Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:142/25.0BEFUN
Secção:CA
Data do Acordão:07/15/2025
Relator:MARIA TERESA CAIADO FERNANDES CORREIA
Descritores:COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA; TRIBUNAL DO TRABALHO/TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS; EPE.
Sumário:1.In casu, a omissão do contraditório não se mostra apta a influir na decisão da causa à luz das disposições legais aplicáveis e bem identificadas na decisão recorrida: cfr. art. 3º n.º 3 e art. 195º n.º 1 ambos do CPC ex vi art. 1º do CPTA; art. 13º, art. 14º n.º 2 do CPTA; art. 5º e sobretudo art. 4º n.º 4 al. b) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais – ETAF; art. 1 n.º 1, art. 35º e art. 40º do Decreto Legislativo Regional - DLR n.º 23/2008/M, de 23.06, publicado no DR n.º 119/2008, Série I de 2008-06-23, que republicou o DLR n.º 4/2003/M, de 7 de abril; art. 30.° e art. 33º do DLR n.°12/2012/M, de 02 de julho , publicado no DR n.º 126/2012, Série I, de 2012-07-02; art. 12.° da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas - LGTFP;

2.Acresce que entre as apelantes e a entidade recorrida foram firmados contratos de trabalho sem termo, de acordo com o disposto no Código do Trabalho e não qualquer vínculo de emprego público à luz do estabelecido na LGTFP, donde, o tribunal a quo concluiu corretamente pela sua incompetência em razão da matéria, posto que estão excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios decorrentes de contratos de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa coletiva de direito público, com exceção dos litígios emergentes do vínculo de emprego público, o qual , como se viu, é, no caso, inexistente: art. 3. n.º 3 do CPC, art. 7º-A, art. 13º, art. 14º n.º 2, art. 112º e seguintes todos do CPTA; art. 4º n.º 4 al. b) do ETAF.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Social
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO acordam as juízas da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul – Subsecção Social:
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I. RELATÓRIO:
JENNY ……………… e DÉBORA …………….., com os demais sinais dos autos, intentaram no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal – TAF do Funchal, contra o SERVIÇO DE SAÚDE DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA, EPE-RAM, preliminarmente à ação principal, PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DA EFICÁCIA, com “… efeitos retroativos a 20/03/2025…" de 2 (duas) “…ordens…”, emanadas pela entidade requerida e comunicadas por emails rececionados, ambos, em 2025-02-06 que impuseram, a cada uma das requerentes, o regresso ao posto de trabalho em 2025-02-24.
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O TAF do Funchal, por decisão datada de 2025-04-21, proferida no âmbito do presente processo cautelar julgou “…verificada a exceção dilatória de incompetência em razão da matéria…” e, em consequência, absolveu a entidade requerida da instância: cfr. fls. 594 a 606.
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Inconformadas as requerentes, ora recorrentes, interpuseram recurso de apelação para este Tribunal Central Administrativo do Sul -TCAS, no qual peticionam a revogação da decisão recorrida, e para o caso de assim não se entender a remessa dos presentes autos ao Juízo de Trabalho junto do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, apresentando as respetivas alegações e conclusões, como se transcreve:“… 2. A exceção de incompetência do tribunal em razão da matéria não foi suscitada pelas partes nem pelo tribunal em momento anterior ao da prolação da sentença.
3. As partes, em momento anterior ao da instauração da presente ação, procuraram a intervenção da Procuradoria da República da Comarca da Madeira, em particular o Juízo do Trabalho do Funchal, que se declarou incompetente.
4. Nada levava as Recorrentes a crer a que o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal se declararia incompetente.
5. A decisão proferida pelo tribunal configura uma decisão-surpresa e viola o art. 3.°, n.º 3, do CPC.
6. A decisão, da forma como foi proferida, contra a expetativa criada nas partes e sem o seu conhecimento prévio, viola o princípio do contraditório.
7. Caso as Recorrentes tivessem sido notificadas para exercer o contraditório podiam, designadamente, ter solicitado a remessa do processo para o Juízo do Tribunal do Trabalho, antes de terminada a instância, com relevância em termos de pagamento de taxas de justiça.
8. A não observância do contraditório, porque influiu na decisão da causa, constitui uma nulidade processual, nos termos do art. 195.° do CPC, o que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
9. O tribunal a quo, socorrendo-se do disposto no art. 4.°, n.º 4, al. b), do ETAF, concluiu que “está excluída da competência à jurisdição administrativa e fiscal o presente litígio por ser emergente da celebração de contrato de trabalho, regulado pelo regime do Código do Trabalho e não pela Lei Geral do Contrato de Trabalho em Funções Públicas’’.
10. Ao determinar que o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal é incompetente, em razão da matéria, para julgar a presente causa, o tribunal a quo incorreu em erro na determinação da norma aplicável e indevida interpretação e aplicação do direito.
11. Dado que a Entidade demandada atua no exercício de poderes públicos, enquanto Serviço Regional de Saúde, conforme previsto nos seus Estatutos, através do seu Conselho de Administração, cujas atribuições revestem carácter de autoridade pública, mais precisamente de autoridade de saúde.
12. No exercício daqueles poderes, ela está sujeita aos princípios gerais da atividade administrativa constantes do Código de Procedimento Administrativo e às normas que concretizam preceitos constitucionais.
13. E foi no uso das suas prerrogativas de autoridade que praticou os atos administrativos em causa nos autos: os atos administrativos que determinaram a revogação dos atos que concederam às Recorrentes o direito à dispensa de prestar trabalho em períodos determinados, em face da exposição aos riscos específicos.
14. O tribunal a quo incorreu, assim, em erro de julgamento, violando o disposto nos art.s 4.°, n.º 1, al.s c) e d), do atual ETAF, 23.° do DL n.°133/2013, de 3 de outubro, e 267.°, n° 6, da Constituição da República Portuguesa.
15. No caso do despacho que receber este recurso, e ao contrário do requerido efeito suspensivo, fixar ao recurso efeito devolutivo, deve ser alterado o efeito do recurso fixando-lhe efeito suspensivo...“ :cfr. 610 a 623.
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A entidade recorrida, apresentou contra-alegações, nas quais concluiu da seguinte forma: “… A) As recorrentes na providência cautelar, ora em recurso, peticionaram que fosse determinada “a suspensão de eficácia, com efeitos retroativos a 20/03/2025, das ordens de regresso das Requerentes ao posto de trabalho com efeitos a 24/02/2025.”
B) A competência absoluta em razão da matéria afere-se pela natureza da relação jurídica que serve de fundamento à ação, tal como a configura o A., ou seja, analisando o que foi alegado como causa de pedir no confronto com o pedido formulado.
C) É uma exceção que se impõe ao julgador (de conhecimento oficioso), sendo, por isso, irrelevante o facto de nenhuma das partes a ter invocado.
D) A sua simplicidade reside na mera verificação dos elementos probatórios documentais trazidos aos autos pelas partes e dados como assentes na matéria de factos provada na douta sentença e não impugnada pelas recorrentes.
E) Daqui decorre, no caso concreto, a irrelevância do princípio do contraditório, que pode ser postergado, sem prejuízo para as partes, em face da sua manifesta desnecessidade, conforme alude o n.º 3 do art. 3.° do CPC, quando refere “...salvo caso de manifesta necessidade”.
F) A omissão do contraditório nos termos expostos pelas Recorrentes não é, em si, vício que comprometa a regularidade formal da sentença, o que, como é sabido, apenas ocorre quando, na sua elaboração, seja cometida qualquer uma das irregularidades que o art. 615°, n° 1, nas suas várias alíneas, identifica.
G) A exceção dilatória de incompetência em razão da matéria implica a absolvição do réu da instância, assim se extinguindo a ação.
H) A ordem, cuja suspensão as Recorrentes peticionaram, é um comando comum dentro dos normais poderes de qualquer entidade empregadora, no âmbito de um contrato de trabalho.
I) O poder de dar ordens é próprio da esfera jurídica da entidade empregadora e encontra o seu correlativo no dever de cumprir ordens que integra o dever de obediência próprio do trabalhador, com previsão legal no art. 128.° n.º 1 e 2 do CT.
J) Não tem subjacente qualquer especial poder de autoridade tal como pretendido pelas recorrentes.
K) A Recorrida, Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira, EPERAM, não é uma empresa pública.
L) A Recorrida é uma pessoa coletiva de direito público, de natureza empresarial, dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial que se rege pelo regime jurídico aplicável às entidades públicas empresariais do Sector Empresarial da Região Autónoma da Madeira, com as especificidades constantes dos seus Estatutos e regulamentos internos, bem como das normas em vigor para o Serviço Regional de Saúde que não contrariem as normas previstas, nos seus Estatutos, e
M) Enquadra-se no sector público empresarial da Região Autónoma da Madeira, a que alude o capítulo IV, sob a epígrafe Entidades públicas empresariais da Região Autónoma da Madeira, com previsão no art. 54.° e ss do Decreto Legislativo Regional n.º 15/2021/M, de 30/06.
N) O SESARAM, EPERAM, tem por objeto principal a prestação de cuidados de saúde, de cuidados e tratamentos continuados e cuidados paliativos a todos os cidadãos em geral e é o único serviço de saúde público da Região.
O) O SESARAM EPERAM não tem poderes de autoridade.
P) Para efeitos do art. 4.° n. 4, al. b) do ETAF, bastará, para excluir a competência da jurisdição administrativa, tão-somente a verificação de que os contratos de trabalhos das recorrentes são contratos de trabalho sem termo, regidos pelo código de trabalho, celebrados respetivamente em 10/03/20210 e 25/07/2018, com uma parte que é uma pessoa coletiva de direito público, o que desde logo faz subtrair a apreciação do litígios àquela jurisdição administrativa, conforme fundamentado pelo juiz ad quo.
Q) Deve por tudo isto manter-se a decisão do Tribunal ad quo…”.: cfr. fls. 634 a 640.
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O recurso foi admitido e ordenada a sua subida em 2025-06-11: cfr. fls. 644.
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O Digno Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal Central, de acordo com o disposto no art. 146º e art. 147º ambos do CPTA, emitiu parecer, concluindo, em síntese, que: “….
da análise aos presentes Autos, nomeadamente da decisão de que se recorre, à motivação de recurso apresentada pelo Recorrente e à resposta do recorrido, entende o Ministério Público que a decisão de que se recorre procedeu a uma correta apreciação dos factos trazidos ao conhecimento do Tribunal e à sua subsunção ao Direito, evidenciando clara e suficiente fundamentação, pelo que, salvo melhor opinião, não merece qualquer censura…”: cfr. fls. 652 a 655.
E, de tal parecer, notificadas, as partes nada disseram: cfr. fls.656 e 657.
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Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente (cfr. art. 36º nº 2 do CPTA), mas com envio prévio do projeto de Acórdão às Juízas Desembargadoras Adjuntas, vem o processo à conferência para julgamento.
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II. OBJETO DO RECURSO:
Delimitadas as questões a conhecer pelo teor das alegações de recurso apresentadas pelo recorrente, e respetivas conclusões (cfr. art. 635°, n° 4 e art. 639°, n°1, nº. 2 e nº 3 todos do Código de Processo Civil – CPC ex vi artº 140° do CPTA), não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas - salvo as de conhecimento oficioso -, importa apreciar e decidir agora: se o efeito do recurso foi corretamente fixado; se a decisão sob recurso padece de nulidade; se ocorre erro de julgamento.
Vejamos:
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III. FUNDAMENTAÇÃO:
A – DE FACTO:
Remete-se para os termos da decisão da 1.ª instância que decidiu a matéria de facto: cfr. art. 663º n.º 6 do CPC ex vi art. 1.º, art. 7º-A e art. 140.º n.º 3 todos do CPTA.
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B – DE DIREITO:

DA ALTERAÇÃO DO EFEITO DEVOLUTIVO DO RECURSO (v.g. art. 143º n.º 2 al. b) e n.º 4 do CPTA):
Alegam as apelantes que: “… Através da presente providência cautelar, é pedida, por via do pedido de suspensão de eficácia das ordens de regresso ao posto de trabalho em 24/02/2025, com efeitos retroativos a 20/03/2025, a manutenção de aplicação do regime de proteção na parentalidade, previsto no art. 62.º do Código do Trabalho, em concreto, a dispensa de prestação de trabalho, até à decisão final, por as medidas adotadas pela Entidade demandada não serem viáveis a evitar a sua exposição, enquanto lactantes, aos riscos que perigam a sua saúde e segurança e que, em última instância, podem ser fatais para os seus filhos de apenas um ano de idade ou, pelo menos, prejudiciais ao seu saudável desenvolvimento.
É evidente o fundado receio das Recorrentes na constituição de uma situação de facto consumado, uma vez que poderão ver-se expostas aos riscos para a sua segurança e saúde, com repercussões sobre a amamentação dos seus filhos.
A não atribuição de efeito suspensivo ao recurso obriga, até uma decisão final, as Recorrentes a faltar consecutivamente ao trabalho, o que pode levar ao seu despedimento (art. 351.º, n.º 2, al. g), do Código do Trabalho) ou à cessação do contrato de trabalho (art. 403.º, n.º 2 e 3 do Código do Trabalho) ou à sua exposição àqueles perigos para a sua segurança e saúde, até ser obtida a anulação daquelas ordens de regresso…”.

Solicitando assim a alteração da fixação do efeito devolutivo para suspensivo ao presente recurso.

Como sobredito, o tribunal a quo, por despacho de 2025-06-11, fixou o efeito meramente devolutivo ao recurso, para tanto, alicerçando-se: “… nos artigos 141.º, n.º 1, 147.º, n.º 1, 142.º, n.º 1, 140.º, n.º 1 e 3, todos do CPTA, artigos 644.º, n.º 1, alínea a) e 645.º, n.º 1, alínea a), do CPC e artigo 143.º, n.º 2, alínea b), do CPTA…”.
Aqui chegados, a primeira questão decidenda a resolver é saber se deve ser alterado o efeito devolutivo atribuído ao presente recurso.

Na situação trazida a juízo, o efeito regra aplicável é o do efeito devolutivo, como bem decidido pelo tribunal a quo, e não o efeito suspensivo, posto que, não resulta demonstrado, nos autos, que da atribuição do efeito que a lei atribui possam resultar os alegados danos (v.g. na oposição é referida a atribuição de tarefas administrativas e não necessariamente o regresso às habituais tarefas de enfermagem; a não atribuição de efeito suspensivo ao recurso não obriga, até uma decisão final, as apelantes necessária e consecutivamente, a falta ao trabalho, na exata medida em que sempre poderão ser encontradas outras soluções e não se mostra demonstrado o necessário nexo de causalidade): cfr. art. 143º n.º 2 al. b), n.º 4 e n.º 5 do CPTA.

Acresce que, a atribuição de efeito meramente devolutivo aos recursos de sentenças cautelares destina-se, precisamente, a permitir que as decisões que recusem a suspensão da eficácia de atos administrativos produzam imediatamente os seus efeitos a partir do momento em que são proferidas, evitando-se o “… efeito pernicioso de favorecer a utilização abusiva do recurso contra decisões que recusassem a suspensão da eficácia de atos administrativos, no propósito de aproveitar o efeito automático que resultaria da simples interposição do recurso jurisdicional durante toda a pendência do mesmo, assim prolongando a situação de proibição de executar o ato administrativo…” : cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, CPTA Anotado, Almedina, pág. 824.

É, pois, patente a inviabilidade processual da pretensão em análise, pelo que se mantém o efeito devolutivo atribuído ao presente recurso.

DA NULIDADE (v.g. art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC ex vi art. 140º n.º 3 do CPTA):
Da decisão recorrida ressalta que: “… Considerando os documentos que constituem o processo administrativo e a simplicidade da matéria excetiva ora suscitada, não se afigura necessário dar cumprimento ao princípio do contraditório, conforme permite o art. 3.º, n.º 3, do CPC, “a contrario sensu” (“salvo caso de manifesta desnecessidade”), ex vi do artigo 1.º do CPTA…”.
Reduzindo a vexatia questio aos seus termos mais simples, importa saber se ocorreu uma decisão-surpresa, consubstanciada na omissão de formalidade imposta pelo princípio do contraditório: cfr. art. 3º n.º 3 e art. 195º n.º 1 ambos do CPC ex vi art. 1º do CPTA.

A este propósito sempre se dirá que tem sido objeto de debate a questão de saber se a decisão-surpresa é uma nulidade processual ou uma nulidade da sentença, sendo que, atualmente, a jurisprudência maioritária entende que: “… a violação do princípio do contraditório do art. 3º, nº 3 do CPC dá origem não a uma nulidade processual nos termos do art. 195º do CPC, que origina a anulação do acórdão, mas a uma nulidade do próprio acórdão, por excesso de pronúncia, nos termos art.s. 615º, nº 1, al. d), 666º, n.º 1, e 685º do mesmo diploma…” : cfr. Acórdão deste Tribunal de 2024-06-06, processo n.º 350/12.3BEBJA; Acórdão do STJ de 2020-10-13, processo 392/14.4.T8CHV-A.G1.S1 e Acórdão do STA de 2023-12-20, proferido no processo 0445/12.3BELRS.

Como decorre dos autos e o probatório elege, e bem o sublinha o EMMP, no caso presente, estamos perante uma das situações de manifesta desnecessidade do contraditório: cfr. art. 3.º, n.º 3 do CPC.

Isto porque, estão excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios decorrentes de contratos de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa coletiva de direito público, com exceção dos litígios emergentes do vínculo de emprego público, pelo que a falta de contraditório sobre a competência em razão da matéria não podia e não pode, in casu, influir no exame ou na decisão da causa, inexistindo assim qualquer decisão-surpresa: cfr. art. 3º n.º 3 e art. 195º n.º 1 ambos do CPC ex vi art. 1º do CPTA; art. 13º, art. 14º n.º 2 do CPTA; art. 5º e sobretudo art. 4º n.º 4 al. b) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais – ETAF; art. 1 n.º 1, art. 35º e art. 40º do Decreto Legislativo Regional - DLR n.º 23/2008/M, de 23.06, publicado no DR n.º 119/2008, Série I de 2008-06-23, que republicou o DLR n.º 4/2003/M, de 7 de abril; art. 30.° e art. 33º do DLR n.°12/2012/M, de 02 de julho , publicado no DR n.º 126/2012, Série I, de 2012-07-02; art. 12.° da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas - LGTFP.

Deste modo, o regime consagrado no CPTA, aliás na esteira do CPC, visa contribuir para a agilização, adequação formal e concentração no que é essencial em detrimento do que é acessório, assim, sob pena de se cair num inaceitável formalismo, entendemos, que no caso concreto, o cotejo dos factos assentes, enquadrados pelas disposições legais e constitucionais aplicáveis, permitem concluir, estar-se perante um caso de manifesta desnecessidade de observar e fazer cumprir o princípio do contraditório, inexistindo, em consequência, qualquer decisão surpresa: cfr. art. 3º n.º 3 e art. 195º n.º 1 ambos do CPC ex vi art. 1º do CPTA; art. 13º, art. 14º n.º 2 do CPTA; art. 5º e sobretudo art. 4º n.º 4 al. b) do ETAF; art. 1 n.º 1, art. 35º e art. 40º do Decreto Legislativo Regional - DLR n.º 23/2008/M, de 23.06, publicado no DR n.º 119/2008, Série I de 2008-06-23, que republicou o DLR n.º 4/2003/M, de 7 de abril; art. 30.° e art. 33º do DLR n.°12/2012/M, de 02 de julho , publicado no DR n.º 126/2012, Série I, de 2012-07-02; art. 12.° da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas - LGTFP.

Termos em que a decisão recorrida não padece da invocada nulidade.

DO ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO (v.g. art. 4.°, n.º 1, al.s c) e d) do ETAF; art. 23.° do DL n.°133/2013, de 3 de outubro; art. 267.°, n° 6, da Constituição da República Portuguesa – CRP):
Ressalta do discurso fundamentador da decisão recorrida que: “ … In casu, as Requerentes pretendem a suspensão de eficácia das ordens dirigidas à 1.a e 2.a Requerentes de regresso ao posto de trabalho.
Ora, o citado artigo 4.°, n.º 4, al. b), do ETAF determina que está excluída da competência à jurisdição administrativa e fiscal o presente litígio por ser emergente da celebração de contrato de trabalho, regulado pelo regime do Código do Trabalho e não pela Lei Geral do Contrato de Trabalho em Funções Públicas.
Nessa medida, é competente o Tribunal do Trabalho e não este Tribunal Administrativo de Círculo, ainda que a Entidade Requerida seja uma pessoa coletiva de direito público, de natureza empresarial (cf. Acórdão do STJ de 22.06.2022, Processo n.º 825/21.3T8VCT.G1.S1-A, disponível em www.dgsi.pt)...”.

Correspondentemente, e como resulta do sobredito, o tribunal a quo decidiu, no essencial, estar : “… excluído o presente litígio do âmbito da jurisdição administrativa, pelo que se considera este Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal materialmente incompetente para apreciar a causa…”.

O assim decidido pelo tribunal a quo escora-se em tese que se acompanha.

Valendo aqui mutatis mutandis o supra aduzido, acresce que o tribunal a quo ao proferir a decisão ora sob censura no sentido em que o fez, procedeu de forma irrepreensível à interpretação dos factos e aplicou corretamente aos mesmos o direito.

Na verdade, resulta indiciariamente assente dos autos que entre as apelantes e a entidade recorrida foram firmados contratos de trabalho sem termo, de acordo com o Código do Trabalho e não qualquer vínculo de emprego público à luz do estabelecido na LGTFP.

Donde, exatamente porque estão excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios decorrentes de contratos de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa coletiva de direito público, com exceção dos litígios emergentes do vínculo de emprego público – o qual inexiste no caso concreto - , o tribunal a quo concluiu corretamente pela sua incompetência em razão da matéria, sendo, por isso, irrelevante a
a natureza jurídica da entidade requerida para aferir da competência material do Tribunal: art. 3º n.º 3 do CPC, art. 7º-A, art. 13º, art. 14º n.º2 art. 112º e seguintes todos do CPTA; art. 4.°, n.º 1, al.s c) e d) e art. 4º n.º 4 al. b) ambos do ETAF; art. 23.° do DL n.°133/2013, de 3 de outubro; art. 267.°, n° 6 da CRP).
Termos em que, sem necessidade de mais amplas considerações, a decisão recorrida não padece outrossim do invocado erro de julgamento.
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Por fim, sempre se dirá que, tendo sido, como foi, a petição dirigida a tribunal incompetente, sem que o tribunal competente pertença à jurisdição administrativa e fiscal, podem as interessadas, ora apelantes, no prazo de 30 (trinta) dias a contar do trânsito em julgado da decisão que declare a incompetência, requerer a remessa dos autos ao tribunal competente, com indicação do mesmo, razão pela qual existindo norma especial, ou seja o art. 14º n.º 2 do CPTA, não se dará satisfação ao requerido à luz do disposto no art. 99.°, n.º 2, do CPC (vide parte final do recurso).
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IV. DECISÃO:
Pelo exposto, acordam as juízas da Secção de Contencioso Administrativo – Subsecção Social deste TCAS em negar provimento ao recurso interposto, confirmando, em consequência, a decisão recorrida.
Custas a cargo das recorrentes.
15 de julho de 2025
(Teresa Caiado – relatora)
(Ilda Côco – 1º adjunta)
(Maria Helena Filipe - 2º adjunta)