Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | RAQUEL CORREIA DE LIMA | ||
Descritores: | SENTENÇA ERRO MATERIAL DE ESCRITA CORREÇÃO PRAZO DE RECURSO | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RP202507101545/24.2T8VLG-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 07/10/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
Indicações Eventuais: | 2. ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - Após a prolacção da sentença, se for pedida a rectificação de um erro formal nos termos do artigo 614º nº 1 do Código de Processo Civil (o que apenas acontece quando o mesmo é manifesto, facilmente detectável pelo contexto da decisão onde se insere ) tal pedido não tem qualquer interferência no prazo de recurso da sentença, se ainda estiver em curso. II - Daqui decorre que se for junto aos autos requerimento comprovativo do pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, não haverá interrupção do prazo do recurso nos termos do disposto no artigo 24º nº 4 da lei 34/2004 de 29 de Julho, se, iniciando-se a contagem após a prolação da sentença (e não após o despacho que rectificou o erro formal) o mesmo já tiver decorrido. (Sumário da responsabilidade da Relatora) | ||
Reclamações: | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo Local Cível de Valongo - Juiz 2 Processo 1545/24.2T8VLG-A.P1 ACÓRDÃO I. RELATÓRIO
AA e outros, intentaram acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum, contra BB, NIF ...93, residente na Travessa ..., ... e CC, NIF ...93, residente na Praceta ..., ..., pedindo fosse decretada a resolução do contrato de arrendamento tendo por objeto o prédio urbano sito Travessa ..., ..., Valongo, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º ...70 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Valongo sob o n.º ...86.; a condenação do 1.º Réu a despejar e entregar, imediatamente, aos AA, o prédio urbano identificado, absolutamente livre e desimpedido de pessoas e coisas; a condenação de ambos os Réus a pagar as rendas vencidas desde o mês de janeiro de 2024 até à presente data, que se computam no montante de € 1.550,00, acrescidas do montante de € 14,57 de juros vencidos e os vincendos, bem como as rendas que se vencerem até à data do trânsito em julgado da sentença que decrete o despejo e ainda, em caso de mora na restituição do locado, uma indemnização igual ao dobro da renda, pelo período que decorrer desde a data de trânsito em julgado da sentença até efetivo despejo – cfr. art.º 1045.º n.º 2 do C.C. * Valongo, d.s.” O Réu BB foi notificado a 03.12.2024. O Réu CC foi notificado a 03.12.2024. O Réu CC veio a 12.12.2024 apresentar o seguinte requerimento: O Réu BB veio a 12.12.2024 apresentar o seguinte requerimento: A 24.01.2024 foi certificado: DD, Escrivão Auxiliar, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Local Cível de Valongo - Juiz 2: CERTIFICO que por este Tribunal, correm uns autos de Ação de Processo Comum, registados sob o n.º 1545/24.2T8VLG, em que são: Autor: AA Réu: BB e atesto nos termos do n.º 1, do art.º 387 do Código Civil, que as cópias que se seguem, em formato digital, são cópias fiéis dos originais destes autos. MAIS CERTIFICO NARRATIVAMENTE QUE · A sentença proferida transitou em julgado em 16/12/2024; · Os pedidos de apoio judiciário formulado pelos réus em 12/12/2024 ainda não têm decisão junta aos autos; · Os réus não constituíram mandatário. É quanto me cumpre certificar em face dos autos e a que me reporto em caso de dúvida. Valongo, 24-01-2025. O Escrivão Auxiliar, DD A 12.02.2025 foi junto ao processo o ofício da Segurança Social, dando conta que foi nomeado ao Réu CC um patrono no âmbito do pedido de apoio judiciário. Na mesma data, a 12.02.2025, o Réu BB dá entrada do seguinte requerimento: Em face deste requerimento a Sr. Juiz solicitou explicações à Secção quanto à data de trânsito em julgado aposta na certidão de ref.ª 468074271. A Secção informa que o trânsito em julgado aposto na certidão com a referência 468074271 se reporta ao despacho de 02/12/2024 que retifica lapso de escrita verificado no dispositivo da sentença da sentença proferida em 22/10/2024 e notificada em 23/10/2024. Nesta sequência, a 19.12.2025, é proferido o seguinte despacho: “Requerimento 12-02-2025 (ref.ª41574532): “Através do requerimento à margem epigrafado veio o réu BB requerer, para além do mais que, o Tribunal declarasse que o prazo de interposição de recurso foi oportuna e tempestivamente interrompido, e que se mantém, pelo que a sentença dos autos não transitou ainda em julgado, com todas as inerentes e legais consequências, designadamente a comunicação de tal circunstância aos autos de execução de sentença pendentes. Para tanto, alega que, no dia 10 de dezembro de 2024, juntou aos autos comprovativo do pedido de apoio judiciário, nas modalidades de pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo, bem como a nomeação e pagamento de honorários a patrono oficioso, o que determinou a interrupção do prazo processual em curso, no seu entender, o de interposição de recurso da sentença proferida – prazo esse, cujo início da sua contagem apenas se verificou com a notificação do despacho que deferiu a retificação do erro material na sentença proferida, i.e., a 03-12-2024, defende. Vejamos se assim é. A 22-10-2024 foi proferida sentença nos presentes autos, nos termos da qual foi decretada a resolução do contrato de arrendamento urbano para fins habitacionais a que alude o ponto 1 dos factos provados e ordenada a desocupação do imóvel, devendo o 1º réu (BB) restituí-lo livre de pessoas e bens. Mais foram os réus, BB e CC solidariamente condenados no pagamento das rendas vencidas desde dezembro de 2022 até à interposição da ação, no valor global de € 1.550,00 (mil, quinhentos e cinquenta euros), acrescidas de juros de mora à taxa supletiva legal até efetivo pagamento; bem como no pagamento das rendas entretanto vencidas e vincendas até ao trânsito em julgado da sentença e no pagamento de indemnização em quantia igual às rendas desde o trânsito até à efetiva entrega do locado. Até ao momento, os réus não constituíram mandatário na lide. A sentença proferida foi notificada aos réus a 23-10-2024, mediante carta registada dirigida para a sua residência (cfr. ref.ª 464881550 e 464881551). Posteriormente, e na sequência de requerimento apresentado pelo réu BB para o efeito, foi proferido despacho, a 02-12-2024, que, deferindo ao requerido, procedeu à correção do lapso de escrita constante no dispositivo da sentença, passando a ter a seguinte redação: “Decisão: Em face do exposto, decide-se julgar a ação totalmente procedente por provada e, consequentemente: I. Decretar a resolução do contrato de arrendamento urbano para fins habitacionais a que se alude no ponto 1 dos factos provados; II. Ordenar a desocupação do imóvel, devendo o primeiro réu restituí-lo livre de pessoas e bens, imediatamente após o trânsito em julgado da sentença; III. Condenar os réus, solidariamente, no pagamento das rendas vencidas desde dezembro de 2023 até à interposição da ação, no valor global de € 1.550,00 (mil, quinhentos e cinquenta euros), acrescidas de juros de mora à taxa supletiva legal até efetivo pagamento; bem como no pagamento das rendas entretanto vencidas e vincendas até ao trânsito em julgado da sentença e no pagamento de indemnização em quantia igual às rendas desde o trânsito até à efetiva entrega do locado.» Tal despacho foi igualmente notificado aos réus por missiva postal registada a 03-12-2024 (cfr. ref.º 466370045 e 466370046). Ora, estatui o artigo 249.º do Código de Processo Civil sob a epígrafe “Notificações às partes que não constituam mandatário” que: «1 - Se a parte não tiver constituído mandatário, as notificações são efectuadas nos termos previstos no n.º 5 do artigo 219.º, quando aplicável, ou por carta registada, dirigida para a sua residência ou sede ou para o domicílio escolhido para o efeito de as receber, presumindo-se, nestes casos, feita no terceiro dia posterior ao do registo da carta ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja. 2 - A notificação efectuada por carta registada não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para a residência ou a sede da parte ou para o domicílio escolhido para o efeito de a receber; nesse caso, ou no de a carta não ter sido entregue por ausência do destinatário, juntar-se-á ao processo o sobrescrito, presumindo-se a notificação feita no dia a que se refere a parte final do número anterior. 3 - Exceptua-se o réu que se haja constituído em situação de revelia absoluta, que apenas passa a ser notificado após ter praticado qualquer ato de intervenção no processo, sem prejuízo do disposto no n.º 5. 4 - Na hipótese prevista na primeira parte do número anterior, as decisões têm-se por notificadas no dia seguinte àquele em que os autos tiverem dado entrada na secretaria ou em que ocorrer o facto determinante da notificação oficiosa. 5 - As decisões finais são sempre notificadas desde que a residência ou sede da parte seja conhecida no processo. 6- Sem prejuízo do disposto nos nºs 3 e 4, a notificação considera-se ainda efectuada, em qualquer circunstância, quando o notificando proceda à consulta electrónica do processo, nos termos previstos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º.» O nº 3 do citado preceito sanciona, digamos assim, o desinteresse manifestado pela parte no acompanhamento do processo. Como refere Lebre de Freitas “se tiver sido citado pessoalmente, o desinteresse por ele manifestado ao não contestar nem constituir mandatário, nem de outra forma intervir no processo, dispensa a prática de actos ulteriores presumivelmente inúteis, pelo que só quando posteriormente venha a intervir no processo, fazendo cessar a situação de revelia absoluta, é que passam a ser feitas notificações nos termos gerais”. – in Código de Processo Civil anotado, Volume 1.º, pag. 448 Assim, se o réu estiver em situação de revelia absoluta (não contestou, não constituiu mandatário nem interveio de qualquer modo no processo) opera a ficção imposta no n.º4, sem prejuízo de a decisão final dever ser sempre notificada, desde que a residência ou sede da parte seja conhecida (n.º5). Revertendo ao caso dos autos, sendo conhecida a morada dos réus – porquanto pessoalmente citados – a secretaria promoveu a notificação da decisão final através de carta registada para tal morada, nos termos do n.º5 do citado preceito, notificação essa que se presume efetuada ao terceiro dia posterior ao do registo da carta ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja. Assim, tendo sido registada no dia 23-10-2024, os réus presumem-se notificados da sentença proferida no dia 28-10-2024. O prazo para a interposição de recurso é de 30 dias (art. 638º, n.º1 do Código de Processo Civil) e conta-se a partir da notificação da decisão. A tal prazo acrescem 10 (dez) dias quando for impugnada a decisão em matéria de facto e houver apelo a reapreciação de prova gravada (cfr. art. 638º, n.º7 do C.P.C) – prazo não concretamente aplicável, porquanto na presente lide não houve a produção de prova gravada. Aduz o réu que o prazo de interposição de recurso da decisão proferida nos presentes autos apenas se iniciou com a notificação do despacho que procedeu à retificação do lapso de escrita. A este propósito o Tribunal Constitucional no acórdão n.º 413/2015, no Processo n.º 1074/2014, publicado na segunda série do Diário da república nº 227/2015, de 19 de novembro de 2015, decidiu não julgar inconstitucional a norma, decorrente dos arts. 613º, 614º e 638º do Código de Processo Civil, segundo a qual o prazo de interposição de recurso de apelação pelo réu não se interrompe ou suspende por força do pedido de retificação de erro de cálculo constante da sentença recorrida formulado por um dos autores, contando-se a partir da data da notificação de tal decisão judicial, e não a partir da data da proferição do despacho que, posteriormente, se pronuncie sobre a pretendida retificação. Na mesma linha, sumariou-se no aresto do Tribunal da Relação do Porto de 19-12-2023, proc. n.º 22046/20.2T8PRT.P1, que «VI - Atualmente a decisão de retificação da sentença não tem qualquer influência no prazo de interposição de recurso contra a decisão retificada, devendo o recurso ser interposto no prazo de trinta ou quarenta dias consoante o seu objeto e a contar da notificação da decisão cuja retificação foi requerida e independentemente da retificação que venha a ser decidida.» Não há motivos para divergir do entendimento assim exposto. Nesta medida, tendo-se iniciado o prazo de interposição de recurso da sentença no dia 29 de outubro de 2024 (inclusive), o mesmo findou no dia 27 de novembro de 2024, sem prejuízo do ato ainda poder ser praticado nos três dias úteis subsequentes (dias 28, 29 de novembro e 02 de dezembro de 2024), mediante o pagamento de uma multa, nos termos do artigo 139.º, n.º 5, do CPC. Assim, o requerimento apresentado pelo réu BB aos autos a 10-12-2024, juntando o comprovativo do pedido de proteção jurídica nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e compensação de patrono não tem a virtualidade de interromper o prazo de recurso, nos termos do art. 24º, n.º4 da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, porquanto o mesmo já havia findado a 27 de novembro de 2024, data do trânsito em julgado da sentença proferida nos presentes autos. Pelo que, de harmonia com o acabado de expor, indefere-se na totalidade o requerido pelo réu BB no requerimento à margem identificado. Custas do incidente pelo réu BB, fixando-se a taxa de justiça pelo mínimo legal (artigo 7º do RCP e 527º do CPC). Notifique.” NB. Bold da nossa autoria A 31.03.2025 é junto um ofício da Segurança Social dando conta que o pedido de apoio judiciário requerido por BB foi indeferido, uma vez que não foi requerido até ao termo do prazo de recurso da decisão de primeira instância, ou seja, não se verificou a tempestividade do pedido. RECURSO Não se conformando com a decisão proferida a 19.12.2025 veio o Réu CC recorrer. Após alegações, termina com as seguintes CONCLUSÕES: A. A 3.12.2024 foi proferido despacho que veio a retificar a sentença 22.10.2024 B. Erro retificado de relevância quanto à data de início de divida de rendas, i.e., retificando de “dezembro de 2022” para “dezembro de 2023”. C. Erro que se mantendo teria relevante impacto em sede de ação executiva, nomeadamente pela contagem de montante de capital em divida e respetivo juro moratório. D. A 10.12.2024 o aqui recorrente e o co-réu apresentaram nos autos requerimento de pedido de nomeação de patrono e demais encargos processuais. E. Ao recorrente viria a ser deferido a 11.2.2025 F. Requerimento de co-réu que viria a ser indeferido a 11.03.2025. G. Haveria assim suspensão de prazos processuais em curso até a ser proferido despacho sobre o requerimento de proteção jurídica do co-réu BB. H. Suspensão que afetaria a contagem de prazo de recurso após ser proferido despacho de retificação de sentença. I. Abrangeria ainda a suspensão de emissão de certidão de sentença, que viria a ser emitida a 24.1.2025 J. Aliás na qual se adverte que naquela data pende a decisão de apoio judiciário. K. Aguardando o processo sobre posição de eventuais patronos nomeados. L. Pelo que s.m.o uma vez apresentados aos autos pedido de apoio judiciário na sequência de despacho de retificação de 3.12.2024 deveria a MM juiz a quo aguardar pela nomeação, especialmente pela que ocorresse em último lugar. M. E só após nomeação de patrono/indeferimento de nomeação é que decorrido o prazo de recorribilidade de sentença, contada de despacho de retificação, se poderia seguramente proceder à emissão de certidão de sentença – título executivo. N. Diverso é o entendimento de despacho aqui recorrido, não atendendo aos efeitos suspensivos de apresentação de pedido de apoio judiciário e interruptivos na circunstância de nomeação de patrono. O. Despacho recorrido que não foi notificado ao patrono do recorrente apesar de nomeado a 11.02.2025. P. Despacho proferindo decisão, confirmando a plena consolidação e segurança de sentença i.e. título executivo, afirmando o trânsito em julgado de 2.12.2024. Q. Trânsito afirmado, diversamente do que consta em certidão de sentença, que é a data de 16.12.2024. R. Pelo que, s.m.o. deve o título executivo imitido - certidão de sentença, ser revogado. S. Acrescendo a determinação da possibilidade de recurso de sentença. Nestes termos e fundamentos se requer a V. Exas. que: Concluam pela revogação de despacho de 19.02.2025 e em consequência seja revogada a certidão de sentença emitida com a devida comunicação ao processo executivo pendente, tudo sem prejudicar a determinação da recorribilidade de sentença de presente ação declarativa no prazo legal ** Não houve contra-alegações. ** Colhidos os vistos, cumpre decidir. II. A DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil No caso vertente, em face das conclusões do recurso, as questões a decidir são: A. FACTOS
Os constantes do relatório supra.
B. O DIREITO
III. DECISÃO |