Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3430/20.8T8CSC.L1-6
Relator: EDUARDO PETERSEN SILVA
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
FURTO
AUTOMÓVEL
PARTICIPAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/08/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Sumário (a que se refere o artigo 663º nº 7 do CPC e elaborado pelo relator):
A participação do furto de um veículo, para efeitos de seguro, às autoridades policiais, não se confunde com o facto gerador da responsabilidade da seguradora, que é o próprio furto.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório
AA, com os sinais dos autos, intentou a presente acção declarativa com processo comum contra Generali Seguros, S.A., peticionando a condenação desta a pagar-lhe: «a) €19.189,87 (…) de danos patrimoniais; b) 4.000,00 (…) de danos morais; c) Lucros cessantes; d) (…) juros legais contados desde a data da citação até integral pagamento».
Em síntese, alegou ser dona de um veículo automóvel que foi furtado, sendo que o furto estava coberto por seguro de responsabilidade civil automóvel que contratou com a Ré. A Ré declinou a responsabilidade. Além disso, a Ré não entregou à Autora um veículo de substituição, pelo que a Autora deve ser ressarcida das quantias que despendeu com o aluguer de uma outra viatura, ao que acrescem lucros cessantes e danos não patrimoniais sofridos.
A Ré contestou impugnando a ocorrência do furto. Invocou ainda que jamais poderia proceder a pretensão da Autora pelo valor peticionado, uma vez que o valor a considerar para indemnização seria o decorrente da aplicação da tabela de desvalorização constante das condições particulares e não o valor do capital no momento da celebração do contrato. Negou que a Autora tivesse direito a veículo de substituição, e alegou que a Autora não concretizou minimamente os factos nos quais sustenta o seu pedido de indemnização, sendo que os danos não patrimoniais reclamados não merecem a tutela do direito.
Saneados os autos tabelarmente e fixado o valor de €23.189,87, veio a realizar-se a audiência de julgamento, na sequência da qual foi proferida sentença de cuja parte dispositiva consta:
Em face do exposto e nos termos das disposições legais supra citadas, o Tribunal julga a presente ação totalmente improcedente, por não provada, e em consequência:
A. Absolve-se a Ré, Generali Seguros, S.A., do pedido de condenação no pagamento a AA de 19.189,87 € por danos patrimoniais, 4000,00 € por danos não patrimoniais e lucros cessantes, acrescido dos respetivos juros de mora.
B. Julga-se improcedente o incidente de litigância de má-fé processual e, em consequência, absolve-se a Autora, AA do mesmo.
Custas pela Autora – cf. artigo 527.º, n.º s 1 e 2 do Código de Processo Civil”.
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Inconformada, a Autora interpôs o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
I. (…).
II. O tema decidendi no presente recurso consiste na apreciação de nulidades da sentença, nos termos do artigo 615.º do Código de Processo Civil e impugnação dos factos tidos como assentes, bem como, as provas produzidas, os quais nos termos do artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, impunham uma decisão diversa.
III. Considerou também o Tribunal a quo, que o furto do veículo da ora recorrente, com a matrícula ..-SJ-.., não teria ocorrido.
IV. O Tribunal a quo, deveria ter apreciado a matéria de facto de acordo com as regras de lógica e de experiência reconduzindo os fundamentos a critérios objetivos para que a decisão possa ser objetivável e assim oponível a terceiros a fim de as partes poderem exercer o seu direito ao recurso.
V. Segundo o disposto no citado artigo 609º, n.º 1 do Código de Processo Civil, a sentença tem de se inserir no âmbito do pedido, não podendo o juiz condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir.
VI. No que diz respeito “para a morada da Autora, que é a por si indicada nos presentes autos” podemos considerar que estamos perante um facto instrumental, no entanto, o Tribunal a quo não o carreou para o processo, nem o sujeitou a prova.
VII. No que concerne ao facto “outorgaram um documento escrito” resulta claro que estamos perante um facto essencial, o que gera uma nulidade da decisão.
VIII. É uma verdadeira decisão surpresa, proibida pelo nosso sistema judicial.
IX. Urge questionar como é que o Tribunal a quo pode considerar que uma inquirição não contraditória feita perante uma pessoa que está a fazer um trabalho pago por uma das partes e cujo resultado se for favorável a essa parte levará ao não pagamento de uma indemnização substancial terá algum valor?
X. Pelo que o resultado desse depoimento/declarações, seja qual for a forma em que se traduza, designadamente transmitido pelo depoimento do averiguador ou por algum escrito elaborado na sua sequência, não tem qualquer valor.
XI. Cabe esclarecer que quando as partes incluem num contrato de seguro a cobertura do risco do furto do bem segurado, não se pode exigir que se faça a prova com toda a certeza do furto, devendo ela fazer-se por meio de indícios, entre eles o mais forte e com valor bastante, o da formalização de uma queixa junto das autoridades policiais.
XII. É evidente que existe uma contradição insanável, que gera a nulidade da sentença.
XIII. Mais, o segurador, constituiu-se na obrigação de indemnizar automaticamente o segurado, passados que se encontraram os 60 (sessenta dias).
XIV. Não menos importante, o próprio Tribunal a quo, motivou sua decisão em relação à matéria de facto, tendo por base um único depoimento, que como tivemos oportunidade de referir não pode ser valorado como único meio de prova ou meio de prova por excelência.
XV. Pelo que, também aqui o Tribunal a quo ultrapassou os seus poderes de cognição.
XVI. Pelo que, também aqui o Tribunal a quo andou mal!
Pelo exposto, e no que demais for doutamente suprido, a sentença recorrida deverá ser alterada nos termos acima peticionados, dando-se provimento ao presente recurso (…)”.
Contra-alegou a Ré, formulando a final as seguintes conclusões:
“1) A sentença recorrida deve ser mantida na íntegra, uma vez que a decisão de dar o furto como não provado foi devidamente fundamentada com base na ausência de prova idónea e suficiente.
2) A fundamentação do Tribunal, ao considerar as regras da experiência comum e os juízos de normalidade, foi adequada e justificada pela falta de elementos de prova corroborantes.
Inexistência de Nulidade na Sentença
3) A alegação de nulidade na redação dos artigos 3.º e 7.º dos factos assentes é infundada.
4) A expressão “outorgaram um documento escrito” é clara e não diverge do alegado pela Recorrente, não havendo qualquer nulidade.
5) A identificação da morada da Autora na petição inicial, coincidente com a da apólice, não constitui uma presunção, mas sim um facto aceite pela Ré, configurando uma confissão.
Impugnação dos Factos Provados 11 e 12
6) As declarações manuscritas da Recorrente, prestadas ao averiguador da Recorrida, foram confirmadas pela testemunha BB e pelo companheiro da Recorrente.
7) Não há fundamento para a impugnação dos factos 11 e 12, uma vez que foram devidamente comprovados.
Impugnação do Facto Provado 17
8) A impugnação do facto 17 pela Recorrente é infundada, pois a testemunha BB confirmou que a Recorrente e o seu companheiro não sabiam quantas chaves tinham do veículo, o que gerou estranheza e foi devidamente considerado pelo Tribunal.
Impugnação do Facto Provado 18
9) A impugnação do facto 18 também é infundada, uma vez que a testemunha confirmou que o companheiro da Recorrente tinha tido sinistros anteriores, contradizendo a sua afirmação de não ter tido problemas com seguradoras.
Fundamentação da Sentença Relativa à Inexistência de Prova do Furto
10) A Recorrente alega que a apresentação da queixa junto das autoridades seria suficiente para demonstrar a ocorrência do furto, no entanto, o Tribunal exigiu uma prova mais robusta, como testemunhas ou outros elementos corroborantes, que não foram apresentados.
11) A queixa apresentada não tem força probatória plena em relação aos factos alegados, conforme decidido pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26/10/2004, processo 0423773, que esclarece que tais documentos apenas atestam as declarações feitas às autoridades, não a veracidade dos factos.
Impugnação da Matéria de Facto em Geral
12) A Recorrente discorda da apreciação da prova testemunhal, especialmente da testemunha BB, mas o Tribunal fundamentou adequadamente a sua decisão com base na análise lógica e na experiência comum.
13) O princípio da liberdade de julgamento, conforme o artigo 607.º do C.P.C., permite ao Tribunal apreciar livremente as provas e formar a sua convicção sobre os factos controvertidos.
14) A Recorrente ignora este princípio ao pretender que a decisão recorrida seja alterada sem apresentar fundamentos sólidos para tal.
15) A reapreciação da matéria de facto deve respeitar o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador de primeira instância, que beneficia dos princípios da oralidade e da mediação.
16) Conforme o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 04.02.2016 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31.05.2016, a decisão de primeira instância só deve ser alterada em casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão.
17) A prudente convicção do Tribunal deve ser suportada numa lógica racional, segundo juízos de probabilidade séria, baseada no resultado da prova apreciado à luz das regras da experiência comum e atentas as particularidades de cada caso.
18) A exigência relativamente à prova deve variar em função dos bens ou direitos em jogo, sendo mais exigente quanto maior for a improbabilidade do evento alegado.
19) Quando a prova é difícil de obter (probatio diabólica), o julgador deve ajustar o standard de prova para um nível de exigência mais baixo.
20) Para que a decisão de 1.ª instância seja alterada, deve-se demonstrar que na formação da convicção do julgador foram violadas regras de experiência, ciência e lógica, o que não ocorreu no presente caso.
Termos em que deve ser integralmente mantida a douta decisão recorrida, (…)”.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do Código de Processo Civil - as questões a decidir são a nulidade de sentença e a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
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III. Matéria de facto
A decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de primeira instância é a seguinte:
“A. Factos provados
Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal considerou provados, os seguintes factos:
1. A Autora é dona do veículo automóvel AUDI A4 AVANT, 3.0 TDI SPORT, com a matrícula ..-SJ-.., que se encontra inscrito em seu nome desde 14 de setembro de 2017.
2. No dia 14 de setembro de 2017, o veículo já tinha sido inscrito em nome de CC, que o importou da Alemanha para Portugal.
3. Autora e Ré, esta última através da sua marca «Logo», em 14 de setembro de 2017, outorgaram um documento escrito relativamente ao veículo de matrícula ..-SJ-.., ao qual foi atribuída a apólice n.º ...915.
4. Além da responsabilidade civil obrigatória, por esse documento foi também coberto o risco de furto e roubo do veículo.
5. Constava desse documento o seguinte:
(imagem, sem relevo para a decisão do presente recurso).
6. À data da outorga do documento, o «Capital Seguro do Veículo» era de 15.439,87€.
7. A Ré comunicou à Autora que, a partir de 14 de setembro de 2018, a apólice passaria a vigorar com o «Capital Seguro do Veículo» de 10.872,38€.
8. Em 28 de novembro de 2018, a Autora dirigiu-se à Polícia de Segurança Pública – 52ª Esquadra – Parede da Divisão Policial de Cascais, onde participou o furto do veículo de matrícula ..-SJ-.., na Rua..., em frente ao n.º ..., em São Domingos de Rana.
9. Posteriormente, em data não concretamente determinada, a Autora participou o furto na Companhia de Seguros da Ré, tendo aquela iniciado um processo de averiguação.
10. No decurso da averiguação, em 01.02.2019, dois averiguadores da Ré, DD e BB, reuniram pessoalmente com a Autora que se encontrava acompanhada do seu companheiro, EE, no local de trabalho daquela.
11. Foi EE quem prestou maiores esclarecimentos relativamente ao furto.
12. Com efeito, existiu necessidade de a Autora atender um cliente e durante esse período, os averiguadores da Ré e EE mantiveram conversa no exterior do local de trabalho.
13. O casal referiu aos averiguadores da Ré que tinha adquirido o veículo através de um anúncio no OLX, tendo o pagamento sido efetuado em dinheiro, por aproximadamente 12.000,00 €.
14. Questionados pela Ré sobre quem era o vendedor, disseram que não conheciam a pessoa, mas quando lhes foi perguntado uma segunda vez EE recorreu ao seu telemóvel e indicou o nome do vendedor, CC.
15. O casal mencionou também que à data da averiguação o veículo tinha cerca de 178.000 quilómetros.
16. A Autora declarou ainda que pouco tempo após terem apresentado queixa do furto receberam um documento a dar-lhes nota do arquivamento do processo.
17. Na altura da averiguação a Autora e o seu companheiro não tinham as chaves do veículo seguro consigo e não souberam indicar quantas chaves teriam do mesmo, tendo EE referido ter várias chaves de veículos Audi em casa e que por esse motivo teria que procurar saber se alguma delas era do veículo em causa.
18. Foi também dito por EE que o casal nunca tinha estado envolvido em «assuntos de maior» (cit.) com companhias de seguro, tendo apenas mencionado um pedido de assistência em viagem e um acidente de menor gravidade.
19. O casal referiu ainda aos averiguadores da Ré que considerava que a desvalorização do «Capital Seguro do Veículo» era maior do que estavam a contar.
20. A 13 de março de 2019, a Ré veio informar a Autora que considerava que o sinistro não tinha ocorrido nos moldes em que foi participado e declinava qualquer tipo de responsabilidade.
21. A Ré veio a apurar que, em abril de 2018, o veículo de matrícula ..-SJ-.. já contava com 201.000 quilómetros percorridos.
22. Apurou, igualmente, que em 29 de junho de 2009, EE, participou o furto de um Audi A4, com a matrícula ..-..-VG, na Companhia de Seguros Tranquilidade.
23. Na sequência deste furto, a Companhia de Seguros Tranquilidade determinou a perda total e liquidou 23.496,00 € a EE.
24. Verificou, também, que EE participou um despiste isolado, ocorrido em 23 de dezembro de 2014, em que ia a conduzir um veículo de marca MG, com a matrícula ..-..-ZL à Companhia de Seguros Fidelidade.
25. O veículo tinha sido seguro a partir de 5 de dezembro 2014 junto da Fidelidade, 18 dias antes do despiste.
26. Na sequência desse sinistro, a Companhia de Seguros Fidelidade aprovou a liquidação de 9.945 € pelo capital e 600 € pela privação de uso, num valor total de 10.545,00, à irmã de EE, FF.
27. Por fim, em 11.08.2020, EE participou na PSP o furto de um Audi A6, por si importado, com a matrícula ..-ZB-...
28. O furto referido em 27. ocorreu na Rua... São Domingos de Rana.
29. Na sequência deste sinistro, a Companhia de Seguros Allianz, S.A. liquidou o valor de 40.100,00 €.
30. O companheiro da Autora já teve registado em seu nome 22 apólices de veículos diferentes.
31. De igual forma, também a Autora já teve registado em seu nome mais de seis seguros para diferentes veículos.
B. Factos não provados
Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal considerou não provados os seguintes factos:
a) O veículo da Autora, com a matrícula ..-SJ-.., foi furtado.
b) Em 30 de novembro de 2018, a Autora solicitou à Ré um veículo de substituição.
c) A Autora despendeu a quantia de 250 € diários com o aluguer de um outro veículo.
d) Em consequência do mencionado em a), a Autora teve aborrecimentos e desgosto por não ter o seu carro e a situação não ser resolvida.
e) Existência de uma sinistralidade que envolve o anterior proprietário do veículo, CC, os seus familiares e amigos.
Consigna-se que a demais factualidade constante dos articulados não foi considerada por se tratar de matéria conclusiva, repetitiva, de mera impugnação, de Direito, ou não interessar para a boa decisão da causa.
C. Da motivação da decisão de facto
A convicção do Tribunal alicerçou-se na análise crítica e conjugada da prova produzida nos autos, tendo em consideração as regras da experiência comum e os juízos de normalidade, sempre à luz do princípio da livre convicção. Para a formação da convicção do Tribunal foram produzidos os seguintes meios de prova:
• Prova documental, da qual foi tida em conta para a presente decisão:
- Declaração do histórico de propriedade do veículo seguro, obtida junto da Conservatória do Registo Automóvel; - Declarações Aduaneiras de Veículo das matrículas ..-ZB-.. e ..-SJ..; - Condições gerais, especiais e particulares do contrato sobre o veículo de matrícula ..-SJ-.., titulado pela apólice n.º ...915; - Depoimento escrito da Autora recolhido pela Ré aquando da averiguação; - Comunicações da Ré à Autora relativas ao valor do capital seguro a vigorar no final da primeira anuidade; - Auto de denúncia na Polícia de Segurança Pública – 52ª Esquadra – Parede da Divisão Policial de Cascais datado de 28.11.2018; - Comunicação da Ré à Autora a declinar qualquer tipo de responsabilidade pelo alegado furto datada de 13.03.2019; - Documentos relativos ao processo de participação de furto na Companhia de Seguros Tranquilidade de um Audi A4, com a matrícula ..-..-VG, incluindo: participação de sinistro à Seguradora, auto de denúncia à PSP, a declaração de perda total e declaração com o valor a liquidar; - Documentos relativos ao processo de participação de um despiste isolado na Companhia de Seguros Fidelidade de um veículo de marca MG, com a matrícula ..-..-ZL, incluindo: fotografias do veículo, declaração amigável com croquis, proposta de seguro, relatório de peritagem, condições particulares do contrato, comunicação de pagamento de indemnização, certificado de tarifação e certificado internacional de seguro automóvel; - Documentos relativos ao processo de participação de furto na Companhia de Seguros Allianz de um Audi A6 com a matrícula ..-ZB.., incluindo: auto de denúncia à PSP, comprovativo de liquidação e condições contratuais da apólice; - Fotografia do local do alegado furto do veículo de matrícula ..-SJ-..; - Pesquisa realizada na segurnet.pt relativamente ao número de apólices do companheiro da Autora e da Autora.
• Prova testemunhal: EE (companheiro da Autora), BB (perito averiguador na Ré) e GG (coordenador de averiguações e membro da equipa de supervisão de combate à fraude na Ré).
Concretizando.
O direito de propriedade da Autora sobre o Audi de matrícula ..-SJ-.. e o historial anterior do veículo, resulta da declaração do histórico de propriedade do automóvel conjugada com a Declaração Aduaneira do Veículo, ambos juntos aos autos (factos provados 1 e 2).
A celebração de um contrato entre as partes contemplando situações de roubo ou furto do veículo de matrícula ..-SJ-.. não é matéria controvertida nos presentes autos, encontrando-se os termos do contrato devidamente documentados nos autos (factos provados 3, 4 e 5).
O capital seguro do veículo à data da celebração do contrato foi dado como provado com base no acordo das partes – cf. artigos 1.º da petição inicial e 3.º da contestação (facto provado 6).
Já a comunicação dessa desvalorização pela Ré à Autora, resulta provada com base nas comunicações dirigidas pela Ré para a morada da Autora, que é a por si indicada nos presentes autos, dando-lhe nota do valor do capital seguro que iria vigorar no ano seguinte (facto provado 7).
A participação de um furto à PSP pela Autora ficou demonstrada com base no auto de denúncia, datado de 28.11.2018, junto aos presentes autos (facto provado 8). A participação desse mesmo furto pela Autora à Generali Seguros, S.A., ora Ré e o início de um processo de averiguação nessa sequência, resulta provado com base no depoimento da testemunha BB.
Com efeito, a testemunha confirmou que na sequência de uma participação à Seguradora se deslocou juntamente com um colega ao local de trabalho da Autora com o objetivo de recolher informação sobre o furto, o que correspondia a um procedimento normal neste tipo de situações (factos provados 9 e 10).
A testemunha encontrava-se bastante nervosa, crê-se que em virtude de se encontrar em Tribunal, mas revelou através do seu depoimento ter conhecimento direto dos factos e recordar-se de vários detalhes quanto à informação que na altura lhe foi transmitida pela Autora e o seu companheiro quanto ao veículo de matrícula ..-SJ-... Pelas suas respostas e a posição distanciada que ocupa na causa não revelou ter um especial interesse no desfecho do processo, procurando responder com verdade e objetividade, merecendo assim credibilidade ao Tribunal.
A referida testemunha indicou que foi o companheiro da Autora que esclareceu a maior parte das questões no exterior do estabelecimento de trabalho da Autora, tendo-se aquela limitado, no essencial, a prestar um depoimento escrito em virtude de estar ocupada a atender um cliente (factos provados 11 e 12). Ainda assim, o casal terá prestado algumas informações iniciais em conjunto relativamente ao negócio de compra do automóvel, ao preço pago e ao nome do vendedor, este último após alguma insistência, bem como aos quilómetros percorridos pelo veículo (factos provados 13, 14 e 15).
Do depoimento escrito da Autora junto aos autos, resulta o arquivamento do processo crime muito pouco tempo depois da participação do furto (facto provado 16).
O desconhecimento da Autora e do seu companheiro quanto ao número de chaves do veículo na sua posse, bem como o facto de EE ter mencionado ter várias chaves de veículos de marca Audi, resultou demonstrado com base no depoimento da testemunha BB, que confirmou que ouviu o casal prestar declarações neste sentido. Também a ausência de um historial do casal envolvendo «assuntos de maior» (cit.) com seguradoras, resulta provado com base no depoimento da testemunha BB que confirmou ter ouvido EE dizê-lo (factos provados 17 e 18).
No seu depoimento, BB referiu também que a Autora e o seu companheiro mostraram alguma incompreensão com a desvalorização do capital seguro do veículo que lhes foi comunicada na data (facto provado 19).
A decisão da Ré no sentido de declinar qualquer tipo de responsabilidade em virtude de considerar que o furto não ocorreu nos moldes descritos, resultou provada com base na cópia da comunicação à Autora que foi junta aos presentes autos (facto provado 20).
Essa decisão da Ré teve na sua base uma série de circunstâncias que foi apurando quanto à Autora e EE, que lhe levantaram sérias suspeitas sobre a ocorrência de um verdadeiro furto.
Em primeiro lugar, a discrepância na informação prestada quanto ao número de quilómetros efetivamente percorridos pelo veículo de matrícula ..-SJ-... Nesse sentido, BB confirmou que após a realização de pesquisas foi possível apurar que na última inspeção realizada ao veículo, em abril de 2018 (alguns meses antes do alegado furto), aquele já contava com 201.000 quilómetros (facto provado 21).
No entanto, essa suspeita da Ré teve sobretudo na sua base o historial de participações de furtos e acidentes do companheiro da Autora, que ficou demonstrado com base na documentação elaborada pelas diferentes companhias de seguros, melhor discriminada acima (factos provados 22 a 29). Em específico, a importação do veículo com a matrícula ..-ZB-.. pelo companheiro da Autora, resulta provada com base no conteúdo da Declaração Aduaneira do Veículo da qual consta o nome de EE enquanto adquirente/proprietário e a Alemanha como país de procedência (facto provado 27).
Da documentação junta pelas companhias de seguros resulta que esta é a terceira participação que o casal faz do furto de um veículo Audi, tendo a última ocorrência tido estranhamente lugar no mesmo local da dos presentes autos.
Por fim, a Ré também apurou um elevado número de contratos de seguros em nome da Autora e do seu companheiro para diferentes veículos, tendo junto aos presentes autos pesquisas efetuadas no site segurnet.pt com base nas quais se deram aqueles factos como provados (factos provados 30 e 31).
O depoimento da testemunha GG revelou-se especialmente útil para interpretar a informação documental junta aos autos. Com efeito, apesar de não ter conhecimento direto dos factos em causa nos autos, a testemunha detinha conhecimentos técnicos relevantes que partilhou.
Além das situações acima mencionadas, a testemunha sublinhou ainda a estranheza do veículo estar seguro por um valor superior ao seu preço de aquisição pelo casal, atendendo a que o valor do risco é normalmente indexado ao valor do capital seguro e, ainda, ter sido registado no mesmo dia em nome do vendedor (supostamente desconhecido do casal) e da Autora, tendo concluído no sentido de considerar implausível que tenha ocorrido um furto na situação em apreço.
Refira-se, por fim, que o depoimento prestado por EE, única testemunha arrolada pela Autora, não foi valorado atendendo a que se apurou que foi um interveniente direto nos factos, não tendo sido um mero observador com conhecimento direto. Com efeito, foi EE quem prestou maiores esclarecimentos à Ré no momento da averiguação da ocorrência, tendo-se assumido como o principal interlocutor perante a Ré, sendo por isso considerado pelo Tribunal como um dos principais interessados no desfecho do processo (talvez mesmo o principal interessado).
Por fim, os factos não provados a) a e) foram assim considerados devido à ausência de produção de prova cabal a este respeito. No que respeita em específico à ocorrência do furto (alínea a)), o Tribunal não alcançou uma convicção positiva quanto a tal factualidade, uma vez que não foi produzida qualquer prova idónea que permitisse sustentar esta versão.
Com efeito, entende-se que a prova deste facto favorável à Autora, sobre quem recaía o ónus da prova, não pode assentar única e exclusivamente no auto de denúncia da PSP. Exige-se que tal auto seja corroborado por algum outro elemento de prova coadjuvante, dado que a formalização de queixa perante as autoridades policiais corresponde a um mero indício que não permite concluir pela verificação da ocorrência.
Efetivamente, o auto de denúncia prova apenas que o denunciante fez determinadas declarações à PSP, mas não prova que essas declarações correspondam à realidade.
Ora, não foi produzida qualquer outra prova que permita formular um juízo de verosimilhança de que o furto pudesse ter ocorrido (por exemplo, através de uma testemunha que tivesse ouvido vidros a partir durante a noite ou tivesse visto um reboque naquele local), nem sequer foi feita prova do quotidiano da Autora e do seu companheiro no que respeita à utilização do veículo (onde o costumavam estacionar, em que horários o usavam, para que fins etc.).
À falta de consistência da prova produzida pela Autora – qualitativa e quantitativamente – aliaram-se as circunstâncias apontadas pela seguradora, que contribuíram para criar no espírito do julgador a dúvida quanto à realidade da ocorrência de um furto. E sendo assim, por falta de prova bastante, se teve como não demonstrada essa mesma factualidade”.
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IV. Apreciação
Da nulidade de sentença.
É de ler o artigo 615º do Código de Processo Civil, pois é nele que se definem taxativamente as nulidades de sentença. É de recordar que são as conclusões do recurso – e não o corpo da alegação – que delimitam o objecto do recurso, ou dito de outro modo, que balizam o poder de intervenção, a jurisdição, do tribunal de recurso, exceptuadas, claro, as questões que são de conhecimento oficioso. Nada, na matéria deste litígio, é de conhecimento oficioso.
Argumenta a recorrente que há contradição insanável na sentença – caso previsto no artigo 615º nº 1 al. c) do Código de Processo Civil. Se o tribunal considerou que a Autora não provou que o furto do seu veículo tivesse ocorrido, então só podia mesmo absolver a seguradora de qualquer um dos pedidos contra ela formulados com base nesse pressuposto, evento lesivo, dano, risco coberto, que despoletaria o dever de indemnizar. Não encontramos na sentença qualquer contradição insanável.
O tribunal ter considerado que a comunicação da desvalorização do veículo para efeitos de capital seguro foi feita por comunicações dirigidas para a morada da Autora, “que é a por si indicada nos presentes autos”, não constitui nulidade de sentença, isto é, nenhuma das nulidades tal como descritas no referido artigo 615º. E, não constitui nada mais que a explanação de um motivo pelo qual o tribunal entende que o facto da comunicação se provou. Não é uma decisão surpresa, porque em bom rigor não decide nada. Não é sequer a aquisição de um facto para o processo. Considerar que isto é igual ao tribunal extravasar o objecto do seu conhecimento ao importar para o processo um facto não alegado, é o mesmo que dizer que nenhuma capacidade de raciocínio pode o julgador usar para apreciar o litígio.
Não há nenhuma nulidade em o tribunal ter considerado no facto provado terceiro que as partes outorgaram por escrito o contrato de seguro. Só pode aqui haver duas coisas: - ou foi assim ou não foi, ou seja, um erro de julgamento em matéria de facto, mas nunca uma nulidade. E depois, é absolutamente inútil, do ponto de vista de quem (autor) se pretende fazer valer de um contrato de seguro, estar a questionar se o seguro foi celebrado por escrito ou por telefone: - é que não é da eventual nulidade formal do contrato que pode resultar o pagamento da indemnização dos danos peticionados.
Não concedemos assim, na verificação de nenhuma nulidade da sentença.
Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
O recorrente que pretenda impugnar a decisão sobre a matéria de facto tem de dar cumprimento aos ónus estabelecidos pelo artigo 640º do Código de Processo Civil, indicando nas conclusões do recurso os factos com cuja decisão não concorda. A não indicação ou deficiente indicação não é susceptível de ser suprida mediante convite do tribunal de recurso ao aperfeiçoamento, sob pena de violação do princípio da igualdade das partes plasmado no artigo 4º do Código de Processo Civil.
Lemos nas contra-alegações aquilo que não lemos nas conclusões: - a recorrida identifica que os pontos de facto impugnados são “11. Foi EE quem prestou maiores esclarecimentos relativamente ao furto. 12. Com efeito, existiu necessidade de a Autora atender um cliente e durante esse período, os averiguadores da Ré e EE mantiveram conversa no exterior do local de trabalho. 17. Na altura da averiguação a Autora e o seu companheiro não tinham as chaves do veículo seguro consigo e não souberam indicar quantas chaves teriam do mesmo, tendo EE referido ter várias chaves de veículos Audi em casa e que por esse motivo teria que procurar saber se alguma delas era do veículo em causa. 18. Foi também dito por EE que o casal nunca tinha estado envolvido em «assuntos de maior» (cit.) com companhias de seguro, tendo apenas mencionado um pedido de assistência em viagem e um acidente de menor gravidade”.
Se a recorrente não identificou estes pontos nas conclusões do recurso, como não identificou, o tribunal de recurso não pode apreciá-los. Mais, os pontos 11 e 12 são completamente irrelevantes para a decisão da causa, tornando-se a sua reapreciação igualmente irrelevante, e por isso inútil e proibida (artigo 130º do Código de Processo Civil). Os pontos 17 e 18 servem a justificar as dúvidas da recorrida, mas ainda assim são também completamente irrelevantes e, portanto, irrelevante a sua reapreciação. Podiam eles nem sequer ter sido dados como provados e terem passado ao lugar da motivação da convicção do tribunal relativamente à decisão que tomou quanto ao facto essencial da ocorrência ou não ocorrência do furto.
Ainda que imperfeitamente – mas de resto tendo a recorrida percebido e podido defender-se – a recorrente não se conforma com a decisão do tribunal de considerar não provada a ocorrência do furto, por um lado porque é inconcebível dar-se credibilidade a um averiguador que é pago pela recorrida, e por outro, porque, em termos mais jurídicos, a recorrente fez tudo o que, segundo as condições do seguro, lhe competia fazer – participou o furto às autoridades policiais e à seguradora – decorrendo do contrato de seguro que não sendo o veículo encontrado em 60 dias, o pagamento da indemnização é devido.
Coloquemos de lado – dando-o por irrelevante – o averiguador, porque estranha o desconhecimento do número de chaves da viatura e porque o companheiro da recorrente lhe terá dito que não tinha/m tido problemas de maior com seguradoras, quando afinal teve três ou quatro. Tornemos o averiguador irrelevante porque, no caso concreto, a recorrente não impugna nenhum dos seguintes factos:
13. O casal referiu aos averiguadores da Ré que tinha adquirido o veículo através de um anúncio no OLX, tendo o pagamento sido efetuado em dinheiro, por aproximadamente 12.000,00 €.
14. Questionados pela Ré sobre quem era o vendedor, disseram que não conheciam a pessoa, mas quando lhes foi perguntado uma segunda vez EE recorreu ao seu telemóvel e indicou o nome do vendedor, CC.
22. Apurou, igualmente, que em 29 de junho de 2009, EE, participou o furto de um Audi A4, com a matrícula ..-..-VG, na Companhia de Seguros Tranquilidade.
23. Na sequência deste furto, a Companhia de Seguros Tranquilidade determinou a perda total e liquidou 23.496,00 € a EE.
27. Por fim, em 11.08.2020, EE participou na PSP o furto de um Audi A6, por si importado, com a matrícula ..-ZB-...
28. O furto referido em 27. ocorreu na Rua... São Domingos de Rana.
29. Na sequência deste sinistro, a Companhia de Seguros Allianz, S.A. liquidou o valor de 40.100,00 €.
30. O companheiro da Autora já teve registado em seu nome 22 apólices de veículos diferentes.
31. De igual forma, também a Autora já teve registado em seu nome mais de seis seguros para diferentes veículos.
Com estes factos não impugnados não temos um cenário de normalidade, ou pelo menos, não temos o acompanhamento, em termos de factos, do que formaria um cenário de normalidade – alguma idade que justificasse a pessoa já ter tido vários carros, alguma profissão que justificasse vários carros, alguma desavença com seguradoras, nem que seja ao nível de preço, que justificasse várias seguradoras. Sem este cenário, o terceiro furto de um Audi, ou pelo menos o segundo furto de um Audi na mesma rua, não é normal. Depois não é normal pagar doze mil euros em dinheiro, sendo que o pagamento em dinheiro não garante efectivamente o valor pago. E assim podemos estar num outro cenário, que é o da simulação de sinistros envolvendo veículos cujo estado inicial ou valor inicial é desconhecido, para reclamação de valor conhecido de indemnização.
A prova do furto não é diabólica? É de exigir mais do que a participação às autoridades policiais?
Não há dúvida que estamos em sede responsabilidade contratual e que a prestação indemnizatória é consequência necessária da ocorrência do dano. A quem invoca o direito à indemnização compete a prova dos factos constitutivos dele (artigo 342º nº 1 do Código Civil). Assim, o lesado está obrigado a provar a acção causal que provocou o dano, assim a recorrente estava obrigada a provar o furto. Não se confundem os termos contratualmente estabelecidos para a participação do sinistro à seguradora com a prova do mesmo em tribunal. Ocorrendo precisamente o caso da seguradora não se convencer da sua responsabilidade indemnizatória, não se encontra qualquer disposição legal que inverta o ónus da prova, estabelecendo que ao segurado basta vir a juízo invocar o facto e o cumprimento dos termos de participação estabelecidos contratualmente.
Por outro lado, temos de reconhecer o direito da seguradora a, pelo menos, certificar-se de que o evento que lhe é comunicado é real, e se se convencer que não é, a recusar o pagamento da indemnização.
Não assiste razão à recorrente quando invoca as disposições imperativas do “n.º 1 do artigo 102.º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro que «O segurador obriga-se a satisfazer a prestação contratual a quem for devida, após a confirmação da ocorrência do sinistro e das suas causas, circunstâncias e consequências»” e do “artigo 104.º do RJCS, a propósito do vencimento da prestação do segurador, estatui que «A prestação do segurador vence-se decorridos 30 dias sobre o apuramento dos factos a que se refere o artigo 102.º» a partir da constatação evidente da “confirmação da ocorrência”, isto é, a obrigação de satisfação da prestação contratual devida pela seguradora depende da prova da ocorrência, e não da simples participação. Por isso, não tem razão a recorrente quando prossegue o seu raciocínio, atendendo à “cláusula 4ª das “Condições Especiais” - furto ou roubo da Apólice, (…) “Ocorrendo furto ou roubo que dê origem ao desaparecimento do veículo, o Segurador obriga-se ao pagamento da indemnização devida, decorridos que sejam sessenta (60) dias sobre a data da participação da ocorrência à autoridade competente, se ao fim desse período não tiver sido encontrado.”. É que, não ser o veículo encontrado não é o mesmo que haver prova de ter desaparecido. Ou seja, a seguradora não tinha de pagar automaticamente a indemnização decorridos 60 dias sobre a participação se o veículo não fosse encontrado, tinha de o fazer sim se “ocorresse furto ou roubo”, condição primeira da cláusula que autoriza precisamente a investigação sobre a causa aconteceu mesmo.
Somos sensíveis à dificuldade probatória e até apontaríamos para que num cenário de normalidade não deva exigir-se mais do que a prova da participação policial e do circunstancialismo nela descrito, simplesmente concedemos no direito da seguradora à dúvida perante cenários diversos, que em juízo obrigam o lesado a provar, naturalmente apenas de modo indiciário, o furto. É que, a participação policial pode corresponder apenas a uma declaração unilateral desacompanhada de qualquer prova, pode além disso ser muito pouco circunstanciada, e torna-la automaticamente na condição única de que depende o pagamento da indemnização é particularmente inseguro, podendo considerar-se que afecta seriamente o equilíbrio contratual.
Estamos assim com o tribunal recorrido, quando considerou que era necessário produzir outra prova para formar um juízo de verosimilhança sobre a ocorrência do furto, não sendo suficiente a participação.
Em suma, não vemos como passar o facto não provado referido na alínea a), a provado. Não nos resulta qualquer violação de regra probatória nem erro na decisão de direito, pelo que, não estando provado que o furto ocorreu, o recurso improcede.
Tendo nele decaído, é a recorrente responsável pelas custas – artigo 527º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil.
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V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso e em consequência confirmam a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.

Lisboa, 08 de Maio de 2025
Eduardo Petersen Silva
Maria Teresa F. Mascarenhas Garcia
Adeodato Brotas

Processado por meios informáticos e revisto pelo relator