Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANIZABEL SOUSA PEREIRA | ||
Descritores: | ACÇÃO DE PREFERÊNCIA VALOR VENDA CONJUNTA DE IMÓVEIS ARBITRAMENTO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 06/27/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I - Quanto ao critério a recorrer para determinar o valor da ação de preferência, a questão já se encontra dirimida com posição francamente maioritária na doutrina e na jurisprudência: é o constante do artigo 301º, nº 1, do Código de Processo Civil. II- Em caso de venda conjunta de imóveis por preço global, permitida pelo nº1, do artigo 417º, do Código Civil, pretendendo o preferente exercer o seu direito apenas relativamente a algum ou alguns dos bens integrados no conjunto, o preço (e o valor a atribuir à causa) será o que efetiva e proporcionalmente lhe competir dentro do preço global fixado para a venda conjunta; III- É por arbitramento que, na ação de preferência, se há de determinar o preço real e proporcional desses prédios a preferir, por referência ao preço global para a venda conjunta. IV- Para se aferir desse preço real e proporcional tem de se determinar a avaliação de todos os prédios que integram a venda conjunta, para efeitos de se aferir o valor real (de mercado) dos mesmos, e depois, tendo em conta esse valor real, de mercado, de todos esses prédios, determinar qual o peso, no preço global da venda conjunta, que o prédio que o preferente pretende preferir tem nesse preço global. | ||
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Decisão Texto Integral: | Relatora: Anizabel Sousa Pereira Adjuntas: Elisabete Coelho de Moura Alves e * ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:* I- Relatório:EMP01..., LDA, NIPC ...61, veio intentar acção declarativa na forma de processo comum contra AA, NIF ...16, e esposa BB, NIF ...88, e contra EMP02..., SA, NIPC ...99, tendo dado o valor de € 65.980,00 (Valor da fracção acrescido do valor de rendas já pagas à 2ª Ré, e cuja restituição se requereu supra - Art. 301º/1 e 297º/2 do CPC) à ação. Alega, em síntese, que é arrendatária de uma fracção. O seu senhorio, o 1.º réu, comunicou-lhe que ia vender 4 fracções autónomas, incluindo a arrendada à autora. No entanto, o réu informou-a de que, a exercer o direito de preferência, teria de ser na globalidade do negócio, pois a venda isolada da sua fracção causava-lhe prejuízo. Todavia, esta alegação é infundada, razão pela qual a autora vem intentar a presente acção de direito de preferência previsto no art. 1091.º, do CC (a segunda ré sociedade foi quem comprou as 4 fracções, sendo actualmente a sua nova senhoria). Termina pedindo o seguinte: NESTES TERMOS e nos melhores de Direito, a Autora requer a V. Exa. que a presente acção seja julgada procedente por provada e, em consequência: A) Declarar-se a existência do direito de preferência da Autora relativamente à fracção ..., pelo preço de € 64.000,00, e que tal direito foi legitimamente exercido, nos termos supra expostos. B) Declarar-se que a Autora é a legítima proprietária da fracção ..., com efeitos retroactivos à data da aquisição por parte da 2ª Ré, e ordenando-se a inscrição da Autora como proprietária da fracção na competente descrição predial, com o consequente cancelamento da inscrição a favor da 2ª Ré. C) Condenar-se a 2ª Ré a restituir à Autora a posse da fracção, bem como as rendas já pagas, no valor de € 1.980,00, bem como as demais rendas que vierem a ser pagas pela Autora à 2ª Ré, acrescidas de juros de mora a contar do respectivo pagamento por parte da Autora, até à sua restituição, em valor a liquidar em execução de sentença. Citada, a ré EMP02..., SA, veio contestar alegando, em síntese, que só aceitou comprar as 4 fracções em conjunto uma vez que só assim tal negócio era rentável financeiramente. Além do mais, o pedido de restituição de rendas não tem fundamento. Citados, ambos os RR apresentaram contestação e além do mais, os segundos réus vieram contestar alegando, em síntese, a existência de prejuízo apreciável caso a venda não fosse conjunta. Por outro lado, alega que a autora pagou-lhe parcialmente o valor das rendas, pelo que deduz reconvenção nesse sentido, ao que a que atribuíram o valor de € 6.900,00 (seis mil e novecentos euros). Terminam pedindo o seguinte: Deve a A. ser condenada no pagamento da diferença entre a renda contratualizada e a renda efetivamente paga ao primeiro R. diferença essa que se cifra nos € 460,00 (quatrocentos e sessenta euros) por cada um dos 15 (quinze) meses em que o primeiro R. ocupou a posição de senhorio, num montante global de € 6.900,00 (seis mil e novecentos euros), valor da reconvenção e que somado ao indicado pelo A, pelo que indicaram como valor da ação:72.880,00 Ainda impugnaram o valor da causa e pediram que “ e na falta de elementos suficientes que permitam fixar o valor da ação, deve ser ordenada a realização do arbitramento previsto no artigo 309.º, do CPC, por forma a determinar o real valor das frações em causa nos autos se vendidas separadamente e, consequentemente, determinar o preço a depositar pela A. que, além do mais, deverá ser acrescido em montante de valor igual ao do pedido reconvencional. A Autora apresentou réplica mantendo o anteriormente alegado e impugnando a reconvenção e sustentou que o valor da ação deverá ser o por si indicado. * Foi proferido despacho, a respeito da fixação do valor da ação, nos seguintes termos:“III. Valor da acção (art. 306.º, n.º 2, do CPC): €72.880,00 – art. 301.º, e 297.º, n.º 1 e 2, e 299.º, n.º 1 e 2, do CPC (aquele valor resulta da seguinte soma: 65.980,00 [numa acção de preferência o valor da acção é o valor do acto jurídico. Se o preço foi simulado, nesse caso deverá ser o réu a invocar esse facto, deduzindo a reconvenção pertinente. Nada disto ocorre nos autos, pelo que o valor da acção inicialmente dado pela autora é o correcto] + 6900).” * Inconformados com este despacho, vieram os 2ºRR/reconvintes dele interpor recurso, e a terminar as respetivas alegações, formularam as seguintes conclusões (que se transcrevem):“A) No que tange às ações em que se pretende ver efetivado o direito de preferência sobre determinado imóvel, é, geralmente, aferido o valor da ação nos termos do artigo 301.º do CPC,; B) Contudo, a Recorrida pretende fazer valer, o seu direito de preferência relativamente a uma determinada fração, que está englobada num negócio de venda conjunta de imóveis, feita por preço global, nos termos do n.º 1 do artigo 417.º do CC; C) Sendo que neste caso, o preço não resulta de uma soma aritmética de preços individuais, traduzindo antes, e pelo contrário, uma contrapartida única para um conjunto de bens; D) Ora, os preços atribuídos, na escritura de compra e venda, a cada uma das frações, foram-no, apenas, para efeitos de formalização do referido ato; E) Tendo sido a Recorrida informada disso mesmo pelos Recorrentes; F) Sendo necessário apurar o valor que efetivamente compete ao referido imóvel dentro do preço global fixado para a venda conjunta; G) Aferindo-se o valor de mercado do imóvel, se vendido separadamente, procedendo-se arbitramento, nos termos do artigo 309.º do CPC; H) Encontrando-se, desta forma, o justo valor do imóvel, se vendido separadamente, e, em consequência, o justo valor a depositar pela Recorrida nos termos da presente ação. I) Pelo que o valor atribuído pela Recorrida, e fixado pelo Mmo. Juiz a quo, não corresponde ao valor de mercado da fração em causa, se vendida separadamente. Nestes termos e nos demais de direito, com o douto suprimento de V/Exas, deve ser revogado o despacho que fixou o valor da causa em €72.880,00, substituindo-o por outro que ordene o arbitramento do valor da causa, nos termos do artigo 309.º do CPC, com as necessárias consequências legais e processuais.” * Foram apresentadas contra-alegações sustentando-se a manutenção da decisão recorrida por, em síntese “ ter sido expressamente afastada pelos outorgantes, na aludida compra e venda, a previsão legal do n.º1 do artigo 417º do Código Civil, e no referido título de transmissão ter sido expressamente atribuído o valor proporcional às fracções, torna-se evidente que o douto despacho em crise não violou o disposto na referida disposição legal, tendo aplicado correctamente a lei e determinado de forma válida o valor da causa”.* Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.* II. Questões a decidir.Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a questão essencial que se coloca à apreciação deste Tribunal consiste em saber: - Qual o valor da ação? O que contende com a questão da admissibilidade ou não do arbitramento previsto no art. 309º, do CPC, para determinação do valor da causa na presente ação de preferência de parte dos imóveis objeto de venda conjunta por preço global. * III. Fundamentação de facto.Os factos a atender com relevo jurídico-processual constam do relatório elaborado. * IV. Fundamentação de direito.Como vimos a única questão a decidir traduz-se em saber se está correto o valor da causa fixado pelo Mmº Juiz a quo. No caso dos autos, o Mmo Juiz a quo fixou o valor da ação em €72.880,00 ( €65.980,00 ( 64.000 correspondente ao valor do ato jurídico+ € 1.980,00 de rendas) + 6.900 da reconvenção), porquanto, aceitando as bases de cálculo feitas pela autora na petição inicial, considerou ser aquele o valor do direito real de aquisição que está em causa e que a Autora pretende exercer na presente ação – com as inerentes substituições nas posições contratuais e cancelamento do registo que dele decorrem – e a soma dos restantes pedidos, inclusive do reconvencional. Ou seja, o tribunal a quo fixou desde logo o valor da ação na medida em que considerou que os elementos constantes do processo eram bastantes para o efeito, e, entendendo os RR que não. Com efeito, defendem os réus a realização de arbitramento ( artº 309º do CPC) com vista a determinar o real valor das frações em causa nos autos se vendidas separadamente por, desde logo, “ pretendendo a Preferente exercer o seu direito apenas relativamente a algum(ns) bem(s) integrado(s) no conjunto… o "preço devido" (e o valor a atribuir à causa) será o que efetiva e proporcionalmente lhe compete, dentro do preço global fixado para a venda conjunta; Para o cálculo da supra referida proporcionalidade, mostra-se necessária a separada e concreta determinação dos valores reais de mercado dos bens objeto da ação, por forma a aferir o peso que cada um deles tem no preço global fixado para a venda conjunta.”. Para o efeito citam o Acordão desta Relação de Guimarães de 18-04-2018, in dgsi. Vejamos, então, de que lado está a razão. O art. 296º do CPC dispõe no seu nº1 que “A toda a ação deve ser atribuído um valor certo em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”, e constitui um dos elementos obrigatórios a indicar na petição inicial (art. 552º, nº1, al. f) do CPC). O pedido é, conforme resulta do nº3, do art. 581º do CPC, o efeito jurídico que se pretende obter com a demanda. Para a fixação do valor de uma causa, deve atender-se ao valor do pedido relacionado com a causa de pedir, sendo esta constituída pelo facto ou factos que dão origem ao direito. Em verdade, é pacífico, quer na jurisprudência, quer na doutrina, que o valor duma ação é o valor do que se pede combinado com a causa de pedir (cf, a título exemplificativo, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 1º, 4ª ed, pág. 601, Alberto Reis, Comentário ao CPC, Vol. III, pág. 594, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães de 11/07/2012, no processo 286/10.2TBSPS-B.C1 e do Tribunal da Relação de Lisboa no processo 2586/17.1T8CSC.L1-7, de 04/13/2021, disponíveis no portal dgsi.pt.). Nas ações de preferência, que se considerem, quer como reais, quer como constitutivas, a causa de pedir é sempre a transmissão da coisa. Será a venda, se tiver sido esta a forma porque a coisa se transmitiu. Através da ação de preferência pretende-se provocar uma mudança na ordem jurídica existente, ou seja, a substituição do adquirente pelo autor da preferência. O pedido consiste no direito do peticionante haver para si o bem vendido. Ora, como impressivamente se lê no AC deste TRG de 09-11-2023, proc. 484/21.3T8CMN-A.G1 quanto ao critério a recorrer para determinar o valor da ação de preferência “ A questão já se encontra dirimida com posição francamente maioritária na doutrina e na jurisprudência: “Não há dúvidas de que o critério para a fixação neste caso do valor da ação é o constante do artigo 301º, nº 1, do Código de Processo Civil, isto é, o do valor do ato determinado pelo preço ou estipulado pelas partes. (considerando a aplicação deste critério às ações de preferência, vide Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa in “Código de Processo Civil Anotado. Volume I. Parte Geral e Processo de Declaração. Artigos 1º a 702º”, Almedina 2020, 2ª edição, a página 370; Miguel Teixeira de Sousa in “Código de Processo Civil Online”, publicado no Blogue do Instituto Português do Processo Civil (IPPC), em anotação ao citado artigo 301º, nº 1, do Código de Processo Civil; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 2021 (relatora Catarina Serra), proferido no processo nº 8526/19.6T8SNT.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Dezembro de 2002 (relator Eduardo Antunes), proferido no processo nº 02A2890, publicitado in www.jusnet.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 24 de Maio de 2011 (relatora Rosa Tching), proferido no processo nº 1.09.3TCGMR-A.G1, publicitado in www.jusnet.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 26 de Novembro de 2013 (relator Henrique Antunes), proferido no processo nº 9/11, publicitado in www.jusnet.pt acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16 de Outubro de 2007 (relator Isaías Pádua), proferido no processo nº 1937/04.3TBC, publicitado in www.jusnet.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14 de Junho de 2018 (relatora Eugénia Cunha), proferido no processo nº 2269 /17, publicitado in www.jusnet.pt e que contém referências jurisprudenciais sobre este ponto; acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 9 de Dezembro de 2014 (relatora Maria Domingas Simões), proferido no processo nº 33/09.1TBPNC.C1, publicado in www.dgsi.pt). Conforme refere, sobre este ponto, Salvador da Costa in “Os Incidentes da Instância”, Almedina 2020, 11ª edição, a página 40: “Por força deste normativo, o valor processual da ação de preferência corresponde ao do preço pelo qual a coisa foi vendida e não ao seu valor real (...)”.).” como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/02/2022, no processo 3372/18.7T8VNF-A.G1.S1 . Com efeito, preenchendo-se a previsão do artigo 301º nº 1 do Código de Processo Civil é a esta norma que há que recorrer, por ser especifica para o caso em questão: porque o valor entre o preço constante do contrato e aquele por que se pretende preferir, este representa a utilidade económica do pedido.”. Sem embargo, sendo o preço acordado para a venda um preço global para todos os bens vendidos, o valor a atribuir à causa é o correspondente ao que proporcionalmente competir aos bens objeto da preferência dentro do preço global fixado para a venda conjunta. Como se decidiu no Acórdão do STJ de 20/6/2013, processo 1043/10.1TVLSB.L1.S1, in dgsi.net, “Por via do disposto no art. 417.º do CC, se o vendedor quiser alienar a coisa juntamente com outra ou outras, por um preço global, pode o direito de preferência ser exercido em relação àquela, pelo preço que proporcionalmente lhe for atribuído, salvo se o mesmo já estiver concretamente determinado.”. Mais se acrescenta “Desconhecendo-se o valor de mercado da fracção objecto da preferência, não tendo sido invocada qualquer simulação do preço constante na escritura pública, na falta de dados concretos sobre o estado da mesma fracção, sabendo-se que estava arrendada, razões não há para se lhe atribuir um preço proporcional ao que, no conjunto, foi pago. Devendo aceitar-se como verdadeiro o que a respeito consta na escritura pública de compra e venda”. Contudo, e conforme resulta das alegações de recurso e da contestação dos RR, o valor atribuído às frações na respetiva escritura de venda não corresponde ao seu real valor, outrossim representa um valor atribuído apenas para da elaboração da respetiva escritura, uma vez que se tratou de uma venda conjunta de imóveis pelo valor global de € 173.000,00, não representando, de modo algum, o valor em causa, valor de mercado dos imóveis unitariamente e em caso de venda individual. Conforme realçam os recorrentes nas alegações “ Aliás, disso mesmo deram nota os Recorrentes à Recorrida, na carta de exercício de direito de preferência que lhe enviaram, junta à petição inicial como documento 9.” Por outro lado, e se atentarmos nos documentos juntos aos autos, nomeadamente a certidão matricial donde consta o valor patrimonial da fração pretendida preferir só o seu valor individual ( € 123.281, 43) cifra-se em valor próximo do valor da soma das 4 frações vendidas em conjunto ( € 173.000,00). Assim sendo, é ostensiva a constatação de ser o valor indicado para a causa irrisório (para as 4 frações) e manifestamente inferior ao respetivo valor patrimonial apenas de uma delas - valor esse que, inclusive, na esmagadora maioria das vezes, se encontra abaixo do valor de mercado dos imóveis. Em verdade, e no caso sub judicio, tendo a Autora indicado € 65.980,00 (Valor da fração acrescido do valor de rendas já pagas à 2ª Ré, e cuja restituição se requereu supra - Art. 301º/1 e 297º/2 do CPC 6), como valor da causa, o que foi acatado pelo tribunal a quo ( valor a que somou o valor da reconvenção), verifica-se não equivaler o valor indicado à utilidade visada com a demanda. Acresce entendemos que não temos elementos para fixar o valor, pelo que deverá ser ordenada a realização de arbitramento previsto no artº 309º, do CPC, com vista a determinar o real valor das frações em causa nos autos, bens objeto do direito de preferência, se vendidas separadamente, tendo em vista fixar o valor da ação. Por conseguinte, concordamos inteiramente com os recorrentes e na senda do acórdão deste TRG de 18-04-2018, relatora Eugénia Marinho da Cunha ( e ainda o AC deste TRG de 09-05-2019, relator José Alberto Moreira Dias, ambos no dgsi)e pelos apelantes citado e que seguimos aqui de perto. Destarte, consideramos ser de ordenar a produção de prova por arbitramento, ao abrigo dos art.s 308º e 309º, do CPC, por o mesmo se revelar necessário para apurar o valor, sem o injusto locupletamento (tratando-se de venda conjunta por preço global). Não correspondendo o valor indicado pela Autora ao preço proporcional, como resulta do expressamente estipulado pelas partes no contrato de compra e venda, não pode o Tribunal, para cumprir o que lhe é imposto, deixar de realizar arbitramento, para o apurar. Com efeito, revelando já os autos ser o valor indicado pela Autora para a compra dos quatro imóveis irrisório e abusivo - o que é notório e resulta, desde logo, dos valores patrimoniais dos imóveis, sendo que o preço acordado foi para todos os imóveis e em função do globalmente acordado entre as partes - e não fornecendo os elementos necessários à adequada determinação do valor, é essencial o arbitramento, por só ele munir o Tribunal dos indispensáveis elementos a tal. E, na verdade, só no caso de os elementos constantes do processo ou outras diligências requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz se mostrarem insuficientes para determinar o valor da causa ou do incidente é que arbitramento, isto é, a perícia, deve ser ordenada. Com se lê naquele citado aresto “ Não se trata de um poder discricionário do juiz, mas de um poder-dever, que ele só pode deixar de exercer quando aquela diligência probatória se revelar objetivamente desnecessária ou inútil para o fim em causa. Sendo, in casu, necessário, até para o Tribunal, munido de valores reais de mercado, poder aferir do abuso (notório), da dimensão do locupletamento e de proporcionalidade de preços, nunca será de considerar o arbitramento impertinente nem dilatório. Assim, em caso de venda conjunta de imóveis por preço global, permitida pelo nº1, do artigo 417º, do Código Civil, pretendendo o preferente exercer o seu direito apenas relativamente a alguns bens integrados no conjunto, o preço será o que efetiva e proporcionalmente lhe competir dentro do preço global fixado para a venda conjunta. Para a devida determinação de tal proporcionalidade, na falta de provas suficientes, é necessário arbitramento (9), sendo que, para essa determinação e para a do valor da ação de preferência, é útil e necessária a concreta determinação dos valores reais de mercado dos bens objeto da ação, podendo haver necessidade de o alargar aos demais bens objeto da venda conjunta (e com base nas avaliações de todos os bens e no preço global fixado para a dita venda conjunta serem achadas as proporcionalidades). O arbitramento impõe-se pelo dever de ser fixado valor à causa (pelo Tribunal a quo) havendo, para tal, necessidade de apurar as reais proporcionalidades do preço das frações objeto da presente ação do preço global fixado para a venda conjunta, sendo, para tal, necessário determinar o real valor das frações, se vendidas separadamente.” Por conseguinte, necessário se mostra determinar o valor real dos imóveis, conforme alegado pelos apelantes, sendo que deverá, assim, proceder-se a arbitramento nos termos do art. 309º, do CPC -, para posterior verificação do valor da causa ( neste sentido, v.g. Acs. STJ. de 20/06/2013, Proc. 1043/10.1TVLSB:l1.S1, e RP. de 08/05/1984, Proc. 0017300, e Acórdão do STJ de 1/7/2014, Proc. 599/11.6TVPRT.P2.S1, relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Fonseca Ramos , todos in DGSI.) Em suma: é na presente ação de preferência que se impõe determinar esse valor real e proporcional por que foram vendidas as quatro frações, mediante recurso a arbitramento. Nesse arbitramento, para efeitos de se determinar o preço real e proporcional da fração a preferir no preço global pelo qual as quatro frações foram vendidos à 1ª ré, impõe-se determinar o valor real, isto é, o preço de mercado, das 4 frações vendidas e após determinar qual o preço proporcional que a fração que a apelante pretende preferir tem nesse preço global de € 173.000,00, posto que só assim, se poderá determinar o peso que cada uma delas tem no preço global fixado na venda conjunta. Refira-se que este, foi de resto, o entendimento sufragado por esta Relação no acórdão proferido em 14/06/2018, onde limitada que estava pelo objeto do recurso, onde apenas podia confirmar ou revogar o despacho recorrido, no qual apenas se determinou a avaliação das quatro frações, com vista a determinar o real valor das mesmas, se vendidas separadamente, a fls. 16 desse aresto, alertou-se para a eventual necessidade de se proceder à avaliação de todos os sessenta e seis prédios, ao escrever-se: “Para a devida determinação de tal proporcionalidade, na falta de provas suficientes, é necessário arbitramento, sendo que, para essa determinação e para a do valor da ação de preferência, é útil e necessária a concreta determinação dos valores reais de mercado dos bens objeto da ação, podendo haver necessidade de o alargar aos demais bens objeto da venda conjunta (e com base nas avaliações de todos os bens e no preço global fixado para a dita venda conjunta serem achadas as proporcionalidades)” - destacado e sublinhado nosso. Aqui chegados, impõe-se concluir pela procedência da presente apelação e, em consequência, pela consequente revogação do despacho recorrido, determinando-se que se proceda a arbitramento dos prédios objeto da venda global, a fim de se determinar o respetivo valor de mercado, por forma a determinar-se o valor real e proporcional destas, por referência ao valor de mercado dos prédios que integram a venda conjunta e o valor global, pelo qual foi realizada essa venda conjunta. * V- Decisão:Nesta conformidade, as Juízas Desembargadores desta 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, acordam em julgar a presente apelação integralmente procedente e, em consequência: - revogam a decisão recorrida e ordenam que se proceda a arbitramento dos prédios que integram a venda conjunta, a fim de se determinar o respetivo valor de mercado, e determinar-se o valor real e proporcional da fração a preferir, por referência ao valor de mercado de todos os prédios que integram a venda conjunta e preço global pelo qual essa venda conjunta foi realizada. * Custas pelas apeladas (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).Notifique. * * * Guimarães, 27 de junho de 2024 Anizabel Sousa Pereira ( relatora) Elizabete Coelho de Moura Alves e Paula Ribas |