| Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 44360/24.8BELSB | 
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| Secção: | CA | 
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| Data do Acordão: | 10/23/2025 | 
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| Relator: | ALDA NUNES | 
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| Descritores: | INTIMAÇÃO PARA PROTEÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA PARA ATIVIDADE DE INVESTIMENTO INIDONEIDADE DE MEIO PROCESSUAL | 
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| Sumário: |  | 
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| Votação: | UNANIMIDADE | 
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| Indicações Eventuais: | Subsecção Administrativa Comum | 
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| Aditamento: |  | 
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório AA veio interpor recurso jurisdicional da decisão proferida a 13.3.2025, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, de rejeição liminar da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantais, que intentou contra a Agência para a Integração, Migrações e Asilo, IP, com fundamento na falta de demonstração do pressuposto da urgência e da indispensabilidade. O recorrente nas alegações formulou as conclusões seguintes: 1. A Sentença de que se recorre padece de erro na aplicação do direito e na apreciação da prova produzida, pelo que o Recurso abrange a decisão que indeferiu liminarmente a Petição Inicial; 2. Resulta da prova produzida que o Recorrente realizou um investimento imobiliário em Portugal em 2023 com vista à obtenção de residência por via do programa ARI, conforme Doc.1 junto com a Petição Inicial; 3. Bem como, que apresentou a respetiva candidatura no dia 05/09/2023, conforme Doc.1 e 2 juntos com a Petição Inicial; 4. O Recorrente submeteu, ainda, a 08/09/2023, pedido de reagrupamento familiar para a sua esposa e filhos menores, conforme Doc.3 a 8 juntos com a Petição Inicial; 5. E que até à data os referidos pedidos não mereceram qualquer desenvolvimento por parte da Recorrida, conforme Doc.1 a 8 juntos com a Petição Inicial; 6. Entende o Recorrente que a verificação da urgência e indispensabilidade da emissão de uma decisão de mérito que condene a Recorrida a proferir decisão sobre os referidos pedidos para evitar a violação dos seus direitos, liberdades e garantias resulta das regras da experiência, bem como das normas legais aplicáveis à autorização de residência para investimento, sendo dedutível por mera presunção judicial; 7. Bem como que a paralisação dos processos de autorização de residência, e a impossibilidade de contactar a Recorrida, são factos notórios que não carecem de prova; 8. Estão aqui em questão não um, mas vários direitos, liberdades e garantias, cujo acesso efetivo depende da concessão de autorização de residência ao Recorrente; 9. Nomeadamente, tendo o Recorrente efetuado um investimento que será obrigado a manter durante cinco anos contados a partir da emissão do respetivo título de residência, a inação da Recorrida ofende de forma irreversível, atual e contínua, o seu direito de propriedade, e a sua liberdade de iniciativa económica, que são direitos fundamentais de natureza análoga aos direitos liberdades e garantias (artigos 61.º e 62.º da CRP); 10. Por outro lado, a ausência de decisão por parte da Recorrida restringe a liberdade de circulação e permanência no território nacional do Recorrente, consagrada no artigo 44.º da CRP; 11. A inércia da Recorrida compromete ainda o exercício de direitos pessoais do Recorrente, uma vez que os procedimentos dos autos dizem respeito à obtenção de um documento de identificação essencial à sua vida privada e profissional (artigo 26.º da CRP); 12. Bem como o acesso do Recorrente aos direitos de petição, de obtenção de uma decisão em prazo razoável e de informação sobre os procedimentos administrativos que lhe dizem respeito – previstos nos artigos 20.º, n.º 4 e 52.º da Constituição da República Portuguesa (CRP); 13. Pelo que os factos expostos na Petição Inicial, aliados à prova apresentada, demonstram a necessidade urgente de uma decisão de mérito que condene a Recorrida a pronunciar-se sobre o pedido de autorização de residência do Recorrente; 14. Decisão essa que se revela indispensável para garantir acesso efetivo a direitos fundamentais ao Recorrente; 15. Não assiste qualquer razão ao Tribunal a quo, quando limita o Acórdão uniformizador de jurisprudência 11/2024 aos pedidos de autorização de residência para o exercício de atividade profissional subordinada, quando resulta claro do seu sumário que o mesmo se aplica a todos os casos em o exercício de direitos fundamentais seja comprometido pela inércia da administração face a qualquer pedido de autorização para residência; 16. Pelo que a decisão recorrida ofende o princípio da igualdade, desde logo, porque discrimina o Recorrente sem qualquer fundamento, na medida em que não existe motivo para considerar o .../2024 inaplicável a autorizações de residência para investimento, desde que se verifique uma lesão iminente e irreversível a direitos, liberdades e garantias do candidato. 17. A decisão recorrida aplica incorretamente o artigo 15.º da CRP; 18. O Tribunal a quo desconsidera a conexão do Recorrente com Portugal, negando-lhe direitos fundamentais; 19. Conforme demonstrado, a situação nos autos revela que é urgente que a Recorrida se pronuncie sobre os pedidos do Recorrente, precisamente para que possa ser considerado residente em Portugal, e assim ter acesso aos direitos fundamentais previstos na CRP; 20. Pelo que o Tribunal a quo contraria, assim, a jurisprudência uniformizada, que reconhece a necessidade de uma decisão célere para evitar a perpetuação de uma situação de indocumentação prejudicial; 21. A qual é aplicável ao presente processo, mostrando-se que a inércia da Recorrida compromete materialmente o exercício de direitos fundamentais do Recorrente; 22. Ao permitir que a Administração condicione o acesso à residência, e, logo, à equiparação, com base na sua própria inércia, o entendimento adotado pelo Tribunal a quo compromete o princípio da tutela jurisdicional efetiva, deixando o Recorrente vulnerável à violação dos seus direitos fundamentais (artigo 20.º, n.º 5 e artigo 268.º n.º 4 da CRP); 23. Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que ao não reconhecer a equiparação do Recorrente aos cidadãos nacionais, mesmo diante do seu investimento e vínculo com Portugal, a decisão recorrida viola o princípio da igualdade (artigo 13.º CRP) e desconsidera a proteção conferida aos estrangeiros que já iniciaram o processo de autorização de residência; 24. Resulta evidente que a intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias é o meio processual idóneo e adequado para a tutela jurisdicional das pretensões como as que aqui se colocam; 25. Pelo que, tendo o Tribunal a quo julgado mal a matéria de facto especificamente identificada, além de uma desajustada aplicação dos preceitos legais, deverá o Tribunal Central revogar a Sentença de que se recorre, admitindo a Petição Inicial do Recorrente, e ordenar a citação da Entidade Recorrida; 26.	Caso assim não se entenda, sempre se dirá que a sentença recorrida não respeitou o previsto no artigo 110.º-A do CPTA, pelo que, deverá o Tribunal Central revogar a Sentença de que se recorre, substituindo-a por uma que fixe prazo ao Recorrente para vir substituir a petição, para o efeito de requerer a adoção de providência cautelar. Termos em que, a douta Sentença recorrida deve ser revogada. O recurso foi admitido e, nos termos do art 641º, nº 7 do CPC, o requerido e recorrido foi citado para os termos da causa e do recurso, nada tendo alegado ou requerido. O Exmo Procurador Geral Adjunto, notificado nos termos e para efeitos do art 146º, nº 1 do CTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. Notificado o parecer ao recorrente, o mesmo nada disse. Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º, nº 1, alínea d) e nº 2 do CPTA, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à conferência para julgamento. Objeto do recurso Atentas as conclusões de recurso, que delimitam o seu objeto, a questão a decidir consiste em saber se a sentença padece de erro de julgamento de direito ao rejeitar liminarmente a presente intimação, com fundamento na falta de urgência e de indispensabilidade. Fundamentação De facto Para efeitos de decisão do presente recurso jurisdicional dão-se como provados os seguintes factos: 1.	O requerente/ recorrente é cidadão norte-americano, residente nos Estados Unidos - docs juntos com o requerimento inicial. 2. No ano de 2023 realizou um investimento imobiliário em Portugal – doc nº 1 junto com o ri. 3. O requerente deu entrada, em 05/09/2023, através do Portal ARI, a um pedido de autorização de residência para atividade de investimento - docs nº 1 e 2 juntos com o ri, que se dão por integralmente reproduzidos. 4. Ao pedido do requerente foi atribuído o número de processo ... – docs nº 1 e 2 juntos com o ri. 5. O requerente formalizou, ainda, em 08/09/2023, através do Portal ARI, pedido de reagrupamento familiar para a sua cônjuge BB e filhos menores CC e DD – Docs nº 3, 4, 5, 6, 7 e 8 juntos com o ri, que se dão por integralmente reproduzidos. 6.	A entidade requerida não proferiu decisão sobre os requerimentos referidos em 3) e 5) [acordo]. O Direito. Erros de julgamento de direito. Os ora recorrentes requereram intimação para proteção de  direitos, liberdades e garantias, ao abrigo dos artigos 109º a 111º do CPTA. O pedido de intimação consistiu em: … ser intimada a Requerida para: a. se pronunciar sobre o pedido de autorização de residência para atividade de investimento apresentado pelo requerente em 5.9.2023, procedendo à sua pré-aprovação e notificando-o para proceder ao agendamento para recolha dos seus dados biométricos, porquanto reúne todos os pressupostos para o efeito; b. se pronunciar sobre os pedidos de Reagrupamento Familiar apresentados pelo requerente em 8.9.2023, procedendo à sua pré-aprovação e notificando-o para proceder aos agendamentos para recolha dos dados biométricos da sua cônjuge e filhos menores, porquanto reúnem todos os pressupostos para o efeito; c. caso os referidos pedidos sejam aprovados, para proceder à emissão das devidas autorizações de residência, mediante o pagamento das taxas que se mostrem devidas e verificada a conformidade da documentação e demais pressupostos, porquanto reúne todos os pressupostos para o efeito previstos nos arts 90º A e 98º da Lei nº 23/2007; bem como d. tomar a requerida as medidas necessárias para salvaguardar a especial urgência da situação, adotando as medidas consideradas adequadas ao abrigo do nº 3 do art 110º do CPTA ; e e.	subsidiariamente, caso assim não se entenda, notifique o requerente nos termos e para os efeitos do nº 1 do art 110ºA do CPTA. O TAC de Lisboa indeferiu liminarmente a intimação, por falta de urgência e de indispensabilidade do meio processual, com a seguinte fundamentação: Volvendo ao caso dos autos. Alega o Requerente que a urgência assenta no incumprimento do prazo decisório, omissão /incumprimento que se traduz em constrangimentos de diversa ordem e na violação de diversos direitos, com respaldo constitucional ou em diplomas internacionais, conjuntura que não se compadece com uma tutela provisória ou alcançável pela ação administrativa e que não se encontra, sequer, densificada (tratando-se, de resto, de factos essenciais / nucleares), mas cuja eventual densificação nem releva. Com efeito, mesmo considerado o requerimento que antecede, as suas alegações não atingem o nível de detalhe ou a profundidade que, mesmo a um golpe de vista mais aturado, se distingam do que pode ser alegado por qualquer pessoa que aguarde a decisão da AIMA, IP (ou de qualquer entidade adstrita / vinculada a prazos de decisão), sendo, aliás, alegações características dos incómodos comuns associados à incerteza dessa decisão (seja quanto ao prazo da sua emissão, seja quanto ao seu teor). Ou seja, o Requerente não alega qualquer factualidade circunstanciada que permitisse apreciar a necessidade urgente concreta que permita sustentar a verificação de uma situação justificadora do uso do presente meio processual. Com efeito, como temos vindo a dizer, não está suficientemente caraterizada a existência de um prejuízo iminente e/ou consumado – veja-se que lança mão de numerosos artigos legais, sem indicar, um único caso / cenário concreto em que tais direitos se encontrem, efetivamente, violados (facto, de resto, essencial / nuclear para se apreciar da admissão e viabilidade do presente meio processual). Por seu turno, também claudica a alegada indispensabilidade. Não se descura, ignorando, que possa existir um incumprimento do dever de pronúncia / decisão, por silêncio da Requerida dentro do prazo previsto legalmente para o efeito: porém, para que se possa lançar mão deste meio processual (e, procedendo, a Requerida seja intimada a decidir em determinado prazo), importa que o Requerente demonstre que seja indispensável o recurso a este meio processual em desprimor dos demais – o que não sucede no caso vertente, porquanto, mais uma vez, o Requerente se sustenta em alegações genéricas. Compulsada a petição, resta concluir que, com referência ao momento presente, inexistem alegações (e, muito menos, algo que seja comprovado pelo Requerente: e recordemos as regras de distribuição do ónus da prova) que sustentem qualquer urgência na proteção de direitos, liberdades e garantias e que permitam vislumbrar (e, muito menos, concluir pela existência) de uma lesão iminente e irreversível dos vários direitos que o Requerente refere, o mesmo se dizendo quanto à indispensabilidade de uma decisão de mérito para assegurar o seu exercício em tempo útil. Em conclusão: o Requerente formula, somente, alegações genéricas, abstratas, considerandos que não passam de juízos conclusivos, mesmo considerada a resposta que antecede, sem a necessária densificação das circunstâncias da especial urgência que lhe cabia demonstrar no âmbito do presente meio processual. Com efeito, a tutela judicial revela-se acautelada com recurso a outros meios processuais que se revelam adequados a, cumpridos os pressupostos, uma decisão de mérito que vá ao encontro do direito a uma pronúncia por parte da aqui Entidade Requerida. Adicionalmente, não se encontrando ou residindo em território nacional (cfr. artigo 15.º da CRP), não é titular dos direitos, liberdades e garantias a que se arroga – cfr., em sentido próximo, os acórdãos do TCA Sul, de 24-04-2024, proferido no processo n.º 3595/23.7..., e de 23-05-2024, proferido no processo n.º 155/24.9..., disponíveis em www.dgsi.pt. Veja-se, com detalhe, o doutamente sumariado no processo 3595/23.7...: “I - Para se darem por verificados os pressupostos [adjetivos/processuais] da admissibilidade desta ação principal, excecional e urgente, impunha-se que os Recorrentes na petição tivessem alegado factos que permitissem concluir que o uso de uma ação administrativa de condenação à prática do ato devido, associado a uma providência cautelar, não seria suficiente a assegurar o exercício dos direitos fundamentais ou análogos que invocam, em tempo útil. Ou dito de outro modo, o respetivo exercício seria frustrado antes de poder obter decisão judicial não urgente; II - Como cidadãos nacionais e residentes nos EUA é nesse país que têm a sua vida pessoal, familiar e profissional organizada e exercem os direitos que lhe são inerentes ou relacionados. Nada do que alegaram na petição, de forma genérica e conclusiva, permite afirmar que se verifica a exigida lesão iminente e irreversível dos vários direitos que referem, nem que seja indispensável uma decisão de mérito para assegurar o seu exercício em tempo útil; III - A circunstância de terem investido em Portugal confere-lhes, nos termos da legislação aplicável, o direito a requerer junto das autoridades portuguesas ARI e, não sendo por estas observados os prazos legais de tramitação e decisão dos correspondentes procedimentos administrativos, têm também ao seu dispor os meios judiciais de reação junto dos tribunais administrativos portugueses, disponibilizados a qualquer cidadão nacional ou estrangeiro em idêntica situação, os quais poderão ser urgentes ou não, consoante a causa de pedir e pedidos formulados; IV - O que não significa que possam beneficiar do princípio da equiparação, previsto no artigo 15º da CRP, cujo nº 1 dispõe: “1. Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português”, precisamente quanto aos direitos que dependem da efetiva presença ou residência em Portugal, onde o exercício do direito invocado se encontra ameaçado.” Refira-se, ainda, não ter lugar o acórdão uniformizador de jurisprudência do STA n.º 11/2024, de 6 de junho, proferido no processo n.º 741-23.4BELSB (…), porquanto o mesmo se centra nos pedidos apresentados, e não decididos, de concessão de autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada. A falta de urgência e de indispensabilidade da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias consubstancia uma exceção dilatória inominada, cuja procedência obsta ao conhecimento do mérito da causa (neste sentido, vide, a titulo exemplificativo, o acórdão prolatado pelo Tribunal Central Administrativo Norte, em 04.03.2016, no âmbito do processo n.º 02931/15.4..., cujo entendimento aqui se acolhe sem reservas) e impõe a absolvição da entidade demandada da instância, o que se determina de seguida, sem necessidade de maiores desenvolvimentos. Em face de tal conclusão, resulta, naturalmente, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas, bem como a convolação dos presentes autos de intimação para uns outros de ação cautelar (neste sentido, vide MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, op. cit., página 903). Pelo exposto, conclui-se que não estão reunidos os pressupostos ínsitos no n.º 1, do artigo 109.º do CPTA para a admissão da presente intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias, razão pela qual rejeita-se liminarmente o requerimento inicial, nos termos do n.º 1, do artigo 110.º do CPTA. Por identidade de razões, não é aplicável o disposto no artigo 110.º-A do CPTA [negritos e sublinhados nossos]. A sentença segue e cita a abundante e reiterada jurisprudência dos tribunais superiores produzida em situações muito semelhantes à dos autos. Sendo o que vem decidido para manter. Passemos a explicar. Decorre do art 109º do CPTA que: «A intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adoção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar (nº 1), sendo que «quando, nas circunstâncias enunciadas no n.º 1, o interessado pretenda a emissão de um ato administrativo estritamente vinculado, designadamente de execução de um ato administrativo já praticado, o tribunal emite sentença que produza os efeitos do ato devido» (nº 3). Este meio processual, regulado nos arts 109º a 111º do CPTA, constitui um processo autónomo que implica a emissão duma decisão definitiva e em tempo útil. Mas, o meio normal, ou regra, de defesa ou de tutela dos direitos fundamentais reside no recurso à ação administrativa, sendo que o lançar mão das formas de tutela principal urgente, como é o caso vertente, está reservada apenas para as situações em que aquela via normal não é possível ou suficiente para assegurar o exercício em tempo útil e a título principal do direito, liberdade ou garantia que esteja em causa e cuja defesa reclame uma intervenção jurisdicional, ou, ainda, quando aquelas situações não encontrem enquadramento contencioso num outro meio/forma processual principal urgente. Por assim ser, a ação de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias constitui um meio subsidiário de tutela (cfr ac. do STA de 26.9.2019, processo nº 1005/18, e outros que nele vêm citados), destinado a ser utilizado como uma válvula de segurança do nosso sistema de garantias contenciosas, ou seja, apenas nas situações em que as outras formas de processo – ação administrativa associada à dedução de um pedido de decretamento de providências cautelares, destinadas a assegurar a utilidade da sentença que, a seu tempo, vier a ser proferida no âmbito dessa ação – não se mostrem ou não se apresentem como meios adequados ou aptos à realização e efetiva proteção dos direitos, liberdades e garantias, assegurando uma efetiva e plena tutela jurisdicional. Assim, são pressupostos do pedido de intimação que: 1. esteja em causa o exercício, em tempo útil e, por isso, com carácter de urgência, de um direito, liberdade ou garantia [urgência e indispensabilidade]; 2. a adoção da conduta pretendida seja apta a assegurar esse direito; 3.	que não seja possível acautelar o direito por outro meio processual [a intimação ser subsidiária relativamente ao decretamento de uma medida cautelar]. Estes requisitos específicos, de que depende a utilização da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, previstos no artigo 109º, nº 1 do CPTA, são de verificação cumulativa, pelo que a falta de qualquer um dos referidos requisitos de admissibilidade consubstancia uma exceção dilatória inominada. A ação de intimação para proteção de direitos liberdades e garantias não está subordinada a prazo, mas só deve ser usada se for o único meio que em tempo útil permita evitar a lesão do direito do requerente. Para efeitos de aferição da necessidade da intimação, o requerente deve alegar e demonstrar factos dos quais se retire que a intimação é indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, no sentido de não poder voltar a exercer o direito cuja efetividade está comprometida. Existe uma situação de urgência sempre que a atuação e/ ou decisão da Administração prejudique de maneira suficientemente grave e imediata um interesse público ou um interesse do requerente. A urgência exigida no caso trata-se de uma urgência concreta face às circunstâncias do caso, designadamente, por ocorrência de factos lesivos supervenientes. Neste sentido ensinam Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, em Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, 4ª edição, Almedina, pág 883, que: para que a intimação possa ser utilizada, é necessário que esteja em causa o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia e que a adoção da conduta pretendida seja apta a assegurar esse exercício. À partida, o preenchimento deste requisito pressupõe que o requerente concretize na petição os seguintes aspetos: a existência de uma situação jurídica individualizada que caracterize um direito, liberdade e garantia, cujo conteúdo normativo se encontre suficientemente concretizado na CRP ou na lei para ser jurisdicionalmente exigível por esta via processual; e a ocorrência de uma situação, no caso concreto, de ameaça do direito, liberdade e garantia em causa, que só possa ser evitada através do processo urgente de intimação (…). Não releva, por isso, a mera invocação genérica de um direito, liberdade ou garantia: impõe-se a descrição de uma situação factual de ofensa ou preterição do direito fundamental que possa justificar, à partida, ao menos numa análise perfunctória de aparência do direito, que o tribunal venha a intimar a Administração, através de um processo célere e expedito, a adotar uma conduta (positiva ou negativa) que permita assegurar o exercício em tempo útil desse direito.” O requerente/ recorrente submeteu, em 5.9.2023, candidatura a autorização de residência para investimento (vulgo, «ARI»), ao abrigo do artigo 3º, nº 1, al d) e do artigo 90º-A, nº 1 da Lei nº 23/2007, de 4.7, que aprovou o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional. E a 8.9.2023 formalizou, ainda, pedido de reagrupamento familiar para a sua cônjuge e filhos menores. Diante da inação da Administração, o requerente, em 2024, instaurou o presente processo urgente de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias. Todavia, no requerimento inicial apresentado, não invoca quaisquer factos que permitam concluir pela indispensabilidade do recurso ao processo de intimação para assegurar o exercício, em tempo útil, de qualquer direito, liberdade ou garantia. O que resulta do que vem alegado pelo requerente é, face ao incumprimento do prazo de decisão do pedido de concessão de autorização de residência para investimento e dos pedidos de reagrupamento familiar, não pode residir em Portugal, contra os planos de vida e projetos pessoais e familiares que tinha feito em vista o Programa Golden Visa, vê-se impedido de concluir o seu processo de residência civil e, por conseguinte, de poder estabelecer a residência fiscal em Portugal e perde o direito de beneficiar do regime de residente não habitual. O circunstancialismo fáctico descrito não configura uma situação de urgência que careça da tutela do presente meio processual, de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias. Pois, a verificação da urgência e indispensabilidade da emissão de uma decisão de mérito da pretensão do recorrente, ao contrário do que afirma o recorrente, na conclusão 6ª, não resulta, in casu, das regras da experiência, bem como das normas legais aplicáveis à autorização de residência para investimento, sendo dedutível por mera presunção judicial, antes, como ensina a doutrina que citámos, carece de alegação e prova de uma situação factual de ofensa ou preterição do direito fundamental que possa justificar que o tribunal venha a intimar a Administração, através de um processo célere e expedito, a adotar uma conduta (positiva ou negativa) que permita assegurar o exercício em tempo útil desse direito. O que não ocorre no caso. O recorrente invoca que a inação da AIMA põe em causa vários direitos, liberdades e garantias com tutela constitucional, como o seu direito de propriedade e a sua liberdade de iniciativa económica (arts 61º e 62º da CRP), a sua liberdade de circulação e permanência em território nacional (art 44º da CRP), o exercício de direitos pessoais (art 26º da CRP), o direito de petição, de decisão em prazo razoável e de informação (arts 20º, nº 4 e 52º da CRP), o princípio da igualdade (art 13º da CRP), o princípio da tutela jurisdicional efetiva (arts 20º, nº 5 e 268º, nº 4 da CRP). Mas, a invocação genérica que faz da restrição destes direitos, liberdades e garantias – ofensa irreversível, atual e contínua - não permite sustentar uma situação jurídica individualizada que caracterize um direito, liberdade e garantia. Como afirmou este TCAS, em acórdão proferido a 29.6.2023, no processo nº 603/23.2...: III - A extrema urgência inerente ao presente meio processual impõe que devamos fazer uma triagem estrita daquilo que é verdadeiramente urgente e indispensável para salvaguarda de direitos, liberdades e garantias ou outros direitos e garantias de natureza análoga. IV - Isto sob pena de vulgarizarmos a urgência e passarmos a ter, na presente intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, uma espécie processual ineficiente e votada ao fracasso na proteção das verdadeiras urgências e atropelos aos verdeiros direitos, liberdades e garantias. Acresce que ao requerente/ recorrente, como bem decide o tribunal a quo, não é aplicável o disposto no art 15º, nº 1 da CRP, que dispõe que: os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português. De facto, o requerente/ recorrente encontra-se e reside nos Estados Unidos. Assim, porque o requerente não reside nem se encontra em Portugal, não pode beneficiar do princípio da equiparação constitucionalmente consagrado no art 15º, nº 1 da CRP (cfr ac do TCAS de 11.7.2024, processo nº 4812/23). Também a jurisprudência que resulta do acórdão uniformizador do STA nº 11/2024, de 6.6.2024, proferido no processo nº 741/23, não colhe neste caso, porque, como corretamente vem decidido, a situação de facto tratada naquele acórdão é diversa da que vem posta neste recurso. O acórdão do STA versou sobre pedidos de concessão de autorização de residência para o exercício de atividade profissional subordinada e neste caso discute-se um pedido de concessão de autorização de residência para atividade de investimento (cfr acs do TCAS de 3.7.2025, processo nº 31554/24, e de 11.9.2025, processo nº 55075/24). Sendo os casos concretos diversos em cada um dos processos, neste e no nº 741/23, não assiste razão ao recorrente quando alega ter sido discriminado sem fundamento, pois a igualdade envolve a obrigação de “tratar igualmente o que é igual e desigualmente o que é diferente”. Não se olvida que a ausência de decisão definitiva quanto ao pedido de concessão de Autorização de Residência para Investimento (ARI) e aos pedidos de reagrupamento familiar, como sucede nos autos, pode limitar a liberdade de circulação do recorrente e os demais direitos invocados pelo recorrente. Do mesmo modo, a espera por decisão definitiva do pedido de ARI formulado a 5.9.2023 e dos pedidos de reagrupamento familiar apresentados a 8.9.2023 põe em causa o direito do requerente a uma decisão em prazo razoável, prazo este que se encontra manifestamente excedido (cfr arts 82º, nº 5 e 105º, nº 1 da Lei nº 23/2007). Contudo, não se descortina no caso uma situação jurídica individualizada que caracterize um direito, liberdade e garantia, nem vem configurada situação de facto que justifique a tutela urgente de um direito. Ainda assim, o requerente/ recorrente não fica desprovido de direitos. Ao requerente/ recorrente assiste o direito a requerer, segundo os pressupostos da lei ordinária, autorização para residir ou permanecer em Portugal – o que fez. E, consequentemente, assiste-lhe o direito a obter uma decisão nos procedimentos administrativos com vista à concessão de autorização de residência e de reagrupamento familiar (cfr artigo 82º, nº 1 da Lei nº 23/2007 e artigo 13º do CPA) e ainda o direito a recorrer aos tribunais administrativos portugueses, quer no caso de a Administração não tomar uma decisão no prazo legalmente previsto, quer, no caso de, tomada uma decisão, não se conformar total ou parcialmente com a mesma. Foi o que fizeram os requerentes/ recorrentes, porém, sem alegação e prova de factos consubstanciadores da verificação dos pressupostos específicos de que depende a utilização do presente meio processual. Em suma, como decidiu o Tribunal a quo, não logrou o requerente, ora recorrente, alegar e demostrar a indispensabilidade da emissão urgente de uma decisão para proteção de um direito, liberdade ou garantia. Subsidiariamente, o recorrente invoca que se impunha ao tribunal a quo cumprir o disposto no art 110º-A, nº 1 do CPTA, fixando prazo ao recorrente para vir substituir a petição, para o efeito de requerer a adoção de providência cautelar. O teor do preceito permite negar provimento a esta pretensão do recorrente. A norma do nº 1 do art 110ºA do CPTA permite a convolação do processo de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias num processo cautelar quando, em sede liminar, o juiz verifique que as circunstâncias do caso não são de molde a justificar o decretamento de uma intimação, por se bastarem com a adoção de uma providência cautelar. Sucede que, em sede liminar, o juiz a quo verificou, e este tribunal ad quem confirma a decisão, que não foram alegados factos que caracterizem uma situação de urgência para exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia do recorrente. Ou seja, nas circunstâncias do caso concreto, a falta de alegação de factos que demonstrem a indispensabilidade e a urgência da intimação ditou o não preenchimento dos pressupostos legais do art 109º, nº 1 do CPTA, por identidade de razões, nomeadamente por não estar demonstrada a urgência da tutela requerida, não é aplicável ao caso o disposto no art 110ºA, nº 1 do CPTA (cfr fls 5 da sentença, ac do STA de 7.4.2022, processo nº 36/22, ac do TCAS de 9.5.2024, processo nº 2729/23). Pelo que improcedem in totum os erros de julgamento imputados à sentença. Decisão Nestes termos, acordam em Conferência os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso jurisdicional. Sem Custas, por isenção legal do recorrente – art 4º, nº 2, al b) do RCP – sem prejuízo do disposto no art 4º, nº 6 e 7 do RCP. Notifique. * Lisboa, 2025-10-23, (Alda Nunes) (Marta Cavaleira) (Marcelo Mendonça). |