Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2191/21.8BELSB |
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Secção: | JUIZ PRESIDENTE |
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Data do Acordão: | 07/17/2025 |
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Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
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Descritores: | COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO TERRITÓRIO IMI SITUAÇÃO DOS BENS |
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Sumário: | Em sede de impugnação de liquidações de IMI, há que atentar na prevalência do critério especial da situação de bens, particularmente desenhado para os impostos sobre o património. |
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Votação: | DECISÃO SINGULAR |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Decisão
[art.º 105.º, n.º 4, do Código de Processo Civil (CPC)] I. Relatório A……….. P……….. – Empresa U……………….., Limitada (doravante Reclamante) veio reclamar, ao abrigo do art.º 105.º, n.º 4, do CPC, da decisão proferida no Tribunal Tributário de Lisboa (TTL), na qual aquele Tribunal se julgou territorialmente incompetente para o conhecimento da impugnação judicial cujo objeto é liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). Formulou as seguintes conclusões: “I) O despacho/sentença recorrido é desconforme com o direito positivo nesta matéria, é contrário aos princípios de atribuição de competências no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal e à jurisprudência do STA. II) O que está em causa nos presentes autos é uma questão processual, que é a de determinar qual o tribunal territor3ialmente competente para conhecer dos pedidos formulados na impugnação. III) O Tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação do disposto n.º 1 do artigo 136.º do CIMI e, consequentemente, errada aplicação do n.º 1 do artigo 12.º do CPPT, resultando violados. IV) Ao contrário do vertido na decisão recorrida, dos autos não consta nenhum documento que permita ao Mmo. Juiz a quo afirmar que o acto de liquidação do IMI sob impugnação foi praticado pelo serviço periférico local, o Serviço de Finanças de Sesimbra. V) E, por omissão, a decisão recorrida fez errada interpretação e aplicação no disposto conjugado nos artigos 113.º, n.º 1 do CIMI, 103.º, nºs 1 e 2, 12.º, n.º 2 do CPPT e 19.º, n.º 1, alínea b) da LGT. VI) A situação dos autos não se enquadra na previsão do n.º 1 do artigo 136.º do CIMI, mas na previsão do n.º 1 do artigo 113.º do CIMI, que expressamente regula e atribui a competência para a liquidação do imposto do IMI, aos Serviços Centrais da Direcção-Geral dos Impostos, os Serviços do IMI, criados para o efeito. VII) Está assim assente que a liquidação do imposto de IMI é da competência dos Serviços Centrais da Direcção-Geral dos Impostos, criados para o efeito, tendo a sua sede em Lisboa. VIII) Mesmo que não estivesse expressamente fixado na lei qual a entidade que tem legitimidade para praticar o acto tributário da liquidação do imposto de IMI, em direito processual tributário, estão previstos elementos suficientes para a sua determinação e, como eles, a atribuição da competência territorial dos tribunais tributários. IX) Deparando-se o tribunal a quo com uma questão processual, é primeiramente nos normativos processuais que o julgador deve iniciar a análise da questão e da verificação se o legislador previu e fixou normativo específico que resolva a situação. X) Nestes autos, efectivamente, existem normativos processuais que resolvem expressamente a questão com que o tribunal a quo se deparaou, i.é, da determinação do tribunal territorialmente competente para decidir a presente impugnação. XI) Estabelece a conjugação do disposto nos n.°s 1 e 2 do artigo 103.º do CPPT que a petição de impugnação judicial é apresentada no tribunal tributário competente ou no serviço periférico local onde haja sido ou deva legalmente considerar-se praticado o acto, sendo que os actos tributários se consideram sempre praticados na área do domicílio ou sede do contribuinte, da situação dos bens ou da liquidação. XII) Resulta ainda do n.º 2 do artigo 12.° do CPPT que, no caso de actos tributários ou em matéria tributária praticados por outros serviços da administração tributária, julgará em 1ª instância o tribunal da área do domicílio ou sede do contribuinte, da situação dos bens ou da transmissão. XIII) Pelo que são estes os normativos aplicáveis aos presentes autos, devendo o Mmo. Juiz a quo ter feito aplicação dos mesmos e declarado competente, em razão do território, o tribunal tributário da área da sede da ora Recorrente, o que de acordo com o mapa Anexo ao Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de Dezembro, é o Tribunal Tributário de Lisboa. XIV) Ao não aplicar o previsto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 103.º e n.º 1 do artigo 12.º do CPPT, resultaram os mesmos violados. XV) Neste mesmo sentido decidiu-se nos acórdãos, do STA proferidos em 24 de Setembro de 2008 no processo n.º 068/08 e em 12.11.2014 no processo 0611/14, no Acórdão do Tribunal Administrativo Central Norte de 23.11.2006 no processo 00236-A/02-Coimbra e no acórdão do Tribunal Administrativo Central Sul de 28.2.2019 no processo 585/07.0BLSB, todos disponíveis em: https://www.dgsi.pt. XVI) Portanto, e ao contrário do decidido pelo tribunal a quo, os Serviços Centrais da Direcção-Geral da TA, na situação em apreciação, os Serviços do IMI, não são órgãos periféricos locais, pelo que não tem aplicação o disposto no n.º 1 do artigo 136.º do CIMI, nem o n.º 1 do artigo 12.º do CPPT. XVII) A decisão recorrida é ainda desconforme com o acórdão do STA proferido em 12 de Fevereiro de 2003 no Processo n.º 01782/02 e o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido em 20.06.20, processo 2748/99, também disponíveis em: https://www.dgsi.pt. XVIII) Assim, nos termos conjugados dos artigos 103.º, n.ºs 1 e 2, 12.º, n.º 2 do CPPT e n.º 1 do 113.º do CIMI, é manifesto que o tribunal competente é o tribunal da área do domicílio ou sede do contribuinte, ou seja, o domicílio fiscal do sujeito passivo. XIX) De acordo com a alínea b) do n.º 1, do artigo 19.º da LGT, o domicílio fiscal do sujeito passivo é, para as pessoas colectivas, o local da sede ou direcção efectiva ou, na falta destas, do seu estabelecimento estável em Portugal. XX) A Recorrente tem a sua sede em Lisboa, na Avenida dos Estados Unidos da América, freguesia de Alvalade, Concelho de Lisboa. XXI) Pelo que, tendo presente o previsto nos artigos 103.º, n.ºs 1 e 2, 12.º, n.º 2 do CPPT, n.º 1 do artigo 113.º do CIMI e alínea b) do n.º 1 do artigo 19.º da LGT, o tribunal competente, em razão do território, para conhecer dos pedidos formulados na presente acção é o Tribunal Tributário de Lisboa (mapa Anexo ao Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de Dezembro). XXII) Perante este enquadramento legal e jurisprudencial, andou mal o Mmo. Juíz a quo tendo o despacho/sentença recorrido violado o disposto nos artigos 103.º, n.ºs 1 e 2, 12.º, n.º 2 do CPPT, n.º 1 do 113.º do CIMI e alínea b) do n.º 1 do artigo 19.º da LGT. XXIII) Face ao exposto e de acordo com a melhor jurisprudência, é errada a interpretação e aplicação feita pelo Mmo. Juíz a quo do disposto nos artigos 12.º, n.º 1 e 136.º, nº 1 do CIMI, resultando violados. XXIV) O n.º 1 deste artigo 136.º do CIMI tem aplicação, isso sim, a outros actos e situações tributárias contidos naquele diploma, estabelecendo uma hierarquia entre os vários serviços periféricos locais da administração tributária (incluindo serviços de finanças), local onde o contribuinte se tem de dirigir para o exercício dos direitos e cumprimento obrigações de vários actos regulados naquele Código. XXV) Daqui resulta que está afastada a interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 136.º do CIMI, no sentido explanado na de decisão recorrido, ou seja, que o(s) acto(s) de liquidação do imposto de IMI se considera(m) praticado(s) nos serviços de finanças da área da situação dos prédios e se aplique o n.º 1 do artigo 12.º do CPPT. XXVI) Todavia, ainda que se colocasse esta hipótese, da aplicação deste n.º 1 do artigo 136.º do CIMI, como o fez a decisão recorrida, sempre esta seria afastada pela aplicação do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 103.º do CPPT que, em direito processual, e para determinação do tribunal competente, onde deve ser apresentada a petição de impugnação, estabelece que os actos tributários consideram-se sempre praticados na área do domicílio ou sede do contribuinte, no lugar dos bens ou da liquidação. XXVII) Portanto, o disposto conjugado nos n.ºs 1 e 2 do artigo 103.º do CPPT, afastaria, sempre, a aplicação do n.º 1 do artigo 136.º do CIMI e, nesta acção, continuaria a ser competente, em razão do território, o Tribunal Tributário de Lisboa por ser o tribunal da área da sede do contribuinte. Termos em que deve V.Exa. conceder provimento à reclamação e revogar o despacho/sentença recorrido substituindo-o por outro que declare que, para conhecer da presente acção, é competente, em razão do território, o Tribunal Tributário de Lisboa, Assim sendo feita a Boa e Costumada Justiça!”.
É a seguinte a questão a decidir: a) Qual o tribunal territorialmente competente para a instrução e conhecimento da presente ação?
II. Fundamentação II.A. Para a apreciação da presente reclamação, está provado o seguinte: 1) Foi apresentada, a 09.11.2021, impugnação judicial, pela Reclamante, junto do TTL, na qual foi formulado o seguinte pedido: “ Texto no original ” (cfr. documento com o n.º de registo neste TCAS 005708740). 2) A liquidação a que se refere a petição inicial mencionada em 1) respeita aos seguintes prédios: “Quadros no original” (cfr. documento com o n.º de registo neste TCAS 005708763). * II.B. Apreciando. Considera a Reclamante, em síntese, que o TTL é o competente para apreciar a impugnação em causa, porquanto tal é a solução que decorre do disposto no art.º 12.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Assim, entende que não decorre dos autos que a liquidação de IMI tenha sido praticada pelo Serviço de Finanças da Sesimbra, pelo que houve uma errada aplicação do art.º 12.º, n.º 1, do CPPT, dado que o caso dos autos se enquadra não no âmbito do art.º 136.º, n.º 1, do Código do IMI (CIMI), mas no do art.º 113.º, n.º 1, do mesmo código. Como tal, prossegue, a liquidação é da competência dos serviços centrais. Do art.º 12.º, n.º 2, do CPPT decorre, pois, ser competente o tribunal tributário da sede da Reclamante, concretamente o TTL. Vejamos, então. A competência do tribunal, em qualquer das suas espécies, deve ser aferida pelo tipo de pretensão deduzida pelo autor (pedido) e pelas normas que a disciplinam (fundamentos jurídicos). Nos termos do art.º 12.º do CPPT: “1 - Os processos da competência dos tribunais tributários são julgados em 1.ª instância pelo tribunal da área do serviço periférico local onde se praticou o ato objeto da impugnação ou no caso da execução fiscal, no tribunal da área do domicílio ou sede do executado. 2 - No caso de atos tributários ou em matéria tributária praticados por outros serviços da administração tributária, julgará em 1.ª instância o tribunal da área do domicílio ou sede do contribuinte, da situação dos bens ou da transmissão”. In casu, estamos perante impugnação cujo objeto é uma liquidação de IMI, atinente a prédios situados em Sesimbra. Nos termos do art.º 113.º do CIMI: “1 - O imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita”. Por seu turno, o art.º 136.º do CIMI dispõe que: “1 - Os atos tributários consideram-se praticados nos serviços de finanças da área da situação dos prédios”. Ou seja, o legislador definiu que, ainda que as liquidações sejam emitidas centralmente, se consideram praticadas no serviço periférico local da área da situação dos bens. É certo que tudo nos autos faz concluir que a liquidação em causa foi emitida pelos serviços centrais, nos termos do disposto no art.º 113.º, n.º 1, do CIMI. Mas é igualmente certo que o art.º 136.º do mesmo código prevê que os “atos tributários consideram-se praticados nos serviços de finanças da área da situação dos prédios” e que o art.º 103.º, n.º 2, do CPPT (que ainda prevê a possibilidade de a impugnação ser apresentada junto do serviço periférico local onde deva legalmente considerar-se praticado o ato) aponta, em termos de competência do tribunal em razão do território, para a solução da área da situação dos prédios, em casos como o dos autos, face à leitura conjunta de todo o complexo normativo aplicável. Ao contrário do que defende a Reclamante, não existe qualquer fundamento para afastar a aplicação do mencionado art.º 136.º do CIMI. No entanto, acrescente-se, por aplicação do n.º 2 do art.º 12.º do CPPT, o resultado sempre seria no sentido do decidido pela instância. Concretizando. Seguindo o sentido defendido pelo Tribunal a quo, por aplicação do n.º 1 do art.º 12.º do CPPT é competente o Tribunal Tributário de Almada [a funcionar agregado com o Tribunal Administrativo de Círculo de Almada, sob a designação unitária Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (TAF de Almada), nomenclatura que adotaremos de ora em diante], dado o Serviço de Finanças de Sesimbra se situar na sua área geográfica. No entanto, igual solução decorre do n.º 2 do art.º 12.º do CPPT, uma vez que há que atentar ao critério da situação dos bens (in casu, Sesimbra), critério especial que prevalece face aos gerais – interpretação que se revela a mais consentânea com a teleologia da norma e a coerência do sistema. Como referem Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão (Código de Processo Tributário Comentado e Anotado, 3.ª Ed., Almedina, Coimbra, 1997, p. 77), não se pretende aqui a existência de uma escolha discricionária. Logo, há que atentar na prevalência do critério especial da situação de bens, particularmente desenhado para os impostos sobre o património. Assim, da leitura conjunta do art.º 12.º do CPPT com o mapa anexo ao DL n.º 325/2003, de 29 de dezembro, é competente em primeira instância para conhecimento dos presentes autos o TAF de Almada (cfr. art.º 3.º, n.ºs 1 e 3, do DL n.º 325/2003). Como tal, concorda-se com a decisão da instância, não assistindo razão à Reclamante.
É responsável pela custas a Reclamante (art.º 527.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.
III. Decisão Face ao exposto: a) Indefere-se a reclamação apresentada; b) Custas pela Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 1/2 (meia) UC, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário; c) Registe e notifique; d) Baixem os autos. Lisboa, d.s. A Juíza Desembargadora Presidente, |