Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
469/25.0GCALM.L1-3
Relator: HERMENGARDA DO VALLE-FRIAS
Descritores: CONDUÇÃO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
MEDIDA DA PENA
PREVENÇÃO GERAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/03/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: I - Como ensina Figueiredo Dias, para a determinação da medida da pena, deve encontrar-se, dentro do limite máximo da moldura abstracta da pena, uma moldura de prevenção geral de integração - sendo que o limite máximo desta moldura deve consistir na tutela óptima dos bens jurídicos protegidos pela norma e o limite inferior na tutela mínima dos bens jurídicos protegido pela norma, sem se colocar em causa o ordenamento jurídico e a confiança dos cidadãos na validade dela.
II - Sendo que, quanto à pena acessória, prevista no artº 69º do Cód. Penal, as exigências de prevenção geral devem ser entendidas no sentido da necessidade geral de manutenção da confiança da comunidade na segurança rodoviária.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 3ª Sec. Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório
Pelo Juízo Local Criminal de Almada – J 1 – foi proferida Sentença que decidiu do seguinte modo:
(…)
Pelo exposto, atentas as considerações expendidas e as normas legais invocadas, decido:
a) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa;
b) Nos termos do artigo 80.º, n.º 2, do Código Penal, procede-se, atenta a circunstância de ter sido aplicada pena de multa e à detenção do arguido (privação de liberdade), ao desconto de um dia de multa, passando a ser liquidada a pena em 119 (cento e dezanove) dias de multa à taxa de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), num total de € 654,50 (seiscentos e cinquenta e quatro euros e cinquenta cêntimos).
d) Condenar o arguido AA, nos termos do disposto no art.º 69º, nº 1, al. a) do CP, na proibição de conduzir veículos a motor pelo período de 5 (cinco) meses e 15 (quinze) dias, devendo o arguido entregar a carta de condução na secretaria do tribunal ou em qualquer posto policial, até ao 10.º dia após o trânsito em julgado da decisão, sob pena de não o fazendo ser determinada a apreensão da carta de condução e de o arguido incorrer na prática de um crime de desobediência. Caso conduza durante o período em que a carta se encontre apreendida incorrerá na prática de um crime de violação de proibições.
(…)
Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:
(…)
I- O Tribunal a quo condenou o arguido AA por um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 120 dias de multa, liquidada a pena em 119 dias de multa à taxa de € 5,50, num total de € 654,50, e na pena acessória de na proibição de conduzir veículos a motor pelo período de 5 meses e 15 dias.
II - Delimita-se o recurso quanto à matéria da medida concreta da pena de multa e da sua razão diária, e da pena acessória de proibição de conduzir em que o recorrente foi condenado.
III- Incorreu o Tribunal a quo em violação direta dos arts. 40.º, 47.º, e 71.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, e art. 18.º da Constituição da República Portuguesa.
IV - Da conjugação dos artigos supracitados com o caso concreto, depreende-se que as condenações do arguido pelo referido crime são excessivas, injustas e desproporcionais, pois o Tribunal a quo não considerou adequadamente todas as condições que depõem a seu favor, como a confissão integral e sem reservas, a motivação dos factos, as suas condições socioeconómicas e financeiras, e os seus encargos, para a determinação da medida concreta da pena de multa, taxa diária e da pena acessória fixadas.
V - Aduz o art. 47.º do CP que a pena de multa é fixada pelo Tribunal nos termos do art. 71.º, n.º 1, do CP, e em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.
VI - Na determinação concreta da medida da pena o Tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando especificamente as circunstâncias referidas no art. 71.º, n.º 2, do Código Penal.
VII - O art. 40.º do CP prevê que a pena tem dupla finalidade, de proteção dos bens jurídicos e de reintegração do agente na sociedade, e toda sanção deve sempre ser limitada pelo princípio da estrita necessidade da reacção sancionatória à medida da culpa.
VIII - Desse modo, a pena aplicada deve se submeter aos princípios da necessidade, adequação, razoabilidade, e proporcionalidade, de modo que deve ser necessária para satisfazer as exigências de prevenção, adequada ao caso, e nunca fixada de forma excessiva e que ultrapasse o limite da razoabilidade e proporcionalidade.
IX - No presente caso, a pena de multa, a sua taxa diária, e a pena acessória arbitradas restaram bastante elevadas diante dos factos em causa, e nada se apurou de tão grave quanto às circunstâncias da prática do crime ou à prevenção especial que revelem a efectiva necessidade, adequação e proporcionalidade em se aplicar uma pena de multa no limite máximo abstrato relativamente ao crime de condução em estado de embriaguez, tal como uma pena de proibição de conduzir por quase o dobro do limite mínimo legal.
X - Ainda que sob a premissa de que a determinação da pena multa e da sua razão diária devem ser fixadas de forma a constituir um sacrifício real para o condenado e fazê-lo sentir o juízo de censura e assegurar a função preventiva da pena, deve ser assegurado ao condenado o mínimo de rendimento e meios para que ele possa dignamente fazer face às suas necessidades básicas e do seu agregado familiarᜭ
XI - A pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor deve, como a pena principal, seguir os critérios do art. 71.º do Código Penal, de modo que na sua determinação tem que haver uma cuidadosa ponderação dos direitos fundamentais do recorrente afetados por esta restrição, limitando o menos possível o direito ao trabalho e exercício da atividade profissional, sem contudo, deixar de atender aos ᜋns da pena.
XII - O Tribunal a quo desconsiderou as circunstâncias e a motivação do recorrente ter conduzido de madrugada, por estar imensa dor decorrente de uma fratura óssea, a uma reduzida distância entre sua residência e o hospital, em uma via que estava deserta, com risco de perigo reduzido, além do facto de ele confiar que sequer estava sob efeito do álcool além do limite legal.
XIII - A condenação em penas inferiores às que o recorrente foi condenado não desmerece a proteção dos bens jurídicos visados e a reintegração social, assegura o cumprimento do princípio da estrita necessidade da reação sancionatória à medida da culpa, e satisfaz as exigências de prevenção.
XIV - Portanto, é imperioso que a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra decisão que venha a reduzir as penas a que o recorrente foi condenado, em consonância com os princípios Constitucionais da estrita necessidade da reacção sancionatória à medida da culpa e da dignidade da pessoa humana.
TERMOS EM QUE, E NOS DEMAIS DE DIREITO, REQUER O PROVIMENTO DO PRESENTE RECURSO, E, CONSEQUENTEMENTE, A REVOGAÇÃO DA SENTENÇA E A SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRA DECISÃO QUE REDUZA A PENA DE MULTA, A TAXA DIÁRIA, E A PENA ACESSÓRIA DE PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULO A MOTOR EM QUE O RECORRENTE FOI CONDENADO᥁ SEJA FEITA A COSTUMADA JUSTIÇA.
(…)
O Ministério Público na primeira instância respondeu ao recurso, sem juntar conclusões, e pugnando pela improcedência do recurso.
***
O recurso foi admitido, com forma, modo e efeito devidos.
Uma vez remetido a este Tribunal, o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Proferido despacho liminar e colhidos os vistos, veio o processo à Conferência.
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Objecto do recurso
Resulta do disposto conjugadamente nos arts. 402º, 403º e 412º nº 1 do Cód. Proc. Penal que o poder de cognição do Tribunal de recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, já que é nelas que sintetiza as razões da sua discordância com a decisão recorrida, expostas na motivação.
Além destas, o Tribunal está ainda obrigado a decidir todas as questões que sejam de conhecimento oficioso, como é o caso das nulidades insanáveis que afectem a decisão, nos termos dos arts. 379º nº 2 e 410º nº 3 daquele diploma, e dos vícios previstos no artº 410º nº 2 do mesmo Cód. Proc. Penal, que obstam à apreciação do mérito do recurso, mesmo que este se encontre limitado à matéria de direito, tal como se assentou no Acórdão do Plenário das Secções do STJ nº 7/95 de 19.10.1995 [DR, Iª Série - A de 28.12.1995] e no Acórdão para Uniformização de Jurisprudência nº 10/2005, de 20.10.2005 [DR, Iª Série - A de 07.12.2005].
Das disposições conjugadas dos arts. 368º e 369º, por remissão do artº 424º, nº 2, ambos do mesmo Cód. Proc. Penal, resulta ainda que o Tribunal da Relação deve conhecer das questões que constituem objecto do recurso pela seguinte ordem preferencial:
Em primeiro lugar, das que obstem ao conhecimento do mérito da decisão (artº 379º do citado diploma legal);
Em segundo lugar, das questões referentes ao mérito da decisão, desde logo, as que se referem à matéria de facto, começando pela chamada impugnação alargada, se deduzida [artº 412º], a que se segue o conhecimento dos vícios enumerados no artº 410º nº 2 sempre do mesmo diploma legal.
Finalmente, as questões relativas à matéria de direito.
Tendo em vista este princípio, averigue-se o caso.
O arguido, nas conclusões do recurso, fixa o objecto de apreciação requerida na pena aplicada, numa vertente tripla: medida da pena principal, razão diária dela e medida da pena acessória, considerando que a decisão recorrida violou os princípios legais para a respectiva determinação.
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Fundamentação
O Tribunal recorrido fixou a matéria de facto como vinha da acusação:
(…)
No dia ........2025, pelas 04h12m, o arguido AA conduziu o veículo de matrícula ..-BC-.. na ..., em …, sendo portador de uma taxa de álcool no sangue registada de 1,72 g/l, correspondendo à TAS de 1,634 g/l.
Com a conduta descrita, o arguido quis conduzir o veículo acima referido, bem sabendo que havia ingerido bebidas alcoólicas e que, como tal, era portador de uma taxa de álcool no sangue superior ao limite que lhe é permitido por lei, o que efectivamente conseguiu.
O arguido agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei, tendo capacidade para se determinar por esse conhecimento.
(…)
Tem os antecedentes criminais averbados no CRC: condenações em 2009, 2019 e 2022, todas em penas de multa.
Faz negócios de …, auferindo 500/600 euros mensais.
Vive em casa camarária, pagando renda no valor mensal de 7/8 euros.
Vive com a companheira e quatro filhos menores.
A companheira recebe o RSI
(…)
O Tribunal recorrido fundamentou a decisão de facto com recurso à confissão integral e sem reservas do arguido e documentação junta aos autos, de que destacou os autos e CRC do arguido.
Concretamente quanto à escolha e determinação das penas, atendeu:
À necessidade preferencial de aplicar pena não privativa da liberdade;
As necessidades elevadas de prevenção geral;
As necessidades medianas de prevenção especial, atentos os antecedentes criminais do arguido, sendo um deles por crime da mesma natureza e ainda que praticado em 2017;
Última oportunidade de aplicação de pena não privativa da liberdade;
O facto de ter sido fiscalizado em operação aleatória;
Ilicitude mediana;
Culpa elevada;
Confissão dos factos;
A necessidade de que a pena reflicta sacrifício;
Os rendimentos abaixo do ordenado mínimo nacional.
Vejamos, então, na perspectiva desta Relação se merece acolhimento a pretensão do recorrente.
Comecemos por atender aos elementos relevantes resultantes do processo.
O arguido, com três condenações anteriores averbadas no CRC, à data dos factos conduzia a referida viatura e, sujeito a fiscalização técnica vocacionada, foi detectado que conduzia na via pública com um teor de alcoolemia no sangue não permitido pela lei penal, circunstância que sabia ser proibida e punida por lei.
Uma das condenações que o arguido tem averbada no CRC, por factos de 2017, mas transitada a decisão só em 2019, é por crime da mesma natureza.
Vejamos.
Conforme ensina Figueiredo Dias, a fixação da pena deverá obedecer ao critério geral consignado no artigo 71º e ao critério especial previsto no artigo 77º, nº1, ambos do Cód. Penal, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique 1, relevando, na avaliação da personalidade do agente.
O critério legitimador das normas penais assenta cada vez mais na ideia de prevenção racional e eficaz da violação dos bens jurídicos socialmente considerados2.
As penas são necessárias na medida em que protegem bens jurídicos - princípio de necessidade (cfr. artº 18°, n° 2 da CRP).
Assim, para a determinação da medida da pena, deve encontrar-se, dentro do limite máximo da moldura abstracta da pena, uma moldura de prevenção geral de integração - sendo que o limite máximo desta moldura deve consistir na tutela óptima dos bens jurídicos protegidos pela norma e o limite inferior na tutela mínima dos bens jurídicos protegido pela norma, sem se colocar em causa o ordenamento jurídico e a confiança dos cidadãos na validade dela.
Depois, dentro desta moldura de prevenção, deve calcular-se a medida concreta da pena – aqui, tendo-se em conta as exigências de prevenção especial, de reintegração, ou de socialização e de intimidação.
Nos termos do artº 71º CP, deverá o Tribunal atender a todas as circunstâncias que deponham a favor ou contra o arguido, valorando-as em função da culpa do agente e das exigências de ressocialização (prevenção especial), e de confiança da comunidade na vigência da ordem jurídica (prevenção geral)3.
Deve atender-se, assim, em primeiro lugar e como limite máximo, à culpa do agente - que constitui, em atenção à dignidade do ser humano, o fundamento e limite máximo da própria pena.
O limite mínimo é determinado em função da prevenção geral, uma vez que a pena visa a protecção de bens jurídicos (mas também a tutela das expectativas comunitárias na manutenção e reforço da norma infringida).
Apenas calculados estes parâmetros, e dentro deles, fixará o tribunal a pena, de acordo com as exigências da prevenção especial de socialização4.
Ora,
O Tribunal a quo, como decorre do supra exposto, ponderou todas as exigências que tinha a seu cargo, tendo optado em primeiro lugar por aplicar ao arguido pena não privativa da liberdade, o que, diga-se, o favoreceu sem dúvidas, uma vez que esta é a segunda condenação por crime de condução sob influência do álcool.
Atento a que estamos perante uma segunda condenação, não se suscita dúvida sobre a benevolência de uma segunda decisão aplicando a pena de multa.
Feita esta escolha, que não foi posta em crise e que, como tal, não se impõe aqui questionar, o universo da moldura oscila entre o mínimo legal e 120 dias de multa.
Neste universo, o Tribunal a quo aplicou a pena de 120 dias, descontando um dia relativo à detenção sofrida aquando da apresentação.
Esta pena que assim se fixou no limite superior da moldura, prende-se com a excepcionalidade referida de voltar a optar pela pena de multa, portanto, não privativa da liberdade, quando existe já condenação anterior pelo mesmo crime e precisamente em pena de multa, portanto, uma repetição de comportamento violador da mesma regulação imposta pela ordem jurídica, de que resulta, não apenas o insucesso da primeira, mas também um aumento muito significativo das necessidades de prevenção, geral e especial.
Ao contrário do que parece entender o arguido, a pena não desvaloriza com o tempo, ou seja, a pena anteriormente aplicada não deixa de reflectir as actuais exigências de prevenção especial porque a condenação já foi em 2019.
Pelo contrário, o facto de o arguido, já anteriormente julgado por este crime, advertido penalmente pela decisão condenatória então aplicada, ter voltado a conduzir com álcool no sangue reflecte bem essas necessidades e a irrelevância que para si constitui a censura da sociedade aos seus comportamentos anteriores, porque é isso que uma sentença de um Tribunal incorpora.
Como tal, do ponto de vista do quantitativo da pena também nenhum reparo nos merece a opção do Tribunal a quo.
E o mesmo se diga quanto à razão diária da multa, atento a que o mínimo é de 5€, que deve reservar-se a caso de absoluta carência ou indigência – pois que, se por um lado não é possível isentar de pena o agente de um crime porque tem parcos ou nenhuns rendimentos, por outro lado é o próprio arguido que, antecipando uma condenação nesses termos, pode escolher praticar, ou não, o ilícito -, sendo que o arguido, tendo rendimentos, não teria sequer estatuto que justificasse aplicar a multa pelo mínimo legal.
O mínimo legal da multa, que dependerá desse estatuto económico quando se verifique, depende também, dentro desse âmbito, da ponderação de factores sociais importantes.
E o arguido, conhecedor dos seus rendimentos e também da condenação anterior que já tinha, podia, como se disse supra, desde logo ter evitado esta condenação, bastando-lhe para isso inibir-se de conduzir depois de ingerir bebidas alcoólicas.
Como tal, também foram devidamente ponderados os critérios da fixação quantitativa da multa, improcedendo também este fundamento de recurso.
No que respeita à pena acessória,
O artº 69º, nº 1 do Cód. Penal prevê um período de três meses a três anos para a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, não se estabelecendo um regime específico para a sua determinação.
Não obstante, tem-se entendido que, tratando-se de verdadeira pena criminal e imbricando, como tal, no juízo sobre a culpa que se faça, e sobre prevenção, a sua determinação ou medida concreta deve efectuar-se segundo os critérios orientadores gerais contidos no artº 71º do mesmo Cód. Penal.
Devendo também ser observada a proporcionalidade certa entre a medida concreta da pena principal e a da pena acessória, pois que os critérios de ponderação são comuns.
No entanto, no caso da pena acessória, sem esquecer que a sua especifica finalidade é mais restrita, pois visa sobretudo prevenir a perigosidade do agente5, devendo procurar-se essa tendencial proporcionalidade entre a pena principal e a pena acessória, ela não tem, contudo, de assegurar a equivalência matemática reciproca, desde logo porque a finalidade de cada uma delas não é a mesma, como se vê.
As exigências de prevenção geral devem, quanto a esta pena acessória, ser entendidas no sentido da necessidade geral de manutenção da confiança da comunidade na segurança rodoviária6.
Neste caso, como se disse, o Tribunal a quo fundamentou a escolha naqueles referidos critérios, considerando o mínimo legal, e a condenação anteriormente sofrida pelo arguido, ainda assim fixando a pena acessória dois escassos meses a cima do mínimo legal.
Assim como não devia o Tribunal a quo considerar qualquer das circunstâncias referidas pelo recorrente, como as dores que tinha ou a pouca distância da deslocação, porque esses não são factores ponderáveis neste caso. Aliás, em nenhum caso, a menos que integrem uma causa de exculpação, o que, como é evidente, aqui não acontece.
Pelo contrário, devidamente ponderados, no sentido de, estando o arguido debilitado fisicamente menos ainda devia ter-se colocado na referida situação e no sentido de que, sendo curta a distância, menos ainda se justifica o comportamento porque as alternativas existiam, desde logo, o ir a pé ou com recurso a outro meio de transporte, como se vê, a serem, como se disse, devidamente ponderadas, as mesmas circunstâncias são desfavoráveis e não no sentido em que as pretendeu invocar. O que significa, por outro lado ainda, que ao não as ponderar desfavoravelmente, como podia, o Tribunal a quo, ainda aí, beneficiou o arguido.
Diga-se, apenas, que o Tribunal a quo, em qualquer dos casos, atendeu ao que podia atender e, em qualquer deles, foi sempre benevolente na apreciação que fez.
Não estando aqui ínsita uma crítica ao critério, mas uma constatação.
Os crimes rodoviários devem ser exemplarmente punidos (aqui no sentido de garantirem, pela aplicação da pena, da reafirmação das expectativas comunitárias na validade das normas penais rodoviárias), principalmente num país, como é o nosso, com os tristes números de sinistralidade nas estradas.7
Pelo que, tendo sido, também nesta parte, ponderados os critérios considerados adequados pelo Tribunal a quo, e que mostram acolhimento na lei, é de improceder este fundamento de recurso.
Importa, por isso, concluir a apreciação deste recurso, decidindo-se este Tribunal da Relação pela falta de provimento do mesmo.

Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido AA, mantendo-se intocada a decisão do Tribunal a quo.
Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 4 UC’s, a que acrescem os demais encargos legais.
Notifique.

Lisboa, 03 de Dezembro de 2025
Hermengarda do Valle-Frias
Ana Rita Loja
Rosa Vasconcelo
Texto processado e revisto.
Redacção sem adesão ao AO
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1. Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Ed. Coimbra - 1993, p. 290ss.
2. Cfr. Anabela Rodrigues, o Sistema Punitivo Português, in Sub Judice, nº 11, 1996.
3. Arts. 71°, 47°, n° 1 e 40° do Cód. Penal.
4. Cfr. Jorge de Figueiredo Dias - As consequências Jurídicas do Crime, p 227 e seguintes.
5. Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, p.165
6. Taipa de Carvalho, as Penas no Direito Português - Jornadas de Direito Criminal, vol. II, p. 28.
7. Ac. Tribunal da Relação do Porto de 19.04.2023 - www.dgsi.pt\trp..