Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
235/22.4T8CBC.G2
Relator: PEDRO CUNHA LOPES
Descritores: PRAZO DE PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DA COIMA
REQUERIMENTO DE PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES
TEMPESTIVIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CONTRA-ORDENACIONAL
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
1 - O prazo de pagamento da coima previsto no art.º 88º/1 e 2), D.L. n.º 433/82, 27/10, não está de acordo com o agora previsto no art.º 29º/1 R.C.P.
2 - Aquele primeiro normativo foi, assim, tacitamente revogado pelo segundo, devendo agora o pagamento da coima ser feito nos dez dias posteriores à notificação da conta e não nos dez dias contados do trânsito em julgado da decisão.
3 - O arguido pode requerer o pagamento da coima em prestações nos dez dias posteriores à notificação da conta.
4 - Com efeito, e ao contrário do que dispunha o referido art.º 88º/1 e 2), D.L. n.º 433/82, até esse momento está na fase de pagamento voluntário, como dispõe o atual art.º 29º/1 R.C.P."
Decisão Texto Integral:
2 - Decisão Sumária

- Tribunal Recorrido – Juízo de Competência Genérica de ...
- Proc.º 235/22.4T8CBC.G2
- Recorrente –  AA (Arguido)
- Recorrido  - M.P.
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Por decisão proferida nestes autos em 6 de Outubro de 2 023, foi proferida a seguinte decisão, quanto a requerimento do arguido para pagamento da coima em prestações:
- foi indeferido o requerimento do arguido, por o mesmo ter sido considerado extemporâneo, por ultrapassado o prazo de pagamento voluntário da coima previsto no art.º 88º/1, D.L. n.º 433/82, 27/10.
É desta decisão que o arguido recorre, para este Tribunal da Relação.
Considera-se que o recurso deve ser decidido por decisão sumária do relator, por o mesmo ser claramente procedente – arst.º 417º/6, d),  C.P.P.
Aliás, no sentido da procedência do recurso se pronunciaram também, quer o M.P. em 1ª instância, quer a Dignm.ª Senhora Procuradora Geral Adjunta já neste Tribunal da Relação.
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Da Tempestividade do Requerimento para Pagamento da Coima em Prestações, Formulado pelo Arguido

Como se sabe, o objeto do processo é definido pelas conclusões do recurso apresentado (cfr. A.F.J. n.º 7/95, 19/10/95, D.R., 1ª Série A, publicado em 28/12/1 995), excetuando as questões relativas à nulidade da sentença (art.º 379º/1 e 2), C.P.P.) e aos vícios da decisão previstos no art.º 410º/2 C.P.P., que prevê a revista alargada.
Ora, a questão posta no presente recurso é, única e exclusivamente, esta: a de saber se o arguido requereu o pagamento da coima em que se mantém condenado, tempestivamente.
E, efetivamente, diz o art.º 88º/1 e 2), D.L. n.º 433/82, 27/10, que o pagamento das coimas em que os arguidos foram condenados deveria ser feito no prazo de 10 (dez) dias, contado do trânsito da decisão. Esse pagamento poderia ser feito na Secretaria do Tribunal que tivesse proferido a decisão, contra entrega do respetivo recibo.
Deve porém lembrar-se que este diploma entrou em vigor efetivamente, ainda na vigência do anterior C.P.P. de 1 929 e do C.C.J. então em vigor.
Neste momento, está em vigor e quanto à matéria de custas e pagamentos, o R.C.P. imposto pelo D.L. n.º 34/08, 26/2, na sua versão atualizada.
Nos termos deste diploma, vigente agora e à data do trânsito em julgado da decisão, a conta ou liquidação das custas em Processo Crime deve ser feita em 10 (dez) dias, após o trânsito em julgado da decisão final – art.º 29º/1, R.C.P.
Nos termos ainda do referido no art.º 31º/1 do mesmo diploma, a conta é notificada ao M.P., mandatários ou partes para que, no prazo de 10 (dez) dias possam pedir a reforma, reclamação da conta ou efetuar o pagamento.
Estando em causa quantias de valor superior ao 10 (dez) U.C.`s, os pagamentos são sempre feitos , por meios eletrónicos – o que naturalmente, implica a emissão de uma guia, com menção do montante a pagar e da respetiva referência para pagamento.
O que só pode querer dizer, que o referido art.º 88º/1 e 2) foi já tacitamente revogado, pois atualmente só de ser feito por meios eletrónicos – e não na Secretaria, contra recibo – e depois de realizada essa conta, feita a sua notificação e enviadas as referidas guias para pagamento. O pagamento deve ser feito, como se disse, no prazo de 10 (dez) dias, contados do recebimento pelo arguido ou seu mandatário, desta notificação.
O que, aliás aconteceu e está bem documentado nos autos.

Veja-se assim, que:
- depois de remetidos os autos à 1ª instância é proferido despacho em 11/9/23, mandando os autos à conta – ref.ª ...05;
- a conta, liquidação e guias para pagamento são efetuadas em 21/9/23 – refs.ª ...74, ...21 e ...75;
- as notificações para pagamento são enviadas em 21/9/23, ao arguido e seu mandatário e com o prazo de 15 (quinze) dias, para esse efeito – refs.ª ...68... e ...26....
- consta das guias para pagamento emitidas, que este deve ser feito até ../../2023 – ref.ª ...68.

O requerimento em que o arguido pede o pagamento da coima em prestações dá entrada em Tribunal em 28/9/23, logo em pleno prazo voluntário de pagamento, que podia ocorrer até ../../2023.
Ou seja, os próprios autos dão a conhecer que o pagamento já não pode ser feito nos termos do disposto no art.º 88º/1 e 2), R.G.C.O., sendo também claros no sentido da tempestividade do requerimento para pagamento da coima em prestações, pois quer esta, quer as custas em dívida estavam ainda em pleno prazo de pagamento.
O requerido pagamento em prestações não pode assim ser indeferido por extemporâneo, como se decidiu na decisão recorrida, que deve pois ser revogada, apreciando-se o pedido feito pelo recorrente.
Dada a clareza da situação, a decisão deve ser sumária e proferida apenas pelo Juiz relator do recurso apresentado – art.º 417º/6, d), C.P.P.
A decisão de condenação proferida é parca na descrição da concreta situação económica do arguido requerente, mas permite, ainda assim, a decisão do requerido.
Sabe-se que é Empreiteiro por conta própria, vive em casa própria não pagando empréstimo bancário e reside com dois filhos, de 22 (vinte e dois) e 18 (dezoito) anos de idade, ambos estudantes.
O filho mais novo está a fazer um tratamento ortodôntico, que excede os 3 500€ (três mil e quinhentos euros) de custos.
O facto de ser Empreiteiro e viver em casa própria permite reter que viverá pelo menos um pouco acima dos mínimos, devendo porém ter-se em conta que tem ainda dois filhos a estudar e que suportar as respetivas despesas e que o filho mais novo está a fazer um tratamento dentário dispendioso.
Passou também já algum tempo sobre o tempo do trânsito em julgado da decisão, devendo assim o arguido ter-se prevenido de modo a fazer este pagamento, que não surge agora como imprevisto.
Estão em causa o pagamento de 2 500€ (dois mil e quinhentos euros) de coima e de 102€ (cento e dois euros) de custas (taxa de justiça).
Tudo considerado, defere-se parcialmente o requerido, permitindo-se que o arguido recorrente pague a coima em que foi condenado em 10 (dez) prestações mensais e sucessivas, a vencer no último dia de cada mês, sendo que, não paga uma se vencerão as restantes (art.º 88º/5, “in fine”, D.L. n.º 433/82, 27/10) – e com início já, em Julho próximo.
Com a primeira prestação devem ser pagas as custas.
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Termos em que,

3 – Decisão

a) se declara procedente o recurso interposto pelo arguido AA, por via disso se revogando o despacho que indeferiu o seu requerimento para pagamento da coima em prestações, por extemporâneo;
b) apreciando-se agora o requerimento apresentado, defere-se parcialmente o requerido pagamento da coima em prestações, permitindo-se que o arguido recorrente pague a coima em que foi condenado em 10 (dez) prestações mensais e sucessivas, a vencer no último dia de cada mês, sendo que, não paga uma se vencerão as restantes –  com início já, em Julho próximo.
c) Com a primeira prestação, devem ser pagas as custas em dívida.
d) Sem custas – já que, no recurso interposto, apenas se pediu a revogação do despacho que julgou o requerimento para pagamento da coima em prestações, como extemporâneo.
e) Notifique.
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Guimarães, 21 de Junho de 2 024

(Pedro Miguel da Cunha Lopes)