Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:213/25.2BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:10/23/2025
Relator:ALDA NUNES
Descritores:EFEITO DEVOLUTIVO DO RECURSO
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DE ATO ADMINISTRATIVO NEGATIVO
INDEFERIMENTO DE AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA
REJEIÇÃO LIMINAR
Sumário:
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo – Subsecção Comum do Tribunal Central Administrativo Sul

Relatório


AA interpõe recurso jurisdicional da sentença proferida a 27.6.2025, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, que rejeitou liminarmente o requerimento inicial de providência cautelar que propôs contra a AIMA - Agência para a Integração, Migrações e Asilo, IP, visando a suspensão da eficácia do ato administrativo proferido a 29.5.2025, que lhe indeferiu o pedido de concessão de autorização de residência.


O recorrente nas alegações formulou as conclusões seguintes:


- O indeferimento de autorização de AR, com a respetiva não concessão da mesma, deixa o recorrente numa situação de ilegalidade, que no final do prazo para abandono se transforma em clandestinidade.


- A suspensão da eficácia de atos negativos, faz sentido nos casos em que o ato seja puramente negativo e na medida em que a lei associe à emissão do ato negativo uma modificação automática que até aí existia.


- Os atos aparentemente negativos, ou atos negativos com efeitos positivos, trata-se de uma categoria de atos em que há, efetivamente, uma utilidade na suspensão na medida que deles advém efeitos secundários positivos.


- A ordem de abandono voluntario do país e a posterior coercividade nesse abandono com a detenção do imigrante, tem como pressuposto o ato administrativo de indeferimento e a ordem de abandono do país e consequente expulsão coerciva, as quais são consequências diretas e necessárias daquele ato administrativo.


- Violou a douta decisão em crise o disposto no artigo 116 n,º 2 al. d) CPTA.


Termos em que deve o presente recurso ser procedente e, em consequência, revogar-se a douta decisão e substituir-se por outra que ordene o recebimento dos autos com toda a demais tramitação legal.


Com efeito, entende o recorrente com respeito pela opinião contrária que o meio processual adequado para a pretensão deduzida é o por si apresentado.


Com efeito, o recorrente foi confrontado com a comunicação de duas decisões: a do indeferimento do seu pedido e do Abandono voluntário.


O recurso foi admitido e, nos termos do art 641º, nº 7 do CPC, o requerido e recorrido foi citado para os termos da causa e do recurso, no entanto, não contra-alegou.


A Exma Procuradora Geral Adjunta, notificada nos termos e para efeitos do art 146º, nº 1 do CTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso e não ter aplicação ao caso do disposto no art 143º, nº 4 do CPTA.


Notificado o parecer às partes, o recorrente respondeu.


Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º, nº 1, alínea d) e nº 2 do CPTA, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à conferência para julgamento.


Objeto do recurso


Atentas as conclusões de recurso, que delimitam o seu objeto, as questões a decidir consistem em:


i) conhecer o pedido de alteração do efeito devolutivo do recurso;


ii) saber se a decisão recorrida viola o disposto no art 116º, nº 1 e nº 2, al d) do CPTA.


Fundamentação


De facto


Para efeitos de decisão do presente recurso jurisdicional dão-se como provados os seguintes factos:

1. O recorrente nasceu a 15.4.1996, na Índia – doc 1 junto com o requerimento inicial.

2. Em 4.7.2022 apresentou pedido de concessão de autorização de residência para o exercício de atividade profissional subordinada, através da manifestação de interesse n.º ..., de acordo com o disposto no art 88º, nº 2 da Lei nº 23/2007, de 4.7, na redação vigente à data da apresentação do pedido – doc 1 junto com o requerimento inicial.

3. A 7.11.2024 a AIMA chamou o recorrente para recolha dos dados biométricos e verificação documental – doc 2 junto com o ri.

4. Por ofício de 4.2.2025 o recorrente foi notificado do projeto de decisão de indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência, por não cumprir o(s) seguinte(s) requisito(s):

a) ausência de condenação por crime que em Portugal seja punido com pena privativa de liberdade superior a 1 ano - a comprovar pela apresentação do certificado do registo criminal do país de origem ou do país onde residiu mais de 1 ano,

b) posse de meios de subsistência,

c) ausência de indicação no Sistema Integrado de Informação da ... para efeitos entrada e permanência ou de regresso – doc 3 junto com o ri.

5. O recorrente respondeu e juntou documentos – doc 5 junto com o ri.

6. A 29.5.2025 a AIMA proferiu despacho final de indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência do recorrente, por, da análise dos documentos apresentados e da consulta das bases de dados relevantes para a apreciação do pedido constatou-se que:

a. Impende sobre o requerente uma medida cautelar, nos termos do disposto no artigo 3.º do Regulamento (UE) 2018/1860.

b. Existe no Sistema de Informação Schengen uma indicação no sentido de ser recusada a entrada, permanência ou regresso, nos termos dos artigos 33.° e 33.°-A da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, verificando-se o incumprimento do disposto no artigo 77.°, n.º 1, al. i), da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho.

(…) Considerando a presente a decisão de indeferimento, fica por este meio notificado o requerente de que deverá abandonar o Território Nacional no prazo de vinte (20) dias (…).

Este prazo para abandono voluntário pode ser prorrogado tendo em conta, designadamente, a duração da permanência, a existência de filhos que frequentem a escola e a existência de outros membros da família e de laços sociais, (…).

Fica ainda por este meio notificado de que:

a. Deverá comprovar documentalmente junto da AIMA … o abandono do Território Nacional e Espaço Schengen, Estados Membros da União Europeia ou Estados Parte ou Associados da Convenção da Aplicação do Acordo de Schengen, para o país de que é nacional, ou outro Estado terceiro, no qual tenha garantida a admissão;

b) Caso não abandone voluntariamente Território Nacional nos termos supramencionados, poderá ficar sujeito (a) detenção por permanência ilegal promovida pelas forças e serviços de segurança e à instauração do procedimento de afastamento coercivo (…) - doc 5 junto com o ri.

O Direito.


Pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso.


O recorrente requer a concessão de efeito suspensivo ao presente recurso, nos termos do art 143º, nº 4 do CPTA, alegando que a execução imediata da decisão recorrida causar-lhe-á prejuízo grave e de difícil reparação, não causando o deferimento do efeito suspensivo qualquer lesão significativa do interesse público.


Vejamos.


Nos termos do artigo 641º, nº 5 do CPC, a decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior.


O presente recurso jurisdicional vem interposto da decisão que rejeitou liminarmente o requerimento inicial do processo cautelar.


Pretende o requerente/ recorrente que, ao abrigo do disposto no artigo art 143º, nº 4 do CPTA, seja fixado ao recurso efeito suspensivo.


Para o recurso em apreço, de apelação, interposto da decisão proferida em processo cautelar, o Código de Processo nos Tribunais Administrativos dispõe de norma própria no art 143º, nº 2, al b), nos termos da qual: 2 – Para além de outros a que a lei reconheça tal efeito, são meramente devolutivos os recursos interpostos de: … b) decisões respeitantes a processos cautelares e respetivos incidentes.


Como se afigura evidente, da citada al b) do nº 2 do art 143º do CPTA expressamente resulta solução legal contrária à sustentada pelo recorrente, posto que aí se prevê que têm efeito meramente devolutivo os recursos interpostos de decisões respeitantes a processos cautelares em prol da eficácia de um meio processual urgente, configurando uma exceção à regra de atribuição de efeito suspensivo (art 143º, nº 1 do CPTA).


O art 143º do CPTA apenas permite que o tribunal possa alterar, quando requerido pela parte interessada, a efeito regra dos recursos - o efeito suspensivo – previsto no nº 1 do preceito – para efeito devolutivo, nos termos previstos nos seus nº 3, 4 e 5.


Ou seja, quando o efeito devolutivo decorre diretamente de imperativo legal, como sucede nos casos previstos no nº 2 do art 143º do CPTA, não se lhe aplica o disposto no art 143º, nº 4 do CPTA. Esta norma, do nº 4, é aplicável às situações em que tenha sido requerida a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso nos termos do nº 3.


Neste sentido, observam Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha que «a lei não prevê a possibilidade, nos casos em que o recurso tem efeito meramente devolutivo, nos termos do nº 2, de ser requerida ao juiz a substituição desse efeito por um efeito suspensivo», pois a atribuição do efeito meramente devolutivo ao recurso decorre das «razões de especial urgência que estão na base da utilização dos meios processuais em causa (…) [e de nas ] decisões respeitantes a processos cautelares, também pelo facto de o juiz já ter procedido, no âmbito desses processos, à ponderação de interesses de que os nº 4 e 5 do presente artigo fazem depender a decisão do juiz de alterar os efeitos do recurso» («Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos», 2017, pág. 1103 e os Acórdãos do STA de 3.11.2022, processo nº 1465/19, do TCAS de 11.1.2024, processo nº 2431/22, e do TCAN de 20.10.2023, processo nº 46/23, de 26.9.2025, processo nº 434/25).


Improcede, assim, o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto da rejeição liminar do requerimento inicial destes autos cautelares, mantendo-se o efeito devolutivo declarado pelo tribunal a quo em estrito cumprimento da lei.


Erro de julgamento de direito.


O requerente, ora recorrente, pediu a suspensão da eficácia do ato administrativo proferido pela AIMA, com data de 29.5.2025, que lhe indeferiu o pedido de concessão de autorização de residência que peticionou.


O tribunal a quo rejeitou liminarmente o requerimento inicial do processo cautelar por manifesta falta de fundamento da tutela cautelar requerida, em conformidade com o disposto no artigo 116º, nº 2, al d) do CPTA e com a jurisprudência que cita (cfr acs do STA de 1.10.1998, processo nº 44160, de 30.9.2009, processo nº 718/09, ac do TCAN de 30.11.2017, processo nº 886/17-A). Para o efeito, fundamentou o tribunal que o ato suspendendo identificado pelo requerente é um ato administrativo de indeferimento, consubstanciando um ato puramente negativo, porquanto a sua prolação não conduz a uma modificação automática da situação preexistente do requerente. Assim sendo, a suspensão do ato puramente negativo não altera a esfera jurídica do requerente, não existindo efeitos do indeferimento passíveis de serem suspensos quanto à sua execução.


Acresce que, atentando nas alegações aduzidas pelo requerente em sede de requerimento inicial, ressalta que aquele entende verificar-se, com o indeferimento do seu pedido, o primeiro passo para o abandono voluntário do território nacional, o que comporta um dano irreparável.


Contudo, tratando-se de abandono voluntário, que pode ser eventualmente objeto de prorrogação nos termos do art 138º, nº 3 da Lei nº 23/2007, de 4.7.2007, como aliás consta da própria notificação da decisão de indeferimento, a sua execução somente tem lugar no âmbito de um outro procedimento administrativo visando a sua expulsão, a ter lugar nos termos do art 145º e segs da Lei nº 23/2007. Apenas no fim desse procedimento administrativo de expulsão coerciva é então proferido ato administrativo final, que poderá ser tanto de expulsão como de arquivamento, sendo esse ato futuro passível de impugnação judicial (arts 149º, nº 4 e 150º da Lei nº 23/2007).


Do acima exposto decorre assim que, não tendo o procedimento de expulsão coerciva do cidadão do território nacional, admitidamente pelo requerente, tido sequer início, a sua pretensão sempre seria manifestamente infundada, pois, contra um tal ato administrativo futuro, proferido a final nesse procedimento, existem meios de tutela principais e cautelares ao dispor do requerente (…).


O recorrente discorda do decidido.


Argui, desde logo, que, enquanto aguardava a decisão do seu pedido de autorização de residência, encontrava-se numa situação de legalidade, podia cá residir, trabalhar, viver a sua vida normalmente, por outro lado o indeferimento é um ato de conteúdo negativo, porém é o ato definidor da situação jurídica e é o pressuposto do segundo ato «ordem de abandono voluntário», sem o qual este não existiria. Assim, o ato suspendendo de indeferimento não é um ato puramente negativo como vem decidido, mas um ato aparentemente negativo ou ato negativo com efeitos positivos, em que há, efetivamente, uma utilidade na suspensão, na medida que dele advêm efeitos secundários positivos. A ordem de abandono voluntário do país e a posterior coercividade nesse abandono tem como pressuposto o ato administrativo de indeferimento e a ordem de abandono do país e consequente expulsão coerciva, as quais são consequências diretas e necessárias daquele ato administrativo. Em abono da sua tese, o recorrente cita a jurisprudência vertida no ac do STA de 19.2.2003, processo nº 289/03.


Analisemos.


A questão dos autos prende-se com a natureza do ato suspendendo, puramente negativo, como decidiu o tribunal, ou aparentemente negativo ou negativo com efeitos positivos, como advoga o recorrente e, consequente, insuscetibilidade ou suscetibilidade de suspensão de eficácia do ato administrativo de 29.5.2025.


O requerente da providência cautelar de suspensão de eficácia, do ato administrativo de indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência em território nacional, apresentou o pedido através de uma manifestação de interesse em 4.7.2022.


A manifestação de interesse era um procedimento estabelecido pela Lei nº 23/2007, de 4.7, na redação que lhe foi dada pela Lei nº 59/2017, de 31.7 (revogado pela Lei nº 37-A/2024, de 3.7), que permitia a regularização da permanência em território nacional, por meio do exercício de uma atividade profissional subordinada ou independente, a imigrantes sem visto válido para o efeito, ao abrigo do nº 2 do artigo 88º e do nº 2 do artigo 89º da Lei dos Estrangeiros (cfr preâmbulo da Lei nº 37-A/2024).


Por esta via, o cidadão estrangeiro que já se encontrava em Portugal, além dos requisitos previstos no art 77º, nº 1, als b) a j) da Lei nº 23/2007, desde que tivesse entrado legalmente em Portugal, estivesse inscrito e com situação regularizada na Segurança Social e possuísse relação laboral comprovada podia requerer autorização de residência.


Com as alterações introduzidas na Lei nº 23/2007, de 4.7, pela Lei nº 59/2017, de 31.7 e, depois, pela Lei nº 28/2019, de 29.3, o legislador da alteração operada na Lei dos Estrangeiros pela Lei nº 37-A/2024, de 3.6 (esta versão não se aplica ao caso por força do estipulado no seu art 3º, nº 2, a)), assume (no preâmbulo) que «com estas alterações [de 2017 e 2019], admitiu-se, de forma clara, a possibilidade de qualquer cidadão estrangeiro permanecer em território nacional, ainda que tenha entrado de forma irregular no País».


O mesmo é dizer que até ser proferido e ser notificado o despacho final de indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência, a 29.5.2025, o requerente/ recorrente permaneceu em território nacional a coberto das normas da Lei dos Estrangeiros que lhe permitiam a regularização da permanência em território nacional, mediante o procedimento administrativo previsto no artigo 88º da Lei nº 23/2007, de 4.7, para concessão de autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada.


Com a prática e notificação do ato suspendendo, o requerente, ora recorrente, teve conhecimento do indeferimento do seu pedido de concessão de autorização de residência, por sobre ele impender uma medida cautelar, nos termos do disposto no artigo 3.º do Regulamento (UE) 2018/1860.


Foi notificado de que deverá abandonar o Território Nacional no prazo de vinte (20) dias (…); deverá comprovar documentalmente junto da AIMA … o abandono do Território Nacional e Espaço Schengen, Estados Membros da União Europeia ou Estados Parte ou Associados da Convenção da Aplicação do Acordo de Schengen, para o país de que é nacional, ou outro Estado terceiro, no qual tenha garantida a admissão.


E, ainda foi notificado de que, caso não abandone voluntariamente Território Nacional nos termos supramencionados, poderá ficar sujeito (a) detenção por permanência ilegal promovida pelas forças e serviços de segurança e à instauração do procedimento de afastamento coercivo (…).


Em face desta factualidade, o ato suspendendo não deixa intocada a esfera jurídica do recorrente, a ponto de pelo ato nada ter sido criado, modificado, retirado ou extinto relativamente ao status anterior a 29.5.2025 (cfr ac do STA de 19.2.2003, processo nº 289/03, citado na conclusão 21 do recurso).


Com o ato suspendendo o recorrente deixa de ter, perde a situação de permanência autorizada em território nacional a coberto das normas da Lei dos Estrangeiros que lhe permitiam a regularização da permanência em território nacional, por meio do exercício de uma atividade profissional subordinada, sem visto válido para o efeito.


Pelo que, assiste razão ao recorrente, há um efeito positivo imediato com a suspensão de eficácia do ato de indeferimento, que consiste, como decidiu recentemente o TCAN, em acórdão proferido a 26.9.2025, no processo nº 449/25.6..., sobre caso idêntico ao dos autos, em «manter o estatuto que a manifestação de interesse lhe proporciona, servindo cautelarmente a preservar uma permanência em território nacional que em ação principal pretende(rá) almejar em definitivo».


Sustentando ainda o mesmo acórdão do TCAN: sem que valha afirmar de inútil ou sem positivo efeito a suspensão porque o requerente/ recorrente se manteria em situação ilegal, quando este, com tal manifestação de interesse, é recolector de situação de permanência autorizada de harmonia com o disposto na Lei nº 23/2007, de 4.7, e quando sendo de fundamento do ato que «impende sobre o requerente uma medida cautelar, nos termos do disposto no art 3º do Regulamento (EU) 2018/1860», que expressamente admite uma «suspensão ou o adiamento da execução da decisão de regresso, inclusive como resultado da interposição de um recurso (art 3º, nº 5),verte, precisamente, que tal hipótese não verta operativa nos seus efeitos.


Acresce que, se for de suspender a eficácia do ato de indeferimento do pedido de autorização de residência do recorrente, também as demais notificações ordenadas pela decisão suspendenda não podem manter eficácia. Isto porque, como alega o recorrente, o indeferimento é um ato de conteúdo negativo, porém é o ato pressuposto da ordem de abandono voluntário do país e da posterior coercividade nesse abandono, sem o qual estas não existiriam.


Assim, o ato suspendendo de indeferimento não é um ato puramente negativo como vem decidido, mas um ato aparentemente negativo ou ato negativo com efeitos positivos, em que há, efetivamente, uma utilidade na suspensão, na medida que dele advêm efeitos positivos.


A situação dos autos, ao contrário do que vem decidido, não é idêntica à tratada no acórdão do TCAN, proferido a 30.11.2017, no processo nº 886/17.0...-A, citado na decisão recorrida. Além do referido aresto não ter colhido unanimidade, por dele constar um voto vencido, no processo só estava em causa a suspensão de eficácia da decisão que determinou a notificação do cidadão estrangeiro para o abandono voluntário do território nacional e da decisão de indeferimento do recurso hierárquico interposto. O que significa que a doutrina vertida no referido acórdão não se aplica ao caso em apreço, em que o ato pressuposto é a decisão administrativa de indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência.


Aqui chegados, cumpre concluir pela verificação do erro de julgamento imputado à decisão recorrida, pois não é manifesta a falta de fundamento da pretensão cautelar, não podendo manter-se a rejeição liminar do requerimento inicial do processo cautelar.


Decisão


Nestes termos, acordam em Conferência os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em:


i) manter o efeito devolutivo ao recurso;


ii) conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, devendo o TAF de Beja prosseguir os ulteriores termos do processo em ordem à prolação de sentença, se a tal nada mais obstar.


Sem custas.


Notifique.


*


Lisboa, 2025-10-23,


(Alda Nunes)


(Marcelo Mendonça)


(Marta Cavaleira).