| Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 294/11.6BECTB | 
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| Secção: | CA | 
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| Data do Acordão: | 10/09/2025 | 
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| Relator: | HELENA TELO AFONSO | 
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| Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA | 
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| Sumário: | I – Só ocorre a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, que são todas as que lhe forem submetidas à sua apreciação e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (cfr. art.º 608.º, nº 2, do CPC). II – Desta forma o Tribunal a quo não estava obrigado a pronunciar-se sobre o acórdão arbitral, designadamente, sobre a validade do contrato de concessão ou sobre as consequências da mencionada nulidade relativamente aos contratos de fornecimento de água e de recolha de efluentes, não tendo ocorrido a invocada omissão de pronúncia. III – Como já decidido, por diversos tribunais desta jurisdição, o conhecimento da questão da nulidade do contrato de concessão e/ou dos contratos de fornecimento de água e recolha de efluentes, ou ainda das consequências da declaração de nulidade do contrato de concessão nestes contratos configuraria a prática de um ato inútil – cfr. artigo 130.º do CPC – pois mesmo que se viesse a concluir pela nulidade do contrato de concessão, e, em consequência pela invalidade dos contratos de fornecimento e recolha, tal não implicaria qualquer modificação da sentença recorrida, subsistindo o dever de pagar tais serviços. | 
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| Votação: | Unanimidade | 
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| Indicações Eventuais: | Subsecção de Contratos Públicos | 
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| Aditamento: |  | 
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| Decisão Texto Integral: | I – Relatório: Águas do Vale do Tejo, S.A., que sucedeu ope legis, a Águas do Zêzere e Coa, S.A., instaurou a presente ação administrativa contra o Município do Fundão, na qual peticionou a condenação do Município no pagamento de € 384.097,92 (trezentos e oitenta e quatro mil e noventa e sete euros e noventa e dois cêntimos), relativos à prestação de serviços de abastecimento de água e de recolha de efluentes prestados pela AZC ao réu; o valor de € 8.015,97 (oito mil e quinze euros e noventa e sete cêntimos), a título de juros de mora vencidos até ao dia 29 de abril de 2011, perfazendo a importância global de € 392.133,89 (trezentos e noventa e dois mil cento e trinta e três euros e oitenta e nove cêntimos); e do montante que se mostrar devido a título de juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento. Por sentença proferida a 6 de março de 2025, foi a presente ação julgada procedente e, em consequência, condenado o réu a pagar à autora o valor de € 384.097,92, acrescido de juros de mora vencidos até 29/04/2011, no valor de € 8.015,97, e de juros vincendos, calculados à taxa dos juros de mora aplicáveis às dívidas ao Estado até efetivo e integral pagamento. Inconformado, o réu interpôs recurso, tendo na sua alegação de recurso, formulado as seguintes conclusões: “1.	O Tribunal a quo, parte da existência de um Contrato de Concessão celebrado entre o Estado português e a Autora, ao abrigo do qual são celebrados, entre a Autora e o ora Recorrente, os Contratos de Fornecimento e Recolha em crise nos presentes autos. B)	A jurisprudência e a doutrina são consensuais no sentido de que as questões cuja falta de apreciação pelo tribunal é suscetível de a gerar identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23/5/2022, proferido no processo n° 588/14.9TVPRT, e Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. 5°, pág. 143). F) A propósito de matéria idêntica à dos presentes autos - que a sentença recorrida não se pronunciou sobre a questão da nulidade do contrato de concessão, nem sobre as consequências para os contratos de fornecimento e de recolha dessa declaração da nulidade - já se pronunciou a decisão sumária proferida, em 25 de março de 2019, no processo n° 487/08.3 BECTB - 2° Juízo - 1a Secção - pelo TCA Sul - Desembargadora Relatora: Catarina Jarmela - em que era recorrente o aqui MUNICÍPIO DO FUNDÃO, que decidiu no sentido de que, não tendo sido levantada qualquer questão relativa à validade do contrato de concessão e/ou dos contratos de fornecimento e de recolha nem ter sido indicado nas alegações de recurso qualquer razão de facto e/ou de direito que fundamentasse tal declaração de nulidade, não podia ser conhecida na sentença recorrida - razão pela qual aí não foi analisada -, nem podia ser apreciada no (...) recurso jurisdicional (cfr. art. 264°n.° 1, do CPC de 1961, e art. 5° n.° 1, do CPC de 2013), além de que o conhecimento de tal questão era inútil - e sendo certo que, de acordo com o estatuído no art. 130°, do CPC de 2013, não é lícito realizar no processo atos inúteis -, pois, mesmo que se viesse a concluir pela nulidade do contrato de concessão e, em consequência, pela invalidade dos contratos de fornecimento e de recolha, tal não implicaria qualquer modificação na sentença recorrida (na qual o réu foi condenado a pagar à autora as importâncias relativas aos serviços prestados - fornecimento de água e saneamento - e respectivos juros de mora), ou seja, tal nulidade não tem qualquer influência na exequibilidade da sentença recorrida. 
 G) Também nos presentes autos tal questão não podia ser conhecida na sentença recorrida, nem pode ser apreciada no presente recurso jurisdicional, pois não foi invocada na contestação, sendo antes uma questão que o Recorrente se lembrou de trazer agora em sede de recurso sem indicação de qualquer razão de facto e/ou de direito que fundamente tal declaração de nulidade, o que gera a improcedência do presente recurso jurisdicional. SEM PRESCINDIR, H) Ao invés do que o Recorrente pretende fazer crer, a decisão do Tribunal Arbitral não se reporta à nulidade do Contrato de Concessão e às consequências dessa nulidade sobre os contratos de fornecimento e recolha, mas antes à “interpretação ou execução” do Contrato de Recolha de Efluentes - Cfr. al. c) do ponto 11, pág. 8 do Acórdão -. I) De facto, o Recorrente sabe perfeitamente que a decisão do Tribunal Arbitral, que juntou aos autos em 26 de janeiro de 2023, não se reporta à nulidade do Contrato de Concessão e às consequências dessa nulidade sobre os contratos de fornecimento e recolha, uma vez que o Recorrente, juntamente com os Municípios de Almeida, Guarda, Pinhel e Sabugal, interpôs no Tribunal Arbitral ação que teve por objeto a declaração de nulidade do Contrato de Concessão subscrito, em 15 de setembro de 2000, pelo Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território e a sociedade Águas do Zêzere e Côa, bem como os Contratos de Fornecimento, Recolha e Valorização e Cedência de Infraestruturas, tendo o Tribunal Arbitral, em 14 de janeiro de 2021, declarado que era incompetente para decidir - ex professo - sobre a validade do Contrato de Concessão, por os Demandantes não serem partes no referido Contrato, avançando, posteriormente, para o conhecimento da invocada nulidade dos contratos celebrados entre os Demandantes e a Demandada (Contratos de Fornecimento, Recolha e Valorização e Cedência de Infraestruturas), ainda que para decidir essa nulidade tivesse que incidentalmente apreciar a invocada nulidade do Contrato de Concessão, sendo que o Tribunal Arbitral decidiu que os vícios invocados pelos Demandantes não eram suscetíveis de gerar a nulidade do contrato de concessão, concluindo pela declaração de caducidade do direito à ação, na medida em que todos os vícios invocados relativamente ao Contrato de Concessão são - se se viessem a provar - geradores de anulabilidade, tendo o prazo de impugnação da validade do Contrato já caducado. J)	O recurso interposto desta decisão por tais Municípios foi julgado improcedente por douto acórdão proferido, em 13 de setembro de 2023, pelo TCA Sul no Proc. n° 68/21.6BCLSB, já transitado em julgado. L) Na situação vertente, o Recorrente juntou aos autos um documento sem ter alegado concretamente qual o direito ou facto que por meio do mesmo pretendia ver demonstrado ou infirmado. M) Ora, estando a parte interessada na junção de um documento quando todos os articulados já foram apresentados, deve indicar os factos concretos que pretende demonstrar com o documento e, além disso, aludir ao objeto do processo que o justificam, não tendo, porém, nada disto sido efetuado pelo Recorrente, logo não pode vir dizer que o mesmo é essencial à descoberta da verdade. N) Efetivamente, desconhecendo-se que concretos factos pretendia o Recorrente provar com a junção do acórdão do Tribunal Arbitral, não pode considerar-se que esse documento respeite a factos incluídos na globalidade da matéria de facto carecida de prova, pelo que também por esta via o recurso deve ser julgado improcedente. O) A douta sentença recorrida não violou os preceitos legais invocados.”. 
 *II. Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pelo Município do Fundão delimitadas pela alegação de recurso e respetivas conclusões, são as de decidir se a sentença recorrida incorreu em nulidade por omissão de pronúncia sobre a decisão do Tribunal Arbitral proferida a 23/01/2023 e se incorreu em erro de direito na interpretação do disposto no n.º 1 do art.º 134.º do CPA. III – Fundamentação: 3.1. De facto: Na sentença recorrida foi julgada a matéria de facto com interesse para a decisão, nos seguintes termos: “Provaram-se os seguintes factos: 1) Em 15/09/2000 a autora e o Estado português assinaram um documento designado por “CONTRATO DE CONCESSÃO”, com o teor que consta do documento n.° 2, da petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido, e do qual consta o seguinte: «(...) Cláusula 1.ª1.	O concedente atribui à concessionária, em regime de exclusivo, a concessão da exploração e gestão, as quais abrangem a concepção, a construção das obras e equipamentos, bem como a sua exploração, reparação, renovação e manutenção, nos termos da cláusula 23.ª, do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Alto Zêrere e Côa para captação, tratamento e distribuição de água para consumo público e para recolha, tratamento e rejeição de efluentes dos municípios de Almeida, Belmonte, Covilhã, Figueira de Castelo Rodrigo, Fundão, Guarda, Manteigas, Meda, Penamacor, Pinhel e Sabugal, que foi criado pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 121/2000, de 4 de Julho (adiante designado por sistema). (Conteúdo) (...)A concessionária adoptará e executará, tanto na construção das infra-estruturas como na correspondente exploração do serviço concedido, o esquema financeiro constante do estudo económico constituído pelo Anexo 3, o qual se baseia nas seguintes fontes de financiamento: Cláusula 14.ª (Financiamento) a) O capital da concessionária; b) As comparticipações financeiras e os subsídios atribuídos à concessionária; c) As receitas provenientes das tarifas ou dos valores garantidos cobrados pela concessionária; d) Quaisquer outras fontes de financiamento, designadamente empréstimos. Cláusula 15.ª1.	As tarifas ou valores garantidos serão fixados por forma a assegurar a protecção dos interesses dos utilizadores, a gestão eficiente do sistema, o equilíbrio económico- financeiro da concessão e as condições necessárias para a qualidade do serviço durante e após o termo da concessão. (Critérios para a fixação das tarifas ou valores garantidos) (...) Cláusula 16.ª1. Os valores mínimos (a corrigir em cada ano de acordo com a variação do índice de preços no consumidor, divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística em relação ao ano anterior) a receber anualmente pela concessionária como condição do equilíbrio económico-financeiro da concessão são garantidos pelos utilizadores e resultarão da aplicação aos caudais anuais que constam do Anexo 4 da tarifa adoptada para o respectivo ano no estudo de viabilidade económico-financeira que constitui o Anexo 3. (Fixação das tarifas ou valores garantidos) 2. Enquanto não for possível proceder à medição dos caudais, por razões de ordem técnica, designadamente decorrente da articulação dos sistemas municipais com as condutas e os interceptores do sistema, os valores a receber pela concessionária coincidirão com os valores mínimos a que se refere o número 1. 3. Os valores fixados no número anterior serão sempre sujeitos a uma primeira revisão à data do início da exploração da integralidade do sistema, de acordo com os princípios do estudo económico constante do Anexo 3 e tendo em consideração, designadamente, os seguintes critérios: a) Montante do investimento global efectivamente realizado; b) Montante do investimento global realizado e efectivamente comparticipado por subsídios não reembolsáveis; c) Alteração de outros pressupostos do estudo económico não imputável à concessionária. 4. A concessionária procederá à medição dos caudais logo que o concedente, ouvidos a concessionária, os municípios utilizadores e o IRAR, reconheça estarem criadas por cada um dos municípios utilizadores todas as condições de afectação dos caudais ao sistema, tanto no que respeita a cada um dos sistemas municipais como às ligações destes com as adutoras e os interceptores do sistema. 5. No ano de arranque da medição dos caudais de fornecimento de água e dos caudais de efluentes, o preço do metro cúbico de água e o preço do metro cúbico de efluente será determinado, no final do ano pelo quociente resultante da divisão do valor mínimo a receber nesse ano pela concessionária, nos termos dos números anteriores e para o conjunto dos utilizadores, pelo número total de metros cúbicos medidos para o conjunto dos utilizadores, sendo a facturação desse ano corrigida de acordo com a medição efectiva de cada um e a facturação dos anos anteriores corrigida em função da percentagem de cada um dos utilizadores na medição total desse ano de arranque. A correcção da facturação respeitante a todos os anos determinará entregas, durante um prazo máximo de dois anos, por parte dos utilizadores que tenham de completar os seus pagamentos anteriores, com imediata reversão a efectuar pela concessionária - que não poderá ficar prejudicada por quaisquer eventuais onerações, fiscais ou outras - para os utilizadores que tenham anteriormente procedido a pagamentos superiores aos resultantes da correcção. (...)» - 2.° facto assente. 2) Em 15/09/2000 a autora e o réu assinaram um documento designado por “CONTRATO DE FORNECIMENTO”, com o teor que consta do documento n.° 3, da petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido, do qual consta o seguinte: «(…) Cláusula 1.ª1.	A Sociedade obriga-se a fornecer água ao Município, destinada ao abastecimento público, nos termos e de acordo com as condições previstas no contrato de concessão, adiante como tal designado, celebrado entre o Estado e a Sociedade relativo à atribuição da concessão da exploração e gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e saneamento do Alto Zêzere, criado pelo artigo 1º do Decreto-Lei n° 121/2000, de 4 de Julho, adiante designado, abreviadamente, por "Sistema". (…) Cláusula 3.ª1. O regime tarifário a aplicar ao Município, reger-se-á pelo estabelecido no contrato de concessão. (…) 4. Os valores mínimos garantidos a entregar pelo Município, os quais constituem uma condição essencial do equilíbrio da concessão, são os fixados no Anexo 1. Até 31 de Dezembro de 2004, os valores mínimos fixados no anexo 1 poderão não ser garantidos, sem prejuízo da cláusula 16.ª do contrato de concessão. 5. O Município garante à Sociedade o pagamento dos mínimos fixados no Anexo 1 para os sucessivos anos de utilização do Sistema, de acordo com as tarifas aplicáveis nos termos do n.º 1 da cláusula 4ª, nº 2, com excepção das situações em que haja acordo com outro ou outros utilizadores, que pressuponha a alteração daqueles mínimos, e sem prejuízo do pagamento de todos os caudais verificados cujo valor ultrapasse esses mínimos. 6. As facturas referentes a débitos de consumo, bem assim como as relativas a quaisquer outros fornecimentos ou serviços prestados, serão pagas pelo município na sede da concessionária até sessenta dias após a data da facturação. 7. Em caso de mora no pagamento das facturas, estas passarão a vencer juros de mora nos termos da legislação aplicável às dívidas do Estado, com a taxa prevista na mesma legislação, sem prejuízo de a sociedade poder recorrer às instâncias judiciais como forma de obter o ressarcimento dos seus débitos, bem como de exercer os demais direitos previstos no contrato de concessão. (…) Cláusula 4.ª1. A medição e facturação de água consumida, serão efectuadas nos termos constantes do Аnехо 2: 2. O Município adoptará tarifários de venda de água aos seus consumidores que se adequem à cobertura dos seus encargos perante a Sociedade. (…) CONTRATO DE FORNECIMENTO1.1. A quantidade de água a facturar nas condições do presente contrato será determinada pela contagem feita nos primeiros dez dias úteis de cada mês nos contadores ou medidores colocados nos locais de fornecimento previamente definidos. Аnехо 2 Medição e Facturação da Água Consumida 1.2. Quando o valor do consumo efectivo do Município, em cada ano, seja inferior ao mínimo fixado no Anexo 1, a facturação de Janeiro será acrescida da importância necessária para perfazer o pagamento total anual do valor mínimo garantido estabelecido. 2.1. Considerar-se-á avariado um contador ou medidor a partir do momento em que, sem motivo justificado, o mesmo haja começado a registar consumos que, face ao seu registo habitual e à época da ocorrência, se possam considerar anormais. 2.2. No caso de avaria, dano, deterioração ou desaparecimento do contador ou medidor, o volume de água presumivelmente consumido será determinado pela média dos consumos dos vinte dias anteriores à data em que presumivelmente tenha ocorrido a situação. (…)” - 5. °, 7.º a 9.º factos assentes. 3) Em 15/09/2000 a autora e o réu assinaram um documento designado por “CONTRATO DE RECOLHA”, com o teor que consta do documento n.° 4, da petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido, do qual consta o seguinte: «(...) Cláusula 1ª1. A Sociedade obriga-se a recolher efluentes provenientes do sistema próprio do Município, nos termos e de acordo com as condições previstas no contrato de concessão, adiante como tal designado, celebrado entre o Estado e a Sociedade e relativo à atribuição da concessão da exploração e gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e saneamento do Alto Zêzere e Côa, criado pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n° 121/2000, de 4 de Julho, adiante designado abreviadamente por Sistema. (...) Cláusula 3ªl. O regime tarifário e o regime de facturação e de pagamentos a aplicar ao Município, respeitantes à recolha de efluentes, reger-se-ão pelo estabelecido no contrato de concessão. (…) 4. Os valores mínimos garantidos a entregar pelo Município, os quais constituem uma condição essencial do equilíbrio da concessão, são os fixados no Anexo 1. Até 31 de Dezembro de 2004, os valores mínimos fixados no anexo 1 poderão não ser garantidos, sem prejuízo da cláusula 16.ª do contrato de concessão. 5. A facturação será apresentada mensalmente e, quando, nos termos previstos no contrato de concessão, não resultar de medição, corresponderá a um duodécimo dos valores mínimos anuais previstos no mesmo. 6. As facturas referentes a débitos de recolha de efluentes, bem assim coino as relativas a quaisquer outros fornecimentos ou serviços prestados, serão pagas pelo utilizador na sede da concessionária até sessenta dias após a data da facturação. (...) 7. Em caso de mora no pagamento das facturas, estas passarão a vencer juros de mora nos termos da legislação aplicável às dívidas do Estado, com a taxa prevista na mesma legislação, sem prejuízo de a sociedade poder recorrer às instâncias judiciais como forma de obter o ressarcimento dos seus débitos, bem como de exercer os demais direitos previstos no contrato de concessão. (…) Cláusula 5.ª1. A medição dos efluentes recolhidos, quando efectuada, sê-lo-á nos termos constantes do contrato de concessão e do Anexo 2 ao presente contrato. (…) CONTRATO DE RECOLHA(...) ANEXO 2 Medição dos Efluentes 1. Os medidores serão colocados nos locais próximos dos órgãos de ligação técnica entre o sistema multimunicipal e o sistema municipal, incluindo-se nestes órgãos os colectores de ligação integrados nos sistemas municipais, sendo tais locais determinados pela Sociedade, em função das razões técnicas atendíveis e após audição do Município. 2. Considerar-se-á avariado um medidor a partir do momento em que, sem motivo justificado, o mesmo haja começado a registar consumos que, face ao seu registo habitual e à época da ocorrência, se possam considerar anormais. (…) 3. No caso de avaria, dano, deterioração ou desaparecimento do medidor, o volume de efluentes presumivelmente recolhido será determinado pela média dos consumos do mês anterior à data em que presumivelmente tenha ocorrido a situação. (...)» - 6. ° 7. ° a 9. ° factos assentes. 4) Em execução dos contratos descritos nos pontos precedentes a autora, desde então, fornece ao réu água e presta-lhe serviços de saneamento, recolha e tratamento de efluentes - 10.° facto assente. 5) A autora no âmbito do contrato de fornecimento descrito em 2) emitiu as seguintes faturas: i) n° 3040384546, relativa ao período de 4 de outubro a 3 de novembro, datada de 09/11/2010, com vencimento assinalado em 08/01/2011, num volume total de 172.635 m3 (x € 0,6009/m3), com um valor de €103.736,37 (mais IVA no montante de € 6.224,18), onde tal valor (mais IVA) foi contabilizado, mais a taxa de recurso hídricos no valor de €2.91753, num total de €112.878,08 -10.° e 12.° factos assentes; ii) n° 3040384579, datada de 10/12/2010, relativa ao período de 3 de novembro a 02 de dezembro de 2010, com vencimento assinalado em 08/02/2011, num volume total de 148.310 m3 (x €0,6009/m3), com um valor de €89.121,29 (mais IVA no montante de €5.347,28), onde tal valor (mais IVA) foi contabilizado, mais a taxa de recurso hídricos no valor de €2.506,44, num total de €96.975,01 - 10.° e 14.° factos assentes. 6) A autora no âmbito do contrato de recolha descrito em 3) emitiu as seguintes faturas; i) 3040384562, datada de 09/11/2010, relativa ao período de período de 1 de Julho a 3 de Agosto de 2010 e à recolha e tratamento de efluentes das ETAR's de Atalaia do Campo, Barroca, Silvares, Fundão, Capinha, Escarigo, Orca, Castelejo, Soalheira, Janeiro de Cima, Lavacolhos e Bogas de Cima, com vencimento assinalado em 08/01/2011, num volume total de 113.372 m3 (x € 0,6642/m3), com um valor de €70.799,07 (mais IVA no montante de €4.247,94), onde tal valor (mais IVA) foi contabilizado, mais a taxa de recurso hídricos no valor de €623.55, num total de €75.670,56 -10.º e 13.° factos assentes; ii) ii) 3040384595, datada de 10/12/2010, relativa ao período de 03 de novembro a 01 de dezembro de 2010 e à recolha e tratamento de efluentes das ETAR's de Atalaia do Campo, Barroca, Silvares, Fundão, Capinha, Escarigo, Orca, Castelejo, Soalheira, Janeiro de Cima, Lavacolhos e Bogas de Cima, com vencimento assinalado em 08/02/2011, num volume total de 146.689 m3 (x € 0,6642/m3), com um valor de € 92.233,47 (mais IVA no montante de €5.534,01), onde tal valor (mais IVA) foi contabilizado, mais a taxa de recursos hídricos no valor de €806,79, num total de €98.574,27 -10.° e 15.° factos assentes – 10.º e 17.º factos assentes. 7) O réu não pagou as faturas descritas em 5) e 6) - 11.° facto assente. 8) A autora prestou os serviços e forneceu os bens nos volumes referidos nas faturas identificadas em 5) e 6) - resposta ao quesito único [cf. fundamentação infra]. **Os factos assentes nos pontos l.°, 3.°, 4.°. - cf. despacho proferido em sede de saneamento - são matéria de direito, pelo que não estão incluídos na matéria de facto. Quanto ao único quesito [ponto 8), da matéria de facto], a convicção ], a convicção do tribunal quanto à sua veracidade dos factos assenta no depoimento de A… (engenheiro, funcionário da prestadora de serviços para a autora desde a sua fundação), o qual se mostrou congruente com os depoimentos dos funcionários da autora: H…, F…, J…, B…, J…, E…. Os depoimentos foram prestados de forma objetiva, clara, revelando um conhecimento direito e detalhado do modo de funcionamento das operações da autora. Os depoimentos foram, ainda, coerentes com os autos de medicação anexos às faturas apresentadas com a petição inicial, bem com os documentos n.° 22, n.° 7 e com os certificados de calibração juntos aos autos. Os depoimentos de F… e M…, trabalhadoras do réu, não abalaram a convicção gerada pelos meios de prova supra indicados, na medida em que deles não resultou um conhecimento direto das operações da autora, nem quanto às medições, nem quanto ao modo de funcionamento dos aparelhos de medição nem quanto às circunstâncias que concretamente (e não em abstrato) influenciaram o resultado da medicação.”. 3.2. De Direito. Por sentença proferida a 6 de março de 2025, a fls. 2612-2623 do SITAF, foi julgada a presente ação procedente e, em consequência, condenado o réu a pagar à autora o valor de €384.097,92, acrescidos de juros de mora vencidos até 29/04/2011, no valor de €8.015,97, e de juros vincendos, calculados à taxa dos juros de mora aplicáveis às dívidas ao Estado até efetivo e integral pagamento. Por não se conformar com esta sentença veio o réu apresentar o presente recurso defendendo que a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, incorrendo em violação do artigo 612.º do CPC e que violou o regime da nulidade previsto no artigo 134.º, n.º 1 do CPA. Alegou o réu e ora recorrente que o Tribunal a quo não dispunha, como não dispõe de todos os elementos necessários ao conhecimento do mérito da causa, não sem antes se pronunciar sobre a junção aos presentes autos da decisão do Tribunal arbitral, que é essencial para a descoberta da verdade material, pelo que devia ser valorada por este Tribunal. Estamos perante uma omissão de pronúncia pois o Tribunal a quo não se pronunciou sobre questões com relevância para a decisão de mérito da causa. O Tribunal a quo não se pronunciou quanto à questão de fundo, i.e, quanto à questão da nulidade do contrato de concessão e quais as consequências da declaração da nulidade nos contratos de fornecimento e Recolha. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre quais as consequências da declaração de nulidade do contrato de concessão, quando a ação arbitral transitar em julgado. Não se pronunciou sobre quais as consequências para os contratos de recolha e fornecimento da decisão proferida em Tribunal arbitral. A matéria relativa à validade dos contratos que suportam juridicamente os pagamentos que se reclamam nos autos recorridos, mormente a validade do contrato de concessão, bem como a ilegalidade do sistema multimunicipal são matérias que deveriam ter sido conhecidas a final. No caso de o contrato de concessão e/ou de os contratos de fornecimento de água e de recolha de efluentes virem a ser declarados nulos, tal declaração terá efeitos retroativos com consequências na exequibilidade da sentença ora recorrida. A quase totalidade da relação contratual pressuposta na petição inicial e nas faturas reclamadas, está regulada no contrato de concessão. A decisão proferida em sede do tribunal arbitral acarreta consequências sobre todos os demais contratos celebrados para concretizar a referida concessão, nomeadamente os contratos de fornecimento de água e de recolha e tratamento de efluentes subjacentes à emissão das faturas cujo pagamento a A. ora recorrida reclama nos autos. Ignorar este facto, é ignorar o regime jurídico das nulidades aplicável no âmbito do direito administrativo, nomeadamente o princípio da total improdutividade de efeitos jurídicos dos atos administrativos nulos, constante do artigo 134.º, n.º 1 do CPA, norma que a decisão recorrida violou. A questão que importa apreciar e decidir é a de saber se o Tribunal a quo incorreu em nulidade por não se ter pronunciado sobre a decisão arbitral junta aos autos, quanto à questão da nulidade do contrato de concessão e quais as consequências dessa nulidade para os contratos de fornecimento e recolha subjacentes à emissão das faturas cujo pagamento a autora reclama nos presentes autos, isto é para a decisão a proferir nos presentes autos, i.e. se incorreu em violação do disposto no artigo 615.º, n.º 2, do CPC e no artigo 132.º, n.º 1 do CPA. Nos termos do artigo 615.º do Código de Processo Civil (CPC): “1 - É nula a sentença quando: (…) d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; (…).”. Só ocorre a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, que são todas as que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (cfr. art.º 608.º, nº 2, do CPC). É consabido que as questões que ao tribunal se impõe apreciar e cuja omissão é suscetível de gerar nulidade são as que as partes invocaram nos respetivos articulados e que se consubstanciam no pedido, na causa de pedir, assim como nas exceções deduzidas. Ora, no caso dos autos, atentas as posições manifestadas pelas partes nos articulados apresentados, as questões a decidir e que a sentença recorrida identificou claramente circunscrevem-se à questão de saber “se o réu está obrigado, em cumprimento dos contratos de fornecimento e recolha que celebrou com a autora, em 15/09/200, a pagar-lhe €384.097,92.” e em caso de resposta afirmativa a esta questão, importava, ainda, decidir se o réu estava obrigado a pagar à autora juros de mora calculados sobre a quantia de €384.097,92, vencidos até 29/04/2011, no montante global de €8.051,97, e juros de mora vincendos. Na referida sentença foi julgada provada a factualidade considerada relevante para a decisão do pedido formulado, efetuada a respetiva subsunção às normas jurídicas aplicáveis. Com efeito, o Tribunal a quo não estava obrigado a pronunciar-se sobre o acórdão arbitral, designadamente, sobre a validade do contrato de concessão ou sobre as consequências da mencionada nulidade relativamente aos contratos de fornecimento. Questão que não foi objeto de discussão pelas partes nos respetivos articulados. Na verdade, o réu em sede de contestação limitou-se a mencionar que corre termos em Tribunal Arbitral uma ação arbitral onde se discutiam, entre outas questões a eventual existência de um incumprimento contratual por parte da Autora, aos contratos ora em apreço, a qual na perspetiva do réu impunha a suspensão “da presente acção até ao trânsito em julgado da decisão final que vier a ser proferida em sede de recurso, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do art. 279.° do Código de Processo Civil..”. Não tendo ocorrido, assim, a invocada omissão de pronúncia – cfr. artigo 5.º do CPC. Com efeito, o ora recorrente, em 29 de novembro de 2011, apresentou requerimento pelo qual requereu “a suspensão da presente instância até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nos autos do processo que se encontra a correr termos no TAF de Castelo Branco sob o n.º 450/11.7ВЕСТВ”. A autora apresentou pronúncia no sentido da rejeição deste pedido de suspensão da instância. Este pedido foi indeferido em sede de despacho saneador proferido em 12 de abril de 2013, constante de fls. 839 e ss. do SITAF. Posteriormente em 30 de setembro de 2014, a fls. 2255 e ss. do SITAF veio requerer a junção aos autos de dois acórdãos do TCA Sul, relativos à questão da suspensão da presente instância nos termos do artigo 272.º do novo CPC. O Tribunal a quo pronunciou-se sobre este requerimento, em sede de audiência final, em despacho que consta da respetiva ata a fls. 2361 e ss do SITAF, nos seguintes termos: “O réu nada requereu, oferecendo o requerimento e documentos à disposição dos fins tidos por convenientes pelo tribunal. A questão da suspensão da presente instância até à decisão do processo n.º 450/11.7BECTB foi já apreciada e decidida nos presentes autos, os quais prosseguiram a sua tramitação. Não obstante, em relação a esta questão referira-se que o artigo 272.º do novo CPC não impõe ao juiz o dever inexorável de suspender a instância com fundamento numa causa prejudicial, referindo no n.º 1 que o juiz “pode” ordenar a suspensão, acrescentando no n.º 2 que não o deve fazer quando a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens. É o caso dos presentes autos. Com efeito, embora se reconheça a conexão entre as duas acções, importa considerar que mesmo que seja dada procedência ao pedido que o R. formula no processo n.º 450/11.7BECTB, considerando o disposto no artigo 289.º, do Código Civil, a declaração de nulidade dos contratos não pode impedir, por si só, a improcedência da pretensão formulada pela autora nos presentes autos. Com efeito, os contratos que a A. e R. celebraram são de execução continuada, pelo que o R. beneficiou do fornecimento dos bens e serviços prestados pela A., não sendo possível a sua restituição, devendo, pois, mesmo que os contratos sejam declarados nulos, pagar à A. o valor da prestação de que beneficiou [cf. acórdão do STA processo n.º 0301/08, de 17/12/2008] Deste modo, a produção de prova não representa a prática de um acto inútil, pois pode ser aproveitada mesmo que o ora R. venha a obter vencimento no processo n.º 450/11.7BECTB. (…) Assim, nos presentes autos pretende apurar-se se o valor dos bens fornecidos e dos serviços prestados pela A. ao R. é aquele que a A. facturou, e cujo pagamento peticiona, ou outro valor inferior, pelo que os autos devem prosseguir para apuramento desta questão, com a menção de que quanto mais tempo decorre mais difícil se torna a prova, aumentando o risco de perda da mesma.”. Sucede que em 27 de janeiro de 2023 a autora veio requerer a junção aos autos “da decisão proferida pelo Tribunal Arbitral” – cfr. fls. 2559 e ss. do SITAF. A autora pronunciou-se, dizendo, em síntese que “além do acórdão do Tribunal Arbitral não ter ainda transitado em julgado – facto que o Réu omite convenientemente -, a decisão proferida não integra o conceito de documento supra referido e previsto no art. 362º do C.C.”, requerendo a final que os documentos sejam desentranhados dos autos, por legalmente inadmissíveis – cfr. fls. 2563 e ss do SITAF. Por despacho de 25 de setembro de 2023, foi admitida a junção aos autos da referida decisão arbitral – cfr. 2597-2598 do SITAF. É, pois, manifesto que o Tribunal a quo não incorreu em qualquer nulidade, por omissão de pronúncia, seja processual, pronunciando-se sobre todas as questões que se lhe impunha apreciar e decidir. De todo o modo, ainda que nos autos não se tivesse demonstrado o trânsito em julgado do referido acórdão arbitral, sempre diremos, como de resto, a autora e recorrida menciona na conclusão H), da sua alegação recursória “a decisão do Tribunal Arbitral não se reporta à nulidade do Contrato de Concessão e às consequências dessa nulidade sobre os contratos de fornecimento e recolha, mas antes à “interpretação ou execução” do Contrato de Recolha de Efluentes”. Com efeito, consta do acórdão arbitral “O âmbito da arbitragem (ou, se se preferir, e como se disse antes, o objecto do litígio) ficou assim cingido à “interpretação ou execução” do Contrato de Recolha de Efluentes, sabendo-se que a sua vigência não foi além da do Contrato de Concessão, a cuja luz fora celebrado.” - Cfr. al. c) do ponto 11, pág. 8 do acórdão arbitral. Para além de que estavam em causa apenas faturas relativas aos anos de 2012, 2013 e 2014, claramente fora do âmbito temporal do pedido formulado nos presentes autos – cfr. fls. 108-109 do acórdão arbitral. Por outro lado, e como já decidido, por diversos tribunais desta jurisdição, o conhecimento da questão da nulidade do contrato de concessão e/ou dos contratos de fornecimento de água e recolha de efluentes, ou ainda das consequências da declaração de nulidade do contrato de concessão nestes contratos configuraria a prática de um ato inútil – cfr. artigo 130.º do CPC – pois mesmo que se viesse a concluir pela nulidade do contrato de concessão, e, em consequência pela invalidade dos contratos de fornecimento e recolha, tal não implicaria qualquer modificação da sentença recorrida (1-Cfr. decisão sumária, deste TCA Sul, de 25 de março de 2019, proferida no processo n.º 487/08.3BECTB, referida pela recorrida e consultada no SITAF.). Em sentido idêntico já havia decidido o STA, designadamente, em acórdão de 12 de abril de 2018, proferido no proc. n.º 0595/17, nos seguintes termos: “carece de fundamento a invocação pelo acórdão aqui recorrido de que se impunha a suspensão da instância para que se aguarde a decisão sobre a nulidade dos contratos por tal ser uma questão prejudicial. Na verdade, não se trata de uma questão prejudicial a partir do momento em que este STA em formação alargada entendeu que a nulidade do contrato não impedia a autora de reclamar do réu o «quantum» correspondente às tarifas administrativamente estabelecidas.”. E no mesmo sentido já havia sido decidido, anteriormente, no acórdão de 15 de março de 2018, proferido no proc. n.º 0775/17 (2-Tirado em recurso de Revista de acórdão do TCA Sul proferido no proc. n° 487/08.3BECTB,em 16 de fevereiro de 2017.), do qual se transcreve o seguinte excerto: “(…) em princípio, estamos perante uma causa prejudicial quando o julgamento dela pode destruir a razão de ser da outra causa; é assim, aquela que tenha por objecto pretensão que constitui pressuposto da formulada, como bem define José Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, Coimbra, vol. 1º, p. 501. Por outro lado, a ordem do tribunal, por motivo justificado, é causa da suspensão da instância - artigo 272º, nº 1 do CPC. Porém, no caso dos autos, a acção 450/11.7 não poderá nunca destruir a razão da presente acção, inclusive, porque tem vido este Supremo Tribunal a decidir que, mesmo no caso de os contratos serem nulos ou até em situações de inexistência de contratos, os Municípios têm por obrigação proceder ao pagamento das facturas decorrentes da efectiva prestação de serviços por parte das empresas concessionárias, aplicando-se aqui o princípio do enriquecimento sem causa, uma vez que, em caso de prestações de serviços efectivos, se o Município não pagar esses serviços está a usufruir indevidamente dos mesmos, ou seja, sem contrapartida, pelo que o montante devido fica ilicitamente na sua posse. Ou seja, a recente jurisprudência recente deste STA é no sentido de que – mesmo perante a nulidade dos contratos entre os Municípios e as empresas prestadoras de serviços similares – subsiste o dever de pagar tais serviços. - cfr. neste sentido o Acórdão de 04.05.2017, proferido em formação alargada do STA no processo 01209/16, onde se consignou a este propósito: «As declarações de vontade constitutivas dos contratos não têm de ser explícitas nem sincrónicas (arts. 217º e 228º e ss. do Código Civil). E, por isso, é possível surpreender um acordo entre as partes, não escrito, em comportamentos por elas voluntariamente assumidos. E essa possibilidade mostra-se efectivada «in casu». Na medida em que o réu, de modo continuado, emitia os efluentes para a autora e esta os recepcionava, deve esse estado de coisas qualificar-se – para que o direito reproduza fielmente a realidade – como um acordo entre as partes, determinativo da obrigação de recepção dos efluentes por banda da autora. No entanto, está provado que o réu «sempre» disse à autora que não se considerava obrigado a pagar-lhe qualquer preço ou tarifa por causa da recepção de tais efluentes (cfr. o facto EEE). Trata-se de um dado firme e relevante – embora esse «sempre» deva ser encarado com a restrição advinda do acordo aludido no facto GGG e que respeitou ao ano de 2005. Sabemos, assim, que o desacordo das partes não se limitou à simples determinação do preço ou tarifa (cfr. o art. 883º do Código Civil), mas que incidiu sobre a própria existência de uma contrapartida patrimonial. O que levanta a questão de saber se tal postura do município réu, negatória da onerosidade do contrato, afasta a possibilidade desse pacto, ainda que «sine forma», alguma vez ter surgido («vide», a propósito o art. 232º do Código Civil). Ora, afigura-se-nos que essa drástica solução – a de não haver um contrato oneroso em virtude do réu «sempre» ter recusado a respectiva onerosidade – é de rejeitar no caso presente. O âmbito das relações contratuais do género encontra-se regulado «ex lege» (cfr. o DL nº 379/93, de 5/11, e o DL nº 171/2001, de 25/5). E dessa regulação resulta que os serviços prestados por concessionários, e relativos à recepção de efluentes provindos de municípios, estão sujeitos a um tarifário administrativamente fixado. Nesta ordem de ideias, a atitude do réu município – que voluntariamente aderiu a um serviço cuja onerosidade conhecia, embora dela discordasse – corresponde à sua aceitação de negociar com a autora, fazendo-o de maneira que esta ficasse obrigada a receber os efluentes. Ora, esse negócio jurídico, aceite «a silentio» pelo réu, só podia inscrever-se no tipo contratual disponível – e que até fora definido por lei. E, como esta definição já incluía o «quantum» a pagar pelo serviço que a autora prestasse, estava vedado ao réu – perante a incindibilidade do tipo contratual disciplinador das relações entre as partes – aceitar as vantagens do negócio, beneficiando deveras do serviço, e simultaneamente rejeitar a contrapartida pecuniária desse benefício. Portanto, acompanhamos o acórdão recorrido quando ele disse que as partes se uniram num vínculo negocial relativo à recepção dos efluentes domésticos no ano de 2011. E, ante o que se dispunha no art. 184º do CPA, na redacção então vigente, concordamos com o aresto a propósito da nulidade desse contrato, por falta de forma (art. 220º do Código Civil). E é de assinalar a absoluta impossibilidade de acometer um tal juízo – o de que houve um contrato de prestação de serviços nulo por falta de forma, mas gerador de consequências – através da mera invocação de princípios jurídicos ou do instituto do abuso do direito, como faz o recorrente. Aliás, se tal abuso houvesse – e não há – ele obrigaria a encarar o contrato como válido, em vez de se ignorar o negócio ou tomá-lo como inexistente. Prossigamos, portanto, na linha decisória adoptada pelo TCA, que considerou nulo o negócio relativo à recepção dos efluentes domésticos no ano de 2011 e, depois disso, ponderou os efeitos dessa nulidade. Neste campo, em que convocou o art. 289º do Código Civil, o aresto «sub specie» também decidiu com acerto. Tratando-se de um negócio de execução continuada, e não sendo possível devolver o serviço – de recepção de efluentes – que a autora já prestou, o programa restitutivo, a cargo do município réu, tem de sucedaneamente passar pelo pagamento do valor correspondente à prestação da autora. E esse valor é o do tarifário administrativamente fixado. (…)». Ora, sendo esta a posição assumida neste Supremo Tribunal Administrativo, em sede de julgamento em formação alargada, mostra-se destituída de fundamento a argumentação utilizada no acórdão recorrido que determinou a suspensão da instância em virtude da pendência da acção nº 450/11.7 BECTB [nulidade dos contratos ao abrigo dos quais foram prestados os serviços cujo pagamento é reclamado]; ao invés, o que se verifica é que no caso dos autos, é irrelevante o desfecho da referida acção, face à aplicação do direito que deve ser efectuada, não havendo motivo legal que justifique a suspensão da instância, uma vez que não se baseia em qualquer questão prejudicial, na medida em que a decisão da acção não tem qualquer influência no pedido de pagamento das facturas que constitui o objecto da presente acção.”. Entendimento este, que é inteiramente aplicável aos presentes autos. Ora, na contestação deduzida nos presentes autos não foi levantada qualquer questão relativa à validade do contrato de concessão e/ou do contrato de fornecimento de água e/ou do contrato de recolha referidos nos n.ºs 1, 2 e 3 dos factos provados. Em sede de alegação de recurso o réu também não indica qualquer razão de facto e/ou de direito que fundamente tal declaração de nulidade. De todo o modo, ainda que se venha a concluir pela nulidade do contrato de concessão e, em consequência, pela invalidade dos contratos de fornecimento e de recolha, tal não implicaria qualquer modificação na sentença recorrida, que condenou o réu a pagar à autora “o valor de €384.097,92, acrescidos de juros de mora vencidos até 29/04/2011, no valor de €8.015,97, e de juros vincendos, calculados à taxa dos juros de mora aplicáveis às dívidas ao Estado até efetivo e integral pagamento”, relativo aos serviços prestados – fornecimento de água e saneamento -, correspondentes às faturas discriminadas nos n.ºs 5 e 6 dos factos provados e respetivos juros de mora, ou seja, tal nulidade não tem qualquer influência na exequibilidade da sentença recorrida - cfr., também, já decidido na referida decisão sumária. Em face do exposto, deverá ser negado provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo réu e, em consequência, mantida a sentença recorrida. * Conclui-se, assim, que deve ser negado provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo réu. * As custas do recurso serão suportadas pelo réu - cfr. artigo 527.º n.º 1 e n.º 2, do Código Processo Civil e artigos 6.º n.º 2, 7.º n.º 2 e 12.º n.º 2, todos do Regulamento das Custas Processuais. *IV. Decisão: Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Subsecção de Contratos Públicos, da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo réu. Custas do recurso pelo réu. Registe e notifique. Lisboa, 9 de outubro de 2025. (Helena Telo Afonso – relatora) (Ana Carla Teles Duarte Palma – 1.ª adjunta) (Jorge Martins Pelicano – 2.º adjunto) |