconhecido ao “instituto da segurança social” pelo que, nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 212º do CIRE, este credor não tem direito de voto (o seu valor de voto ascende a euros 0,00). D. Resultado dos votos emitidos: I. Resultado da votação nos termos da alínea b) do nº 5 do artigo 17º-f do CIRE: Valor % Votos contra 785.732,01 € 42,58% Votos a favor 1.059.630,64 € 57,42% Total dos votos emitidos, excluindo as abstenções 1.845.362,65 € 100,00% Ii. Resultado da votação nos termos da alínea c) do nº 5 do artigo 17º-f do cire: Valor % Votos contra 785.732,01 € 40,38% Votos a favor 1.059.630,64 € 54,45% Votos não emitidos ou com valor zero 100.567,87 € 5,17% Total dos créditos com direito de voto, excluindo as abstenções 1.945.930,52 € 100,00% Abstenções Total dos créditos com direito de voto 1.945.930,52 € créditos sem direito de voto 543.641,46 € total dos créditos 2.489.571,98 € Após convite, o Sr. AJP emitiu parecer no sentido da homologação do plano. * Proferiu-se decisão que não homologou o plano apresentado pela devedora por violação de regras de conteúdo e atendendo a que a situação dos credores é mais favorável sem este plano. * Inconformada com a decisão, a devedora interpôs recurso finalizando com as seguintes Conclusões I-Vem o recurso interposto da Sentença, que extinguiu a instância, pois recusou a homologação do plano de revitalização apresentado pela A. e aprovado pelos credores (ref. n.º 464289348). II.Entende-se que a Sentença sob censura deve ser revogada e substituída por outro que aprove o plano. III.O Tribunal apresentou a seguinte decisão: (…) “Em suma, o tribunal entende que, não obstante a votação, há violação de regras de conteúdo e que a situação dos credores é mais favorável sem este plano, daí que, nos termos dos art.º 215.º, 216.º e 17. -Fº n.º 7 do CIRE não homologar o plano apresentado pela devedora. Registe, notifique e publicite nos termos do nº 11 do artigo 17.º-F do CIRE.” IV.Percebe-se que o Tribunal fundamentou a sua decisão de não homologação do plano nestes dois fatores: há violação de regras de conteúdo; a situação dos credores é mais favorável sem este plano. V.Por se discordar, vem a Recorrente expor as suas razões, refutando as do Tribunal. DA VIOLAÇÃO DA REGRAS DE CONTEÚDO: Vejamos VI.a. “Resulta dos documentos juntos que, não há muitos anos, a Requerente já beneficiou de um PER, que, se tivesse resultado, não estaria a requerer outro, sendo que as dívidas se mantêm ou agravaram”. VII.A Recorrente apresentou um PER a 19/12/2018 e cumpriu as suas obrigações, assumidas naquele PER. A empresa não aumentou a sua dívida e estas não se avolumaram. Outrossim, está com dificuldades em lidar com os créditos contraídos antes de 2018 e deparou-se ainda com dificuldades para cobrar os créditos pré-existentes, sendo que é também vítima dos problemas como inflação, dificuldade em contratar trabalhadores, etc. VIII.A lei prevê a possibilidade de apresentação de novo plano após 2 anos de anterior apresentação, pelo que nada de errado fez a Recorrente. Apresentar novo o plano, 6 anos após o primeiro, onde se tenta negociar condições mais vantajosas para a empresa, não revela qualquer violação das regras de conteúdo, pelo que deve improceder o argumento, o que se requer. IX.b. “Os credores que pretenderam iniciar este novo processo não estão sequer reconhecidos na lista provisória de credores”. X.Os credores que quiseram iniciar este novo processo não reclamaram créditos e, por isso, não constam da lista provisória de credores. Mas tal facto é alheio à Requerente, esta nada poderia fazer para que aqueles reclamassem os créditos. XI.Não é legalmente imposto que isso suceda, a falta de apresentação de reclamação de créditos nos Autos nada revela e a Requerente não pode ser penalizada por isso. XII. Consta da sentença recorrida: “(…) Note-se que o próprio Sr. AJP na votação não deu a esses alegados credores direito de voto, já que tais créditos não terão sido reclamados, o que, a nosso ver, indicia já algo de anormal.”, tal observação não passa de uma suposição premonitória e sem fundamento; XIII. Lê-se ainda o seguinte: “Todavia, nesta fase preliminar, em que não é possível a produção de prova, mas apenas juízos de prognose, com base nas regras da experiência e da normalidade e do bom senso jurídico, não se pode afirmar que esses credores não existam”. Para afastar suposições, entende a Recorrente que deve juntar 8 documentos para comprovar a existência dos créditos e dos credores que outorgaram as declarações. Pelo que se requer que seja admitida a sua junção. XIV. Este argumento deve improceder, não lhe podendo ser atribuído o efeito jurídico pretendido, pois a ausência de reclamação de créditos nada significa. XV. c. Um perdão de dívidas de 95% a todos os credores, incluindo laborais (privilegiados) beneficiando apenas os créditos ao Estado – ISS, IP, já salvaguardados extra processualmente, afigura-se-nos prejudicial aos mesmos, violando o princípio da igualdade. XVI.Este argumento também não pode colher, senão vejamos: o princípio da igualdade de credores é estabelecido pelo art. 194.º, do CIRE. Entende o Tribunal que a empresa viola o princípio da igualdade de credores, pois beneficia apenas os créditos ao Estado (ISS, IP). Acontece que os créditos ao Estado já se encontram salvaguardados pela própria lei, sendo que a empresa apenas respeitou a lei. XVII.Foi o AJP quem optou por não considerar o voto da ISS, IP, por entender que o plano não a afeta. Mas, o plano (a sua homologação ou não), afeta a ISS, IP. Pois a empresa encontra-se a pagar as dívidas à ISS, IP, desde 05/2019 e, caso o PER não seja aprovado e/ou a empresa deixe de laborar, por ser decretada insolvente, ainda que contra a sua vontade, deixará de cumprir as suas obrigações, ficando o Estado prejudicado. XVIII.Os créditos do Estado são considerados créditos indisponíveis, que não admitem perdões, pelo que, são tratados de outra forma. XIX.d. Os credores comuns e até os privilegiados ficam em melhor situação em caso de liquidação em insolvência do que com este Plano. XX.Tal argumento é uma falácia. Ora, se a empresa for declarada insolvente deixará de laborar e, após o despedimento dos funcionários, o seu ativo integrará a massa insolvente. Com a liquidação dos bens existentes, serão pagos os créditos existentes. XXI.Por ser uma empresa que elabora soluções informáticas, o ativo é reduzido e incapaz de fazer face as dívidas. Os bens que empresa produz não se veem, nem se vendem em leilão, nem se encontram armazenados, pois é ativo intelectual. XXII.Mas, caso a empresa se mantenha ativa e a laborar, esta pagará 5% do capital em dívida, que é sempre melhor do que iriam auferir os credores em insolvência. XXIII.O plano (não homologado) traz vantagens para todos os credores, se colocado em contraposição com o processo de insolvência. XXIV.e. O qual, como refere a credora Banco 2... não cumpre, minimamente, os requisitos legalmente exigidos pelo art.º 195.º do CIRE. XXV.Entende-se que o plano cumpre os requisitos impostos, não se compreendendo em que termos tal não sucede. O Tribunal não aponta as alíneas que, eventualmente, estão a ser incumpridas pela Recorrente, o que configura uma nulidade de fundamentação da sentença, que expressamente se levanta para os devidos efeitos legais. XXVI.f. “Não é viável aguardar por um crédito de uma ação nos TAF que, para além de incerto, demorará anos, o que é totalmente incompatível com os interesses dos credores e a manutenção da empresa, já sem liquidez e recurso a crédito.” XXVII. Este é o único crédito que a requerente prevê reaver, pelo que foi obrigada a inserir este ponto e esta possibilidade, que não prejudica os credores, pelo contrário. XXVIII. A Recorrente que conseguiu demonstrar o seu entendimento: não foram violadas as regras de conteúdo, pelo que, deve a sentença improceder, o que se requer. DA SITUAÇÃO DOS CREDORES SER MAIS FAVORÁVEL SEM ESTE PLANO, vejamos: XXIX.A Recorrente que conseguiu demonstrar o seu entendimento: não foram violadas as regras de conteúdo, pelo que, deve a sentença improceder, o que se requer. DA SITUAÇÃO DOS CREDORES SER MAIS FAVORÁVEL SEM ESTE PLANO, vejamos:Remetendo-se para a al. d) do Ponto A) da presente, entende-se que a situação dos credores não é mais favorável sem a aprovação do plano, isto porquanto a não homologação poderá conduzir a empresa a uma situação de insolvência. XXX. Caso o Tribunal opte por decretar a insolvência da empresa, com a qual expressamente se discorda, os credores ficarão em situação de desvantagem, pois não serão ressarcidos, nem sequer em 5%. XXXI. Na empresa, devido à sua atividade, não existirá ativo tradicional para liquidação, pelo que a massa insolvente pouco ou nada reunirá e os credores pouco ou nada receberão. Ao contrário do PER, que fará com que 5% do capital seja pago. DA APROVAÇÃO DO PLANO: XXXII. Apesar das críticas apresentadas pela banca e corroboradas pelo Tribunal, trata-se de um plano que foi aprovado, nos termos determinados pelo CIRE. XXXIII. O principal credor, por querer ser ressarcido, ainda que parcialmente, e por acreditar na recuperação da empresa, votou favoravelmente. XXXIV. Voto favorável foi ainda o apresentado pela ISS, IP, por trabalhadores, entre outros, ainda que nem todos reconhecidos pelo Sr. AJP. XXXV. Mesmo sem o reconhecimento de todos os votos favoráveis, o plano foi aprovado. Não nos poderemos olvidar destes votos favoráveis, ainda que não contabilizados, pois demonstram a vontade dos credores. É notório que os credores, no geral e maioritariamente, votaram favoravelmente, disserem que queriam que o plano fosse aprovado. XXXVI. A banca insurgiu-se! Aqui, apesar de os bancos não representarem a maioria dos créditos, a sua opinião acabou por toldar o processo e a opinião do Tribunal. XXXVII. Uma vez que o PER é uma negociação entre credores e devedor, com intuito de permitir a viabilidade da empresa em dificuldades, entende-se que tal deve ser tido em consideração, ao invés da opinião dos bancos. XXXVIII.Termos em que, a Apelante é do entendimento de que a sentença supra identificada deve improceder. * O credor “Banco 2...” apresentou resposta, sem conclusões. * II—Delimitação do Objecto do Recurso A questão principal decidenda, delimitada pelas conclusões do recurso, consiste em saber se o plano de revitalização apresentado pela devedora deve, ou não, ser homologado judicialmente. * III—FUNDAMENTAÇÃO A versão final do plano, sem alterações, foi apresentada em 8 de Agosto de 2024 e publicada no dia 12 e do qual consta, em suma: A - Dívida ao Instituto da Segurança Social: Para a regularização da dívida da Segurança Social no âmbito deste Plano, a empresa compromete-se a continuar a cumprir os planos prestacionais, que sem encontram a decorrer em execução fiscal e nos precisos termos em que foram autorizados. Assim, irá continuar a dar cumprimento ao pagamento das prestações mensais bem como das contribuições mensais. B - Créditos laborais: - pagamento de 5% do capital em dívida, através de uma única prestação, no prazo de 30 meses após trânsito em julgado da sentença homologatória do presente PER; - perdão de 95% do capital em dívida; - inexigibilidade de juros de mora vencidos e vincendos; C - Outros Credores: - pagamento de 5% do capital em dívida, através de uma única prestação, no prazo de 30 meses após trânsito em julgado da sentença homologatória do presente PER; - perdão de 95% do capital em dívida; - inexigibilidade de juros de mora vencidos e vincendos; D – Ação Pendente contra a CCDR-N: - Distribuição, na proporção dos respetivos créditos, de 20% da totalidade do valor recuperado na ação pendente contra a Comissão de Coordenação Regional do Norte (CCDR-N), que corre no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, sob o n.º de Processo 782676, no valor de € 265.360,00 (duzentos e sessenta e cinco mil, trezentos e sessenta euros); - A A... ficará obrigada a prestar informações aos credores sempre que solicitadas; - Fica, ainda, obrigada a, no prazo de 30 dias depois de qualquer decisão existente no mesmo processo, comunicar a mesma aos referidos credores. * IV-DIREITO O tribunal a quo decidiu recusar o plano de revitalização da devedora essencialmente pelos seguintes fundamentos: “(…) -Um perdão de dívidas de 95% a todos os credores, incluindo laborais (privilegiados) beneficiando apenas os créditos ao Estado – ISS, IP, já salvaguardados extra processualmente, afigura-se-nos prejudicial aos mesmos, violando o principio da igualdade. -Os credores comuns e até os privilegiados ficam em melhor situação em caso de liquidação em insolvência do que com este Plano. -O qual, como refere a credora Banco 2... não cumpre, minimamente, os requisitos legalmente exigidos pelo art.º 195º do CIRE. - Não é viável aguardar por um crédito de uma ação nos TAF que, para além de incerto, demorará anos, o que é totalmente incompatível com os interesses dos credores e a manutenção da empresa, já sem liquidez e recurso a crédito.” A alteração do CIRE, através da publicação da Lei n.º 16/2012 de 20.04, que instituiu o novo processo especial de revitalização na ordem jurídica interna, obedeceu a actos de execução, por parte do Governo, do Memorandum de entendimento celebrado com o BCE, UE e FMI, com o objectivo de se conseguir a “recuperação extrajudicial de devedores”.[1] Sobre a finalidade e natureza do presente processo, o artigo 17º-A, nº1 do CIRE prescreve que se destina a permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes um acordo conducente à sua revitalização. Este processo especial visa criar as condições necessárias para que se estabeleçam negociações com o propósito de conseguir um acordo.[2] E esse acordo tem como desiderato a revitalização do devedor, o qual se encontra em situação económica difícil ou de insolvência iminente mas com possibilidade de recuperação. É um processo de natureza urgente, célere, simples e híbrido[3] em que a intervenção judicial se cinge às seguintes fases processuais: ao início do processo[4], à decisão da impugnação da lista provisória de créditos[5] e à homologação ou não do acordo obtido, se for caso disso, ou à determinação dos efeitos derivados da falta desse mesmo acordo (cfr. artigos 17.º- F, nº 5 e artigo 17.º-G, nºs 1 a 3 do CIRE). Dispõe o n.º 7 do artigo 17.º-F do CIRE que o juiz decide se deve homologar o plano de recuperação ou recusar a sua homologação, nos 10 dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título ix, em especial o disposto nos artigos 194.º a 197.º, no n.º 1 do artigo 198.º e nos artigos 200.º a 202.º, 215.º e 216.º do CIRE. E compete-lhe ainda, além do mais, nos termos do citado normativo, alínea g), aferir “Se o plano de recuperação apresenta perspetivas razoáveis de evitar a insolvência da empresa ou de garantir a viabilidade da mesma.” Portanto, submetido o plano à apreciação do tribunal, o juiz averigua se observa as normas aplicáveis, devendo recusar, nos termos do art. 215.º do CIRE a homologação quando -ocorrer violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, -no prazo razoável que estabeleça, não se verifiquem as condições suspensivas do plano ou não sejam praticados os actos ou executadas as medidas que devam preceder a homologação. Da violação das regras não negligenciáveis As regras não negligenciáveis (por oposto às irrelevantes) são aquelas consideradas essenciais para a decisão, quer estejam em causa regras procedimentais quer de conteúdo do plano.[6] Normas procedimentais, como esclarecem Salazar Casanova e Sequeira Dinis[7] “são todas aquelas que regem a actuação a desenvolver no processo, que incluem os passos que nele devem ser dados até que os credores decidam sobre as propostas que lhes foram apresentadas…” As regras de conteúdo são “…todas as respeitantes à parte dispositiva do plano, mas, além delas, ainda aquelas que fixam os princípios a que ele deve obedecer imperativamente e as que definem os temas que a proposta deve contemplar.”[8] O tribunal concordou com a posição manifestada pela credora Recorrida e concluiu que a devedora não cumpriu as regras mínimas estabelecidas na lei. Sobre o conteúdo do plano, o art. 17.º-F, n.º 1 do CIRE dispõe: a) A identificação da empresa, indicando o seu nome ou firma, sede, número de identificação fiscal ou número de identificação de pessoa coletiva, e do administrador judicial provisório nomeado; b) A descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia da empresa no momento da apresentação da proposta do plano de recuperação, indicando, nomeadamente, o valor dos ativos, e fazendo uma descrição da situação económica da empresa; c)No caso previsto no n.º 4 do artigo 17.º-C, as partes afetadas pelo conteúdo do plano, designadas a título individual e repartidas por classes de créditos nos termos do artigo 47.º, e os respetivos créditos ou interesses abrangidos pelo plano de recuperação; d)As partes afetadas pelo conteúdo do plano, designadas a título individual e, se aplicável, repartidas pelas categorias em que tenham sido agrupadas para efeitos de aprovação do plano de recuperação nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 17.º-C, e os valores respetivos dos créditos e interesses de cada categoria abrangidos pelo plano de recuperação; e)As partes, designadas a título individual, repartidas, consoante o caso, por classes nos termos gerais ou por categorias nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 17.º-C, que não são afetadas pelo plano de recuperação, juntamente com uma descrição das razões pelas quais o plano proposto não as afeta; f)As condições do plano de reestruturação, incluindo, em especial, as medidas de reestruturação propostas e sua duração; g)As formas de informação e consulta dos representantes dos trabalhadores, a posição dos trabalhadores na empresa e, se for caso disso, as consequências gerais relativamente ao emprego, designadamente despedimentos, redução temporária dos períodos normais de trabalho ou suspensão dos contratos de trabalho; h)Os fluxos financeiros da empresa previstos, incluindo designadamente plano de investimentos, conta de exploração previsional e demonstração previsional de fluxos de caixa pelo período de ocorrência daqueles pagamentos, especificando, fundamentadamente, os principais pressupostos subjacentes a essas previsões e o balanço pró-forma, em que os elementos do ativo e do passivo, tal como resultantes da homologação do plano de recuperação, são inscritos pelos respetivos valores; i)Qualquer novo financiamento previsto no âmbito do plano de recuperação e as razões pelas quais esse novo financiamento é necessário para executar o plano; j) Uma exposição de motivos que contenha a descrição das causas e da extensão das dificuldades da empresa e que explique as razões pelas quais há uma perspetiva razoável de o plano de recuperação evitar a insolvência da empresa e garantir a sua viabilidade, incluindo as condições prévias necessárias para o êxito do plano. Este normativo, similar ao art. 195.º do CIRE visa, além do mais, “…garantir o cabal esclarecimento dos que são chamados a decidir o destino do processo, de forma a poderem ponderar suficientemente as vantagens que estimam resultarem da aprovação de um plano.”[9] (itálico nosso) Como bem observou a Recorrida, não existe um plano de negócios estruturado e principalmente não são descritas quais as alterações nos princípios de gestão que a devedora pretende implementar para reverter a situação económico-financeira difícil que se prolonga no tempo, pois já foi sujeita anteriormente a um PER. Não expôs a situação patrimonial e financeira nem apresentou uma análise económica comprovativa dos benefícios do plano (para além do perdão de 95% da maioria das dívidas) com o inerente juízo comparativo da sua situação sem a execução do plano. Por outras palavras, afigura-se-nos que não foi submetido ao tribunal para aprovação um plano credível de revitalização da devedora mas tão só um perdão de dívidas. Com efeito, apenas está previsto o pagamento, aos credores laborais e outros, de 5% do capital em dívida, através de uma única prestação, no prazo de 30 meses após trânsito em julgado da sentença homologatória do presente PER, um perdão de 95% do capital em dívida e a inexigibilidade de juros de mora vencidos e vincendos. A Recorrente limitou-se a alegar, no recurso, que “o plano cumpre os requisitos impostos, não se compreendendo em que termos tal não sucede.” Acompanhando a reflexão sobre a temática, exposta no Acórdão desta Relação, de 08/10/2024,[10]aplicável ao presente caso: “É óbvia a relevância das informações em questão. A viabilidade de uma empresa só é aferível se, além de se conhecer a sua actividade e a vontade dos seus gerentes ou administradores para continuarem a desenvolvê-la, bem como a existência de mercado para o respectivo resultado, se conhecerem também a sua situação patrimonial, financeira e reditícia, o que inclui saber os seus activos (designadamente stocks de matéria prima e de produto acabado, sendo caso disso), equipamentos e sua condição, a disponibilidade de meios financeiros ou o acesso a financiamento que seja necessário à continuação da actividade. Por isso se justifica o disposto na al. b) do nº 1 do art. 17º-F. E bem se compreende ser também imprescindível que o plano disponibilize a informação especificada na al. h) do mesmo preceito, referente à previsão do comportamento económico da empresa, no prosseguimento da sua actividade e em cumprimento do plano: “… os fluxos financeiros da empresa previstos, incluindo designadamente plano de investimentos, conta de exploração previsional e demonstração previsional de fluxos de caixa pelo período de ocorrência daqueles pagamentos, especificando, fundamentadamente, os principais pressupostos subjacentes a essas previsões e o balanço pró-forma, em que os elementos do ativo e do passivo, tal como resultantes da homologação do plano de recuperação, são inscritos pelos respetivos valores”. Em suma, o plano não fornece minimamente aos credores informação relevante sobre a viabilidade económica da empresa, integrando a omissão de cumprimento do disposto nas alíneas b), f), g), h) e i) do n.º 1 do art. 17.º-F do CIRE. Neste ponto é suprida a invocada nulidade da decisão, invocada pelo Recorrente, que configura uma mera irregularidade. Carecendo o plano de uma análise económico-financeira, sustentada documentalmente, susceptível de indiciar uma provável recuperação da empresa, não se justifica o perdão de 95% dos créditos, a inexigibilidade dos juros e o pagamento de 5% do capital em dívida, através de uma única prestação, no prazo de 30 meses a contar do trânsito. Numa palavra, a devedora não apresentou um plano do qual resultem perspetivas razoáveis de evitar a insolvência da empresa ou de garantir a viabilidade da mesma, como a lei exige.
Nestes termos, concorda-se com a posição do tribunal de recusa deste plano desde logo por violação das mencionadas regras essenciais de conteúdo previstas na lei, ficando prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos. Subscrevendo as palavras consignadas no referido aresto deste Tribunal e secção “A implementação de um plano assim apresentado é uma aposta no desconhecido, uma manifestação de fé sem qualquer alicerce, que o tribunal deve prevenir.” Confirma-se, pelas razões aduzidas, a decisão. * V-DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso e em consequência, confirmam a decisão. Custas pela Recorrente. Notifique. |