Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2335/11.8YXLSB.L1-1
Relator: SUSANA SANTOS SILVA
Descritores: LIQUIDAÇÃO
MAPA DE RATEIO FINAL
NOTIFICAÇÃO
PRESTAÇÃO DE CONTAS
NULIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/11/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Sumário (cfr. nº 7, do art.º 663º, do CPC):
I. É através da prestação de contas que se pode sindicar a razoabilidade das despesas efetuadas pelo administrador e a cujo reembolso ele tem direito, de acordo com o art.° 60.°, n.° 1 do CIRE, com referência ao Estatuto do administrador da insolvência e à Portaria nº 51/2005.
II. Na distribuição e rateio final estão em causa operações aritméticas que não envolvem já, em princípio, a formulação de qualquer juízo de legalidade, oportunidade ou probabilidade. Por tal razão, no momento da elaboração do rateio há que considerar o sentido das decisões judiciais com base nas quais se faz a referida execução material do mapa, entre elas as decisões relativas à graduação de créditos (seguindo a graduação inerente às prioridades de pagamento atendíveis) e à prestação de contas (seguindo as contas aprovadas).
III. Ao aprovar estas contas, tal qual se encontram descritas no mapa de rateio, o tribunal está a determinar que as receitas e as despesas ali declaradas foram efetivamente obtidas e realizadas, devendo, como tal, ser traduzidas e concretizadas no mapa de rateio final a que se refere o art.º 182º do CIRE.
IV. Não pode haver lugar a pagamento de créditos que não estejam verificados por sentença transitada em julgado, nem em montante superior àquele que conste da mesma sentença.
V. O art.º 182º do CIRE não exige que a apresentação da proposta de distribuição e rateio seja notificada aos credores, sendo objeto de publicação e contando-se o prazo de pronúncia sobre a mesma dessa publicação, recaindo o ónus sobre os interessados de consultarem o portal citius para aferirem se já foi publicada a proposta de distribuição e rateio final.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

I. Relatório
Por sentença de 11/06/2012, transitada em julgado, foram declarados insolventes “A” e mulher, “B”.
Foi realizada Assembleia para aprovação do relatório a que alude o art.º 155º do CIRE tendo os autos prosseguido para liquidação.
Foram reclamados, verificados e graduados os créditos sobre os insolventes.
Foi junto auto de apreensão de bens no apenso A – Apreensão de bens e subsequentes aditamentos.
Nos autos de Liquidação – apenso H, foram vendidos os bens apreendidos para a massa insolvente, tendo sido proferido despacho, em 6/12/2021, declarando encerrada a liquidação e ordenando a notificação do AI nos termos e para os efeitos do artigo 182º, nº 2, do CIRE.
No apenso de prestação de contas – apenso J -, foi aprovada a prestação de contas da administração da insolvência.
Em 19/04/2023 (ref. citius n.º …), nos autos principais, foi proferido despacho fixando a remuneração variável de cada um dos três Administradores da Insolvência que exerceram funções nos autos, despacho que a secretaria notificou via citius aos credores.
Em 11/05/2023, nos autos principais, o Administrador da Insolvência juntou aos autos a «proposta de rateio final».
Notificados do despacho referido proferido em 19/04/2023 (ref. citius n.º…) vieram os devedores “A” e mulher “B”, apresentar requerimento em 4/05/2023 (ref. citius n.º…) com o seguinte teor: O requerimento junto em 15 de novembro de 2022 pelo Senhor Administrador de Insolvência não lhes foi notificado pelo que, sem contraditório, não pode produzir quaisquer efeitos.// Sem conceder,// Deve a relação de créditos reconhecidos ser atualizada considerando os créditos pagos e os efetivamente reconhecidos, uma vez que consta dos autos uma relação de créditos de Maio de 2015 (Refª…) e por isso extemporânea e aliás elaborada por AI que estava já destituído de funções conforme decisão informada pela CAAJ junta aos autos, não podendo integrar a lista definitiva de créditos, consequentemente, o valor de €10.759.206,95.// Nomeadamente, o credor BCP, S.A. que recebeu € 403.827,03 para pagamento dos créditos constantes da referida relação de 371.203, 01 e € 147.161,66.// Recebeu ainda o BCP o pagamento integral de € 44.23,10 valor este que não consubstanciava um crédito, mas sim uma fiança que os insolventes prestaram a terceiro.// Quanto à verba de € 103.830,14, o valor de € 100.000, corresponde a uma garantia bancária, prestada à Camara Municipal de Sines em 2006 que nunca foi reclamada sendo consequentemente insuscetível de constar na lista definitiva de créditos e o remanescente montante de 3.830.14 corresponde igualmente a uma outra garantia bancária prestada num processo judicial que foi entretanto extinto e consequentemente devolvida a garantia e entregue ao BCP em 2014.// Quanto à verba de € 51.000,00 a mesma já se encontra paga no âmbito destes autos.// Quanto aos bens apreendidos constantes do auto inicial, existem alguns que não constam agora na prestação de contas, embora efetivamente apreendidos, nomeadamente 12.000 ações do Sport Lisboa e Benfica e 11.800 ações do BCP.// O mesmo se passa com os valores das contas bancárias inicialmente apreendidos nomeadamente contas do BCP e Montepio, tituladas pelos insolvente e pelas sociedades de que insolventes eram sócios, Strongframe, S.A. e LPI LDA, melhor identificados nos auto de apreensão junto pelo AI “C”.// Quanto à remuneração dos Administradores:// O 1.º Administrador, perdeu licença pela Lei 22/2013 tendo continuado a praticar actos (nulos) não devendo ser remunerado e consequentemente anulados todos os actos praticados por ele praticados, após a data da sua cessação de funções constante da informação da CAAJ junto aos autos.// O 2.º Administrador, fez pagamentos com base numa lista de crédito não aprovada pela Assembleia de Credores e não justificou despesas nomeadamente inúmeros DUC pagos com o dinheiro da massa.// Está assim o processo eivado de erros que consubstanciam nulidade insanável que aqui e agora expressamente se argui.»
Em 25/05/2023 sob a ref. n.º … os devedores “A” e mulher “B”, juntaram aos autos requerimento com o seguinte teor: «(…) tendo tomado conhecimento da proposta de mapa de rateio junto pelo senhor AI por consulta ao CITTIUS, vêm expor e requerer a V.ª Ex.ª o seguinte:// Não pode o senhor Administrador de Insolvência propor a distribuição dos valores aos credores se os créditos que estes detêm não se encontram devidamente atualizados ou até já não existem e outros já se encontram pagos.// Razão pela qual se opõem à proposta de rateio, impugnando-se o requerimento que a consubstancia, pelas razões aduzidas no seu requerimento de 04/05/2023 cujo teor reiteram.»
Em 19/10/2023, nos autos principais, a secretaria apreciou o mapa de rateio.
Em 10/11/2023 foi proferido despacho com o seguinte teor: «O rateio de ref.ª … não dá cumprimento ao despacho proferido em 19.04.2023 (ref.ª…), porquanto considera apenas a parcela da remuneração variável para o atual administrador – quando no despacho identificado é fixado um valor total que é depois repartidos pelos vários administradores que exerceram funções nestes autos, e se determina o pagamento pelo atual administrador aos anteriores administradores (ou cabeça de casal da herança) e a respetiva comprovação nos autos.// Notifique, assim, o administrador para dar integral cumprimento ao referido despacho e, após, juntar proposta de rateio atualizada em conformidade. (…) Ref.ª…:// Não se descortina nestes autos comprovativo dos pagamentos a que os insolventes se referem.»
Em 12/02/2024, nos autos principais, o Administrador da Insolvência juntou aos autos a «proposta de rateio final» alterada, fazendo constar os valores de remuneração variável, a favor dos administradores de insolvência que o antecederam.
Em 13/03/2024, nos autos principais, a secretaria apreciou o mapa de rateio retificado.
Em 4 de abril de 2024, nos autos principais, foi proferida decisão com o seguinte teor: «Vi o mapa de rateio de ref.ª…, bem como a cota de apreciação da secretaria (ref.ª…).// Notifique o Administrador para que proceda aos pagamentos em conformidade, devendo comprovar nos autos, mais juntando comprovativo do encerramento da conta da massa.»

Em 3/05/2024 vieram os devedores interpor recurso de apelação do despacho proferido em 4 de abril de 2024, apresentando as seguintes conclusões, que se reproduzem:
1 - Antecedendo a decisão recorrida os ora recorrentes suscitaram, em 04/05/2023, diversas questões quanto a alguns pagamentos a credores e, ainda, quanto a pagamentos efectuados pelo segundo Administrador nomeado nestes autos.
Tais pagamentos eivaram o processo de erros que consubstanciam nulidade insanável que então se arguiu.
2 - Alternativamente, requereram ao Mmº Juiz a quo que notificasse aqueles que entendesse deverem pronunciar-se quanto ao que do referido requerimento constava, dando sem efeito o despacho Refª … por o mesmo ter sido elaborado e assentar em lapso material e, sem que houvesse despacho sobre aquele seu requerimento, apresentaram um outro, em 25/05/2023, através do qual, por terem tomado conhecimento via CITIUS da proposta de mapa de rateio junto pelo Senhor Administrador, pugnaram pela impossibilidade deste propor a distribuição de valores aos credores por os mesmos não se encontrarem devidamente atualizados, não existirem ou já se encontrarem pagos, terminando opondo-se à proposta de rateio e impugnado o requerimento que a consubstanciou.
Tais requerimentos mereceram, 6 meses volvidos, o douto despacho Ref.ª … o qual não dá satisfação aos requerimentos supra referidos, omite pronúncia sobre a nulidade arguida e omite o pedido de notificação requerido e omite ainda o pedido de que se dê sem efeito o despacho Ref.ª …..
3 - Foi assim que, aguardando-se despacho que desse resposta às questões suscitadas e não apreciadas pelo Mm.º Juiz a quo, que os insolventes foram surpreendidos pelo douto despacho de que agora recorrem.
4 - Em 12/02/2024 o Senhor Administrador fez juntar aos autos uma proposta de rateio final alterada a qual igualmente lhes não foi notificada e, por isso, não puderam exercer o contraditório, nem pronunciar-se sobre tal proposta e só esta última circunstância seria suficiente para a procedência do presente recurso.
5 - O Mm.º Juiz a quo omitiu, injustificadamente, a apreciação da nulidade arguida e do mais requerido nos requerimentos de 04/05/2023 e de 20/05/2023, apreciações que se aguardavam e que, pode agora concluir face ao despacho de que se recorre, ter o Mm.º Juiz a quo entendido, pura e simplesmente, ignorar o então requerido.
6 - A postura adotada pelo Mmº Juiz a quo é suscetível de influenciar a boa decisão da causa e, nomeadamente, causar danos irreparáveis que este Tribunal terá de reparar.
7 - Por outro lado, crédito do Banco Comercial Português SA é inexistente uma vez que os aqui insolventes não são devedores, conforme resulta dos autos de insolvência n.º (…) do Juízo de Comercio, Juiz (…) e dos autos de execução n.º (…), o que se prova através da certidão e carta - documentos n.ºs 1 e 2 que se juntam quanto ao primeiro dos aludidos processos, protestando juntar certidão do segundo.
Logo, tal crédito não pode ser pago nestes autos por não poder sê-lo à custa de património dos insolventes.
Esta circunstância está demonstrada nos autos tendo-se todavia, até ao momento, feito tábua rasa de tal factualidade.
8 - O mesmo se diga quanto aos alegados crédito de “D” e “E” os quais emergem de um contrato promessa de compra e venda que não foi cumprido e, como tal, não se tendo celebrado o contrato definitivo e apenas dele podendo resultar a obrigação de pagamento, o direito em causa nunca integrou a esfera jurídica dos aqui insolventes pelo que, os supra alegados créditos de “D” e “E”, pura e simplesmente não existem, o que nestes autos é conhecido e agora se comprova através do acórdão proferido pela 6.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, tirado no processo (…), cuja cópia se junta - Doc n.º 3.
9 - O Senhor Administrador, em cumprimento do despacho recorrido estaria legitimado para proceder a pagamentos que, quanto às apreendidas ações Banco Comercial Português, apenas emergiriam de 150 ações, quando estão apreendidas 11833. Ou seja, ficariam por vender, injustificadamente, inúmeros títulos, em manifesto prejuízo dos autos e, consequentemente, dos insolventes.
10- Existem valores aprendidos, constantes dos autos, que não constam do proposto mapa de rateio que, repete-se, não foi notificado aos insolventes devendo sê-lo.
Terminam pedindo que seja revogada a decisão recorrida e substituída por outra que determine o saneamento das vicissitudes/deficiências alegadas no presente recurso nomeadamente a apreciação da nulidade tempestivamente arguida.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Por despacho proferido em 26/07/2025 – ref.ª citius … – foi proferido despacho que não admitiu o recurso interposto pelos devedores.
Apresentada reclamação ao abrigo do disposto no art.º 643º do CPC a qual foi deferida por decisão sumária, transitada em julgado, proferida no apenso K, tendo sido admitido o recurso, com subida imediata, em separado, e efeito meramente devolutivo.

Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar.
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II. Do Objeto do recurso:
Dado que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, sem prejuízo das questões passíveis de conhecimento oficioso (artigos 608º, n.º 2, parte final, ex vi do art.º 663º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil), importa apreciar e decidir:
i. da admissibilidade da junção de documento com as alegações;
ii. da nulidade da decisão recorrida;
iii. saber se sobre o Sr. Administrador da Insolvência impendia o dever de notificar os recorrentes do teor da proposta de distribuição e rateio;
iv. se existem créditos que não devam ser pagos conforme definido no mapa de rateio.
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Nos termos do disposto no nº1 do artigo 617º do CPC, se a nulidade da sentença for suscitada no âmbito do recurso dela interposto, compete ao juiz apreciá-la, no próprio despacho em que se pronuncia sobre a admissibilidade do recurso.
No caso presente tal apreciação foi omitida pelo tribunal recorrido, mas, por dispensável para a apreciação do objeto do recurso, não se ordena a baixa do processo para apreciação da nulidade da sentença arguida pela recorrente, por manifesta desnecessidade, a qual se passará a apreciar (art.º 617º, nº 5 do CPC).
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III. Fundamentação
De facto
Com interesse para a decisão da causa resultam dos termos dos autos os seguintes factos, bem como os que constam do relatório que antecede:
1. Por sentença de 11/06/2012, transitada em julgado, foram declarados insolventes “A” e mulher, “B”.
2. Foi realizada Assembleia para aprovação do relatório a que alude o art.º 155º do CIRE tendo os autos prosseguido para liquidação.
3. Foi reclamada a verificação e graduação de créditos sobre a insolvente, nos termos e prazo estabelecidos para o efeito, findo o qual o Sr. Administrador da Insolvência apresentou a relação de créditos prevista no art.º 129º do CIRE. – apenso G
3 - Da relação de créditos apresentada constavam como credores reconhecidos:
3.1) Banco Comercial Português, SA,
a) Montante do crédito reconhecido: 2.028.965,70€
Capital: 1.995.420,24€
Juros: 33.545,46€
Qualificação do crédito: Comum
b) Montante do crédito reconhecido: 372.880,85€
Capital: 371.203,01
Juros: 1.677,84
Qualificação do crédito: Garantido com hipoteca
c) Montante do crédito reconhecido: 147.827,03€
Capital: 147.161,86€
Juros: 665,17€
Qualificação do crédito: Garantido com hipoteca
d) Montante do crédito reconhecido: 44.231,10€
Qualificação do crédito: Comum
e) Montante do crédito reconhecido: 103.830,14€
Qualificação do crédito: Comum
f) Montante do crédito reconhecido: 10.759.206,95€
Qualificação do crédito: Comum
3.2) “D”
a) Montante do crédito reconhecido: 249.559,92€
Capital: 199.000,00€
Juros: 50.559,92€
Qualificação do crédito: Comum
3.3.) “D”
Montante do crédito reconhecido: 51.000,00€
Qualificação do crédito: Privilegiado.
3.4) Caixa Económica Montepio Geral
Montante do crédito reconhecido: 8423,62€
Capital: 8377,59€
Juros: 47,07€
Qualificação do crédito: Comum 8377,59+21,82€.// subordinado 24,25€
3.5) Condomínio (…) Lote 2
Montante do crédito reconhecido: 40.244,20€
Capital: 36.536,50€
Juros: 3.707,70€
Qualificação do crédito: Comum
5. Foram apresentadas impugnações à relação de credores, das quais notificado o AI veio dar razão aos impugnantes, concluindo que deverá ainda ser reconhecido o crédito do credor BCP no montante de 1.102.685,31€, qualificado como comum e o crédito do credor Condomínio (…) Lote 2, pelo montante de 9747,30€, qualificado como comum.
6. Em 1/07/2016 no apenso G – verificação e graduação de créditos – foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, procedo à seguinte graduação:// 1º - Os créditos hipotecários, reclamados pelo BCP, S.A.;// 2º - Os créditos comuns, cujo pagamento deverá ser feito na proporção respectiva, se a massa insolvente não for suficiente para a sua satisfação integral.// As custas da insolvência, assim como as que devam ser suportadas pela massa insolvente, saem precípuas do respectivo produto (artigo 46º do C.I.R.E.)//Custas pela massa insolvente.»
7. A sentença de homologação e graduação de créditos foi devidamente notificada aos credores e demais interessados, tendo sido objeto de retificação conforme despacho de 14/07/2016 (ref. citius…) nos seguintes termos: «(…) urge corrigir o lapso na graduação constante do final de tal decisão (cf. fls.42 deste Apenso), passando a constar em 2º lugar (após os créditos hipotecários e antes dos créditos comuns), os créditos privilegiados dos credores requerentes “D” e “E”.»
8. Em 16/09/2013, no apenso de verificação ulterior de créditos – apenso D, foi proferida sentença, transitada em julgado, que julgou verificado o crédito do credor Condomínio (…) Lote 2, no valor de 40.244,20€.
9. Foi junto auto de apreensão de bens no apenso A – Apreensão de bens e subsequentes aditamentos.
10. Nos autos de Liquidação – apenso H, foram vendidos os bens apreendidos para a massa insolvente, tendo sido proferido despacho, em 6/12/2021, declarando encerrada a liquidação e ordenada a notificação do AI nos termos e para os efeitos do artigo 182º, nº 2, do CIRE.
11. Tal despacho foi notificado, aos intervenientes processuais, em 07/12/2021.
12. O Sr. Administrador da Insolvência apresentou prestação de contas por apenso em 15/11/2022 (cfr. apenso J).
13. Em 23/06/2023, no apenso de prestação de contas – apenso J -, foi aprovada a prestação de contas da administração da insolvência, a qual foi devidamente notificada aos intervenientes processuais conforme certificação citius em 27/06/2023.
14. Em 19/04/2023 (ref. citius n.º …), nos autos principais, foi proferido despacho fixando a remuneração variável de cada um dos três Administradores da Insolvência que exerceram funções nos autos, despacho que a secretaria notificou aos credores e aos devedores em 21/04/2023, conforme certificação citius.
15. Em 11/05/2023, nos autos principais, o Administrador da Insolvência juntou aos autos a «proposta de rateio final».
16. Em 19/10/2023, nos autos principais, a secretaria apreciou o mapa de rateio, lendo-se nomeadamente no respetivo termo: «Em 19-10-2023, nos termos do nº 4 do artº 182º do CIRE, procedeu esta secretaria à apreciação da proposta de distribuição e de rateio, concluindo-se que este se encontra devidamente elaborado com os cálculos exactos, achando-se de acordo com a documentação de suporte apresentada e com o determinado na sentença de graduação de créditos, tendo sido levado em conta o despacho de retificação da douta sentença, a fls.159; em referência ao requerimento dos insolventes (refª 45674582) não se vislumbra nos autos informação dos credores sobre pagamentos efetuados.».
17. Em 10/11/2023 foi proferido despacho com o seguinte teor: «O rateio de ref.ª … não dá cumprimento ao despacho proferido em 19.04.2023 (ref.ª…), porquanto considera apenas a parcela da remuneração variável para o atual administrador – quando no despacho identificado é fixado um valor total que é depois repartidos pelos vários administradores que exerceram funções nestes autos, e se determina o pagamento pelo atual administrador aos anteriores administradores (ou cabeça de casal da herança) e a respetiva comprovação nos autos.// Notifique, assim, o administrador para dar integral cumprimento ao referido despacho e, após, juntar proposta de rateio atualizada em conformidade. (…) Ref.ª…:// Não se descortina nestes autos comprovativo dos pagamentos a que os insolventes se referem.»
18. Em 12/02/2024, nos autos principais, o Administrador da Insolvência juntou aos autos a «proposta de rateio final» alterada, fazendo constar os valores de remuneração variável, a favor dos administradores de insolvência que o antecederam, nos seguintes termos:
(…)
19. Em 13/03/2024, nos autos principais, a secretaria apreciou o mapa de rateio retificado, lendo-se nomeadamente no respetivo termo: «Em 13-03-2024, nos termos do nº 4 do artº 182º do CIRE, procedeu esta secretaria à apreciação da proposta de distribuição e de rateio, concluindo-se que este se encontra devidamente elaborado com os cálculos exactos, achando-se de acordo com a documentação de suporte apresentada e com o determinado na sentença de graduação de créditos; de salientar que se verifica que os juros indicados na relação do artº129 do CIRE não foram incluídos na presente proposta de rateio no entanto sendo os mesmos créditos subordinados não obteriam pagamento.»
20. Em 4 de abril de 2024, nos autos principais, foi proferida decisão com o seguinte teor: «Vi o mapa de rateio de ref.ª…, bem como a cota de apreciação da secretaria (ref.ª…).// Notifique o Administrador para que proceda aos pagamentos em conformidade, devendo comprovar nos autos, mais juntando comprovativo do encerramento da conta da massa.».

Fundamentação de Direito.
I. Da (in)admissibilidade de junção de documentos com as alegações de recurso.
Com as alegações de recurso, juntaram os recorrentes três documentos, nada alegando com vista à justificação da sua junção não atempada.
Diz o art.º 651º nº. 1 do CPC que “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425º ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.”
O art.º 425º do CPC, diz que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”, norma esta excecional, semelhante à prevista no nº. 3 do art.º 423º do C.P.C., no que se reporta à fase de junção de documentos em sede de aferição da prova em julgamento.
Assim sendo, é possível a junção de documentos com as alegações de recurso, dependendo a admissibilidade da sua junção de alegação por parte do apresentante de uma de duas situações:
- a impossibilidade de apresentação deste documento em momento anterior ao recurso; a superveniência em causa, pode ser objetiva ou subjetiva: é objetiva quando o documento foi produzido posteriormente ao momento do encerramento da discussão; é subjetiva quando a parte só tiver conhecimento da existência desse documento depois daquele momento;
- o julgamento efetuado na primeira instância ter introduzido na ação um elemento adicional, não expectável, que tornou necessária esta junção; pressupõe esta situação a novidade da questão decisória justificativa da junção pretendida, como questão operante (apta a modificar o julgamento) só revelada pela decisão, sendo que isso exclui que a decisão se tenha limitado a considerar o que o processo já desde o início revelava ser o thema decidendum. Com efeito, como refere António Abrantes Geraldes in Recursos no Novo Código de Processo Civil, págs. 229 e 230 da 4ª edição, “podem (…) ser apresentados documentos quando a sua junção apenas se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando este se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo.” (…) “a jurisprudência anterior sobre esta matéria não hesita em recusar a junção de documentos para provar factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado”.
No caso concreto, visto os três documentos cuja junção se pretende, constata-se que:
- o primeiro consubstancia uma certidão judicial com data de emissão de 12/06/2023, referente a um despacho proferido no âmbito dos autos com o n.º (…) do Juizo Comércio (…) com data de 16/10/2019, notificado ao reclamante marido em 27/12/2019 e no qual se diz, quanto ao crédito reconhecido ao Banco Comercial Português, que “se o crédito reconhecido ao Banco Comercial Português nestes autos for efetivamente o mesmo reconhecido ao aludido banco no processo (…), o recebimento em rateio num processo leva automaticamente à extinção, na mesma proporção no outro, o que deve ser comunicado (…).”
Ou seja, trata-se de despacho proferido em data anterior ao do despacho sob o recurso, do qual também em data anterior teve conhecimento o apelante, tendo a certidão sido emitida em data anterior ao despacho sob recurso, de modo que poderia ter sido junto em data anterior, máxime, aquando da notificação aos reclamantes do despacho proferido em 10/11/2023 (ref. citius…) quando, em resposta ao requerimento de 25/05/2023 (ref. citius…), o Tribunal a quo disse não descortinar nos autos “comprovativo dos pagamentos a que os insolventes se referem.”
Assim, nada tendo sido alegado pelos recorrentes para justificar a necessidade de junção do documento seja, por via da sua superveniência objetiva, seja por via da sua superveniência subjetiva, nem resultando a necessidade da sua junção do julgamento efetuado em primeira instância, indefere-se a consideração/junção deste documento junto com as alegações.
- o segundo consubstancia uma carta enviada pelo Millenium BCP a COCER II – Imobiliária e Saúde, S.A, com data de fevereiro de 2015 fazendo referência ao vencimento de um contrato de crédito, considerando-se imediatamente exigível divida no valor de 8.853.874,09 acrescida de juros remuneratórios e moratórios e encargos legais.
Também este documento tem data de emissão anterior ao do despacho em recurso, e bem assim à da sentença de verificação e graduação de créditos proferida nos autos. Também neste caso, nada tendo sido alegado pelos recorrentes para justificar a necessidade de junção do documento seja, por via da sua superveniência objetiva, seja por via da sua superveniência subjetiva, nem resultando a necessidade da sua junção do julgamento efetuado em primeira instância, indefere-se a consideração/junção deste documento junto com as alegações.
- finalmente, o terceiro documento consubstancia acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 25 de outubro de 2012 em processo em que “D” e “E”, aqui requerentes e credores, requereram a insolvência de Caminhos de Sesimbra – Actividades Turisticas e Residenciais, S.A., fundamentando a sua legitimidade substantiva em um crédito que detinham sobre a requerida que se constituiu fiadora em contrato promessa de venda de ações, no âmbito do qual prometeram vender 15.750 ações que detinham cada um na sociedade requerida, mediante o pagamento da quantia de 325.000,00€. A petição inicial veio a ser indeferida, por se ter considerado que não existia na esfera jurídica dos requerentes o crédito invocado, decisão que foi confirmada pelo Acórdão em causa. Mais uma vez, e como sucede com os restantes, também este documento tem data anterior ao do despacho em recurso, e bem assim à da sentença de verificação e graduação de créditos proferida nos autos. De igual modo, nada foi alegado pelos recorrentes para justificar a necessidade de junção do documento seja, por via da sua superveniência objetiva, seja por via da sua superveniência subjetiva, nem resultando a necessidade da sua junção do julgamento efetuado em primeira instância, - tanto mais que diz respeito a crédito invocado sobre terceiro -, indefere-se a consideração/junção do documento junto com as alegações.
*
II.
Da nulidade da decisão recorrida
Recorrem os apelantes do despacho proferido em 4/04/2024 o qual tem o seguinte teor “(…) Vi o mapa de rateio de ref.ª…, bem como a cota de apreciação da secretaria (ref.ª…).// Notifique o Administrador para que proceda aos pagamentos em conformidade, devendo comprovar nos autos, mais juntando comprovativo do encerramento da conta da massa.”
Dizem os recorrentes (conclusões 2, 5 e 6) que o Tribunal a quo omitiu, injustificadamente, a apreciação da nulidade arguida e do mais requerido nos requerimentos de 04/05/2023 e de 20/05/2023, apreciações que se aguardavam e que, podem agora concluir face ao despacho de que se recorre, ter o Mm.º Juiz a quo entendido, pura e simplesmente, ignorar o então requerido. A postura adotada pelo Mmº Juiz a quo é suscetível de influenciar a boa decisão da causa.
Se bem que não expressamente invocada, ao alegarem que o Tribunal a quo omitiu, injustificadamente, a apreciação da nulidade arguida e do mais requerido nos requerimentos de 04/05/2023 e de 20/05/2023, arguem os recorrentes a nulidade da decisão proferida por omissão de pronúncia, prevista no art.º 615º, n.1, al. d) do CPC aplicável aos despacho por via do art.º 613º, n.º3 do mesmo diploma.
Com efeito, dispõe aquele preceito que é nula a sentença (despacho) quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…).
A omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão judicial prevista no art.º 615°, n.º1, al. d) do CPC, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar (incumprimento do dever prescrito no art.º 608°, n.º2 do CPC), implicando, caso se verifique, de harmonia com o disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, a nulidade do acórdão – cf. o Acórdão do STJ de 12/01/2021, processo n.º 4542/19.6T8VNG-B.P1.S1, relatora Ana Paula Boularot.
A omissão de pronúncia está relacionada com o comando contido no art.º 608º, n.º2 do CPC, exigindo ao juiz que resolva todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, “excetuadas aquelas cujas decisões estejam prejudicadas pela solução dada a outras”.
São coisas diferentes deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte.
É jurisprudência consensual dos tribunais portugueses que importa não confundir questões (cuja omissão de pronúncia desencadeia nulidade da decisão nos termos da alínea d) do nº 1 do art.º 615º do CPC) com argumentos, razões ou motivos que são aduzidos pelas partes em defesa ou reforço das suas posições – cf. Acórdão do STJ de 20/11/2014, processo n.º 810/04.0TBTVD.L1.S1, relator: Álvaro Rodrigues. Esta é também a lição da generalidade da doutrina, referenciando-se Alberto dos Reis, in Código de processo Civil Anotado, Vol. 5, pág. 143.
Só existe o dever de o juiz conhecer e decidir questões; não existe tal dever quanto aos argumentos invocados pelas partes para fazer valer as suas pretensões (cf. Acórdão do STJ de 14/07/2021, processo n.º 10/21.4YFLSB, relatora Catarina Serra).
As questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
O conceito de “questões”, a que ali se refere o legislador, deve somente ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, ou seja, abrange tão somente as pretensões deduzidas em termos do pedido ou da causa de pedir ou as exceções aduzidas capazes de levar à improcedência desse pedido, delas sendo excluídos, como já acima deixámos referido, os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes (vide, por todos, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª. Ed., Almedina, págs. 713/714 e 737.” e Abrantes Geraldes, in “Recursos em Processos Civil, 6ª. Ed. Atualizada, Almedina, pág.136.).
Diferente das questões a dirimir/decidir são os argumentos, as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, que não constituem questões no sentido do art.º 608.º, n.º 2, do CPC.
Constitui, pois, jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça, que a nulidade da decisão por omissão de pronúncia “apenas se verificará nos casos em que ocorra omissão absoluta de conhecimentos relativamente a cada questão e já não quando seja meramente deficiente ou quando se tenham descurado as razões e argumentos invocados pelas partes (cf. Acórdão do STJ de 12/01/2021, processo n.º 379/13.4TBGMR-B.G1.S1, relator Paulo Ferreira da Cunha, de 16/11/2021, processo n.º 5097/05.4TVLSB.L2.S3, relator Pedro Lima Gonçalves, e de 01/02/2023, processo n.º 252/19.2T8OAZ.P1.S1, relator Júlio Gomes).
No caso, alegam os recorrentes que o Tribunal a quo omitiu, injustificadamente, a apreciação da nulidade arguida e do mais requerido nos requerimentos de 04/05/2023 e de 20/05/2023.
Vejamos.
Notificados do despacho referido proferido em 19/04/2023 (ref. citius n.º…), mediante o qual o Tribunal a quo fixou a remuneração variável aos Administradores da Insolvência, vieram os devedores “A” e mulher “B”, apresentar requerimento em 4/05/2023 (ref. citius n.º…) com o seguinte teor: O requerimento junto em 15 de novembro de 2022 pelo Senhor Administrador de Insolvência não lhes foi notificado pelo que, sem contraditório, não pode produzir quaisquer efeitos.// Sem conceder,// Deve a relação de créditos reconhecidos ser atualizada considerando os créditos pagos e os efetivamente reconhecidos, uma vez que consta dos autos uma relação de créditos de Maio de 2015 (Refª…) e por isso extemporânea e aliás elaborada por AI que estava já destituído de funções conforme decisão informada pela CAAJ junta aos autos, não podendo integrar a lista definitiva de créditos, consequentemente, o valor de €10.759.206,95.// Nomeadamente, o credor BCP, S.A. que recebeu € 403.827,03 para pagamento dos créditos constantes da referida relação de 371.203, 01 e € 147.161,66.// Recebeu ainda o BCP o pagamento integral de € 44.23,10 valor este que não consubstanciava um crédito, mas sim uma fiança que os insolventes prestaram a terceiro.// Quanto à verba de € 103.830,14, o valor de € 100.000, corresponde a uma garantia bancária, prestada à Camara Municipal de Sines em 2006 que nunca foi reclamada sendo consequentemente insuscetível de constar na lista definitiva de créditos e o remanescente montante de 3.830.14 corresponde igualmente a uma outra garantia bancária prestada num processo judicial que foi entretanto extinto e consequentemente devolvida a garantia e entregue ao BCP em 2014.// Quanto à verba de € 51.000,00 a mesma já se encontra paga no âmbito destes autos.// Quanto aos bens apreendidos constantes do auto inicial, existem alguns que não constam agora na prestação de contas, embora efetivamente apreendidos, nomeadamente 12.000 ações do Sport Lisboa e Benfica e 11.800 ações do BCP.// O mesmo se passa com os valores das contas bancárias inicialmente apreendidos nomeadamente contas do BCP e Montepio, tituladas pelos insolvente e pelas sociedades de que insolventes eram sócios, Strongframe, S.A. e LPI LDA, melhor identificados nos auto de apreensão junto pelo AI Eusébio Gouveia.// Quanto à remuneração dos Administradores:// O 1.º Administrador, perdeu licença pela Lei 22/2013 tendo continuado a praticar actos (nulos) não devendo ser remunerado e consequentemente anulados todos os actos praticados por ele praticados, após a data da sua cessação de funções constante da informação da CAAJ junto aos autos.// O 2.º Administrador, fez pagamentos com base numa lista de crédito não aprovada pela Assembleia de Credores e não justificou despesas nomeadamente inúmeros DUC pagos com o dinheiro da massa.// Está assim o processo eivado de erros que consubstanciam nulidade insanável que aqui e agora expressamente se argui.»
Posteriormente em 25/05/2023 sob a ref. n.º … os devedores “A” e mulher “B”, juntaram aos autos requerimento novo com o seguinte teor: «(…) tendo tomado conhecimento da proposta de mapa de rateio junto pelo senhor AI por consulta ao CITTIUS, vêm expor e requerer a V.ª Ex.ª o seguinte:// Não pode o senhor Administrador de Insolvência propor a distribuição dos valores aos credores se os créditos que estes detêm não se encontram devidamente atualizados ou até já não existem e outros já se encontram pagos.// Razão pela qual se opõem à proposta de rateio, impugnando-se o requerimento que a consubstancia, pelas razões aduzidas no seu requerimento de 04/05/2023 cujo teor reiteram.»
Ora, sobre o primeiro requerimento – o de 4/05/2023 (ref. citius n.º…) não incidiu, de facto, pronuncia do Tribunal. Porém, reiterando o seu teor no requerimento de 25/05/2023 sob a ref. n.º…, pronunciou-se o Tribunal a quo no despacho proferido em 10/11/2023 (ref. Citius n.º…) no qual se pode ler o seguinte «Ref….: Não se descortina nestes autos comprovativo dos pagamentos a que os insolventes se referem.», ou seja, invocando os apelantes, em ambos os requerimentos, que a relação de créditos reconhecidos deverá ser atualizada considerando os créditos pagos e os efetivamente reconhecidos, o Tribunal pronunciou-se expressamente quanto a esta questão, dizendo não vislumbrar nos autos a que pagamentos os devedores se referiram. Assim sendo, e uma vez apreciada, naquele despacho posterior a questão suscitada pelos apelantes, que nada mais vieram dizer, máxime nos termos disposto no art.º 182º, n.º3 do CIRE, não se surpreende neste ponto qualquer nulidade por omissão de pronuncia.
Mais referiram, no requerimento de 4/05/2023 (ref. citius n.º…) que:
i) o requerimento de 15 de novembro de 2022 pelo Senhor Administrador de Insolvência não lhes foi notificado pelo que, sem contraditório, não pode produzir quaisquer efeitos;
ii) Requereram a anulação dos actos praticados pelo primeiro AI nomeado, após a data da sua cessação de funções, por falta de poderes.
iii) Invocaram pagamentos efetuados pelo segundo AI nomeado com base numa lista de crédito não aprovada pela Assembleia de Credores e despesas não justificadas nomeadamente inúmeros DUC pagos com o dinheiro da massa.
Concluindo que o processo está eivado de erros que consubstanciam nulidade insanável que arguiram, questões sobre as quais, se constata, não incidiu pronúncia do Tribunal, seja em momento anterior, seja aquando da prolação do despacho recorrido.
Nos termos do art.º 615.º n.º 4 do CPC, sendo recorrível a decisão, a nulidade por omissão pronuncia deve ser invocada nesta sede.
Como sintetizou Rui Pinto (in Os meios reclamatórios comuns da decisão civil - artigos 613.º a 617.º CPC¸ Revista Julgar Digital, 2020 pág. 39) subindo o recurso, se vier a ser julgada procedente a arguição de nulidade, a decisão será revogada e substituída por decisão expurgada do vício.
Essa nova decisão poderá ser proferida pela Relação, ao abrigo do artigo 665.º, mas, nos casos do artigo 662.º, n.º 2, als. c), segunda parte, e d), pode aquela determinar que ela seja proferida pelo tribunal recorrido. Quer isto dizer, portanto, que esta instância recursória deve conhecer do vício e decidir a questão, a menos que entenda que a prova se mostra insuficiente para tanto e deva ser completada pelo Tribunal a quo.
Concluindo-se pela nulidade da decisão por omissão de pronuncia, importará, avaliar se se verificam ou não preenchidos os pressupostos da arguição das nulidades invocadas pelos recorrentes.
As nulidades processuais distinguem-se das nulidades específicas da sentença bem como do erro de julgamento (de facto ou de direito). Estes respeitam a vícios de conteúdo, aquele respeita à própria existência de atos processuais.
No caso, arguem os apelantes nulidade habitualmente chamada de secundária, inominada ou atípica.
Quanto às regras gerais sobre a nulidade dos atos, estatui, para estas nulidades, o nº1, art.º 195º do CPC, (aplicável aos presentes autos ex vi do art.º 17º do CIRE) que “fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”, estabelecendo o nº1, do art.º 199º, quanto ao prazo de arguição que “se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência”.
Consagra-se, assim, um sistema que remete para uma análise casuística, em que se invalida apenas o ato que não possa ser aproveitado sendo que, invalidado um ato, tal acarreta que se invalidem todos os subsequentes que se lhe sigam e que daquele dependam absolutamente.
Constitui exemplo de omissão de ato prescrito na lei a falta de cumprimento do dever jurídico do juiz de realizar diligências que importem a justa composição do litígio, como é caso, da necessidade de fazer observar o princípio do contraditório.
Dizem, então, os recorrentes que o requerimento de 15 de novembro de 2022 do AI (a referência a esta data tratar-se-á certamente de um lapso dos apelantes, posto que em 15/11/2022 não se mostra junto aos autos qualquer requerimento subscrito pelo AI, pretendendo, certamente, referir-se ao de 11/11/2022) não lhes foi notificado pelo que, sem contraditório, não pode produzir quaisquer efeitos.
O requerimento do AI em causa (ref. citius n.º…) tem o seguinte teor «(…) Administrador Judicial nomeado para intervir nos autos de processo de insolvência, vem expor o seguinte:// O signatário vem informar que se encontra a ultimar a elaboração da prestação de contas, faltando apenas no momento, justificar alguns movimentos, mais antigos, que por não terem sido movimentados: (…). Assim aguardamos esclarecimentos da entidade bancária, o que se espera esteja concluído até à próxima terça feira.// Nestes termos e nos mais de Direito, que V. Ex.ª doutamente suprirá, requer a junção aos autos do presente requerimento.»
Pelo requerimento em causa, nada se requeria, dando-se apenas nota ao Tribunal de que a prestação de contas ainda não se encontrava elaborada.
Na mesma data foi proferido despacho com o seguinte teor (ref. Citius n.º…): «Considerando o prazo já decorrido, notifique o Administrador para prestar conta nos termos já determinados.»
Em 15/02/2023 o Sr. AI apresentou contas que foram autuadas por apenso nos termos do art.º 64º do CIRE, tendo-se ordenado a notificação aos credores e ao devedor insolvente, o que veio a suceder. Nada tendo aí sido dito quanto às contas apresentadas, máxime pelos devedoras/apelantes. Depois, em 23/06/2023, no apenso de prestação de contas – apenso J -, foi aprovada a prestação de contas da administração da insolvência, a qual foi devidamente notificada aos intervenientes processuais conforme certificação citius em 27/06/2023 e publicitada, por anúncio no portal Citius, tendo transitado em julgado.
Tudo para concluir que, no requerimento de 11/11/2022, o AI apenas dá nota ao Tribunal de que as contas não se mostram ainda elaboradas em função das vicissitudes ocorridas, que sobre tal requerimento não incidiu qualquer decisão que definisse quaisquer direitos, nomeadamente no que diz respeito às funções exercidas pelos sucessivos Administradores da Insolvência nomeados nos autos. Tal não sucedendo, o requerimento em causa não foi, nem teria de ser, notificado aos devedores, razão pela qual não se surpreende qualquer nulidade ocorrida, por esta via.
Mais requereram os apelantes a anulação dos atos praticados pelo primeiro AI nomeado, após a data da sua cessação de funções, por falta de poderes.
Ora, no que diz respeito ao regime e meio de arguição, a regra é a de que o juiz só conhece destas nulidades mediante arguição da parte e o meio processual próprio para o fazer é a reclamação (v. parte final do art.º 196º e 197º), no momento em que ocorrer a nulidade, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário e, no caso de o não estar, o prazo geral de arguição, de dez dias, conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando se deva presumir que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência (cfr. arts. 199º, n.º 1 e 149º, n.º 1, do C. P. Civil).
Acrescenta-se manter-se “a atualidade e pertinência do brocardo segundo o qual “dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”. Com efeito, se houver um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou a omissão do ato ou formalidade, o meio próprio para reagir será a impugnação do respetivo despacho pela interposição do recurso competente. A reclamação e o recurso não são meios de impugnação concorrentes, cabendo à parte reclamar previamente para suscitar a prolação de despacho sobre a arguida nulidade (cf. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, pág 236).
Isto serve para dizer que, quanto aos atos praticados pelo primeiro AI nomeado após a data da sua cessação de funções, por falta de poderes – os quais, de resto, os apelantes não individualizam – e que a ser assim, constituiriam irregularidade suscetível de influir na marcha do processo, a respetiva nulidade daí decorrente, se algo tinham a requerer ao Tribunal ou a reclamar, fosse da concreta nulidade secundária acima referida fosse de outra cometida, tinham os apelantes de o fazer perante o Tribunal a quo, no prazo geral de dez dias. Não o tendo feito, e vindo só argui-las muito meses após ter cessado funções e já quando se encontrava em funções o segundo AI nomeado em substituição do primeiro, as eventuais nulidades secundárias ocorridas encontravam-se já sanadas, no momento da sua arguição.
Finalmente, invocaram os devedores que foram efetuados pagamentos pelo segundo AI nomeado, com base numa lista de créditos não aprovada pela Assembleia de Credores e despesas não justificadas nomeadamente inúmeros DUC pagos com o dinheiro da massa.
Considerando o disposto nos artigos 62.º a 64.º do CIRE sobre a prestação de contas, vê-se que a apresentação delas impende sobre o administrador da insolvência (n.º 1 do artigo 62.º) e que, autuadas por apenso, cumpre à comissão de credores, caso exista, emitir parecer sobre elas, abrindo-se de seguida um contraditório sobre as contas com a participação dos credores, do devedor e do Ministério Público (n.ºs 1 e 2 do artigo 64.º do CIRE).
Quando o n.º 1 do artigo 62.º do CIRE determina que o administrador da insolvência apresenta contas dentro de dez dias subsequentes à cessação das suas funções, qualquer que seja a causa que a tenha determinado…”, fá-lo por causa dos poderes de administração e disposição dos bens da massa que a lei lhe concede (n.º 1 do artigo 81.º do CIRE e artigo 2.º, n.º 1 do Estatuto do administrador judicial, na parte em que afirma que o administrador judicial é a pessoa incumbida da gestão ou liquidação da massa insolvente no âmbito do processo de insolvência).
Tal como decorre do disposto no nº 3 do art.º 62º do CIRE as contas são elaboradas em forma de conta corrente, com um resumo de toda a receita e despesa destinado a retratar sucintamente a situação da massa insolvente.
Por outro lado, é através da prestação de contas que se pode sindicar a razoabilidade das despesas efetuadas pelo administrador e a cujo reembolso ele tem direito, de acordo com o art.° 60.°, n.° 1 (…)”, com referência ao Estatuto do administrador da insolvência e à Portaria nº 51/2005 (cf. Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa Anotado, 3ª edição, pág. 358).
O julgamento das contas que o tribunal terá de fazer recai sobre a real situação económica final da insolvência decretada, incidirá sobre a real consistência do saldo encontrado e resultante das receitas e das despesas comprovadas na conta-corrente exibida por quem as presta, assim como e também comportará um juízo sobre a exatidão ou insuficiência de cada uma das verbas que se incluem nas receitas ou débitos descritos - a finalidade do processo de prestação de contas é a do apuramento do saldo das contas; para tal apuramento, se necessário, deve o julgador recorrer ao prudente arbítrio e à sua experiência.
Depois, na distribuição e rateio final estão em causa operações aritméticas que não envolvem já, em princípio, a formulação de qualquer juízo de legalidade, oportunidade ou probabilidade. Por tal razão, no momento da elaboração do rateio há que considerar o sentido das decisões judiciais com base nas quais se faz a referida execução material do mapa, entre elas as decisões relativas à graduação de créditos (seguindo a graduação inerente às prioridades de pagamento atendíveis) e à prestação de contas (seguindo as contas aprovadas).
Ora, nas contas da administração que o Administrador da Insolvência apresentou, em cumprimento do disposto no art.º 62º, nºs 1 e 3, sobre as quais se debruçou a sentença que as aprovou, estão transcritos em mapa, discriminadamente as receitas (provenientes da venda de bens apreendidos) e as despesas. Do respetivo resumo resulta o valor total da receita e o valor total da despesa, com indicação do respetivo saldo, ou seja, o valor da receita deduzido do valor da despesa.
Ao aprovar estas contas pela sentença de 23/06/2023, tal qual se encontram ali descritas, o tribunal está a determinar que as receitas e as despesas ali declaradas foram efetivamente obtidas e realizadas, devendo, como tal, ser traduzidas e concretizadas no mapa de rateio final a que se refere o art.º 182º.
A sentença assim proferida, transitou em julgado, (assim como a sentença de verificação e graduação de créditos) não tendo sido arguida, em momento oportuno, qualquer irregularidade processual seja pelos credores, seja pelos devedores, de modo que assim foi tida em conta na elaboração do mapa de rateio.
Quanto aos pagamentos, é manifesto que não pode haver lugar a pagamento de créditos que não estejam verificados por sentença transitada em julgado, nem em montante superior àquele que conste da mesma sentença. Porém, dos autos, não resultam quaisquer pagamentos que tenham sido efetuados em contrário do determinado na sentença de graduação de créditos proferida em 1/07/2016 e retificada em 14/07/2016.
Em conclusão, a lista definitiva de credores junta aos autos em 14/07/2016 encontra-se homologada por sentença datada de 01-07-2016, decisão esta que já transitou em julgado.
A sentença de 20/02/2023 na qual foram julgadas válidas as contas apresentadas nos presentes autos, transitou igualmente em julgado.
Caso os apelantes tivessem algum fundamento a opor à referida decisão, nomeadamente em face da ocorrência de irregularidades processuais secundárias, deviam tê-las arguido em tempo. Fazendo-o, apenas, decorridos que se mostram mais de sete anos sobre a primeira e um ano sobre a segunda, as eventuais nulidades secundárias, a terem ocorrido, encontram-se, igualmente sanadas, não podendo ser atendidas.
III.
Defendem ainda os recorrentes que a proposta de rateio final alterada não lhes foi notificada e, por isso, não puderam exercer o contraditório, nem pronunciar-se sobre tal proposta (conclusão 4), de modo que a questão que se coloca, agora, é a de saber se sobre o Sr. Administrador da Insolvência impendia o dever de notificar os recorrentes do teor da proposta de distribuição e rateio.
A este propósito pronunciou-se o recente Acórdão desta secção de 29/04/2025, proferido no processo n.º 13612/14.6T8LSB-I.L1, relatora Fátima Reis Silva, disponível para consulta in www.dgsi.pt, em cujo sumário se pode ler que “2 - O art. 182º do CIRE na redação dada pela Lei nº 9/2022 de 11 de janeiro, não exige, não prevê e claramente dispensa que a apresentação da proposta de distribuição e rateio seja notificada aos credores, bastando a respetiva publicação.”
A razão subjacente a este entendimento radica, essencialmente, no facto de, por um lado e literalmente, o art.º 182º não o exigir, dispensando que a apresentação da proposta de distribuição e rateio seja notificada aos credores, sendo que já nas versões anteriores do referido artigo, quando a elaboração do rateio pertencia à secretaria, nada se dispunha sobre a notificação do rateio final, pelo que se aplicavam as regras do CPC relativas às notificações (220º, nº2 do CPC, aplicável ex vi art. 17º do CIRE), podendo os credores reclamar nos termos do art.º 157º, nº5 do CPC, no prazo geral de dez dias (149º nº1 do CPC). A versão, dada pela Lei nº 9/2022 de 11/01 (aplicável nos autos), introduziu uma regra que afasta aquele regime, à luz do disposto no art.º 17º do CIRE. Agora os credores podem pronunciar-se no prazo de 15 dias contados da data da publicação da proposta na área dos serviços digitais dos tribunais, ou seja, no portal citius. Regulou-se a publicidade e determinou-se ser da realização desta que depende o início do prazo de pronúncia, nada havendo a notificar.
Assim, independentemente do teor da proposta de rateio, esta nunca é notificada, sendo sim objeto de publicação e contando-se o prazo de pronúncia sobre a mesma dessa publicação, recaindo o ónus sobre os interessados de consultarem o portal citius para aferirem se já foi publicada a proposta de distribuição e rateio final.
A proposta de rateio final foi apresentada na sequência de um conjunto de atos legalmente previstos, que, no caso em apreço, foram corretamente cumpridos. Por esse motivo, a sua apresentação era previsível, não se prefigurando, portanto, qualquer afronta ao princípio do contraditório.

IV.
Neste ponto, confluímos para a última das questões a apreciar que é a de saber se existem créditos que não devam ser pagos conforme definido no mapa de rateio e se existem bens apreendidos nos autos que dele não constam (conclusões 9 e 10).
Alegam os apelantes que os créditos do Banco Comercial Português S.A. e dos credores “D” e “E” são inexistentes, não devendo, como tal constar no mapa de rateio.
Os créditos em causa foram reconhecidos na sentença de verificação e graduação de créditos que transitou em julgado.
Ora, a regra legal é a de que o rateio é efetuado de acordo com a sentença de verificação e graduação de créditos, no âmbito da qual o devedor teve oportunidade de influir no conteúdo dessa sentença, impugnando a lista e recorrendo da sentença, caso lhe fosse desfavorável.
Atenta a redação do art.º 182º, n.º3 do CIRE, a responsabilidade pela execução do rateio final e da elaboração do respetivo mapa é do administrador da insolvência, que para o efeito elabora uma «proposta de distribuição e de rateio final», prevendo-se a possibilidade dos credores se pronunciarem sobre a mesma, o que deverão fazer nos 15 dias subsequentes à sua publicação na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, consagrando-se a intervenção nesta fase do juiz (após a apreciação pela secretaria da proposta de rateio final (a realizar após o decurso do prévio prazo de 15 dias para o exercício de contraditório), a quem cabe decidir sobre eventuais impugnações que surjam à dita proposta do administrador da insolvência e validá-la, o que deverá fazer nos 10 dias seguintes à pronúncia da secretaria.
Apesar de a lei mencionar apenas a possibilidade de pronuncia dos credores, cremos não ser de excluir a possibilidade de pronuncia pelo devedor, que, terá, naturalmente, interesse em que a repartição dos bens e o pagamento das dividas da massa seja efetuada de acordo com o que ficou definido quer na sentença de verificação e graduação de créditos quer na que julgou as contas apresentadas.
Assim se entendendo, será necessariamente no decurso do prazo de reclamação (agora expressamente consagrado) que os interessados – credores e devedor - deverão reagir a quaisquer desconformidades entre a proposta do mapa de rateio e o que se ache estabelecido na sentença de reconhecimento e graduação de créditos, como, uma vez proferido o despacho de validação da anterior mera proposta do referido mapa, só então o nela contido (e tal como seja decidido no dito despacho, nomeadamente mercê da consideração das eventuais discordâncias dos credores e da secretaria) determinará os pagamentos ulteriores.
Ora, os apelantes, não seguiram esta via, por referência ao mapa de rateio junto em 12/02/2024, nada tendo dito ou reclamado.
Não o tendo feito, e tendo a secretaria emitido uma apreciação conforme, veio a ser proferido despacho judicial homologando o mapa de rateio e ordenando que se fizessem os conformes pagamentos, desse modo o validando.
De todo o modo, analisado o quadro anexado à proposta apresentada pelo AI, com base no qual foi o rateio efetuado, constata-se que o mesmo respeitou integralmente o decidido, porquanto aí se descriminaram os créditos reconhecidos/graduados a cada um dos credores, sendo o rateio elaborado tendo subjacente os mesmos pagamentos já efetuados (contabilizando-os) em sede de rateio parcial de 2017.
O rateio respeitou, pois, o decidido em sede de verificação e graduação de créditos, a saber: pagamento dos créditos privilegiados - créditos hipotecários, reclamados pelo BCP, S.A, os créditos privilegiados dos credores requerentes “D” e “E” e os créditos comuns.
Analisada a sentença de prestação de contas, do mesmo modo se conclui, no que diz respeito aos bens apreendidos e vendidos em sede de liquidação, que o mapa de rateio acautelou devidamente o que constava do apenso de prestação de contas, a saber, nomeadamente no que diz respeito às participações sociais - ações (elencadas sob as verbas 14 e 15).
A potencial existência de bens apreendidos e não vendidos tem que ver com o âmbito da liquidação que correu os seus termos no apenso H, - a qual foi declarada encerrada por decisão de 13/12/2021 e, devidamente notificada quer aos credores quer aos apelantes, transitou em julgado, do que resultou o esgotamento do poder jurisdicional do Tribunal nos termos do disposto no art.º 613º do CPC – ou seja, é questão que extravasa o âmbito do rateio final que, como se disse, tendo lugar após o encerramento da liquidação tem como função a distribuição final do valor remanescente (ou sobras), ou seja, do valor que se obteve com a liquidação dos bens e rendimentos do devedor e que sobrou após terem sido pagas todas as custas do processo e demais dívidas da massa insolvente.
A presente apelação improcede, assim, integralmente.
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IV. Decisão
Perante o exposto, acordam as Juízas desta Secção do Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar a apelação improcedente, mantendo-se o decidido pela 1.ª instância.
Custas pelos apelantes – artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

Lisboa, 11-11-2025,
Susana Santos Silva
Manuela Espadaneira Lopes
Renata Linhares de Castro