Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:43293/24.2BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:06/18/2025
Relator:LINA COSTA
Descritores:INFORMAÇÃO NÃO PROCEDIMENTAL
SEGURANÇA PRISIONAL
NÃO CRIAR DOCUMENTOS
INFORMAR DA EXISTÊNCIA OU CONTEÚDO
Sumário:I. O direito à informação não procedimental, consagrado no artigo 268º, nº 2, da CRP e densificado no artigo 17º do CPA e na Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA), aprovada pela Lei nº 26/2016, de 22 de Agosto, de acesso aos documentos que constam dos arquivos das entidades públicas administrativas, visa assegurar a transparência da respectiva actuação na prossecução do interesse público que por lei lhes está cometido, sendo que todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito a aceder aos documentos administrativos, mediante consulta, reprodução e informação sobre a sua existência e conteúdo v. os artigos 2º e 5º da LADA;
II. A entidade, a quem o particular dirige o pedido de acesso, não tem o dever de criar ou adaptar documentos para o satisfazer, nos termos do nº 6 do artigo 13º, nem deve permitir o acesso dos documentos abrangidos pelas restrições e limitações, previstas nos artigos 6º a 8º [v. a referida alínea b) do nº 7 do artigo 6º], todos da LADA;
III. É justificada a restrição de acesso aos documentos que possam conter informação sobre as características dos materiais das janelas por o seu conhecimento por terceiros ao sistema poder comprometer de forma séria e irremediável a segurança prisional, cfr. artigo 6º, nº 7, alínea b) da LADA;
IV. A informação requerida deve ser prestada mediante consulta, reprodução (por certidão, cópia física – fotocópia – ou por outros meios digitais) e informação sobre a respectiva existência ou conteúdo;
V. Significando que a informação a elaborar pelo Recorrente se limita a dar conhecimento sobre se existe ou não documento/s na sua posse que verse/m sobre o conteúdo pretendido pelas Requerentes e não a consubstanciar ela própria a resposta ao solicitado.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Ministério da Justiça, melhor identificado como entidade requerida nos autos de acção de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões instaurados por L… e B…, inconformado, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida em 7.2.2025, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que decidiu julgar a presente intimação procedente e, em consequência, intimar a Entidade Requerida a prestar às Requerentes o acesso aos documentos e informações em falta, requeridas no seu requerimento de 31.10.2024.
Nas respectivas alegações, o Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
«1- O presente recurso recai sobre a douta Sentença proferida, em 07.02.2025, pelo Tribunal a quo, que julgou inexistir uma inutilidade superveniente da lide, em consequência intimou a entidade requerida, no prazo de 5 dias contados nos termos do artigo 87.º do CPA2015, desde o trânsito em julgado da presente sentença, a informar as requerentes dos atos e diligências praticados no procedimento iniciado com o requerimento descrito em 1) da matéria de facto.
2- O referido requerimento, descrito em 1) da matéria de facto, rececionado pela ora recorrente em 31.10.2024, vinha “solicitar (…) ““Exma./o Sr./a. Diretor/a Na qualidade de Mandatário das reclusas L… e B… venho solicitar que se digne prestar as seguintes informações: estabelecimento prisional em que esteve/está detido; _período de detenção (data- de...a..); _superfície total da cela (metros quadrados); _ área ocupada pelas instalações sanitárias (metros quadrados); _ área ocupada pelo mobiliário, e bens pessoais de/os cada um dos recluso(s) _número de detidos em cada cela/camarata; _espaço pessoal. Também se solicita que se digne informar qual a dimensão das camas, ou beliches (comprimento e largura), e de que modo estavam(ão) as mesmas equipadas. Assente em pedra e/ou cimento? Mais se requer que informe se as celas/camaratas dispunham de janelas e, em caso afirmativo, quantas? Qual a sua altura e largura? Composta por que materiais? Também se requer informações sobre a lotação máxima oficial em cada EP, e a lotação à data da entrada nos mesmos, e à data da saída. De igual modo, se digne informar sobre se as instalações sanitárias estão no interior das celas/camaratas, ou não? De que modo estão separadas do restante espaço do alojamento? Por uma parede total ou parcial (murete)? Qual a dimensão (comprimento, largura e altura) da parede total e/ou parcial? Próximas das portas de entrada nas celas/camaratas? O anexo sanitário está (estava) totalmente isolado, desde que se iniciou a reclusão? Em todas as celas/camaratas em que o mesmo esteve alojado? Desde que data? Por uma cortina? Se for cortina, a DGRSP fornece a mesma, ou esta tem de ser adquirida pelos reclusos, a expensas suas? No que concerne às camaratas, qual a dimensão (comprimento, largura e altura) da parede, e do teto de cobertura? Qual o espaço entre o piso e o teto de cada uma das celas/camaratas? Qual a distância entre as instalações sanitárias e as paredes de cada uma das celas/camaratas? Qual a configuração da porta de alumínio? Porta de correr? Porta pivotante? Porta veneziana? Porta com grade? Porta de alumínio com vidro ou envidraçado (qual o estilo concreto do vidro ou envidraçado- sua cor, características e natureza)? A porta de alumínio é de folha dupla, ou folha única? No que concerne à área (m2), qual a área especificamente ocupada por objetos pessoais, e mobiliário geral? Qual o mobiliária afeto às celas/camaratas? Qual o espaço ocupado pelos sistemas de aquecimento e de ventilação, em cada uma das celas e camaratas (de cada estabelecimento prisional)? Há/havia sistema de aquecimento e/ou de ventilação nos.”.”.
3- Em sede de contestação veio a ora recorrente juntar resposta prestada via e-mail ao mandatário das ora recorridas, cujo conteúdo foi dado a conhecer, na íntegra, àquele, no dia 18.11.2024. O mesmo começa por informar que as reclusas B…(nº interno …) e L….(nº interno …) deram entrada no Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo no passado dia 1 de Junho de 2024, em cumprimento da medida de coação de prisão preventiva, no âmbito do Processo nº 15/24.3GGVNG; À entrada é entregue ás reclusas o “Folheto Informativo” sendo entregue um em Espanhol. Folheto Informativo em português, no qual constam os horários/visitas/atividades; Em 29 de Março de 2021 o EPSCB Feminino foi contemplado com o Programa Piloto de telefones nas celas. As reclusas poderão efetuar contactos telefónicos para os números de interesse público; o serviço de comunicações telefónicas funciona das 7h00 às 22h00; durante o período de funcionamento, cada reclusa poderá efetuar 60 minutos de chamadas telefónicas diários para os seus contactos, previamente aprovados, sem limite do número de chamadas bem como para o advogado e/ou solicitador; podem efetuar chamadas para os números de interesse publico / Humanitários sem limitação de tempo e de número. Os gratuitos são apenas os que iniciam por “800” e estão gravados de base no cartão telefónico. Todos os outros, que não comecem por “800”, estão acessíveis a pedido da reclusa e são inseridos pelo TSR. Sendo números humanitários o tempo de acesso é ilimitado.
4- Mais informou o ora requerente que: As reclusas B… e L….integraram, no imediato à entrada, a Terapia Ocupacional (2/sessões semanais); frequentam as aulas de TIC (Tecnologias Informática e Comunicação) e PFOL (Português para Falantes de outra Língua); frequentam atividade desportiva (dança, treino funcional e EDF Reabilitação. A L… está integrada laboralmente na cozinha central e a B… na faxina de Ala (substituição).
5- A ora recorrente informou ainda que as ora recorridas foram observadas nos serviços clínicos à entrada no EP e com acompanhamento clínico, que o processo clínico está informatizado e os serviços clínicos articulam com o Serviço Nacional de Saúde.
6- Prossegue o referido documento n.º 2 anexo aos presentes autos, informando as ora recorridas de que, estas, foram alocadas numa cela dupla/nº 52, na ALA 4, cuja área total é de 12,9174 e a área privada do WC 1,805 (com porta). O espaço de alojamento tem uma bancada (1,45 m), armário (largura 59 cm/altura 2,80 m), cama (largura 82 cm, altura 40 cm, cumprimento 1,80m). Todos os espaços de alojamento e casas de banho são dotados de luz natural.
7- As ora recorridas foram ainda informadas de que, as reclusas, se assim o entenderem, podem requerer junto do Tribunal tradutor, o que é concedido.
8- Ás informações solicitadas pelo ora recorrido relativamente ao regulamento de queixas, a ora recorrente informou as recorridas de que o no EPSCB Feminino em todas as Alas prisionais existe uma caixa fechada para queixas e requerimentos gerais colocada em zona acessível que garanta privacidade, na qual as pessoas reclusas podem depositar as queixas e requerimento bem como uma segunda caixa para questões de saúde.
9 - Ademais, informou ainda que, às reclusas é entregue, à entrada, Kit com produtos de higiene e limpeza e se se verificar que as reclusas não dispõem de apoio do exterior e/ou não integram ocupação laboral é entregue Kit mensal/lavagem roupa própria/cabeleireiro a expensas do EP. Mais referindo que o edifício permite estabelecer, de acordo com a Lei, a separação entre reclusas em cumprimento de pena e reclusas a aguardar julgamento e tem uma lotação para 354 mulheres.
10- É de salientar que consta ainda das informações prestadas pela ora recorrente que o EPSCB Feminino, está dotado de: Creche; Quartos de visitas íntimas (4); Serviços Clínicos do estabelecimento prisional que estão equipados com 4 gabinetes. Dispõem de: Medicina Dentária, Ginecologia/Obstetrícia, uma sala de tratamentos de enfermagem, uma sala de esterilização, duas enfermarias com 15 camas, 3 quartos individuais e 1 quarto de observação contínua. Atividade assistencial 24h00 com profissionais das áreas de Clínica Geral, Psiquiatria, Ginecologia, Pediatria, Medicina Dentária, Psicologia, Enfermagem, Farmácia, serviço Administrativo e de Auxiliar de Ação Médica.
• Unidades funcionais: Patologias Aditivas, Doenças Infeciosas, Doenças Cardiovasculares, Diabetes, Saúde da Mulher/Planeamento Familiar e Saúde Materna/Saúde Infantil.
- Certificado de Gestão da Qualidade pelo Norma NP EN ISO 9001:2015 obtido em 2018. Setor Escolar que possui instalações próprias com 8 salas de aulas e uma sala para os professores; Biblioteca /Videoteca com cerca de 9620 títulos (7921 em língua portuguesa e 1699 em língua estrangeira: Inglês, Francês, Espanhol, Italiano, Alemão, Russo, Grego, Polaco, ucraniano, Crioulo, mandarim), jornal diário e revistas semanais, está também equipada com 4 computadores para uso das reclusas, aparelhos de som, TV, leitor de Vídeo e DVD. Média de livros requisitados por mês – 150; dois campos polidesportivos exteriores, um salão polivalente e um ginásio de manutenção. Setor oficinal com 7 salas / brigadas de trabalho (+1 anexo parlatório ½). Espaço adaptado para Assistência Religiosa. Dispõe de Serviço de Lavandaria e Cantina e parlatório visitas.
11 - No que concerne às demais informações solicitadas pelas ora recorridas, em requerimento apresentado em 31.10.2024, é entendimento da ora recorrente, designadamente do Serviço de Auditoria e Inspeção do Norte, em consonância com a posição manifestada pela Direção dos Serviços de Segurança da recorrente, que as informações relativas a elementos construtivos de equipamentos considerados essenciais para a segurança física das instalações, como sejam as características dos materiais das janelas, portas, gradeamentos, paredes e tetos, não deverão ser fornecidas, ao abrigo do preceituado no artigo 6.º, n.º 7, al. b), da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, porquanto, o seu conhecimento por terceiros externos ao sistema poderá comprometer de forma séria e irremediável a segurança prisional.
12 - Ora, salvo o devido respeito, a ora recorrente é do entendimento de que já satisfez, na íntegra, todos os pedidos de informação solicitados pelas ora recorridas. Parece-nos sim, que as ora recorridas, insatisfeitas com o teor da resposta dada (e não com a falta de informação dada) pretende que a ora recorrente satisfaça, em sede de intimação, os seus pedidos que claramente violam o disposto no artigo 6.º, n.º 7, al. b), da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, porquanto o seu conhecimento por terceiros externos ao sistema poderá comprometer de forma séria e irremediável a segurança prisional.
13 - Motivo pelo qual se entende que a ora recorrente prestou todas as informações solicitadas pelas ora recorridas em 31.10.2024, abstendo-se de responder às informações que colocam em causa a ordem e segurança dos estabelecimentos prisionais, com a eventual possibilidade de evasões ou tentativas de evasões de reclusos, o que, de resto, se pretende evitar.
14 - Ou seja, a ora recorrente ao informar as ora recorridas de informações como: Qual o tipo de vidro nas janelas das celas, e camaratas? Qual o material de que eram compostas as janelas das celas, e camaratas? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético dos edifícios, de cada um dos EP? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético das janelas, isolamentos das celas, camaratas, e demais espaços interiores? E das tintas? Quais os móveis que tiveram em cada uma das celas, e camaratas, onde ficaram alojados? Quantas cadeiras estiveram disponíveis, e operacionais, no interior de cada cela e camarata? No que concerne à água servida, a mesma tinha certificação de qualidade? Era considerada potável? Qual a entidade/s que certificaram a mesma? Em que data/s?...”, tal iria facilitar o acesso por parte, não só das ora recorridas, como da população em geral, de informações relativas a elementos construtivos de equipamentos considerados essenciais para a segurança física das instalações.
15 – Assim, face ao supra exposto, a Douta Sentença proferida nos presentes autos, em 07.02.2025, pelo Tribunal a quo, está ferido de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, que incumbe retificar.»
requerendo,
«Termos em que deve o presente recurso proceder e a Douta Sentença do Tribunal a quo ser revogada, na parte em que considera inexistir uma inutilidade superveniente da lide, com as legais consequências.».
Juntou 8 documentos [que já constam dos autos, tendo sido apresentados com a resposta e o requerimento das Requerentes de 7.12.2024, pelo que irreleva aferir da sua admissibilidade em sede de recurso].

Notificadas para o efeito, as Recorridas não contra-alegaram.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente, mas com apresentação prévia aos mesmos do projecto de acórdão, o processo vem à conferência da Subsecção Administrativo Comum para julgamento.

A questão suscitada pelo Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consiste, no essencial, em saber se a sentença recorrida incorreu em erros de julgamento ao não considerar que já facultou o acesso à informação requerida ou que não a deve prestar ao abrigo do artigo 6º, nº 7, alínea b), da Lei nº 26/2016, de 22 de Agosto, por poder comprometer a segurança prisional.

A matéria de facto relevante é a constante da sentença recorrida, a qual, por não ter sido impugnada, aqui se dá por reproduzida, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 6 do artigo 663º do CPC, ex vi o nº 3 do artigo 140º do CPTA.

Na sentença recorrida, o juiz a quo após explicitar as duas vertentes do direito à informação, procedimental e não procedimental, e o meio processual que lhes serve de garantia, bem como as normas da CRP, do CPA, da LADA e do CPTA aplicáveis, fundamentou o decidido nos seguinte termos:
«Ora, considerando o quadro legal traçado, verifica-se que no caso dos autos as Requerentes pretendem exercer o direito à informação não procedimental, pois não está em causa um procedimento administrativo no âmbito do qual sejam titulares ou interessados e requerem o acesso a determinada informação.
Como resulta dos factos provados, do acervo de informação solicitada pelas Requerentes, apenas foi disponibilizada pela Entidade Requerida a informação que consta das alíneas D) e E) dos factos provados.
Com efeito, verifica-se que no pedido de informação formulado, as Requerentes requereram um conteúdo mais extenso do que aquele que foi disponibilizado – cf. alíneas A) e B) dos factos provados.
Assim, considerando todo este circunstancialismo fáctico, torna-se forçoso concluir, sem margem para qualquer contestação, que a Entidade Requerida não prestou de forma cabal o acesso à informação solicitada.
Donde, desde já se pode, então, afirmar, que as Requerentes, atento o princípio do arquivo aberto, e dispondo de legitimidade para a sua obtenção, viram negado o seu direito à informação não procedimental.
Dito isto, vejamos, então, se essa negação se poderá considerar justificada ou se encontra justificação dentro do quadro legal que limita o acesso aos arquivos administrativos.
Ora, uma vez que na situação presente não se afigura existir quaisquer concretas circunstâncias que justifiquem a recusa do acesso à documentação/informação integrada no pedido formulado pelas Requerentes, carece de fundamento a denegação de informação.
Mais se diga que a alegação da Entidade Requerida de que «cabe aos Requerentes especificar de forma clara e individualizada as informações pretendidas face a cada pedido, o que não se verificou no requerimento apresentado em 31/10/2024, pelo que, não compete à Entidade Requerida interpretar o alegadamente solicitado pelos Requerentes, motivo pelo qual se consideram devidamente prestadas as informações remetidas em 18/11/2024, à luz do pedido em causa», não consubstancia uma qualquer razão válida que justifique a negação do acesso aos documentos/informação pretendidos, nem o entendimento, ali feito, de que a dificuldade de interpretação poderá comprometer o acesso à informação solicitada.
Disto isto, não pode, assim, manter-se a recusa de acesso à documentação solicitada ainda em falta em face da inexistência de uma qualquer concreta circunstância que justifique o seu impedimento, não se afigurando a existência de qualquer motivo ou razão legítima para manter-se reservado o acesso a tal documentação/informação.
Pelo que, deve ser deferido o correspondente pedido, devendo a Entidade Requerida prestar a informação em falta e pretendida, apresentada no requerimento de 31-10-2024.
Termos em que deve a Requerida, ainda, informar «No que concerne à alimentação, qual o menu que foi servido aos Reclusos, em cada dia, por referência a cada estabelecimento prisional? Cada estabelecimento prisional dispõe de nutricionista/s afeto ao mesmo, em permanência? Durante o período de reclusão, quantos nutricionistas tinha no quadro de cada EP? A quantidade e a qualidade das refeições eram controladas por nutricionista? Se não, por quem era controlada? Com que periodicidade? Requer-se a remessa diária da certificação realizada à qualidade e quantidade das refeições, no período de reclusão de cada um, por referência a cada estabelecimento prisional. Qual o tipo de vidro nas janelas das celas, e camaratas? Qual o material de que eram compostas as janelas das celas, e camaratas? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético dos edifícios, de cada um dos EP? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético das janelas, isolamentos das celas, camaratas, e demais espaços interiores? E das tintas? Quais os móveis que tiveram em cada uma das celas, e camaratas, onde ficaram alojados? Quantas cadeiras estiveram disponíveis, e operacionais, no interior de cada cela e camarata? No que concerne à água servida, a mesma tinha certificação de qualidade? Era considerada potável? Qual a entidade/s que certificaram a mesma? Em que data/s? (…)».
[…]
Nestes termos, e com os fundamentos de facto e de direito supra expostos, julga-se a presente intimação procedente e, em consequência, intima-se a Entidade Requerida a prestar às Requerentes o acesso aos documentos e informações em falta, requeridas no seu requerimento de 31-10-2024.».

A saber, o juiz a quo, ainda que no dispositivo intime o aqui recorrente a prestar às Requerentes o acesso aos documentos e informações em falta, requerido em 31.10.2024, delimita o acesso a facultar a: «No que concerne à alimentação, qual o menu que foi servido aos Reclusos, em cada dia, por referência a cada estabelecimento prisional? Cada estabelecimento prisional dispõe de nutricionista/s afeto ao mesmo, em permanência? Durante o período de reclusão, quantos nutricionistas tinha no quadro de cada EP? A quantidade e a qualidade das refeições eram controladas por nutricionista? Se não, por quem era controlada? Com que periodicidade? Requer-se a remessa diária da certificação realizada à qualidade e quantidade das refeições, no período de reclusão de cada um, por referência a cada estabelecimento prisional. Qual o tipo de vidro nas janelas das celas, e camaratas? Qual o material de que eram compostas as janelas das celas, e camaratas? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético dos edifícios, de cada um dos EP? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético das janelas, isolamentos das celas, camaratas, e demais espaços interiores? E das tintas? Quais os móveis que tiveram em cada uma das celas, e camaratas, onde ficaram alojados? Quantas cadeiras estiveram disponíveis, e operacionais, no interior de cada cela e camarata? No que concerne à água servida, a mesma tinha certificação de qualidade? Era considerada potável? Qual a entidade/s que certificaram a mesma? Em que data/s?» [nota: apesar de ter terminado este excerto da sentença com “(…)”, a seguir à pergunta “Em que datas?”, nada mais está escrito no requerimento de 31.10.2024 das Requerentes], de acordo com o que as Requerentes vieram especificar nos autos não ter sido satisfeito pelo aqui Recorrente, apesar do alegado e da documentação junta, na sua resposta.
Razão pela qual o objecto do recurso se limita a estas perguntas/pedidos que o Recorrente considera já ter facultado ou não dever prestar, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 7, alínea b) da Lei nº 26/2016, de 22 de Agosto, actualizada, porquanto o conhecimento da informação sobre “Qual o tipo de vidro nas janelas das celas, e camaratas? Qual o material de que eram compostas as janelas das celas, e camaratas? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético dos edifícios, de cada um dos EP? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético das janelas, isolamentos das celas, camaratas, e demais espaços interiores? E das tintas? Quais os móveis que tiveram em cada uma das celas, e camaratas, onde ficaram alojados? Quantas cadeiras estiveram disponíveis, e operacionais, no interior de cada cela e camarata? No que concerne à água servida, a mesma tinha certificação de qualidade? Era considerada potável? Qual a entidade/s que certificaram a mesma? Em que data/s?...”, por terceiros externos ao sistema poderá comprometer de forma séria e irremediável a segurança prisional, o que já resultava do teor da informação prestada ao mandatário das Requerentes, em 18.11.2024, e é reiterado em sede de recurso como sendo o entendimento do Serviço de Auditoria e Inspecção do Norte e da Direcção de Serviços de Segurança da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.
No parecer junto aos autos pelo Ministério Público, o Digníssimo Procurador-Geral Adjunto concorda com a defendida restrição ao direito fundamentação de informação não procedimental, por haver risco para a segurança prisional, referindo exemplos de notícias sobre casos concretos de objectos feitos por detidos a partir dos materiais das celas, como facas criadas com objectos, metais, encontrados nas prisões, como barras dos vitrais das janelas, dos corrimões, dos batentes das portas, dos vergalhões das camas, das cadeiras, que aqui damos por reproduzidos.
Apreciando.
O direito à informação não procedimental, consagrado no artigo 268º, nº 2, da CRP e densificado no artigo 17º do CPA e na Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA), aprovada pela referida Lei nº 26/2016, de acesso aos documentos que constam dos arquivos das entidades públicas administrativas, visa assegurar a transparência da respectiva actuação na prossecução do interesse público que por lei lhes está cometido, sendo que todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito a aceder aos documentos administrativos, mediante consulta, reprodução e informação sobre a sua existência e conteúdo v. os artigos 2º e 5º da LADA.
Para efeitos da LADA, documento administrativo é qualquer conteúdo, ou parte desse conteúdo, que esteja na posse ou seja detido em nome dos órgãos e entidades referidas no artigo 4º, seja o suporte de informação sob forma escrita, visual, sonora, electrónica ou outra forma material, neles se incluindo, designadamente, aqueles relativos a procedimentos de emissão de actos e regulamentos administrativos, procedimentos de contratação pública, incluindo os contratos celebrados, a gestão orçamental e financeira dos órgãos e entidades, bem como a gestão de recursos humanos, nomeadamente os dos procedimentos de recrutamento, avaliação, exercício do poder disciplinar e quaisquer modificações das respectivas relações jurídicascfr. a alínea a) do nº 1 do artigo 3º da LADA, com caracter enunciativo ou não taxativo.
A entidade, a quem o particular dirige o pedido de acesso, não tem o dever de criar ou adaptar documentos para o satisfazer, nos termos do nº 6 do artigo 13º, nem deve permitir o acesso dos documentos abrangidos pelas restrições e limitações, previstas nos artigos 6º a 8º [v. a referida alínea b) do nº7 do artigo 6º], todos da LADA.
Quanto à restrição de acesso à informação procedimental invocada nos presentes autos, na resposta dada às Requerentes – “[n]o que concerne às características materiais das janelas, portas, gradeamentos, paredes e tetos não podem ser fornecidos tendo presente o estatuído no art. 6º nº 7 al. b) da Lei nº 26/2016 de 22 de Agosto, porquanto o seu conhecimento por terceiros externos ao sistema poderá comprometer de forma série e irremediável a segurança prisional” – e no recurso, acrescentando ser esse o entendimento dos Serviço de Auditoria e Inspecção do Norte e da Direcção de Serviços de Segurança da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (sem junção de qualquer comprovativo), entendemos, apesar de pouco explicativa, ser suficiente para permitir justificar a recusa de acesso aos documentos que possam conter informação sobre “Qual o tipo de vidro nas janelas das celas, e camaratas? Qual o material de que eram compostas as janelas das celas, e camaratas?”, porquanto apenas estas se referem as características dos materiais das janelas, cujo conhecimento, por terceiros, vem alegado ser susceptível de pôr em causa a segurança do estabelecimento prisional onde as Requerentes se encontram ou estiveram.
Quanto às demais perguntas elencadas pelo Recorrente, entendemos não estarem abrangidas pela restrição indicada, importando aferir se já foram respondidas, como o mesmo alega.
Da informação remetida às Requerentes resulta, designadamente, que: “[a]s reclusas foram alocadas numa cela dupla … O espaço de alojamento tem uma bancada (1,45m), armário (largura 59 cm/altura 2,80 m), cama (largura 82cm/altura 40cm/comprimento 1,80m)”, pelo que entendemos ter sido prestada informação sobre “Quais os móveis que tiveram em cada uma das celas, e camaratas, onde ficaram alojados?” e “Quantas cadeiras estiveram disponíveis, e operacionais, no interior de cada cela e camarata?”, esta pela negativa.
Assim, o Recorrente não deu resposta a: «No que concerne à alimentação, qual o menu que foi servido aos Reclusos, em cada dia, por referência a cada estabelecimento prisional? Cada estabelecimento prisional dispõe de nutricionista/s afeto ao mesmo, em permanência? Durante o período de reclusão, quantos nutricionistas tinha no quadro de cada EP? A quantidade e a qualidade das refeições eram controladas por nutricionista? Se não, por quem era controlada? Com que periodicidade? Requer-se a remessa diária da certificação realizada à qualidade e quantidade das refeições, no período de reclusão de cada um, por referência a cada estabelecimento prisional. Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético dos edifícios, de cada um dos EP? Qual a etiqueta classe+ do desempenho energético das janelas, isolamentos das celas, camaratas, e demais espaços interiores? E das tintas? No que concerne à água servida, a mesma tinha certificação de qualidade? Era considerada potável? Qual a entidade/s que certificaram a mesma? Em que data/s?».
Mas, como referimos supra, está em causa o direito de informação não procedimental, ou seja, o direito de acesso a documentos administrativos que, detidos pelo Recorrente, possam conter a informação pretendida a prestar mediante consulta, reprodução (por certidão, cópia física – fotocópia – ou por outros meios digitais) e informação sobre a respectiva existência ou conteúdo.
Significando que a informação a elaborar pelo Recorrente se limita a dar conhecimento sobre se existe ou não documento/s na sua posse que verse/m sobre o conteúdo pretendido pelas Requerentes e não a consubstanciar ela própria a resposta ao solicitado.
Exemplificando, por referência ao primeiro pedido “No que concerne à alimentação, qual o menu que foi servido aos Reclusos, em cada dia, por referência a cada estabelecimento prisional?, se o Recorrente detém na sua posse documento ou documentos que contém/êm o menu que foi servido aos reclusos em cada dia e em cada estabelecimento prisional em que as Requerentes estiveram, deve permitir o acesso ao/s mesmo/s, informando, por exemplo, via email [o meio que, resulta nos autos, ter sido usado a solicitar e a prestar a informação entre as partes] as Requerentes de que no dia x, às horas y, no local w, poderão (através do seu mandatário), proceder à sua consulta, ou remetendo-lhes ficheiro com a cópia ou certidão do respectivo teor (sendo que deveriam ter sido as Requerentes a indicar a forma de acesso que pretendiam). Se esse/s documento/s não existe/m, deve informar, pelo mesmo meio, as Requerentes em conformidade. Se a pretendida informação sobre os menus estiver vertida em partes de vários documentos e a sua prestação implicar criar documentos novos ou adaptar os existentes, ou fornecer extractos destes, envolvendo um esforço desproporcionado que ultrapassa a sua simples manipulação – v. o nº 6 do artigo 13º da LADA -, a informação a remeter, idem, às Requerentes evidenciará essa situação de impossibilidade de prestar a informação pretendida a partir dos documentos existentes, cumprindo assim, nos termos que a LADA admite, o dever de prestar a informação não procedimental requerida.
Acresce que, a existirem os documentos com a informação solicitada e ainda não prestada, cumpre ao Recorrente verificar se os mesmos não contêm dados nominativos ou outros que lhe imponham restrições ou limitações no respectivo acesso, nos termos dos referidos artigos 6º a 8º da LADA.
Donde, o presente recurso deve proceder parcialmente, por se justificar a aduzida restrição do acesso por razões de segurança ou por já terem sido prestadas, as informações indicadas, mantendo-se a intimação do Recorrente, por não ter ocorrido a alegada inutilidade superveniente da lide, a conceder o acesso aos documentos administrativos que contenham a demais informação requerida, acima delimitada, ao abrigo da LADA e nos termos agora explicitados.

As custas são devidas pelas partes na proporção do respectivo decaimento que se fixa em ¾ para o Recorrente e ¼ para as Recorridas. Contudo, porque estas não contra-alegaram, a fixação efectuada apenas releva quanto às mesmas para efeitos da sua responsabilidade pelas custas de parte - cfr. artigos 527º, nºs 1 e 2, e 533º do CPC e 7º, nº 2 do RCP.

Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder parcial provimento ao recurso, considerando justificada a restrição de acesso e já prestado o mesmo, nos pedidos referidos supra, e mantendo, quanto aos demais pedidos considerados não satisfeitos, a sentença recorrida, com diferente fundamentação.

Custas pelo Recorrente, na proporção de ¾ e pelas Recorridas, de ¼, na vertente de custas de parte, por não terem contra-alegado.

Registe e Notifique.

Lisboa, 18 de Junho de 2025.


(Lina Costa – relatora)

(Marcelo Mendonça)

(Joana Costa e Nora)