Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | JOÃO PAULO VASCONCELOS RAPOSO | ||
| Descritores: | MEIOS DE PROVA EXPERIÊNCIA COMUM GERENTE DE COMÉRCIO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/20/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: | Sumário (da responsabilidade do relator): I. Na avaliação dos meios de prova à luz de juízos de experiência comum, incluindo recurso a presunções naturais, o tribunal deve partir de uma base de avaliação assente na normalidade social, considerando os comportamentos tipicamente praticados num determinado contexto de relacionamento pessoal e jurídico; II. Esta base de normalidade não significa que não se possa estabelecer, com base nesses juízos de experiência, uma realidade socialmente atípica, mas, para que tal suceda, deve partir-se de um standard probatório mais exigente e fazer-se um percurso lógico-racional que permite estabelecer, de forma clara, um tal resultado; III. A falta de prova concreta de um curso anómalo de eventos e, pelo contrário, a existência de abundante prova de um curso normal devem levar a concluir que foi este que ocorreu e não a afirmação de subsistência de dúvidas, a valorar em desfavor do onerado com a prova; IV. É gerente de comércio, nos termos do art.º 248.º do Código Comercial, aquele agente que se apresente no mercado a atuar em nome de uma sociedade proponente, como seu mediador ou comissionista. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Decisão: I. Caracterização do recurso: I.I. Elementos objetivos: - Apelação – 1 (uma), nos autos; - Tribunal recorrido – Juízo Local Cível de Loures - Juiz 3; - Processo em que foi proferida a decisão recorrida – Ação de processo comum n.º 13574/23.9YIPRT; - Decisão recorrida – Sentença. -- I.II. Elementos subjetivos: - Recorrente (autora): - ; - Recorrida (ré): - ---- -- I.III. Síntese dos autos: - Instaurou a autora procedimento de injunção contra a requerida, liquidando o valor que reclama em €45.296,89, incluindo juros vencidos, indicando um conjunto de faturas para sustentar a sua pretensão. - Citada, opôs-se a ré. - Invocou ineptidão do requerimento inicial e contestou que as faturas em causa sejam referentes a serviços a si prestados, invocando ter uma simples relação de parceria comercial com AA, pessoa que solicitou os serviços. - Remetidos os autos à distribuição e distribuídos em tribunal, foi proferido um despacho inicial declarando improcedente a invocada ineptidão da petição inicial e convidando a autora a apresentar nova petição inicial, com alegação completa da factualidade que suporta o seu direito: - Apresentou a autora petição inicial dizendo, em síntese: - Ter prestado serviços e fornecido bens do seu comércio da área da gráfica e publicidade: - Que tais serviços e bens estão documentados em faturas, que descreve, perfazendo o valor total de €39.938,10; - Que a ré não procedeu ao respetivo pagamento. - Citada, a ré impugnou ter estabelecido qualquer contrato com a autora e que a pessoa física que se relacionou com esta não é seu funcionário ou representante. - Foi proferido despacho saneador, fixado o objeto do litígio e indicados os temas da prova. - Após, realizou-se audiência final, na sequência da qual foi proferida sentença, cujo dispositivo é o seguinte: Em face do exposto julga-se a ação improcedente, e, em consequência: a) Absolve-se a Ré -- do pedido deduzido pela Autora – -- - Desta decisão, não se conformando a autora, veio apelar, pelo presente recurso. --- II. Objeto do recurso: II.I. Conclusões apresentadas pela recorrente nas suas alegações (sem atualização de grafia, suprimindo pequenos trechos e assinalando a negrito as questões suscitadas): A. O presente recurso tem como objeto toda a matéria de facto e de direito da Douta Sentença proferida nos presentes autos que absolveu a Recorrida do pagamento de € 39.938,10 (trinta e nove mil, novecentos e trinta e oito euros e dez cêntimos). B. Tendo em conta a prova produzida em audiência de discussão e julgamento o tribunal a quo nunca poderia ter dado como não provados, como deu, os factos i), ii) e iii), porquanto a prova documental junta e prova testemunhal demonstram precisamente o contrário. C. O Tribunal a quo não valorou alguns documentos e algumas testemunhas ouvidas para formar a sua convicção, nomeadamente da testemunha AA, fundamental para compreender a situação dos presentes autos. D. A Recorrente dedica-se ao comércio e indústria gráfica, artigos publicitários e demais serviços gráficos e serigrafia e no exercício da sua atividade forneceu à Recorrida diversos produtos. E. No âmbito desta relação comercial, e como provado pelo Tribunal a quo, foram emitidas diversas facturas. F. Para a emissão das referidas facturas foram enviados pedidos, orçamentos e adjudicações, conforme resulta dos documentos 16 a 39 junto aos autos. G. Todos os pedidos eram feitos pelo AA que assinava o email como: --, conforme fica demonstrado pelos emails juntos e é referido pela testemunha no seu depoimento aos minutos: 4.32, 4.47, 17.33, 21.59, 22.06, 22.20. H. E reitere-se que tudo era autorizado pela própria Recorrida, conforme ficou referido pela testemunha AA e resulta da transcrição dos minutos 4.32, 4.47, 13.02, 17.33, 21.59, 22.06, 22.20 I. Sendo que o Sr. AA representava, para os efeitos comerciais, a Recorrida, conforme se alcança pelos emails junto aos autos e pelo depoimento de BB 4.25, 22.06, 22.20, 33.33, 33.42. J. Quanto ao tipo relação estabelecida entre a Recorrida e o Sr. AA a Recorrente é totalmente alheia, mas que existiu, existiu, porquanto ficou devidamente comprovado pela inquirição da testemunha AA, nos minutos 4.25, 33.47, 35.35 e do depoimento da testemunha CC ao minuto 58.58, 59.17. K. O próprio CC refere que pressionou o gerente (seu pai) a contratar o Sr. AA, conforme o mesmo confirmou no seu depoimento ao minuto 58.58, 59.17 L. Ou seja, dúvidas não podem restar que o Sr. AA era prestador de serviços e agia em nome da Recorrida. M. Da prova testemunhal produzida nas audiências de julgamento foi amplamente mencionado pela testemunha AA (depoimento ao minuto: 2.48, 6.00, 6.19, 13.12, 14.29, 23.18, 23.22, 23.47, 24.01, 24.05, 26.05, 27.23, 27.27) a forma como funcionava a contratação dos serviços da Recorrente. N. Da testemunha AA foi possível concluir, se margem para erros, que a Recorrente e a Recorrida acordaram diretamente no fornecimento de serviços e artigos gráficos e publicitários, sendo que esse acordo era intermediado pelo colaborador da Recorrida, AA, conforme o mesmo esclareceu no seu depoimento aos minutos 2.48, 6.00, 6.19, 13.12, 14.29, 23.18, 23.22, 23.47, 24.01, 24.05, 26.05, 27.23, 27.27. O. E mais, a testemunha AA referiu que todos os trabalhos foram entregues ao cliente final, conforme resulta claro do depoimento aos minutos 6.34, 6.40, 7.10, 12.08 e corroborado pela testemunha DD no seu depoimento aos minutos 06.59, 5.32, 7.37, 7.40, 7.54, P. E ainda, que os trabalhos foram pagos à Recorrida pelos clientes, conforme confirmou a testemunha AA no seu depoimento ao minuto 6.34, 6.40, 7.10, 14.29. Q. Pelo que, a Recorrida recebeu pelos trabalhos entregues ao cliente final e simplesmente optou por não pagar. R. Tendo alegado erros facturação, que como se verificou não estão em causa nos presentes autos (confirmado pelo depoimento da testemunha CC 1.00.55), quando sabe que recebeu pelo trabalho que foi prestado, conforme resultou da testemunha AA. S. Para além de que, tal informação nunca foi prestada à Recorrente, pelo menos, nas facturas em dívida nos presentes autos, conforme referiu a testemunha CC no seu depoimento aos minutos 01.05.53, 1.06.10, 1.06.14. T. Sendo esta a forma de contornar o pagamento que a Recorrida arranjou para não proceder aos pagamentos aos fornecedores, como o caso da aqui Recorrente, tal como sucedeu noutros fornecedores como a --, conforme confirmado no depoimento das testemunhas BB aos minutos 20.57, 26.06 e DD, aos minutos 14.16, 14.33. U. O facto é que os trabalhos foram entregues ao cliente final nos moldes acordados com o AA, sendo que a sua grande maioria foi entregue na “Lojista” (uma central de entregues de um dos clientes finais, --), conforme confirmado pelo depoimento das testemunhas AA e DD nos minutos, respectivamente, 2.48, 6.40, 7.10, 7.50, 12.08, 15.15 e 06.59, 5.32, 7.40. V. Alias, os trabalhos eram acompanhados com guias de transportes emitidos em nome da Recorrida, conforme explicado pela testemunha DD no depoimento aos minutos 7.40, 7.54. W. Para além de que, o Sr. AA, enquanto prestador de serviços da Recorrida, recebeu sempre as suas comissões, conforme o próprio referiu tendo ficado apenas em dívida o último pagamento, coincidente com a sua saída da Recorrida, conforme referiu o mesmo no seu depoimento aos minutos 1.33, 2.48 7.50, 9.10, 33.42, 33.47, 35.35 X. Ficou também devidamente provado, através das testemunhas, que esta prática comercial era habitual nos fornecedores, ou seja, existia o intermediário, neste caso, o Sr. AA, que adjudicada trabalhos aos fornecedores e posteriormente, eram faturados à Recorrida, conforme resulta do depoimento aos minutos 21.19, 21.21. Y. Trabalhos esses que eram pagos pelo cliente final à Recorrida. Z. Aliás, a testemunha AA e a testemunha DD informaram que se conheceram no âmbito da empresa designada “--” e que estes trabalhos eram, ipsis verbis, os retratados nos presentes autos, conforme depoimentos aos minutos, 36.42 e 15.55, respectivamente AA. Ficou igualmente provado que todos os pedidos de pagamentos eram enviados ao Sr. CC, através de prova documental carreada pelas partes nos autos, tendo a testemunha AA corroborado tais informações aos minutos 7.50 12.08, a forma como tudo se processava. BB. Em bom rigor, o Sr. CC, que era o diretor comercial da Recorrida, recebia as facturas para pagamento e efetuava os pagamentos CC. Tendo efetuado o pagamento de diversas facturas, conforme ficou demonstrado pela prova documental junta aos autos, nomeadamente a conta corrente junta como doc. 42. DD. Tendo apenas ficado em dívida as que se encontram peticionadas nos presentes autos. EE. Ademais, ficou ainda provado, sem margens para dúvidas, que a Recorrida nada fez contra o Sr. AA a nível judicial, conforme confirmado pelo depoimento da testemunha BB ao minuto 10.49 e pela testemunha CC aos minutos 1.07.42 a 1.07.52. FF. Pelo que, dúvidas não podem restar que o Sr. AA representava a Recorrida nas relações comerciais e que este adjudicava trabalhos aos fornecedores (como à aqui Recorrente) e estes eram entregues ao cliente final. GG. Posteriormente, o cliente pagava à Recorrida e esta deveria proceder aos pagamentos aos fornecedores, não o tendo feito no caso da Recorrente. HH. Pelo que, deverão, face ao exposto, os factos não provados serem dados como provados em face da prova produzida. Termos em que, e nos melhores de direito, que V. Exas mui doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a Douta Sentença recorrida, e consequentemente, condenar a Recorrida ao pagamento à Recorrente, fazendo-se, assim a habitual e necessária, JUSTIÇA! -- A autora, notificada, contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida. -- II.II. Questões a apreciar: São as conclusões da recorrente que delimitam o objeto de recurso, sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso que, no caso, não se prefiguram. Assim, tendo a recorrente impugnado a decisão de facto, cumpre verificar da admissibilidade da mesma e, na sequência, proceder à sua apreciação, caso a avaliação prévia seja ultrapassada. Na sequência do que for estabelecido em sede factual, sendo a única questão jurídica em causa a de saber se o fornecimento e prestação de serviços objeto dos autos foi celebrado entre autora e ré, haverá que decidir em conformidade. -- Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. – --- II.III. Apreciação do recurso: -- II.III.I. Recurso da decisão de facto: II.III.I.I Admissibilidade do recurso de facto: De acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 640.º do Código de Processo Civil (CPC), para admissão da impugnação de facto o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (al. a); os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão de facto diversa (al. b) e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto em causa (al. c). A interpretação destas exigências legais tem sido trabalhada jurisprudencialmente, procurando afastar o que se poderia qualificar de formalismo excessivo e fazendo relevar critérios de proporcionalidade e razoabilidade. De acordo com esta doutrina, há dois ónus que a parte deve cumprir, um primário, traduzido no cumprimento das exigências do art.º 640.º n.º 1, e um secundário, traduzido na indicação das passagens relevantes da prova gravada, estabelecido pelo n.º 2. Assim iluminando os ónus estabelecidos ao recorrente, comummente segmentados em primários e secundário, considerando também que a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem-se mostrado aberta no que concerne à consideração do corpo das alegações para colmatar alguma insuficiência que possa existir nas conclusões, deve avaliar-se – cfr. acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 12/2023, cujo segmento uniformizador estabeleceu que, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa1. Considerando este quadro normativo e interpretativo, deve concluir-se, no caso, que a recorrente cumpriu os ónus impugnatórios que sobre si recaiam. A matéria de facto está identificada, podendo ser referida como relativa à identidade dos contratantes ou, pondo de outra forma a questão, à existência de uma relação contratual entre autora e ré. Os meios de prova em que assenta a impugnação também o estão, referindo-se a prova testemunhal identificada, incluindo os trechos indicados como relevantes dos depoimentos, bem como em prova documental, igualmente indicada. Por fim, a decisão alternativa também se mostra identificada e, em termos simples, traduz a passagem dos factos relativos à existência de uma relação contratual entre autora e ré dos não provados para os provados. Não existe, portanto, obstáculo à admissibilidade do recurso, o que se decide. -- II.III.I.II. Apreciação do recurso relativo à matéria de facto: A) Decisão de facto na sentença: Para melhor enquadrar a análise, cumpre começar por apresentar o elenco de fundamentos de facto dados por provados e por não provados a quo. a) Factos provados: 1. No exercício da sua atividade comercial, a Autora emitiu várias faturas em nome da Ré com vista ao pagamento de quantias relativas a serviços e produtos gráficos: - Factura n.º 90 de .../.../2021 no valor de € 455,10; - Factura n.º 124 de .../.../2021 no valor de € 238,62; - Factura n.º 126 de .../.../2021 no valor de € 1.141,44; - Factura n.º 202 de .../.../2021 no valor de € 147,60; - Factura n.º 210 de .../.../2021 no valor de € 831,48; - Factura n.º 274 de .../.../2022 no valor de € 3.525,18; - Factura n.º 290 de .../.../2022 no valor de € 6.463,65; - Factura n.º 301 de .../.../2022 no valor de € 3.462,45; - Factura n.º 302 de .../.../2022 no valor de € 3.008,58; - Factura n.º 331 de .../.../2022 no valor de € 10.392,27; - Factura n.º 333 de .../.../2022 no valor de € 5.105,73; - Factura n.º 335 de .../.../2022 no valor de € 2.717,07; - Factura n.º 416 de .../.../2022 no valor de € 1.172,19; - Factura n.º 462 de .../.../2022 no valor de € 1.276, 74. 2. Por carta datada de ... de ... de 2023, a Autora comunicou à Ré o seguinte: Pela n/ representada supra referenciada, recebi o encargo de proceder ao necessário para obter a boa cobrança da quantia V. Exas. são devedores no valore de € 39.938,10, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento. A fim de evitar os incómodos despesas que sempre resultam do tratamento judicial destas questões, solicito que procedam à liquidação daquele débito, no prazo de 5 dias a contar da data da recepção desta carta. (…)” b) Factos não provados: i. A Autora e a Ré acordaram diretamente no fornecimento de serviços e artigos gráficos e publicitários. ii. A Autora prestou os serviços gráficos e publicitários e forneceu os materiais titulados pelas faturas identificadas no ponto 1 dos factos provados à Ré que não foram pagas por esta. iii. AA era funcionário da Ré. -- B) O quadro geral de análise: Assente esta base, contextualizando-a com a impugnação apresentada, importa atentar num conjunto de juízos gerais que cumpre fazer, antes de entrar na análise dos meios de prova propriamente ditos, i.e., na substância da impugnação. Assim: a) Deve atentar-se, em primeiro lugar, que é incontestado que a relação contratual direta se deu entre a autora e uma pessoa de nome AA, cujo depoimento é convocado para sustentar este recurso. Este AA solicitou à autora, da forma que à frente se referirá mais detidamente, um conjunto de bens e serviços do seu comércio (área gráfica e publicidade). A dúvida factual que existe refere-se à relação (ou falta dela) entre AA e a ré; b) Deve atentar-se, de seguida, que o tribunal deu como não provado que AA fosse funcionário da ré, mas não respondeu expressamente à questão de saber se tinha alguma relação jurídica com esta, apresentando-se como seu representante, agente, comissionista ou qualquer outra qualidade deste tipo, que não implique uma integração orgânica na sociedade. c) Acresce que o tribunal deu também como não provado que autora e ré tenham acordado diretamente no fornecimento de serviços e artigos gráficos e publicitários, algo que decorre diretamente do que antes se salientou. Não houve, assumidamente (da parte da própria recorrente) uma contratação direta entre sociedades, por via dos seus legais representantes, i.e., os respetivos gerentes; d) Quer isto dizer, numa simples avaliação a priori da decisão de facto, que ressalta que esta é omissa na referência expressa, seja como facto provado ou não provado, a ter AA atuado na qualidade de agente da ré. Em todo o caso, porque o sentido da decisão é de inexistência de qualquer ligação contratual entre as partes, a conclusão que tem que se inferir será, necessariamente, que tal pessoa teria atuado de forma isolada ou, pelo menos, sem qualquer ligação à ré. e) Dito isto, fica claro que a decisão de facto, neste contexto, torna-se socialmente atípica e, portanto, ainda numa análise prévia, pouco compatível com juízos de experiência comum e presunções naturais. Não quer dizer que seja insustentável e não possa ser sustentada, mas terá necessariamente que ser vista como algo de pouco normal. Sabe-se que o quadro jurídico e organizativo da generalidade do tecido empresarial português é precário, constituído por uma esmagadora maioria de micro e pequenas empresas, cuja estrutura social é limitada. Acresce que o modo de funcionamento do mercado interempresas, e também, frequentemente, entre empresas e clientes finais, funciona de modo largamente informal, assente em negócios indocumentados, ou documentados em meras comunicações eletrónicas muito parcelares, deixando amplo campo para dúvidas. Estas, naturalmente, só se manifestam quando existem divergências ou litígios entre as partes. Nesse sentido, este litígio, como tantos outros, assacando à justiça responsabilidade por disfunções económicas do mercado que muitas vezes não tem, seria evitado à nascença se, no momento da contratação, as partes, por meio dos seus representantes, tivessem cuidado de reduzir a escrito, ainda que de forma singela, a sua simples vinculação contratual. f) Apesar disso, será algo de atípico e socialmente anormal que alguém, com propósitos que se desconhecem, viesse atuar no mercado, solicitando prestação de serviços e fornecimento de bens, em nome de outrem, com quem não tenha qualquer ligação. Partindo do princípio que os diferentes agentes económicos atuam na busca de vantagens, seja na obtenção de ganhos ou na redução de perdas, não se compreende qual a racionalidade de um tal comportamento e a que propósitos se poderia destinar (sendo certo que não é discutida nos autos qualquer atuação do tipo criminoso, da esfera da burla, algo, a verificar-se, seria do interesse de ambas as partes denunciar – a autora porque se sujeitara a ter perdido bens dos seu comércio, a ré porque haveria alguém no mercado a fazer-se passar por seu representante para burlar terceiros). g) Será, pelo contrário, algo de absolutamente normal e típico que um devedor relapso procure encontrar algum subterfúgio ou argumento para se escusar ao pagamento. O devedor relapso típico não afirma que não paga porque não quer. Dirá que não paga por alguma razão, que pode ir do erro na faturação, à invocação de algum defeito no objeto fornecido (e usado), eventualmente alguma dificuldade temporária de tesouraria. Neste contexto que, repete-se, se apresenta meramente a priori, pode dizer-se, portanto, que será muito mais típico socialmente e, consequentemente, apresenta-se muito mais sólido racionalmente, atribuir-se a uma justificação do devedor a negação de qualquer relacionamento com AA. Em termos de standard de prova, devem retirar-se consequências deste juízo e, portanto, será de exigir uma demonstração de uma explicação racional e consistente para ter alguém atuado no mercado, apresentando-se como agente de uma sociedade, sem que o seja, ou, por outro lado, para que um fornecedor que se relacione com uma pessoa física emita faturas em nome de uma sociedade. Pelo contrário, a simples demonstração de uma relação de representação entre AA e a ré, ainda que não estabelecida uma concreta forma jurídica para a mesma, deverá ser suficiente para estabelecer uma verdadeira relação entre sociedades, se se estabelecer um quadro de um relacionamento informal e continuado. No relacionamento comercial não se exige demonstração documental da qualidade dos intervenientes. Os gerentes não atuam no mercado apresentando certidões de registo comercial que atestem a sua posição. Os funcionários não atuam exibindo contratos de trabalho e os agentes, representantes e comissionistas não atuam exibindo contratos e procurações. Este é, por fim, o último juízo de experiência que cumpre referir, antes de avançar para a análise direta da decisão. -- C – A motivação da decisão recorrida: Cumpre deter a atenção nas razões e juízos que levaram o tribunal a decidir como decidiu. De relevante para a questão em apreço, consta na motivação da sentença o seguinte: Refira-se que no essencial o que se discute neste processo é saber de AA representava a Ré -- nas suas relações comerciais com a Autora ou se este era antes um freelancer que tinha apenas uma parceria com a Ré, não sendo seu funcionário nem a vinculando perante terceiros. Discute-se ainda se os serviços titulados pelas faturas acima identificadas foram efetivamente prestados à Ré ou se apenas foram faturados em nome desta. Ora, dúvidas não existem de que a Autora emitiu faturas em nome da Ré por serviços que alegadamente lhe foram prestados. Porém, da prova produzida também resultou claro que, em primeiro lugar, nunca existiu um contacto direto entre os legais representantes da Autora e da Ré ao longo destes supostos serviços (todas as testemunhas e os legais representantes das partes nas suas declarações o confirmam), sendo que estes contactos eram sempre intermediados por AA. Ora, tal como resultou do depoimento de CC, ex-colaborador da Ré num registo claro, muito espontâneo e objetivo, o que existia entre AA e a -- era uma parceria verbal, sendo este um freelancer. Esclareceu que nesta parceria, em que os lucros seriam repartidos na proporção de 85% para AA e 15% para a Ré, a última aceitava emprestar o seu nome para efeitos de faturação com a contrapartida acima referida, mas que os clientes eram de do primeiro. Este acordo foi de resto confirmado por AA e resulta evidenciado pela prova documental dos autos, nomeadamente os e-mails juntos pela Ré. Concretizando, destes e-mails, trocados entre as duas testemunhas (AA e CC) acima referidas decorre que não existia uma ligação direta entre a Ré -- e a -- e os demais clientes (doc. 10 junto com a oposição). Indiciam também que foram faturados serviços à Ré por parte da Autora que não foram recebidos pela primeira: terão porventura estes serviços e produtos sido prestados ou enviados a outras empresas clientes de AA que, não obstante, fez uso do nome da -- para efeitos de faturação ( doc. 17 junto com a oposição– que se trata de um e-mail enviado pelo TOC da Ré, alertando que não existe conciliação contabilística entre faturas lançadas pela Autora no portal das finanças e os alegados serviços prestados à Ré, sendo que estas faturas nem sequer terão sido recebidas pela última e doc. 18 junto com a oposição– em que AA admite que algo terá falhado ). Segundo AA e CC, isso dever-se-ia a uma organização financeira caótica da --; contudo com elevada probabilidade poderá prender-se com serviços prestados a outros clientes de AA ou à sua própria empresa (--), embora tendo sido faturados em nome da Ré. Acrescente-se a este propósito que tendo sempre a --pago durante um período de tempo considerável os serviços que lhe foram efetivamente prestados (conforme referiram a sócia gerente da Autora EE, o também sócio da Autora DD e CC, acima identificado), esta tenha deixado, a partir de certo momento, de liquidar as faturas respeitantes aos serviços que a Autora alega que foram prestados e não foram pagos; tudo apontando para que tais faturas não se prendam com a efetiva prestação de serviços por parte da Autora à Ré mas eventualmente com serviços prestados pela Autora a outros clientes de AA ou ao próprio. As comunicações acima mencionadas atestam ainda a existência de uma pareceria nos termos acima referidos, de que é exemplo o doc. 21 e 24 junto com a oposição bem como a circunstância de AA lidar de forma independente (e sem instruções) da Ré com os seus clientes, nomeadamente com a Autora. Por fim, de mencionar ainda os e-mails identificados no doc. 23 juntos com a oposição atestam uma vez mais que não existe uma correspondência entre os serviços prestados à --e as faturas que são emitidas pela --. As dúvidas quanto à existência de serviços prestados à Autora à Ré adensam-se pela circunstância de, pese embora, o convite de aperfeiçoamento endereçado pelo tribunal através do despacho de ...-...-2023, solicitando que a Autora procedesse à “Discriminação concreta de cada um dos trabalhos contratados, datas em que foram solicitados e preços de cada trabalho”, esta última ter-se limitado a fazer referência aos orçamentos que juntou aos autos para indicar esses trabalhos o que dificulta a tarefa de determinar os serviços que poderão efetivamente ter sido prestados à Ré e aqueles que poderão ter sido prestados a outras entidades e faturados apenas em seu nome. De resto, se é certo que resulta da análise da correspondência trocada entre AA e a Autora que este assinava muitas vezes os e-mails como “--” o que daria a entender a terceiros, nomeadamente à Autora, que este se tratava de um funcionário da Ré e que a representava para todos os efeitos, a verdade é que tal como referido anteriormente se extrai do depoimento de AA e de CC que entre estes existia entres estes uma parceria comercial, resultando também de forma clara que AA tinha autonomia e outros clientes a quem também pedia trabalhos. Dos depoimentos de DD (sócio e funcionário da --) EE (sócia gerente da Autora) e FF (funcionário da Autora) resultou que os serviços documentados nas faturas foram seguramente prestados à Ré e que os materiais eram entregues num armazém logístico que não pertencia à Ré (de referir que embora as guias de entrega destes materiais fossem emitidas em nome da Ré, estas guias não se encontram assinadas por algum responsável ou funcionário da última - veja-se neste sentido o doc. 38), o que nos faz duvidar uma vez mais que os materiais tenham sido entregues a esta empresa). Ora, sem prejuízo de não se ter tido estes depoimentos pouco credíveis, tendo-se, ficado pelo contrário até com a sensação de que estas testemunhas estavam convictas de que foram prestados serviços à Ré que não terão sido pagos, a verdade é que a inexistência de conciliação contabilística entre estas faturas e os serviços prestados, o facto de AA agir em nome próprio e ter apenas uma parceria com a Ré nos termos já retratados, a circunstância de AA ter sempre procurado impedir que os representantes da Autora e da Ré se conhecessem e contactassem diretamente ( conforme resulta dos e-mails – doc. 10 - juntos com a oposição e foi mencionado por CC), gera a dúvida sobre se as faturas cujo pagamento aqui se peticiona se prendem com serviços ou materiais prestados e enviados à Ré ou a outros clientes de AA que este abusivamente faturou em nome da Ré, salientando-se que este ( conforme admitido pelo próprio e por CC) constituiu uma empresa ( --) para exercer a sua atividade comercial, tendo sido precisamente a partir deste momento que começaram a existir as discrepâncias na conciliação entre as faturas emitidas em nome da Ré e os serviços que alegadamente lhe teriam sido prestados. Tudo isto levou a que o tribunal tenha ficado com dúvidas sobre a efetiva prestação de serviços por parte da Autora à Ré titulados pelas faturas juntas aos autos, dúvida que deve ser julgada em desfavor da primeira. -- Sintetizando estes juízos, podem ser assim apresentados: - O tribunal a quo analisou um conjunto alargado de provas, considerando inconclusiva a prova documental e valorando as declarações em juízo de CC, ex-colaborador da ré e do próprio AA, em detrimento das declarações e depoimentos de gerente e funcionários da autora; - Nesse contexto, considerou verdadeira a tese de facto de existência de uma parceria entre AA e a ré, parceria esta em que AA seria o empresário mais importante (pondo a ideia de modo simples), ficando com a parte de leão dos proveitos (85% de qualquer negócio) e apresentando-se a ré como mera entidade que se prestava a ceder o seu nome para efeitos de faturação, com o que receberia 15% dos proveitos dos negócios; - Que AA teria outros negócios do mesmo tipo com outras sociedades e que, nesse contexto, exorbitou a sua permissão, solicitando fornecimentos para si próprio, ou para sociedades terceiras, pedindo que a faturação fosse emitida sobre a ré sem qualquer correspondência num negócio real. Estes juízos, confrontados com o que acima se disse, trazem para o campo de uma maior racionalidade algo que, à partida, se afigurava incompreensível. De acordo com esta avaliação, teria sido AA, com vista a obtenção de vantagens, que teria sido o responsável por um erro de faturação. Em boa verdade, o tribunal a quo não conclui taxativamente pela existência de um tal erro, ou intenção, limitando-se a dizer, no final, que permanece uma dúvida sobre a efetiva prestação de serviços da autora à ré, decidindo-se em desfavor daquela. -- D – Os argumentos da recorrente: Começa esta por sustentar-se dizendo que as faturas objeto dos autos foram emitidas e enviadas na sequência de pedidos, orçamentos e adjudicações, o que resultaria dos documentos 16 a 39 junto aos autos. Aduz que todos os pedidos eram feitos pelo AA que assinava o email como: --. Fez-se uma análise de toda a prova documental, particularmente a apresentada com a oposição, o que ressalta da mesma é que AA se apresentava, de facto, como representante da ré. Isso decorre da referida assinatura como "--" mas, ainda mais, da própria caixa de correio de proveniência das comunicações – ..." Fica também claro do teor de vários documentos, referidos e não referidos pela recorrente, que o comportamento de AA era gerador de dúvidas, na medida em que solicitava faturação a diversas entidades, nem sempre sendo clara a sua atuação quanto aos serviços prestados e à sua imputação. Assim, veja-se, designadamente, a cópia de correio eletrónico entre AA e CC em que são refletidas dúvidas e até mal-estar pela emissão de faturas a uma tal sociedade --, aludindo-se também a desorganização, como teria acontecido em relação a outras sociedades, a -- e a -- (documento 2). O mesmo se vê, por exemplo, no documento n.º 8, relativamente a uma certa sociedade --. Particularmente elucidativo é o documento n.º 10 (também transcrito sob o n.º 26), contendo cópias de comunicações de correio eletrónico entre AA (provenientes da caixa de correio supra referida e assinando também nos termos referidos) e GG, que é especificamente relativo às relações comerciais entre a ré e a autora, cujo teor se transcreve nos seus elementos mais salientes: Comunicação de AA: Olá GG, Temos de pagar o que devemos à --, pois a relação está a complicar-se, com este nosso fornecedor com quem trabalho faz mais de 25 anos. Dizem-me que só de 2021 há estas faturas que aguardam pagamento. Identifiquei todas, e agradeço-te que confirmes se é verdade, e resolvas o mais rápido possível, pois estou numa relação de merda, com a -- por causa disto. - Fatura nº 90 ----- 455.10€ - fatura -- 364 - “ “ 107 -----8548.50€ - fatura -- 373 - “ “ 108 ------1047.96€ - fatura -- 374 - “ “ 123 ------- 934.80€ - fatura -- 383 - “ “ 124 -------238.62€ - fatura -- 381 - “ “ 126 ------1141.44€ - fatura -- 380 - “ “ 173 ------3264.42€ - fatura -- 401 - “ “ 177 --------713.40€ - fatura -- 400 - “ “ 201 -------867.15€ - fatura -- 417 - “ “ 202 -------147.60€ - fatura -- 417 - “ “ 210 -------831.48€ - fatura -- 423 - “ “ 218 -------163.59€ - fatura -- 420 - “ “ 224 -----12 287.70€ - fatura -- 421 - “ “ 225 ---------380.07€ - fatura -- 432 - “ “ 240 ------ 1 782,27€ - fatura -- 421 - “ “ 253 ----------874.53€ - fatura -- 439 Resposta de GG: Os nossos clientes pagam, e a -- sabe disso pois conhece-os, e somos pessoas sérias, não há nenhuma justificação. " fim de citação! A --- tem mais sorte que eu pois conhece os nossos clientes e eu ao fim deste tempo todo ainda não. Nem fornecedores nem clientes (com excepção da --) Também tens razão quando afirmas que somos pessoas sérias. A -- paga a todos tudo o que deve. Basta olhar para o que facturaste nesta parceria e os trabalhos que tu ( através da --) deste a fazer. Como diz o outro é só fazer as contas. Só não concordo quando dizes que não há nenhuma justificação em relação á --. Tens muitos emails meus , teus, sobre a e tudo o que se passou/ passa com a desorganização da --. Infelizmente já li que na -- e em outras organizações é que há organização na -- pelos vistos não. Depois de tudo o que se passou com a não há justificação para o que se está a passar? Fico ainda incrédulo quando escreves sucessivamente que a tua relação com a está a complicar-se, a deteriorar-se , que se está a transformar numa relação de merda por causa de mim ou da --. Uma relação que existe há tanto tempo, que passou ( segundo o que me contaste) pela falha de pagamentos da -- , está assim tão "na merda" quando apesar de tudo o que foi dito e escrito no dia ... envias um email para facturar á -- 11K e o trabalho foi feito pela ? Aliás enviaste recentemente facturas da no valor de 18k ( já sei porque eles trabalham bem , porque estão sempre disponíveis, porque são os melhores e mais baratos). Andas a ser "massacrado" ( palavras tuas) pela porque a -- não pagava, depois evoluímos para o paga mas aos "bochechos" e mesmo assim mais 18k para a --?! (...) Como te disse sempre e escrevi a -- paga aos seus fornecedores. Pagou desde o inicio desta parceria sempre ao -- os 85% sobre a margem de lucro , os trabalhos do -- e a todos os outros fornecedores que tu trouxeste contigo (...) -- As diversas comunicações de correio eletrónico, não impugnadas (a transcrita será apenas especialmente elucidativa e relativa especificamente a faturas em dívida à autora), só por si, ainda sem qualquer consideração das declarações e testemunhos em juízo, permitem estabelecer, de forma inequívoca, alguns juízos probatórios. Assim: a. Deve considerar-se confirmada a existência de uma relação contratual entre a autora e a ré, prolongada no tempo; b. Que, nessa relação contratual, AA apresentava-se como agente da ré, em seu nome solicitando prestação de serviços; c. Que houve efetiva prestação de serviços nesse âmbito, faturados pela autora à ré e objeto de pagamento; d. Que AA recebia nesses negócios uma comissão sobre a margem de lucro; e. Que AA atuava no mercado também como agente ou mediador noutros negócios, com outras sociedades; f. Que AA afastava contactos diretos entre as sociedades prestadoras e beneficiárias de serviços; g. Que essa atuação é compatível com o comportamento de um mediador/comissionista (que ficaria sem a sua margem se as empresas passassem a contratar diretamente entre si); h. Que as empresas prestadoras de serviços, neste caso a autora, necessariamente aceitavam essa forma de fazer negócio, porque se foi mantendo (até dar origem, pelo menos, a este litígio). Até este ponto de análise não se pode sequer dizer que estas conclusões se desviem do que foi decidido a quo e, portanto, também não se pode dizer que a impugnação da decisão tenha grande efeito útil, podendo, quanto muito, ter pertinência enquanto elemento de contexto. Em termos simples, a ré não pode dizer que não conhecia a autora ou que nunca negociou com ela. Houve uma relação contratual, prolongada por tempo não apurado, sempre mediada por AA, com emissão de faturas por serviços prestados e pagamentos efetuados. Neste ponto nada mais há a apreciar. A questão probanda, devidamente identificada, não é esta. É saber se aqueles concretos bens e serviços, documentados naquelas concretas faturas (as referidas no requerimento de injunção e depois na petição aperfeiçoada), foram efetivamente fornecidos pela ré à autora, uma vez que é certo que pagos não foram. Chegando a este ponto, as dúvidas são outras. Deve assinalar-se, em primeiro lugar, que não consta de qualquer correio eletrónico enviado por AA alguma referência que descreva este rol de faturas, havendo as mais diversas referências a faturas por pagar. Existem, em todo o caso, coincidências parciais a números de fatura referidos na petição e em correios eletrónicos (fatura n.º 90). Pode dizer-se, considerando que AA atuou como representante da ré, que esta reconheceu nestas comunicações de correio eletrónico ser devedora de valores documentados em faturas, mas não mais que isso (isto que é, que seja devedora destas faturas). Importa, portanto, saber que prova existe da solicitação e prestação destes concretos serviços. A alegação da autora é, a este propósito, meramente remissiva para o teor de documentos e, portanto, não contém expressa e substanciada indicação dos concretos bens fornecidos e serviços prestados, nem do valor convencionado para os mesmos. A autora alega apenas a existência de faturas (que descreve por número e valor) e que a sua emissão decorreu da elaboração e envio à ré de orçamentos relativos aos serviços a prestar. Assim, a título de exemplo, alega que emitiu a Factura n.º 90 de .../.../2021 no valor de € 455,10 (cuja cópia anexou como documento n.º 2 à petição inicial) e alega que para tal fatura n.º 90 foi remetido o orçamento n.º 2171. que se junta como doc. 17 e adjudicado através de email de .../.../2021, que se junta como doc. 18. que se dá integralmente reproduzido. Analisando o teor destes documentos, verifica-se que o orçamento (documento n.º 17) descreve um conjunto de produtos, com indicação de tipo, quantidade e valor (o primeiro da lista, a título de exemplo, será "impressão em autocolante lagartixa poliester com laminação mate no formato de 39x42cm, com corte especial e embalados aos 5ex. - 750 unidades – 2365€), constando como dirigido a "-- – AA". Verifica-se também que AA, a partir da referida caixa de correio "-- gmail" respondeu "vamos avançar com este trabalho". Esta forma de relacionamento comercial repete-se em todos os trabalhos descritos nas faturas objeto dos autos e permite estabelecer um segundo juízo probatório seguro, que se refere já não apenas à existência de uma relação contratual continuada, mas aos concretos fornecimentos objeto dos autos. Assim, AA, apresentando-se claramente como agente ou representante da ré, solicitava um orçamento para um determinado trabalho, correspondente a material gráfico e publicitário. Na sequência dessa solicitação, a autora emitia e enviava, por correio eletrónico, o orçamento solicitado e AA procedia à respetiva aceitação, sempre por esse meio de comunicação. Nesta sequência de procedimentos as faturas eram (e foram) emitidas. – -- Chegando a este ponto de análise, a margem de dúvida circunscreve-se ainda mais. Fica estabelecido que, a despeito de uma manifesta confusão na atuação de AA, que aparecia como um agente no mercado capaz de fazer solicitações de serviços para diversas entidades, existiu uma relação contratual prolongada no tempo entre autora e ré, sempre mediada por esta pessoa. Que o mesmo, apresentando-se como representante da ré, solicitou a prestação dos trabalhos objeto dos autos, primeiro pedindo uma discriminação dos bens a fornecer e respetivo preço e depois declarando expressamente aceitar a sua realização. A dúvida passa a circunscrever-se apenas a saber se os serviços gráficos foram efetivamente prestados e os bens a fornecer foram efetivamente entregues à ré. Este é o nó górdio da questão de facto. – -- Nos termos supra referidos, o tribunal desvalorizou a única prova existente sobre a efetiva produção e entrega dos produtos objeto dos autos. Identificada a questão em apreço nestes termos, retomando o juízo inicialmente apresentado sobre a normalidade social, terá que se concluir que esta se estende também ao ato de emissão de faturas e, nesse contexto, transferir-se-ia para a completa atipicidade a atuação da própria autora. Quer isto dizer que seria algo absolutamente desconforme com a normalidade dos negócios que uma sociedade, num contexto de uma relação comercial continuada, ante uma encomenda de produtos, os viesse a faturar e depois a exigir pagamento sem os ter produzido e entregue, nos termos habitualmente praticados. Essa atipicidade teria que ser, em princípio, associada a algum quadro explicativo anómalo, algo que não foi sequer alegado e, por consequência, não está refletido na decisão. Detendo a atenção na motivação da sentença, diz-se aí a este proposto, repescando os segmentos relevantes, o seguinte: Dos depoimentos de DD (sócio e funcionário da --), EE (sócia gerente da Autora) e FF (funcionário da Autora) resultou que os serviços documentados nas faturas foram seguramente prestados à Ré e que os materiais eram entregues num armazém logístico que não pertencia à Ré (de referir que embora as guias de entrega destes materiais fossem emitidas em nome da Ré, estas guias não se encontram assinadas por algum responsável ou funcionário da última - veja-se neste sentido o doc. 38), o que nos faz duvidar uma vez mais que os materiais tenham sido entregues a esta empresa). Ora, sem prejuízo de não se ter tido estes depoimentos pouco credíveis, tendo-se, ficado pelo contrário até com a sensação de que estas testemunhas estavam convictas de que foram prestados serviços à Ré que não terão sido pagos, a verdade é que a inexistência de conciliação contabilística entre estas faturas e os serviços prestados, o facto de AA agir em nome próprio e ter apenas uma parceria com a Ré nos termos já retratados, a circunstância de AA ter sempre procurado impedir que os representantes da Autora e da Ré se conhecessem e contactassem diretamente ( conforme resulta dos e-mails – doc. 10 - juntos com a oposição e foi mencionado por CC), gera a dúvida sobre se as faturas cujo pagamento aqui se peticiona se prendem com serviços ou materiais prestados e enviados à Ré ou a outros clientes de AA que este abusivamente faturou em nome da Ré, salientando-se que este ( conforme admitido pelo próprio e por CC) constituiu uma empresa ( --) para exercer a sua atividade comercial, tendo sido precisamente a partir deste momento que começaram a existir as discrepâncias na conciliação entre as faturas emitidas em nome da Ré e os serviços que alegadamente lhe teriam sido prestados. Tudo isto levou a que o tribunal tenha ficado com dúvidas sobre a efetiva prestação de serviços por parte da Autora à Ré titulados pelas faturas juntas aos autos, dúvida que deve ser julgada em desfavor da primeira. Os juízos de prova foram, portanto, os seguintes: a. Não existe uma certeza sobre a efetiva prestação de serviços (este grau de certeza é subjetivo e respeitante ao julgador de 1.ª instância, ainda que objetivado nos elementos de avaliação convocados); b. Tal incerteza decorre de várias dificuldades, em primeiro lugar da posição negocial de AA; c. Depois da falta de conciliação contabilística de faturas; d. Decorre também de os produtos terem sido entregues, assumidamente, num armazém logístico que não é da ré; e. E de as guias de transporte, emitidas em nome da ré, não permitirem estabelecer tal certeza, por não estarem assinadas por alguém ligado a esta; f. Que as declarações e depoimentos prestados em juízo (por representante da autora e testemunhas ligadas a esta), mesmo afigurando-se sinceros e convictos, também não afirmam essa certeza (presume-se que por enfermarem de um erro de perceção e não de uma intenção de faltar a verdade). Estes juízos ligam-se à valorização dos depoimentos de CC e de AA, para afastar a prova da efetividade dos fornecimentos. -- Procedendo à sua reanálise em sede de recurso, terá que se dizer que são juízos conclusivos que não se podem sustentar. Começando pela negativa, quer o depoimneto de AA, o referido mediador de negócios, quer o de CC, antigo funcionário da ré, em algum momento põem em causa a existência destes concretos fornecimentos. O teor do que depuseram refere-se, no caso de CC, à confusão (hoc sensu) do relacionamento contratual que envolvia AA, com faturação a diversas entidades e não mais que isso. O que decorre deste depoimento e dos referidos documentos relativos a comunicações eletrónicas mantidas entre esta testemunha permite até retirar a conclusão contrária – que existiu um relacionamento comercial prolongado entre sociedades, mediado por AA, ainda que a posição deste fosse fluida (no sentido de aparecer como mediador de negócios de diversas empresas). No caso de AA, com direto conhecimento e participação, o que resulta é também o mesmo – a assunção de uma posição de representação comissionista. Quanto aos concretos negócios, ainda que GG se apresente como antigo funcionário da ré (algo que não se pode sequer dizer que esteja confirmado) e AA como seu representante de negócios, ambos estão numa posição em que, por via direta ou indireta, lhes pode ser conveniente não assumir a existência desta dívida, por poderem ter a perceção de virem a ser responsabilizados pela mesma. Estão ambos, se não numa posição de interesse imediato, pelo menos numa posição de pretender afastar uma responsabilidade pelos negócios objeto destes autos. Partir destes depoimentos para desconstruir completamente a prova de concreta produção e entrega de bens, cujo fornecimento fora solicitado, não se afigura um raciocínio logicamente sustentável. Do lado positivo, é a própria motivação da decisão que valoriza as declarações e depoimentos de DD, EE (sócia gerente da Autora) e FF, única prova existente nos autos que se pronunciou especificamente quanto a este ponto (o fornecimento efetivo dos bens descritos nas faturas dos autos). Aduz ainda a referência expressa à existência de guias de transporte de mercadoria emitidas pela autora, em nome da ré, relativas ao movimento das mercadorias para entrega em armazém. A este nível também não se afigura sustentável retirar eficácia à prova existente devido à inexistência de assinatura das guias de transporte ou de a entrega não se ter concretizado em instalações da ré (mas em armazém logístico). Diga-se, a propósito, que se infere também dos documentos dos autos (as referidas comunicações eletrónicas) que o cliente final dos produtos fornecidos não será, ou pelo menos não será em todos os casos, a própria ré (a título de exemplo, no correio eletrónico referido nos documentos 10 e 26 da oposição é referido o "canal hollywood"), o que pode explicar esse sistema de entrega e a ausência de um documento comprovativo de receção, assinado pela ré. A falta de conciliação de faturas, sendo relativa a uma prática contabilisticamente adequada, também não pode ser um elemento decisivo para pôr em causa a única prova existente sobre os fornecimentos – os referidos depoimentos e declarações. -- Em conclusão, resumindo o caminho percorrido, deve dizer-se: a. Que não se pode sequer considerar controvertida a existência de uma relação contratual entre autora e ré, mediada por AA e que, mesmo que tal se considerasse, a simples prova documental relativa a comunicações eletrónicas mantidas dá suporte à mesma; b. Que os fornecimentos objeto dos autos foram solicitados à autora, por AA, apresentando-se este como representante da ré, – algo que se retira diretamente das comunicações eletrónicas referidas; c. Que a autora elaborou orçamentos e enviou-os a AA que, também aí se apresentando como representante da ré, declarou aceitá-los – idem quanto ao meio de prova pertinente; d. Que a produção e entrega dos produtos faturados constitui a situação comercialmente típica e esperada, não havendo nenhum elemento nos autos que a infirme (que não umas alusões gerais à posição dúbia de AA, enquanto agente de mercado); e. Que a única prova do fornecimento e entrega resulta dos depoimentos das testemunhas referidas, corroborado pelas declarações da gerente da autora e, mesmo que se desqualifiquem estas pelo seu interesse na causa, é a própria decisão recorrida que valoriza os testemunhos, que se afiguram inequivocamente espontâneos e credíveis; f. A simples existência de faturas e guias de transporte, ante a inexistência de alegação ou demonstração de qualquer abuso ou má-fé da autora, torna-se, neste quadro probatório, algo de perfeitamente coerente. O inverso, i.e., uma emissão de faturas e guias de transporte sem conexão com algum fornecimento é que seria algo de social e comercialmente anómalo. Tudo visto, conclui-se, em sentido divergente do decidido em 1.ª instância, pela prova da matéria relativa aos fornecimentos, o que se decide. -- E – A decisão de facto alternativa: A despeito do que ficou dito, a decisão alternativa não pode traduzir-se na simples migração dos factos dados por não provados para os provados. É, aliás, a própria recorrente que admite que AA interveio como representante, dizendo que "representava para efeitos comerciais" (a ré), mas não põe em causa a conclusão de não ser funcionário desta. Diga-se, como se foi expressando, que a posição deste AA não se mostra juridicamente evidente, podendo ser referida por uma expressão compreensiva, que podendo até remeter para conceitos jurídicos, não deixa de ter uma ressonância factual adequadamente explicativa – a de mediador de negócios ou comissionista. Também o facto, dado por não provado, relativo à inexistência de um acordo direto entre autora e ré deve ser mantido, sendo claro que o relacionamento comercial foi sempre mediado por AA. Assim, mantendo-se os factos provados n.º 1 e 2, serão aditados aos factos provados os seguintes: 3. A ré, por meio de AA, que atuava habitualmente em seu nome como mediador de negócios e comissionista, solicitou à autora a realização dos trabalhos descritos nas supra referidas faturas; 4. A Autora prestou os serviços gráficos e publicitários e forneceu os materiais titulados pelas faturas identificadas no ponto 1 dos factos provados à Ré que não foram pagas por esta. Os factos não provados passarão a ter o seguinte teor: i) A Autora e a Ré acordaram diretamente no fornecimento de serviços e artigos gráficos e publicitários. ii. AA era funcionário da Ré. -- F. Fundamentação de facto – apresentação agregada: Assim, compaginando os elementos supra referidos, a decisão de facto passará a ter o seguinte teor completo: Factos provados: 1. No exercício da sua atividade comercial, a Autora emitiu várias faturas em nome da Ré com vista ao pagamento de quantias relativas a serviços e produtos gráficos: - Factura n.º 90 de .../.../2021 no valor de € 455,10; - Factura n.º 124 de .../.../2021 no valor de € 238,62; - Factura n.º 126 de .../.../2021 no valor de € 1.141,44; - Factura n.º 202 de .../.../2021 no valor de € 147,60; - Factura n.º 210 de .../.../2021 no valor de € 831,48; - Factura n.º 274 de .../.../2022 no valor de € 3.525,18; - Factura n.º 290 de .../.../2022 no valor de € 6.463,65; - Factura n.º 301 de .../.../2022 no valor de € 3.462,45; - Factura n.º 302 de .../.../2022 no valor de € 3.008,58; - Factura n.º 331 de .../.../2022 no valor de € 10.392,27; - Factura n.º 333 de .../.../2022 no valor de € 5.105,73; - Factura n.º 335 de .../.../2022 no valor de € 2.717,07; - Factura n.º 416 de .../.../2022 no valor de € 1.172,19; - Factura n.º 462 de .../.../2022 no valor de € 1.276, 74. 2. Por carta datada de ... de ... de 2023, a Autora comunicou à Ré o seguinte: Pela n/ representada supra referenciada, recebi o encargo de proceder ao necessário para obter a boa cobrança da quantia V. Exas. são devedores no valore de € 39.938,10, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento. A fim de evitar os incómodos despesas que sempre resultam do tratamento judicial destas questões, solicito que procedam à liquidação daquele débito, no prazo de 5 dias a contar da data da recepção desta carta. (…)” 3. A ré, por meio de AA, que atuava habitualmente em seu nome como mediador de negócios e comissionista, solicitou à autora a realização dos trabalhos descritos nas supra referidas faturas; 4. A Autora prestou os serviços gráficos e publicitários e forneceu os materiais titulados pelas faturas identificadas no ponto 1 dos factos provados à Ré que não foram pagas por esta. Factos não provados: i) A Autora e a Ré acordaram diretamente no fornecimento de serviços e artigos gráficos e publicitários. ii. AA era funcionário da Ré. --- II.IV. Recurso de direito: Decorre do acima exposto que está estabelecida a existência de uma relação contratual, pode esta ser referida estritamente como uma compra e venda comercial, ou fornecimento strictu sensu, ou como um contrato misto, que envolve prestação de serviços de desenho e elaboração de material gráfico e publicitário, com subsequente venda do mesmo (cf., a propósito de situações contratuais de tipo misto no âmbito de relações comerciais, acórdão do STJ de 15/1/2013 – FONSECA RAMOS. Para o caso, a questão da qualificação do contrato não se apresenta como decidenda – o que cumpria apreciar era controvérsia de facto relativa à existência de uma relação contratual entre as partes, algo que se esgotou na avaliação anteriormente feita. O que subjaz, a nível jurídico, é apenas uma aplicação direta do princípio pacta sunt servanda, consagrado como regra concreta no art.º 406.º do Código Civil (CC), por serem imputáveis à ré os negócios realizados em seu nome por AA. Para o enquadrar juridicamente deve referir-se a figura do gerente de comércio, tratada no art.º 248.º do Código Comercial: - É gerente de comércio todo aquele que, sob qualquer denominação, consoante os usos comerciais, se acha proposto para tratar do comércio de outrem no lugar onde este o exerce ou noutro qualquer. Diz BB que o gerente de comércio é uma modalidade de mandatário comercial, que tem um mandato geral e trata e negoceia em nome do seu proponente.3 Esta disposição legal é suficientemente aberta para considerar a existência de um vínculo representativo eficaz numa pluralidade de atuações no mercado, incluindo o comportamento apurado nestes autos – encomenda de serviços e bens, em nome de uma sociedade, sem indicação de um estabelecimento comercial de suporte local dos negócios. Diz o art.º 250.º que o gerente trata e negoceia em nome de seus proponentes; nos documentos que nos negócios deles assinarem devem declarar que firmam com poder da pessoa ou sociedade que representam. Estes atos de declaração e assinatura, transpostos de 1888 para o final do primeiro quartel do século XXI, devem ser interpretados com atualidade, abarcando a simples inclusão de identificação e assinatura em comunicações de correio eletrónico, como se verifica nos autos, prática associada a uma ligação comercial continuada no tempo. A ré apresenta-se, assim, como proponente de negócios e AA como seu proposto (a propósito veja-se ac. Relação de Guimarães de 22/11/2018 – JOAQUIM BOAVIDA4 O mandato deste gerente, diz o art.º 249.º ainda deste diploma, pode ser conferido verbalmente ou por escrito e, quanto à sua extensão presume-se geral e compreensivo de todos os actos pertencentes e necessários ao exercício do comércio. O proponente fica obrigado sem que possa opor a terceiros limitação alguma dos respectivos poderes, salvo provando que tinham conhecimento dela ao tempo em que contrataram (algo que nem sequer a ré invoca). Quer isto dizer que a ré se obrigou, perante a autora, no pagamento de do preço de sucessivos fornecimentos ou compras e vendas mercantis, que, incumprindo, dão lugar à respetiva condenação (cf. art.º 463.º &1.º do Código Comercial e 874.º do Código Civil) Não estando também em causa a emissão das faturas, designadamente no que concerne às respetivas datas, será também a ré-recorrida responsável por indemnização moratória correspondente a obrigações comerciais, nos termos peticionados. É o que se decide, concedendo-se a apelação. -- --- III. Decisão: Face ao exposto, concede-se a apelação e decide-se revogar a decisão de 1.ª instância e condenar a ré no pagamento à autora da quantia de €45.296,89 (quarenta e cinco mil duzentos e noventa e seis euros e oitenta e nove cêntimos), a que acrescem juros de mora à taxa legal devida para operações comerciais, vencidos e vincendos, desde a propositura da ação e até integral pagamento. Custas pela recorrida ré, sem dispensa de taxa remanescente. Notifique-se e registe-se. – --- Lisboa, 20 de novembro de 2025 João Paulo Vasconcelos Raposo Pedro Martins Laurinda Gemas _______________________________________________________ 1. 0004400065.pdf 2. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 3. Direito Comercial, 5.ª ed., Almedina 2025, p. 289. 4. https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/8fa6061f23b977c78025837800339df1?OpenDocument |