Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | EDUARDO DE SOUSA PAIVA | ||
| Descritores: | SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA PRISÃO EFECTIVA BEM JURÍDICO PROTEGIDO OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA SIMPLES AMEAÇA JUIZO DE PROGNOSE | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 10/09/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
| Sumário: | Sumário: (da responsabilidade do Relator) I. A suspensão da execução da pena de prisão, por expressa disposição legal, não é automática nem é a regra, só devendo ter lugar, em pena não superior a 5 anos, se e quando o Tribunal concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. II. É que, a lei não diz que, as penas de prisão não superiores a 5 anos são suspensas na sua execução, salvo se o Tribunal concluir que tal suspensão é insuficiente para as finalidades das penas. O que a lei estabelece é precisamente o contrário, ou seja, que, a suspensão só tem lugar, quando o Tribunal formule um juízo de prognose favorável. III. Ou seja, não basta que a pena concreta seja não superior a 5 anos, sendo ainda necessário que o Tribunal possa formular um concreto e positivo juízo de prognose favorável, no sentido de que, a simples ameaça da pena seja suficiente para satisfazer as necessidades da punição, ou seja, que seja suficiente para a proteção dos bens jurídicos e para a reintegração do agente na comunidade (cfr. artº 40º, nº 1 do C.P.), isto é, para acautelar não só as necessidades de prevenção especial mas também as necessidades de prevenção geral. IV. Quando o Tribunal decida suspender a pena na sua execução, terá de explicar, com factos concretos, porque é que formula o tal juízo de prognose favorável, à luz dos critérios previstos no artº 50º, nº 1 do C.P., que são a personalidade do arguido, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste. V. Face à necessidade de satisfazer as exigências de prevenção geral e especial, não basta que a simples censura do facto e ameaça da pena seja suficiente para a reintegração do agente na comunidade, tornando-se ainda necessário que consiga acautelar a proteção dos bens jurídicos, o que significa que, as exigências de prevenção geral, funcionando como exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico, podem ser impeditivas da suspensão da execução da pena, mesmo que o Tribunal conclua por um prognóstico favorável à luz de considerações exclusivas de socialização do arguido. VI. A ausência de arrependimento, a violência empregue e a consequente energia criminosa despendida, as condenações anteriores - que demonstram uma persistência e reiteração na prática de crimes, em especial com o emprego de violência física - e o cometimento dos crimes objeto do presente processo em pleno período de suspensão da execução de pena de prisão a que anteriormente tinha sido condenado, são bem elucidativos das elevadas necessidades de prevenção especial e da personalidade do arguido, levando a que o Tribunal não possa formular um prognóstico favorável, quanto à suficiência da simples ameaça da pena. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO No processo comum coletivo nº 308/21.1... do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, Juízo Central Criminal de ... – ... 4, por acórdão proferido a .../.../2025, o arguido AA foi condenado na pena única de 3 (três) anos de prisão , resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares de: a) 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão, pela prática de um crime (doloso) de ofensa à integridade física simples; e b) 9 (nove) meses de prisão, pela prática de um crime de ameaça simples. *** Inconformado com a sua condenação em pena de prisão efetiva, o arguido interpôs recurso, pugnando pela suspensão da execução da pena e para tanto concluindo que: «1. O arguido, ora recorrente, foi condenado nos presentes autos pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples previsto e punido pelo art. 143º do Código Penal, na pena de dois anos e nove meses de prisão e pela prática de um crime de ameaça simples previsto e punido pelo art. 153º do Código Penal, na pena de nove meses de prisão. 2. Em cúmulo jurídico, das penas referidas no artigo anterior, na pena única de 3 anos de prisão. 3. Não se conformando o arguido com o acórdão proferido. 4. Entende o arguido que a pena de prisão em que foi condenado deveria ter sido suspensa na sua execução nos termos do disposto no art. 50º do Código Penal. 5. Não foi esse o entendimento do tribunal “a quo”. 6. Mas entende o arguido estarem reunidas as condições para a suspensão da execução da pena em que foi condenado. 7. A pena em que foi condenado é inferior a cinco anos (3 anos). 8. O arguido está integrado familiarmente. Tem o apoio da mãe e do padrasto com quem vive atualmente durante os dias da semana; e também o apoio do pai. 9. Ao contrário do referido no douto acórdão proferido está integrado profissionalmente. 10. Trabalhou entre ...2.../2022 na construção civil na mesma empresa em que trabalhava o pai. Ficando o pai entretanto desempregado e o arguido também. 11. Não obstante continuou a trabalhar na construção civil como trabalhador indiferenciado na sua zona de residência com regularidade, fazendo trabalhos por conta de empreiteiros conhecidos. 12. Provendo pelo seu sustento; não obstante como se referiu anteriormente ter o apoio dos pais e do padrasto. 13. O arguido é verdade que tem antecedentes criminais, mas desde a data dos presentes fatos, há cerca de quatro anos, que se afastou completamente da prática de atos de natureza reprovável, sem quaisquer infrações. 14. Tendo vindo a dar um rumo adequado à sua vida. Uma vida de trabalho e de relacionamento saudável com os seus familiares, namorada e amigos. 15. Sendo de concluir que a simples censura do fato e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de punição. 16. O tribunal “a quo” ao não ter suspendido a execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado, não fez uma correta aplicação do art. 50º do Código Penal. 17. Violando deste modo o art. 50º do Código Penal.» * O recurso foi admitido com subida imediata, nos autos e efeito suspensivo. * O Ministério Público respondeu, pugnando pela improcedência do recurso, formulado para tal as seguintes conclusões: «1 - O arguido, tendo sido condenado numa pena única de prisão de 3 anos pela prática de um crime de ofensa à integridade física e de um crime de ameaça, entende que a mesma deveria ter sido suspensa na sua execução, sendo que ao determinar a sua execução efetiva, entende ter sido violado o artº 50º do Código Penal; 2 – O Ministério Público adere n integra à fundamentação do Tribunal recorrido, por entender que o mesmo decidiu com inteira justeza. 3 – Na verdade, o arguido tem já diversos antecedentes criminais averbados no seu CRC, alguns deles pela prática de crimes da mesma natureza. 4 – O arguido recorrente praticou os crimes pelos quais foi condenado no período da suspensão da execução de uma pena de prisão em que o mesmo se encontrava condenado, para mais, pela prática de crimes da mesma natureza, o que evidencia uma personalidade evidentemente contra o direito, de desconsideração pelos Tribunais e de desrespeito pela Justiça. 5 - Perante a conduta e personalidade evidenciada pelo arguido, não se mostra possível fazer qualquer juízo de prognose favorável àquele para a aplicação de nova suspensão da execução da pena de prisão, para mais, relativamente á prática de crimes da mesma natureza dos cometidos no processo cuja execução da pena se encontrava suspensa. 6 – O Tribunal a quo fez a correta aplicação da lei, e bem andou ao condenar o arguido numa pena de prisão efetiva, sendo que só esta se mostra adequada e proporcional a salvaguardar as necessidades de prevenção geral e especial que o caso merece. 7 – Face ao exposto, entende-se ser de manter, na íntegra, o Acórdão recorrido por nenhum reparo nos merecer.» * Neste Tribunal da Relação, a Digna Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. * Foi proferido despacho a efetuar o exame preliminar, mantendo o efeito e regime de subida do recurso. Após os vistos foram os autos à conferência. Nada obsta à prolação de acórdão. **** II. OBJETO DO RECURSO Em conformidade com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das Secções do S.T.J. de 19/10/1995 (in D.R., série I-A, de 28/12/1995), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. Atendendo às conclusões apresentadas, a única questão que importa apreciar é se a pena única de prisão resultante do cúmulo jurídico das duas penas parciais a que o arguido foi condenado deve ou não ser suspensa na sua execução. **** III. FUNDAMENTAÇÃO *** A) DECISÃO RECORRIDA O acórdão recorrido estabeleceu os seguintes factos provados: «1. No dia ... de ... de 2021, cerca das 18h:40m, o assistente BB aparcou o seu veículo automóvel junto à sua residência, sita na .... 2. Nessas circunstâncias de tempo lugar, quando o assistente já se encontrava a trancar o veículo automóvel, o arguido AA, em passo acelerado, dirigiu-se a ele e empurrou-o na zona do tronco. 3. Em consequência do empurrão desferido pelo arguido, o assistente foi projetado por uma distância não concretamente apurada, acabando por cair no solo, desamparado e sob o lado esquerdo do seu corpo. 4. Já com o assistente caído no solo, o arguido ainda se lhe dirigiu, tendo sido impedido de se aproximar do mesmo por terceiros que assistiram aos factos. 5. Em consequência da atuação do arguido, o assistente ficou com o membro inferior esquerdo partido, tendo de receber tratamento médico, no ..., em ..., onde foi submetido a intervenção cirúrgica no dia ... de ... de 2021. 6. Como consequência direta e necessária do comportamento do arguido, o assistente sofreu dores no membro inferior esquerdo, tendo ficado com três cicatrizes cirúrgicas lineares e longitudinais, nacaradas, na face lateral da coxa com cerca de 5 centímetros de cumprimento cada, duas cicatrizes cirúrgicas rosadas com orientação oblíqua na face anterior do terço proximal da perna, com cerca de 10 centímetros de cumprimento cada, cicatrizes próprias de artroscopia na face anterior do joelho, muito discretas, sem limitação da mobilidade da anca, ligeira limitação na flexão do joelho associado à dor. 7. O assistente ficou internado no ..., em ..., até ao dia ... de ... de 2021, tendo posteriormente realizado tratamentos de medicina física e de reabilitação, com seguimento em fisiatria, até ... de ... de 2022. 8. Tais lesões determinaram para o assistente um período de doença de 467 dias, todos com afetação da capacidade de trabalho geral e de trabalho profissional. 9. As lesões acima descritas, determinaram para o assistente consequências permanentes que se traduzem no status pós fratura do fémur e da tíbia à esquerda, com cicatrizes dispersas pelo membro inferior esquerdo e ligeira limitação da mobilidade do joelho, apresentando marcha claudicante e fenómenos dolorosos quando faz carga sobre o membro inferior esquerdo, tendo de repousar periodicamente. 10. O assistente é pintor de automóveis de profissão, o que implica flexão da perna esquerda e do joelho esquerdo. 11. No dia ... de ... de 2022, cerca das 17h:50m, o arguido chegou ao estabelecimento comercial denominado “...”, sito na ..., na ..., onde já estava o assistente. 12. Naquelas circunstâncias de tempo e local, o arguido começou a falar com o assistente, tendo-lhe sido dito “para se ir embora”. 13. Contudo, o arguido não acatou tal sugestão e dirigiu-se ao assistente dizendo-lhe que o ia partir todo, a si e à sua família. 14. Nesse momento, alguns dos clientes do estabelecimento comercial intervieram e o assistente abandonou o local, dirigindo-se à esquadra da ... para relatar o sucedido. 15. O assistente temeu pela sua integridade física e vida, receando que o arguido concretizasse as ameaças que havia proferido. 16. O arguido sabia que as expressões que dirigiu ao assistente eram aptas a provocar neste, receio de vir a sofrer algum mal, o que representou, quis e logrou. 17. O arguido, ao desferir um empurrão no assistente, sabendo que o fazia com a força decorrente do passo de corrida que empregou, agiu com o intuito concretizado de molestar o corpo daquele de maneira que sabia ser apta a provocar-lhe a queda. 18. O arguido atuou igualmente com o propósito conseguido de tolher a liberdade, o sossego e capacidade de se autodeterminar do assistente, causando com isso angústia, inquietação e medo ao mesmo, o que logrou. 19. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei. 20. O arguido tem antecedentes criminais: a) Por decisão transitada em julgado em .../.../2012, foi o arguido condenado pela prática, em ..., de um crime de consumo de estupefacientes, na pena de 60 dias de multa [extinta por prescrição]; b) Por decisão transitada em julgado em .../.../2013, foi o arguido condenado pela prática, em .../.../2012, de um crime de ameaça agravada e de um crime de injúria agravada, na pena de 150 dias de multa [extinta pelo pagamento]; c) Por decisão transitada em julgado em .../.../2016, foi o arguido condenado pela prática, em .../.../2013, de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 2 anos de prisão suspensa pelo mesmo período, com regime de prova [extinta]; d) Por decisão transitada em julgado em .../.../2017, foi o arguido condenado pela prática, em .../.../2017, de dois crimes de injúria agravada, na pena de 160 dias de multa [extinta pelo cumprimento]; e) Por decisão transitada em julgado em .../.../2019, foi o arguido condenado pela prática, em .../.../2017, de um crime de ameaça agravada e de dois crimes de ofensa à integridade física qualificada, na pena de 3 anos e um mês de prisão suspensa pelo mesmo período com regime de prova; f) Por decisão transitada em julgado em .../.../2018, foi o arguido condenado pela prática, em .../.../2017, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 100 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 4 meses. 21. O arguido é o filho único da união dos pais, sendo natural de ... e estando em ... desde os seus cinco anos de vida. 22. Quando o arguido tinha 15 anos, ocorreu a ruptura conjugal e separação de facto do casal, tendo os progenitores saído da habitação e constituído outros agregados familiares, ficando o arguido a viver sozinho na casa de família. 23. O arguido frequentou o 6.º ano de escolaridade, tendo sofrido retenções associadas a dificuldades de aprendizagem. 24. Aos 15 anos, o arguido teve o primeiro contacto com o sistema tutelar educativo, cumprindo medidas de internamento em centro educativo aos fins-de-semana. 25. O arguido trabalhou no ramo da construção civil entre ... e ..., tendo ficado desempregado nessa data. 26. Atualmente não se encontra a trabalhar de forma constante, exercendo funções ocasionalmente no ramo da construção civil. 27. O arguido ocupa o tempo livre em jogos virtuais. 28. O arguido consome pontualmente substâncias psicoactivas e bebidas alcoólicas. 29. Os custos da intervenção cirúrgica referida em 5) e dos tratamentos referidos em 7) cifraram-se em 6 820,78 €, não tendo até à data sido liquidados ao .... 30. Face às lesões referidas em 5) e 6), o assistente sofreu dores, que ainda subsistem. 31. O assistente suportou despesas de farmácia em virtude das lesões referidas em 5) e 6) no valor de 82,88€. 32. O assistente tem medo de represálias e sente-se constrangido e receoso. 33. À data da prática dos factos, o assistente estava sem trabalhar, encontrando-se há meses em recuperação de problemas cardíacos de que padece. 34. Após os factos, o assistente não voltou a trabalhar. 35. O arguido imputa ao assistente o facto de a sua mãe ter ido residir para casa do padrasto. 36. O arguido é tido pela comunidade que o rodeia como uma pessoa provocadora, de difícil trato.» *** B) APRECIAÇÃO DO RECURSO Conforme acima enunciado, face às conclusões do recorrente, a única questão que importa decidir é se a pena única de prisão, resultante do cúmulo jurídicos de duas penas parcelares) a que o arguido foi condenado deve ou não ser suspensa na sua execução. Defende o recorrente que, por estar socialmente integrado, deveria ter lugar tal suspensão, tendo a decisão recorrida, ao não a determinar, “violado o artº 50º do Código Penal”. Já o Ministério Público entende que, a decisão recorrida deve ser mantida, porquanto, face aos antecedentes criminais do arguido e por os factos objeto do presente processo terem sido praticados no período de suspensão da execução de pena de prisão a que antes tinha sido condenado, é de concluir que a simples censura do facto e a ameaça da pena são insuficientes para a realização das necessidades da punição. Vejamos se é de suspender a pena única a que o arguido foi condenado, uma vez que se trata de pena de prisão não superior a 5 (cinco) anos. Nos termos do artº 50º, nº 1 do Código Penal, o Tribunal só suspende a execução de pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos “se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”. Tal norma, conforme se retira da sua leitura, exige a verificação de um pressuposto de aplicabilidade e de um requisito para a efetiva suspensão. Assim, é pressuposto de aplicabilidade do regime da suspensão, ser a pena aplicada não superior a 5 anos. Verificado tal pressuposto, exige a lei, para que a pena possa ser suspensa na sua execução, que o Tribunal conclua que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Ou seja, não basta que a pena concreta seja não superior a 5 anos, sendo ainda necessário que o Tribunal formule um concreto e positivo juízo de prognose favorável, no sentido de que, a simples ameaça da pena seja suficiente para satisfazer as necessidades da punição, ou seja, que seja suficiente para a proteção dos bens jurídicos e para a reintegração do agente na comunidade (cfr. artº 40º, nº 1 do Código Penal). Deste modo, não pretende o legislador que, em penas de prisão até 5 anos, a suspensão seja quase automática, devendo o Tribunal, quando não determine a suspensão, fundamentar, explicando os motivos que o levam a não suspender, tais penas, na sua execução. É que, a lei não diz que, as penas de prisão não superiores a 5 anos são suspensas na sua execução, salvo se o Tribunal concluir que tal suspensão é insuficiente para as finalidades das penas. O que a lei estabelece é precisamente o contrário, ou seja, que, a suspensão só tem lugar, quando o Tribunal formule um juízo de prognose favorável. Assim sendo, sempre que o Tribunal decida suspender a pena na sua execução, terá de explicar, com factos concretos, porque é que formula o tal juízo de prognose favorável, que o leva a suspender a pena, na sua execução. Os critérios a que o Tribunal há de recorrer, em ordem a formular o referido juízo de prognose favorável, hão de ser, segundo se retira do disposto no artº 50º, nº 1 do Código Penal, a personalidade do arguido, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste. De tal conjunto de critérios, retirará o Tribunal a conclusão de que, a simples censura do facto e a ameaça da pena servirão para afastar o arguido da criminalidade e para censurar o facto, cumprindo, assim, a pena, as suas finalidades de proteção de bens jurídicos e de reintegração do agente na comunidade. Em suma, satisfazendo, a pena, as exigências de prevenção geral e de prevenção especial. O acórdão recorrido não determinou a suspensão da execução da pena, fundamentando devidamente, porque não podia formular juízo de prognose favorável, no sentido de que, a simples ameaça da pena seria suficiente para satisfazer as necessidades da punição, ou seja, que não seria suficiente para a proteção dos bens jurídicos e para a reintegração do agente na comunidade. Fê-lo com o fundamento de que (e passamos a citar), “a finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão é o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes, tendo por base o princípio ressocializador que orienta o nosso ordenamento jurídico-penal. Tendo presente a matéria de facto apurada, pode concluir-se que a ideia da prevenção não encontra eco na matéria de facto dada como provada, atendendo à personalidade do arguido, às circunstâncias em que os crimes foram cometidos e à sua conduta anterior e posterior a estes, supra enunciadas. Com efeito, importa salientar que o arguido praticou os factos em apreço no período de suspensão de uma pena de prisão que lhe foi aplicada, justamente pela prática de crimes de ameaça agravada e de ofensa à integridade física qualificada. Não pode concluir-se que tal suspensão da execução da pena tenha surtido efeito, na medida em que não obviou a que o arguido, nesse período, praticasse novos factos atentatórios da liberdade pessoal e da integridade física de terceiros. Por outro lado, o arguido não se mostra inserido social e profissionalmente, não verbalizando qualquer arrependimento perante as consequências das suas condutas e manifestando uma total desinserção do meio social onde se encontra. Atendendo a todas as apontadas circunstâncias, torna-se inevitável a conclusão de que a ameaça da prisão efetiva não salvaguarda as finalidades da punição, impossibilitando o Tribunal de recorrer a tal instituto legal.» Vejamos se é ou não de formular juízo de prognose favorável, no sentido de que, a simples ameaça da pena seria suficiente para satisfazer as necessidades da punição, ou seja, que seria suficiente para a proteção dos bens jurídicos e para a reintegração do agente na comunidade. O arguido, a nível profissional, apesar de ter realizado alguns trabalhos na construção civil, fá-lo “ocasionalmente”, uma vez que “não se encontra a trabalhar de forma constante”. Por outro lado, a ausência de qualquer forma de arrependimento, o modo de execução dos factos, com a violência empregue e a consequente energia criminosa despendida, e o facto de o arguido ser tido pela comunidade como pessoa provocadora e de difícil trato, são bem demonstrativos da sua personalidade. O arguido já foi condenado pela prática de dez crimes, dos quais vários de ameaças, injurias e ofensas à integridade física qualificadas, mas também um crime de tráfico de estupefacientes, o que demonstra uma persistência e reiteração na prática de crimes, em especial com o emprego de violência física. Já beneficiou de uma condenação em pena de prisão suspensa na sua execução, que não foi suficiente para o afastar do cometimento de novos crimes, como o demonstra a prática dos crimes objeto do presente processo. A que acresce a circunstância de ter cometido estes crimes em pleno período de suspensão da execução de pena de prisão a que anteriormente tinha sido condenado, o que tudo é bem elucidativo das elevadas necessidades de prevenção especial que se fazem sentir. Deste modo, o comportamento do arguido é bem revelador da sua personalidade e levam a que o Tribunal não possa formular um prognóstico favorável, quanto à suficiência da simples ameaça da pena. Por outro lado, atendendo às circunstâncias dos crimes, que, foram dois, à violência empregue, gerando ainda sentimento de insegurança na comunidade, temos de concluir serem elevadas, tanto as exigências de prevenção geral, como as exigências de prevenção especial. Consequentemente, no caso concreto, só uma pena de prisão efetiva e de duração, pelo menos, da fixada no acórdão recorrido logrará “a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. Deste modo, face à personalidade do arguido, ao seu comportamento anterior e posterior aos factos e às circunstâncias dos dois crimes, é de concluir, com toda a segurança, que a simples censura do facto e a ameaça da prisão são manifestamente insuficientes para o afastar da criminalidade e para satisfazer as necessidades de reprovação e de prevenção de cometimento de futuros crimes. Ademais, é elevado o sentimento de insegurança que condutas desta natureza geram na comunidade, bem como a frequência com que ocorrem, sendo certo que, in casu, só uma pena de prisão efetiva e de duração não despicienda, repõe na comunidade a confiança na validade e eficácia das normas violadas. É quanto basta para se concluir pela não suspensão da execução da pena. Consequentemente, improcede o recurso. *** IV. DECISÃO Pelo exposto, acordamos em negar provimento ao recurso, confirmando, na íntegra, o douto acórdão recorrido. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça por si devida em 4 (quatro) UC. * Lisboa, 9 de outubro de 2025 Eduardo de Sousa Paiva Diogo Coelho de Sousa Leitão Ana Paula Guedes |