Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
23136/22.2T8LSB.L1-2
Relator: HIGINA CASTELO
Descritores: SEGURO DE VIDA
SEGURO DE GRUPO
CADUCIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/08/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I. No seguro de vida acessório de um mútuo e celebrado por adesão a um “seguro de grupo” celebrado entre seguradora e entidade bancária, encontramos com frequência (assim era no caso dos autos) várias camadas contratuais distintas, a saber:
a) Condições gerais com título “seguro vida grupo” ou afim, constituídas por um conjunto de cláusulas contratuais gerais emitidas pela seguradora, destinadas a regular futuros contratos-quadro de seguro de grupo do ramo vida, a celebrar com futuros tomadores (entidades mutuantes, maioritariamente, bancos), para coberturas de morte e invalidez de pessoas ligadas aos tomadores por vínculo diferente do de segurar, tipicamente por contrato de mútuo; as ditas condições subsumem-se ao conceito de cláusulas contratuais gerais, elaboradas sem prévia negociação individual, que destinatários indeterminados se limitem aceitar; não são um contrato, mas um conjunto de cláusulas destinadas a regular futuros contratos.
b) Condições particulares da apólice “x”, com o título “seguro de grupo do ramo vida” ou parecido, que dão corpo a um contrato entre uma seguradora e uma instituição de crédito (ali tomadora), prevendo-se a adesão como pessoas seguras dos clientes da tomadora que recorram ao crédito à habitação e que satisfaçam certas condições; constituem contratos-quadros nos quais a seguradora e a tomadora estabelecem as cláusulas a que se subordinarão os futuros contratos de seguro formados por adesão dos participantes (nos quais a tomadora do contrato-quadro, contraparte da seguradora nesse contrato, será beneficiária); nos termos das condições particulares desta apólice, o pagamento dos prémios é da responsabilidade das pessoas seguras, tratando-se, portanto, de um seguro de grupo contributivo; este contrato-quadro não é um contrato de seguro em sentido estrito, mas um contrato preliminar, independente daqueles cuja celebração irá possibilitar; só com a adesão dos participantes nasce a situação de cobertura e a possibilidade do evento aleatório.
c) Adesão da pessoa segura, através da subscrição de um boletim de adesão, que incorpora a declaração negocial da pessoa segura e que, após aceitação da seguradora, será parte essencial do contrato de seguro por adesão ao clausulado previamente elaborado pela contraparte seguradora (e também por terceiro, contraparte da seguradora no prévio contrato-quadro); num seguro coletivo contributivo deste género, os participantes não são meros terceiros, mas sim partes, tomadores no seu próprio contrato individual de seguro.
d) O certificado de adesão ou certificado de seguro constitui prova da aceitação da inclusão no seguro de grupo, da renovação do seguro ou da alteração de valores do capital seguro ou do prémio, sendo emitido por cada segurado e sempre que se verifica a renovação do seguro e/ou alteração do valor do capital seguro ou do prémio.
II. As condições particulares da apólice de seguro de grupo, em que são partes a seguradora e a entidade bancária, são condições gerais (cláusulas contratuais gerais) do contrato de seguro entre a seguradora e o aderente.
III. Constando das condições particulares da apólice de seguro de grupo que a cobertura morte cessa no final do ano em que a pessoa segura completa 70 anos de idade, e tendo sido dada à pessoa segura dos autos, aquando da subscrição do boletim de adesão, informação escrita com as cláusulas a que aderiu, incluindo esta, a cobertura morte caducou no final da anuidade no curso da qual a pessoa segura perfez 70 anos.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório
Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial S.A., ré na ação declarativa de condenação, com processo comum, que lhe é movida por “A”, “B” e “C”, notificada da sentença condenatória, proferida em 17/11/2024, e com ela não se conformando, interpôs o presente recurso.

Os três autores instauraram a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra a seguradora ré e a Caixa Geral de Depósitos S.A., pedindo que: seja liquidado o valor em dívida à data da morte de “D”, referente ao mútuo com hipoteca contraído com a Caixa Geral de Depósitos, para compra e venda de um imóvel; a ré seguradora seja condenada a pagar o capital seguro a favor da tomadora do seguro, CGD, e, a haver algum valor remanescente, a pagá-lo aos herdeiros do falecido, acrescido dos juros de mora até à conclusão do processo; e, a ré CGD seja condenada a reembolsar os autores, na qualidade de herdeiros, do valor correspondente às mensalidades indevidamente pagas, desde a data do óbito e até ressarcimento pela ré seguradora.
Para o efeito, alegam, em síntese, que “D” contratou com a Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial, S.A. um “Seguro de Vida Grupo Crédito à Habitação Clientes CGD”, apólice n.º 5.001.500, que garantia do pagamento do capital mutuado pela Caixa Geral de Depósitos, S.A., em caso de morte ou invalidez total e permanente por doença ou acidente. Mais alegam que “D” faleceu e a ré recusou o pagamento do capital seguro, pelo que os autores continuaram, até à presente data, a pagar as prestações no âmbito do mútuo bancário.
Regularmente citada, a ré Fidelidade apresentou contestação, argumentando que a cobertura de morte do contrato de seguro de vida de grupo invocado nos autos cessa para cada aderente no final do ano em que a pessoa segura completa 70 anos de idade e que “D” faleceu já depois de cessar a garantia morte a que se reportava a apólice n.º 5.001.500. Mais alega que, à data da subscrição do seguro, foram fornecidas ao cliente, entretanto falecido, todas as informações pré-contratuais, explicado o âmbito e objetivo do preenchimento do questionário clínico, bem assim das cláusulas contratuais do referido seguro pelo colaborador da Caixa Geral de Depósitos que o atendeu, não tendo tido a ré Fidelidade qualquer contacto com a pessoa a segurar, não sendo estes seguros de vida associados ao crédito sequer vendidos fora dos balcões da Caixa Geral de Depósitos, pois esta é a tomadora do seguro e sua beneficiária.
Igualmente citada, a ré Caixa Geral de Depósitos impugnou, expressamente ou por não ter obrigação de conhecer, parte dos factos; no mais disse que, no momento da subscrição do seguro de vida associado ao empréstimo em causa nos autos, explicou a ambos os mutuários as condições gerais a que o mesmo se mostrava sujeito, como era seu dever; já as condições particulares, que estão dependentes de exames médicos e dos quais podem resultar exclusões e agravamentos dos prémios, seriam transmitidas pela seguradora (7.º a 9.º da contestação); desconhece porque é que a seguradora liquidou um dos seguros (apólice 1105001203) e não o outro (apólice 5.001.500); nada tem a reembolsar aos autores, porque não reteve nem recebeu qualquer quantia que não lhe fosse devida. Termina pedindo que a ação seja julgada improcedente no que à CGD diz respeito.
O processo seguiu os regulares termos e, após audiência final, foi proferida sentença que julgou a ação totalmente procedente e, em consequência:
1. Condenou a ré Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial, S.A. a pagar à Caixa Geral de Depósitos, S.A. o valor em dívida à data do óbito de “D”, no âmbito do contrato de mútuo celebrado entre este e a CGD, ao qual se encontra associado o contrato de seguro de vida grupo em causa nestes autos (apólice 5.001.500).
2. Condenou a ré Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial, S.A. a pagar aos autores “A”, “B” e “C” o remanescente do capital seguro, caso exista, acrescido dos juros de mora, calculados sobre o valor remanescente do capital seguro que exista, à taxa legal supletiva para juros civis, desde a data do trânsito em julgado desta decisão e até efetivo e integral pagamento.
3. Condenou a Caixa Geral de Depósitos, S.A. a restituir aos autores “A”, “B”, e “C” todas as prestações mensais pagas por estes, desde o óbito de “D”, no âmbito do contrato de mútuo celebrado entre este e Caixa Geral de Depósitos, S.A., ao qual se encontra associado o contrato de seguro de vida grupo em causa nestes autos.

A ré seguradora não se conformou e recorreu, concluindo:
«A) O presente recurso assenta na discordância quanto à sentença proferida pelo tribunal a quo, a qual julgou procedente a ação, discordância essa consubstanciada na impugnação da decisão sobre as matérias de facto provada e não provada, quer por razões de direito;
B) A Recorrente pretende, no que respeita ao facto provado sob o Ponto n.º 5, a alteração da sua redação, como igualmente pretende que a matéria constante das alíneas A), B), C), D), E) e F) dos factos não provados seja julgada provada;
C) Para tal alteração da decisão sobre a matéria de facto, impõe-se analisar e refletir sobre a prova documental, testemunhal e sua valoração de iure;
D) O acolhimento da factualidade defendida pela Apelante, e apoiada na documentação junta aos autos e nas declarações das testemunhas, cujos depoimentos se encontram gravados, deveria ter conduzido à sua absolvição;
E) O Tribunal a quo deu crédito exclusivo à tese defendida pelos Recorridos, sem que estes apresentassem qualquer prova documental bastante e, muito menos, testemunhal, tendo desconsiderado a prova produzida pela Recorrente e anteriormente explanada, pois não apreciou devidamente os documentos juntos à contestação da Recorrente sob os n.ºs 1, 2, 3, 4 e 5, bem como o doc. n.º 5 (versão integral) junto pelos Recorridos em sessão de julgamento e por solicitação do próprio tribunal;
F) Assim, o Tribunal recorrido deveria ter respondido à matéria de facto PROVADA no Ponto 5 e NÃO PROVADA alíneas A), B), C), D), E) e F), de forma distinta, ou seja, julgando estes factos como provados e aquele alterado na sua redação;
G) Quanto ao Ponto 5, o Tribunal a quo confundiu “adesão” com “aceitação e início do seguro”, porquanto a proposta de adesão ao seguro é manifestada pelo segurado, que para tal tem de responder a questionário médico, sendo que os exames médicos a que o segurado “D” se submeteu foram aceites por este que, para tal, subscreveu em 28.06.2005 o documento, isto após subscrever a adesão, dias antes, em 22.06.2005;
H) A estranheza manifestada pelo Tribunal recorrido e constante a fls. 7 da sentença quanto à data de adesão em 2005, quando a escritura é de 2006, só pode resultar de deficiente interpretação dos documentos e da natural evolução temporal do processo de seguro de vida;
I) Importa recordar que a escritura de empréstimo celebrada entre o segurado falecido e a CGD, associada à adesão à apólice 5.001.500, data de 1.03.2006, sendo que esta é data de início do seguro, pois este sempre se iniciaria “na data da escritura” como decorre do doc. 3 junto à contestação da recorrente, mas que não prejudica a prévia adesão ao seguro em causa, adesão essa anterior;
J) Deste modo, considera-se que o Ponto 5 dos provados dever ser alterada no que respeita à data, que deve passar a ser 22.06.2005, entendendo-se que este ponto 5 deveria ter a seguinte redação “a adesão do falecido “D” à apólice 5.001.500 ocorreu em 22.06.2005, tendo início no dia 1 de março de 2006”.
K) No que respeita à matéria julgada não provada e constante das alíneas A) e B), o tribunal recorrido apreciou de forma incorreta os documentos juntos à contestação da Recorrente sob n.º 3 respeitante à “Proteção Mais - apólice 5.001.500” (apólice em causa) nomeadamente a matéria respeitante ao “Início e duração do seguro” que consagra e transcreve-se “O seguro de vida tem início na data da escritura ou na data de aceitação por parte da seguradora se esta for posterior. A duração do seguro acompanha o prazo de empréstimo, no máximo até aos setenta anos de idade do cliente. As garantias de seguro cessam nas seguintes condições: o cliente atingir os 70 anos…”.
L) Estas condições foram entregues ao segurado, aquando da adesão ao seguro em 2005, sendo este documento/nota informativa entregue ao Segurado, como este então declarou, no documento de adesão que subscreveu e assinou pelo seu punho.
M) Aliás, a testemunha arrolada pela CGD “E” que prestou o seu depoimento na sessão de 30.10.2024, gravada no sistema médio Habilus Studio, refere que a instituição e ela própria entregavam sempre aos mutuários e aderentes ao seguro/vida a documentação da qual constava as coberturas e exclusões contratadas. Que era a prática da instituição.
N) Aliás, as seguradoras e as instituições bancárias não desconhecem o normativo contido no art.º 4, n.º 1 do DL 176/95 de 26/7 que lhes impõe esse ónus, dado tratar-se de um seguro de grupo.
O) No que concerne à matéria das alíneas B) e C) importa salientar que o documento junto à contestação da Recorrente sob o n.º 1 contém o “Boletim de Adesão” e as “Condições Particulares”, sendo que nenhum destes documentos foi impugnado pelos Recorridos, pelo que devem fazer prova em juízo;
P) Ora, do “Boletim de Adesão” consta a assinatura do segurado, entretanto falecido, Sr. “D” e o reconhecimento, aceite, “que tomei conhecimento das informações pré-contratuais que constam da Nota Informativa que em foi entregue”, assim cumprindo o estatuído no n.º 5 do art.º 21 do DL 72/2008.
Q) Este “Boletim de Adesão” escrito e assinado pelo segurado falecido é acompanhado das Condições Particulares relativas à Apólice em causa datada 8.04.2002 e em vigor à dada da adesão do segurado “D”, das quais consta logo na primeira folha, art.º 2, § 2.º “a cobertura de invalidez Total e Permanente por doença termina quando a pessoa segura atingir os 60 anos de idade. Todas as outras garantias conferidas por esta apólice cessam, para cada pessoa segura, logo que esta atinja a idade prevista em cada cobertura ou, na falta dessa previsão, aos 70 anos”.
R) Estas “Condições Particulares” respeitam ao seguro de grupo, “chapéu” este onde se enquadram depois os seguros a que cada segurado adere, pelo que foi também entregue ao segurado, aquando da formalização da adesão ao seguro de grupo, a Nota Informativa relativa a esta Apólice (5.001.500) e que constitui a fl. 2 do doc. 4 junto à contestação que refere no seu Ponto 2.5.1. “o que não está seguro: Morte verificada após o termo da anuidade em que a pessoa segura atinja 70 anos de idade”.
S) Os Recorridos juntaram aos autos, a solicitação do tribunal, cópia integral do doc. n.º 5, nota esta que nada tinha a ver com a apólice n.º 5.001.500, mas sim com uma outra apólice subscrita pela segurada posteriormente àquela e com o n.º 5.001.203, apólice esta que definia escalões etários distintos em termos de garantias.
T) E juntaram essa Nota Informativa (apólice n.º 5.001.203) porque a tinham, pois, a mesma fora entregue ao segurado “D” aquando da adesão deste a esta mesma apólice;
U) Ora, se o Segurado recebeu a Nota Informativa relativa à apólice 5.001.203, não há razão para duvidar que também a tenha recebido aquando da adesão à apólice 5.001.500, objeto deste autos, tando mais que ele próprio o declarou por escrito, assinando pelo seu punho o “Boletim de Adesão”, como se referiu.
V) E a testemunha “F”, declarou que as Notas Informativas eram sempre entregues aos segurados (vd. Sessão de 10.10.2024, gravado no sistema médio habilus studio).
W) Finalmente no que respeita à alienas E) e F) importa não isolar documento de 30.04.2009 dos demais juntos aos autos pois a factualidade expressa pela Recorrente assente no procedimento sequencial ao longo dos anos e que o Segurado “D” foi sendo informado e acompanhando, sendo que este documento resulta da entrada em vigor do novo regime jurídico do contrato de seguro, com alteração das condições contratuais;
X) Mas essas alterações contratuais não feriram a condição de exclusão de garantia, após os 70 anos de idade, que se mantém, como decorre da Nota Informativa e que identifica no seu cabeçalho a apólice n.º 1.001.500;
Y) As Recorridas não fizeram qualquer prova de que a carta enviada ao segurado falecido em 3.01.2019 (doc. 2 junto à contestação da Recorrente) não tenha sido recebida pelo falecido segurado;
Z) E nessa carta, face à caducidade deste seguro por ter sido atingido o limite de idade do segurado, a Recorrente, convidava aquele a procurar junto desta outras soluções que considerasse adequadas, sendo que o Segurado “D” recebeu a mesma e nada disse, não tendo sequer reclamado da caducidade do seguro, por ter sido atingido o limite de idade.
AA) Fosse o Segurado “D” desconhecedor das condições que contratualizara com a adesão ao seguro relativo à apólice 1.001.500 e teria então reclamado junto da Recorrente, o que não fez porque há muito sabia, tinha conhecimento, dessa causa de exclusão.
BB) Esta carta é enviada pela Recorrente ao segurado “D” em 3 de Janeiro de 2019 e este falece em 17 de Agosto de 2019, ou seja, sete meses após receber a informação escrita da Recorrente, que nada disse, reclamou ou questionou, nem sequer tendo então invocado a alegada falta de informação, que só os Recorridos invocam, sem que tivessem alegado e, assim, não provando estarem juntos do falecido “D” quando este subscreveu a adesão aos seguros em causa;
CC) Alterada a matéria de facto, de molde a torná-la devidamente consentânea, com a prova produzida em julgamento, como defende a Apelante, impõe-se a conclusão de que o seguro titulado pela apólice vida n.º 1.001.500 já não vigorava à data do óbito do Segurado “D”, porquanto o mesmo atingira os 70 anos de idade na anuidade que terminara em 31 de dezembro de 2018;
DD) O Segurado “D” nascera em 15 de Março de 1948 (vd. Certificado de óbito junto à p. sob o n.º 1), pelo que atingiu os 70 anos em 15 de Março de 2018;
EE) Face ao disposto no doc. 4 (fl. 2) junto à contestação da Recorrente, a caducidade deste seguro operou no fim da anuidade, ou seja, em 31 de Dezembro de 2018;
FF) Assim, a sentença recorrida violou as normas ínsitas nos artºs 106, n.º 1 e 109 do DL 72/2008 de 16/04 merecendo censura.
NESTES TERMOS
E nos mais de Direito, que V. Exªs doutamente suprirão, deve o presente recurso merecer integral provimento e, em consequência, ser a sentença recorrida revogada, absolvendo-se a Apelante dos pedidos, com o que V. Exªs farão, como sempre, a mais lídima JUSTIÇA!»

Não foram apresentadas respostas ao recurso.

Colhidos os vistos, nada obsta ao conhecimento do mérito da apelação.

Objeto do recurso
Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (artigos 635.º, 637.º, n.º 2, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Tendo em conta o teor daquelas, colocam-se as seguintes questões:
a) A matéria de facto deve ser alterada, no sentido de se considerar assente que o contrato de seguro em que o falecido era pessoa segura terminou no final do ano civil em que fez 70 anos de idade, conforme cláusula contratual que o falecido conhecia e subscreveu?
b) O seguro estava findo por caducidade à data do óbito da pessoa segura, pelo que a ação devia ter sido julgada improcedente e a apelante absolvida dos pedidos?

II. Fundamentação de facto
Mostram-se provados os seguintes factos (que são os adquiridos em 1.ª instância, com alteração no ponto 5. e aditamento dos pontos 5-A. a 5-D., com os fundamentos explicados em III.1.):
1. “D” faleceu em 17 de agosto de 2019, com 71 anos de idade.
2. Deixou como herdeiros legitimários a mulher e dois filhos, os ora autores.
3. A 1 de março de 2006, “D” e mulher, “A”, celebraram com a Caixa Geral de Depósitos um contrato de mútuo com hipoteca, no valor de cem mil euros, para financiamento de um contrato de compra e venda de um imóvel.
4. Para tal “D” aderiu ao Seguro de Vida Grupo Crédito à Habitação Clientes CGD, da Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial S.A., cuja apólice é 5.001.500, para garantia do pagamento do capital seguro ao beneficiário, a aqui Ré Caixa Geral de Depósitos S. A., em caso de morte ou invalidez total e permanente por doença ou acidente, e pagamento do remanescente do capital seguro aos herdeiros da pessoa segura, em caso de morte, ou à própria pessoa segura, em caso de invalidez, através da subscrição do Boletim de Adesão com o n.º 208309, no balcão da Caixa Geral de Depósitos da Parede.
5. A adesão do falecido “D” à apólice 5.001.500 ocorreu em 22/06/2005, tendo início no dia 1 de março de 2006. [alterado pelos motivos explicados em III.1]
5-A. À data do início da adesão do falecido “D” ao contrato de seguro de vida grupo supra identificado no ponto 4, constava das cláusulas particulares dessa apólice que a cobertura morte cessaria para cada aderente quando este atingisse a idade de 70 anos, passando ulteriormente a explicitar-se, pelo menos, na versão das condições particulares da mesma apólice de 30/10/2009, que a cobertura morte cessa no final do ano em que a pessoa segura complete 70 anos de idade. [aditado pelos motivos explicados em III.1]
5-B. No momento da adesão ao contrato de seguro vida grupo mencionado no ponto 4, a CGD comunicou a “D” que a cobertura de morte cessaria ao completar 70 anos de idade, o que fez, pelo menos, através da entrega de documento escrito com essa informação. [aditado pelos motivos explicados em III.1]
5-C. Em 30 de abril de 2009, a ré seguradora remeteu ao segurado, o falecido “D”, a nota informativa que se mostra junta aos autos como documento n.º 4 da contestação, da qual consta “o que não está seguro: morte verificada após o termo da anuidade em que a pessoa segura atinja 70 anos de idade”. [aditado pelos motivos explicados em III.1]
5-D. Em 3 de Janeiro de 2019, “D” recebeu uma carta remetida pela Ré Seguradora, referente à apólice 5.001.500, da qual constava, de entre o mais, “De acordo com as condições da apólice Vida Grupo acima identificada, a sua adesão a este contrato de seguro extingue-se a partir de 31/12/2018. Com efeito, por ter atingido a idade limite definida nas condições contratuais, 70 anos, deixa de poder estar seguro na apólice em causa”. [aditado pelos motivos explicados em III.1]
6. O óbito de “D” foi participado à ré Seguradora.
7. A seguradora ré recusou o pagamento do capital seguro à data da morte.
8. Até à presente data, os autores continuaram a pagar as prestações à Caixa Geral de Depósitos.
9. A 7 de fevereiro de 2020, o valor em dívida no âmbito do contrato de mútuo supra identificado no ponto 3 ascendia a 33.691,64 €.
10. “D” aderiu ao Seguro de Vida Grupo Crédito à Habitação Clientes CGD, da Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial S.A., cuja apólice é 1105001203, para garantia do pagamento do capital seguro de €15.000, ao beneficiário, a aqui ré Caixa Geral de Depósitos S. A., em caso de morte, por doença e acidente, e invalidez total e permanente por doença ou acidente, e pagamento do remanescente do capital seguro aos herdeiros da pessoa segura em caso de morte e à própria pessoa segura, em caso de invalidez, associado a um crédito hipotecário complementar, designado por “multiusos”.
11. A adesão do falecido “D” à apólice 1105001203 teve início a 11 de dezembro de 2008.
12. No momento da adesão do falecido “D” à apólice 1105001203, a cobertura morte cessava quando a pessoa segura atingisse os 80 anos e a cobertura por invalidez absoluta e definitiva cessava quando a pessoa segura atingisse os 70 anos.

III. Apreciação do mérito do recurso
III.1. Reapreciação de matéria de facto
O recorrente pode impugnar a decisão sobre a matéria de facto, caso em que deverá observar as regras contidas no artigo 640.º do CPC.
Segundo elas, e sob pena de rejeição do respetivo recurso, o recorrente deve especificar:
- Os pontos da matéria de facto de que discorda;
- Os meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida;
- A decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
No caso em apreço, a apelante cumpriu cabalmente os ónus descritos no artigo 640.º do CPC:
- Identificou na conclusão B) os pontos da matéria de facto de que discorda – ponto n.º 5 dos factos provados e matéria constante das alíneas A), B), C), D), E) e F) dos factos não provados, que são todos os factos identificados em 1.ª instância como não provados;
- Indicou como devem ser decididos os citados pontos de facto – a matéria não provada deve ser passada a provada (conclusão F)) e do ponto n.º 5 dos factos provados deve passar a constar «a adesão do falecido “D” à apólice 5.001.500 ocorreu em 22.06.2005, tendo início no dia 1 de março de 2006» (conclusão J));
- Explicitou os meios probatórios destinados à alteração do facto 5 – análise do boletim de adesão, da apólice 5.001.500 e das suas condições (conclusões G), H) e I)); à prova das alíneas A) e B) – condições da apólice em causa e testemunha “E” (conclusões K), L) e M)); à prova das alíneas C) e D) – boletim de adesão, condições da apólice e testemunha “F” (conclusões O) a V)); e, à prova das alíneas E) e F) – carta de comunicação da caducidade enviada ao segurado e condições da apólice (conclusões W) a Z)).

Passamos, portanto, a reapreciar a prova e a decidir cada um dos pontos impugnados.
Para a reapreciação dos factos impugnados são relevantes, entre outros, os seguintes documentos juntos aos autos:
i. Boletim de adesão, subscrito em 22/06/2005 por “D”, como pessoa a segurar, sendo a adesão ao contrato de seguro com a apólice 5.001.500 do “Ramo Vida Grupo”, em que é tomadora e beneficiária a Caixa Geral de Depósitos, e seguradora a Fidelidade (doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré);
ii. Versão de 08/04/2002 das Condições particulares da apólice 5.001.500 do “Ramo Vida, Seguros de Grupo”, na qual é seguradora a Fidelidade, tomadora do seguro a CGD, pessoas seguras os clientes da tomadora que recorram ao crédito à habitação e que satisfaçam certas condições (2.ª parte do doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré);
iii. Versão de 30/10/2009 das Condições particulares da mesma apólice 5.001.500 do “Ramo Vida, Seguros de Grupo”, na qual é seguradora a Fidelidade, tomadora do seguro a CGD, pessoas seguras os clientes da tomadora que recorram ao crédito à habitação e que satisfaçam certas condições (3.ª parte do doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré);
iv. Condições gerais do “seguro vida grupo temporário anual renovável” da Fidelidade, que terá como tomador a entidade identificada nas condições particulares (4.ª parte do doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré);
v. Certificados de adesão à apólice 5.001.500, um emitido em 08/05/2009 e outro em 15/01/2011 (docs. 4 e 7 juntos com a p.i.).

A compreensão e a análise destes documentos, relevantes para a reapreciação dos factos impugnados, exigem conhecimentos jurídicos.
No conjunto de documentos acima listado encontramos três camadas contratuais distintas, a saber:
a) As condições gerais do “seguro vida grupo temporário anual renovável” da Fidelidade (4.ª parte do doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré, identificado acima em iv.) são um conjunto de cláusulas contratuais gerais emitidas pela seguradora Fidelidade, destinadas a regular futuros contratos-quadro de seguro de grupo do ramo vida, a celebrar com futuros tomadores (entidades mutuantes, maioritariamente, bancos), para coberturas de morte e invalidez de pessoas ligadas aos tomadores (por vínculo diferente do de segurar, tipicamente por contrato de mútuo); as ditas condições subsumem-se ao conceito de cláusulas contratuais gerais, elaboradas sem prévia negociação individual, que destinatários indeterminados se limitem aceitar; não são um contrato, mas um conjunto de cláusulas que regularão futuros contratos.
b) As condições particulares da apólice 5.001.500 do “Ramo Vida, Seguros de Grupo”, na qual é seguradora a Fidelidade, tomadora do seguro a CGD, prevendo-se a adesão como pessoas seguras dos clientes da tomadora que recorram ao crédito à habitação e que satisfaçam certas condições (2.ª e 3.ª partes do doc. 1 com a contestação da ré seguradora, acima identificados em ii. e iii.), constituem contratos-quadros nos quais a seguradora e a tomadora (no caso, a CGD) estabelecem as cláusulas a que se subordinarão os futuros contratos de seguro formados por adesão dos participantes (nos quais a tomadora do contrato-quadro, contraparte da seguradora nesse contrato, será beneficiária). Nos termos destas condições, o pagamento dos prémios é da responsabilidade das pessoas seguras, tratando-se, portanto, de um seguro de grupo contributivo. O referido contrato-quadro não é um contrato de seguro em sentido estrito, mas um contrato preliminar, independente daqueles cuja celebração irá possibilitar. Só com a adesão dos participantes nasce a situação de cobertura e a possibilidade do evento aleatório. A existência de várias versões das condições particulares da mesma apólice deve-se ao facto de, no decurso da relação contratual entre a ré seguradora e a ré CGD, as partes neste contrato quadro (ora rés nesta ação) terem, ao abrigo da sua liberdade contratual, feito pequenas alterações, por vezes meros ajustes de redação, e que, em nenhum caso, afetaram a idade que determina a caducidade da cobertura morte, que é o que está em causa nos autos. Nada há a estranhar, portanto, à existência de várias versões com várias datas; sendo em todas elas a data de início da apólice 5.001.500, obviamente a mesma, 23 de outubro de 2000 (uma coisa é o início do contrato-quadro celebrado entre as ali partes, ora rés, outra coisa são as alterações que as mesmas partes foram fazendo ao mesmo contrato).
c) O boletim de adesão (doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré, acima listado em i.) incorpora a declaração negocial do segurado e, após aceitação da seguradora, será parte essencial do contrato de seguro por adesão ao clausulado previamente elaborado pela contraparte seguradora (e também por terceiro, contraparte da seguradora no prévio contrato-quadro, a ré CGD). Num seguro coletivo deste género e contributivo, os participantes não são meros terceiros, mas sim partes, tomadores no seu próprio contrato individual de seguro. O boletim de adesão é subscrito numa dada data que, à partida, não coincide com a data de início da cobertura individual, esta, normalmente, coincidente com a data da escritura de mútuo ou de aceitação da adesão pela seguradora. Finalmente, os certificados de adesão (docs. 4 e 7 juntos com a p.i., acima listados em v.) são prova da aceitação da inclusão no contrato de seguro, da renovação do seguro ou da alteração de valores do capital seguro ou do prémio, sendo emitido um por cada segurado e sempre que se verifica a renovação do seguro e/ou alteração do valor do capital seguro ou do prémio. Não é, portanto, de estranhar a existência de vários certificados, com diferentes datas.

Foram ouvidas duas testemunhas:
- “F”, profissional de seguros, empregado da ré Fidelidade há 36 anos, responsável direto na área de sinistros em seguros de vida. Explicou os documentos acima listados, nomeadamente, que o boletim de adesão terá sido preenchido na data nele aposta, de 22/06/2005, no balcão da CGD na Parede (só nos balcões da CGD estão disponíveis estes boletins, porque estes seguros servem para garantia do pagamento de contratos de mútuo celebrados com a CGD), por certo na altura em que o aderente ao seguro estava a tratar do mútuo; já a data de início do contrato será a data da escritura, como consta dos certificados de adesão, que foi em 01/03/2006 (facto 3).
Todos os anos enviam certificados de seguro atualizados, daí a existência dos documentos 4 e 7 com a p.i., dois certificados de dois anos diferentes; a data que deles consta como de início é a data do início do contrato individual de seguro, que corresponde à data da escritura de mútuo.
Das condições particulares da apólice 5.001.500 a que o segurado aderiu constava, à data da adesão, que a cobertura morte cessaria quando a pessoa segura atingisse os 70 anos de idade (artigo 2.º § 2.º das Condições Particulares de 08/04/2002 – 2.ª parte do doc. 1 com a contestação da Fidelidade); e assim continuou a ser nas Condições Particulares de 30/10/2009, artigo 3.º, n.º 2, alínea c) i) – 3.ª parte do doc. 1 com a contestação da Fidelidade.
A testemunha explicou também a diferença entre o seguro de grupo, celebrado entre a seguradora e a CGD, que teve início em 23/10/2000 (artigo 3.º, n.º 1, das Condições Particulares de 08/04/2002 – 2.ª parte do doc. 1 com a contestação da Fidelidade –, e artigo 5.º, n.º 1, das Condições Particulares de 30/10/2009 – 3.ª parte do doc. 1 com a contestação da Fidelidade), e a adesão ao seguro pelo aderente, pessoa segura, em 22/06/2005, para ter início na data do mútuo, ou seja, 01/03/2006.
Mais disse que, quando “D” aderiu ao seguro, foi-lhe entregue uma nota informativa com as coberturas e as exclusões, pois, em anexo ao boletim de adesão, encontra-se sempre uma nota informativa da qual consta, sempre constou, o limite de idade para as coberturas.
Com a vigência do RJCS, a Fidelidade enviou a todos as pessoas seguras que aderiram à apólice 5.001.500 nova nota informativa (carta de 30 de abril de 2009, doc. 4 com a contestação da seguradora), mas as condições de caducidade mantiveram-se as mesmas.
Esta testemunha voltou a ser ouvida na segunda sessão da audiência, após ter sido junto um documento completo, que tinha sido junto pelos autores truncado, como doc. 5 com a p.i. (nota informativa remetida em 9 de março de 2009, referente a outras apólices, que não a 5.001.500). Debruçou-se sobre as duas apólices a que o falecido aderiu e suas condições, e explicou porque pagaram indemnização no âmbito de uma (cuja cobertura morte apenas caducaria aos 80 anos) e não no âmbito da outra (cuja cobertura morte caducou no fim do ano em que o segurado perfez 70 anos de idade).
- “E”, bancária na CGD, há 28 anos, foi a segunda e última testemunha inquirida. Não teve contacto direto com os autores, nem com o falecido. Atestou que, com o boletim de adesão entregavam as condições particulares da apólice.
A primeira testemunha denotou um nítido conhecimento de causa, compreensão dos contratos seguros e dos modus operanda da seguradora; a segunda testemunha evidenciou nervosismo e respostas feitas, acabando por prestar um depoimento curto e com pouco de útil para o caso concreto.

Concluindo sobre cada ponto impugnado:
Facto 5
Neste facto atestava-se que «A adesão do falecido “D” à apólice 5.001.500 teve início no dia 1 de março de 2006». A apelante pretende a sua alteração para: «A adesão do falecido “D” à apólice 5.001.500 ocorreu em 22.06.2005, tendo início no dia 1 de março de 2006».
No caso dos autos, e como é habitual, a data do preenchimento do boletim de adesão – data da declaração negocial de adesão – é anterior à data do início do contrato de seguro para o aderente. De acordo com o disposto no contrato-quadro constituído pela apólice 5.001.500 do “Ramo Vida, Seguros de Grupo”, no qual é seguradora a Fidelidade e tomadora a CGD, o início da integração de cada pessoa segura dá-se «a partir da data de aceitação do risco pela Seguradora» (artigo 3.º, n.º 2, das Condições particulares da apólice 5.001.500, versão de 08/04/2002, 2.ª parte do doc. 1 com a contestação da Fidelidade), ou «na data de celebração do contrato de empréstimo ou escritura se posterior (artigo 5.º, n.º 2, das Condições particulares da apólice 5.001.500, versão de 30/10/2009, 3.ª parte do doc. 1 com a contestação da Fidelidade). No boletim de adesão do falecido está expresso que o contrato terá início na data da escritura (que se celebrou em 01/03/2006 – facto 3) e, dos certificados de seguro consta efetivamente essa data, de 1 de março de 2006 (docs. 4 e 7 com a p.i.).
É importante clarificar no facto 5 que a data da adesão e a data do início do contrato de seguro para o aderente são distintas e quais são, uma vez que a incompreensão destes dados conduziu à errada apreciação da prova produzida.
Assim, altera-se o facto 5, que passa a ter a seguinte redação, como proposto pela apelante:
«5. A adesão do falecido “D” à apólice 5.001.500 ocorreu em 22/06/2005, tendo início no dia 1 de março de 2006.»

Facto não provado A)
A apelante pede que se considere provado o facto da alínea A) da lista dos não provados:
A) À data do início da adesão do falecido “D” ao contrato de seguro de vida grupo supra identificado no ponto 4 dos factos provados, constava das cláusulas particulares dessa apólice que a cobertura morte cessa para cada aderente no final do ano em que a pessoa segura complete 70 anos de idade.
Das Condições particulares da apólice 5.001.500 do “Ramo Vida, Seguros de Grupo”, na qual é seguradora a Fidelidade, tomadora do seguro a CGD (2.ª parte do doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré - versão de 08/04/2002), v. artigo 2.º, § 2.º, onde se lê «A cobertura de Invalidez Total e Permanente por Doença termina quando a Pessoa Segura atingir a idade de 60 anos. Todas as outras garantias conferidas por esta apólice cessam, para cada Pessoa Segura, logo que esta atinja a idade prevista em cada cobertura ou, na falta dessa previsão, aos 70 anos».
Da versão de 30/10/2009 das Condições particulares da mesma apólice (3.ª parte do doc. 1 junto com a contestação da seguradora ré), artigo 3.º, n.º 2, al. c) i), onde se lê «Para além do previsto nas Condições Gerais as garantias cessam os seus efeitos nas seguintes situações: (…) c) Limite de idade em relação a cada Pessoa Segura: i) Garantia de Morte, no termo da anuidade em que a Pessoa Segura completa 70 anos de idade».
A testemunha “F”, com conhecimento dos factos pelos motivos acima assinalados, também o atestou.
Existe uma nuance entre a versão de 08/04/2002, que referia caducidade aos 70 anos, e a versão de 30/10/2009, que passou a referir caducidade no termo da anuidade em que a pessoa segura completa 70 anos, versão mais favorável à pessoa segura e que a seguradora aplicou (embora, no caso concreto, o desfecho fosse o mesmo com qualquer das versões). Admite-se que a alteração tenha tido intuito meramente interpretativo.
De referir, ainda, e como mero apontamento a latere, que na outra apólice à qual o falecido também aderiu, igualmente existia caducidade por idade, ainda que aí os limites fossem mais elevados, por ser uma apólice mais recente, e, como a testemunha “F” explicou, os limites foram aumentando, também para acompanhar o aumento da esperança de vida.
Perante estes elementos, em especial o teor das condições particulares da apólice 5.001.500, não se duvida de que o conteúdo útil da alínea A) é facto assente, devendo transitar para esse universo, com o n.º 5-A, para ficar ordenado cronológica e logicamente, com a seguinte redação:
5- A. À data do início da adesão do falecido “D” ao contrato de seguro de vida grupo supra identificado no ponto 4, constava das cláusulas particulares dessa apólice que a cobertura morte cessaria para cada aderente quando este atingisse a idade de 70 anos, passando ulteriormente a explicitar-se, pelo menos, na versão das condições particulares da mesma apólice de 30/10/2009, que a cobertura morte cessa no final do ano em que a pessoa segura complete 70 anos de idade.

Factos não provados B), C) e D)
A apelante pede também que se considerem provados os factos das alíneas B), C) e D) da lista dos não provados, a saber:
B) No momento da adesão ao contrato de seguro vida grupo mencionado no ponto 4 dos factos provados, ou em momento prévio, as Rés comunicaram a “D” que a cobertura de morte cessa para cada aderente, no final do ano em que a pessoa segura complete 70 anos de idade.
C) No momento de adesão ao seguro, foi entregue ao falecido “D” as condições gerais e particulares que se mostram juntas aos autos como documento n.º 1 da contestação.
D) Aquando da adesão ao seguro de vida grupo (apólice 5.001.500), foi entregue ao falecido “D” a nota informativa, junta como documento n.º 3 da contestação, da consta que “a duração do contrato acompanha o prazo de empréstimo, no máximo até aos setenta anos de idade do cliente. As garantias do seguro cessam nas seguintes situações - o cliente atingir os 70 anos…”.
Estes factos reportam-se todos à mesma situação: a transmissão pelas rés, ou por alguma delas, ao aderente do termo do seguro quando atingisse os 70 anos de idade, forma dessa comunicação e conteúdo específico.
Da análise acima feita às duas versões das Condições Particulares da Apólice 5.001.500 e aos depoimentos das duas testemunhas não se duvida de que, aquando do preenchimento e entrega do boletim de adesão pelo falecido lhe foi entregue pela CGD informação escrita de que a cobertura morte terminaria quando perfizesse70 anos de idade. Fosse através das condições particulares então vigentes, fosse, como mais provavelmente sucedeu, da nota informativa constante do doc. 3 com a contestação da seguradora, o falecido tomou conhecimento da referida condição do seguro a que aderia; constava de ambos os documentos que o seguro caducaria, no máximo, aos 70 anos de idade do cliente (havendo até limites inferiores para os casos de invalidez por doença, 60 anos, e de invalidez por acidente, 65 anos).
Defere-se a pretensão da apelante, acrescentando esta matéria como facto 5-B, com a seguinte redação:
5-B. No momento da adesão ao contrato de seguro vida grupo mencionado no ponto 4, a CGD comunicou a “D” que a cobertura de morte cessaria ao completar 70 anos de idade, o que fez, pelo menos, através da entrega de documento escrito com essa informação.

Facto não provado E)
Pede, ainda, a apelante que se considere provado:
E) Em 30 de Abril de 2009, a Ré Seguradora remeteu ao segurado, o falecido “D”, a nota informativa que se mostra junta aos autos como documento n.º 4 da contestação, da qual consta que “o que não está seguro: morte verificada após o termo da anuidade em que a pessoa segura atinja 70 anos de idade”.
Efetivamente, o doc. 4 junto com a contestação da ré seguradora assim o atesta.
Trata-se de carta datada de 30/04/2009, que a seguradora enviou na sequência da vigência do Regime Jurídico do Contrato de Seguro constante do DL 72/2008 («Assunto: Atualização das condições contratuais aplicáveis nos termos e para os efeitos previstos no artigo 3.º, n.º 2 do Decreto-Lei 72/2008, de 16 de Abril»). Em anexo à carta, seguiu documento de duas páginas intitulado «SEGURO DE VIDA GRUPO CRÉDITO À HABITAÇÃO CLIENTES CGD APÓLICE 5.001.500 NOTA INFORMATIVA», do qual, entre o mais, constava no ponto 2.5.1. «O que não está seguro: Morte verificada após o termo da anuidade em que a pessoa segura atinja 70 anos de idade.»
Em suma, não houve mudanças neste aspeto.
A testemunha “F” também explicou e atestou o envio da carta de 30 de abril e a sua razão de ser – a vigência do novo regime do contrato de seguro, embora as condições se tivessem mantido, no essencial.
Os autores tentaram omitir a carta de 30/04/2009, referente à apólice 5.001.500, juntando uma outra análoga, mas para outras apólices (não para a 5.001.500, que está em causa nos autos), com data de 09/03/2009, que juntaram como doc. 5 com a p.i. e truncada, apenas com a segunda página do documento anexo.
Em audiência, acabaram por juntar o documento completo, que tinha três páginas, intitulado «SEGURO DE VIDA GRUPO CRÉDITO À HABITAÇÃO CLIENTES CGD NOTA INFORMATIVA», sendo no seu texto apenas referidas as apólices 5.001.203, 5.001.219, 5.001.202, 5.001.218, 5.000.248, 5.000.816 (não se reportava, portando, à apólice em discussão nos autos, a 5.001.500).
Porquanto exposto, não se duvida de que o conteúdo da alínea E) constitui facto assente, devendo transitar para esse universo, sob o n.º 5-C:
5-C. Em 30 de abril de 2009, a ré seguradora remeteu ao segurado, o falecido “D”, a nota informativa que se mostra junta aos autos como documento n.º 4 da contestação, da qual consta “o que não está seguro: morte verificada após o termo da anuidade em que a pessoa segura atinja 70 anos de idade”.

Facto não provado F)
Finalmente, a apelante pugna pela prova do facto considerado, em 1.ª instância, não provado:
F) Em 3 de Janeiro de 2019, “D” recebeu uma carta remetida pela Ré Seguradora, referente à apólice 5.001.500, da qual constava, de entre o mais, “De acordo com as condições da Apólice Vida Grupo acima identificada, a sua adesão a este contrato de seguro extingue-se a partir de 31.12 de 2018. Com efeito, por ter atingido a idade limite definida nas condições contratuais, 70 anos, deixa de poder estar seguro na apólice em causa”.
A carta referida no facto foi junta como doc. 2 com a contestação da seguradora e não foi posta em causa pelos autores. Também a testemunha “F” mencionou a sua emissão e remessa ao destinatário.
Pelo exposto, é de deferir a impugnação, aditando o facto aos provados, na ordem mais adequada, como 5-D.

III.2. Relacionando os factos com o direito aplicável
Em sede de reapreciação da matéria de facto, não pudemos deixar de adiantar o enquadramento jurídico das relações entre as partes. É agora altura de o fazer de forma estruturada e tendo como ponto de partida o acervo fáctico a que chegámos.
A causa de pedir radica num contrato de seguro a que o falecido marido e pai dos autores aderiu como pessoa segura. Importa, antes de mais, perceber a relação contratual em causa e as atribuições dos seus intervenientes.
Referem-se nos autos dois contratos de seguro:
i. um respeitante à apólice 5.001.500, subscrito através do Boletim de Adesão n.º 208309, para garantia do pagamento do capital seguro (respeitante a um mútuo contraído em 1 de março de 2006, no valor de cem mil euros, para compra de imóvel), à beneficiária do seguro, a mutuante Caixa Geral de Depósitos (facto 4);
ii. outro respeitante à apólice 1105001203, para garantia do pagamento do capital seguro (respeitante a um mútuo complementar, contraído em 2008, no valor de quinze mil euros), à beneficiária do seguro, a mutuante Caixa Geral de Depósitos (facto 10).
Ambos os referidos contratos são reconduzíveis ao amplo tipo do contrato de seguro, pelo qual, tipicamente, «o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando-se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga-se a pagar o prémio correspondente» (artigo 1.º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo DL 72/2008, de 16 de abril, alterado por vários diplomas, de ora em diante, RJCS).
No momento da adesão do falecido à apólice 5.001.500, a cobertura morte cessava quando a pessoa segura atingisse os 70 anos de idade (factos 5-A a 5-D); e, aquando da adesão do falecido à apólice 1105001203, a cobertura morte cessava quando a pessoa segura atingisse os 80 anos (facto 12).
“D” faleceu em 17 de agosto de 2019, com 71 anos de idade, tendo o óbito sido participado à ré seguradora, para pagamento do capital em dívida em ambos os contratos de seguro (factos 1 e 6). No que se reporta à primeira, apólice 5.001.500, cujo seguro estava caducado aquando do óbito, a seguradora ré não satisfez o solicitado. O que os autores reclamam nos presentes autos diz respeito apenas à apólice 5.001.500.
Como referido, a adesão pelo falecido ao contrato de seguro de grupo do ramo vida, com a apólice 5.001.500, teve em vista a garantia da restituição do valor mutuado à respetiva mutuante, a CGD, em caso de morte ou invalidez da pessoa segura.
A pessoa segura adere a um contrato-quadro celebrado entre a seguradora e a entidade que, nos futuros contratos de seguro por adesão, será beneficiária (sobre a realidade do contrato-quadro, Maria Raquel de Almeida Graça Silva Guimarães, O contrato-quadro no âmbito da utilização de meios de pagamento electrónicos, Coimbra Editora, 2011, maxime pp. 59-168). Esse contrato-quadro (in casu, designado por “seguro de grupo do ramo vida”) não é um contrato de seguro em sentido estrito, pois só com a adesão dos participantes nasce a situação de cobertura e a possibilidade do evento aleatório. O dito contrato-quadro consiste antes num modelo regulatório de futuros contratos de seguro. Estes formar-se-ão por adesão de pessoas que neles serão pessoas seguras.
No “contrato de seguro de grupo” com apólice 5.001.500 (o referido contrato-quadro) é seguradora a ré Fidelidade e tomador o banco mutuante, a CGD. Com a adesão a esse contrato, aceite pela ré seguradora, o falecido marido e pai dos autores passou a ser pessoa segura e pagador do prémio, conforme condições da respetiva apólice 5.001.500 e certificados de adesão. O seguro resultante da adesão era, portanto, contributivo, na terminologia do DL 72/2008, de 16 de abril, que aprovou o regime jurídico do contrato de seguro (v. artigos 77.º, 80.º, n.º 3, 83.º, n.º 1, e 86.º a 90.º), e que já vinha do DL 176/95, de 26 de julho (v.g., artigos 1.º, al. h), 4.º, n.º 3, deste último). Os beneficiários eram, em primeira linha, a mutuante CGD, pelo montante em dívida no empréstimo associado ao contrato e até ao limite do capital seguro, e, pelo eventual remanescente do capital seguro, em caso de morte, os herdeiros legais e, nas coberturas complementares, a pessoa segura.
Para uma melhor compreensão do contrato corporizado na apólice 5.001.500, ao qual as partes (nesse contrato, as aqui rés Fidelidade e CGD) atribuíram o título “Ramo Vida Seguros de Grupo”, lembramos que a designação legal (acolhida do RJCS) “seguro de grupo” abrange diferentes realidades, nomeadamente, as seguintes:
-  seguros de grupo celebrados por conta dos participantes, que são terceiros-segurados (para Margarida Lima Rego são estes os seguros de grupo em sentido próprio, stricto sensuContrato de seguro e terceiros, Estudo de direito civil, Coimbra Editora, 2010, p. 809, ou, igualmente útil sobre o tema, o texto da mesma autora, «Seguros coletivos e de grupo», in Temas de direito dos seguros: a propósito da nova lei do contrato de seguro, Almedina, 2012);
- contratos-quadros celebrados entre uma seguradora e um subscritor (geralmente uma instituição financeira), para serem seguidos da celebração de contratos individuais de seguro por clientes do segundo; não são contratos de seguro, mas contratos preliminares, independentes daqueles cuja celebração irão possibilitar, podendo limitar-se a definir os parâmetros dentro dos quais os aderentes poderão em seguida celebrar os respetivos contratos de seguro ou conferir ao subscritor poderes de cobrança (Margarida Lima Rego, Contrato de seguro e terceiros, cit., p. 815). 
Este segundo caso é, tipicamente, o do banco que contrata com o segurador os parâmetros dentro dos quais irão celebrar-se os contratos individuais de seguro sobre a vida dos seus clientes, que estes últimos celebrarão com o propósito de os dar em garantia ao próprio banco (Margarida Lima Rego, Contrato de seguro e terceiros, cit., p. 817).
As leis que se sucederam sobre a matéria não distinguem as várias realidades que designam por “seguros de grupo” com nomes diversos, mas contêm normas que se aplicam (umas, também, e outras, exclusivamente – v. artigos 86.º a 90.º do RJCS), a seguros coletivos que não são seguros de grupo em sentido estrito, nomeadamente porque não são contratos de seguro, mas meros contratos-quadros que apenas com a adesão das futuras eventuais pessoas seguras poderão vir a ter as notas de um contrato de seguro.
Nestes casos, e no dos autos em particular, a adesão da pessoa segura constituiu um verdadeiro contrato de adesão a um clausulado previamente elaborado pela contraparte seguradora (e também por terceiro, contraparte da seguradora no prévio contrato-quadro, o banco réu).

Nos termos do disposto no artigo 1.º, n.º 1, da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais (DL 446/85, de 25 de outubro), as cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respetivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma.
São cláusulas dirigidas ao público em geral, ou a um conjunto de pessoas com determinadas características, que a elas aderirão nos contratos que venham a celebrar. São cláusulas predispostas, seja por uma das partes nos futuros contratos, seja por terceiros (por exemplo, associações profissionais) e adotadas por uma das futuras partes. Podem definir-se «como proposições destinadas à inserção numa multiplicidade de contratos, na totalidade dos quais se prevê a participação como contraente da entidade que, para esse efeito, as pré-elaborou ou adotou» (Carlos Ferreira de Almeida, Contratos, I, 4.ª ed., Almedina, 2008, p. 181).
Estas cláusulas têm, pois, existência antes da sua inserção nas ocorrências contratuais concretas, o que pressupõe a sua publicidade prévia e permite o seu controlo abstrato através da ação inibitória (artigo 25.º da LCCG) – sobre a pré-existência das cláusulas contratuais gerais e sua natureza normativa antes da inserção contratual, Carlos Ferreira de Almeida, ob. cit., pp. 187-8. Para que se verifique a generalidade não é, pois, suficiente, assim como também não é necessário, que uma cláusula se repita em vários, eventualmente muitos, contratos.
A cláusula que determina a caducidade do contrato de seguro no final da anuidade em que o aderente completa 70 anos de idade é, para o aderente, enquanto parte no seu contrato individual de seguro, uma cláusula contratual geral. Trata-se de uma cláusula inserta nas condições particulares da apólice 5.001.500, que não será uma cláusula contratual geral no contrato-quadro celebrado entre as aqui rés, tendo sido provavelmente negociada entre ambas. No âmbito do contrato-quadro, em que são partes Fidelidade e CGD, a cláusula não se subsume ao disposto no n.º 1 do artigo 1.º da LCCG (poderia subsumir-se ao n.º 2 do mesmo artigo, não o sabemos, nem interessa para os autos); mas, no contrato de seguro por adesão do falecido marido e pai dos autores, a mesma cláusula assume a qualidade de cláusula contratual geral.
As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las (artigo 5.º, n.º 1, da LCCG), devendo tal comunicação ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efetivo (artigo 5.º, n.º 2).
A adequação e a antecedência da comunicação são as que forem necessárias ao conhecimento completo e efetivo do conteúdo da cláusula. A comunicação deve «mostrar-se idónea para a produção de um certo resultado: tornar possível o real conhecimento das cláusulas pela contraparte» (Almeno de Sá, Cláusulas contratuais gerais e directiva sobre cláusulas abusivas, Almedina, 1999, p. 22). Está em causa a comunicação para efeitos de eficácia ou validade do comportamento contratual; não está em causa a comunicação para efeitos de boa-fé ou licitude do mesmo comportamento. São coisas distintas e com consequências jurídicas diferentes. Não se exige, por exemplo, a antecedência necessária a que a contraparte encontre alternativas mais satisfatórias sem incorrer em prejuízos. Basta a antecedência necessária a que a contraparte tenha tomado consciência completa e efetiva do conteúdo da cláusula.

No caso dos autos, provou-se que o aderente teve conhecimento das condições contratuais a que estava a aderir (factos 5 a 5-D), pelo que não releva discutir a qual das rés cabia, na data da subscrição do boletim de adesão (22/06/2005), comunicar as condições contratuais. Deixa-se apenas a referência de que, nessa data, vigorava a lei da mediação de seguros contida no DL 388/91, de 10 de outubro, à luz da qual os bancos não eram tidos como mediadores nestes seguros, panorama que se alterou com o DL 144/2006, de 31 de julho (v. artigo 8.º), entretanto revogado, e com a vigente Lei 7/2019, de 16 de janeiro (v. também seu artigo 8.º, e artigos 4.º, als. c) e d), e 9.º, n.º 1, al. a), do Regime jurídico da distribuição de seguros e de resseguros, anexo à mesma Lei 7/2019). Mesmo não sendo os bancos, na data da subscrição do boletim de adesão, considerados mediadores dos seguros que promoviam, associados aos contratos de mútuo próprios da sua atividade, já então recaía expressamente sobre os mesmos a obrigação de informar os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas, incumbindo-lhes também o ónus da prova de terem fornecido essas informações (assim o expressava o artigo 4.º, n.ºs 1 e 2, do DL 176/95, de 26 de julho, que visou definir algumas regras sobre a informação que deve ser prestada aos tomadores e subscritores de contratos de seguro). Tais normas mantêm-se no presente, expressas agora no artigo 78.º, n.ºs 1 e 3, do RJCS.

O seguro de vida a que o falecido marido e pai dos autores aderiu em 22/06/2005, com início em 01/03/2006, terminaria no final da anuidade em curso quando a pessoa segura completasse 70 anos. Com feito, de acordo com as condições particulares da apólice 5.001.500, a cobertura morte cessaria para cada aderente quando este atingisse a idade de 70 anos, passando ulteriormente a explicitar-se, pelo menos, na versão das condições particulares da mesma apólice de 30/10/2009, que a cobertura morte cessaria no final do ano em que a pessoa segura completasse 70 anos de idade. Trata-se de cláusula contratual designada por termo: estipulação de que os efeitos do negócio jurídico comecem ou cessem a partir de certo momento (artigo 278.º do CC). Quando se clausula que os efeitos cessam com o atingir do termo, este designa-se por termo final e, com ele, cessam automaticamente, por caducidade, os efeitos contratuais designados como sujeitos ao mesmo termo. A caducidade, como forma de cessação de contratos (ou, mais restritamente, de efeitos contratuais) opera de forma automática, sem necessidade de declaração (sobre a caducidade como forma de extinção do contrato sujeito a termo final, Pedro Romano Martinez, Da cessação do contrato, 3.ª ed., Almedina, 2015, pp. 45-53 e 104-109).
No caso dos autos, a seguradora ré, em janeiro de 2019, após a caducidade da cobertura morte (e do contrato, pois as demais coberturas tinham termos anteriores), que se operou no final do ano 2018 (ano em que a pessoa segura havia perfeito 70 anos de idade), enviou-lhe carta lembrando essa caducidade e propondo o contacto para alternativas. O marido e pai dos autores nada disse.
Quando “D” faleceu, em 17/08/2019, o contrato de seguro referente à apólice 5.001.500 já não vigorava, pelo que bem esteve a seguradora ré ao negar a cobertura.

Relembramos que:
- Os pedidos formulados foram a condenação da ré seguradora a pagar o capital seguro a favor da tomadora do seguro, CGD, e, a haver algum valor remanescente, a pagá-lo aos herdeiros do falecido, acrescido dos juros de mora até à conclusão do processo; e a condenação da ré CGD a reembolsar os autores, na qualidade de herdeiros, do valor correspondente às mensalidades indevidamente pagas, desde a data do óbito e até ressarcimento pela ré seguradora;
- As rés foram condenadas nos pedidos, tal como formulados;
- Apenas a ré seguradora recorreu, a CGD não o fez.
Impõe-se interpretar o pedido formulado contra a CGD, bem como interpretar o dispositivo da sentença nessa parte, e concluir que aquele pedido e a condenação da CGD são absolutamente dependentes da procedência do pedido formulado contra a Fidelidade.
Procedendo a apelação e sendo a seguradora absolvida, impõe-se a improcedência do pedido formulado contra a entidade bancária.

IV. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar a apelação totalmente procedente e, revogando a sentença, absolvem as rés dos pedidos contra si formulados.
Custas pelos apelados.

Lisboa, 08/05/2025
Higina Castelo
Fernando Alberto Caetano Besteiro
Susana Maria Mesquita Gonçalves