Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 235/13.6BESNT |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 04/03/2025 |
| Relator: | MARGARIDA REIS |
| Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL NULIDADE IRS MAIS VALIAS PERMUTA REIVESTIMENTO |
| Sumário: | I - A nulidade da sentença gerada pela oposição entre os seus fundamentos e a decisão, a que se alude no art. 125.º do CPPT com disposição paralela na alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, é um vício que afeta a sua estrutura lógica por contradição entre as premissas de facto e de direito, e a conclusão; ou seja, os fundamentos invocados na sentença não conduziriam ao resultado que é expresso na decisão, mas a um resultado logicamente oposto. II - Não tendo o imóvel permutado sido o que destinara a habitação própria e permanente, e tendo o remanescente do preço do imóvel adquirido sido integralmente pago com recurso ao produto de um crédito bancário, não ocorreu qualquer reinvestimento nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 5 do art. 10.º do CIRS. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | I. Relatório M…, inconformada com a sentença proferida em 2020-12-27 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a impugnação judicial que interpôs tendo por objeto liquidação de IRS referente ao ano de 2009, datada de 2011-10-28 com n.º 20115005099791, no valor de EUR 145.705,08 euros, e correspondentes juros compensatórios, vem dela interpor o presente recurso. A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: IlI. CONCLUSÕES: A. Entende a ora Recorrente, salvo o devido respeito, que há na decisão recorrida erro de julgamento quanto à matéria de facto dada como provada, assim como errou o Tribunal a quo na interpretação da legislação aplicável. B. Foi alegado e provado, em sede de impugnação judicial, que o valor de aquisição do imóvel melhor descrito em D) dos factos provados não era de 210.260,00€ (duzentos e dez mil, duzentos e sessenta euros) mas antes de 224.986,51€ (duzentos e vinte e quatro mil, novecentos e oitenta e seis euros e cinquenta cêntimos), (cfr. doc. n.º 5 e 11 junto com a PI). C. Ora, o Tribunal a quo não só não deu como provado este facto - cfr. lhe competia - como, do mesmo modo, não retirou daí as necessárias consequências no que respeita à mais-valia apurada (pela AT) e que, consequentemente, não se apresentava correcta. D. Tratava-se de matéria essencial para efeitos de quantificação de imposto, matéria sobra a qual o Tribunal a quo não se pronunciou, pelo que, a sentença ora recorrida é nula por omissão de pronúncia nos termos do art.º 615.0 , n.0 1, ai., d) do Código de Processo Civil, aplicável ex vi o art.º 2.0 do CPPT, Ainda, E. Cumpria na sentença do Tribunal a quo sindicar o valor considerado para efeitos de cálculo das mais-valias, em especial, o valor da aquisição a considerar, bem como os valores de contratos de mútuos celebrados, designadamente, sobre a mais-valia apurada da alienação do imóvel destinado a habitação própria e permanente, e o entendimento sobre os valores considerados para efeitos de reinvestimento à luz dos art. 43.º e 10.º , ambos do CIRS. F. A decisão recorrida, na sua apreciação, teria que atender quer ao valor residual pago em antecipação dos pagamentos finais de locação, quer às rendas financeiras pagas ao longo da duração do contrato de locação financeira (cfr. Acórdão do STA proferido a 17/06/2015, no âmbito do processo nº 0117/18). G. O apuramento da mais-valia pela AT verifica-se incorrecta e, por consequência, igualmente incorrecta estava a impugnada liquidação do imposto referente a 2009. H. Extraindo-se consequências do apreciado pelo Tribunal a quo - a respeito do valor de aquisição do imóvel alienado - a liquidação não podia manter-se na ordem jurídica. I. É manifestamente incoerente que possa proceder um argumento que altera a liquidação impugnada (como o valor de aquisição do imóvel alienado), para depois a mesma manter os seus efeitos (na íntegra) perante o sujeito passivo. J. Reconhecendo o Tribunal a quo que devem ser considerados os valores suportados no âmbito do contrato de locação financeira para efeitos de cálculo do valor de aquisição do imóvel, a sentença recorrida padece de manifesto erro de julgamento quando conclui pela total improcedência da impugnação. K. Quanto à questão do valor de reinvestimento na habitação própria e permanente a considerar para efeitos de exclusão de tributação à luz do art.º 10.0 n.0 5 do CIRS, deu a sentença a quo os argumentos por improcedentes, porém, também aqui, em erro de julgamento. L. Importava sempre precisar a operação em causa, atendendo ao objectivo de reinvestir o valor da realização e a protecção do destino conferido - habitação própria e permanente, por forma a concluir se se enquadra, ou não, na delimitação negativa da norma, o que não aconteceu, M. Quer isto dizer que a Sentença ora recorrida é nula por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, ex vi o art.º 2.º do CPPT. N. No caso sub judice, a exigência da (i) identidade funcional entre o imóvel transmitido, (ii) o valor consequente da realização e (iii) o imóvel adquirido, não se poderia ter confundido com a simples contratação do crédito bancário para efeitos de aquisição, como fez o Tribunal a quo. O. Não só a identidade da operação alienação - aquisição se verificava, como se verifica o escopo de protecção da norma do art. 10.º, n.º 5, do CIRS. P. A Recorrente fixou a sua habitação própria e permanente na fracção autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao primeiro e segundo pisos, rés-do-chão e primeiro andar - fogo designado por Moradia “E”, integrada no prédio urbano sito na rua das C…., nº 1…, A…, freguesia e concelho de Cascais, descrito na 1 ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o número 2… da referida freguesia e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 1….. (cfr. ponto C) dos factos provados). Q. Como ficou provado na sentença a quo, o passar a habitar aquele imóvel, tomando posse do mesmo, dá-se pela operação de permuta (cfr. ponto C) dos factos provados). R. Para adquirir o direito real sobre aquele imóvel, a Recorrente cedeu o imóvel que adquirira para efeitos de segunda habitação (o imóvel descrito em B) dos factos provados), S. Sendo certo, que a permuta, enquanto contrato oneroso, tem como contrapartida a cedência de propriedade de outra coisa ou de outro direito, como aliás aconteceu. T. Se atendêssemos à operação em causa, poder-se-ia considerar a cedência do imóvel descrito em B) dos factos provados, não preenche o quesito inerente à identidade funcional entre o imóvel transmitido e o imóvel adquirido. Não obstante, não pode de forma alguma ser desconsiderada a contrapartida que acresceu à cedência da habitação secundária. U. Para compensação inerente à permuta na aquisição da habitação própria e permanente, a Recorrente teve de entregar 901.000,00€ ao alienante. V. Ora se se poderia desconsiderar, para efeitos de reinvestimento, por não existir ligação entre a habitação secundária da Recorrente e a habitação adquirida a que destinou a sua habitação permanente, não se poderia desconsiderar o encargo de 901.000,00€ que a Recorrente incorreu para adquirir essa habitação própria e permanente. W. O escopo de protecção da norma do art.º 10.º, n.º 5, do CIRS, impõe que se verifique o nexo de causalidade entre a habitação adquirida e o recurso financeiro em que incorreu a Recorrente, X. A operação em causa em nada se confunde com a situação apreciada no Acórdão do STA n.º 039/16, proferido a 23/11/2016, citado no Acórdão n.º 0748/17 já identificado, uma vez que não estava em causa a contratação de um empréstimo bancário para aquisição da habitação própria e permanente - o que efectivamente está em causa é a contratação de um empréstimo bancário para financiar a contraprestação no âmbito da permuta celebrada. Y. O nexo causal entre a contratação de um empréstimo para aquisição de habitação própria e permanente, enquadramento que não cabe na ai. a), do n.0 5, do art. 10.º , do CIRS, não é o mesmo que o nexo causal entre a permuta pela qual a Recorrente adquiriu a habitação própria e permanente e a forma como a financiou. Z. A ratio que baseia a exclusão da tributação prevista no art. 10.º, do CIRS, não é estanque, ao ponto de apenas considerar uma operação de alienação/realização e consequente investimento da totalidade da realização. AA. Tanto assim é que, a norma do art. 10.º, n.º 5 al. a), do CIRS, dispõe, actualmente, que ao valor de realização, é deduzida a “amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel.”. BB. Se a Recorrente alienasse o imóvel correspondendo à habitação própria e permanente, a aplicação da norma do art.º 46.º do CIRS implicaria que se considerasse como valor de aquisição quer os 901.000,00€, quer a cedência do imóvel permutado no valor de 325.000,00€. CC. Aliás, se a interpretação da norma fosse apenas literal e não se atendesse ao escopo de protecção da norma, não estaria assente na jurisprudência, como se verificou no caso presente, que no âmbito da locação financeira, deve considerar-se “valor residual de aquisição, mas também e ainda, o valor das rendas pagas ao longo do período acordado, encontrando-se, por isso, enformadas pelo princípio da neutralidade fiscal, cfr. preâmbulo do DL n. 0 311/82 de 4 de Agosto.”. DD. A norma do art.º 10.º, n.º 5, não inclui expressamente, a fim de garantir a neutralidade fiscal, o pagamento do valor residual e das rendas financeiras suportadas, nem assim exclui expressamente, a contratação de créditos bancários, para aquisição de habitação própria e permanente, EE. Porém, é esse o entendimento fixado na jurisprudência, com um fundamento crucial, ou seja, inexistir nexo de causalidade entre a venda/realização e a contratação de um crédito bancário, para adquirir outra habitação. FF. No caso sub judice, não foi esse o enquadramento dado à operação, e é crucial que se atente no fundamento que exclui a contratação de créditos bancários para efeitos de exclusão, para sindicar se a operação em causa, deve ou não ser considerada. GG. O fundamento que subjaz à exclusão de tributação de créditos ou débitos bancários para aquisição de uma habitação própria e permanente, não é o mesmo que poderia subsistir na operação de permuta a que a Recorrente recorreu para adquirir a sua habitação. HH. No presente caso, verifica-se plenamente o nexo de causalidade entre o empréstimo contraído para compensação do valor de permuta e a aquisição da habitação própria e permanente que naturalmente vem a ser financiado com o valor da realização do imóvel primeiramente afeto a habitação própria e permanente. II. Todos os elementos referidos no já aqui mencionado) Acórdão do STA foram manifestados na operação em que incorreu a Recorrente, pelo que, existe um claro nexo de interdependência entre a alienação e aquisição do imóvel afeto a habitação própria e permanente. JJ. Impunha-se ao Tribunal a quo sindicar a operação concreta em causa, analisando a forma legal que a operação assumiu, excluindo-a ou não, da previsão do art. 10.º, n.º 5, do CIRS. KK. Foi alegado e provado em sede de PI o manifesto erro na quantificação do valor de aquisição do imóvel melhor descrito em D) dos factos provados, facto sobre qual a sentença do Tribunal a quo não se pronunciou: a errónea quantificação do valor de aquisição importa que o apuramento da mais-valia se encontra incorrecto nos cálculos da Autoridade Tributária e Aduaneira, o que por consequência, faz alterar o imposto à final, isto é, altera a liquidação impugnada. LL Em suma, deveria o Tribunal a quo ter dado por provado: i. Que o valor de aquisição do imóvel descrito em D) dos factos provados foi de 224.986,51€ (duzentos e vinte e quatro mil, novecentos e oitenta e seis euros e cinquenta cêntimos), (cfr. doc. N.º 5 e 11 junto com a PI). ii. Que há que atender quer ao valor residual pago em antecipação dos pagamentos finais de locação, quer às rendas financeiras pagas ao longo da duração do contrato de locação financeira (cfr. Acórdão do STA proferido a 17/06/2015, no âmbito do processo nº0117/18, bem como preâmbulo do DI. n.0 311/82 de 4 de Agosto). iii. Que existe identidade funcional entre o imóvel transmitido, o valor consequente da realização e o imóvel adquirido, para efeitos de exclusão de tributação à luz do art.º 10.º n.º 5 do CIRS. iv. Que Recorrente fixou, na sequência da permuta, a sua habitação própria e permanente no imóvel descrito no ponto C) dos factos provados. v. Que a Recorrente despendeu de 901.000,00€ para adquirir essa habitação própria e permanente. MM. Por todo o concluído, o Tribunal a quo errou em julgamento e em interpretação e aplicação da lei quanto violou: i. A norma do art. 10.º n.º 5 do CIRS quanto ao valor residual e das rendas financeiras, bem como sobre a contratação de créditos bancários, para aquisição de habitação própria e permanente; ii. As normas dos art. 43.º e 10.º, ambos do CIRS, sobre a quantificação da mais-valia apurada da alienação do imóvel destinado a habitação própria e permanente; iii. A norma do art. 46.º do CIRS no que toca à quantificação do valor de aquisição; iv. A norma do art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, ex vi o art. 2.º do CPPT por não se ter pronunciado sobre a delimitação negativa, quanto à questão do valor de reinvestimento na habitação própria e permanente a considerar para efeitos de exclusão de tributação; v. A norma do art.º 125.º do CPPT por se encontrarem os fundamentos em manifesta oposição com a decisão de total improcedência; Termina pedindo: Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, revogando-se a sentença do Tribunal a quo e substituindo-se por outra que anule a liquidação adicional n.º 2011 5005099791, referente ao IRS de 2009, tudo com as necessárias consequências legais. *** A Recorrida não apresentou contra-alegações. *** O Digno Magistrado do M.º Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. *** Questões a decidir no recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, tal como decorre do disposto nos arts. 635.º nºs 4 e 5 e 639.º do Código de Processo Civil (CPC), disposições aplicáveis ex vi art. 281.º do CPPT. Assim sendo, no caso em apreço, atentos os termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso, há que apurar se a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia e por contradição entre os respetivos fundamentos e a decisão proferida, ou se padece dos erros de julgamento de facto e de direito que lhe são apontados pela Recorrente, ou seja, se nela se desconsideraram factos provados nos autos e pertinentes para a decisão a proferir, e se fez uma incorreta interpretação e aplicação ao caso do disposto nos arts. 10.º, n.º 5, 43.º e 46.º do CIRS.
II. Fundamentação II.1. Fundamentação de facto Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz: III. Fundamentação 1. De facto Com interesse para a decisão da causa, mostram-se provados os seguintes factos: a) A 30/09/2003, a impugnante celebrou como F…, S.A., um contrato, que denominaram por “Contrato de Locação Financeira Imobiliária”, que se dá por integralmente reproduzida, e em que declararam (cfr. documento de fls. 84 dos autos): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS)
b) A 21/12/2005, a impugnante, na qualidade de compradora, e outros, na qualidade de vendedores, celebraram um contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca, relativa à fracção autónoma designada pela letra “P”, correspondente à moradia tipo A, primeira do lado norte poente, destinada à habitação, do prédio urbano localizado nos limites de Fontanelas, freguesia de S. João das L…, Sintra, pelo preço de 325.000,00euros, destinando o imóvel a habitação secundária (cfr. documento de fls. 112 e ss. dos autos); c) A 27/08/2009, a impugnante e outros, compareceram perante notário, declarando (cfr. documento de fls. 119 e ss. dos autos): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) d) A impugnante, e outro, compareceram perante oficial público, perante quem declarou: (cfr. documento de fls. 142 dos autos): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS)
e) A 30/09/2009, entre a impugnante, e outros, foi consignadas por escrito, declarações, onde, além do mais, se lê (cfr. documento de fls. 146 e ss dos autos): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) f) A 15/06/2010, foi entregue a declaração modelo 3, pela impugnante, com o anexo B, G e I (cfr. documento de fls. 154 dos autos); g) No anexo G, a impugnante, declarou (cfr. documento de fls. 158 dos autos): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) h) Pelo F…, foi emitida declaração, onde se lê (cfr. documento de fls. 163 dos autos): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) i) A 21/10/2011, foi remetido, à impugnante, ofício, onde se lê (cfr. documento de fls. 182 do PAT):
j) Aos 05/11/2010, à impugnante, foi remetido ofício, onde se lê (cfr. documento de fls. 181 do PAT): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) k) A 12/05/2011, à impugnante foi remetido ofício, onde se lê (cfr. documento de fls. 180 do PAT): (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) l) A 28/10/2011, foi emitida a liquidação de IRS, à impugnante, relativa ao exercício de 2009, onde se apurou um rendimento global de 455.147,24 euros, e um valor a pagar de 145.705,00 euros (cfr. documento de fls. 68 dos autos); m) Na mesma data, foi emitida a liquidação de juros compensatórios, relativa à liquidação a que respeita a alínea anterior, lendo-se da demonstração da liquidação (cfr. documento de fls. 70 dos autos):
n) A 10/04/2012, a impugnante deduziu RG (cfr. documento de fls. 2 do PAT RG); o) A 14/12/2014, foi proferido despacho onde se lê “Concordo, pelo que com os fundamentos constantes da presente informação e respectivo parecer, considero que o pedido em apreço é de indeferir. Notifique-se para o exercício do direito de audição prévia (cfr. documento de fls. do PAT); p) A impugnante, exerceu o seu direito de audição, por requerimento de fls. 229 do PAT); q) A 31/01/2013, foi indeferida a RG a que respeitam as alíneas anterior (cfr. documento de fls. 72 dos autos); Não há factos alegados e não provados com interesse para a decisão da causa. Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados, conforme se indica em cada alínea do probatório. * II.2. Fundamentação de Direito Alega a Recorrente que a sentença padece de de nulidades, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 125.º do CPPT, por omissão de pronúncia e por oposição dos fundamentos com a decisão, por, respetivamente, não ter apreciado a questão referente ao invocado correto valor de aquisição do imóvel descrito no ponto D da fundamentação de facto, e por, não obstante ter considerado procedente a questão que suscitou quanto ao efetivo valor de aquisição do imóvel alienado, não ter retirado as devidas consequências desta decisão, mantendo totalmente incólume o ato impugnado. Vejamos então. Perante a argumentação expendida não pode deixar de se assinalar a respetiva incongruência no que se refere à invocação da nulidade por omissão de pronúncia. Com efeito, a Recorrente alega que a sentença não conheceu a questão relativa ao valor de aquisição do imóvel descrito na alínea D, para logo referir que o Tribunal julgou a questão procedente, sem que dela tenha retirado as devidas consequências. Ora, e compulsada a sentença, o que se retira da mesma é que efetivamente o Tribunal a quo conheceu esta matéria, tendo concluído, inequivocamente, que “procede o invocado na PI, quanto à questão relativa ao valor de aquisição do prédio alienado, e que originou a mais-valia tributada”, tendo, aliás, a sentença transitado em julgado quanto a esta questão. Por outro lado, e quanto ao alegado erro de julgamento de facto, também a Recorrente não tem razão, pois a afirmação que pretende que seja considerada provada – “que o valor de aquisição do imóvel descrito em D dos factos provados foi de 224.986,51€ (duzentos e vinte e quatro mil, novecentos e oitenta e seis euros e cinquenta cêntimos)” -, como se de um facto se tratasse, é manifestamente conclusiva. Acresce que à pretendida conclusão se chega pela apreciação crítica dos pontos A, D e G da fundamentação de facto conjugados entre si, ou seja, se a Recorrente celebrou o contrato de locação financeira imobiliária relativamente ao imóvel em questão, resultando do mesmo (cf. cláusula IV) o montante a financiar de EUR 224 986,51 (cf. ponto A, da fundamentação de facto), e se no momento da escritura o Banco locador declara que vende o imóvel, que recebeu o valor residual e que o contrato se extingue automaticamente, em consequência do seu cumprimento (cf. ponto D, da fundamentação de facto), é possível concluir que o mesmo foi cumprido na integra tendo sido pago o valor em questão, pelo que é possível concluir que a Recorrente declarou um valor incorreto na sua declaração de IRS (cf. ponto G, da fundamentação de facto). Acresce, neste mesmo sentido, a circunstância de o Banco locador ter emitido declaração para efeitos de IRS, por força da qual atesta o pagamento efetuado durante o exercício de 2009 (cf. ponto H, da fundamentação de facto). Tanto é quanto basta, aliás para que se conclua que, manifestamente, a sentença não padece de qualquer nulidade por omissão de pronúncia, ou do erro de julgamento de facto que lhe é apontado, devendo o recurso ser julgado improcedente neste extrato. Alega também a Recorrente que a sentença padece de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão. A nulidade da sentença gerada pela oposição entre os seus fundamentos e a decisão, a que se alude no art. 125.º do CPPT com disposição paralela na alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, é um vício que afeta a sua estrutura lógica por contradição entre as premissas de facto e de direito, e a conclusão; ou seja, os fundamentos invocados na sentença não conduziriam ao resultado que é expresso na decisão, mas a um resultado logicamente oposto. Para que tal se verifique deverá existir um vício real no raciocínio do julgador, uma verdadeira contradição entre os fundamentos e a decisão, apontando a fundamentação num determinado sentido e seguindo a decisão o caminho oposto, ou, pelo menos, uma direção diferente. Assim, a oposição entre os fundamentos e a decisão da sentença não é confundível com o erro de subsunção dos factos ao regime jurídico aplicável ou com o erro na interpretação deste último. Com efeito, e cotejada a sentença, o que a este respeito dela consta é que o Tribunal não deixou de considerar que a impugnação judicial deveria proceder parcialmente, pois ali se afirma, após conhecimento da questão referente ao valor de aquisição do imóvel, “[p]orém, para que proceda totalmente a presente impugnação, há ainda que analisar a questão relativa ao valor do reivestimento, atendendo ao valor dos empréstimos contraídos para a aquisição do prédio, alegadamente em que se investiu a mais valia”. Donde a conclusão a retirar é que o segmento decisório, por força do qual se determinou a total improcedência da impugnação judicial, é o resultado de um vício de raciocínio do julgador, que configura a invocada nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão. Deverá, por isso, ser julgado procede o recurso neste extrato, e suprida a referida nulidade, retirando-se no decisório as devidas consequências do julgamento favorável à recorrente desta causa de pedir. Prosseguindo no conhecimento dos demais erros de julgamento de facto imputados à sentença, desde já se antecipa que a sentença não padece de qualquer erro neste aspeto, não cabendo razão à Recorrente. Assim, pretende a Recorrente que a sentença erra ao não ter dado por provado (i) que há que atender quer ao valor residual pago em antecipação dos pagamentos finais de locação, quer às rendas financeiras pagas ao longo da duração do contrato de locação financeira (cf. Acórdão do STA proferido a 17/06/2015, no âmbito do processo nº 0117/18, bem como preâmbulo do DI. n.0 311/82 de 4 de agosto); (ii) que existe identidade funcional entre o imóvel transmitido, o valor consequente da realização e o imóvel adquirido, para efeitos de exclusão de tributação à luz do art.º 10.º n.º 5 do CIRS; (iii) que a Recorrente fixou, na sequência da permuta, a sua habitação própria e permanente no imóvel descrito no ponto C) dos factos provados; e (iv) que despendeu de 901.000,00€ para adquirir essa habitação própria e permanente. Ora, as afirmações que aqui se transcrevem sob os pontos (i), (ii) e (iii) são marcadamente conclusivas, pelo que não correspondem a quaisquer factos que devessem ser elencados no probatório. Acresce que a conclusão da existência de “identidade funcional” entre o imóvel descrito no ponto D e o imóvel adquirido, sito em Cascais, e identificado no ponto C, além de não ser controvertida nos autos, é totalmente inócua para a decisão a proferir, atendendo a que a Recorrente nem sequer alega que tenha utilizado o produto da venda do primeiro imóvel na compra do segundo. Por fim, do ponto C resulta já, que a Recorrente despendeu EUR 901.000,00 na aquisição do imóvel relativamente ao qual pretende ter ocorrido o reinvestimento. Tanto é quanto basta para que o seu recurso improceda neste extrato. Por fim, alega a Recorrente que estavam reunidos os requisitos para que fosse reconhecido o reinvestimento, e que ao não o reconhecer o Tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação ao caso do disposto no n.º 5 do art. 10.º do CIRS, se bem se percebe a sua alegação, por entender que o mútuo em questão teve por objetivo financiar a permuta, e não a aquisição do imóvel. Não tem, no entanto, razão.
No n.º 5 do art. 10.º do CIRS dispunha-se o seguinte, na redação pertinente: Artigo 10.º Mais-valias (…) 5 - São excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, nas seguintes condições: a) Se, no prazo de 36 meses contados da data de realização, o valor da realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, for reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para a construção de imóvel, ou na construção, ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino situado em território português ou no território de outro Estado membro da União Europeia ou do espaço económico europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal; [Redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro - OE] b) Se o valor da realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, for utilizado no pagamento da aquisição a que se refere a alínea anterior desde que efectuada nos 24 meses anteriores; [Redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro - OE] c) Para os efeitos do disposto na alínea a), o sujeito passivo deverá manifestar a intenção de proceder ao reinvestimento, ainda que parcial, mencionando, na declaração de rendimentos respeitante ao ano da alienação, o valor que tenciona reinvestir; d) [Revogada pelo Decreto-Lei n.º 211/2005, de 7 de Dezembro] (…) Ora, e como é corretamente referido na sentença sob recurso, é a própria Recorrente que reconhece que o imóvel foi adquirido através da permuta com o imóvel identificado no ponto B da fundamentação de facto, e que destinara a habitação secundária, e do pagamento da quantia de EUR 901.000,00, que obteve através de mútuo. Donde resulta claro que no imóvel adquirido, e relativamente ao qual pretende que seja reconhecido o reinvestimento a que se aludia no n.º 5 do art. 10.º do CIRS, não foi aplicado qualquer montante proveniente do produto da venda do imóvel identificado no ponto D da fundamentação de facto, não se verificando, por isso, qualquer “reivestimento” do valor de realização do imóvel destinado a habitação própria e permanente, nos termos do disposto na citada norma. De facto, e como foi já decidido por este Tribunal Central Administrativo Sul – aliás, em total consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo assente sobre esta matéria, e ali profusamente citada - “O reinvestimento a que alude o preceito 10.º, nº 5 do CIRS, é, tão só, o reinvestimento do produto da alienação e não o investimento através de empréstimo bancário. Logo, havendo recurso ao crédito bancário para a aquisição do novo imóvel, só pode considerar-se reinvestido, para efeitos de excluir da tributação as mais-valias, o montante que provenha do produto da alienação e já não o do empréstimo” (cf. Acórdão proferido por este TCAS em 08/07/2021 no proc. 1064/10.4BEALM, disponível para consulta em www.dgsi.pt). Donde, não tendo o imóvel permutado sido o que destinara a habitação própria e permanente, e tendo o remanescente do preço do imóvel adquirido sido integralmente pago com recurso ao produto de um crédito bancário, não ocorreu qualquer reinvestimento nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 5 do art. 10.º do CIRS. Não há, por isso, que imputar qualquer erro de julgamento de direito à sentença recorrida, que, pelo contrário, fez uma correta interpretação e aplicação ao caso do disposto no art. 10.º do CIRS. Assim sendo, e em face do exposto, o presente recurso deve ser julgado parcialmente procedente, com a consequente alteração do segmento decisório da sentença. *** Atento o parcial decaimento do Recorrente, em ambas as instâncias, a mesma é responsável pelas custas na proporção do decaimento, que se fixa em 50%, nos termos do disposto no art. 527.º, n.º 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT, não sendo devida taxa de justiça à Recorrida nesta instância, por não ter contra-alegado (cf. art. 7.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais – RCP). *** Conclusão: Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva: I. A nulidade da sentença gerada pela oposição entre os seus fundamentos e a decisão, a que se alude no art. 125.º do CPPT com disposição paralela na alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, é um vício que afeta a sua estrutura lógica por contradição entre as premissas de facto e de direito, e a conclusão; ou seja, os fundamentos invocados na sentença não conduziriam ao resultado que é expresso na decisão, mas a um resultado logicamente oposto. II. Não tendo o imóvel permutado sido o que destinara a habitação própria e permanente, e tendo o remanescente do preço do imóvel adquirido sido integralmente pago com recurso ao produto de um crédito bancário, não ocorreu qualquer reinvestimento nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 5 do art. 10.º do CIRS. III. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder parcial provimento ao presente recurso, e, em consequência, julgar parcialmente procedente a impugnação judicial, e assim anular a liquidação impugnada na parte referente ao valor de aquisição do imóvel sito na Rua Francisco de Andrade, 11, São Jorge de Arroios, Lisboa, devendo ser considerado para o efeito o montante de EUR 224.986,51. Custas pela Recorrente e pela Recorrida, na proporção do decaimento, nas duas instâncias, que se fixa em 50%. Lisboa, 3 de abril de 2025 - Margarida Reis (relatora) – Patrícia Manuel Pires – Ângela Cerdeira. |