Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP00036828 | ||
| Relator: | CAIMOTO JÁCOME | ||
| Descritores: | EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA DECISÃO ARBITRAL CASO JULGADO ACTUALIZAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RP200403030450728 | ||
| Data do Acordão: | 03/03/2004 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | AGRAVO. | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - A decisão dos árbitros em processo de expropriação por utilidade pública, não havendo recurso, faz caso julgado no que respeita ao montante da indemnização devida aos expropriados, com referência à data da declaração de utilidade pública. II - A força do caso julgado assim formado, não se estende à imposição legal de actualização de tal indemnização à data da decisão final - nos termos do artigo 24 n.1 do Código das Expropriações de 1999. III - Tal actualização não viola, pois, o caso julgado arbitral. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1- RELATÓRIO Neste processo de expropriação em que é expropriante o ICOR-Instituto para a Construção Rodoviária (actualmente I.E.P. - Instituto de Estradas de Portugal), e expropriados X............ e Outros, com os sinais dos autos, estes não recorreram da decisão arbitral de fls. 5-11, na qual se fixou o montante indemnizatório em Esc. 53.000$00, relativo à expropriação por utilidade pública urgente da parcela nº .. (Nó de ............-Ligação ao IC..), tendo a respectiva declaração de utilidade pública (DUP) urgente sido efectuada por despacho do Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, publicado no DR. n.º 197, II série, de 24/08/1999. * A decisão arbitral transitou em julgado em 4 de Outubro de 2002, uma vez que não houve recurso da mesma.* Por despacho de fls. 116, foi adjudicada, ao expropriante, a propriedade da aludida parcela nº .., com a área de 35 m2, a destacar de um prédio rústico dos expropriados, situado na freguesia de ............, concelho de ............., inscrito na matriz sob o artº 1968.A fls. 137 vieram os expropriados requerer a actualização do montante da indemnização. Ouvido o Ministério Público, este entendeu que deve ser indeferida pretensão dos expropriados. Por despacho de 148-150, o julgador a quo, concluindo assistir razão aos expropriados no sentido de o montante fixado na decisão arbitral dever ser actualizado desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até 4 de Outubro de 2002, determinou a notificação da “entidade expropriante I.E.P. - Instituto de Estradas de Portugal nos termos e para os efeitos dispostos pelo art. 71°, n.º 1, do Código das Expropriações, após o que poderão os expropriados vir impugnar o montante que venha a ser depositado, nos termos dispostos pelo n.º 2, do art. 72° do referido Código”. ** Inconformado, o IEP, representado pelo Ministério Público, agravou deste despacho, tendo, nas respectivas alegações, concluído: 1 - A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação nos termos dos artigos 668.° e 669.° do CPC. 2 - Em processo de expropriação o prazo de interposição do recurso da decisão arbitral é actualmente de 20 dias a contar da notificação do despacho de adjudicação da propriedade à entidade expropriante. 3 - Quando não haja recurso o juiz profere despacho a atribuir aos interessados a indemnização fixada na decisão arbitral. 4 - A decisão arbitral tem a natureza de decisão judicial e se dela não for interposto recurso torna-se definitiva por haver transitado em julgado, formando-se relativamente à indemnização por ela fixada caso julgado material. 5 - Por isso, não tendo sido interposto recurso da decisão arbitral cessa o poder jurisdicional do juiz que não pode conhecer do pedido deduzido pelos expropriados de actualização da indemnização. 6 - A douta decisão de fls. 148 a 150 ao ordenar a actualização da indemnização fixada pelos árbitros apreciou de novo a questão da indemnização que se havia tornado definitiva por trânsito em julgado da referida decisão e não respeitou o caso julgado material. 7 - Deste modo, violou o disposto nos arts. 38.°, n.º 1, 52.° e 58.° do actual Código das Expropriações. e os arts. 671.°, n.º 1, 673.° e 677.°, estes do CPC. 8 - Nestes termos, deverá revogar-se a decisão recorrida fixando o valor da indemnização devida pela expropriação no montante constante do acórdão arbitral. Não houve resposta às alegações. ** O julgador a quo sustentou o seu despacho. ** Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. 2- FUNDAMENTAÇÃO 2.1- OS FACTOS E O DIREITO APLICÁVEL ÁS QUESTÕES SUSCITADAS NO RECURSO O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1, do CPC). * Os factos a considerar são os que se deixaram descritos no relatório.Na perspectiva do agravante a decisão recorrida viola o caso julgado, pois que o julgador apreciou de novo a questão da indemnização que se havia tornado definitiva por trânsito em julgado da decisão arbitral. Vejamos. É maioritariamente entendido que a decisão arbitral tem a natureza de uma decisão judicial. No artº 671º, do CPC, estabelece-se o valor da sentença transitada em julgado. O artº 673º, do CPC, reportando-se ao alcance do caso julgado diz: "A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga...". Segundo a doutrina, os limites objectivos do caso julgado confinam-se à parte injuntiva da decisão, não constituindo caso julgado os fundamentos da mesma (Castro Mendes, Dir. Proc. Civil, 1980, III, pág. 282, e Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, 1968, pág. 152, Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio Nora, Manual Proc. Civil, 1985, pág. 714, Anselmo de Castro, Dir. Proc. Declaratório, 1982, III, pág. 404, e Manuel Andrade, Noções Elementares de Proc. Civil, 1976, pág. 334 e 335). Os limites objectivos do caso julgado abrangem o objecto do processo, ou seja, todas as questões que o juiz deve resolver, mesmo que suscitadas pelo réu em sua defesa desde que interessem ao conhecimento e decisão do litígio. A excepção de caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior. Pretende-se evitar não uma colisão teórica de decisão, mas a contradição de julgados, a contradição de decisões concretamente incompatíveis. O artº 23º, nº 1, do Código das Expropriações (CE/91) aprovado pelo Dec.-Lei n.º 438/91, de 9 de Novembro, em vigor à data da declaração de utilidade pública (no mesmo sentido dispõe o artº 24º, n.º 1, do actual Código das Expropriações (CE/99), aprovado pelo Dec.-Lei nº 168/99, de 8 de Setembro), estatui que o montante da indemnização se calcula com referência à data da declaração de utilidade pública, sendo actualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação. No acórdão arbitral de fls. 5-11, os árbitros expressamente referem que o valor da indemnização se reporta à data da declaração de utilidade pública (DUP), cumprindo, por isso, o que a lei lhes exige para o cálculo da justa indemnização. Não têm os árbitros que se pronunciar sobre a actualização do montante da indemnização. A nosso ver, o facto de nada dizerem sobre a actualização não significa que os expropriados, não recorrendo do acórdão arbitral, deixem de poder ver actualizado aquele montante. O recurso da decisão dos árbitros visa a modificação do montante da indemnização fixado por aqueles e não a actualização desse montante, pois que esta decorre da lei (CE). Quer dizer, o que transita em julgado é apenas o decidido pelos árbitros relativamente ao montante da indemnização calculado com referência à data da DUP. O montante fixado na decisão arbitral terá necessariamente que ser actualizado desde a data da declaração de utilidade pública até ao referido dia 4 de Outubro de 2002, pois que assim o impõem os princípios da justa indemnização e da igualdade (justiça e proporcionalidade) consagrados nos arts. 13º, nº 1, 18º, 62º, nº 2, e 266º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa e o exige a lei ordinária (arts. 23º do CE/ e 24º do CE/99). Ao contrário do concluído pelo recorrente, a decisão posta em crise, ao ordenar a actualização da indemnização fixada pelos árbitros, não apreciou de novo a questão do montante da indemnização. O que se havia tornado definitivo, por trânsito em julgado do referido acórdão arbitral, foi o valor da indemnização calculado por referência à data da DUP. Em suma, entendemos não ocorrer violação do caso julgado, com o alcance descrito, ou seja, inexiste contradição de julgados, a contradição de decisões concretamente incompatíveis. Não merece, a nosso ver, censura a decisão da 1ª instância. Improcedem, deste modo, as conclusões do recurso. 3- DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em negar provimento ao agravo, confirmando-se a decisão recorrida. Sem custas, dada a isenção de que beneficia a entidade expropriante (artº 2º, nº 1, al. a), do CCJ). Porto, 3 de Março de 2004 Manuel José Caimoto Jácome Carlos Alberto Macedo Domingues José António Sousa Lameira |