| Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 184/25.5BEFUN | 
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| Secção: | CT | 
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| Data do Acordão: | 10/16/2025 | 
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| Relator: | TIAGO BRANDÃO DE PINHO | 
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| Descritores: | COMPETÊNCIA MATERIAL SUBSECÇÃO TRIBUTÁRIA COMUM SUBSECÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL E DE RECURSOS CONTRAORDENACIONAIS | 
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| Sumário: | 1 – A subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo é competente para "conhecer de todos os processos relativos a litígios emergentes de execuções fiscais e de contraordenações tributárias". 2 – O processo em que se discuta, em recurso, o direito à certificação, pelo órgão de execução de fiscal, de informação relativa à fase processual e à duração da tramitação de um Processo de Execução Fiscal, é da competência da subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais. | 
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| Votação: | Unanimidade | 
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| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum | 
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| Decisão Texto Integral: | Acordam na Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul: Na Intimação para Consulta de Documentos e Passagem de Certidões n.º 184/25.5BEFUN, deduzida por .... contra Autoridade Tributária e Assuntos Fiscais da Região Autónoma da Madeira no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, foi proferida sentença em 25 de junho de 2025 que, julgando-a improcedente, não intimou a Administração a emitir “certidão para efeitos de apresentação em processo diverso, sobre o estado do processo de execução fiscal [n.º 2810-2017/01181750 e apensos], ou seja se o mesmo está parado há mais de 30 dias; em que é Executada .... ”. A decisão ora posta em xeque considerou, na sua fundamentação, que “em causa está, pois, a solicitação, pelo Requerente, de dados sobre a situação tributária de um outro contribuinte, nomeadamente dados sobre a situação tributária da executada .... , no âmbito do PEF n.º 281020171181750 e apensos”, no ponto, “elementos que revelem a atual situação patrimonial da executada e/ou a existência ou não de regularização da situação tributária desta”, tendo concluído que estes “dados que se encontram abrangidos […] pelo dever de sigilo fiscal, previsto no artigo 64.º, n.º 1, da LGT”. Considerando que não se verifica qualquer causa de cessação daquele dever de sigilo (previstas no artigo 64.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária), o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal concluiu que a Administração não podia emitir a certidão requerida pelo Requerente por este não ser o titular de tais dados, nem estar na posse de procuração forense emitida pela Executada (“como refere o Ofício-Circulado n.º 60294, de 12.01.2021”). Inconformado, o Requerente formulou as seguintes conclusões: I - O presente recurso versa sobre a sentença proferida pelo Mma. Juiz do tribunal “a quo”, que julgou improcedente o pedido de intimação para a passagem de certidão, porquanto considerou em síntese que tal violaria o dever de sigilo fiscal previsto no Art.º 64º da Lei Geral Tributaria, doravante LGT. II - Nos termos do disposto no n.º 1 do Art.º 64º da LGT os dirigentes, funcionários e agentes da administração tributária, devem guardar sigilo sobre: a) - os dados recolhidos sobre a situação tributária dos contribuintes; b) - e os elementos de natureza pessoal que obtenham no procedimento, nomeadamente os decorrentes do sigilo profissional ou qualquer outro dever de segredo legalmente regulado. III - Sobre o que deve entender-se por dados relativos à situação tributária dos contribuintes e os elementos de natureza pessoal que obtenham no procedimento, deverá a atentar-se ao parecer n° 20/94 de 9/2/95 do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, publicado no Volume VII da Colecção dos Pareceres da Procuradoria-Geral da República, que estabelece: "A expressão dados relativos à situação tributária dos contribuintes, constante da alínea d) do artigo 17° do Código de Processo Tributário, abrange, na sua previsão, quaisquer informações, quaisquer elementos informatizados ou não que reflictam de alguma forma a situação patrimonial dos sujeitos passivos da obrigação de imposto, sejam pessoas singulares, ou pessoas colectivas, comerciantes e não comerciantes...”. IV - O sobredito parecer, acrescenta ainda "São dados que exprimem a capacidade contributiva: os bens, as atividades, as receitas, os rendimentos, as despesas, os encargos, em suma, tudo o que reflicta ou se prenda com a matéria colectável em causa em cada processo, tudo o que interesse à situação tributária do contribuinte." - no mesmo sentido vide Carlos Pamplona Corte-Real, Jorge Bacelar Gouveia, e Joaquim Pedro Cardoso da Costa in “Breves Reflexões em Matéria de Confidencialidade Fiscal' ', Ciência e Técnica Fiscal, 368, Outubro - Dezembro de 1992, V – O Recorrente não pretende que lhe sejam revelados dados privados de .... , abrangidos pelo sigilo fiscal, porquanto a informação requerida, não envolve a indicação de bens, elementos da conta bancária, numero de contribuinte, nem mesmo elementos que envolvam a situação patrimonial ou pessoal de .... , nem a existência ou não de de regularização da situação tributaria. VI - O Recorrente apenas pretende saber o estado em que se encontra o processo de execução fiscal 2810201701181750 e apensos, uma vez que execução que instaurou por dividas ao condomínio, contra .... - Proc. n.º 12962/22.2T8PRT que corre termos no Juízo de Execução do Porto - Juiz 4, no âmbito do qual foi penhorada, na proporção de metade, a fracção autónoma designada pelas letras “FP”, de que é comproprietária com o actualmente marido Paulo; foi sustada. VII – A exigência decorrente do oficio circulado n.º 60294 da Direcção de Serviços da Justiça Tributária, de 12-01-2021, nos termos do qual a mandatária do Recorrente, para ter acesso à certidão, necessitaria também de procuração subscrita pela .... , é manifestamente absurda não só por tal não ser permitido no termos do Estatuto da Ordem dos advogados, sob pena de violação do segredo profissional – Art.º 92º ; mas também VIII – Por tal não vincular o tribunal, dado que ofícios circulados integram orientações genéricas/instruções administrativas que visam a uniformização de interpretação e aplicação das leis tributárias - vide neste sentido Ac. TCAS, prolatado a 24.02.2022, Proc. n.º 833/13.8BESNT, relatora: Cristina Flora, só vinculam os funcionários e os órgãos da Autoridade Tributária e Aduaneira, não vinculam os contribuintes; nem os tribunais, - Art.º 55º do CPPT, estando sujeitas a revisão do Art.º 68-A n.º 4 da LGT, nomeadamente quando contrariadas por sentenças/ acórdãos dos tribunais. Termos em que, deve ser dado provimento ao recurso interposto, revogando-se a sentença proferida, substituída por outra que determine a emissão por parte do Chefe de Serviço de Finanças do Funchal-1, de certidão que indique se o Processo Execução Fiscal n.º 2810201701181750 e Apensos está parado há mais de 30 dias. e ainda a fixação de sanção pecuniária compulsória condigna, por forma a evitar o atraso na emissão da certidão requerida, fazendo-se a acostumada JUSTIÇA”. *A Recorrida não contra-alegou. *O Exmo. Magistrado do Ministério Público veio aos autos pronunciar-se pela improcedência do Recurso, por considerar que ”para obter informações sobre processos de execução fiscal, caso não seja o próprio titular o requerente, justifica-se a exigência de procuração. Caso contrário, correríamos o risco de qualquer pessoa, pelos mais variados motivos (legítimos ou não) pudesse aceder a tais elementos de terceiros”. *Considerando que o Recorrente interpôs recurso para o “Tribunal Central Administrativo Sul” e que este foi admitido para a “Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul”, foi ordenada a notificação do Recorrente para, no prazo de 10 dias, informar para qual das duas subsecções do TCAS pretendia interpor o Recurso e, no caso de o pretender fazer para esta Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário, se pronunciar, ao abrigo do artigo 655.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, sobre a eventual incompetência, em razão da matéria, desta. O Recorrente veio então esclarecer que pretendeu recorrer para a Subsecção Comum, a qual considera materialmente competente “porquanto ainda que a certidão a emitir diga respeito a um litígio emergente de execução fiscal, o que está em causa nos presentes autos, não é a apreciação do litígio fiscal propriamente dito, mas sim o reconhecimento do direito do Recorrente a obter a emissão de certidão que comprove o estado atual do processo, de modo a permitir o impulso do processo executivo, que corre termos nos tribunais cíveis.” *Considerando que: - A incompetência do Tribunal é uma exceção dilatória que obsta ao conhecimento do mérito; - A infração das regras de competência em razão da matéria é de conhecimento oficioso - artigo 16.º, n.º 2, do CPPT; - O Recorrente foi ouvido sobre a eventual incompetência, em razão da matéria, desta subsecção tributária comum; - Estão dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo (artigos 146.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 36.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), Nada obsta à decisão. *QUANTO À COMPETÊNCIA MATERIAL DA SUBSECÇÃO TRIBUTÁRIA COMUM: Nos termos do artigo 32.º, n.º 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, “Cada Tribunal Central Administrativo compreende duas secções, uma de contencioso administrativo e outra de contencioso tributário”, contendo a secção tributária - n.º 3 - a subsecção tributária comum e a subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais. Por força do n.º 2 do artigo 38.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 49.º-A do ETAF, a subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul é competente para "conhecer de todos os processos relativos a litígios emergentes de execuções fiscais e de contraordenações tributárias". Já a subsecção tributária comum tem competência residual, cabendo-lhe julgar todos os litígios emergentes de relações jurídicas tributárias cujo conhecimento não seja atribuído à subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais - artigos 1.º, n.º 1, 4.º e 38.º, n.º 2, in fine, do ETAF. Pretendeu, assim, o legislador atribuir às subsecções de execução fiscal e de recursos contraordenacionais dos Tribunais Centrais Administrativos competência para apreciar todos os recursos que tenham por objeto litígios emergentes de execuções fiscais e de contraordenações tributárias, isto é, lides que tenham origem em processos de execução fiscal (cfr. artigo 103.º da Lei Geral Tributária) ou em infrações, previstas em normas sancionatórias tributárias, cujo facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal seja punido com coima (cfr. os artigos 2.º e 3.º, alínea b) do Regime Geral das Infrações Tributárias e 1.º do Regime Geral das Contraordenações). Ao utilizar a expressão “litígios emergentes de execuções fiscais” o legislador quis atribuir competência às subsecções de execução fiscal para compor os litígios que no âmbito do Processo de Execução Fiscal, e por força do princípio da Reserva da Função Jurisdicional ou da Reserva de Juiz, têm de ser resolvidos em Tribunal por este ter o monopólio da última palavra quanto a eles (cfr. os artigos 202.º da Constituição da República, 103.º, n.º 2 da LGT e 10.º, n.º 1, alínea f) e 151.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário). O que bem se compreende: tendo sido sua intenção criar uma subsecção especializada na composição dos litígios relacionados com as execuções fiscais e as contraordenações tributárias, decidiu atribuir a tais subsecções uma competência genérica para todos os dissensos conexos com a cobrança coerciva de tributos, assim como com a responsabilização dos agentes que pratiquem aquelas contraordenações. Deste modo, ao eleger, dentro da sua liberdade de conformação, como critério atribuidor da competência o conteúdo material da relação jurídica tributária, o legislador quis, então, que as subsecções de execução fiscal e de recursos contraordenacionais dos Tribunais Centrais Administrativos decidissem todos os litígios (independentemente do meio processual utilizado) que emergem (de forma imediata ou mediata) de execuções fiscais e de contraordenações tributárias, ou seja, todos os recursos de decisões proferidas em processos judiciais tributários cuja génese seja a formulação de um pedido relacionado com a cobrança coerciva de tributos ou com a punição de contraordenações tributárias. *Ora, aferindo-se, como se disse, a competência em razão da matéria do Tribunal pela natureza da relação jurídica, vejamos como é que o Autor a configurou na sua Petição Inicial. No seu articulado, o Autor alega que em 1 de abril de 2025 solicitou ao órgão de execução fiscal “a emissão de certidão que certificasse o estado em que se encontrava o processo de execução fiscal [n.º 2810-2017/01181750 e apensos], ou seja se o mesmo está parado há mais de 30 dias", o que foi recusado - artigos 4.º e 5.º do seu articulado inicial. Mais alega que a pendência deste PEF foi causa de sustação da Ação Executiva para Pagamento de Quantia Certa que corre termos no Juízo de Execução do Porto – Juiz 4, instaurada contra a mesma executada por dívidas ao condomínio, sendo “imperativo conhecer o estado em que se encontra a execução fiscal […] de modo a poder impulsionar” a Ação Executiva cível – cfr. os artigos 1.º a 3.º e 6.º da PI. Deste modo, em causa, nos autos, está o direito do Autor à certificação, pelo órgão de execução de fiscal, de informação relativa à fase processual e à duração da tramitação do Processo de Execução Fiscal n.º 2810-2017/01181750 e apensos, o que constitui uma relação jurídico-tributária e, em concreto, uma pretensão relacionada com um processo de execução fiscal. Daí que o meio processual de que o sujeito passivo lançou mão para reagir contra o indeferimento de tal pedido seja, para efeito do artigo 38.º, n.º 2, do ETAF, um processo relativo a litígio emergente de execução fiscal cuja competência para o conhecimento do recurso da sentença nele proferido é das subsecções de execução fiscal e de recursos contraordenacionais dos Tribunais Centrais Administrativos, que não desta subsecção tributária comum. *Termos em que se acorda julgar verificada a incompetência, em razão da matéria, da subsecção comum da secção de contencioso tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, e se determina a remessa do processo à subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais deste TCAS. Sem custas. Lisboa, 16 de outubro de 2025. Tiago Brandão de Pinho (relator) – Isabel Silva – Sara Loureiro |