Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 18/25.0BEPDL |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 06/18/2025 |
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Relator: | MARCELO MENDONÇA |
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Descritores: | INFORMAÇÃO NÃO PROCEDIMENTAL/LADA; DOCUMENTOS PRÉ-EXISTENTES/CONSTITUÍDOS |
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Sumário: | I - O direito de acesso a informação não procedimental, enunciado na LADA, depende, respectivamente, de elementos documentais que tenham sido já produzidos, isto é, da existência de documentos pré-constituídos. II - Sobre o interessado na pretensão informativa impende o ónus de identificar os concretos documentos administrativos aos quais pretende aceder ou obter informação sobre a existência e conteúdo dos mesmos (pelos meios de consulta, reprodução ou certidão), enumerando-os, ainda que de modo minimamente indiciário, nomeadamente, pela autoria, data de elaboração ou serviço concretamente detentor do mesmo (qual o serviço de arquivo, por exemplo), de modo a que, cooperando com a Administração, também contribua para a profícua satisfação do seu pedido informativo. III - No âmbito da satisfação do direito de acesso à informação não procedimental, não cabe à Administração produzir ou adaptar novos documentos, não se admitindo que o processo de intimação, nesta vertente, seja utilizado para a obtenção de explicações, justificações, conclusões ou juízos de valor. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Administrativa Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | I - Relatório. G…, doravante Recorrente, que deduziu no Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada (TAF de Ponta Delgada) contra a Universidade dos Açores, doravante Recorrida, processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, no âmbito do qual, alegando, resumidamente, que lhe foi aplicada sanção disciplinar por violação do dever de exclusividade, requereu informação sobre “1. Os docentes da Universidade dos Açores M…; F…; J…; S…; G…; J…; J… estão, ou estiveram (e em caso afirmativo, desde quando e até quando) em regime de exclusividade? 2. Caso os docentes em apreço se encontram em regime de exclusividade, pretende-se a informação se aos mesmos foi espoletado ou encontra-se em curso algum procedimento disciplinar tendo em vista a aplicação de uma sanção disciplinar decorrente da mesma circunstância de facto ou análoga ao presente caso do Requerente?”, apresentando como justificação do pedido a “aparente violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 6.º do Código de Procedimento Administrativo”, inconformado que se mostra com a sentença do TAF de Ponta Delgada, de 11/03/2025, que decidiu julgar improcedente a presente intimação, contra a mesma veio interpor recurso ordinário de apelação, apresentando alegações, nas quais formula as seguintes conclusões: “I. A 21 de janeiro de 2025, o aqui Recorrente apresentou junto da Recorrida um pedido de informações que não se inscreviam num procedimento, tendo, portanto, intenção de obter informações não procedimentais. II. O pedido de informações do Recorrente tinha como principal desiderato a obtenção de informações relativas a sete docentes da Recorrida, por este identificados, nomeadamente se os mesmos se encontram ou não em regime de exclusividade (dedicação exclusiva) e se contra estes tinha sido espoletado um qualquer procedimento disciplinar por situações análogas aquela em que se encontra o aqui Recorrente. III. A 5 de fevereiro, o Recorrente foi notificado da resposta ao pedido de informações apresentado, IV. Não tendo sido dada integral satisfação ao pedido de informações no exercício do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o Recorrente requereu a correspondente intimação nos termos e para os efeitos do artigo 104.º do CPTA. V. Nesse seguimento, o Recorrente foi notificado da Sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou totalmente improcedente a intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, absolvendo a Entidade Requerida do pedido. VI. Não se conformando com a Douta Sentença, o Recorrente apresenta o presente recurso para ser remetido Tribunal ad quem. VII. O Recorrente considera que a Douta Sentença enferma um erro de interpretação de Direito que, por consequência, absolve erroneamente a Recorrida do pedido. Vejamos, VIII. Conforme logrou o Recorrente demonstrar e que se encontra igualmente fixado pela Douta Sentença, o pedido de informações apresentado pelo Recorrente insere-se no âmbito de informações não procedimentais e, portanto, no exercício do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos. IX. Ora, a Sentença proferida pelo Tribunal a quo não efetua uma correta interpretação e aplicação do disposto no artigo 13.º, n.º 6 da LADA, conforme infra se verificará. Isto, porque, X. O direito à informação não procedimental, como é o presente caso, é conferido a todas as pessoas, tendo, portanto, natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias. XI. Neste âmbito vigora o princípio da administração aberta, consagrado nos artigos 17.º o CPA e 5.º da LADA. XII. No caso sub judice, a Douta Sentença considerou que o pedido formulado pelo Recorrente se traduzia na criação de um documento novo por parte da Recorrida, XIII. “A informação pretendida pelo Requerente sobre o dito «regime de exclusividade» daqueles sete trabalhadores importa, por outro lado, a criação de um documento, inadmissível ao abrigo da LADA, pelo que não merce censura a decisão de recursa proferida pela Entidade Requerida.” XIV. Fundamentação esta com a qual o Recorrente discorda em absoluto! XV. É que conforme ventila a Sentença proferida pelo Tribunal a quo em passagem anterior à supra transcrita, “(…) o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos (…) restringindo-se o seu âmbito à consulta, obtenção de reprodução simples ou de certidão de documentos e de informação sobre a existência ou inexistência e conteúdo de documentos na posse da Administração.” (destaque nosso) XVI. De fácil compreensão se torna que o pedido efetuado pelo Recorrente encontra resposta nos documentos administrativos e respetivos registos em posse da aqui Recorrida, nomeadamente através de contratos de trabalho, recibos de vencimento, declaração de exclusividade anual solicitada pelos serviços da Recorrida, entre outros, XVII. Sendo certo que, conforme alegou a Sentença proferida, o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos também se aplica à obtenção de informações relativas ao conteúdo de documentos na posse da Administração, que sempre foi o pretendido pelo Recorrido! XVIII. Não se limitando o dever de colaboração da Administração ao disposto no artigo 15.º da LADA… XIX. Elucida-nos o artigo 13.º, n.º 6 da LADA que “A entidade requerida não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido, nem a obrigação de fornecer extratos de documentos, caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos.” XX. Verifica-se, no entanto, que o Recorrente não pediu cópia ou reprodução de qualquer documento, XXI. Tendo apenas formulado o concreto pedido de informação acima identificado cuja satisfação se mostra unicamente dependente da efetuação de pesquisa, como bem reconhece a Sentença do Tribunal a quo, dos contratos de trabalho dos docentes bem como de eventuais pedidos de autorização de acumulação de funções que tenham eventualmente disso formulados pelos mesmos. XXII. Ora, a pesquisa e a prestação das informações constantes daqueles documentos administrativos não se traduz na produção de um novo documento, nem sequer na sua adaptação, mas antes e só na certificação estrita da existência dos mesmos documentos e de alguns dos seus elementos integrativos, tendo sido esse o exato pedido do Recorrente. XXIII. O Recorrente não pretendeu com o pedido de informações efetuado, ter acesso a qualquer documento, pretendeu sim que lhe fossem prestadas informações constantes de documentos administrativos que se encontram em posse da Recorrida, nada mais do que isso. XXIV. Conforme nos elucida o artigo 13.º, n.º 1, alínea c) da LADA, a certificação constitui uma das típicas formas do direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende, a par dos direitos de consulta e de reprodução de documentos administrativos, o direito de informação sobre a sua existência e conteúdo. XXV. É também verdade que o direito de acesso aos documentos administrativos se exerce através de algum daqueles referidos meios, “conforme opção do requerente”, nos termos do artigo 13.º da LADA. XXVI. Ora, o aqui Recorrente não solicitou a reprodução de qualquer documento, o que exclui a satisfação do seu pedido através desse meio. XXVII. Assim sendo, está excluída, a eventualidade da necessidade de qualquer prévia adaptação documental a exigir, ao contrário daquilo que se encontra por diversas vezes ventilado na Douta Sentença (e até mesmo contrariado por esta mesma decisão do Tribunal a quo, conforme supra se verificou em sede de alegações). XXVIII. Ao contrário daquilo que a Douta Sentença faz crer, ventilando que “a informação pretendida pelo Requerente não se trata de mera informação sobre a existência ou inexistência de documentos nem mesmo uma informação que possa ser extraída pela mera consulta/análise de um documento em concreto” XXIX. A verdade é que o âmbito da informação a solicitar não se tem de limitar ao questionamento da existência ou não de determinados documentos, sendo, claro está, extensível ao conteúdo dos mesmos (aos seus elementos integrantes), XXX. Sendo certo que através de um exercício de análise e mera constatação de elementos integrantes de documentos em posse da Recorrida (contratos de trabalho, recibos de vencimento, declaração de exclusividade anual solicitada pelos serviços da Recorrida, entre outros) teria sido possível certificar-se a informação pretendida pelo Recorrente, sem necessidade de criação de um qualquer novo documento! XXXI. Por muito que tente a Douta Sentença, e até a resposta apresentada pela Recorrida, fazerem crer o seu contrário, em nenhum momento o Recorrente solicitou qualquer documentos, XXXII. Antes, apenas e só, a certificação de uma realidade de facto relativamente a sete docentes da Recorrida, de fácil constatação e verificação através dos documentos que esta Edilidade dispõe. XXXIII. Ora, conforme se tem vindo a demonstrar, a pesquisa e a prestação das informações pretendidas e constantes daqueles de documentos administrativos não se traduz na produção de um novo documento, nem sequer na sua adaptação, XXXIV. Mas antes e só na certificação estrita da existência dos mesmos documentos e de alguns dos seus elementos integrativos. XXXV. Seguindo, neste sentido, a mais elevada Jurisprudência emanada por vários Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, notadamente: de 17.01.2008, proc. nº 0896/07, de 21.11.2013, proc. nº 01590/13 e de 04.02.2016, proc. nº 01370/15. XXXVI. Segue também nesse sentido o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 13-07-2016, no âmbito do processo n.º 0577/16, o qual se tratou com maior detalhe em sede de alegações, e que nos diz o seguinte: “I - O direito à informação não procedimental, como é o caso presente, é conferido a todas as pessoas, tendo natureza análoga aos direitos liberdades e garantias e só podendo estar sujeito às restrições expressamente previstas na Constituição e na lei (cfr. art. 268º, nº 2 da CRP e arts. 5º, 6º, 7º e 11º, nº 5 da LADA). II - Vigorando aqui o princípio do arquivo aberto, agora consagrado no art. 17º do CPA e 1º da LADA, o acesso à informação não procedimental engloba os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a existência e conteúdo dos documentos administrativos (cfr. referidos arts. 5º e 11º da LADA). III - O dever de colaboração não compreende a elaboração de dossiers estruturados ou sínteses da documentação existente, nem a obrigação de produzir uma nova documentação administrativa para satisfazer o pedido do requerente, por essas actividades ultrapassarem o dever legal de informação, mas a inexistência desta obrigação não pode ser cobertura para uma interpretação de tal modo minimalista que negue o direito à informação.” (destaque nosso) XXXVII. Uma subsunção dos factos à mais elevada Jurisprudência, permite-nos constatar que a Sentença do Tribunal a quo alicerçou toda a sua fundamentação numa “suposta” necessidade de criação de novos documentos, à qual não se encontra a Recorrida obrigada. XXXVIII. Ora, não se pode concordar com tal argumentação. XXXIX. Verificou-se que não existe qualquer necessidade de criação de novos documentos, dado que o Recorrente, apenas e só, requereu a certificação de uma realidade de facto subjacente a sete dos seus colegas docentes na Recorrida, XL. Realidade de facto essa que pode ser constatada através dos elementos integrativos de documentos administrativos que se encontram na posse da Recorrida, como contratos de trabalho, recibos de vencimento, declaração de exclusividade anual solicitada pelos serviços da Recorrida, entre outros. XLI. Sendo esses mesmos documentos e os seus elementos, capazes e suficientes para atestar as informações solicitadas pelo Recorrente. XLII. Residindo na Recorrida a obrigação da sua certificação, não sendo de se admitir como motivo legítimo de recusa do direito de acesso a documentos administrativos uma “suposta” necessidade de criação de novos documentos, XLIII. A qual não se verifica, conforme se logrou demonstrar. XLIV. Assim, o indeferimento do pedido do Recorrente consubstancia uma denegação injustificada do direito à informação, em violação do disposto no n.º 6 do artigo 13.º da LADA. XLV. Enfermando, portanto, a Douta Sentença um erro de interpretação e de aplicação do artigo 13.º, n.º 6 da LADA, o que se releva e se requer para os devidos efeitos legais. XLVI. Carecendo a Douta Sentença de total reparo, a mesma deve ser revogada e, em consequência, ser proferida uma nova Sentença que promova pela intimação da Recorrida a prestar exata e rigorosa sobre pedido de informação vertido no pedido de informações entregue pelo Requerente nos serviços da Requerida a 21 de janeiro de 2025, o que se releva e se requer para os devidos efeitos legais.” A Recorrida apresentou contra-alegações, produzindo as seguintes conclusões: “1. Por meio do recuso que apresenta, o recorrente vem por em crise a douta Sentença proferida nesta intimação que não merece censura nenhuma; 2. Em suma, entende o recorrente que a recorrida deveria ter prestado as informações que foram requeridas, porquanto tal não implicaria a criação de um novo documento administrativo; 3. Acontece que, ao contrário do que o recorrido tanto insiste, a resposta a esse pedido de informações não se trata de uma simples consulta aos processos administrativos destes docentes, ou se uma simples informação a ser prestada de imediato; 4. Na verdade, o recorrente pediu informação relativa a sete docentes colegas seus e para tanto é necessário consultar os contratos de trabalho de todos esses docentes, bem como é necessário consultar os seus processos individuais de trabalhador, para que fosse possível perceber se aqueles, ao longo de todas as suas carreiras, estiveram, ou não, sujeitos a esse regime; 5. Sendo que, para poder responder à informação requerida seria necessário elaborar documentos administrativos novos dos quais decorresse, ainda que sumariamente, toda essa informação que o requerente solicitou; 6. Ou seja, o recorrente pediu à recorrida que emitisse um documento novo, que não existe, do qual resulta o sumário da informação que solicitou relativa a todos aqueles docentes e constante de diversos outros documentos administrativos que teriam de ser consultados e sumariados em um documento novo, coisa que a Lei não obriga a recorrida a fazer; 7. Por fim, o recorrente quis saber se foram ou não instaurados processos disciplinares contra aqueles sete docentes; 8. No entanto, os processos disciplinares são de natureza secreta até a acusação, nos termos do artigo 200.º da Lei Geral em Funções Publicas, pelo que, ainda que existissem processos disciplinares em curso, a recorrida não poderia prestar essa informação; 9. Acontece que, a recorrida, com a resposta que deu ao pedido de informações, respondeu que só existia mais um docente nas mesmas circunstâncias do recorrente a quem tinha sido aplicada uma sanção disciplinar; 10.Ora, a mera discordância do recorrente com essa resposta que foi dada não é fundamento para intimar a recorrida a prestar informações adicionais; 11.Por tudo isto, deverá o recurso apresentado improceder e a decisão recorrida se manter, por não merecer censura.” O Ministério Público (MP) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para os efeitos do previsto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso. O parecer do MP foi notificado às partes. Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente (cf. artigo 36.º, n.º 2, do CPTA), mas com apresentação prévia do projecto de acórdão, o processo vem à conferência da Subsecção Administrativa Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste TCAS para o competente julgamento. *** II - Delimitação do objecto do recurso.Considerando que são as conclusões de recurso a delimitar o seu objecto, nos termos conjugados dos artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicáveis “ex vi” do artigo 140.º, n.º 3, do CPTA, cumpre apreciar e decidir, resumidamente, se a decisão recorrida se encontra eivada do erro de julgamento quanto à matéria de direito que lhe vem assacado pelo Recorrente, mormente, se se mostra acertado o julgamento de que a pretensão informativa nos autos requerida, a título de não procedimental, implica, não o singelo acesso a documentos administrativos pelos meios elencados nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 13.º da Lei n.º 26/2016, de 22/08 (doravante, referida apenas por LADA), mas a produção ou adaptação de documentos para satisfazer o concreto pedido informativo do Recorrente. *** III - Matéria de facto.Considerando que a fixação da matéria de facto na sentença recorrida não foi impugnada, mormente, segundo o ónus prescrito ao Recorrente pelas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, nem há lugar a qualquer alteração dessa mesma factualidade, remetemos para os termos da decisão da 1.ª instância que a decidiu, por ser suficiente a sua consideração para a apreciação do presente recurso, conforme o disposto no n.º 6 do artigo 663.º do CPC, aplicáveis tais comandos legais “ex vi” do artigo 140.º, n.º 3, do CPTA. *** IV - Fundamentação de Direito.Tendo presente o teor das conclusões de recurso, transcrevemos os seguintes excertos da sentença recorrida: “No âmbito da LADA o direito de acesso compreende, pois, os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a existência e/ou conteúdo de um documento (artigo 5.º, n.º 1, da LADA). Assim, o direito de acesso, em qualquer das suas modalidades, não envolve o direito a exigir a elaboração de documentos, mas apenas direito de aceder a documentos que existam nos arquivos da administração (artigo 13.º da LADA). É evidente, pois, que o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos – assim como a utilização do presente meio processual – não serve para compelir a Administração à fundamentação de ações ou decisões, restringindo-se o seu âmbito à consulta, à obtenção de reprodução simples ou de certidão de documentos e de informação sobre a existência ou inexistência e conteúdo de documentos na posse da Administração. Conforme dispõe o artigo 13.º, n.º 6, da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, o direito de acesso aos documentos administrativos – embora não envolva, como correlativo, o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido – implica necessariamente, para a Administração – nos termos do artigo 15.º, n.º 1, alínea d), do mesmo diploma –, o dever de, sendo esse o caso, informar o Requerente de que «não possui o documento e, se souber qual a entidade que o detém, remeter-lhe o requerimento, com conhecimento ao requerente». Ora, no caso que nos ocupa o Requerente pretende obter informação sobre se determinados docentes da universidade Requerida se encontram ou já se encontraram em regime de exclusividade. E, caso se encontrem ou tivessem encontrado em regime de exclusividade, pretende informação sobre se existe algum procedimento disciplinar em curso «tendo em vista a aplicação de uma sanção disciplinar decorrente da mesma circunstância de facto ou análogo ao presente caso do Requerente» (cf. alínea 1) do probatório). Como bem refere a Entidade Requerida, essa informação não resulta de uma simples consulta aos processos individuais dos docentes carecendo, desde logo, de uma análise dos contratos de trabalho dos mesmos. Ora, como se disse anteriormente, o direito de acesso aos documentos administrativos não envolve o dever de a Administração criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido do interessado, embora impondo, ainda assim, um dever de a Administração, nos termos do disposto no artigo 15.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, informar o Requerente - sendo esse o caso- de que não possui o documento e, se souber a entidade que o detém, remeter-lhe o requerimento, com conhecimento do requerente. Acontece que no presente caso, o Requerente não pretende, de acordo com o que foi requerido à Administração, ter acesso a um ou mais documentos em particular, mas pretende que a Administração informe sobre se sete docentes daquela universidade, por si identificados, estão ou estiveram – sem realizar qualquer circunscrição temporal - em regime de exclusividade (ou de dedicação exclusiva). Antes de mais refira-se que o regime de dedicação exclusiva na administração pública encontra-se desde logo previsto na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas bem como no Estatuto da Carreira de Docente Universitária e o mesmo comporta exceções. Acontece que a prestação da informação pretendida pelo Requerente pode impor, desde logo, quer uma análise da lei, quer dos contratos de trabalho dos docentes bem como de eventuais pedidos de autorização de acumulação de funções que tenham eventualmente sido formulados pelos mesmos. Dito de outro modo, a informação pretendida pelo Requerente não se trata de uma mera informação sobre a existência ou inexistência de documentos nem mesmo uma informação que possa ser extraída pela mera consulta/análise de um documento em concreto. (…) Não merece, pois, acolhimento, o entendimento do Requerente de que aquele apenas pretende uma eventual pesquisa e passagem de certidão donde constem os elementos requeridos. Ademais diga-se que o requerente não indicou/identificou, no requerimento apresentado à Administração, cujo teor foi dado como provado em 1), que documentos pretende, limitando-se a pedir informação sobre se aqueles docentes se encontram em regime de exclusividade, e tal informação importa a criação de um documento novo. Em suma, ao contrário do que defende o Requerente, aquele não pretende apenas uma eventual pesquisa e passagem de certidão donde constem os elementos requeridos ou a informação sobre a existência ou inexistência de um documento. A informação pretendida pelo Requerente sobre o dito «regime de exclusividade» daqueles sete trabalhadores importa, por outro lado, a criação de um documento, inadmissível ao abrigo da LADA, pelo que não merece censura a decisão de recusa proferida pela Entidade Requerida. (…) No entanto, sem prejuízo dos argumentos tecidos entre as partes relativamente ao direito de acesso a documentos nominativos, a verdade é que, como já se disse, o Requerente não requereu o acesso a documentos nominativos. Por outro lado, o que o Requerente solicitou foi a elaboração, pela Entidade Requerida, de uma informação que carece de uma atividade de análise e síntese dos processos individuais dos trabalhadores, por forma a concluir se os mesmos estão ou não sujeitos ao regime de exclusividade e tal não é admissível ao abrigo do regime da LADA (cf. artigo 13.º, n.º 6, da LADA). Para além disso, como resulta do requerimento apresentado pelo Requerente junto da Entidade Requerida, cujo teor foi dado como provado em 1) da matéria de facto assente, aquele Requereu ainda, subsidiariamente, «caso os docentes em apreço se encontrem no regime de exclusividade» que fosse prestada informação sobre se, relativamente aos mesmos, existiu ou existe algum procedimento disciplinar. Antes de mais refira-se que relativamente ao acesso a informação relativa a procedimentos disciplinares em curso aplica-se, quanto ao acesso, não a Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto (LADA), mas o regime jurídico previsto para esse procedimento, pois, como dispõe o seu artigo 1.º, n.º 4, alínea b), a LADA «não prejudica a aplicação do disposto em legislação específica, designadamente quanto: (…) à instrução tendente a aferir a responsabilidade (…), disciplinar». E, de acordo com o artigo 200.º, n.º 1, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas «O processo disciplinar é de natureza secreta até à acusação, podendo, contudo, ser facultado ao trabalhador, a seu requerimento, para exame, sob condição de não divulgar o que dele conste». Só depois de finalizado o procedimento disciplinar, o acesso será realizado ao abrigo da LADA, havendo que ter em conta, então, eventual matéria sujeita a reserva, nos termos das restrições previstas no seu artigo 6.º, facultando-se o acesso com expurgo da matéria reservada (cf. artigo 6.º, n.º 8 da LADA) [neste sentido vide parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos n.º 27/2025, de 15-01-2025, proc. 1110/2024]. Dito isto importa antes de mais referir que não cabe, evidentemente, ao Tribunal aferir para efeitos de intimação da Administração a prestar informação – se tais elementos não constarem dos autos – se um determinado processo disciplinar se encontra pendente ou findo e se foi já ou não proferida acusação, para efeitos de aferição do regime aplicável ao acesso à informação. Para além disso, a Entidade Requerida informou o Requerente que «tanto quanto é do conhecimento da UAc, apenas um docente desta casa, além de V. Exa., teve um comportamento comparável ao acima referido, tendo sido tratado da mesma forma, sem qualquer discriminação, i.e., foi-lhe instaurado um processo disciplinar desta natureza apenas contra quem a Universidade dos Açores detetou como tendo agido daquela forma» (cf. alínea 2) do probatório). Ou seja, a Entidade Requerida prestou informação de que existe apenas um docente ao qual foi instaurado um processo disciplinar de idêntica natureza, pelo que se terá de concluir que a Administração prestou a informação requerida (mesmo que o próprio Requerente tivesse indicado que apenas pretendia a informação sobre processos disciplinares relativamente aos trabalhadores identificados no requerimento caso os mesmos se encontrassem no dito «regime de exclusividade»). O que acontece é que o Requerente não concorda com a informação prestada e essa discordância não é razão suficiente para intimar a Requerida a prestar informações adicionais. De resto, a existirem eventuais procedimentos disciplinares em curso, nos quais não tenha sido deduzida acusação, a Administração não pode sequer prestar informação sobre a sua existência, atendendo à natureza secreta dos mesmos (artigo 200.º da LGTFP)” *** Desde já adiantamos que a sentença recorrida não merece qualquer censura.A LADA instituiu o regime de acesso aos documentos administrativos e à informação administrativa, não procedimental, resultando do seu artigo 5.º, n.º 1, que “Todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo.” (destaque nosso). Por seu turno, o artigo 13.º, n.º 1, alíneas a) a c), da LADA, é cristalino quando define que o direito de acesso aos documentos administrativos é exercido pelos seguintes meios: “a) Consulta gratuita, eletrónica ou efetuada presencialmente nos serviços que os detêm; b) Reprodução por fotocópia ou por qualquer meio técnico, designadamente visual, sonoro ou eletrónico; c) Certidão.” (destaques nossos). Isto significa que o direito de acesso dos interessados à informação não procedimental deve conter-se nos limites traçados pelos citados comandos legais, ou seja, o acesso abrange documentos administrativos e informação administrativa concreta, porque já produzida/existente e inserta no competente suporte documental, ao qual poderão os interessados aceder pelos meios de consulta, reprodução e certidão, mas sempre por referência a um documento preciso, determinado e objectivamente já elaborado. Nisto se consubstancia, portanto, o direito de informação sobre a existência e o conteúdo do documento, se existente, e não mais do que isso. Ou então, a informação negativa de que o documento pretendido inexiste nos arquivos da entidade requerida ou que pode ser acedido noutra entidade, se conhecida. Acontece que o ora Recorrente, com o pedido que apresentou, não solicitou a consulta, a reprodução ou a certidão deste ou daquele preciso documento (já existente), que, objectivamente, não especificou no requerimento administrativo, nem, muito menos, no requerimento inicial que despoletou o presente processo de intimação. Isto é, por omissão do próprio Recorrente, a ora Recorrida ficou sem saber quais os arquivos ou/e documentos pré-constituídos que, em concreto, pretendia o interessado aceder, ou quais os precisos documentos a partir dos quais almejava alguma informação sobre a sua existência e/ou o seu conteúdo. Mas não só. A complexificação da informação pretendida pelo ora Recorrente (saber se os identificados sete docentes estão ou estiveram em regime de exclusividade e em que períodos; e saber se, desses docentes em exclusividade, se contra os mesmos foram despoletados processos disciplinares - se instaurados -, aos quais a sentença recorrida entendeu, e bem, que já demandaria da entidade requerida a tarefa exploratória de averiguar se teria sido deduzida acusação, ou não, por forma a ter em conta a natureza secreta do processo disciplinar, atento o previsto no artigo 200.º, n.º 1, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas) já não traduz o mero acesso a documentos administrativos nos moldes atrás delimitados, porquanto, para ser prestada, implicaria para a ora Recorrida não só a mera manipulação de vários processos/arquivos administrativos (os processos individuais/disciplinares de cada um dos servidores – se especificamente identificados pelo Recorrente - que não foram), mas também a análise, interpretação e concatenação de vários elementos informativos contidos nos respectivos suportes documentais, dos quais teria ainda de extrair a devida interpretação factual-jurídica, ou seja, dos mesmos tendo que retirar “conclusões ou juízos de valor” ou “esclarecimentos” para satisfazer o requerimento do ora Recorrente por intermédio de um novo documento a produzir autonomamente. E, a ser assim, tal actividade da Recorrida extravasaria em muito o que se deve conter no estrito direito de acesso a documentos administrativos existentes, acessíveis pela consulta, reprodução e certidão. Neste mesmo sentido, convocamos em nosso apoio o acórdão do STA de 18/05/2017, proferido no processo sob o n.º 0470/17, consultável em www.dgsi.pt, do qual destacamos o seguinte excerto: “Por sua vez, o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, que corresponde ao direito à informação não procedimental, compreende a consulta de documentos administrativos, a reprodução do seu teor e a informação sobre a sua existência e conteúdo (cf. art.º 5.º, da LADA), cabendo ao requerente optar por uma das formas de acesso previstas no art.º 11.º, n.º 1, da LADA (consulta gratuita nos serviços que detém o documento, certidão ou reprodução por fotocópia). Assim, este direito tem por objecto documentos existentes em poder da Administração, não podendo servir para lhe impor a produção de novos documentos nem para esclarecer questões respeitantes a uma anterior actuação administrativa. Por isso, como se decidiu no Ac. deste STA de 25/3/2015 — Proc. n.º 0179/15, o direito de acesso a documentos administrativos ao abrigo da LADA não é exercitável para a obtenção de explicações, justificações, conclusões ou juízos de valor.” – (destaques nossos). Na senda do atrás exposto, melhor estaria a posição do Recorrente se, em vez de formular tal requerimento, tivesse requerido a consulta, reprodução ou certidão de documentos já produzidos e que lhe interessasse conhecer, desde que identificados de modo preciso e materialmente patentes nos processos individuais e nos eventuais processos disciplinares (que também os deveria identificar) de cada um dos docentes, assim contribuindo para a satisfação do almejado direito de acesso informativo e de modo a alcançar informação sobre a existência e conteúdo dos mesmos. E, aí sim, uma vez munido desses documentos, poderia então o ora Recorrente interpretá-los e extrair as “conclusões ou juízos de valor” que bem entendesse, designadamente, que outros docentes também estariam, ou estiveram (ou não), em regime de exclusividade, e que a outros docentes, nas mesmas circunstâncias, foram instaurados processos disciplinares (ou não). Mas não é, com certeza, à ora Recorrida que compete produzir a informação tal como requerida pelo ora Recorrente, pois que, como atrás dissemos, é uma actuação que, nesta temática, é inexigível à Administração, visto que, por um lado, como dito, extravasa as formas de acesso aos documentos administrativos enunciadas nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 13.º da LADA, e, por outro lado, a entidade requerida também “não tem o dever de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido”, sobretudo, quando isso, desproporcionadamente, envolva algo mais que “a simples manipulação dos mesmos”, conforme decorre do n.º 6 do mesmo comando legal. Em síntese, é o que aqui acontece com o pedido informativo do ora Recorrente, que exigiria da ora Recorrida, não só a simples manipulação dos documentos inclusos nos competentes processos individuais ou/e (eventuais) processos disciplinares, que o Recorrente, frisa-se, nem sequer os especificou, mas também a criação desproporcionada de um novo documento, “ad hoc”, para satisfazer um pedido que, como já deixámos plasmado, bem poderia ser alcançado pela consulta, reprodução e certidão de elementos documentais (se especificados), ante os quais as “conclusões ou juízos de valor” (nomeadamente, jurídicos) ao Recorrente competia dos mesmos retirar. A propósito, já este TCAS, no processo sob o n.º 252/22.5BEBJA, emitiu acórdão, em 23/11/2023, consultável em www.dgsi,pt, do qual enfatizamos o ponto III do seu sumário, como segue: “III - Se o pedido de informação, no momento em que foi formulado, não visou o acesso a documentos existentes na posse do Requerido, mas informação sobre a instauração ou não de um procedimento administrativo, nem obter certidão da inexistência de um qualquer documento, mas o acesso a um documento futuro ou incerto, o mesmo não consubstancia um efectivo pedido de informação de informação não procedimental e a acção de intimação não pode proceder.” (sublinhados nossos). E ainda o acórdão deste mesmo TCAS, de 30/01/2025, tirado no processo sob o n.º 12744/24.7BELSB (no qual o ora Relator também interveio nessa mesma qualidade), disponível para consulta em www.dgsi.pt, do qual focamos os pontos II e III do seu sumário, nos seguintes termos: “II - O direito de acesso aos documentos administrativos, enunciado na LADA, depende, respectivamente, de elementos documentais que tenham sido já produzidos, isto é, da existência de documentos pré-constituídos. III - Sobre o interessado na pretensão informativa impende o ónus de identificar quais os concretos documentos administrativos que pretende conhecer, enumerando-os, ainda que de modo minimamente indiciário, nomeadamente, pela autoria, data de elaboração ou serviço concretamente detentor do mesmo (qual o serviço de arquivo, por exemplo), de modo a que, cooperando com a Administração, também contribua para a profícua satisfação do seu pedido informativo.” (sublinhados nossos). Ora, bem se constata que o Recorrente, atento o requerimento informativo que deduziu, não cumpriu minimamente tal ónus de identificação documental. Tendo presente todo o exposto, temos, pois, de concluir que o recurso “sub judice” não merece provimento, devendo ser confirmada a sentença recorrida. *** Custas a cargo do Recorrente – cf. artigos 527.º, n.º 1, do CPC, 1.º e 189.º do CPTA, 7.º, n.º 2, e 12.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, do RCP.*** Em conclusão, é elaborado sumário, nos termos e para os efeitos do estipulado no artigo 663.º, n.º 7, do CPC, aplicável “ex vi” do artigo 140.º, n.º 3, do CPTA, nos seguintes moldes:I - O direito de acesso a informação não procedimental, enunciado na LADA, depende, respectivamente, de elementos documentais que tenham sido já produzidos, isto é, da existência de documentos pré-constituídos. II - Sobre o interessado na pretensão informativa impende o ónus de identificar os concretos documentos administrativos aos quais pretende aceder ou obter informação sobre a existência e conteúdo dos mesmos (pelos meios de consulta, reprodução ou certidão), enumerando-os, ainda que de modo minimamente indiciário, nomeadamente, pela autoria, data de elaboração ou serviço concretamente detentor do mesmo (qual o serviço de arquivo, por exemplo), de modo a que, cooperando com a Administração, também contribua para a profícua satisfação do seu pedido informativo. III - No âmbito da satisfação do direito de acesso à informação não procedimental, não cabe à Administração produzir ou adaptar novos documentos, não se admitindo que o processo de intimação, nesta vertente, seja utilizado para a obtenção de explicações, justificações, conclusões ou juízos de valor. *** V - Decisão.Ante o exposto, os Juízes-Desembargadores que compõem a Subsecção Administrativa Comum da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida. Custas a cargo do Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 18 de Junho de 2025. Marcelo Mendonça – (Relator) Joana Costa e Nora – (1.ª Adjunta) Ricardo Ferreira Leite (2.º Adjunto) |