Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:318/06.9BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:03/27/2025
Relator:LUÍS BORGES FREITAS
Descritores:CONCURSO
PROFESSOR CATEDRÁTICO
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO
ATOS CONSEQUENTES
Sumário:I - Como resulta do disposto no artigo 125.º/2 do Código do Procedimento Administrativo de 1991, interpretado a contrario, a fundamentação terá de ser clara, coerente e completa.
II - É entendimento jurisprudencial, à luz do Código do Procedimento Administrativo de 1991, que atos consequentemente inválidos por causa da anulação do ato precedente são apenas aqueles cujos efeitos não possam manter-se sem ofensa do caso julgado ou desconformidade com a sentença, concretamente, aqueles cujos efeitos têm necessariamente de ser destruídos para que se possa reconstituir a situação hipotética atual, na medida em que seja imposta pela sentença anulatória, em função dos respetivos fundamentos.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Social
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul:


I
B....... intentou, em 25.7.2006, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, ação administrativa especial contra a Universidade de Évora, indicando como Contrainteressada A........, impugnando o despacho reitoral 30.3.2006 e pedindo a condenação da Entidade Demandada a provê-la no lugar a que concorreu (professor catedrático do quadro do pessoal docente da Universidade de Évora para a disciplina de Paleontologia).

Mediante ampliação de pedido que veio a ser deferida, impugnou ainda os despachos reitorais de 30.4.2007, 29.1.2008 e 7.2.2008.

Por sentença de 24.12.2019 o tribunal a quo julgou a ação totalmente improcedente.

Inconformada, a Autora interpôs recurso daquela decisão, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

A. Na douta Sentença recorrida, o Tribunal a quo julgou totalmente improcedente a presente ação. Porém, como demonstraremos no presente recurso, o Tribunal a quo deveria ter decidido diferente quanto aos factos e quanto ao direito, devendo a presente ação ser considerada totalmente procedente, com as demais consequências legais.
B. Quando à matéria de facto, deve ser adiado o seguinte facto: “A Contrainteressada A........ é amiga pessoal de todos os membros do júri do procedimento concursal, com exceção dos membros faltosos”, pois tal constitui um facto notório e público que nos termos legais deve ser tido em conta pelo Tribunal (cfr. alínea c) do n.º 2, do artigo 5.º e artigo 412.º do Código de Processo Civil (atualmente em vigor, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho ou 514.º do anterior CPC).
C. Também devem ser incluídos na matéria de facto provada os factos contantes da parte final do artigo 49.º e artigos 50.º a 52.º da Petição Inicial, dado que os mesmos não foram contestados.
D. Deve ainda ser aditado à matéria de facto provada o seguinte facto: “No Relatório Final foi tomado em consideração o critério da continuidade no leccionamento da disciplina posta a concurso, sendo que tal elemento não constava do quadro de critérios definido anteriormente”, pois no Relatório Final o Júri aditou um novo critério que se veio revelar determinante na nova ordenação das candidaturas.
E. Relativamente ao vício de violação de lei, o artigo 44.º do CPA não pode ser aplicado ao concurso documental em causa nos autos, pois as disposições legais aplicáveis ao referido concurso são as constantes do Capítulo IV do ECDU, que tem por epígrafe «Concursos e provas», nomeadamente o artigo 61.º. Pelo que o único caso de impedimento aplicável ao concurso documental são os casos dos “parentes ou afins dos candidatos na linha recta ou até ao terceiro grau”.
F. Assim, devem ser considerados os impedimentos constantes no ECDU e não os casos de impedimento do CPA, sendo por isso manifestamente ilegal subsumir ao caso em crise o disposto no artigo 44.º, n.º 1, alínea a), do CPA.
G. O ato do Magnífico Reitor que teve como efeito declarar o Prof. R........ impedido viola claramente as disposições legais aplicáveis pelo que deve ser anulado.
H. Mesmo que assim não se entenda, o que não se concede, sempre se diria que o ato praticado pelo Magnífico Reitor não tem qualquer suporte legal, uma vez que faz uma errada interpretação do artigo 44.º, n.º 1, alínea a), do CPA, pois só está impedido de intervir no procedimento administrativo o órgão relativamente ao qual se verifique algumas das situações enunciadas nas alíneas a) a g) do n.º 1 do artigo 44.º do CPA.
I. O concurso em causa, segundo os artigos 38.º e 49.º do ECDU, tem por finalidade apreciar e valorar o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da atividade pedagógica já desenvolvida, sendo que a ordenação dos candidatos ao concurso terá por fundamento o mérito científico e pedagógico do curriculum vitae de cada um dos candidatos, logo o objeto de avaliação no presente concurso não são as publicações das candidatas, mas sim a intervenção que estas tiveram no âmbito das mesmas.
J. Ademais, não existe qualquer interesse pessoal, qualquer ganho, vantagem ou benefício, em concreto ou em abstrato, por parte do Professor R........ na nomeação da ora Recorrente para o lugar de professor catedrático de paleontologia da Universidade de Évora.
K. Caso se entenda que a situação exposta constitui um impedimento deve igualmente considerar-se a situação da Contrainteressada em relação ao Professor H........., que foi membro do júri, pois estes desenvolveram, em conjunto, para além dos estágios científicos e missões de trabalho na Université des Sciences et Techniques du Languedoc e projetos de investigação, publicações conjuntas.
L. O entendimento da Recorrente sempre foi o de que a coautoria dos candidatos do procedimento com membros do júri do concurso não é, por si só, gerador de qualquer impedimento ou qualquer outro vício na sua apreciação, porém caso se considere a existência deste impedimento em relação à situação da Recorrente, tal também deve ser considerado quanto à outra candidata, a ora Contrainteressada.
M. O Tribunal a quo vem indicar que a Recorrente não invocou em tempo a existência de tal impedimento, porém é entendimento unânime da doutrina que caso não se detete um impedimento durante o procedimento e caso este se verifique, a decisão final do procedimento é invalida (neste sentido, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco Amorim, Código do Procedimento Administrativo, 2.ª edição, revista e aumentada, Coimbra, Almedina, 1997, p. 245).
N. Além disso, a Administração tem o dever de quando tenha conhecimento de factos que levam à anulação do ato, fazê-lo. Tal como o Tribunal, que tem o dever de tendo conhecimento de factos para julgar um ato anulado, fazê-lo. Neste sentido veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 28.10.2009, Processo n.º 0121/09, disponível em www.dgsi.pt.
O. Face ao exposto, deve ser declarada a anulabilidade do ato do Magnífico Reitor, por violação clara da lei, nos termos do artigo 135.º do CPA, ainda que se entenda que ao caso sub judice não se aplica os casos de impedimento previstos no artigo 44.º do CPA.
P. O ato impugnado padece ainda de vício de falta de fundamentação, pois a informação com base no qual foi praticado o ato o Magnifico Reitor faz uma errada interpretação do conceito de impedimento tal como ele se encontra CPA e não se descortina qual o «interesse pessoal» que o Professor R........ pode eventualmente ter na designação da ora Autora para o lugar de professor catedrático de paleontologia da Universidade de Évora.
Q. Assim, não foi possível à Recorrente reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido do autor do ato.
R. A exigência de fundamentação de todos os atos administrativos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos é uma exigência constitucional. Gomes Canotilho e Vital Moreira defendem que os atos administrativos, ao não cumprirem o disposto no artigo 268 º n. º 3, da CRP e nos artigos 124.º e 125 º do CPA, ofendem o conteúdo essencial do direito fundamental à fundamentação — artigo 133 º n 2, al. d) do CPA — enfermando, por conseguinte de nulidade cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª Edição Revista, bem como Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e João Pacheco de Amorim, in Código de Procedimento Administrativo comentado, 2.ª Edição, Almedina, p. 590. Assim, o ato impugnado é ilegal, por falta de fundamentação, pelo que deverá ser declarado nulo ou pelo menos anulado, nos termos da al. d), do n.º 2, do artigo 133.º ou do 135.º, todos do CPA.
S. Por fim, os atos impugnados violam ainda os princípios da igualdade, da autovinculação, da imparcialidade e da transparência.
T. É um facto notório e público que os membros do Júri, com exceção dos dois membros faltosos, são amigos pessoais da Contrainteressada A........, algo que por si só não significa que estejam impedidos, mas a atuação dos mesmos e o desenrolar de todo o procedimento demonstram exatamente o contrário, pelo que não está a assegurada a imparcialidade devida (cfr. artigo 6.º do CPA).
U. Por outro lado, a nova avaliação feita pelo Júri não poderia ter em conta quaisquer aspetos que não tivessem previamente sido tidos em conta, em conformidade com a vertente negativa da autovinculação (não ter em conta aquilo que antes, em situações semelhantes, não se relevou).
V. Assim, deve ser declarada a anulabilidade do Despacho de 29.01.2008, pelo qual foi homologado o Relatório Final do Júri, e do Despacho n.º 5015/2008.
NESTES TERMOS
Deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se na íntegra a Sentença proferida e deverá julgar-se a ação em causa totalmente procedente, com as demais consequências legais.
Só assim se fazendo a tão ACOSTUMADA JUSTIÇA!
*

A Recorrida apresentou contra-alegações, concluindo que «[a] sentença recorrida está fundamentada de facto e de direito, não merecendo a mínima censura, devendo manter-se para assim se fazer JUSTIÇA!»

*

Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o Ministério Público não emitiu parecer.
*

Com dispensa de vistos, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores adjuntos, vem o processo à conferência para julgamento.


II
Sabendo-se que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do apelante, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam do conhecimento oficioso (cf. artigos 144.º/2 e 146.º/4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 608.º/2, 635.º/4 e 5 e 639.º/1 e 2 do Código de Processo Civil), as questões que se encontram submetidas à apreciação deste tribunal consistem em determinar se existe erro de julgamento:

a) Na apreciação da matéria de facto;
b) Na apreciação dos seguintes vícios:

i) Violação de lei, por erro quanto à base legal sobre a qual a decisão foi tomada (artigo 44.º do Código do Procedimento Administrativo de 1991);
ii) Falta de fundamentação do ato de 30.3.2006;
iii) Violação dos princípios gerais da atuação administrativa.


III
A matéria de facto constante da decisão recorrida é a seguinte:

A) Em 2005-02-16, foi publicado no D.R. n.º 33 (II Série) o Edital n.º 327/2005 que abriu: “… o concurso documental para recrutamento de um professor catedrático para a disciplina de Paleontologia, em conformidade com os artigos 37.º, 38.º, 40.º, 43.º e 44.º do Estatuto da Carreira Docente Universitária, anexo à Lei n.º 19/80, de 16 de julho, e demais legislação aplicável. (…) 7 - A este concurso é ainda aplicável o disposto nos artigos 45.º e 47.º a 52.º do aludido Estatuto da Carreira Docente Universitária…” para a UÉ;
B) Em 2005-06-16, foi publicado no D.R. n.º 114 (II Série) o Despacho n.º 13247/2005 através do qual o Reitor da Entidade Demandada designava os membros do Júri do concurso melhor identificado na alínea a) supra, a saber: Professor Catedrático J.........; Professor Catedrático H.........; Professor Catedrático C.........; Investigador coordenador M.........; Professor Catedrático R.........; Professor Catedrático P.........; Professor Catedrático F.........;
C) A A. e a Contrainteressada foram opositoras ao concurso documental aberto por edital acima melhor identificado;
D) Em 2005-07-15, o Júri reuniu pela primeira vez, ressaltando da ata:
“(texto integral no original; imagem)”
E) Em 2005-11-02, o Júri reuniu pela segunda vez, ressaltando da ata:
“(texto integral no original; imagem)”

F) Em 2005-11-17, em sede de audiência prévia, a A. declarou concordar com o projeto de decisão final que a ordenara em primeiro lugar, tendo a Contrainteressada, por seu turno, e na mesma sede, manifestado a sua discordância com o referido projeto, além do mais, requerendo impedimento do membro do Júri Professor Catedrático R........., por ter verificado que boa parte do trabalho publicado e apresentado pela A. em curriculum havia sido publicado em coautoria com o referido membro do Júri;
G) Em 2005-12-06 os serviços jurídicos da Entidade Demandada informaram:
H) “(texto integral no original; imagem)”


I) Em 2005-12-13 a Entidade Demandada determinou a notificação do membro do Júri Professor Catedrático R........., para querendo se pronunciar sobre a, alegada, situação de impedimento;
J) Em 2006-01-20, o membro do Júri do concurso acima melhor identificado, pronunciou-se sobre a, alegada, situação de impedimento, tendo, posteriormente sido ouvidas a A. e a Contrainteressada;
K) Em 2006-03-21, foi proferido nova informação jurídica, de que ressalta:
L) “(texto integral no original; imagem)”


M) Ato impugnado:
Em 2006-03-30 o Reitor da Entidade Demandada proferiu o seguinte despacho: “Deferido com base na informação jurídica, que se anexa. Notifique-se o membro do júri visado. Convoque-se o júri sem o membro declarado impedido”;
N) Ocorreram eleições para os órgãos diretivos da Universidade, dai resultando uma nova equipa dirigente, da qual a Contrainteressada fez parte como Vice-Reitora;
O) Em 2006-05-23, a A. obteve resposta ao seu pedido de informações sobre o andamento do procedimento concursal;
P) Em 2006-07-06 a A., então Requerente, intentou providência cautelar de suspensão do ato ora impugnado que correu termos sob o n.º 290/06.5BEBJA e que foi julgada totalmente improcedente, tendo, sem recurso, transitado a referida sentença em 2007-05-14;
Q) Em 2006-07-25 a A. intentou a presente ação administrativa especial neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja;
R) Ato impugnado:
Em 2007-03-26 foi proferido despacho reitoral que determinou a : “… republicação do júri do concurso documental para provimento de um lugar de professor catedrático do quadro de pessoal docente desta Universidade, para a disciplina de Paleontologia, publicado através do edital n.º 327/2005 (2.ª série), de 16 de Fevereiro, nos termos do artigo 45.º do Estatuto da Carreira Docente Universitária, anexo à Lei n.º 19/80, de 16 de Julho, com nova composição, na sequência de declaração de impedimento relativa a um vogal do júri e da aposentação de outro vogal do júri: Presidente - Reitor da Universidade de Évora. Vogais: S........., professor catedrático da Universidade de Lisboa; F........., professor catedrático da Universidade do Porto; H........., professor catedrático da Universidade de Montpellier II; C........., professor catedrático da Universidade de Salamanca; M.A........., professora catedrática da Universidade Estadual do Rio de Janeiro; T........., professor catedrático do Muséum National d'Histoire Naturelle e P........., professor catedrático da Universidade de Coimbra…”;
S) Em 2007-06-06 o Júri reuniu pela terceira vez, ressaltando da ata:
T) “(texto integral no original; imagem)”



U) Em 2007-06-07, foi elaborado o Relatório final, nos seguintes termos:
“(texto integral no original; imagem)”

V) Em 2007-06-25 foi a A. notificada para querendo se pronunciar em sede de (nova) audiência prévia, prerrogativa que utilizou;
W) Em 2008-01-29 o Júri reuniu pela quarta vez, ressaltando da ata:
“(texto integral no original; imagem)”
X) Ato impugnado:
Em 2008-01-29 foi proferido despacho reitoral que homologou o Relatório Final do Júri;
Y) Em 2008-02-06 foi a A. notificada da homologação da decisão final do concurso em causa nos autos;
Z) Ato impugnado:
Em 2008-02-25 foi publicado no D.R. (2.ª série), N.º 39 a nomeação da Contrainteressada como Professora catedrática, a título definitivo, do Quadro de Pessoal Docente da UÉ;
AA) Em 2013-08-13 foi publicado em DR o aviso que tornou pública a aposentação da A.


IV
Do alegado erro de julgamento da matéria de facto

1. De acordo com a Recorrente, deve ser aditado à matéria de facto provada o seguinte facto:

· A Contrainteressada A........ é amiga pessoal de todos os membros do júri do procedimento concursal, com exceção dos membros faltosos

2. Para o efeito alegou ser «um facto notório e público que os membros do Júri, com exceção dos dois membros faltosos, são amigos pessoais da Contrainteressada A........».

3. Ora, sendo os factos notórios aqueles «que são do conhecimento geral» (artigo 412.º/1 do Código de Processo Civil), não se vê – nem a Recorrente tentou explicar – de que modo chegou a tal qualificação relativamente ao facto invocado. Portanto, e por aqui, não lhe assiste razão.

4. Por outro lado, entende que «devem ser incluídos na matéria de facto provada os factos contantes da parte final do artigo 49.º e artigos 50.º a 52.º da Petição Inicial, dado que os mesmos não foram contestados», e que indica serem os seguintes:

· O Professor H......... participou no júri de agregação da Contrainteressada
· A Contrainteressada tem desenvolvido muita da sua atividade com o Professor H.........
· Para além dos estágios científicos e missões de trabalho na Université des Sciences et Techniques du Languedoc (Montpellier II) onde tem desenvolvido a sua atividade com o Professor H......... e de que é exemplo o projeto de investigação "Palaeoichtyology. Upper CretaceouS faunas from Angola, Neuogene of Lisboa, Alvalade Basin and Algarve, Uppêr Jurassicsnf Lourinhã, a Contrainteressada é coautora de algumas obras com este membro do júri, tais como:
o 1 . M. - T.l A., A. C. B….. & H, C…… (1999) - Séciens du Miocàne terminal du bassin d'Alvalade (Portugal) Essia de synthêse. Ciências da Terra (UNL), Lisboa, n.º 13, pp. 141-155;
o 2. M. T, A….., A C. B….. & H. C….. (1999)- A new shark, Galeorhinus gonçalvesi nov. SP. (Triakidae, Carcha'rhiniformes) from the latest Miocene of Portugal. Tertiary Research, Leideni n.º 19;
o 3. A. C. B…… & H. C….. (2000) - Paragaleus antunesi (Hemigaleidae, Carcharhiniformes) a new shark species from the latest Miocene of Portugal. Tertiary ReSeprch, Leiden, n.º 20, pp. 1-6.

5. Como se disse, a prova desses factos – refere a Recorrente – decorre de os mesmos não terem sido contestados. Sucede que, no âmbito da ação administrativa especial, o artigo 83.º/4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (versão inicial) estabelece que «a falta de contestação ou a falta nela de impugnação especificada não importa confissão dos factos articulados pelo autor». Decaindo esse pressuposto, vale o disposto no artigo 640.º/1/b) do Código de Processo Civil, ou seja, a Recorrente deveria ter especificado os concretos meios probatórios que suportam o pretendido aditamento à matéria de facto. O que não fez, pelo que o recurso, nesta parte, é rejeitado.

6. Por último, defende a Recorrente que deve ainda ser aditado à matéria de facto provada o seguinte facto:

· No Relatório Final foi tomado em consideração o critério da continuidade no leccionamento da disciplina posta a concurso, sendo que tal elemento não constava do quadro de critérios definido anteriormente

7. Sucede que, como evidenciou a Recorrida, tal facto não foi alegado. Deste modo, não procede o pretendido aditamento.


Dos alegados erros de julgamento de direito

8. Por despacho de 30.3.2006 o Reitor da Recorrida (Universidade de Évora) decidiu nos seguintes termos:

«Deferido com base na informação jurídica, que se anexa. Notifique-se o membro do júri visado.
Convoque-se o júri sem o membro declarado impedido».

9. Sobre tal ato a Autora, agora Recorrente, formulou um juízo de ilegalidade, nomeadamente por via do vício de falta de fundamentação.

10. A sentença recorrida não acolheu tal entendimento, fundamentando a decisão de improcedência do seguinte modo:


«Ressalta da factualidade assente que o ato impugnado identificou os factos em que se alicerça e os critérios e normas em que a Entidade Demandada se fundou para decidir no sentido e no modo, em que o fez (de notar que a primeira informação jurídica – proposta do sentido de decisão do incidente de impedimento – remete já expressa e indistintamente para o art. 44º n.º 1 al. a) e para o art. 48º n.º 1 al. d) ambos do CPA e que a segunda informação jurídica sublinha tal circunstância), permitindo assim alcançar o inter-cognoscitivo adotado e quais as razões por que se decidiu como se decidiu: cfr. art. 124º e art. 125º do CPA; CPA anotado por Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco Amorim, 2º edição, Almedina e alínea A) a X) supra, sobretudo alínea G) e J) supra.
Ponto é que decorre dos factos assentes a inexistência de contradição nos fundamentos vertidos nos atos em crise, uma vez que se mostra identificado o interesse suscetível de colocar em causa a imparcialidade da (proposta) decisão administrativa (homologação) bem como a invocada intimidade entre a A. e o identificado membro do júri impedido: cfr. alínea A) a X) supra.
Dito de outro modo, o comprovado preexistente relacionamento profissional entre a A. e o identificado membro do júri impedido (que justificou a realização de, pelo menos, 18 publicações em conjunto em momento anterior ao da avaliação em procedimento concursal) consubstancia circunstância que podia ser entendida como interesse, em princípio de natureza moral, do membro do júri impedido em assim ver também reconhecido o (seu) trabalho anteriormente desenvolvido e, bem assim em circunstância reveladora de consonância (intimidade) entre ambos, não existindo pois contradição de termos, ou de fundamentos, mas sim diferentes qualificativos de uma mesma realidade, a qual, como bem sublinha a Contrainteressada, não tendo sido assim entendida e arguida pelo identificado júri como fundamento de impedimento se traduz ainda e também em fundamento de suspeição: cfr. EDCU, art. 2º n.º 5 a n.º 7; art. 5º; art. 6º; 44º a art. 51º, art. 124 e art. 125º todos do CPA (tempus regit actum) e alínea A) a X) supra.
Ademais, demonstram os autos que a A. bem compreendeu o sentido e o alcance do ato primeiramente sindicado e dos atos subsequentes, pois que, discordando dos mesmos, deles corretamente se defendeu, quer em sede graciosa, quer na presente sede judicial: cfr. alínea A) a X) supra.
Termos em que julgo improcedente o invocado vício».


11. É contra o assim decidido que a Recorrente se insurge, no que se julga assistir-lhe razão. De resto, é a própria sentença recorrida que indicia a existência de alguma patologia no ato de 30.3.2006, na medida em que alude a uma proposta de decisão do «incidente de impedimento» que remete «expressa e indistintamente» para o regime do impedimento e para o regime da suspeição. Ora, se o ato remete indistintamente para dois regimes diversos ficar-se-á por saber, afinal, qual o regime que se pretendeu aplicar. Aliás, é a confusão que se poderá identificar no ato de 30.3.2006 que justificará o facto de a sentença recorrida aludir a um «incidente de impedimento», que o Reitor da Universidade de Évora referiu, mas que a informação que o suportou tinha afastado, porque considerou que o que estava em causa era um incidente de suspeição [ali se disse que «a norma ínsita no n° 2 do art. 48° do CPA põe termo a qualquer dúvida sobre a tempestividade do incidente porquanto a suspeição (e no caso em apreço e em rigor o que se suscitou foi um incidente de suspeição, independentemente da qualificação que lhe foi sendo dada pelos diversos intervenientes) pode ser oposta por qualquer interessado até ser proferida decisão»] (destaque e sublinhado nossos).

12. Importa, no entanto, recuar ao documento que, por força das remissões efetuadas, corresponde ao início do bloco fundamentador do ato de 30.3.2006. Trata-se da informação de 6.12.2005, na qual se escreveu o seguinte:


«Notificadas as candidatas para efeitos de audiência prévia, veio a candidata Prof*. Dra. A……., discordar do projecto de decisão do júri no que toca à ordenação das candidatas, por quatro ordem de razões, concluindo que:

“ - O projecto decisório apresenta-se-nos como a antevisão de um acto que estará ferido por violação de lei, seja quanto aos pressupostos de Direito seja quanto aos pressupostos de facto, motivo pelo qual se impõe a sua reformulação;
- Sublinhando-se a situação de impedimento do Prof Cat. Doutor R……. que certamente por lapso ainda não foi deduzida pelo próprio, mas que não pode deixar agora de ser ponderada e decidida e nos termos do art. 47°/2, devendo o impedimento ser declarado pelo Senhor Presidente do Júri - o Magnífico Reitor da Universidade de Évora - e a decisão final do Júri ser proferida sem a participação deste senhor Professor Catedrático (evidentemente) impedido.
- Tão pouco nos parecendo que a presença do Exmo. Senhor Prof Cat. Doutor F……. deva ser admitida no processo decisório após a primeira falta, mas quanto a este último aspecto, não insistiremos contra os hábitos se a tanto nos não sentirmos forçados”.

No que concerne à composição do júri, sustenta a candidata Prof. Dra. A........ que o mesmo se apresenta irregularmente constituído pela inclusão de membro que deveria ter suscitado o seu impedimento nos termos do art. 44°, n° 1, al. a) e art. 45° do Código do Procedimento Administrativo.
Para tanto, alega esta candidata que a Sra. Prof. Dra. B……. apresenta curricularmente uma sequência de publicações nas quais se constata a respectiva co-autoria, em pelo menos 18 delas, com o membro do júri Sr. Prof. Dr. R........; que em, pelo menos sete projectos de investigação averbados no curriculum, aquele membro do júri surge como investigador principal.
Daí, conclui a interessada que “tal situação traduz-se portanto em radical incompatibilidade de exercício (...) porquanto ao examinar estes aspectos curriculares da candidata, o examinador aprecia materialmente o seu próprio trabalho seja em co-autoria, seja até no plano da direcção, orientação ou coordenação de equipa ».
A candidata fundamenta a sua motivação no disposto os arts. 44° e segs. do CPA.
Dispõe o n° 1 do art. 44° do CPA que
1 — Nenhum titular de órgão ou agente da Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo ou em acto ou contrato de direito público ou privado da Administração Pública nos seguintes casos:
a ) Quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa;
b) (…)
c) Quando, por si ou como representante de outra pessoa, tenha interesse em questão semelhante à que deva ser decidida, ou quando tal situação se verifique em relação a pessoa abrangida pela alínea anterior;
d) Quando tenha intervindo o procedimento como perito ou mandatário ou haja dado parecer sobre questão a resolver;
e) (...);
J) (...);
g) (…)

Por seu turno e com esta norma correlacionada o art. 48° do CPA dispõe que
1 — O titular de órgão ou agente deve pedir dispensa de intervir no procedimento quando ocorra circunstância pela qual possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção ou rectidão da sua conduta e, designadamente:
a)
b) (...);
c) (…)
d) Se houver inimizade grave ou grande intimidade entre o titular do órgão ou agente ou o seu cônjuge e a pessoa com interesse directo no procedimento, acto ou contrato.
2 — Com fundamento semelhante e até ser proferida decisão definitiva, p>ode qualquer interessado opor suspeição a titulares de órgãos ou agentes que intervenham no procedimento, acto ou contrato.

No processo concursal em causa verifica-se que o membro do júri Sr. Prof. Dr. R........ é co-autor de publicações ínsitas no curriculum de uma das candidatas e co-investigador em projectos de investigação também constantes do curriculum em apreciação.
Esta circunstância pode ser geradora, mesmo que inconscientemente, de um juízo parcial, uma vez que, como bem diz a candidata Prof. Dra. A........, ao apreciar o curriculum o examinador está, em certa medida, a apreciar o seu próprio trabalho ( de co-autoria ou co-investigação ).
Ora, as situações de impedimento expressamente previstas no artigo 44° do CPA são decorrência directa do princípio de imparcialidade, segundo o qual no exercício da sua actividade, a Administração Pública deve tratar de forma imparcial todos os que com eles entrem em relação - cfr. art. 6º do CPA.
E a própria lei - cfr. arts. 44° e 48° do CPA - fixa que a imparcialidade é posta em causa sempre que o titular de órgão ou agente da Administração se encontre numa das situações nela tipificadas.
Ora, é manifesto que o examinador tem « interesse » no procedimento, nos termos e pelas razões sobreditas: avalia um processo curricular na qual figura como co-autor e co-investigador.
Tal situação integra, a meu ver, a previsão das alíneas a) do n° 1 do art. 44° e al. d) do n° 1 do art. 48° do CPA, o que é causa de impedimento ou de escusa.
Os actos proferidos em procedimento nos quais participaram titulares impedidos são anuláveis - art. 51° do CPA.
Tal significa que o procedimento em causa, está ferido de ilegalidade desde a nomeação do membro do júri em causa.
Tendo sido deduzido pela Sra. Prof. A........ o incidente de impedimento, não pode o processo prosseguir sem que o mesmo seja decidido - al. 45° e 46° do CPA.
A entidade que nomeou o júri deve pronunciar-se sobre o incidente de impedimento, ouvindo para tanto o membro do júri visado, se considerar tal necessário - n° 3 do art. 45° do CPA - após o que decidirá.
Decidindo favoravelmente o incidente, deverá ser nomeado um membro do júri em substituição do membro declarado impedido, repetindo-se toda a fase de apreciação curricular.
A nomeação do novo elemento do júri, se tal for decidido na sequência do incidente de impedimento, deverá ter em conta a norma da alínea a) do n° 1 do art. 45° do ECDU.
Face ao exposto e porque me parece ser de atender o incidente de impedimento fica prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas pela candidata Prof Dra. A.........

EM CONCLUSÃO;
1ª - Deverá ser apreciado e decidido pela entidade que nomeou o júri, o incidente de impedimento suscitado pela candidata Prof. Dra. A.........
Para tanto, se o referido órgão tal considerar necessário, será ouvido o membro do júri visado - art. 45° do CPA.
2ª - Sendo decidido favoravelmente o incidente de impedimento deverá ser nomeado um membro do júri em substituição do declarado impedido - art. 47° do CPA.
3ª - A nomeação do novo membro do júri deverá ter em conta a norma da al. a) do n° 1 do art. 45° do ECDU, isto é, dele deverá fazer parte um professor catedrático afecto à Universidade de Évora.
4ª - Após o que o júri do concurso em causa deverá repetir todo o procedimento de avaliação das candidatas».

13. Ouvido o membro do júri em causa – Prof. Dr. R........ -, veio a ser elaborada nova informação, em 21.3.2006, subscrita pela autora da informação de 6.12.2005, na qual se fez constar o seguinte:


«A Sra. Prof. Dra. A..........., candidata ao concurso supra identificado veio, em sede de audiência prévia, suscitar o incidente de suspeição do membro do júri Prof. Dr. R............
Na sequência da minha anterior informação, de 06.12.2005, o Sr. Reitor, atento o disposto no art. 45° do CP A, entendeu ouvir o membro do júri visado, o qual, em súmula, veio responder alegando a intempestividade da arguição de suspeição, pela improcedência das razões de fundo que subjazem à referida arguição ( co-autoria do membro do júri e da candidata em diversos trabalhos científicos ), porquanto também outro membro do júri é co-autor de diversos trabalhos indicados no curriculum da candidata que deduz o incidente, concluindo que :

- “não tinha, nem tem qualquer interesse no resultado do concurso, pelo que nunca imaginou poder ser « acusado » de impedimento na intervenção do júri do concurso;
- daí que não tivesse tomado qualquer posição de recusa de participação no júri, assumindo a situação de impedido;
- assim, não estão preenchidos os requisitos definidos no art. 44º, nº 1 do CPA para que o signatário pudesse ou possa, ser declarado impedido como membro do júri do concurso inicialmente identificado;
- para além desta questão formal invocada pela reclamante, não há qualquer razão ou fundamento para alterar a posição do júri, nem consequentemente, o resultado do concurso”.


Face às questões solicitadas na resposta do visado com o incidente de impedimento entendeu o Sr. Reitor notificar as candidatas do teor do mesmo, convidando-as a, querendo pronunciar-se sobre aquele.
A candidata B........... veio suscitar a tempestividade da arguição do impedimento do membro do júri; tal como o Sr. Prof. R..........., suscita também a questão de no curriculum da Sra. Prof. A........ figurarem trabalhos em co-autoria com o membro do júri Prof. H.........; suscita ainda a circunstância de a lei não proibir que possam fazer parte do júri de concurso os professores catedráticos que tenham publicado trabalhos em co-autoria com os candidatos, concluindo pela improcedência do impedimento do membro do júri em causa e mantida como definitiva a deliberação do júri.
A Sra. Professora A........ pugna pelo deferimento do seu requerimento de arguição de suspeição.
Do acima brevemente exposto, há questões que importa apreciar:
- a tempestividade da arguição de suspeição;
- a não aplicação do art. 44° do CPA ao caso em apreço;
- a possibilidade legal de professores catedráticos co-autores com candidatos a professores catedráticos de trabalhos científicos serem membros dos júris dos respectivos concursos.

I - QUANTO À TEMPESTIVIDADE

(…)
No entanto, a norma ínsita no n° 2 do art. 48° do CPA põe termo a qualquer dúvida sobre a tempestividade do incidente porquanto a suspeição ( e no caso em apreço e em rigor o que se suscitou foi um incidente de suspeição, independentemente de qualificação que lhe foi sendo dada pelos diversos intervenientes ) pode ser oposta por qualquer interessado até ser proferida decisão
definitiva.
(…)
Assim, forçoso é concluir pela tempestividade do incidente deduzido pela Sra. Prof. A........ – n.º 2 do art. 48.º do CPA

II - QUANTO À NÃO APLICAÇÃO DO ART. 44º DO CPA
Na minha informação de 6 de Dezembro de 2005 já sustentei a aplicabilidade ao caso em apreço do art. 48° do CPA.
Reproduzo aqui àquela minha informação, sem necessidade de mais considerações.

III – QUANTO À POSSIBILIDADE DE OS CO-AUTORES FAZEREM PARTE DO JÚRI DE CONCURSO

Salvo o devido respeito, o que está em causa no presente procedimento não é a possibilidade de professores catedráticos co-autores de trabalhos com candidatos a concursos para professores catedráticos serem membros dos respectivos júris.
O que está em causa no presente procedimento é se dado membro do júri pode ou não sê-lo neste procedimento.
O que está em causa não é a qualidade, em abstracto de professor catedrático co-autor, mas a grande intimidade entre um membro do júri e um candidato, que leve a que possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção – cfr. N. 1 do art. 48º do CPA.

EM CONCLUSÃO:
Face ao exposto e sem necessidade de mais considerações, concluo como na minha informação de 06.12.05, com a indicação de não ser necessária a nomeação de novo membro do júri (caso seja decidido favoravelmente o incidente), uma vez que o júri em causa mantém o quórum».

14. Analisadas as duas informações – as quais, recorde-se, consubstanciam a fundamentação do despacho de 30.3.2006 – vemos que, na primeira, a sua autora considera que o que coloca em causa o princípio da imparcialidade é o facto de «o membro do júri Sr. Prof. Dr. R........ [ser] co-autor de publicações ínsitas no curriculum de uma das candidatas e co-investigador em projectos de investigação também constantes do curriculum em apreciação».

15. Por outro lado – e ainda no âmbito da primeira informação – fica claro que desse facto decorre a conclusão de que o membro do júri em causa ««tem “interesse” no procedimento». É o que expressamente foi escrito na referida informação, com natural alusão ao disposto no artigo 44.º/1/a) do Código do Procedimento Administrativo de 1991, nos termos do qual nenhum titular de órgão ou agente da Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo ou em ato ou contrato de direito público ou privado da Administração Pública «[q]uando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa».

16. Por outro lado, disse-se ainda que, sendo «manifesto que o examinador tem “interesse” no procedimento», pois «avalia um processo curricular na qual figura como co-autor e co-investigador», daí decorre que «[t]al situação integra, a meu ver, a previsão das alíneas a) do n° 1 do art. 44° e al. d) do n° 1 do art. 48° do CPA, o que é causa de impedimento ou de escusa».

17. Não se compreende a disjuntiva (impedimento ou escusa). Mas o problema nem é esse. O facto a evidenciar é a chamada à colação do disposto no artigo 48.º/1/d) do Código do Procedimento Administrativo de 1991, do qual decorre que o titular de órgão ou agente deve pedir dispensa de intervir no procedimento quando «houver inimizade grave ou grande intimidade entre o titular do órgão ou agente ou o seu cônjuge e a pessoa com interesse directo no procedimento, acto ou contrato».

18. Sabendo-se que o que estava em causa para a autora da informação era o alegado interesse no procedimento – e daí a invocação do artigo 44.º/1/a) -, e sendo evidentes as dificuldades que a mesma manifestou na articulação entre os regimes dos artigos 44.º e 48.º, poucas dúvidas existirão quanto à razão da invocação do artigo 48.º/1/d): é que nele também se alude a um interesse direto, ainda que numa perspetiva bem diversa, a qual – é convicção do tribunal – não foi tida em conta pela autora da informação. De resto, tem razão a Recorrente quando afirma que «[a] informação com base no qual foi praticado o ato do Magnífico Reitor, confunde sistematicamente situações de impedimento com situações de suspeição (…)».

19. Ora, a confusão manifestada na primeira informação (de 6.12.2005) é adensada na informação que se lhe seguiu (de 21.3.2006).

20. Na verdade, mantendo os mesmos factos, a autora da informação desloca o problema para o campo da suspeição, demarcando-se do impedimento, o qual, segundo agora vem afirmar, seria algo que resultava apenas da qualificação dada pelos intervenientes. O que é evidente não ser verdade, como resulta da leitura da informação de 6.12.2005. O que está em causa, sim, é uma óbvia e incoerente tentativa de alterar a abordagem inicial, confrontada que foi com as pronúncias do membro do júri visado e da Recorrente.

21. De resto, depois de afirmar que se tratava de uma situação de suspeição, não de impedimento, escreveu o seguinte:

«II - QUANTO À NÃO APLICAÇÃO DO ART. 44º DO CPA
Na minha informação de 6 de Dezembro de 2005 já sustentei a aplicabilidade ao caso em apreço do art. 48° do CPA.
Reproduzo aqui aquela minha informação, sem necessidade de mais considerações».

22. Assim sendo, o que sucedeu ao impedimento resultante do alegado interesse no procedimento a que se refere o artigo 44.º/1/a)? É que se reproduz «aquela minha informação» (de 6.12.2005), ele - interesse no procedimento - mantém-se.

23. E o que já era nebuloso tornou-se incompreensível com o seguinte texto:

«Salvo o devido respeito, o que está em causa no presente procedimento não é a possibilidade de professores catedráticos co-autores de trabalhos com candidatos a concursos para professores catedráticos serem membros dos respectivos júris.
O que está em causa no presente procedimento é se dado membro do júri pode ou não sê-lo neste procedimento.
O que está em causa não é a qualidade, em abstracto de professor catedrático co-autor, mas a grande intimidade entre um membro do júri e um candidato, que leve a que possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção – cfr. N. 1 do art. 48º do CPA».


24. Afinal o problema já não decorre da co-autoria? É da grande intimidade? Mas qual é o facto que a sustenta? Porque o que vinha referido na informação de 6.12.2005, e que se manteve, era apenas a co-autoria e a co-investigação, determinantes do interesse direto no procedimento. A grande intimidade não resulta da co-autoria, considerada em abstrato, mas sim em concreto? Então o que existe em concreto que tenha determinado tal conclusão? O que existe de concreto e de modo diverso na situação das duas candidatas e que permita compreender a solução dada pelo despacho de 30.3.2006?

25. Como resulta do disposto no artigo 125.º/2 do Código do Procedimento Administrativo de 1991, interpretado a contrario, a fundamentação terá de ser clara, coerente e completa. Por outro lado, de há muito vem sendo reconhecido, jurisprudencial e doutrinalmente, que a fundamentação é um conceito relativo, devendo concluir-se pela sua existência quando um destinatário normal, na suposta posição do interessado em concreto, atento o tipo legal do ato, os seus termos e as circunstâncias que rodearam a sua prolação, não tenha dúvidas acerca das razões que motivaram a decisão.

26. Pelos motivos acima indicados compreende-se que a Recorrente não tenha apreendido com clareza os efetivos motivos da decisão. Prova disso, aliás, é o facto de a causa de pedir da ação assentar na invocada ilegalidade por aplicação do regime dos impedimentos – artigo 44.º do Código do Procedimento Administrativo -, quando, aparentemente, a autora das informações que sustentaram o ato de 30.3.2006 quis deslocar o problema para o campo exclusivo da suspeição, embora o próprio Reitor da Universidade de Évora, autor do referido ato, possa não ter compreendido tal deslocação, na medida em que acaba por aludir ao membro do júri «declarado impedido».

27. Portanto, não se compreendendo os fundamentos da decisão, fica prejudicado o conhecimento dos alegados erros de julgamento relativamente ao «erro quanto à base legal sobre a qual a decisão foi tomada» e quanto à «violação dos princípios gerais da atuação administrativa».

28. Sendo inválido o ato de 30.3.2006 (anulável, nos termos do artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo de 1991), dir-se-ia que são nulos, por força do disposto no artigo 133.º/2/i), os atos de 30.4.2007 (que determinou o prosseguimento do concurso e a substituição de dois membros do júri, de acordo com a sua nova composição constante do Edital n.º 330/2007), de 29.1.2008 (que homologou o relatório final do júri) e de 7.2.2008 (Despacho Reitoral n.º 5015/2008, pelo qual a Contrainteressada foi nomeada professora catedrática, a título definitivo, do Quadro de Pessoal Docente da Universidade de Évora), na medida em que são consequentes do primeiro.

29. No entanto, não deve ser assim. Como refere Vieira de Andrade, Actos Consequentes e Execução de Sentença Anulatória, Revista Jurídica da Universidade Moderna, Ano I, n.º 1 (1998), pp. 29/46, «o conceito de acto consequente, para efeitos de invalidade, não pode continuar a ser construído em termos puramente lógicos, através de nexos de causalidade ou de consequencialidade fáctica, como qualquer “acto praticado ou dotado de certo conteúdo em virtude da prática de um acto administrativo anterior”. Actos “consequentemente inválidos”, ou seja, automaticamente inválidos (nulos ou, mais exactamente, anulados) “por causa da anulação do acto precedente” serão apenas aqueles actos cujos efeitos não possam manter-se sem ofensa do caso julgado ou desconformidade com a sentença, concretamente, aqueles cujos efeitos têm necessariamente de ser destruídos para que se possa reconstituir a situação hipotética actual, na medida em que seja imposta pela sentença anulatória, em função dos respectivos fundamentos».

30. Convocando esse autor, no trecho citado, o acórdão de 8.5.2003 do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 40821A, pronunciou-se nos seguintes termos:

«Com efeito, a nulidade de certos actos conexos com actos que vêm a ser contenciosamente anulados não é uma exigência do plano lógico, mas do plano prático-normativo. Os actos consequentes são válidos no momento em que são praticados e a sua nulidade (recte, a sua anulação automática consequencial, porque é disso e não duma radical improdutividade jurídica que verdadeiramente se trata) só surge quando e na medida em que a sua conservação se torne incompatível com a execução da sentença, o que, no caso de actos renováveis, significa com a produção dos efeitos da nova definição resultante do reexercício do poder administrativo.
A esta luz, finalisticamente reduzido o conceito de acto consequente em função da compatibilidade com o reexercício do poder administrativo, nada obsta a que a Administração, permitindo-lhe o fundamento da anulação judicial a renovação do acto, atribua ao novo acto efeitos retroactivos, com isso suprindo, num plano reconstrutivo formal, a falta de título legitimador das situações entretanto desenvolvidas ao abrigo do acto anulado e que o reexercício do poder demonstra que se teriam igualmente produzido se este acto não enfermasse do vício que determinou a sua anulação (Nem se objecte que o inciso “salvo tratando-se de actos renováveis” da última parte da al. b) do nº 1 do artº 128º do CPA, introduzido pelo DL 9/96, de 3 de Janeiro, o impede. Do preceito decorre, apenas, que, neste caso, o efeito retroactivo não é automático, ficando dependente da verificação dos pressupostos enunciados no nº 2 do mesmo artigo). Assim, na hipótese de actos renováveis, a eliminação ope jure dos actos consequentes é função dos termos do reexercício do poder administrativo. Terá uma extensão variável dentro do círculo dos actos logicamente consequentes, pelo que, em princípio, a extracção dessas consequências pela Administração deve ser posterior ao reexercício do poder administrativo, salvo na medida do necessário a esse próprio reexercício. É assim de um modo geral, sem prejuízo do que resultar especialmente da lei ou da própria sentença exequenda».

31. Nessa linha sumariou-se, precisamente, que «[a]ctos consequentemente inválidos por causa da anulação do acto precedente são apenas aqueles cujos efeitos não possam manter-se sem ofensa do caso julgado ou desconformidade com a sentença, concretamente, aqueles cujos efeitos têm necessariamente de ser destruídos para que se possa reconstituir a situação hipotética actual, na medida em que seja imposta pela sentença anulatória, em função dos respectivos fundamentos».

32. Esse entendimento veio a ser consolidado em diversos acórdãos, dos quais é exemplo o proferido em 16.6.2023 pelo Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 00158/22.8BEMDL, no qual se reafirmou que «os atos consequentes apenas devem ser atingidos na medida estritamente necessária para chegar à reconstrução da situação hipotética que existiria se não tivesse sido praticado o ato anulado» (à situação fática apreciada ainda se aplicava o Código do Procedimento Administrativo de 1991).

33. Debruçando-se sobre tal entendimento, Aroso de Almeida (Teoria geral do direito administrativo, 2018, p. 340) manifesta a opinião de que «a jurisprudência, de modo sensato, foi reconhecendo, por aplicação do princípio da proporcionalidade, que, na sequência da anulação de um ato administrativo, só se justificava que caíssem os atos dele consequentes cuja subsistência, no presente e para o futuro, se mostrasse incompatível com a reconstituição da situação que deveria existir se o ato anulado não tivesse sido praticado», in

34. O acerto dessa interpretação, doutrinal e jurisprudencial, justificou, de resto, a solução que veio a ser consagrada no artigo 161.º do Código do Procedimento Administrativo de 2015.

35. De qualquer modo, o que deve ser evidenciado, e pelas razões já anteriormente expostas, é o facto de o motivo justificativo da anulação do ato de 30.3.2006 não determinar a invalidade dos identificados atos consequentes.

36. Por último, importa ter presente que foi formulado um pedido condenatório, que se consubstancia em «[s]er homologada a decisão do júri do concurso e, consequentemente, ser a Autora provida no lugar a que concorreu». Nas alegações de recurso a Recorrente mantém o entendimento de que «deverão ser anulados os atos impugnados e deve o Réu ser condenado à prática do ato devido».

37. Ora, independentemente de quaisquer considerações sobre a natureza renovável do ato de 30.3.2006, sabe-se que a Recorrente se aposentou em 2013. Foi esse facto que levou o Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja a proferir sentença, em 19.6.2014, a julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, porquanto a então Autora, por se ter aposentado, não poderia ser provida como Professora Catedrática da Universidade de Évora, mesmo que tal fosse o resultado do procedimento concursal. A ora Recorrente reclamou para a Conferência e em 15.1.2015 o mesmo tribunal proferiu acórdão, com um voto de vencido, que decidiu desatender a reclamação e manter a sentença reclamada.

38. O Tribunal Central Administrativo Sul, por decisão sumária de 28.2.2019, confirmada pelo acórdão da conferência de 6.6.2019, veio a revogar tal acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, na medida em que considerou que «ainda que a reconstituição da situação se revele impossível, no caso, atenta a situação de aposentação, sempre a recorrente pode lançar mão da tutela indemnizatória, por eventual responsabilidade civil pelos danos ilícita e culposamente causados pela atuação ilegal da demandada, como por responsabilidade objetiva pelo ato ilegal, que existe automaticamente, sem haver que indagar da eventual existência de culpa na emissão desse ato e, portanto, na criação da situação lesiva». Ou seja, a «recorrente pode retirar benefícios do prosseguimento da lide, visto que, se esta lhe for favorável, poderá retirar consequências da eventual decisão anulatória, designadamente as de natureza indemnizatória». Por isso concluiu que «só se verifica a inutilidade superveniente da lide quando essa inutilidade for inutilidade jurídica. De outro modo, não se pode considerar atividade inútil o prosseguimento do processo quando ele se destine a expurgar da ordem jurídica um ato ilegal e a proporcionar a tutela efetiva dos direitos daqueles a quem o mesmo atinge».

39. E assim é, naturalmente. No entanto, e como decorre do referido acórdão, já não é possível a pretendida nomeação da Recorrente, na medida em que já se aposentou. Por esse motivo, e quanto ao pedido condenatório, ocorre uma situação de impossibilidade superveniente da lide, determinante da extinção da instância, nessa parte (artigo 277.º/e) do Código de Processo Civil).


V
Em face do exposto, acordam os Juízes da Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder parcial provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e:

a) Declarar extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide, quanto ao pedido de condenação da Recorrida a nomear a Recorrente como professora catedrática na disciplina de Paleontologia da Universidade de Évora;
b) Anular o ato de 30.3.2006;
c) Absolver a Recorrida dos pedidos de anulação dos atos de 30.4.2007, 29.1.2008 e 7.2.2008.

Custas pela Recorrente e pela Recorrida, em partes iguais (artigo 527.º/1 e 2 e 536.º/3 do Código de Processo Civil).

Lisboa, 27 de março de 2025.

Luís Borges Freitas (relator)
Ilda Côco
Rui Fernando Belfo Pereira