Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | LUÍS FILIPE LAMEIRAS | ||
| Descritores: | CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA CLÁUSULA RESOLUTIVA CULPA IN CONTRAHENDO ACORDO REVOGATÓRIO RESTITUIÇÃO DO SINAL EM SINGELO INTERPELAÇÃO MORA | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/18/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
| Sumário: | Sumário: I – Ao invés da condição resolutiva (artigo 270º do Código Civil), cuja verificação opera logo o efeito extintivo do negócio, a cláusula resolutiva (artigo 432º, nº 1, do Código Civil) apenas apetrecha o sujeito com um direito potestativo a poder fazer operar essa extinção, e que ele poderá querer, ou não, accionar efectivamente. II – Realizado entre as partes o consenso para formalização de um contrato, cujos contornos essenciais se acordaram, mas não vindo a ser concretizada a combinada formalização, por causas que não se apuraram, não é possível atribuir culpa in contrahendo (artigo 227º, nº 1, do Código Civil) a qualquer dos sujeitos. III – Celebrado um contrato-promessa de venda de uma moradia, que se não efectivou, se os factos provados – mesmo que apenas obtidos do acordo das partes nos articulados (artigos 574º, nº 2, início, 607º, nº 4, intermédio, e 663º, nº 2, final, do Código de Processo Civil) – mostrarem que, por consenso, as partes vieram a considerá-lo cessado nos seus efeitos, tal acordo consubstancia um contrato revogatório ou de dissenso. IV – E se, a coberto do contrato-promessa, o promitente-comprador tiver entretanto entregue sinal e reforços ao promitente-vendedor, uma vez firmado esse acordo extintivo, os valores entregues, cuja razão de ser desapareceu, devem ser restituídos, em singelo, por quem a recebeu a quem o prestou. V – Se o promitente-comprador reclama do promitente-devedor a restituição do sinal e reforços, mas com fundamento em resolução do negócio, por culpa que imputa ao segundo, esse pedido não vale como interpelação para cumprimento do crédito referido em IV –. VI – Nessa hipótese, e na falta de outra interpelação válida, o devedor só se constitui em mora pela citação judicial para a acção onde o crédito vem a ser reconhecido (artigos 777º, nº 1, e 805º, nº 1, do Código Civil). VII – Sendo esse crédito dívida do casal, e tendo os cônjuges sido citados para a acção em momentos diferentes, é a data da citação inicial que fixa a interpelação e o termo a quo para a contagem do débito dos juros (artigos 512º, nº 1, e 806º, nº 1, do Código Civil). | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório (I). A instância da acção. 1. AA suscitou contra (1.º) BB e (marido) (2.º) CC acção declarativa a pedir que se considerasse (1.º) « nulo e de [nenhum] efeito o CPCV celebrado entre as partes por vício na formação da vontade do autor, (…) devendo os [réus] restituir tudo quanto lhes foi prestado », ou « caso assim não se entenda » (2.º) que se considerasse « nulo e de nenhum efeito o CPCV celebrado entre as partes por má-fé e abuso de direito, (…) devendo os [réus] restituir tudo quanto lhes foi prestado », (3.º) « em ambos os casos » com juros a contar « desde a interpelação judicial constante do doc. 9 » e (4.º) a condenação dos réus « a título de indemnização por danos não patrimoniais, em montante não inferior a € 5.000,00 » (16.9.2019). É a seguinte, em síntese, a sua argumentação. Ajustou, como promitente-comprador, contrato-promessa bilateral com os réus para a compra de uma moradia (25.5.2017). A escritura seria feita no prazo máximo de 90 dias; e acordou-se que o sinal e princípio de pagamento seria devolvido em singelo se o autor não obtivesse financiamento bancário, em 45 dias, sendo esta uma condição essencial do negócio (cláusula 8.ª nº 4). O autor viu rejeitado o financiamento (........2017); e comunicou logo à mediadora. Por a promessa ter sido há apenas 20 dias, o autor não viu necessidade de fazer operar o « seu direito de rescisão junto dos promitentes-vendedores ». É que o autor aguardava por outras decisões bancárias (Julho de 2017). E tudo era do conhecimento da mediadora e dos réus. Mesmo assim, preocupado, o autor contactou a mediadora. Esta veio a informar que os réus estavam disponíveis em alterar as condições; e confirmou ir elaborar adenda ao contrato. O autor tranquilizou. Veio a receber outra recusa de financiamento bancário (8.8.2017). A mediadora fez-lhe chegar a proposta dos réus da alteração das condições. Porém, e « sem nada que o fizesse prever », recebeu da mediadora a notícia de que « estaria em incumprimento » (22 ou 23 de Agosto de 2017). O autor, por intermédio da sua esposa, enviou email, reafirmando « interesse na aquisição do imóvel » (25.8.2017). E em reunião com os vendedores (7.9.2017) ficou acordado « que consideravam o contrato-promessa cessado » (artigo 42º/ii. da petição inicial), mas que o autor mantinha o negócio, com a condição de o imóvel voltar ao mercado, e que, caso surgisse outro comprador, não conseguindo o autor financiamento, os réus venderiam a este e procederiam à devolução em singelo do já recebido (à data, 17.000,00 €); como fariam a devolução se o autor, « num curto espaço de tempo », não obtivesse o financiamento bancário. O autor concordou; mas pretendeu a redução a escrito; sem sucesso. A esposa do autor mandou novo email com ponto de situação, e a pedir « a devolução dos valores entregues [de 17.000,00 €] até dia 26/9/2017 » (22.9.2017). Os réus comunicaram ao autor o incumprimento e que faziam suas as quantias já recebidas (25.9.2017). O autor solicitou aos réus a devolução dessas quantias [17.000,00 €] (2.10.2017). Em síntese; os réus sabiam que o autor só estava interessado em celebrar a promessa caso lhe fosse concedido financiamento bancário. O autor só o assinou por estar convencido de o ir conseguir. Bem como por estar convicto de que os réus, como se comprometeram, jamais fariam suas as quantias já entregues, caso assim não sucedesse. A subscrição do contrato foi feita com dolo induzido. Por outro lado, fazendo-lhe crer que aceitariam prorrogar os prazos, os réus obstaram, com má-fé, à rescisão atempada do contrato, pelo autor. E na reunião tida (7.9.2017) voltaram a fazer crer na restituição das quantias. Agiram com má-fé e abuso de direito. E imprimiram ao autor danos morais; contabilizados no mínimo de 5.000,00 €. 2. O réu marido foi pessoalmente citado (23 de Setembro de 2019). A ré esposa foi citada editalmente (3.6.2020 // artigo 242º/1 do Cód. Proc. Civ.). Apresentaram contestação (18.9.2020); e defenderam a improcedência da causa. O contrato-promessa contemplava que a marcação da escritura era encargo do comprador, o autor; e que devia ser feita no prazo de 90 dias. Ora, foi acordado que, se o autor não obtivesse o financiamento, podia resolver o contrato, desde que exercesse tal direito no prazo máximo de 45 dias. Volvidos os 90 dias (23.8.2017), nada aconteceu. Na reunião realizada (7.9.2017) assumiu-se que o prazo da escritura já se esgotara; mas, ao mesmo tempo, combinou-se a assinatura de outra promessa, com escritura até 31.12.2017, e reforço de sinal (artigos 21º e 25º da contestação). E foi, cansados da inércia do autor, que os réus operaram a resolução (25.9.2017). Em qualquer dos casos; o autor não operou a sua faculdade resolutiva, de acordo com o que fôra contratado; e podendo tê-lo feito, junto dos réus, os vendedores. E nem se esforçou minimamente na sequência do acordo (informal) de prorrogação. Não houve vício de vontade, má-fé contratual ou abuso de direito. Nem se alegaram factos capazes de suportar as perdas morais. Já o autor incorreu em litigância de má-fé (processual). E, como tal, deve ser censurado, com multa e com indemnização. 3. O autor, em resposta (6.10.2020), recusou litigar de má-fé na causa. 4. A instância declaratória progrediu; e com vicissitudes. 5. Foi proferida a sentença final (21.3.2025). E nesta, basicamente, (1.º) se julgou inconsequente o pedido de anulação da promessa com base em vício na formação da vontade do autor, bem como se arredou a má-fé contratual ou o abuso de direito dos réus. Ao invés; (2.º) se interpretou a comunicação do autor para os réus (22.9.2017) como incumprimento culposo e definitivo, e se sustentou o fundado da retenção do sinal. Em complemento; (3.º) os danos morais foram recusados. Tudo a culminar com a absolvição dos réus do pedido. E ainda com a rejeição de qualquer tipo de litigância de má-fé, de banda do autor. (II). A instância da apelação. 1. O autor, inconformado, interpôs recurso da sentença. Organizou assim as conclusões da sua alegação. a. Tem o presente recurso por objecto a sentença proferida pelo tribunal a quo no decurso dos presentes autos, prolatada em 21.03.2025, (…), o qual versa sobre a matéria de facto e de direito, com apelo à prova gravada. b. Entende o recorrente que a sentença recorrida, apesar do seu recorte técnico, não fez, (…), correcta interpretação dos factos e não tomou em consideração toda a matéria relevante, bem como, por outro lado, se algumas das normas de direito fossem bem interpretadas e correctamente aplicadas aos factos conduziriam, necessariamente, (…), a decisão diferente da tomada pelo (…) tribunal a quo. c. Era condição essencial para a celebração do CPCV que, caso o recorrente não conseguisse financiamento bancário em tempo razoável para a aquisição do imóvel objecto do contrato promessa dos autos, a inclusão no CPCV de condição resolutiva, pois na ausência de apoio bancário, o recorrente não poderia ou tinha condições para concretizar o contrato definitivo, e nesse caso, serem-lhe restituídas as quantias entregues a título de sinal e/ou reforço de sinal em singelo. d. Esta condição – resolutiva – era do conhecimento prévio dos recorridos (e dos funcionários encarregados do processo na agência e imobiliária). e. O recorrente necessitava para a realização da compra prometida da obtenção de financiamento bancário, sem o qual não lhe seria possível a sua concretização, razão da existência e inclusão no CPCV da cláusula 8ª, nº 4. f. O prazo de 45 dias, não foi determinado ou solicitado pelo recorrente, nem este tinha noção se era adequado e suficiente para a obtenção do necessário financiamento que ainda iria solicitar às entidades bancárias, antes constava de minutas pré-elaboradas da identificada sociedade imobiliária, que o recorrente se limitou, na sua boa-fé a aceitar – acreditando sempre que não seria, como não poderia ser, um prazo rígido. g. Em 20.06.2017, o recorrente teve conhecimento de que o Banco BPI SA não aprovou o pedido de financiamento bancário (facto provado 3.º), no montante solicitado (€650.000,00), para a aquisição do imóvel identificado na cláusula 1.ª do contrato referido em 1. supra (doc. 4 da PI e facto provado 4.º) isto é 19 dias antes de cessar o prazo de 45 dias. h. Resultando ainda de facto provado 5.º que a mulher do requerido informou a mediadora imobiliária identificada nos autos na cláusula 12ª do CPCV, na pessoa da sua funcionária DD, das decisões de recusa de financiamento, quando delas teve conhecimento, tendo a referida agente imobiliária se comprometido a transmitir tal informação aos promitentes vendedores, estando assim o recorrente dispensado, de repetir a mesma comunicação aos recorridos, desta feita por carta registada com aviso de recepção como também previsto na cláusula 8 do CPCV, tendo cumprido com o dever de comunicação da não obtenção do financiamento bancário de que necessitava. i. Resultando demonstrado e comprovado que funcionária DD, retransmitiu a informação recebida ao seu colega e chefe de equipa EE, e director comercial FF, os quais tiveram conhecimento efectivo e em tempo das duas decisões de recusa dos financiamentos bancários solicitados pelo recorrente, quando delas o recorrente teve conhecimento, isto é, necessariamente quando recebeu as comunicações dos bancos datadas de 20.06.2017 via email, e via carta datada de 08.08.2017 (cfr. factos provados 3 e 4). j. Dos depoimentos transcritos, resulta e fica demonstrado que todas as comunicações e troca de informações entre as partes se processavam através dos identificados consultores imobiliários, no que as partes consentiram e seguramente acordaram. k. Em 20.06.2017, com a recusa do Banco BPI, em financiar o recorrente, verificou-se desde logo a condição resolutiva, o que sempre importaria a resolução automática do negócio jurídico, e que determinaria a eliminação dos efeitos do contrato, retroactivamente, com a consequente restituição do que tiver sido prestado até essa data, mal tendo andado, (…) a (…) sentença, por assim não ter concluído. l. (…), a estipulação de uma cláusula nos termos da 8.ª nº 4 do CPCV em causa, em face da não concessão de empréstimo bancário e sua comunicação aos recorridos, terá de implicar a imediata cessação do contrato, constituindo condição resolutiva expressa, a qual determina a imediata destruição da relação contratual assim que o facto futuro e incerto se verifica - a recusa do financiamento bancário - independentemente de qualquer comunicação, impossibilitando a sua posterior resolução por qualquer das partes. m. Nestes termos, a estipulação de prazo para a comunicação da verificação da condição resolutiva aos recorridos, promitentes vendedores, integra-se nos deveres acessórios impostos ao recorrente a quem incumbe diligenciar pelo empréstimo bancário, promitente comprador, cujo incumprimento, não determina a não verificação da condição, mas antes constitui incumprimento de um dever acessório constante deste contrato, com eventual obrigação de indemnização dos prejuízos sofridos pela contraparte pela mora na comunicação da condição, a qual de resto não foi reclamada, por inexistente. n. Condição resolutiva que o recorrente demonstrou ter ocorrido, mal tendo andado, (…) a (…) sentença recorrida, ao assim não entender. o. O recorrente, em face desta primeira recusa pelo Banco BPI, procurou ainda financiar-se junto de outra instituição de crédito, até porque o prazo dos 45 dias ainda não estava atingido, nomeadamente junto do Santander Totta, demonstrando o recorrente diligência e boa-fé na obtenção de financiamento bancário necessário à realização do contrato definitivo, o qual não veio, novamente, a obter, conforme carta recebida dessa instituição datada de 08.08.2017, cfr. doc. 6 junto com a PI. p. Mesmo depois de exauridos os referidos prazos, de 45 dias em 09.[7].2017 e 90 dias 23.08.2017, as partes mantinham interesse em contratar, tendo sido realizadas pelo menos duas reuniões entre as partes, sendo que uma delas terá necessariamente ocorrido após o prazo de 90 dias, ou seja, necessariamente após a data de 23.08.2017, o que se conjuga com o facto provado 6. q. A testemunha FF, confirmou a existência de interesse de ambas as partes, pelo menos até 23.08.2017, pese embora ultrapassado o prazo previsto para a celebração do contrato prometido, em manterem o negócio, agora através de um novo CPCV, do qual os serviços jurídicos da imobiliária minutaram e enviaram via consultoras, às partes interessadas, sendo certo que não chegou a ser subscrito. r. A injustificada recusa dos promitentes vendedores em assinar e concluir um novo CPVC depois de minutado o entendimento a que terão chegado após negociação, pela sociedade imobiliária, numa fase final em que só faltava ser outorgado pelas partes, isto é em que a formalização escrita do acordo, conforme imposto pelo nº 2 do artigo 410.º do CC, poucos dias depois concluídas as negociações, terá de os fazer incorrer em responsabilidade os recorridos, por violação do princípio da boa fé in contrahendo, sendo equacionável a existência de um verdadeiro dever de contratar, nos temos já negociados. s. Violação do princípio que necessariamente deveria ser declarado pela (…) sentença, e que faria os recorridos incorrer na obrigação de indemnizar pelo dano pelo subsistente, colocando o recorrente na posição em que estaria se novo contrato de promessa tivesse sido celebrado, conforme negociado pelas partes e minutado pela agência imobiliária. t. Sendo que a indemnização devida pela violação do dever de outorgar o novo contrato deveria ser quantificada no montante da restituição da quantia de € 17.000,00. u. Sem conceder, mesmo que assim não se entenda, sempre se dirá que o CPCV foi ilicitamente resolvido, pois os recorridos, decorrido que estava o prazo para a celebração da compra e venda, jamais, interpelaram o requerente para, em prazo razoável, efectuar a respectiva marcação da escritura para o imóvel prometido vender. v. Assim sendo o recorrente só se encontrava em mera mora, não em incumprimento definitivo, e só o incumprimento definitivo e não a mora desencadeia o mecanismo indemnizatório da perda do sinal, no caso em singelo. w. Os recorridos, ao invocar na carta que enviaram ao recorrente, datada de 25.09.2017, registada com aviso de recepção, quando invocam, como causa resolutiva a perda objectiva de interesse na celebração do contrato prometido, tinham o ónus da alegação e prova da factualidade de suporte de tal perda objectiva de interesse, que tem de ser aferida segundo um critério de razoabilidade, o que não fazem, nunca tendo como se disse interpelado o recorrido para a marcação com qualquer cominação no caso de não a efectuar no prazo razoável que fosse então, e assim fixado. x. Quanto aos factos não provados, defende-se contrariamente ao (…) decidido, e como alegado, que para além de existir nos autos diversa prova documental, foi produzida prova testemunhal bastante que conduziria a decisão diversa da prolatada. y. Resulta, quanto ao ponto 1 de facto não provado, que inequivocamente, antes de decorrer o prazo de 45 dias para a comunicação da não obtenção de financiamento bancário, a mulher do recorrente comunicou à imobiliária a decisão do banco BPI, ocorrida em 20.06.2017, na pessoa da funcionária DD que por sua vez informou os seus superiores hierárquicos do facto, reencaminhando-lhes o e-mail recebido da mulher do recorrente, tendo-os ainda alertado pessoalmente, os quais por sua vez transmitiram a ocorrência aos recorridos. z. Mais, se demonstrou e comprovou que após ter expirado o prazo de 90 dias para a celebração do contrato prometido as partes acordaram na elaboração de um novo CPCV, com alteração dos prazos constantes das cláusulas do CPCV inicial, nomeadamente das cláusulas 4ª, nº 1, e 8ª, nº 4, do mesmo contrato, e estabelecimento de novos prazos para a rescisão em caso de não obtenção de financiamento, bem como para a realização da escritura de compra e venda. aa. Assim o facto não provado 1, deve ser eliminado e em sua substituição passar a integrar os factos provados, no lugar que lhe competir, um novo facto, com a seguinte redacção: « Alguns dias antes de se atingirem os 45 dias da celebração do contrato referido em l. dos factos provados, a mulher do A. comunicou à agente imobiliária DD a recusa da financiamento peticionado ao banco BPI pelo Autor, a qual por sua vez reencaminhou a informação aos seus superiores hierárquicos, que por sua vez a comunicaram aos requeridos, mostrando-se assim preenchida e accionada a condição resolutiva, constante da cláusula 8.ª nº 4, constituindo-se assim os RR na obrigação de devolver ao A, em singelo, todos os valores deste recebidos » bb. Deve ainda passar a integrar os factos provados no lugar que lhe competir um novo facto, com a seguinte redacção, eliminando-se em consequência o facto não provado nº 2: « Em reunião ocorrida após 23.08.2017, mas antes de 25.09.2017, em reunião nas instalações da agência imobiliária referida em 12º, do CPCV, as partes acordaram em celebrar um novo CPCV, texto acordado que foi minutado pela agência imobiliária, o qual não foi subscrito pelos RR, incorrendo esta assim flagrante violação do princípio da boa-fé in contrahendo, constituindo-se na obrigação de indemnizar o A. na quantia de 17.000,00 euros, acrescido de juros de mora, contados à taxa legal, que se mostrarem devidos, desde a interpelação extrajudicial constante do Doc. 9 até ao efectivo e integral pagamento » cc. Já quanto ao facto não provado 3, que se transcreve: “3. O A. exigiu que este novo acordo fosse reduzido a escrito e subscrito pelas partes” deve passar a integrar os factos provados no lugar que lhe competir, com a mesma redacção. dd. Alterando-se em consequência a decisão dela passando a constar: a) ser a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar os RR. na devolução em singelo dos valores recebidos do A, acrescido dos juros de mora, contados à taxa legal, que se mostrarem devidos, desde a interpelação extrajudicial constante do Doc. 9 até ao efectivo e integral pagamento; b) considerar violado pelos recorridos o princípio da boa-fé in contrahendo, e como tal em abuso de direito; c) julgar improcedentes os restantes pedidos e o incidente de litigância de má-fé deduzido pelos RR. d) Custas pelo A. e R em razão dos decaimentos. Normas violadas: art. 334.º e 483.º, nº 1, ambos do CC. 2. Os réus responderam. E organizaram assim as conclusões da contra-alegação. a. Entendem os recorridos que não existe fundamento para que seja dada procedência ao pedido do recorrente de eliminação do “facto não provado” 1., da sentença recorrida. b. Também não existe fundamento para que seja aditado à matéria de facto dada como provada o seguinte facto: « Alguns dias antes de se atingirem os 45 dias da celebração do contrato referido em 1. dos factos provados a mulher do A. comunicou à agente imobiliária DD a recusa do financiamento peticionado ao banco BPI pelo Autor a qual por sua vez reencaminhou a informação aos seus superiores hierárquicos, que por sua vez a comunicaram aos Requeridos, mostrando-se assim accionada a condição resolutiva, constante da cláusula 8º, nº 4, constituindo-se assim os RR na obrigação de devolver ao A, em singelo, todos os valores deste recebidos » c. O pedido formulado pelo autor de aditamento de novo facto à matéria dada como provada não faz sentido por falta de prova que sustente o mesmo, e pelo facto de incluir uma conclusão de direito. d. O facto 1 dado como “não provado”, diz respeito à alegação do autor de que tinha pedido a alteração do CPCV antes dos 45 dias do prazo para celebração do contrato, e não à comunicação da recusa do financiamento por parte do Autor. e. Dar como provado que (…) mostrando-se assim accionada a condição resolutiva, constante da cláusula 8º, nº 4, constituindo-se assim os RR na obrigação de devolver ao A, em singelo, todos os valores deste recebidos” não faz sentido, pois não se trata de um facto e sim uma conclusão jurídica. Como tal, deve improceder o pedido do recorrente. f. O recorrente não apresenta fundamentos ou prova para que seja eliminado o “facto não provado” 2. que consta da sentença recorrida. g. Não existe fundamento para aditar à matéria de facto dada como provada o seguinte: « Em reunião ocorrida após 23.08.2017, mas antes de 25.09.2017, em reunião nas instalações da agência imobiliária referida em 12º do CPCV, as partes acordaram em celebrar um novo CPCV, texto acordado que foi minutado pela agência imobiliária, a qual não foi subscrito pelos RR, incorrendo esta assim em flagrante violação do princípio da boa-fé in contrahendo, constituindo-se na obrigação de indemnizar o A. na quantia de 17.000,00 euros, acrescido dos juros de mora, contados à taxa legal que se mostrarem devidos, desde a interpelação extrajudicial constante do Doc. 9 até ao efetivo e integral pagamento » h. O recorrente não apresenta qualquer prova que sustente o aditamento como facto provado do texto referido. i. O depoimento da Sra. D. Sandrine esposa do recorrente, evidenciou de forma clara que: a. No entendimento da Sra. D. Sandrine, o seu objectivo à data da reunião, era fazer uma Adenda ao CPCV que, segundo aquela, ainda estava em vigor e não um novo CPCV; b. O recorrente e a esposa mantiveram-se em total silêncio após a reunião referida, quando eram estes os principais interessados em manter o negócio, ainda que adiando a sua conclusão. j. Da prova produzida resulta que não é verdade que da reunião realizada em Setembro de 2017, tenha resultado que “as partes acordaram em celebrar um novo CPCV (…)”. k. E também não é verdade que “(…) o texto acordado que foi minutado pela agência imobiliária, o qual não foi subscrito pelos RR (…..)” pois a Sra. D. Sandrina referiu de forma expressa que não recebeu nenhuma minuta. E, como foi dito pela própria, o recorrente tomava conhecimento de tudo o que se passava com este processo pela Sra. D. Sandrina. l. Ao longo do depoimento prestado, a Sra. D. Sandrine relata de forma clara que, o recorrente nunca comunicou com os réus e aqui recorridos e que: a. O autor e recorrente nunca leu a minuta do CPCV; b. O autor e recorrente assinou o CPCV mas não o leu antes de assinar. Foi a testemunha quem leu mas só para confirmar a identificação das partes; c. O autor e recorrente não sabia dos prazos previstos no CPCV. m. O recorrente não tem, assim, razão no pedido formulado de eliminação do facto não provado 2. e aditamento de novo facto como provado, por falta de prova. n. O recorrente não indica qual a prova que permite sustentar o pedido de dar como provado o facto indicado no ponto 3 dos factos não provados. o. Deve, assim, improceder o pedido de alteração da matéria de facto não provada. p. O recorrente não tem razão quando alega que o nº 4 da Cláusula 8ª do CPCV consubstancia uma condição resolutiva, nos termos previstos no artigo 270º do CC. q. Só agora em sede de recurso, o autor e recorrente vem alegar que o CPCV incluía uma “condição resolutiva” e que, tendo o autor provado a verificação da mesma, tal facto “sempre importaria a resolução automática do negócio jurídico, e que determinaria a eliminação dos efeitos do contrato, retroactivamente, com a consequente restituição do que tiver sido prestado até essa data”. r. Ora, contrariamente ao que alega agora o recorrente, o que resulta do ponto 4 da Cláusula 8ª não consubstancia uma “condição resolutiva”, mas uma “cláusula resolutiva” que confere àquele que dela beneficia (no caso, o autor e recorrente), o poder de resolver o contrato com fundamento num determinado facto descrito na cláusula. Trata-se, assim, de uma convenção quanto à possibilidade de resolução do contrato por uma das partes, nos termos previstos no nº 1 do artigo 432º do CC. s. A distinção entre “condição resolutiva” e “cláusula resolutiva” pode ser encontrada no Acórdão do TRL proferido no processo nº 12868/19.2T8LSB.L1-2 citado pelo recorrente nas suas alegações, pelo que se estranha que o recorrente o tenha citado para fundamentar a sua tese. t. A resolução do CPCV não pode acontecer sem que a parte que beneficia desse direito venha comunicar a efectivar a resolução por comunicação à outra parte, no prazo previsto no contrato. u. A cláusula resolutiva prevista na cláusula 8ª, ponto 4 prevê um direito do autor e aqui recorrente e, como tal, não poderia operar automaticamente. v. Ainda que estivesse em causa uma condição resolutiva (o que apenas admitimos para efeito de contestar a fundamentação do recorrente), o promitente comprador e aqui recorrente sempre teria de fazer uma comunicação à outra parte, para esta poder tomar conhecimento da resolução automática do cpcv e, assim, proceder à restituição imediata dos valores já recebidos. w. Ao demonstrar interesse na conclusão do negócio após o prazo dos 45 dias e o prazo dos 90 dias, o recorrente reforçou a ideia de que não pretendia resolver o cpcv, contradizendo desta forma a sua conclusão de que o cpcv previa uma condição resolutiva. x. Segundo a Sra. D. Sandrina, em Setembro de 2017 o recorrente e a esposa consideravam que o CPCV ainda estava em execução, pelo que não faz sentido que o recorrente afirme que “(….) as partes acordaram em celebrar um novo cpcv, texto acordado que foi minutado pela agência imobiliária, o qual não foi subscrito pelos RR (…)”. y. Os réus e aqui recorridos concluem, assim, que não pode de forma alguma a sentença recorrida ser alterada no sentido de declarar que os réus violaram o “princípio da boa fé in contrahendo” considerando que não foi produzida prova que sustente esse pedido do autor e recorrente. 3. A delimitação do objecto do recurso. 3.1. Os segmentos desfavoráveis ao recorrente, nas questões julgadas pela sentença, circunscrevem o objecto inicial do recurso; sendo esse o universo onde as conclusões da alegação, delimitam aquelas (mais) concretas, os particulares temas ou assuntos, que se visam colocar à apreciação do tribunal superior (artigo 635º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Civil). 3.2. Na hipótese, constituem primordiais questões decidendas as seguintes: 1.ª; (1) perceber se, no contrato-promessa celebrado, se contempla condição resolutiva, com a virtualidade de operar a rescisão (automática) desse contrato; (2) por outro lado; conexa com esta, equacionar um novo facto provado, em consequência da reversão do facto não provado 1.; 2.ª; (1) perceber se os factos permitem reconhecer a violação do princípio da boa fé in contrahendo, por parte dos réus (apelados); (2) por outro lado; conexa com esta, equacionar dois novos factos provados, em consequência da reversão dos factos não provados 2. e 3.; 3.ª; perceber se os réus (apelados), estando o autor (apelante) apenas em situação de mora, operaram infundadamente a resolução do contrato-promessa; 4.ª; em síntese; se os réus (apelados) devem ser condenados « na devolução em singelo dos valores recebidos do autor acrescido(s) dos juros de mora, contados à taxa legal, (…) desde a interpelação extrajudicial constante do doc. 9 ». II – Fundamentos 1. A matéria de facto enunciada na sentença. 1.1. A decisão recorrida ordenou assim o elenco dos factos provados: 1. Por documento particular datado de 25/05/2017, com a designação «contrato promessa de compra e venda», que aqui se dá por integralmente reproduzido, A. e RR. – aí designados por «parte compradora» e «parte vendedora», respectivamente – declararam, nas qualidades de promitente comprador e promitentes vendedores, também respectivamente, além do mais, o seguinte: «É celebrado livremente e de boa fé o presente contrato promessa de compra e venda que se regerá pelas cláusulas seguintes: 1.ª 1. A PARTE VENDEDORA é dona e legítima proprietária do prédio urbano composto por moradia unifamiliar de cave com garagem, rés-do-chão e 1.º andar (…), sito na Rua da ..., na freguesia de Barcarena, concelho de Oeiras, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial sob o número ... da referida freguesia (…), e inscrito na matriz da mencionada freguesia sob o artigo ... (…). (…). 2.ª Pelo presente contrato, a PARTE VENDEDORA promete vender, livre de quaisquer ónus, encargos e outras responsabilidades, à PARTE COMPRADORA, que promete comprar, a fracção supra identificada, pelo preço de € 650.000,00 (…). 3.ª O preço global acordado será pago pela parte compradora da seguinte forma e tempo: 1. Na presente data, a parte compradora entrega a quantia de € 10.000,00 (…), a título de sinal e princípio de pagamento (…). 2. A título de reforço de sinal, a parte compradora efectuará pagamentos mensais no valor de € 3.500,00 (…) para a conta da parte vendedora com o IBAN (…), vencendo-se a primeira no dia 25/06/2017 e as restantes no dia 25 dos meses subsequentes. 3. Na data da realização da escritura de compra e venda será paga pela Parte compradora, através de cheque visado ou cheque bancário, a quantia remanescente. (…). 4.ª 1. A marcação da escritura pública de compra e venda fica a cargo da Parte Compradora, ficando desde já acordado que a mesma terá lugar no prazo máximo de 90 (noventa) dias a contar da assinatura do presente contrato. 2. Para os efeitos do disposto no número anterior, a Parte Compradora compromete-se a comunicar à Parte Vendedora a hora e local da celebração da escritura pública de compra e venda, com uma antecedência não inferior a quinze dias, tendo a escritura que se realizar no Distrito de Lisboa. (…). 7.ª 1. Todas as comunicações previstas no presente contrato serão realizadas através de carta registada com aviso de recepção para as moradas constantes dos mesmos, considerando-se as mesmas como domicílio convencionado para os devidos efeitos. (…). 3. Qualquer alteração ao presente contrato deverá revestir a forma de documento escrito e assinado por todas as partes constantes desde contrato. 4. A forma de comunicação entre as partes, estabelecida nos números anteriores, não prejudica que, por acordo, as partes privilegiem a comunicação por contacto telefónico, via e-mail, ou por intermédio de Consultor(a) Imobiliário(a). 8.ª 1. Em caso de incumprimento do presente contrato por causa imputável à Parte Vendedora, a Parte Compradora poderá exigir a restituição do dobro do sinal. 2. Se o incumprimento definitivo do presente contrato for por causa imputável à parte compradora, a parte vendedora fará suas as quantias até aí recebidas. (…). 4. Considerando que a parte compradora necessita de financiamento bancário para a aquisição do imóvel objecto deste contrato promessa, é-lhe reconhecido o direito de resolver o presente contrato caso não venha a obter a aprovação do financiamento bancário necessário para a compra do mesmo, cessando deste modo todos os seus efeitos entre as partes, desde que exerça tal direito no prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias a contar desta data, não havendo lugar a qualquer indemnização ou compensação adicional, sendo-lhe restituídas as quantias entregues a título de sinal e/ou reforço de sinal, em singelo. 5. Para o válido e eficaz exercício do direito de resolução estipulado no número anterior, a Parte Compradora deverá manifestar essa sua vontade à Parte Vendedora por carta registada com aviso de recepção, expedida até ao último dia do prazo de 45 dias acima indicado, incluindo comprovativo onde se indiquem as razões da recusa de financiamento. (…). 12.ª As partes declaram, nos termos da Lei número 15/2013, de 8 de Fevereiro, que a compra e venda ora prometida realizar, teve a intervenção da ‘Prestígio Global – Sociedade de Mediação Imobiliária, S.A.’ (…)». (sublinhado acrescentado) 2. O A. entregou aos RR., a título de sinal e princípio de pagamento do preço, a quantia global de € 17.000,00, sendo € 10.000,00 no acto de assinatura do contrato referido em 1. e duas prestações, no valor de € 3.500,00, cada, nos meses de Junho e Julho de 2017. 3. Em 20/06/2017, o A. teve conhecimento de que o Banco BPI, S.A., não aprovou o pedido de financiamento bancário, no montante solicitado (€650.000,00), para a aquisição do imóvel identificado na cláusula 1.ª do contrato referido em 1. supra, dispondo-se, contudo, o mesmo Banco, a reanalisar a operação de crédito para montante inferior, caso o A. nisso tivesse interesse. 4. Por carta de 08/08/2017, também o Banco Santander Totta, S.A., comunicou ao A. a decisão de recusa do pedido de financiamento por este apresentado, para o mesmo efeito. 5. A mulher do A. informou a mediadora imobiliária referida na cláusula 12.ª do contrato referido em 1., na pessoa da sua funcionária DD, das decisões de recusa de financiamento referidas em 3. e 4. supra, quando delas teve conhecimento, tendo a referida agente imobiliária se comprometido a transmitir tal informação aos promitentes vendedores. 6. Por comunicação electrónica de 22/09/2017, que aqui se dá por integralmente reproduzida, GG, mulher do A., comunicou à agência imobiliária, na pessoa de FF, além do mais, o seguinte: «No dia 23 ou 22/08 recebo uma chamada da DD onde o FF me informa que estou em incumprimento, que não pedi a devolução do capital e que não fiz a escritura. O que realmente me deixou estupefacta porque embora sem formalismos, tinha cumprido com tudo. À data deste telefonema, ficou decidido haver uma reunião entre vendedores e compradores (…). A reunião aconteceu fez hoje 15 dias. Nessa reunião, (…) assumimos o compromisso de nos mantermos no negócio com a condição da casa voltar ao mercado de imediato, e se vendessem a casa a um terceiro devolviam o valor entregue em singelo tal como o devolveriam se num curto espaço de tempo o banco recusasse o crédito. A minha única condição é que isto ficasse por escrito. Desde essa reunião já passaram 15 dias, não tive qualquer comunicado nem chamada nem sms a dizer rigorosamente nada. Solicitei a devolução ao banco, e voltei a informar da nossa posição, de só querermos continuar com o negócio em caso de nos garantirem a devolução do dinheiro. Com a nossa conversa, percebi que os vendedores pretendem mais dinheiro, pelo que percebi mais 15.000€, mas não querem assinar qualquer documento em como devolvem o dinheiro na totalidade em caso de recusa. Perante esta posição dos vendedores a nossa posição neste momento é a seguinte: Pretendemos a devolução dos valores entregues para a conta bancária que passo a indicar até dia 26/09/2017. (…)». 7. Por carta datada de 25/09/2017, registada com aviso de recepção, os RR. comunicaram ao A., que a recebeu, o seguinte: «Exmo. Sr. Em 25 de Maio de 2017, assinámos com V. Exa. um Contrato de Promessa de Compra e Venda (CPCV) (…). Na data acima mencionada, acordámos que o contrato definitivo deveria ser realizado no período máximo de 90 (noventa) dias a contar da assinatura. Mais, estabelecemos que V. Exa. teria o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para resolver o contrato promessa de compra e venda, com a devolução de sinal em singelo, caso não viesse a obter a aprovação necessária por parte do Banco financiador. Para isso, bastaria que nos enviasse uma carta, até ao final desse prazo de 45 dias, mencionando essa intenção, juntamento com um comprovativo de recusa por parte do Banco. O que não aconteceu. Desde o terminus do contrato até à presente data, temo-vos dado inúmeras oportunidades para que celebrasse o contrato definitivo, porém, V. Exa. continua sem o fazer. Assim, vimos por esta via comunicar a V. Exa. que o não agendamento do contrato definitivo nas datas acordadas, implica incumprimento da parte compradora, pelo que, este incumprimento, a recusa em realizar o contrato definitivo em data posterior, acompanhado da nossa perda de interesse no negócio dado o decurso do tempo, leva a que consideremos que existe incumprimento definitivo da v/parte, com a inerente consequência de perda do sinal entregue. Face ao exposto, consideramos o contrato definitivamente incumprido por culpa imputável a V. Exa., sendo nossa intenção fazer nossas as quantias prestadas a título de sinal e respectivos reforços». 8. Os RR. não devolveram ao A. a quantia total de €17.000,00, referida em 2. supra. 9. A generalidade dos contactos e comunicações respeitantes ao contrato referido em 1. foram sendo assumidos e desenvolvidos pela mulher do A., GG, com o conhecimento daquele. 10. Findos os prazos previstos nas cláusulas 4.º, n.º 1, e 8.º, n.º 4, do contrato referido em 1. supra, sem celebração da escritura de compra e venda ou envio da carta de resolução referida naquela última cláusula, ocorreram negociações entre as partes, com intervenção da mediadora imobiliária, as quais, todavia, se revelaram inconclusivas, não conduzindo à celebração da referida escritura, nem à alteração dos termos do contrato de promessa. 1.2. A sentença julgou como factos não provados: 1. Alguns dias antes de se atingirem os 45 dias da celebração do contrato referido em 1. dos factos provados, o A. propôs aos RR., através da agente de mediação imobiliária DD, a modificação das cláusulas 4.ª, n.º 1, e 8.ª, n.º 4, do mesmo contrato, no sentido do estabelecimento de novos prazos para a rescisão em caso de não obtenção de financiamento, bem como para a realização da escritura de compra e venda, tendo estes concordado, ficando os termos do aditamento apenas dependentes do estabelecimento de um reforço de sinal, que os RR. ficaram de propor. 2. Em reunião ocorrida em 07/09/2017, as partes acordaram que o imóvel seria colocado em venda no mercado e que, caso surgisse um terceiro interessado na aquisição do imóvel, os RR. venderiam o imóvel e procederiam à devolução em singelo dos quantitativos que até então haviam recebido do A. e, de igual forma, devolveriam os valores recebidos caso o A. não viesse, num curto período de tempo (não definido), a obter o financiamento bancário. 3. O A. exigiu que este novo acordo fosse reduzido a escrito e subscrito pelas partes. 4. O A. só subscreveu o contrato referido em 1. dos factos provados, nas condições de prazos (rescisão e escritura) nele estabelecidos, por estar convencido, o que lhe foi assegurado pelos colaboradores da mediadora de crédito, que seguramente iriam obter para si, junto da banca, em menos de dois meses, o financiamento de que necessitava, e que com toda a certeza efectuaria a escritura em 90 dias, e, se tal não viesse a acontecer, jamais os RR. iriam fazer suas as quantias que fossem entregues a título de sinal e princípio de pagamento, não obstante o que estabelecia o mesmo contrato. 2. O quadro jurídico que o recurso de apelação convoca. 2.1. A condição resolutiva; o facto não provado 1.. 2.1.1. O autor recortou a causa de pedir, na acção, direccionando-a sobretudo a vícios de formação da sua vontade ou, por outro lado, a má-fé e a abuso de direito dos autores; em qualquer dos casos, no contexto da outorga do contrato-promessa fechado. A consequência que retirou foi a da invalidade negocial. A sentença recorrida rejeitou o vício de vontade; e, por outro lado, convocou uma putativa « violação do princípio da boa fé in contrahendo », mas que também arredou. É pela primeira vez, em sede de recurso, que o autor chama o tema da condição resolutiva; redireccionando o envolto jurídico da realidade fáctica e, por essa forma, de alguma maneira, afectando aquele enquadramento inicial. E em termos que se nos afiguram até intrinsecamente incoerentes. Ainda assim; e posto que a liberdade na aplicação do direito tem uma vasta latitude (artigo 5º, nº 3, do Cód. Proc. Civ.); apenas condicionada por um essencial contraditório (artigo 3º, nº 3, do Cód. Proc. Civ.). À cláusula questionada, integrada no contrato-promessa que o autor fechou com os réus, foi dada a seguinte redacção, sob o segmento 8.º, nº 4: « considerando que a parte compradora necessita de financiamento bancário para a aquisição do imóvel objecto deste contrato promessa, é-lhe reconhecido o direito de resolver o presente contrato caso não venha a obter a aprovação do financiamento bancário necessário para a compra do mesmo, cessando deste modo todos os seus efeitos entre as partes, desde que exerça tal direito no prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias a contar desta data, não havendo lugar a qualquer indemnização ou compensação adicional, sendo-lhe restituídas as quantias entregues a título de sinal e/ou reforço de sinal, em singelo » Complementava esta cláusula, uma outra, no nº 5 seguinte, com a redacção: « para o válido e eficaz exercício do direito de resolução estipulado no número anterior, a parte compradora deverá manifestar essa sua vontade à parte Vendedora por carta registada com aviso de recepção, expedida até ao último dia do prazo de 45 dias acima indicado, incluindo comprovativo onde se indiquem as razões da recusa de financiamento » A noção de condição resolutiva consta do artigo 270º do Código Civil. As partes podem, querendo, adicionar ao seu contrato uma cláusula (acessória ou conexa) onde ajustem a sujeição (submetam) a um acontecimento futuro e incerto a extinção automática do negócio, por resolução. A condição constitui-se, portanto, do facto prevenido (futuro; incerto) que, uma vez concretizado (acontecendo), acarreta por si a cessação do contrato. Nada mais se exige para essa cessação; ela gera-se com a verificação do facto. Distinta desta é a chamada cláusula resolutiva. Neste caso, ocorre também a introdução (convencional) no contrato de uma cláusula (também acessória ou conexa); mas esta a prever, nas circunstâncias que desenhe, a possibilidade (a admissibilidade) de se poder (mas tão-só se se quiser) fazer extinguir, de se fazer cessar (de lhe poder por fim), o negócio. Esta cláusula está contemplada no artigo 432º, nº 1, do Código Civil. E não acarreta, verificado o facto prevenido, qualquer extinção automática. Antes, concede às partes, ou a uma delas, (apenas) o direito potestativo a poder fazer operar a extinção; quer dizer, pela ocorrência da circunstância convencionada, a esfera jurídica do sujeito fica apetrechada (enriquecida) de uma (mera) faculdade; mas que ele pode ou não fazer accionar. O que fará, eficazmente, por declaração à outra parte (artigo 436º, nº 1, do CC). Mas, por outro lado, e se o não fizer, deixando persistir a vida ao contrato. É esta uma distinção clara e pacífica, na doutrina e na jurisprudência. Pois bem. Na hipótese concreta, é mais do que evidente que não foi fixada uma condição resolutiva, como o apelante (só) agora pretende. O que foi reconhecido, aliás em seu favor, na cláusula 8.ª, nº 4, verificado que não conseguisse financiamento bancário para fechar o contrato prometido, foi o direito a resolver a promessa, ademais um direito que devia exercer – querendo – no prazo máximo de 45 dias; e ademais ainda mediante a manifestação de vontade, nos termos complementados pelo nº 5, da mesma cláusula 8.ª. Nitidamente, portanto, uma cláusula resolutiva. E que o apelante nem, em algum momento, accionou. Ao invés, como corrobora no recurso interposto, mesmo depois da frustração do financiamento bancário, mantendo « interesse em contratar » (vd. a conclusão p.); o que torna incongruente (e desarmonioso), como dissemos, a invocação de uma condição resolutiva como factor extintivo, e automático, dos efeitos da promessa (!). 2.1.2. Com isto ainda conexo, o apelante pede que se substitua o facto não provado 1., por outro, para o qual propõe a seguinte redacção: « Alguns dias antes de se atingirem os 45 dias da celebração do contrato referido em l. dos factos provados, a mulher do A. comunicou à agente imobiliária DD a recusa da financiamento peticionado ao banco BPI pelo Autor, a qual por sua vez reencaminhou a informação aos seus superiores hierárquicos, que por sua vez a comunicaram aos requeridos, mostrando-se assim preenchida e accionada a condição resolutiva, constante da cláusula 8.ª nº 4, constituindo-se assim os RR na obrigação de devolver ao A, em singelo, todos os valores deste recebidos » Excluído o segmento final, de óbvio cariz não factual, mas nitidamente jurídico-conclusivo, nem ao resto parece ser de dar merecido acolhimento. Desde logo, por aqui se contemplar o que já o facto provado 5. permite reflectir. Por outro lado; o tema do facto não provado 1. é outro, que não o descrito no agora proposto; este a visar a comunicação da recusa do financiamento; aquele a notar uma proposta para modificação de cláusulas contratuais iniciais. E, em qualquer caso; sendo o pretendido acrescento nitidamente indiferente para o enquadramento jurídico especificamente tido em vista. A cláusula não era de condição resolutiva; a comunicação descrita não era hábil a operar a resolução do contrato-promessa. E perante essa apatia jurídica, no confronto com qualquer (outra) solução plausível, desnecessário parece mexer na situação fáctica neste particular construída no tribunal a quo. 2.2. A violação da boa fé in contrahendo; os factos não provados 2. e 3.. 2.2.1. É a sentença recorrida que, pela primeira vez, realiza enquadramento numa putativa censura aos réus, por culpa in contrahendo, expressando assim: « os factos alegados pelo autor, (…), poderiam, em abstracto, configurar uma situação de recusa injustificada de uma das partes (os réus) em concluir um contrato modificativo, numa fase culminante da respectiva negociação, em que apenas faltava a formalização escrita do acordo, conforme imposto pelo nº 2 do artigo 410º do CC. Nesta hipótese, seria de admitir a responsabilidade dos réus por violação do princípio da boa fé in contrahendo, sendo equacionável a existência de um verdadeiro dever de contratar, nos termos já negociados, cuja violação faria os réus incorrer na obrigação de indemnizar o dano pelo subsistente interesse contratual positivo, colocando o autor na posição em que estaria se o contrato modificativo ou o novo contrato de promessa tivesse sido celebrado, conforme negociado pelas partes » E adiante: « Sucede, porém, que o autor não demonstrou, como era seu ónus (…), que as negociações que tiveram lugar após o decurso dos prazos previstos nas cláusulas 4.ª, nº 1, e 8.ª, nº 4, do contrato de promessa de 25/05/2017, tenham culminado em qualquer acordo (…) que os réus se tenham injustificadamente recusado a formalizar, defraudando censuravelmente as expectativas criadas no autor nesse sentido » Em óptica normativa, é o artigo 227º, nº 1, do Código Civil, que prevê a situação de culpa na formação dos contratos, estabelecendo que: « Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte »: Esta disposição não pode deixar de ser contextualizada com outras; como caso, p. ex., as dos artigos 405º, nº 1, ou 232º, ambas do Cód. Civil. A 1.ª, para expressar que as partes não têm vínculo algum, mas são livres, de celebrar, ou não, os contratos que lhes aprouver. A 2.ª, para significar que o contrato só fica concluído quando as partes fecharem o acordo em todas as cláusulas sobre as quais o julguem necessário. Sobre o assunto escreveu assim Inocêncio Galvão Telles: « Até à fase decisória, qualquer das partes pode pôr termo às negociações licitamente e portanto sem incorrer em responsabilidade, porque as negociações fazem-se precisamente para esclarecer se o contrato interessa. Ambas e cada uma das partes têm o direito de não contratar. A ruptura das negociações só será ilegítima se for contrária às exigências da boa fé, como no exemplo clássico daquele que as inicia já com o propósito formado de não as levar a termo (…). Enquanto decorrem as conversações, a boa fé impõe também que nenhum dos negociadores engane o outro, ou deixe-o no engano, sobre circunstâncias que podem influir na sua decisão de levar por diante as conversações ou vir a contratar em determinados termos. » (“Manual dos contratos em geral” [refundido e actualizado], 2002, página 205). Revisitemos os factos (os provados, sem impugnação); e a posição das partes. O contrato-promessa foi fechado no dia 25.5.2017. A marcação da escritura, no prazo máximo de 90 dias, era encargo do apelante e promitente-comprador (cláusula 4.ª). A este se concedeu o direito potestativo de resolver o contrato-promessa, a operar no prazo máximo de 45 dias, caso não obtivesse financiamento (cláusula 8.ª, nºs 4 e 5). O apelante não accionou a resolução. Em 25.8.2017 ainda o autor manifestava « interesse na aquisição do imóvel » (artigo 40º da petição inicial). Já após os 90 dias do termo ad quem da escritura final, « ocorreram negociações entre as partes, com intervenção da mediadora imobiliária, as quais, todavia, se revelaram inconclusivas, não conduzindo à celebração da referida escritura, nem à alteração dos termos do contrato de promessa » – vd. facto provado 10.. As partes encontraram-se, numa reunião, em 7.9.2019 (artigo 42º da pet. inicial e artigo 21º da contestação). Nesse encontro, ficou acordado (artigo 42º/ii. pet. inic. e artigo 25º/i) cont.) que (1.º) o contrato-promessa (antes firmado) estava cessado e que (2.º) deveria ser assinado um novo contrato-promessa. Não foi assinado qualquer novo compromisso (ou outro contrato-promessa). No dia 22.9.2017 o apelante (através da esposa) solicita a devolução do sinal. No dia 25.9.2017 os apelados declaram fazer seu o sinal. A razão pela qual as partes não assinaram qualquer outro compromisso ou novo contrato-promessa, após a reunião de 7.9.2019, não é clara. Sendo este ponto de facto crucial para um escrutínio da culpa in contrahendo. O facto provado 10. – não impugnado pelo apelante – verbaliza negociações sem sucesso; os articulados das partes reflectem consenso sobre a reunião de 7.9 e sobre o duplo acordo aí obtido – que tem de ser adquirido para a decisão (artigos 607º, nº 4, 2.ª parte, e 663º, nº 2, final, do Cód. Proc. Civ.) –, (1.º) de cessação da promessa inicial e (2.º) da feitura de nova promessa. Não foi assinado novo contrato-promessa; nem por apelante; nem por apelados. Mas a causa na origem dessa omissão fica por conhecer – foi o apelante que potenciou o facto da omissão ou foi um comportamento dos apelados que a incitou?... Aliás; a conduta inicial (primeira) de ruptura (aparentemente) fatal, é até do lado do apelante; e traduzida pela missiva de 22.9, enquanto nela reclama « a devolução dos valores entregues ». Por outro lado; nem mesmo a prova livre, a pessoal, contém evidência suficiente para o esclarecimento da imputação. O testemunho que o apelante convoca, de FF (ouvido na sessão de 30.10.2024), director comercial da mediadora, presente na reunião com os sujeitos envolvidos, pese embora ir referindo a feitura de uma minuta de contrato, não foi em qualquer passo concludente (e seguro) acerca das causas da não formalização dessa outra (e nova) promessa; expressou mesmo que « apenas não foi assinada ». E não se vislumbra disponível outra ferramenta probatória com consistência bastante para convencer acerca dessa atribuição (culpa); na certeza de que o alicerce e a maturação próprios à moldagem de livre apreciação exigem que se atinja um nível razoável de fidelidade, o mínimo para as necessidades práticas da vida (artigos 607º, nº 5, segmento inicial, e 662º, nº 1, segmento final, do Cód. Proc. Civ.). O ónus probatório, encargo do apelante (artigo 342º, nº 1, do Cód. Civ.), operou neste particular em seu desfavor (artigo 414º do Cód. Proc. Civ.). 2.2.2. A este pretexto, solicita o apelante, além da reversão do facto não provado 3. para o leque dos provados, ainda, a substituição, por outro, do não provado 2., para o qual propõe a seguinte redacção: « Em reunião ocorrida após 23.08.2017, mas antes de 25.09.2017, em reunião nas instalações da agência imobiliária referida em 12º, do CPCV, as partes acordaram em celebrar um novo CPCV, texto acordado que foi minutado pela agência imobiliária, o qual não foi subscrito pelos RR, incorrendo esta assim flagrante violação do princípio da boa-fé in contrahendo, constituindo-se na obrigação de indemnizar o A. na quantia de 17.000,00 euros, acrescido de juros de mora, contados à taxa legal, que se mostrarem devidos, desde a interpelação extrajudicial constante do Doc. 9 até ao efectivo e integral pagamento » O facto não provado 3. verbaliza a exigência, pelo apelante, de redução a escrito e de assinatura das partes, do « novo acordo » obtido. Só que; percorridas as ferramentas probatórias, não se encontra alguma que permita sustentar, com mínima fidelidade, esta asserção fáctica. Sendo suficientemente seguro que se chegou a acordo de feitura de nova promessa, já nada permite sinalizar (ou suspeitar) que o apelante haja por algum modo expressado essa imposição. Por outro lado; o facto não provado 2. retrata uma configuração de acordo mais visando o compromisso dos apelados na restituição do recebido, ora se surgisse outro interessado, que adquirisse, ora se em curto prazo o apelante se não financiasse. Porém; o (novo) facto proposto – excluindo-se o segmento final também aqui de índole eminentemente jurídico-conclusiva –, a verbalizar o acordo para nova promessa e a inexistência, pese que minutada pela imobiliária, da subscrição dos apelados, nada permite melhor esclarecer, sobretudo, por incompletude – seguro é que o apelante também não subscreveu – e por não permitir denotar as causas dessa(s) omissão(ões). Como no precedente, agora para efeitos de densificação e encontro de culpa in contrahendo, a mutação fáctica propugnada aparenta-se, aqui também, neutra e inócua. E, por conseguinte, desnecessária. 2.3. A mera mora (do apelante) e a infundada resolução (dos apelados). 2.3.1. Com impacto, nesta óptica, o tribunal a quo julgou a causa assim: « (…), não tendo sido acordada qualquer alteração aos prazos estipulados nas cláusulas 4.ª, nº 1, e 8.ª, nº 4, do contrato de promessa de 25/05/2017, é à luz dessas cláusulas que se deve avaliar o comportamento das partes. Ora, o autor não resolveu o contrato, no prazo de 45 dias previsto na última das citadas cláusulas contratuais, pelo que estava obrigado a celebrar a escritura pública de compra e venda no prazo máximo de 90 dias previsto na primeira cláusula. Sucede que o autor não só não o fez, como declarou por escrito, por comunicação de 22/09/2017, que não tinha intenção de o fazer, sendo com este sentido que se deve interpretar o pedido de devolução das quantias pagas, a título de sinal e princípio de pagamento, constante dessa comunicação. Assim sendo, não há dúvida que o autor incorreu numa situação de incumprimento definitivo e culposo da obrigação principal emergente do contrato de promessa de compra e venda (artigos 799º, nº 1, e 808º, nº 1, do CC), a de celebrar o contrato definitivo. Ora, «se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue» (artigo 442º, nº 2, primeira parte, do CC). Em face dos factos provados, não é, pois, ilegítimo ou abusivo o exercício pelos réus do direito previsto neste artigo, fazendo seu o montante recebido a título de sinal » 2.3.2. Temos de voltar a revisitar o substrato fáctico da acção, desta vez, para apurar qual, em 22.9.2017 (facto provado 6.), era o estado (a situação jurídica) em que se encontrava o contrato-promessa celebrado no dia 25.5.2017 (facto provado 1.). O contrato prometido era para ter lugar no prazo máximo de 90 dias. O apelante não accionou o direito potestativo, à resolução, que lhe foi concedido. Não obstante; como pudemos já reconhecer, o apelado, no artigo 42º/ii. da pet. inicial, alegou que em reunião de 7.9.2017 ficou acordado além do mais « que consideravam o contrato-promessa como cessado »; e os apelantes, nos artigos 21º e 25º/i) da contestação, corroboraram a reunião e o acordo das partes de que « o cpcv já tinha cessado os seus efeitos [e] deveria ser assinado um novo cpcv ». Esta hipótese quadra a prova tabelar (plena; legal) dos artigos 574º, nº 2, início, e 607º, nº 4, 2.ª parte, do Cód. Proc. Civil. Rememorando; promitente-comprador e promitente-vendedor acordaram, em 7 de Setembro, que o contrato-promessa estava cessado nos seus efeitos. Ora, o contrato pode extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes (artigo 406º, nº 1, do Código Civil); é o chamado contrato revogatório ou de dissenso. E não se vê exigência legal de forma para que este acordo extintivo fosse hábil a produzir os seus efeitos (artigos 219º e 221º, nº 2, do Código Civil). Nada obstando à sua anatomia meramente informal (Pedro Romano Martinez, “Da cessação do contrato”, 2.ª edição, páginas 111 a 112). É verdade que, mesmo depois desse dia, persistiu o interesse no contrato final. Mas a protecção dessa base de interesse material (substantivo), que subsistia, foi salvaguardada mediante a previsão – a combinação – de ir ser formado um outro contrato-promessa; como é agora seguro, por o apelante insistir em o ver afirmado (no recurso) e os apelados já o terem oportunamente confessado (na contestação). E foi a ruptura, entretanto tida lugar, que frustrou esse novo contrato-promessa. Mas sem a virtualidade de poder prejudicar (ou preterir) a eficácia do contrato de dissenso que, nos termos desenhados, quer na acção, quer no recurso, se não vislumbra haja ficado condicionado, nos seus efeitos, a qualquer facto (à concretização real do novo, e projectado, contrato-promessa). Ora; com o dissenso do contrato-promessa, de 25 de Maio, fechado no dia 7 de Setembro, e perdendo assim aquele contrato-promessa, neste dia, toda a sua eficácia, não se vê como poderiam subsistir, e permanecer, as quantias entretanto entregues, a seu pretexto, pelo putativo comprador aos putativos vendedores, a título de princípio de cumprimento e de sinal (artigos 440º e 441º do Cód. Civ.). Com a queda da prevista compra, teria de cair o vínculo de pagar o preço. E, sem indícios de incumprimento ou culpa, capazes de sustentar o regime do sinal (artigo 442º, nº 2, início, do Cód. Civ.), outra solução razoável não deveria ser tomada que não a de julgar os (virtuais) vendedores devedores ao (virtual) comprador das quantias por este prestadas, a coberto da aquisição que (fatalmente) se frustrou. 2.3.3. Em qualquer dos casos. Mesmo seguindo a orientação segundo a qual o contrato-promessa, por ainda estar em vigor e ter eficácia, era um negócio hábil a poder ser resolvido por algum dos sujeitos negociais, aparenta-se que a concreta solução final não seria distinta. No dia 22 de Setembro, o apelante solicitou aos apelados a devolução dos valores entregues (facto provado 6.). O tribunal a quo interpretou a comunicação como reveladora de incumprimento definitivo do promitente-comprador. A passagem do termo ad quem estabelecido para o negócio definitivo significa que o contrato não foi pontualmente cumprido (artigos 406º, nº 1, início, ou 762º, nº 1, do Cód. Civ.). E se a tanto associarmos a cláusula que no caso onerava o promitente-comprador com a marcação e diligências apropriadas à concretização da escritura (cláusula 4.ª), é fácil encontrar mora debitoris deste (artigo 804º, nº 2, do Cód. Civ.). À transformação da mora em incumprimento definitivo se refere o artigo 808º do Código Civil, para esclarecer esse efeito caso o credor perca objectivamente interesse na prestação ou, em alternativa, caso o devedor persista em incumprir depois de ser convocado, sob cominação e em prazo razoável, a realizá-la (a chamada interpelação admonitória). A estas situações (tipificadas) assimilam-se ainda, por regra, outras, que mostrem uma intenção firme e segura (fatal) do devedor em não realizar a prestação debitória; seguindo a lógica de que, se o devedor dá mostras de inequivocidade a respeito de um inevitável incumprimento, se torna então dispensável algum outro acrescento para (desde logo) o considerar em incumprimento definitivo. Pois bem. Olhado o texto e o contexto da comunicação de 22 de Setembro, operados ainda os critérios interpretativos dos artigos 236º, nº 1, e 238º, nº 1, do Código Civil, podem intuir-se duas ilações. A 1.ª; de que, atribuindo aos vendedores desvio nos compromissos assumidos, o comprador transmitiu a ruptura (fatal) negocial, por isso deixando claro que o contrato terminou; e reclamando a devolução. Juridicamente, o apelante accionou a resolução do negócio; por causa imputável (por culpa) (d)aos vendedores. A 2.ª; a de que, ao assim fazer, o apelante mostrou não mais querer adquirir, em negócio final, ao menos desde essa data; consolidando a recusa do cumprimento, em termos assimilados ao suposto pelo artigo 808º do código. Juridicamente, entrando, pois, em incumprimento definitivo. Ocorre, porém, que a resolução fundada na lei supõe prévia e exactamente um incumprimento definitivo (artigos 432º, nº 1, e 801º, nº 2, do Cód. Civ.). Operando por declaração à outra parte (artigo 436º, nº 1, do Cód. Civ.). Ora, o apelante não transformou os (alegados; mas não comprovados) desvios dos apelantes – isto é, a mora destes (indemonstrada) – nesse hábil incumprimento. Logo, ao rescindir o contrato-promessa, nos termos em que o fez, procedeu por modo juridicamente desajustado. E firmou, a respeito do seu próprio incumprimento (na recusa fatal), a sua culpa (artigo 799º do Cód. Civ.). Entretanto, no dia 25 de Setembro (três dias após), são os apelados a comunicar ao apelante que, após « inúmeras oportunidades », persistindo o comprador na não feitura da escritura, « acompanhado da [sua] perda de interesse no negócio dado o decurso do tempo», consideram haver « incumprimento definitivo »; habilitando esse facto à retenção das « quantias prestadas a título de sinal e respectivos reforços ». Juridicamente, aqui também, visam os apelados accionar a resolução do negócio; agora por causa imputável (por culpa) (d)o comprador. Mas o fundamento que invocam para a declaração operativa (cit. artigo 436º, nº 1) não é o latente à posição assumida pelo comprador em 22 de Setembro pretérito. É outro; o de que, (1.º) por um lado, o comprador não agendou a escritura, como era seu encargo; e que, (2.º) além disso, o curso do tempo criou perda de interesse. Nenhum dos fundamentos, como invocados, tem potencialidade para preencher a previsão material do artigo 808º do Código Civil. O não cumprimento assim imputado ao apelante traduz (apenas) a (sua) situação de mora – que era clara e evidente, como antes já expressámos. O prolongamento, sem escritura, não era idóneo, por si só, para reconhecer fatalidade (definitividade) no incumprimento. E os vendedores, na sua comunicação, não traduzem, como fundamento para a visada rescisão, consistente mutação nos termos – ou similares – daquele suposto no segmento final do nº 1, do artigo 808º (interpelação admonitória; ou facto assimilado). Por outro lado; a perda do interesse na prestação, prevenida no trecho inicial, do mesmo n.º 1, é apreciada objectivamente, como fixa o seu nº 2; não sendo o mero decurso do tempo, e apenas esse, uma circunstância habilitada e bastante que permita reconhecer essa inevitável quebra. Ou seja; a declaração da rescisão empreendida pelos apelados não foi apoiada e acompanhada de sustento válido – o incumprimento definitivo –, nos termos em que a lei o exige, e como ademais impõem a essa declaração os parâmetros da boa fé (artigo 762º, nº 2, do Cód. Civ.). E, logo, ao assim rescindirem o contrato-promessa, igualmente procederam por um modo desviante àquele que merece cobertura jurídica. Em síntese; quer a declaração de resolução do apelante (comprador), quer a que foi enviada pelos apelados (vendedores), se aparentam inadequadas; de parte-a-parte. E a ser assim, nesta outra óptica, de promessa ainda hábil após 7 de Setembro de 2017, não podia validamente operar o regime do sinal, que o segmento inicial do artigo 442º, nº 2, do Código Civil, contempla, enquanto permite que o contraente fiel faça sua a coisa entregue a esse título quando, quem constitui o sinal, deixe de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável; regime que a doutrina e a jurisprudência habitualmente associam ao incumprimento definitivo e à subsequente idónea extinção do contrato-promessa, operada por eficiente resolução. É um quadro onde o contrato-promessa também não pode(ria) subsistir. Não pelo exercício potestativo, por qualquer das partes, de um direito que uma e outra operaram; aliás, desajustadamente do quadro normativo. Mas porque ambas desejam a sua cessação; atribuindo-se reciprocamente a culpa. Exaurido nestes termos o contrato-promessa concreto, aqui convocado, esgotados os seus efeitos, nos termos que inicialmente foram prevenidos, deixando de se poder sustentar as entregas feitas a coberto da sua eficácia, a solução justa e equilibrada, aqui também, seria (sempre) a da reposição (em singelo) do sinal prestado. 2.4. Síntese – a devolução das quantias (prestadas); a dívida de juros (de mora). 2.4.1. A coberto da promessa de Maio de 2017, o apelante entregou aos apelados a título de sinal e princípio de pagamento, o valor de 17.000,00 € – 10.000,00 € no acto da assinatura; e duas prestações, em Junho e Julho de 2017, de 3.500,00 € cada uma (facto provado 2.). Os apelados retiveram, e retêm ainda, essa quantia (facto provado 8.) 2.4.2. O acordo de dissenso, que mencionámos, foi fechado no dia 7.9.2017. Associou-se-lhe o compromisso para uma nova promessa; nunca concluída. A comunicação de 22.9.2017 assenta numa rescisão inadequada; incapaz de fazer germinar qualquer putativa dívida de restituição, tal como aí reclamada. Por outro lado; é o próprio apelante, agora em recurso (conclusões u., v. e w.), a evocar a (sua) (e mera) mora, em 25.9.2017; por conseguinte, a posicionar o termo a quo do vencimento de qualquer (eventual) crédito (seu) a jusante dessa data. O crédito de reposição não foi, em algum momento, acertadamente reclamado. Foi com base nos factos apurados, da acção interposta, que se desenhou a figura do crédito do apelante; e dos seus reais contornos. Com essa concreta configuração (do crédito), só a interpelação judicial dos apelados consegue habilitação para suportar o seu incumprimento e a sua mora (artigos 559º, nº 1, 777º, nº 1, 805º, nº 1, e 806º, nº 1 e nº 2, do Cód. Civ.). E, estando em causa a citação processual dos cônjuges (réus), numa dívida que é comum (e, portanto, solidária), passível de poder por qualquer deles ser extinta (artigo 512º, nº 1, do Cód. Civ.), é com a citação original que o vencimento opera – no caso em 23 de Setembro de 2019. 2.4.3. As conclusões a que chegamos são, portanto, e em síntese, as seguintes. 1.ª; é justa e devida a reposição das quantias entregues como sinal e reforços pelo promitente-comprador aos promitentes-vendedores, a coberto de contrato-promessa que, um e outros, vieram a consensualmente revogar; 2.ª; a essa quantia acrescem juros de mora, à taxa legal (4% ao ano // portaria nº 291/2003, de 8 de Abril), com termo inicial de contagem na data da citação para a acção onde é desenhado, e reconhecido, aquele crédito. A apelação merece essencial provimento. Se bem que pelas razões jurídicas que se deixaram expressas. III – Decisão Em face do exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em julgar o recurso de apelação parcialmente procedente e, nessa conformidade: 1.º; julgar devida a restituição da quantia entregue, pelo apelante (promitente-comprador), aos apelados (promitentes-vendedores), realizada a título de sinal e reforços, a coberto de um contrato-promessa, que se extinguiu por mútuo consenso dos seus contraentes; no valor total de 17.000,00 € e que se condenam estes a entregar àquele; 2.º; julgar devidos juros de mora, sobre esse valor, à taxa legal de 4% ao ano, a contar da citação do apelado marido, em 23.9.2019; e no pagamento dos quais os apelados são também condenados; 3.º; absolver os apelados do remanescente dos juros (de vencimento anterior a essa data) peticionados. As custas da acção são encargo do autor em 25% e dos réus em 75%. As custas da apelação são encargo do apelante em 10% e dos apelados em 90%. Lisboa, 18 de Novembro de 2025 Luís Filipe Brites Lameiras Carlos Oliveira Ana Rodrigues da Silva |