Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:461/09.2BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:10/16/2025
Relator:ISABEL SILVA
Descritores:IABA
FRANQUIA
PERDA FORTUITA
Sumário:I-A par das franquias a que aludia o artigo 39º do CIEC (Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro), as perdas devidas a caso fortuito ou de força maior, também beneficiavam de franquia desde que não houvesse negligência grave e fossem comunicados à estância aduaneira competente até ao segundo dia útil imediato ao da sua ocorrência, para efeitos de confirmação e apuramento, caso contrário, seria legítima a conclusão de que a “perda” se considere introdução no consumo (artigos 41º, 7.º, n.º 1 e 37.º, n.º 2, do CIEC vigente à data dos factos).

II- Para beneficiar da franquia a que aludia o artigo 41º do então CIEC, o interessado não pode apregoar que a perda/diferença encontrada no varejo se deve a fuga ou a obras, e ao mesmo passo, defender que a perda afinal não existe.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: *
Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subseção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

Vem L......., ora recorrente, apela para este Tribunal Central Administrativo, da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra o ato de liquidação “a posteriori” de Imposto sobre o Álcool e as Bebidas Alcoólicas (IABA), determinado pelo despacho do Diretor da Alfândega de Peniche, no âmbito do processo de Conferência Final n° 171/2007, notificado a coberto do oficio nº 12456, datado de 15.12.2008, de que resultou a pagar o montante global de € 8.017,40, sendo 7.658,20€, a título de IABA e 359,20€ respeitante aos juros compensatórios.

O Recorrente apresentou na sua alegação recursiva as seguintes conclusões:
“1) Conforme consta dos autos, o Recorrente deduziu Impugnação Judicial, do Despacho proferido pelo Director da Alfândega de Peniche que fixou a título de imposto sobre o Álcool e Bebidas Alcoólicas, e respectivos juros, a quantia de 8.017,40€, nos termos do disposto no artigo 102º do CPPT “ex vi” artigos 95º e 101º da LGT, alegando o que acima se transcreveu;

2) Notificado o Exmo. Representante da Fazenda Pública (Director da Alfândega de Peniche), veio apresentar contestação pugnando, em síntese, pela improcedência da acção;

3) Por Sentença de fls., o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” decidiu o acima transcrito;

4) O que sempre esteve em discussão foi o ato administrativo de liquidação, que se define como ato tributário, bem como os atos preparatório que a ele levaram;

5) Tais atos referem-se à liquidação de IABA, parece que é do exercício de 2007, da importância de €7.658,20, a que acrescem os respetivos juros compensatórios, que são acessórios da obrigação principal (o tributo);

6) E, disse que parece que a liquidação de IABA respeita ao 2007, por que tal facto nunca foi determinado;
7) Se verificarmos o que vem dito nas alíneas c) e d) não se tratará da mesma aguardente bagaceira, dada a confusão da sentença, que detectamos, pois o depósito nº6 tem a capacidade de 9.300 litros e o depósito nº 7 é que tem a capacidade de 7.000 litros;

8) A aguardente bagaceira que estava originariamente no depósito aéreo nº6 [em cimento] com a capacidade de 9.300 litros, e depois transferido para o depósito em inox nº 2, com a capacidade de 50.000 litros, mas também foi transferida para o depósito nº 2 a aguardente bagaceira de 467 litros, que se encontrava no depósito plástico (com a capacidade de 1.000 litros), como se vai apurar [note-se que a empresa tem mais de 20 depósitos em plástico com a capacidade de 1.000 litros cada, para suportar as diferenças que não cabem nos depósitos principais];

9) Os elementos de contabilidade demonstram, relativamente à aguardente bagaceira, o quadro fáctico acima mencionado, conforme fotocópia já junta como doc. 2;

10) Por adelgaçamento se entende a introdução de água para a redução do volume alcoólico, que seja muito elevado, e para facilitar a sua comercialização. Esta prática é permitida por lei;

11) Esta aguardente bagaceira a granel estava acondicionada do seguinte modo: 9300 litros no depósito nº6 [onde se verificou a fissura com o consequente derramamento da aguardente]; e, 467 litros em embalagem de plástico com a capacidade de 1.000 litros;

12) O que perfaz o total de 9.767 litros de aguardente bagaceira a granel, e que é uma das causas de pedir relativas ao erro de liquidação em causa no processo de impugnação judicial;

13) Nem da prova testemunhal, nem de qualquer prova junta ao processo, consta que os 9767 litros estavam acondicionados num único depósito. Daqui resulta à evidência que a decisão proferida não respeitou a prova efectuada, e foi desajustada com a realidade;

14) Isto além da confusão pronunciada pelo tribunal como se demonstra na alínea d) do articulado 5º, em que trocou tudo;

15) Depois de ouvidos os depoimentos das testemunhas, verificámos que consta a páginas 11 da sentença: ‘O depoimento prestado revelou conhecimento direto dos factos sobre os quais incidiu, mostrou-se claro e coerente, sem contradições, convencendo o Tribunal da sua veracidade;

16) Quanto às estampilhas destinadas às garrafas individuais, em que se verificou uma
diferença de 11 estampilhas em excesso, esta diferença se deveu apenas a uma caixa que não estava ainda encerrada, e em que faltava a aposição das respetivas estampilhas, donde não resultou efetivamente qualquer falta, mas cuja deteção só ocorreu após o relatório do varejo;

17) Quanto ao vinho licoroso, o seu acondicionamento foi feito em depósitos em madeira, donde resultou a sua perda por absorção pela madeira;

18) A aguardente bagaceira apresentava um saldo físico em litros de 7770 e, um saldo contabilístico em litros de 9767.

19) Ficou demonstrado e provado que ocorreu um caso fortuito, conforme participação feita pelo obrigado fiscal, em 21.09.2007, e que vai documentado como documento nº1, que ocorreu no prazo de 24 horas após o seu conhecimento; por prova testemunhal, de 08.01.2013, junta aos autos e por auto de inspeção judicial ao local, datado de 28.01.2013, junto aos autos;

20) Donde resultou, que: a perda do número em litros de 1997, se deveu a caso fortuito, de que se desconhecem as causas, mas que poderá estar relacionado com atos de conservação de outro depósito, mas de que não era suposto que tal tivesse acontecido;

21) A liquidação impugnada deve ser anulada por ilegal, e entendemos que se verificou um puro erro judiciário na decisão recorrida e que deve ser corrigido, só assim se fará justiça, que apesar de tarde, é preferível a nenhuma;

22) A Decisão que deu causa a este recurso, não está fundamentada como exigem as normas referidas, tendo por esse facto de ser Revogada, nulidade, esta, que aqui, mais uma vez, se requer;

23) O (Venerando Tribunal) com a decisão recorrida, não assegurou a defesa dos direitos da Alegante, ao não fundamentar exaustivamente a sua decisão, e nem se quer aplicar as normas legais aplicáveis ao caso em concreto;

24) O Venerando Juiz do Tribunal a quo limitou-se apenas e tão só, a emitir uma decisão onde apenas de uma forma simples e sintética foram apreciadas algumas das questões, deficientemente e sem qualquer cabimento, conforme acima já se alegou e explicou;

25) Deixando o Venerando Juiz do Tribunal a quo de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as acima expostas, cometendo, pois, uma nulidade;
26) A Sentença recorrida viola:
a) O disposto nos artigos 124º, 125º do CPA;
b) O disposto no artigo artigo 21º CPT;
c) O disposto no artigo artigo 120, als. a), b) e c) do CPPT;
d) O disposto no artigo artigo 77º da LGT;
e) O disposto nas alíneas b), c) e d) do atual 615º do CPC;
f) O disposto no Decreto-Lei nº 256-A/77, de 17 de Junho;
g) O disposto nos artigos 13º, 20º, 202º, 204º, 205º, 266º, nº 2 e 268º, nº 3 da CRP.

Termos em que, nos melhores de direito, e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve a Sentença recorrida ser REVOGADA, por ser de:
LEI, DIREITO, E JUSTIÇA.”.


*

Notificada, a Recorrida, Fazenda Pública, apresentou contra-alegações, concluindo como segue:

“1- O Recorrente, NIF........, com sede em Rua de S........ Leiria, constituiu-se como "Depositário Autorizado", junto da ex-Direcção Geral das Alfandegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (atual Autoridade Tributária e Aduaneira) em 28 de Janeiro de 2002, estando assim sujeito ao regime geral de produção, detenção, circulação e controlo dos produtos sujeitos a impostos especiais sobre o consumo, de acordo com o Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), aprovado pelo Decreto - Lei nº566/99, de 22 de Dezembro.

2- O estatuto de depositário autorizado, constitui um dos elementos essenciais do regime, permitindo ao operador produzir, transformar, deter, receber e expedir num entreposto fiscal produtos sujeitos a IEC em regime de suspensão de imposto. (Destaque e sublinhado nosso).

3- O nº2 do artº24 CIEC, estabelece as obrigações inerentes ao estatuto de Depositário Autorizado." Sendo uma das obrigações do estatuto do Depositário Autorizado a de "Manter atualizada uma contabilidade das existências em sistema de Inventário permanente, com indicação da sua proveniência, destino e os elementos relevantes para cálculo do imposto;" de acordo com o estipulado na alínea b) do nº2 do artº24º do Código dos Impostos Especiais Sobre o Consumo (CIEC), aprovado pelo Decreto-Lei nº566/99, de 22 de Dezembro.(Destaque nosso)

4- Outra das obrigações que se encontram mencionadas no CIEC, e que o Depositário Autorizado deve cumprir é a que se encontra estipulada no artº41º "As perdas devidas a caso fortuito ou de força maior beneficiam de franquia desde que não tenha havido negligência grave e sejam comunicados à estância aduaneira competente até ao segundo dia útil imediato ao da sua ocorrência, para efeitos de confirmação e apuramento." (Destaque e sublinhado nosso)

5- No âmbito das competências da Alfândega (artº18º da Portaria nº349/2007, de 30 de Março), foi efectuado um varejo, ao entreposto de produção nº PT1……………… do Recorrente, em 21 de Março de 2007, por funcionárias da Alfândega de Peniche. A equipa fiscalizadora, procedeu à verificação das instalações, contagem tisica de todas as mercadorias existentes, verificação das contas correntes, à data da visita, tendo elaborado Auto de Inventário e Auto de Declarações. Doc. 4 e De. 5.

6- No varejo as funcionárias verificaram que o Recorrente:

1. Não possuía uma contabilidade de existências, organizada em sistema de inventário permanente com saldo à vista com indicação da sua proveniência, destino e elementos relevantes para o cálculo do imposto, que satisfaça as necessidades de controlo do entreposto fiscal, contrariando o disposto na alínea b) do nº2 do art°24°, do CIEC, aprovado pelo Decreto­ lei nº566/99 de 22/12;

2. a contabilidade de existência dos produtos engarrafados e a granel da aguardente bagaceira, aguardente bagaceira velha, e vinho licoroso abafado/geropiga, apresentam lacunas, incorrecções e omissões, para além de não mencionar o grau alcoólico, fundamental para o cálculo do IEC:

3. Apuraram-se diferenças para menos entre o saldo contabilístico e as existências de produtos engarrafados e a granel: ou seja, em termos físicos existia menos produto do que o que constava nos registos do entreposto fiscal (EF);

4. apresenta a conta corrente de estampilhas especiais de acordo com o modelo constante no anexo IV da Portaria 701/2003 de 1 de Agosto, nos termos do nº15 da referida Portaria, contudo, não menciona o nº. das DIC como exigível;

5. O operador apresentou uma percentagem de perda superior à franquiada, de acordo com o estipulado nos arts 37, e 38º, do CIEC, aprovado pelo Decreto-Lei nº 566/99 de 22/12, sendo o imposto exigível em território nacional no momento da introdução no consumo, em conformidade com o disposto no nº 1 e na alínea a) do nº 2 ambos do artº7, do mesmo diploma legal.

7- No âmbito do Varejo foram analisados todos os factos, procedimentos e documentos inerentes ao citado entreposto, atendendo sempre ao disposto no CIEC. Tendo-se verificado várias irregularidades no cumprimento do regime fiscal relativo à produção, recepção, detenção, expedição, circulação e introdução no consumo de Bebidas Alcoólicas.

8- O art°41º do CIEC estabelece que "As perdas devidas a caso fortuito ou de força maior, beneficiam de franquia desde que não tenha havido negligência grave e sejam comunicados à estância aduaneira competente até ao segundo dia útil imediato ao da sua ocorrência, para efeitos de confirmação e apuramento.

9- Considera-se casos fortuitos ou de força maior, derrames em consequência de acidentes de navegação, rebentamento de condutas, etc), conforme citação da página 118/119 do Código dos Impostos Especiais de Consumo (Anotado) de A. Brigas Afonso, 2ª edição, Coimbra Editora.

10- Pelo que, são relevantes para serem considerados como casos fortuitos ou de força maior, acontecimentos que não estejam dependentes do controlo ou de cumprimento de obrigações inerentes ao estatuto que o operador detém

11- O motivo susceptível de integrar o conceito de caso fortuito ou de força maior, para efeitos de exclusão da responsabilidade fiscal do depositário autorizado tem necessariamente a ver com circunstâncias anormais e estranhas ao depositário e cujas consequências são inevitáveis apesar de todas as diligências empregues, como acontece com os acontecimentos naturais imprevisíveis ou previsíveis mas incontroláveis, que têm como efeito a perda da mercadoria.

12- As franquias por perdas por caso fortuito ou de força maior, carecem de reconhecimento prévio por parte da Alfândega de controlo, pelo que no momento da fiscalização apenas se verificou a falta de 1997 litros de aguardente bagaceira, não se confirmando a existência no local de fissura nas paredes (parte superior) do depósito que justifica-se a falta desta quantidade, verificando-se na parte exterior do edifício do lado em que estão instalados os depósitos de cimento a parede molhada não se provando se era ocasionado por um derramamento ou motivada pelas condições atmosféricas, por exemplo chuva.

13- A aguardente bagaceira na altura do controlo estava acondicionada num depósito em inox (Capacidade de 10.000L), estando nele a quantidade de 7.770 Litros, conforme Auto de Inventário. Doc. 4.

14- Pelo que, as funcionárias não puderam confirmar a saída da aguardente do depósito de cimento para o depósito de inox e em que circunstancias ocorreu. Só constataram que a mesma se encontrava acondicionada num depósito de inox.

15- Na inspecção judicial ao entreposto, o Recorrente identificou o depósito de cimento no qual inicialmente/antes da realização do varejo, estava acondicionada a referida aguardente. Sendo o depósito aéreo é o nº7 ou seja o último depósito, a contar da entrada do entreposto.

16- De acordo com a planta do entreposto fiscal e a memória descritiva inserta no processo do Depositário Autorizado, deposto nesta Alfândega, o Depósito identificado pelo Recorrente como sendo o que teria a fissura e que por esse motivo tinha derramado a aguardente em falta (1997 Litros), tem de capacidade 7.000 Litros. Doc.6 e Doc.7.

17- De acordo com o Recorrente, os 9.767 litros estavam no depósito aéreo de cimento nº6, conforme Auto de Inventário, antes de ser transferidos para o depósito de inox, em virtude de uma fissura na parte superior do depósito de cimento, responsável pela perda de aguardente. Nas instalações a Impugnante identifica o depósito nº7 como sendo o que tinha acondicionado a aguardente.

18- Ora, não é possível acondicionar 9.767 litros de aguardente dentro de um depósito cuja capacidade total é de 7.000 litros.

19- Mesmo o depósito contíguo ao nº7 ou seja o depósito nº6, que foi o que inicialmente em sede de controlo foi o referido pelo Impugnante tem de capacidade 9.300 litros, conforme se pode verificar na referida planta, pelo que neste depósito também não estaria a aguardente em falta.

20- O depósito nº5 que fica adjacente ao nº6, tem de capacidade 9.000 litros pelo que também neste depósito não estaria acondicionado os 9.767 litros de aguardente bagaceira.

21- Como se verifica, existem incoerências na demonstração de que foi por uma fissura naquele depósito (nº7 ou nº6) que houve o derramamento de 1.997 litros.

22- Razão pela qual, agora, o Recorrente pretende justificar, que afinal a aguardente estava no depósito nº6 (9.300), e 467 litros estavam num depósito de plástico de 1.000 litros.

23- Ora, os factos constantes do ponto supra, nunca foram invocados pelo Recorrente, quer em sede de exercício do direito de audição, quer na impugnação, quer mesmo em sede de audiência.

24- Convenhamos, que à data do varejo e posteriormente o Recorrente nunca logrou lembrar-se que afinal a aguardente, em vez de estar acondicionada num depósito, estava em dois.

25- Sendo sui generis, esta nova abordagem, surgir em sede de recurso.

26- Facto verificado é que existe diferença entre a conta corrente e a existência física e que essa diferença é de 1997 litros de aguardente bagaceira, e que à data do varejo estava acondicionada num depósito em inox, com capacidade de 10.000 litros. Doc.4.

27- Considerando os registos na conta-corrente em 01/01/2007, existiam 9.767 litros de aguardente e em 21/03/2007 existiam 7.770 litros, existindo um hiato de tempo de 2 meses e 19 dias entre as verificações do produto. Não tendo sido detectado neste período qualquer ocorrência. Doc. 3.

28- Outro facto verificado é que o Recorrente não cumpriu as obrigações inerentes ao estatuto que detém. Obrigações estas relevantes para a averiguação de qualquer ocorrência susceptível de liquidação e apuramento de imposto.

29- Porque inerente ao estatuto de Depositário Autorizado, há que ”Manter actualizada uma contabilidade das existências em sistema de inventário permanente, com indicação da sua proveniência, destino e os elementos relevantes para cálculo do imposto;", nos termos do CIEC conjugado com o nº8 do Despacho Normativo nº42/2000

30- Procedimentos estes que o Recorrente não fez, e os quais são relevantes em sede de controlo e em termos de responsabilidade do Depositário.

31- Por tudo quanto foi exposto, conclui-se que, a Recorrente, não cumpriu com as normas estipuladas no CIEC, aprovado pelo Decreto-Lei nº 566/99, de 22 de Dezembro, conforme é sua obrigação face ao Estatuto de Depositário Autorizado que detém desde 28 de janeiro de 2002.

32- Considerando toda a matéria de facto e de direito controvertida, reiteramos a posição proferida pelo Meritíssimo Juiz "a quo", na Douta Sentença.

Nestes termos e nos melhores de direito, com o sempre mui douto suprimento de Vossa Excelência, deverá ser mantida a Douta Decisão, confirmando-se o ato de liquidação impugnado.”.


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Os autos tiveram vista do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, nos termos do artigo 288.º, n.º 1 do CPPT, o qual no parecer que emitiu concluiu no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos legais, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, vem o processo à Conferência para julgamento.

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II -QUESTÕES A DECIDIR:

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT].
Nesta conformidade, as questões sob recurso são as de saber se a decisão recorrida padece dos seguintes vícios:
(i) - Nulidade, por falta de fundamentação, por ser contraditória e por omissão de pronúncia;
(ii) – Erro de julgamento por errada valoração da prova, da subsunção jurídica aos factos e por erro na interpretação de normas legais.
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III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Consultando a decisão recorrida, reza assim a enunciação da matéria de facto:”
A)
Em 08-10-2007, a Alfândega de Peniche elaborou relatório de varejo, iniciado em 21-03- 2007 e concluído em 04-09-2007, ao depositário autorizado L....... onde consta, designadamente, o seguinte:
“Avaliação
A empresa não possuía uma contabilidade de existências, organizada em sistema de inventário permanente com saldo à vista com indicação da sua proveniência, destino e elementos relevantes para o cálculo do imposto, que satisfaça as necessidades de controlo do entreposto fiscal, nos termos do disposto na alínea b) do n°2 do artº 24°, do CIEC, aprovado pelo Decreto-lei nº 566/99 de 22/12; A contabilidade de existência dos produtos engarrafados e a granel “Aguardente bagaceira”, “Aguardente bagaceira velha” e Vinho licoroso abafado / jeropiga”, apresentam deficiências, incorrecções e omissões, para além de não mencionar o grau alcoólico, fundamental para o cálculo do IEC;
Apuraram-se diferenças para menos entre o saldo contabilístico e as existências de produtos engarrafados e a granel. Relativamente às diferenças para menos de produtos engarrafados, estas quebras não beneficiam de franquias, sendo portanto exigível o Imposto sobre o Álcool e as Bebidas Alcoólicas (IABA) pela aplicação do disposto no nº1 de art.º 7.º do CIEC. A taxa de IABA será aplicada nos termos do n.º2 do art.º55.º para o vinho licoroso, e nos termos do n.º 2 do art.º 57.º para a aguardente, em conjugação com o n.º 4 do art.º 7.º do mesmo diploma legal, em função do produto em falta e do teor alcoólico desse produto, apurando-se uma dívida em sede de Imposto sobre o Álcool e as Bebidas Alcoólicas (\ABA) no montante de 7.658,20 Euros, a que acresce IVA à taxa normal e Juros Compensatórios.
A empresa apresenta a conta corrente de estampilhas especiais de acordo com o modelo constante no Anexo IV da Portaria 701/2003 de 1 de Agosto, nos termos do n.º 15 da referida Portaria, no entanto não menciona o n°. das DIC como exigido.
Após confrontação da contagem física de estampilhas especiais bem como das estampilhas especiais já colocadas nas garrafas existentes no Entreposto Fiscal de Produção fiscalizado, com os saldos constantes nas contas correntes respetivas, foram constatadas o excesso de 11 estampilhas especiais, conforme mapa em anexo.
Audiência prévia
A empresa foi notificada do projeto de conclusões do relatório (n.º 1 e 2 do art.º 60.º do RCPIT) através do n/ oficio 8839 de 04/09-2007. A empresa fiscalizada exerceu, no dia 21 de Setembro de 2007 – Registo de entrada n.º 14323, o seu direito de audição (…) tendo alegado o seguinte:
Quanto à quebra de 2000 litros de aguardente de bagaço a 40% vol., esta poder ter ocorrido lentamente, resultado da pressão/vibração de obras ocorridas no local no período de Outubro de 2006 Janeiro de 2007. Convém referir que esta estância aduaneira não foi informada desta perda dentro do prazo legal, mas sim no dia 21 de Março depois da intervenção das funcionárias, o que contraria assim o estipulado no art.º 41.º do CIEC.
Quanto a haver um excesso de 11 estampilhas especiais para a aguardente de 40%, deve-se ao facto da existência de uma caixa de 11 garrafas sem o respectivo selo, que foi contabilizada pelas funcionárias e pelo Sr. F........, como estando totalmente selada. Aqui convém salientar que durante o tempo que mediou a visitas das funcionárias e a resposta efectuada por V. Ex.ª em 21-09-2007, esta estância aduaneira nunca foi informada de qualquer falta de rigor na contagem das respetivas estampilhas especiais sendo entendimento consagrado que após a realização do varejo efectuado conjuntamente com um representante da empresa e assinado o respectivo auto de inventário por todos os intervenientes, não é legítimo à Administração Aduaneira alterar os resultados, salvo se a empresa provar, de forma inequívoca e irrefutável que houve um erro. Não sendo este o sucedido, os resultados do varejo não podem ser postos em causa.
Quanto à existência de 159 litros de vinho licoroso / jeropiga em garrafas de 0,75 litros no auto de inventário e ter sido considerado por esta estância aduaneira 119 litros no mapa de resumo, nesta situação verificou-se que houve um lapso ao transpor os dados do auto de inventário para o mapa resumo e que vai ser de imediato regularizada.
Quanto à diferença de 248 litros de vinho licoroso abafado/geropiga a granel armazenado no depósito de cimento n°1, de deve ao facto do mesmo ter estado no passado acondicionado em tonéis de madeira que facilmente dão lugar a pequenas quebras, no entanto é de salientar que estas quebras foram consideradas de acordo com o estipulado pelo art.º 37º e 38.º do CIEC, conforme mapa resumo.
Conclusões
Do exposto anteriormente, pode-se concluir que foram detectadas algumas irregularidades no cumprimento do regime fiscal relativo à produção, recepção, detenção, expedição, circulação e introdução no consumo de Bebidas Espirituosas, bem como no cumprimento das obrigações de selagem previsto no CIEC e em legislação complementar, devidamente descritas no ponto seguinte.
Irregularidades
1.A empresa não possuía uma contabilidade de existências, organizada em sistema de inventário permanente com saldo à vista com indicação da sua proveniência, destino e os elementos relevantes para o cálculo do imposto, que satisfaça as necessidades do controlo do entreposto fiscal, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do art.º 24.º do CIEC, aprovado pelo Dec. Lei nº566/99 de 22 de Dezembro, o que consubstancia a prática de introdução irregular no consumo, prevista e punível nos termos das alíneas c) do n.º 2 do art.º 109.º do RGIT.
2.A empresa apresentou perdas de produtos tributáveis em percentagens superiores às franquiadas, nos termos do disposto do art.º 38.º do CIEC, praticando uma introdução irregular no consumo, punível nos termos da alínea g) do n.º 2 do art.º 109.º do RGIT.
3.Ao ser detectada a presença de mais estampilhas especiais, aquando do inventário realizado a 21 de Março de 2007, calculadas entre o saldo contabilístico e as existências de estampilhas especiais em entreposto fiscal, consubstancia a introdução irregular no consumo de bebidas espirituosas sem as respectivas estampilhas especiais apostas, violando assim as regras de selagem previstas na Portaria n.º 701/2003, de 1 de Agosto conjugada com a aplicação do art.º 67.º do CIEC, o que também consubstancia uma introdução irregular no consumo prevista e punida pela alínea p) do n.º 2 e n.º 1, ambos do art.º 109.º, este último por remissão da alínea d) do art.º 96.º do RGIT.
Montantes Propostos p/ cobrança (€) - Mapa de Apuramento em anexo
IABA = _7 658,20 € a que acresce IVA à taxa normal e Juros Compensatórios. (…).”. – (cfr. fls. 2 a 4 do processo administrativo apenso).

B)
Com data de 15-12-2008 o Diretor da Alfândega de Peniche, endereçou ao ora Impugnante o oficio n.º 12456, mediante registo com aviso de receção, de notificação de dívida relativa ao processo de conferência final n.º 171/2007, onde consta, designadamente, o seguinte:
“Após ter sido concedido o direito de audição a V. Exª nos termos da alínea a) do n°1 do art.º60º da Lei Geral Tributária (LGT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/981, de 17 de Dezembro, e o operador ter exercido o direito de resposta fora do prazo de 10 dias contados a partir data de recepção da respectiva notificação (27/10/2008–AR RM 3619 5301 2 PT. No entanto, verificou-se, no decurso da análise concisa e precisa às suas alegações, que não foram alterados os pressupostos que inicialmente levaram ao apuramento da dívida, seguindo o processo para a fase de notificação de dívida.
Assim sendo, fica V. Exª notificado que por meu despacho de 15 de Dezembro de 2008, deverá no prazo máximo de quinze dias (15 dias), nos termos do disposto no art.º10º do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo (CIEC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 566/99 de 22/12, proceder ao pagamento no valor total de 8.017,40€ (oito mil e dezassete euros e quarenta cêntimos), correspondendo 7.658,20 € (sete mil seiscentos e cinquenta e oito euros e vinte cêntimos) ao Imposto sobre o Álcool e Bebidas Alcoólicas (IABA) e 359,20 € (trezentos e cinquenta e nove euros e vinte cêntimos) aos juros compensatórios (JC), com base nos seguintes fundamentos:
1.Na sequência da acção de fiscalização (varejo) n°. …………… com inicio a 21-03-2007 e terminus a 04/09/2007, pelas funcionárias aduaneiras D........ e M........, ao entreposto fiscal de produção n° PT…………, pertencente ao depositário autorizado «L.......» sito na Rua do O........ Leiria, foi efectuado o controlo ao regime fiscal relativo à recepção, detenção, expedição, circulação e introdução no consumo de bebidas espirituosas e produtos intermédios.
2.Esta acção teve como objectivo principal assegurar que os produtos não foram subtraídos à fiscalização das autoridades aduaneiras, através da confirmação física das existências no entreposto fiscal de produção e da sua concordância com os registos contabilísticos do operador.
3.No acto da fiscalização, as funcionárias verificaram que o operador:
a. não possuía uma contabilidade de existências, organizada em sistema de inventário permanente com saldo à vista com indicação da sua proveniência, destino e elementos relevantes para o cálculo do imposto, que satisfaça as necessidades de controlo do entreposto fiscal, contrariando o disposto na alínea b) do n°. 2 do artº. 24°. do CIEC, aprovado pelo Decreto-lei nº 566/99 de 22/12;
b. a contabilidade de existência dos produtos engarrafados e a granel da aguardente bagaceira, aguardente bagaceira velha, e vinho licoroso abafado / geropiga, apresentam deficiências, incorreções e omissões, para além de não mencionar o grau alcoólico, fundamental para o cálculo do IEC;
c. apresenta a conta corrente de estampilhas especiais de acordo com o modelo constante no Anexo IV da Portaria 701/2003 de 1 de Agosto, nos termos do n.º 15 da referida Portaria, contudo, não menciona o n°. das DIC como exigível «ex vi legis»;
4.Analisadas as contas correntes dos produtos com taxa positiva, e a sua existência física, apuraram- se diferenças para menos entre o saldo contabilístico e as existências dos produtos engarrafados e a granel.
5. Da confrontação da contagem física de estampilhas especiais, incluindo as apostas nas garrafas, foram constatadas um excesso de 11 estampilhas.
6.O operador apresentou uma percentagem de perda superior à franquiada, de acordo com o estipulado nos artº.s 37 e 38°, do CIEC, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 566/99, de 22/12, sendo o imposto exigível em território nacional no momento da introdução no consumo, em conformidade com o disposto no nº 1 e na alínea a) do nº 2 ambos do artº7º. do mesmo diploma legal.
7.O imposto é exigível relativamente à quantidade não franquiada de acordo com o mapa infra

« Quadro no original»

(a) – cfr. artºs 55º e 57º do CIEC
(b)Valores em euros
8. Nos termos do estipulado do n.º 1 do art.º 3.º do CIEC, são sujeitos passivos de imposto especial de consumo, os depositários autorizados.
9.O operador foi notificado do projecto de conclusões do relatório nos termos do nº1 do artº 60º, do RCPIT, através do n/ ofício nº 8839 de 04/09/2007.
10.O operador exerceu o seu direito de resposta, tendo alegado que:
a. a quebra de 2000 litros de aguardente de bagaço a 40% vol. terá ocorrido lentamente, resultado da pressão/vibração de obras ocorridas no local no período de Outubro de 2006 Janeiro de 2007;
b. quanto ao excesso de 11 estampilhas especiais para a aguardente de 40%, deveu-se ao facto de existir uma caixa de 11 garrafas sem o respectivo selo, que foi contabilizada pelas funcionárias aduaneiras e pelo Sr. F........, como estando totalmente selada;
c. no que diz respeito à existência de 259 litros de vinho licoroso / geropiga em garrafas de 0,75 litros no auto de inventário e ter sido considerado 119 litros no mapa de resumo apresentado por esta estância aduaneira;
d. da diferença de 248 litros de vinho licoroso abafado/gjeropiga a granel armazenado no depósito de cimento n°1, deveu-se ao facto do mesmo ter estado em tempos passados em tonéis de madeira que facilmente dão origem a quebras.
11.Neste contexto, as funcionárias intervenientes na acção, exerceram o seu direito de réplica, esclarecendo que:
a. o operador não informou a estância aduaneira, de que tinham ocorrido perdas por causa fortuita ou de força maior, no período compreendido entre Outubro de 2006 a Janeiro de 2007, contrariando o disposto no artº41º. do CIEC;
b. da contagem das estampilhas especiais, e do auto de inventário, o operador não contestou em tempo útil, tendo o respectivo auto sido assinado por um funcionário do operador, na pessoa do Sr. F........, confirmando os respectivos dados. A justificação, ora apresentada a 21/09/2007, não afasta, nem pode pôr em causa, a contagem efectuada, durante o acto de fiscalização, «varejo» isto porque à administração não lhe foi dada a oportunidade de fazer a verificação «in loco» da afirmação do operador, não sendo por isso considerada legitima;
c. quanto à contagem feita no auto de inventário e o número representando no mapa, das garrafas de jeropiga, houve na realidade um erro na transposição dos dados, tendo sido o mesmo, devidamente rectificado;
d. da diferença apurada de 248 litros de vinho licoroso abafado, foram consideradas as perdas de acordo com o estipulado nos artºs.37º e 38º, do CIEC;
12. O operador foi notificado do direito de audição (of. 10582 de 17/10/2008], tendo o mesmo sido recepcionado a 27/11/2007, conforme AR.RM-3619 53012PT;
13.O operador exerceu o seu direito de resposta a 11/11/2008 n/registo de entrada 17180 (fora do prazo concedido 10 dias);
14.O operador veio alegar, através do seu mandatário, que age com mandato de representação, conferido pela respectiva procuração, o advogado Dr. Cândido ………….a, que já reclamou o processo de contra ordenação nº. 792/2007“ referindo (…)
16. Assim sendo, o operador não veio alterar os pressupostos do apuramento da dívida
17.Por tudo o que foi demonstrado o operador é responsável pelo pagamento do imposto sobre o álcool e bebidas alcoólicas (IABA) das diferenças constatadas para menos.
18. Em face do exposto, deverá ser cobrada “à posteriori” a quantia de IABA no valor de 7.658,20 € (sete mil seiscentos e cinquenta e oito euros e vinte cêntimos} ao que acresce juros compensatórios no valor de 359,20 € (trezentos e cinquenta e nove euros e vinte cêntimos) e IVA a ser cobrado pelo Serviço de Finanças da área do contribuinte. (…)
21. Deste acto poderá ser apresentada reclamação graciosa no âmbito do art.º 68.º e 70.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT) aprovado pelo Decreto-Lei n.º433/99 de 26 de Outubro” sem efeito suspensivo, no prazo de 120 dias, (contados a partir dos factos previstos no nº1 do artº102º. do CPTT) para o Director Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, e ou Impugnação Judicial para o Tribunal Administrativo e Fiscal, no prazo de 90 dias contados a partir do termo do prazo para o pagamento voluntário (nos termos da alínea a) do nº. 1 do artº102º. do CPPT).(…).”.(cfr. fls. 32 a 38 dos autos).

Encontra-se ainda provado com interesse que:

C)
Em 21-03-2007 o ora Impugnante remeteu via telefax ao Director da Alfândega de Peniche documento com o seguinte teor:
“Ao verificarmos o depósito de cimento Aéreo n.º 6 que continha aguardente bagaço c/40%vol vimos que este tem estado a verter lentamente e provavelmente à muito tempo para as traseiras, terra e casa desabitada pertencente a herdeiros de J.........
Mudamos a aguardente para o depósito de inox nº2 e verificamos a perda de 2000 litros de aguardente.
Devido a obras de remodelação nos depósitos pela firma R......., Lda. no período de Outubro/06 a Janeiro/07 houve alguma pressão / vibração que levou o referido depósito aéreo nº6 a verter aguardente. Só agora nos apercebemos pelo sucedido e vimos a comunica-lo a fim de nos informarem o que devemos fazer.
Sem outro assunto de momento, aguardamos as v/ instruções, (…).”. – (cfr. doc. de fls. 54 do processo administrativo apenso).

D)
Consta da planta do entreposto fiscal e da memória descritiva do depositário autorizado L....... que o depósito aéreo nº7 tem a capacidade de 7.000 litros e o depósito aéreo n.º 6 a capacidade de 9.300 litros. – (cfr. fls. 214 a 216 dos autos).

E)
Um dos depósitos, à data do varejo, tinha uma fissura na parte superior e na face virada para a parede das instalações, que provocou a perda de aguardente. – (cfr. depoimento de F........ e L.......).

F)
A parede exterior das instalações do impugnante, do lado onde se encontram instalados os depósitos de cimento, tinha uma mancha escura com cerca de metro e meio de diâmetro. – (facto confirmado pela inspecção ao local.)

G)
O impugnante realizou obras de manutenção de outros depósitos no período de janeiro de 2006 a fevereiro de 2007. - (cfr. depoimento de F........ e L.......).”
*

A decisão recorrida consignou ainda, quanto aos factos considerados não provados, o seguinte:

“Inexistem outros factos cuja não prova releve para a decisão a proferir.”


*

O Tribunal recorrido motivou, do modo seguinte, a factualidade apurada:

“A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, bem como no depoimento das testemunhas inquiridas, F........ e L......., arroladas pelo Impugnante e M........ e D........, arroladas pela Fazenda Pública.

O depoimento prestado revelou conhecimento directo dos factos sobre os quais incidiu, mostrou-se claro e coerente, sem contradições, convencendo o Tribunal da sua veracidade.

No entanto, do depoimento das testemunhas da Fazenda Pública não resultou a prova de qualquer facto autónomo para além dos já descritos no relatório de varejo.”.


*

IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
Tal como avançamos, a este Tribunal cabe analisar e decidir se a decisão recorrida padece dos vícios acima elencados.
Antes de entrar nessa apreciação importa sublinhar que, apesar de terem sido juntos com as alegações de recurso 3 documentos, e não obstante o estabelecido no artigo 651º do CPC, a verdade é que dois dos documentos juntos constam já da instrução dos autos realizada em 1ª instância, onde foram valorados (doc. 1 e 3 – requerimento de 21.09.2007 apresentado na Alfândega de Peniche e inspeção judicial feita ao entreposto da recorrente, respetivamente), não se tratando por isso de uma “nova” junção de documentos em sede recursiva, mais se percebendo que a sua junção foi feita para facilitar as alegações recursivas.
Relativamente ao doc. 2 junto com as alegações de recurso, além de se tratar de um documento que nunca foi junto na instrução dos autos em 1ª instância ou de constarem já dos autos (como os doc. 1 e 3), a verdade é que além de se tratar de um documento interno elaborado pela recorrente, com o mesmo visa a recorrente demonstrar uma realidade factual diversa daquela que alegara em 1ª instância, como adiante veremos, razão pela qual não é de admitir a sua junção. Além disso, inexiste qualquer explicação para a sua junção apenas em sede de recurso, conforme decorre do artigo 651º do CPC.
Nesta conformidade, podendo manter-se os documentos 1 e 3 já constantes dos autos, não é de admitir a junção do documento 2 apresentado agora em sede de recurso.
Prosseguindo.
- Da nulidade da sentença.
A recorrente alega que a sentença é nula por falta de fundamentação, contradição e omissão.
Para sustentar que a sentença recorrida padece de falta de fundamentação, a recorrente apoia-se em normativos (alguns diplomas não estavam já em vigor, como o CPT e DL nº 256-A/77 de 17.06) respeitantes ao dever de fundamentação dos atos administrativos e tributários, desde logo nos artigos 124º e 125º do CPA, 21º do CPT, 77º LGT, DL nº 256-A/77 de 17.06.
Uma coisa é a nulidade da sentença, outra diferente é, como sabemos, a ilegalidade que contamina os atos de liquidação (nulidade ou anulabilidade) que a mesma aprecia. Por isso, há que distinguir os vícios da sentença (nulidade, erro de julgamento de facto e de direito) e vícios do ato, cabendo ao Tribunal de recurso analisar se a apreciação empreendida pelo Tribunal a quo, na apreciação dessas ilegalidades do ato (designadamente a falta de fundamentação), está ou não eivada dos vícios de erro de julgamento de facto, de direito ou de nulidade.
Tal como se sumariou no acórdão deste TCAS de 19.12.2024, tirado do processo nº º 186/09.7BELRS:
“III)- Não se podem confundir os vícios do ato impugnado, com os vícios da sentença, cabendo ao Tribunal ad quem apreciar se bem ou mal andou o Tribunal a quo no ajuizado quanto aos vícios que contaminam o ato impugnado, aferindo se existe erro de julgamento (de facto ou de direito), ou, até, se existe nulidade no decidido.

IV) - As nulidades da decisão reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de atividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitantes à disciplina legal, tratando-se de vícios de formação ou atividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afetam a regularidade do silogismo judiciário da peça processual que é a decisão.

V) - O erro de julgamento (error in judicando), pode resultar de uma distorção da realidade factual (error facti), ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei”.

Portanto, apoiando-se a recorrente em vícios que contaminam o ato e não a decisão recorrida, terá nesta parte de improceder o recurso.
Não obstante o acabado de referir, revisitando o recurso, constatamos, também, que a par daquilo que acima referimos, na conclusão 22º e 23º, a recorrente refere-se já à sentença recorrida, sublinhando (também) que a mesma não está fundamentada e, ao mesmo tempo, que (afinal) o Tribunal a quo não a fundamentou exaustivamente, não tendo aplicado as normas legais ao caso concreto.
Porém, assim não o entendemos.
Vejamos porquê.

A falta de fundamentação é, com efeito, uma das nulidades de que a sentença no contencioso tributário pode padecer, tal como resulta do disposto no art. 125.º do CPPT, norma paralela à constante na alínea b) do n.º 1 do art. 615.º, em conjugação com o disposto no n.º 1 do art. 154.º, ambos do CPC.


A falta de fundamentação ocorre quando a sentença não especifique os fundamentos de facto e de direito da decisão (cf. art. 125.º do CPPT).


Ora, tal como decorre da lei processual, e como tem vindo a ser explicitado pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, a nulidade da sentença, por falta de fundamentação de facto ou de direito, só abrange a falta absoluta de motivação da decisão (cf. neste sentido, designadamente, os acórdãos do STA proferidos, em 2023.04.12, no proc. 0336/18.4BELRS, em 2022.05.26, no proc. 058/10.4BEPRT, em 2019.02.06, no proc. 01161/16).


Uma vez que apenas a absoluta falta de fundamentação, e já não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade, constitui nulidade, “cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento”, a verdade é que, na situação colocada, a decisão recorrida não padece da imputada nulidade.


Ademais, é a própria recorrente que afirma que a sentença não está “exaustivamente” fundamentada, ora, a ser assim, nunca se poderia concluir pela nulidade da mesma.


No caso em apreço, compulsado o teor da decisão recorrida verifica-se que estão elencados os factos provados deles constando, expressa e individualmente, o meio probatório que permitiu a fixação da aludida factualidade, o que foi desenvolvido na motivação da decisão de facto.

Lendo a sentença recorrida, bem se percebe que a mesma está devidamente fundamentada de facto e de direito, tendo sido elencados os factos provados e feita a sua subsunção jurídica, indicando o quadro legal aplicável, nomeadamente os artigos 37º a 41º do CIEC na versão vigente à data dos factos.
Tanto assim é que, a recorrente desfere um ataque ao decidido, desde logo quanto à valoração dos factos, entendendo que existe contradição, e que não foi feita a análise mais da situação concreta, etc, o que evidencia que a sentença além de fundamentada, permitiu à recorrente atacar a mesma, apontando-lhe vícios atinentes a erro de julgamento e nulidade.
Ademais, discordando da fundamentação poderá, como o fez, apontar as razões da sua discórdia, sem que tal corresponda a falta de fundamentação, mas a eventual erro de julgamento.
Assim sendo, improcede a nulidade por falta de fundamentação.

- Diz ainda a recorrente que a decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia, sem, no entanto, indicar quais as questões que alegara na PI e que o Tribunal a quo não conheceu.
A nulidade da sentença ou acórdão por omissão de pronúncia, prevista no artigo 125º nº 1 do CPPT, só acontece quando a sentença ou acórdão deixam de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão dessa questão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra.
Prende-se esta nulidade com o disposto no n.º 2 do art.º 608.º do CPC, que determina que: “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
A omissão de pronúncia traduz-se, por isso, numa denegação de justiça.
Para aferir desta nulidade há que atender às questões de fundo, àquelas que integram matéria decisória, tendo em conta a pretensão que se visa obter, não abarcando os argumentos, as motivações produzidas pelas partes, mas sim os pontos de facto ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às exceções.
Consultando a PI e bem assim as questões a decidir apontadas na decisão recorrida, todas as questões foram analisadas e apreciadas, apesar das razões de discórdia da recorrente que nas suas alegações recursivas insiste (como alegado na PI) que as liquidações padecem das ilegalidades que o Tribunal a quo apreciou, concluindo pela sua inverificação.
Além disso, como referido, a recorrente não aponta uma questão que não tenha sido analisada, discordando, antes, da apreciação feita pelo Tribunal, insistindo na ilegalidade da liquidação posta em crise.
Efetivamente, olhando para a conclusão 25ª do recurso, verificamos que a recorrente se basta em concluir, depois de elencar que a sentença padece de falta de fundamentação, errada interpretação dos factos, etc, que a mesma deixou de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as acima expostas, cometendo, pois, uma nulidade”
Ora, o assim aduzido não configura qualquer nulidade por omissão de pronúncia, mas, a ocorrer, configura erro de julgamento, que adiante iremos apreciar.

- Advoga, também, a recorrente, que existe contradição na decisão recorrida.
Vejamos.

Sabemos que, de harmonia com o consignado no artigo 615.º nº.1, alínea c), do CPC, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Concatena-se, assim, com a necessidade de um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artigo 154.º, nº.1, do CPC.

No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125, nº.1, do CPPT.

O vício em análise, tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adotada.

No caso sub judice, não vislumbra este Tribunal que a decisão recorrida padeça da nulidade em análise, uma vez que atentando no seu teor conclui-se que a mesma não comporta nenhuma contradição, desde logo entre os fundamentos e a decisão que a ela conduziu, de modo coerente (repete-se, pese embora a discórdia da recorrente).

A decisão recorrida concluiu pela improcedência da impugnação, julgando improcedentes todas as causas de pedir em que a recorrente se apoiou, num discurso lógico, determinante do seu desfecho.

Contudo, a recorrente alega que a mesma é contraditória quando confunde a capacidade de armazenamento do depósito nº 6 com a capacidade de armazenamento do depósito nº 7.

Vejamos mais de perto.

Consta da decisão de facto acima transcrita que o depósito aéreo nº 7 tem capacidade de 7.000 litros e o depósito nº 6 tem capacidade de 9.300 litros (cf. ponto D) dos factos provados).

Na fundamentação jurídica da decisão posta em crise diz-se o seguinte:
“(…) Da planta do entreposto fiscal e da memória descritiva do depositário autorizado consta que o depósito aéreo n.º 6 tem a capacidade de 9.300 litros e o n.º 7 tem a capacidade de 7.000 litros.
Ora, se a conta corrente da aguardente bagaceira do Impugnante refletia, à data do varejo, uma existência em entreposto de 9.767 litros acondicionados no depósito n.º 6, resulta à evidência que tal não é possível pois esse depósito tinha a capacidade de 7.000 litros. O mesmo sucederia com o depósito n.º 7 que tem uma capacidade de 9.300 litros.
Esta divergência não foi explicada pelo Impugnante, não se vislumbrando a possibilidade de existir mais aguardente em existências do que a capacidade do depósito que a armazena.
Sendo certo que a trasfega da aguardente foi efetuada pelo Impugnante, não é menos certo que os serviços aduaneiros não puderam confirmar a saída da aguardente do depósito de cimento para o depósito de inox e em que circunstâncias ocorreu.
Por conseguinte, apesar de se poder afirmar que pode ter existido de facto uma perda de aguardente motivada por uma fissura no depósito, não ficou demonstrado que ocorreu uma perda de 1.997 litros, conforme foi confirmado pelos serviços aduaneiros que, aliás, confirmam uma diferença entre a conta corrente e a existência física de 1997 litros de aguardente bagaceira”.
Como se vê, apesar de constar do probatório a quantidade de litros de cada depósito (nº 6 – 9.300L e nº 7- 7.000 L), na subsunção jurídica a sentença enuncia inicialmente essa mesma capacidade de armazenamento (nº 6 – 9.300L e nº 7- 7.000 L), vertida no probatório, apesar de, mais adiante ter escrito, por lapso que se revela manifesto, referir que o depósito nº6 é que albergava 7.000 L e o nº 7 os 9.300 L, não deixando de sublinhar que, quer um quer outro dos depósitos tinham uma capacidade (física) de armazenamento inferior ao valor contabilizado daquela bebida, que era 9.767 litros e apenas se encontraram no depósito, mercê do varejo, 7.770L, numa diferença, para menos, de 1.997 Litros (como refere a recorrente nas suas conclusões recursivas).
Bem se vê que não existe contradição na decisão recorrida, visto que o desfecho sempre seria o mesmo, sendo manifesto que foi por lapso que na sentença recorrida “trocou”, apenas num momento da sentença, a capacidade de armazenagem de ambos os depósitos, como decorre do probatório e da própria sentença, como visto, sendo que, qualquer um dos depósitos tinha uma capacidade de armazenamento inferior ao escriturado contabilisticamente, referindo a sentença recorrida que “ Esta divergência não foi explicada pelo impugnante, não se vislumbrando a possibilidade de existir mais aguardente em existências do que a capacidade do depósito que a armazena”.
Tal como se disse no acórdão deste TCAS de 26.06.2025, tirado do processo nº 1014/09.1BESNT: “Se as circunstâncias em que a declaração é efetuada patenteiam a evidência do erro, o mesmo deve ser retificado, seja nos atos, peças processuais ou nas decisões judiciais”.
Na verdade, estabelece o artigo 249º do Código Civil, sob a epígrafe “Erro de cálculo ou de escrita” que: “O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta”.
Assim, autoriza o citado artigo 249º do Cód. Civil que pode ocorrer a retificação de lapso manifesto, o que é de aplicar a todos os atos processuais e das partes, desde logo o simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita.
Este tipo de erro corresponde, não a uma falsa representação da realidade, mas tão só a uma divergência entre o que se quer dizer e o que se diz.
Por ser assim é que, os lapsos materiais cometidos, que a lei permite corrigir (desde logo nas próprias decisões judiciais (1)– art. 613º e 614º CPC) devem resultar do teor da própria declaração, ato, peça processual.
O artigo 249º do CC abriga em si um princípio geral de direito que se mostra aplicável a todos os erros de cálculo ou de escrita juridicamente relevantes, conquanto sejam ostensivos, desde logo aqueles que facilmente se detetem e se identifiquem como tais pelo e no seu contexto e que respeitem à expressão material da vontade e já não os que possam ter influenciado a formação dessa vontade – Vd. entre outros, o acórdão do STA de 26.06.2014, proferido no processo nº 0586/14.
Em suma, os erros de escrita surgem quando se escreve ou representa, por lapso, coisa diversa da que se queria escrever ou representar, sendo que se consideram manifestos os erros quando estes são de fácil deteção, isto é, quando a própria declaração ou as circunstâncias em que ela é feita permitem a sua imediata identificação – lapsus calami.
Foi precisamente o que sucedeu in casu, sendo claramente revelado pelo contexto da decisão, que por lapso, depois de dar como provado (ponto D) dos factos provados) e indicar na fundamentação jurídica, inicialmente, os litros que cada depósito suporta, mais adiante, por lapso, atribuiu ao depósito 6 a capacidade de armazenamento do 7 e vice versa, o que além de percetível não tem, como visto, influência alguma na apreciação da questão a decidir nem no sentido decisório da sentença.
Sendo assim, improcede a alegada nulidade por contradição da sentença recorrida.

- Do erro de julgamento.
A recorrente não põe em causa a decisão de facto (factos provados), os quais, se encontram, por isso, estabilizados.
Refere a recorrente nas conclusões 5ª e 6ª que, parece estar em causa a liquidação de IABA de 2007, na importância de €7.658,20, a que acrescem os respetivos juros compensatórios, sem que nunca estivesse determinado que era IABA de 2007.
Ora, esta questão nunca foi levantada na PI, local onde a recorrente nunca pôs em causa que o IABA e juros respeitasse a 2007, evidenciando, pelo contrário, saber que a liquidação proveio do varejo efetuado em março de 2007, tendo, inclusive comunicado à Alfandega no dia do mesmo uma alegada perda decorrente, possivelmente, de obras que ocorreram entre 2006 e 2007.
A verdade é que, apesar do referido, tratando-se de uma questão nova, não carece de apreciação por este Tribunal.

Continuando.
Salienta a recorrente, na conclusão 8ª que: “a aguardente bagaceira que estava originariamente no depósito aéreo nº6 [em cimento] com a capacidade de 9.300 litros, e depois transferido para o depósito em inox nº 2, com a capacidade de 50.000 litros, mas também foi transferida para o depósito nº 2 a aguardente bagaceira de 467 litros, que se encontrava no depósito plástico (com a capacidade de 1.000 litros), como se vai apurar [note-se que a empresa tem mais de 20 depósitos em plástico com a capacidade de 1.000 litros cada, para suportar as diferenças que não cabem nos depósitos principais]”
Acrescenta ainda na conclusão 9ª que: “Os elementos de contabilidade demonstram, relativamente à aguardente bagaceira, o quadro fáctico acima mencionado, conforme fotocópia já junta como doc. 2”;
Já nas conclusões 11ª a 13ª remata que: “Esta aguardente bagaceira a granel estava acondicionada do seguinte modo: 9300 litros no depósito nº6 [onde se verificou a fissura com o consequente derramamento da aguardente]; e, 467 litros em embalagem de plástico com a capacidade de 1.000 litros”
“ O que perfaz o total de 9.767 litros de aguardente bagaceira a granel, e que é uma das causas de pedir relativas ao erro de liquidação em causa no processo de impugnação judicial”
“Nem da prova testemunhal, nem de qualquer prova junta ao processo, consta que os 9767 litros estavam acondicionados num único depósito. Daqui resulta à evidência que a decisão proferida não respeitou a prova efectuada, e foi desajustada com a realidade”.
A este propósito, nas contra-alegações recursivas, a recorrida refere que, quer à data do varejo, quer posteriormente a Recorrente nunca logrou lembrar-se que afinal a aguardente, em vez de estar acondicionada num depósito, estava em dois.
E, tem razão a recorrida.
Senão vejamos.
Percorrendo toda a PI, a recorrente apenas alega que a aguardente bagaceira foi transferida do depósito 6 (contém 9.300 Litros) para o depósito nº 2, em inox.
A aguardente bagaceira, como bem sabe e o indica a recorrente na conclusão 18ª, apresentava um saldo físico de 7.770 litros e um saldo contabilístico de 9.676 litros, aquando do varejo, numa diferença de 1.997 litros, tida em conta, depois de apartada a franquia legal, para a quantificação do imposto.
Ao longo da PI e no procedimento que foi alvo, que culminara com a liquidação controvertida, a recorrente apenas afirmou a quantidade de aguardente contabilizada havia sido transferida do depósito nº 6 para o depósito nº2, em inox, onde foi medida/quantificada em março de 2007, encontrando-se a diferença de 1.997 litros face aquilo que constava da contabilidade, uma vez que, na contabilidade estava registada a quantia 9.767 litros de aguardente bagaceira, e no varejo foi efetuada a contagem física daquela aguardente, resultando o valor de 7.770 litros, ou seja, menos 1.997 litros face ao contabilizado.
Ademais, ao longo da sua intervenção no procedimento, desde logo em audição prévia é a mesma que tenta justificar a diferença encontrada de “cerca de 2000 litros”, avançando que se poderia dever as obras decorridas em 2006 e 2007, o que manteve em sede judicial, e, agora, inovadoramente, referir que afinal não havia diferença e que a aguardente, afinal, estava em dois depósitos, o que nunca alegara no procedimento nem na PI.
Ou bem que existe diferença e tenta demonstrar a sua razão, ou bem que não existe. O que não pode é existir e não existir ao mesmo tempo.
Lendo a PI, para justificar a diferença de menos 1.997 litros de aguardente encontrada no procedimento/varejo, pela análise do depósito nº 2 em inox onde se encontrava apenas os 7.770 litros, a recorrente em momento algum alega que a aguardente bagaceira tivesse sido transferida para o referido depósito nº 2 e que 467 litros de aguardente bagaceira que se encontrava no depósito plástico (com a capacidade de 1.000 litros), como inovadoramente o alega em sede recursiva, juntando, também agora ao recurso, o documento nº 2 a que supra se alude.
Além disso, se o depósito em inox suportasse 50.000 litros como agora defende (sendo certo que nunca foi posto em causa que o mesmo suportasse 10.000 litros), também, não se percebe a razão pela qual transferiria do depósito nº 6 9.300 litros e os restantes 467 litros (para perfazer os 9.767 litros contabilizados), para um depósito em plástico com capacidade de 1.000 litros.
Ora, esta questão jamais foi colocada ao Tribunal recorrido, desde logo que os 1.997 litros de aguardente em falta (9.767-contabilizado e (apenas) 7.770 Litros de saldo físico), estavam inicialmente no depósito nº 6 (9.300 litros) e num depósito em plástico (467 litros), perfazendo os 9.767 litros espelhados na contabilidade.
Pelo contrário.
Veja-se, também (a par do referido em audição prévia que acima se referiu), que, já no requerimento que dirigiu à Alfândega em 21.03.2007 a recorrente volta a sublinhar (à semelhança da PI e do relatório da Alfandega) que a aguardente estava armazenada no depósito de inox nº 2, proveniente (unicamente) do depósito nº 6 ao referir (agora devido, também a provável fuga e às obras que indicara inicialmente) que:
“Ao verificarmos o depósito de cimento Aéreo n.º 6 que continha aguardente bagaço c/40%vol vimos que este tem estado a verter lentamente e provavelmente à muito tempo para as traseiras, terra e casa desabitada pertencente a herdeiros de J.........
Mudamos a aguardente para o depósito de inox nº2 e verificamos a perda de 2000 litros de aguardente.
Devido a obras de remodelação nos depósitos pela firma R......., Lda. no período de Outubro/06 a Janeiro/07 houve alguma pressão / vibração que levou o referido depósito aéreo nº6 a verter aguardente. Só agora nos apercebemos pelo sucedido e vimos a comunica-lo a fim de nos informarem o que devemos fazer.” – Cf. ponto C) dos factos provados.
Portanto, não pode concluir que o Tribunal não respeitou a prova produzida, quando não foi alegado que a aguardente estava acondicionada em dois depósitos.
Além de que, a ser verdade que, afinal, a aguardente contabilizada estava em dois depósitos, não se percebe a alegação da ocorrência de caso fortuito, que defende (paradoxalmente) na PI para justificar a falta/perda de aguardente em 1.997 litros, encontrada pelos funcionários da AT aquando do varejo.
Ou bem que a aguardente contabilizada existia efetivamente em dois depósitos (no nº 6 e noutro depósito em plástico), cujo somatório perfazia a quantidade de 9.767 Litros (9.300 + 467), equivalendo à quantidade contabilizada, não havendo, nessa medida, qualquer “perda”; Ou, a diferença encontrada (1.997 litros) afinal existe e decorre das obras e ou fuga (alegado caso fortuito).
O que não pode é a recorrente apregoar que afinal o bagaço registado na contabilidade (9.767litros) corresponde à contagem física (9.300 L + 467 L, depósito 6 e depósito plástico, respetivamente) e ao mesmo tempo justificar que a diferença entre a contabilidade e a contagem física se deve a caso fortuito que fora comunicado em março de 2007.
Não obstante o paradoxo anotado, face à nova realidade que pretende trazer aos autos, a verdade é que, tratando-se de uma alegação nova da qual não se pode conhecer, o certo é que não se almeje que a sentença recorrida tenha desrespeitado a prova, menos ainda quando, repete-se, a recorrente se apoia em questões que não havia colocado ao Tribunal a quo.
Perante o exposto, improcede o recurso também nesta parte.

- Aduz ainda a recorrente que ficou provado o caso fortuito para justificar a perda de 1.997 litros de aguardente bagaceira, o que está documentado na participação que fez à Alfândega em setembro de 2007, assim como no auto de inspeção judicial, prova testemunhal, desconhecendo as causas do caso fortuito, mas poderá estar relacionado com atos de conservação de outro depósito, que não era suposto acontecer (cf. conclusão 18ª, 19ª e 20ª do recurso).
Portanto, para a recorrente, se bem percebemos, o inconformismo com o sentenciado decorre do facto do Tribunal recorrido não ter considerado que a diferença para menos de 1.997 litros de aguardente bagaceira, face ao registado contabilisticamente, se deve a caso fortuito.
Atente-se desde já que é a própria recorrente a afirmar que a diferença para menos face aos registos contabilísticos, poderá ter ocorrido com atos de conservação de outro depósito, sendo esta a primeira explicação avançada e alegada, e que desconhecia as causas, e não já que tenha ocorrido mercê dos tais atos de conservação de depósitos (cf. conclusão 20º do recurso).
Em todo caso, importa revisitar a factualidade provada.
Do elenco dos factos provados (não questionados), extrai-se que:
- Foi efetuado um varejo em março de 2007 onde se detetou que havia uma diferença para menos, em 1.997 litros, nas quantidades físicas de aguardente bagaceira (7.770 litros) face ao registado contabilisticamente (9.767 litros);
· O depósito aéreo nº 6 tinha uma capacidade de armazenamento de 9.300 litros de aguardente e o depósito nº 7 uma capacidade para 7.000 litros;
· No dia em que os funcionários da Alfândega (21.03.2007) se deslocaram às instalações da recorrente e após constatarem a dita divergência de aguardente bagaceira face ao registo contabilístico (1.997 litros), no depósito nº 2 em inox, a recorrente, remeteu à Alfandega um requerimento onde refere que, ao verificar que o depósito nº 6 que continha aguardente tem estado a verter para as traseiras, mudaram a “aguardente para o depósito de inox nº2 e verificamos a perda de 2000 litros de aguardente. Devido a obras de remodelação nos depósitos pela firma R......., Lda. no período de Outubro/06 a Janeiro/07 houve alguma pressão / vibração que levou o referido depósito aéreo nº6 a verter aguardente. Só agora nos apercebemos…”
· Em sede de audição prévia, a recorrente alegou que a quebra de cerca de 2000 litros de aguardente de bagaço a 40% vol. “poder ter ocorrido lentamente, resultado da pressão/vibração de obras ocorridas no local no período de Outubro de 2006 Janeiro de 2007”
· Um dos depósitos da recorrente tinha uma fissura na parte superior e na face virada para a parede;
· Nas instalações da recorrente foram feitas obras noutros depósitos entre janeiro de 2006 e fevereiro de 2007.

Diante desta factualidade, o Tribunal a quo, depois de enunciar a questão a decidir (que ora nos interessa) e elencar o quadro legal a aplicar à situação trazida (artigos 37º a 41º do CIEC na redação vigente), disse o seguinte:
“(…) Conforme resulta dos autos, o Impugnante é uma "Depositário Autorizado”, titular de um entreposto fiscal de produção.
Na sequência de ação de fiscalização da Alfândega de Peniche, ao Impugnante, foram detetadas várias irregularidades, conforme melhor se descreve no respetivo relatório, sendo impugnada, se bem vemos, apenas a atinente à percentagem de perda superior à franquiada, respeitante a aguardente de bagaço a 40% volume (1997 litros), acondicionada em depósito de cimento.
Defende o Impugnante que tal perda terá ocorrido lentamente, resultado da pressão/vibração de obras ocorridas no local no período de outubro de 2006 a janeiro de 2007 e que foi detetada apenas no dia anterior à visita da fiscalização, tendo nesse próprio dia sido feita a sua transferência para um depósito de inox.
No dia da presença dos agentes fiscalizadores, o Impugnante enviou por telefax à Alfândega de Peniche uma comunicação da ocorrência.
Assim, a questão decidenda é a de saber se a diferença para menos de 1997 litros de aguardente bagaceira a granel, que foi detetada no estabelecimento do impugnante, tendo em conta a existente e a contabilizada, foi fundada e legalmente tributada em sede de imposto.
(…)
Consideram-se casos fortuitos ou de força maior, derrames, rebentamentos ou, de um modo geral, acontecimentos que não estejam dependentes do controlo ou de cumprimento de obrigações do operador.
(…)
No entanto, no sobredito artigo 41.º do CIEC, o legislador estabelece um requisito adicional para que tal perda possa beneficiar de franquia: seja comunicada à estância aduaneira competente até ao segundo dia útil imediato ao da sua ocorrência, para efeitos de confirmação e apuramento.
O que significa que as franquias por perdas por caso fortuito carecem de reconhecimento prévio por parte da Alfândega de controlo, sendo que, no caso dos autos, no momento da fiscalização apenas se verificou a falta de 1997 litros de aguardente bagaceira, não se confirmando a existência no local de fissura nas paredes (parte superior) do depósito que justifica a sua falta.
O impugnante alega que apenas detetou a fuga em causa, de forma ocasional, e no dia anterior à visita dos serviços de inspeção, tendo de imediato transferido o produto para um depósito de inox. E, no dia seguinte, após essa quebra ter sido constatada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, comunicou por telefax a ocorrência, conforme se encontra provado nos autos.
Não obstante, da concatenação dos elementos constantes dos autos verifica-se que a aguardente bagaceira na altura do controlo aduaneiro estava acondicionada num depósito em inox com a capacidade de 10.000 litros, estando nele a quantidade de 7.770 litros, conforme resulta do relatório de varejo.
Da planta do entreposto fiscal e da memória descritiva do depositário autorizado consta que o depósito aéreo n.º 6 tem a capacidade de 9.300 litros e o n.º 7 tem a capacidade de 7.000 litros.
Ora, se a conta corrente da aguardente bagaceira do Impugnante refletia, à data do varejo, uma existência em entreposto de 9.767 litros acondicionados no depósito n.º 6, resulta à evidência que tal não é possível pois esse depósito tinha a capacidade de 7.000 litros. O mesmo sucederia com o depósito n.º 7 que tem uma capacidade de 9.300 litros.
Esta divergência não foi explicada pelo Impugnante, não se vislumbrando a possibilidade de existir mais aguardente em existências do que a capacidade do depósito que a armazena.

Sendo certo que a trasfega da aguardente foi efetuada pelo Impugnante, não é menos certo que os serviços aduaneiros não puderam confirmar a saída da aguardente do depósito de cimento para o depósito de inox e em que circunstâncias ocorreu.
Por conseguinte, apesar de se poder afirmar que pode ter existido de facto uma perda de aguardente motivada por uma fissura no depósito, não ficou demonstrado que ocorreu uma perda de 1.997 litros, conforme foi confirmado pelos serviços aduaneiros que, aliás, confirmam uma diferença entre a conta corrente e a existência física de 1997 litros de aguardente bagaceira.
(…)
Refira-se ainda que as normas constantes dos artigos 7.º, n.º 1 e 37.º, n.º 2, do CIEC, interpretadas no sentido de que as perdas verificadas se consideram introdução em consumo para efeitos de liquidação de IABA, não conflituam com o princípio da capacidade contributiva decorrente dos artigos 103.º e 104.º da CRP.
Isto porque, por um lado, a lei estipula franquias para as perdas em função das condições de produção, armazenagem e circulação, conforme acima se descreveu, nos termos dos artigos 38.º a 40.º do CIEC, e só são tributáveis as perdas que excedam as franquias aplicáveis e, por outro lado, também estipula que as perdas devidas a caso fortuito ou de força maior beneficiam de franquia sem qualquer limite, conforme previsto no artigo 41.º do CIEC.
Assim, face ao supra exposto, improcede também nesta parte a presente impugnação”.
Como se vê, a decisão recorrida acabou por concluir que, apesar da diferença/perda detetada, comparando as existências registadas na contabilidade (9.676 litros) e a verificação física (7.770 litros), no depósito em inox para onde foi vertida aguardente, não foi detetada qualquer fissura no depósito na ocasião da inspeção, tendo unicamente os SIT verificado que a aguardente estava acondicionada no depósito nº 2 em inox, tendo ficado por esclarecer a diferença para menos de 1.997 litros que fora detetada face ao contabilizado. Salienta, ao mesmo passo que, não presenciaram os inspetores a transferência da aguardente bagaceira do depósito em cimento para o depósito em inox.
Acrescentando que, a par disso, o depósito nº 6 albergava unicamente 9.300 litros, não podendo dali “desaparecer” a quantidade de 1.997 litros quando aquele depósito não tinha sequer capacidade de armazenar a totalidade da aguardente (9.767 litros) visto que apenas tinha capacidade para 9.300 litros (e o depósito nº 7 7.000 litros), por essa razão não podia “perder” aquilo que não tinha capacidade de armazenar.
Concordamos com o ajuizado pelo Tribunal a quo.
Além disso, como acima referimos, é a própria recorrente que afirma que a aguardente se perdeu por causas fortuitas, e, ao mesmo tempo afirma que, afinal, a aguardente correspondente às quantias registadas na contabilidade estava armazenada em dois depósitos, no nº 6 (9.300 litros) e noutro depósito em plástico (467 litros).
Ora, como adiantamos já, ou bem que a aguardente existia nas instalações, (em dois depósitos e foi transferida para um depósito de inox com capacidade de 10.000 litros), o que fica por perceber na medida em que no varejo a quantidade encontrada no depósito de inox foi de 7.700 litros (daí a “falta”/“perda” de 1.997 litros), e nesta hipótese não se pode alegar uma perda por razões fortuitas; Ou, afinal existe “perda”, face às quantidades escrituradas, por ter “sumido” por razões fortuitas.
Esta contradição da recorrente confere ao seu discurso recursivo pouca certeza e razoabilidade.
Por outro lado, em audição prévia a recorrente aduz que a diferença da aguardente contabilizada e a existe no depósito de inox, verificada pelos serviços inspetivos, pode ter ocorrido em virtude de obras que ocorreram entre 2006 e fevereiro de 2007, mas aventando apenas essa possibilidade, sem certeza e subsequente demonstração/prova, sendo que, o Tribunal se apoia em factos e não em suposições.
E, mesmo aquando da comunicação à Alfândega, na sequência da visita dos inspetores ao seu entreposto, a recorrente comunicou, igualmente, que o depósito nº 6 tem estado a verter lentamente para as traseiras, devido a obras de remodelação em 2006 e 2007, em que houve alguma pressão/vibração que levou o depósito a verter aguardente, por isso a transferiram para o depósito em inox.
Ora, o que é certo é que, na data do varejo não está demonstrado que houvesse fissura no depósito nº 6, mas que havia fissura num dos depósitos. Também não consta do probatório que os inspetores tenham detetado uma fuga em depósitos, ou sequer que a aguardente tinha sido transferida de um depósito em cimento para o depósito em inox, tendo apenas verificado que a mesma estava no depósito em inox acondicionada.
Não está sequer provado nos autos que no dia anterior ao varejo tenha havido transferência de aguardente de um depósito (nº 6 ou nº 7) para o referido depósito em inox.
O que a recorrente advoga é que apenas comunicou no dia da inspeção essa falta que verificara no dia anterior quando fez a transferência, sem que isso esteja provado, desde logo para evidenciar a tempestividade da sua comunicação à Alfândega de modo a atestar essa realidade, tendo em conta o estabelecido no artigo 41º do CIEC.
Os autos não evidenciam, contrariamente ao que pretende a recorrente, que a deslocação ao entreposto dos inspetores havia decorrido de uma prévia comunicação de “perda fortuita”.
O que os autos atestam é o contrário, os inspetores deslocaram-se ao entreposto, analisaram o depósito em inox e constataram que faltavam 1.997 litros face aquilo que estava registado na contabilidade. E, só após esta verificação no âmbito do varejo, a recorrente comunicou à Alfândega que, alegadamente, no dia anterior verificou que o depósito 6 vertia para as traseiras, mercê da vibração de obras ocorridas anteriormente, e que transferiu a aguardente para um depósito em inox (ou, como agora o faz, que afinal a aguardente existia na totalidade em dois depósitos).
É verdade que consta do probatório que existia num dos depósitos, na parte superior, virada para a parede, uma fissura, mas sem que dali decorra que era no depósito nº 6 que, afinal, segundo apregoa agora a recorrente, nesta sede, continha a totalidade da aguardente (9.300 litros) e que o restante (467 litros), até perfazer os 9.767 litros estava num depósito em plástico, o que, tudo conjugado, não permitiria sequer que se concluísse que no depósito nº 6 tenha sumido aguardente através de qualquer fissura, ainda que na parte superior do mesmo, quando afinal ela existia na totalidade em dois locais.
É igualmente certo que, na inspeção judicial foi detetado que havia uma mancha nas traseiras do entreposto, mas tal verificação foi feita em 2013 e não em 2007 aquando do varejo, não permitindo, também, que se conclua que tenha havido uma fissura no depósito nº 6 (ou 7).
Ademais, no dia do varejo, na comunicação feita à Alfandega, a recorrente não menciona nenhuma fissura no tanque nº 6 donde alega que fora transferida a aguardente no dia anterior, apenas referindo que a diferença nas quantidades poderia ter resultado de obras ocorridas em 2006/2007, nomeadamente da trepidação.
Foi com base na verificação dos serviços inspetivos, na falta de comunicação de qualquer caso fortuito decorrente de alegadas fissuras ocorridas por obras no dito depósito 6 (ou até 7), de modo a que, os serviços Alfandegários fossem comprovar a perda, que o Tribunal concluiu que não se verificavam os pressupostos para que, além do valor da franquia, fosse aceite e/ou justificada a perda de 1.997 litros de aguardente, nos termos impostos pelo artigo 41º do CIEC na redação vigente.
E, repete-se, andou bem.
De resto, decorria do artigo 37º do então CIEC (Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro então vigente), o seguinte:
1. Beneficiam de franquia de imposto as perdas ocorridas em regime de suspensão, durante a produção, armazenagem e circulação, bem como por caso fortuito ou de força maior.
2. As perdas que ultrapassem as franquias concedidas estão sujeitas a imposto, a cobrar à taxa em vigor no território nacional no momento em que ocorreram, devidamente determinado pela autoridade aduaneira ou, eventualmente, no momento em que sejam constatadas, sem prejuízo do disposto no artigo 36º.

No que respeita às perdas na armazenagem, o artigo 39º do mesmo diploma legal, estatuía que:
1. Os entrepostos fiscais de armazenagem beneficiam de franquia de imposto correspondente às diferenças, para menos, entre o saldo contabilístico e as existências em entreposto, calculadas sobre a soma das quantidades de produto existentes em entreposto com as quantidades nele entradas, com os seguintes limites:
a)Até 1,5% no caso de álcool e bebidas alcoólicas não engarrafados;
b) Até 0,4% no caso dos óleos minerais.
2.As estâncias aduaneiras competentes procederão à realização regular de varejos aos entrepostos fiscais de armazenagem, devendo adoptar os seguintes procedimentos no tocante às perdas apuradas:
a)Se as franquias não forem ultrapassadas, relevarão esse facto e procederão à rectificação correspondente na ficha de conta corrente do entreposto fiscal;
b)Se as franquias forem ultrapassadas, promoverão a liquidação oficiosa do imposto, as necessárias averiguações e a eventual instauração de processo por infracção fiscal aduaneira;
c)Se forem constatados excedentes, proceder-se-á à rectificação da contabilidade do entreposto fiscal.
3.A diferença entre o saldo contabilístico e as existências poderá ainda, em casos específicos, designadamente na destilação de vinhos e no envelhecimento de bebidas alcoólicas em vasilhame de madeira, ser ajustada de acordo com a respectiva taxa de rendimento.

Paralelamente, decorria do artigo 41.º daquele CIEC, que:
"As perdas devidas a caso fortuito ou de força maior, beneficiam de franquia desde que não tenha havido negligência grave e sejam comunicados à estância aduaneira competente até ao segundo dia útil imediato ao da sua ocorrência, para efeitos de confirmação e apuramento.

Assim, a par das franquias a que aludia o artigo 39º do CIEC (Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro então vigente, revogado que foi pelo DL nº 73/2010- novo CIEC, transpondo a Diretiva n.º 2008/118/CE, do Conselho, de 16 de Dezembro), as perdas devidas a caso fortuito ou de força maior, também beneficiavam de franquia desde que não houvesse negligência grave e fossem comunicados à estância aduaneira competente até ao segundo dia útil imediato ao da sua ocorrência, para efeitos de confirmação e apuramento, caso contrário, seria legítima a conclusão de que a “perda” se considere introdução no consumo (artigos 41º, 7.º, n.º 1 e 37.º, n.º 2, do CIEC vigente à data dos factos).

In casu, a recorrente não comunicou a perda de modo a ser confirmada, como imposto pelo artigo 41º do CIEC, o que sucedeu é que no dia do varejo, após terem os serviços detetado a perda, a recorrente enviou um requerimento a informar que no dia anterior verificou a perda ao transferir a aguardente para outro depósito, o que não está espelhado no probatório nem foi atestado, como se diz na decisão recorrida, pelos serviços inspetivos.
A verdade é, pois, que a recorrente para não ficar sujeita a imposto teria de demonstrar que a perda se deveu a fuga do depósito (sendo que, repete-se não está sequer provada essa transferência de aguardente de um depósito em cimento, no dia anterior, para o depósito em inox onde foi encontrada), que comunicara essa fuga à estância alfandegária no prazo de dois dias (artigo 41º do CIEC), por forma a poder ser comprovada essa realidade e, só assim, mediante comprovação pelas entidades alfandegárias, não haveria lugar a tributação em sede de IABA, na medida em que, a “perda”/diferença assim constatada, é considerada introdução no consumo à luz do disposto no então artigo 7.º, n.º 1 e 37.º, n.º 2, do CIEC.
Nesta medida, não se vê que a decisão recorrida tenha incorrido no vício apontado, concernente à errada valoração da prova e da aplicação das normas legais.
Por fim.
- Relata ainda a recorrente, na conclusão 16ª que, relativamente às estampilhas, em que ocorreu a diferença de 11, inexistiu qualquer omissão da sua parte, sem daí extrair qualquer conclusão no que tange à apreciação do Tribunal.
O certo é que, a par de esta ser uma questão nova, cuja apreciação não nos cabe igualmente fazer (tal como as demais supra elencadas), a verdade é, ainda assim, que, olhando os cálculos que determinaram o IABA aqui em questão, nada foi contabilizado e quantificado a respeito do IABA, relacionado com estampilhas.
Com efeito, na base de incidência do imposto está a subtração das seguintes quantidades de bebidas:
- a quantidade de -1997 litros de aguardente a granel (acabada de analisar);
- a quantidade - 248 litros de vinho licoroso, e
- a quantidade de - 31 litros de aguardente camarinha.
As quais, depois de considerada as devidas franquias, resultou numa quantidade total subtraída no total de 2.276 litros, sendo 2.165 litros objeto de tributação (após as franquias legais deduzidas), equivalendo a uma liquidação de 7.658,20 EUR (aqui em questão, a que acrescem os JC), tudo conforme decorre do quadro inserto no ponto B) dos factos assentes.

- Relativamente ao aduzido na conclusão 17ª, onde a recorrente refere, agora, igualmente sem extrair qualquer conclusão, que: “Quanto ao vinho licoroso, o seu acondicionamento foi feito em depósitos em madeira, donde resultou a sua perda por absorção pela madeira”, esta alegação é igualmente nova e por isso está, de igual modo, à semelhança do já referido acima, coartada a este Tribunal a sua apreciação.
Na verdade, nesta conclusão nada é referido ou assacado quanto ao ajuizado pelo Tribunal a quo, porque verdadeiramente não fora alegada nem apreciada, por isso, pelo Tribunal recorrido.
No entanto, sempre se diga também que, tal como no ponto anterior, para o cálculo do imposto foi considerada a quantidade de 248 litros ao qual foi aplicada a franquia de isenção, como se vê do mesmo quadro inserto no ponto B) dos factos assentes.
Por último, alega a recorrente na conclusão 26ª das conclusões recursivas que foram afrontados os artigos atinentes à falta de fundamentação dos atos, e à nulidade da sentença, a que supra já nos referimos, e ainda que foram afrontados os seguintes normativos legais: - artigo 120º, als. a), b) e c) do CPPT; artigo 77º da LGT e os artigos 13º, 20º, 202º, 204º, 205º, 266º, nº 2 e 268º, nº 3 da CRP.
Ora, tal como se disse no recente acórdão deste TCAS de 18.09.2025, tirado do processo nº 678/23.7BELRA:
“Não basta afirmar que a sentença violou determinadas normas legais, sem mais. Ou seja, sem indicar o contexto em que foram afrontadas, a razão pela qual foram erradamente aplicadas ou interpretadas, e como deveria ser feita essa aplicação ou interpretação normativa.
O ataque assim desferido não permite sequer ao Tribunal de recurso identificar o que é que foi erradamente interpretado na sentença e qual seria o sentido “legal” e com eco nas normas, tal como é imposto pelo artigo 639º do CPC, ex vi artigo 2º al. e) do CPPT.
Cabia à recorrente indicar não só as normas jurídicas violadas, como a indicação do sentido que deve ser atribuído às normas cuja aplicação e interpretação determinou o resultado que pretende impugnar (desde logo para se perceber o raciocínio por si traçado e se é de prevalecer ou não); E, perante o eventual erro na determinação de normas aplicáveis, indicar as que deveriam ser aplicadas (Vd neste sentido António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 7ª ed. Atualizada, Almedina, págs 181 e 182).
A verdade é que, nem nas alegações nem nas conclusões são apontadas as razões jurídicas pelas quais entende que foram violados aqueles artigos, isto é, como se decidiu e como deveria ser feita a (correta) interpretação daqueles normativos na situação sujeita, contrapondo um raciocínio jurídico-interpretativo alternativo no contexto factual em causa.
Ora, a finalidade das conclusões recursivas, nos termos do artigo 639º do CPC, essencialmente quando está em causa o erro de julgamento do direito, é definir o objeto do recurso, através da identificação abreviada dos fundamentos ou razões jurídicas já desenvolvidas nas alegações, sob pena de ficar impossibilitada a apreciação dessa parte do alegado vício/erro (Neste sentido vd o sumariado no acórdão do STA de 19.05.2016, Processo nº 0203/16).
Ora, o ataque vago assim feito, sem o ser nos termos elencados vota ao insucesso o recurso nesta parte, que terá de naufragar”.
Improcede, por isso, também o aduzido na conclusão 26ª do recurso.
Aqui chegados, assuma a conclusão que o recurso terá de improceder, sendo de manter a decisão recorrida e bem assim a liquidação impugnada e respetivos juros compensatórios.

*

No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo da recorrente por ser parte vencida.


*

V- DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da recorrente.


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Lisboa, 16 de outubro de 2025.

Isabel Silva
(Relatora)
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Ana Cristina Carvalho
(1ª adjunta)
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Rui A. S. Ferreira
(2º adjunto)
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(1) A este respeito, sumariou-se no acórdão do STJ de 12.02.2009, tirado do Processo 08A2680 que: “3) Há erro material quando se verifica inexactidão na expressão da vontade do julgador, por lapso notório, sendo que a divergência entre a vontade real e a declarada não deve suscitar fundadas dúvidas, antes ser patente, através de outros elementos da decisão, ou, até, do processo. É o equivalente ao erro-obstáculo tratado no direito substantivo”.
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