Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2385/09.4BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 07/15/2025 |
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Relator: | ISABEL SILVA |
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Descritores: | INVERSÃO DO SUJEITO PASSIVO (REVERSE CHARGE) SERVIÇOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL DESCRITIVO DAS FATURAS VALORAÇÃO DE DOCUMENTOS |
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Sumário: | I- Impugnar a decisão de facto significa refutar as premissas e os motivos que lhe subjazem, contrapondo-lhe um pensamento racional alternativo, que não dispensa a justificação das afirmações e a expressão de argumentos tendentes a demonstrar a bondade dos motivos apresentados como sendo “bons motivos”, não bastando referir que se provou o inverso do vertido na decisão de facto, sem nada consubstanciar e corporizar, pois não é essa a matriz da lei processual (artigo 640º e 607º do CPC). II-No mecanismo da inversão de sujeito passivo (Reverse Charge), em operações relacionadas com o fornecimento de serviços de construção civil, implica que, o destinatário/adquirente daqueles serviços seja o sujeito passivo do imposto, passando a liquidar o mesmo (artigo 2º nº 1 al. j) do CIVA), o que constitui uma exceção ao regime regra que consta do artigo 2º nº 1 al. a) do CIVA (e artigo 193º da Diretiva IVA -Diretiva 2006/112/CE, de 28 de novembro de 2006), segundo o qual, o imposto é devido pelos sujeitos passivos que efetuem transmissões de bens ou prestações de serviços tributáveis. III-Para operar este mecanismo de reverse charge é necessária a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: (i) Que se esteja perante a aquisição de serviços de construção civil; (ii) O adquirente seja sujeito passivo do IVA em Portugal e aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA. IV-Nas situações de reverse charge, na fatura emitida pelo fornecedor dos bens e/ou prestador dos serviços, além da indicação da natureza dos serviços de construção civil, que não tem de ser exaustiva (artigo 36º do CIVA e artigo 226º nº6 da DIVA), deve constar a expressão “IVA devido pelo adquirente” (artigo 36º nº 13 do CIVA). V-Por via deste mecanismo, o adquirente pode, em simultâneo, liquidar e deduzir o IVA, materializando-se numa operação neutra, na medida em que, por princípio, o valor que liquida e deduz é igual. VI-Assim, sempre que determinada operação económica reúna as condições estipuladas no artigo 2º nº 1 al. j) do CIVA, ocorrendo a referida inversão do sujeito passivo, caberá ao adquirente dos serviços, a liquidação e entrega do imposto que se mostre devido (sem prejuízo do seu direito à dedução, nos termos gerais do CIVA, designadamente nos termos dos artigos 19.º a 26.º). VII-Configuram operações económicas distintas, o mero aluguer de um camião com condutor, e o aluguer de máquinas para construção com manobrador para exercer trabalhos de construção civil, como movimentação de terras para preparar a construção, etc, estando, apenas a segunda, em condições de levar à inversão do sujeito passivo. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | * Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subseção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:I - RELATÓRIO T ……………..A………… R…………, LDA, vem apelar para este Tribunal Central Administrativa da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa em 23.09.2015, que julgou improcedente a impugnação judicial que deduziu na sequência da decisão de indeferimento expresso da reclamação graciosa que apresentara contra as liquidações adicionais de IVA, com os nº ………..915 e ………..913 e de juros compensatórios nºs ………….914 e ………..916, relativas ao 1º e 2º trimestre do ano de 2008, no montante total de € 7.510,59. “A) A aqui recorrente no âmbito do processo construtivo de obra de construção civil celebrou com “ M………….-M...................... Serviços de logísticas, ACE” e “ Transportes R…………… S….., Lda”, com os NIPCS …………… e ………., respectivamente, um contrato com vista a diversas movimentações de terra visando preparar o terreno para construção; B ) tais serviços enquadram-se, inequivocamente: - na alínea j) do n.°1 do art.° 2.° do CIVA (com as alterações introduzidas pelo DL 21/2007, de 29/01, bem como - no Anexo I do Ofício- Circulado n.° 30101/2007 de 24 de Maio da Direcção de Serviços do IVA — na lista exemplificativa de serviços aos quais se aplica a regra da inversão; C) Para o efeito a ora Recorrente, no âmbito da sua actividade de aluguer de máquinas para a construção civil, demolições, terraplanagens, aterros e desaterros, utilizou várias máquinas e equipamentos que incluíram o trabalho do respectivo operador; D) Pelo que, não estamos perante um acto isolado como a Administração Fiscal pretende imputar à aqui recorrente, mas sim perante serviços enquadrados no âmbito de um processo construtivo onde foram intervenientes os equipamentos e o respectivo operador e não de um mero transporte de terras, excepção essa contida em nota 7 de rodapé no Anexo II; E) Estando cumpridos todos os requisitos legais da regra da inversão do sujeito passivo. F) Entende também, que o tribunal a quo, não valou a prova feita, inequivocamente, pelo teor dos documentos juntos a fls. 56 a 65 de que o imposto foi pago pelo adquirente dos serviços como consta das facturas e como sempre se alegou. G) Entende, ainda, a recorrente, que foi feita prova de que o imposto, já foi entregue nos cofres do Estado pelas M………….-M...................... Serviços de logísticas, A……..” e “ T………………… R ………….., Lda”, com os NIPCS ………….. e ……..; H) E, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo, pelo que, tem o direito a ser indemnizada pelos prejuízos resultante da prestação de garantia indevida. Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, com as legais consequências com o que se fará como sempre a costumada Justiça! “ * Notificada, a Recorrida não apresentou contra-alegações. * Os autos tiveram vista do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, nos termos do artigo 288.º, n.º 1 do CPPT, o qual no parecer que emitiu concluiu no sentido de ser negado provimento ao recurso. * Colhidos os vistos legais, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, vem o processo à Conferência para julgamento. * Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT]. Nesta conformidade, cabe a este Tribunal analisar e decidir se a decisão recorrida padece dos erros de julgamento que lhe vão assacados, nomeadamente quanto: (i)- à valoração da prova; (ii)- na aplicação e interpretação dos artigos 2º nº 1 al. j) e 35º nº 13 do CIVA, assim como dos artigos 342º e 329º do CC; (iii)- e, ao não atribuir uma indemnização pela prestação de garantia devida, tendo em conta que o imposto havia sido pago pelos adquirentes dos serviços e que existe erro imputável aos serviços. * III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:* A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade: 1. A Impugnante tem como objeto social a atividade de transportes rodoviários de mercadorias, o aluguer de máquinas para a construção civil, demolições, terraplanagens, aterros e desaterros - cfr. fls. 21 a 23 dos presentes autos;
2. No âmbito da Ordem de Serviço n° 01200806296, de 12/12/2008, foi realizada, à impugnante, ação de inspeção aos períodos 08.03T e 08.06T de IVA - cfr. fls. 22 a 30 do processo administrativo em apenso aos autos;
3. Dessa ação inspetiva resultaram as correções aos períodos 08.03T e 08.06T, com fundamento em IVA não liquidado, que resumidamente enunciamos: "Com o aditamento da al. j) do nº1 do art. 2° do CIVA, com a entrada em vigor a 2007/04/01, transfere-se para o adquirente a obrigação da liquidação do imposto relativa prestação de serviços ou transmissões de bens com instalação, construção civil, dado que passa a ser este o sujeito passivo da relação comercial. (..) verifica - se que os serviços constantes do anexo II, ali mencionado, quando efetuados isoladamente, não configura um serviço de construção civil, pelo que não se lhe aplica a regra da inversão. A partir da entrada em vigor da regra atras referida e com base nas facturas que nos foram remetidas pelo sujeito passivo, emitidas para clientes nacionais, verifica-se que o serviço prestado foi o de “camiões alugados com condutor", para o qual foi utilizada a regra da inversão, contendo ainda as facturas nestas circunstâncias, conforme o disposto no n° 13 do art. 35° do CIVA, a expressão “IVA devido pelo adquirente" De acordo com o atrás exposto (..) aos serviços assim faturados pelo sujeito passivo não se lhe aplica a regra da inversão, sendo sua a obrigação de proceder à liquidação do imposto devido" - cfr. fls. 22 a 30 do processo administrativo em apenso aos autos;
4. As correções efetuadas pelos serviços inspetivos da A.T. tiveram por base as seguintes facturas e valores:
« Quadro no original»
5. As faturas referidas no quadro supra, e relativas aos períodos 08.03T e 08.06T, contêm na respetiva designação "Camião alugado com condutor" - cfr. fls. 60 a 64 dos presentes autos;
6. Em 28/03/2009, os Serviços de Administração do IVA emitiram as liquidações adicionais de imposto (IVA e juros compensatórios) dos períodos 08.03T e 08.06T, liquidações n°s. ………..913, ………….915, ………..914 e ……….916, no valor total de € 7.510,59 - cfr. fls. 38 a 42 do processo administrativo em apenso aos autos;
7. As liquidações impugnadas deram origem ao processo de execução fiscal n° ………….955 - cfr. 43 do processo administrativo em apenso aos autos;
8. Em 22/07/2009, no âmbito do processo de execução fiscal, a impugnante prestou garantia n° 59/2009, sendo que nessa data o processo de execução fiscal foi suspenso - cfr. fls. 43 do processo administrativo em apenso aos autos e fls 82 dos autos;
9. A, ora, impugnante deduziu, então, reclamação graciosa em que solicitava a anulação das liquidações adicionais de IVA dos períodos 08.03T e 08.06T, liquidações n°s. ………..913, ………..915, ………914 e ……….916, tendo a mesma sido indeferida por despacho de 13/11/2009 - cfr. fls. 44 do processo de reclamação em anexo aos autos.”
A decisão recorrida consignou ainda, quanto aos factos considerados não provados, o seguinte: “Não se provou que os adquirentes das faturas emitidas pela impugnante com n°s 80, 81, 82, do 1° trimestre de 2008 e, n°s 86, 87 e 88, do 2° trimestre de 2008, tenham liquidado o IVA correspondente e o tenham entregado nos Cofres do Estado. Não existem outros factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.”
O Tribunal recorrido motivou, do modo seguinte, a factualidade apurada: “A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos não impugnados, juntos aos autos e expressamente referidos no probatório supra.”. * IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO: Tal como avançamos, a este Tribunal cabe analisar e decidir se a decisão recorrida padece dos vícios que lhe vão apontados e que se prendem, primeiramente, com erro de julgamento quanto à valoração da prova, mais precisamente os docs. 56 a 65 juntos aos autos que, no entender da recorrente comprovam que o imposto foi pago pelo adquirente. Antes de enfrentar esta questão, importa dar conta que nos presentes autos estão em causa liquidações de IVA de 2008 e respetivos juros compensatórios, liquidados adicionalmente pela Administração Tributária (AT), na sequência de um procedimento inspetivo onde a AT concluiu que a recorrente não liquidou IVA e que o deveria ter feito, uma vez que, os serviços que prestou respeitam a aluguer de viaturas com condutor, não se tratando de situação em que haja inversão do sujeito passivo (Reverse Charge), nos termos do artigo 2º nº 1 al. j) do CIVA. O Tribunal recorrido, depois de questionada a legalidade das liquidações pela recorrente, entendeu que as mesmas eram legais e que deveriam manter-se na ordem jurídica. Para o Tribunal a quo, tendo em conta a atividade da impugnante e o descritivo das faturas do 1º e 2º trimestre de 2008 (faturas nºs 80, 81, 82, 86,87 e 88, constantes do probatório) onde consta “camião alugado com condutor”, não se poderia concluir que tivesse aplicação a inversão do sujeito passivo -reverse charge- a que alude a alínea j) do nºs 1 do artigo 2º do CIVA, secundando o entendimento da AT. No entendimento do Tribunal recorrido, também não estava demonstrado o pagamento do imposto pelo sujeito a quem foram prestados os serviços vertidos nas faturas em causa nos autos, sobre as quais incidiu o IVA adicional e respetivos juros compensatórios. - Começa a recorrente a pôr em causa a própria valoração da prova feita pelo Tribunal, nomeadamente as faturas que juntou aos autos. A recorrente não questiona a factualidade considerada provada ou não provada, nem apresenta qualquer redação alternativa aos vários pontos do probatório e respetivos meios de prova donde se retiraria a factualidade pretendida. O inconformismo da recorrente repousa, como se disse, na valoração feita pelo Tribunal quanto à prova, mais precisamente quanto aos elementos probatórios que juntou, sem especificar onde errou o Tribunal nessa valoração, porque deveria ter entendido ou motivado de modo diverso. Na verdade, lendo as alegações e conclusões de recurso, decorre dos pontos G) e H) que a recorrente discorda do modo como o Tribunal recorrido valorou “inequivocamente” os documentos juntos a fls. 56 a 65, de que o imposto foi pago pelo adquirente dos serviços como consta das facturas e como sempre se alegou (Cf. conclusão G) das alegações de recurso). Prossegue, salientando, na conclusão G) que, no seu entender, foi feita prova de que o imposto, já foi entregue nos cofres do Estado pelas “M……….-M...................... Serviços de logísticas, ACE” e “T…………… R………. S…….., Lda”, com os NIPCS ………….926 e ………….845. Ora, não obstante o pouco rigor no erro de julgamento, sindicando a valoração de documentos de prova, tendo em conta que o Tribunal a quo considerou que: “Não se provou que os adquirentes das faturas emitidas pela impugnante com n°s 80, 81, 82, do 1° trimestre de 2008 e, n°s 86, 87 e 88, do 2° trimestre de 2008, tenham liquidado o IVA correspondente e o tenham entregado nos Cofres do Estado”, podemos depreender que o ataque que a recorrente pretendia desferir ao ajuizado, se prende com o facto do Tribunal ter dado como não provado esta factualidade (liquidação e entrega do IVA pelos adquirentes dos serviços indicados nas faturas em crise), fazendo errada apreciação dos documentos que no seu entender ditariam o inverso, mas sem indicar e concretizar essa conclusão, bastando-se em referir que o Tribunal valorou inequivocamente os documentos, sem especificar onde errou no ajuizado e as razões que mereceriam uma valoração diversa, concluindo que foi feita prova da liquidação do imposto pelas adquirentes sem qualquer suporte ou razão que, em seu entender, ditariam essa conclusão. A verdade é que, sempre caberia à recorrente indicar quais as razões da sua discórdia no assim considerado não provado, alocando e indicando os elementos probatórios e ilações que autorizariam, em seu entender, dar como provado essa liquidação e pagamento, especificando, nomeada e concretamente, onde errou no seu ajuizado face aos documentos, indicando, nomeadamente, outros meios probatórios que impusessem uma decisão contrária, tendo em conta o ónus que é ditado pelo artigo 640º do CPC. Não basta afirmar que se provou o inverso, sem mais, e que se discorda, também, “sem mais” da valoração feita pelo Tribunal recorrido, para que se reveja a factualidade, negativa e positivamente, vertida no probatório. Impugnar a decisão de facto significa refutar as premissas e os motivos que lhe subjazem, contrapondo-lhe um pensamento racional alternativo, que não dispensa a justificação das afirmações e a expressão de argumentos tendentes a demonstrar a bondade dos motivos apresentados como sendo “bons motivos”, não bastando referir que se provou o inverso do vertido na decisão de facto, sem nada consubstanciar e corporizar, pois não é essa a matriz da lei processual (artigo 640º e 607º do CPC). A nossa lei processual determina e faz impender sobre o julgador um ónus de objetivação da sua convicção, através da exigência da fundamentação da matéria de facto (da factualidade provada e da não provada), devendo analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção. E isto porque, nessa tarefa, o ajuizado pelo julgador não é arbitrário, nem de simples intuição sobre veracidade ou não de uma certa realidade de facto. Pelo contrário, trata-se de uma convicção adquirida por intermédio dum processo racional, objetivado, alicerçado na análise crítica comparativa dos diversos dados recolhidos nos autos na, e com, a produção das provas e na ponderação e maturação dos fundamentos e motivações, devendo aquela convicção ser explicitada por expressa imposição legal como garante da transparência, da imparcialidade e da inerente assunção da responsabilidade por parte do julgador, que administra a justiça em nome do povo. Por ser assim, tal como se disse no acórdão do TCAN de 30.09.2015, tirado do processo 00196/09.6BEAV, diremos nós também que: “Se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção”. Como doutrinado por M. Teixeira de Sousa: “(…) o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente …” (in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, pág. 348). A esta luz, para que possa ser atendida nesta sede a divergência quanto ao decidido em 1.ª instância no julgamento de facto, deverá ficar demonstrado, como avançamos já, pelos meios de prova indicados pela recorrente, a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, exigindo-se, contudo e para tanto, que tais elementos de prova sejam inequívocos quanto ao sentido pretendido por quem recorre, ou seja, neste domínio, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, o que significa que o recorrente tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida. Feitos estes considerandos e tendo em conta o avançado, teremos de concluir que o apontado erro de julgamento de facto e/ou na valoração dos documentos, terá de naufragar. “(…) Defende a impugnante que forneceu serviços de construção civil e, por isso, cabia ao adquirente a liquidação e entrega do imposto que se mostrasse devido. Por seu turno, a Fazenda Pública considera que mesmo que houvesse uma prestação de serviços de construção civil por parte da impugnante, ainda assim, a regra da reversão não se aplicaria na medida que sendo tais serviços efetuados isoladamente, não configurariam um serviço de construção civil e, sempre não se aplicaria a regra da inversão em sede de IVA. Apreciando. De acordo com o art. 2°, n° 1 al. j) CIVA, são sujeitos passivos do imposto: as pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada. (sublinhado nosso) De acordo com a lei citada, para que haja inversão de sujeito passivo, é necessário que, cumulativamente: i) Se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil; ii) o adquirente seja sujeito passivo do IVA em Portugal e; iii) aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA. Resulta dos autos que as faturas emitidas pela impugnante são referentes a "Camião alugado com condutor"(ponto 5 do probatório). E, decorre do probatório que o objeto social da impugnante se reporta à atividade de transportes rodoviários de mercadorias, o aluguer de máquinas para a construção civil, demolições, terraplanagens, aterros e desaterros (ponto 1 probatório). Ora, limitando-se as facturas suj judicie à enunciação do simples aluguer de camiões com condutor, aliado ao facto de o objeto da impugnante revestir essencialmente a atividade de transportes rodoviários e respetivo aluguer, o que significa que a mesma não se dedica exclusivamente à prestação de trabalhos de construção civil, não podemos concluir, dessas facturas, estarmos na presença de aquisições de serviços de construção civil, em conformidade com o disposto no art. 2°, n° 1 al. j) CIVA. Nestes termos, a factualidade exposta não pode subsumir-se à lei que a impugnante invoca, pelo que deveria ter liquidado IVA nas operações que titulam as facturas. Argumenta, ainda, a impugnante não ser lícito que a A.T. lhe esteja a exigir o pagamento do IVA quando o mesmo já foi entregue nos Cofres do Estado pela empresa adquirente dos serviços titulados pelas faturas dos autos. Não tem razão a impugnante. Cabe referir que esta argumentação apenas seria passível de apreciação em sede impugnatória se, de alguma forma, revestisse fundamento legal da ação, atento o disposto no art. 99° CPPT. Com efeito, em sede de duplicação de coleta sempre a pretensão da impugnante soçobraria face aos requisitos impostos pelo art. 205° do CPPT. O art° 205°, n° 1 do CPPT estabelece o seguinte: "1. Haverá duplicação de coleta para efeitos do artigo anterior quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo". Temos então que constituem requisitos da duplicação de coleta: a) que esteja pago um tributo; b) que se exija da mesma ou de diferente pessoa um outro tributo de igual natureza; c) que tal tributo se refira ao mesmo período de tempo. Cabia à impugnante provar (art. 342°, n° 1 C.Civil), para que se considerasse estarmos perante aquela figura jurídica, que o imposto tivesse sido pago pelo outro sujeito passivo, prova que não fez nos autos. Para além disso, as liquidações, ora em causa nos autos, não se encontram pagas pela impugnante, encontrando-se a ser exigidas coercivamente (pontos 7 e 8 do probatório). Nestes termos, faltando desde logo a prova do 1° requisito, estar pago um imposto, não se encontram preenchidos os requisitos da duplicação de coleta. Improcede, por isso, a ação por não provada. Quanto à liquidação de juros compensatórios, afigura-se-me que a mesma também é legal uma vez que se integra na própria divida de imposto, pois, os juros compensatórios sao devidos sempre que a liquidação (legal) de imposto seja retardada (art. 35° da LGT). Improcede a ação por não provada”. · - A recorrente dedica-se à atividade de transportes rodoviários de mercadorias, ao aluguer de máquinas para a construção civil, demolições, terraplanagens, aterros e desaterros, sendo esse o seu objeto social; · - No 1º e 2º semestre de 2008, a recorrente emitiu as faturas 80, 81, 82, 86, 87 e 88, fazendo constar no seu descritivo “camião alugado com condutor”; · - Nas faturas atrás identificadas a recorrente não liquidou IVA, tendo sido emitidas as liquidações adicionais na sequência de um procedimento inspetivo onde se conclui que não era de aplicar a inversão do sujeito passivo nos termos do artigo 2º, nº 1 al. j) do CIVA; · - Os adquirentes dos serviços não liquidaram nem entregaram IVA ao Estado. Vejamos. Sendo o IVA um imposto de matriz comunitária, importa desde já consultar o artigo 199º nº 1 a) da Diretiva IVA (Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28/11/2006), donde decorre que, que os Estados-Membros podem prever que o devedor do imposto é o sujeito passivo destinatário das seguintes operações: a) “Prestação de serviços de construção, incluindo reparação, limpeza, manutenção, alteração e demolição respeitantes a bens imóveis, bem como a entrega de obras em imóveis considerada como entrega de bens nos termos do n.º 3 do artigo 14.º.” Aquela Diretiva, transposta para o direito interno por via do DL nº 21/2007, de 29 de janeiro, estabeleceu que: “no domínio de algumas prestações de serviços relativas a bens imóveis, nomeadamente nos trabalhos de construção civil realizados por empreiteiros e subempreiteiros”, a regra da inversão do sujeito passivo, passando, pois, “a caber aos adquirentes ou destinatários daqueles serviços, quando se configurem como sujeitos passivos com direito à dedução total ou parcial do imposto, proceder à liquidação do IVA devido, o qual poderá ser também objeto de dedução nos termos gerais.” – cf. preâmbulo do citado DL 21/2007, de 29.01. Nesta conformidade, o CIVA passou a consagrar, na alínea j) do nº 1 do artigo 2º, aqui aplicável, que, são sujeitos passivos de imposto “as pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada.” Portanto, o normativo transcrito prevê o mecanismo da inversão de sujeito passivo para algumas operações relacionas com os serviços de construção civil, em regime de empreitada ou subempreitada, de que beneficie o destinatário/adquirente, passando este a ser o sujeito passivo do imposto, em vez de o ser o prestador de serviços de construção civil. Por assim ser, no mecanismo de reverse charge, o IVA deixa de ser liquidado pelo fornecedor ao adquirente (sujeito passivo de IVA), passando este último a assumir essa obrigação em determinadas circunstâncias, constituindo uma exceção ao regime regra que consta do artigo 2º nº 1 al. a) do CIVA (e artigo 193º da Diretiva IVA -Diretiva 2006/112/CE, de 28 de novembro de 2006), segundo o qual o imposto é devido pelos sujeitos passivos que efetuem transmissões de bens ou prestações de serviços tributáveis (pelos fornecedores ou prestadores dos bens e serviços). Por via deste mecanismo, o pagamento final do IVA nos cofres do Estado deixa de caber ao fornecedor, cabendo ao adquirente, de modo a evitar fraude (cf. artigos 19º e 26º do CIVA). Assim, sempre que determinada operação económica reúna as condições estipuladas no artigo 2º nº 1 al. j) do CIVA, haverá inversão do sujeito passivo, cabendo ao adquirente dos serviços, a liquidação e entrega do imposto que se mostre devido (sem prejuízo do seu direito à dedução, nos termos gerais do CIVA, designadamente nos termos dos artigos 19.º a 26.º), devendo, na fatura emitida pelo fornecedor dos bens e/ou prestador dos serviços, nos termos do n.º 13 do artigo 36.º do CIVA, constar a expressão “IVA-autoliquidação”. Deste modo, o IVA passa a ser devido pelo adquirente dos serviços (sujeito passivo “invertido”), devendo liquidar o IVA na fatura recebida do prestador, decorrendo do artigo 19º nº 1 e d) do CIVA que, sendo o adquirente dos serviços tido como sujeito passivo, terá direito à dedução do IVA suportado, após o ter liquidado. Deste modo, consagrou-se no n.º 8 do artigo 19.º do CIVA: "Nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação". Na prática, os adquirentes, sendo sujeitos passivos normais, passam simultaneamente a declarar e a deduzir o imposto, sem pagamento efetivo à AT, uma vez que, nestas situações, o sujeito passivo, liquida e deduz simultaneamente o imposto, materializando-se numa operação neutra, na medida em que, por princípio, o valor que liquida e deduz é igual. Com efeito, neste regime de autoliquidação/Reverse charge, em princípio não há qualquer pagamento de IVA entre o fornecedor e o adquirente de bens, sendo este último, no que toca às operações efetuadas, devedor do IVA a montante, podendo, em princípio, deduzir este imposto de modo que nenhum montante será devido à Administração Tributária – Vd., neste sentido, entre outros, os acórdãos “Fatorie” do TJUE, de 06.02.2014, Processo nº C-424/12 e o acórdão “Farkas” de 27.04.2017, processo C-564/15 Uma vez que o normativo sob nossa mira, de que trata a inversão do sujeito passivo, se reporta a serviços de construção civil, importa dar conta de que, a definição de construção civil, face à atual Lei nº 41/2015, de 3 de junho (Regime Juridico aplicável ao exercício da atividade de construção civil), e respetivas alterações, compreende “a atividade que tem por objeto a realização de obras, englobando todo o conjunto de atos que sejam necessários à sua concretização.” (1) Em sentido semelhante, o Ofício Circulado da Autoridade Tributária nº 30101, de 24/05/2007 (embora não sendo fonte de direito), estabelece que “construção civil” compreende todos atos que tenham por objeto a realização de uma obra, englobando todo o conjunto de atos que sejam necessários à sua concretização. O mesmo se extraía já do artigo 3º Lei nº 12/2004, de 09 de janeiro, que estabelecia o regime jurídico de ingresso e permanência na atividade da construção civil, que veio a ser revogada pela Lei 41/2015 acima referida. Para este efeito, obra compreende, de acordo com a Lei 12/2004: “todo o trabalho de construção, reconstrução, ampliação, alteração, reparação, conservação, reabilitação, limpeza, restauro e demolição de bens imóveis, bem como qualquer outro trabalho que envolva processo construtivo”. De acordo com a Lei nº 41/2015 (que revogou a Lei 12/2004), obra, será “todo o trabalho de construção, reconstrução, ampliação, alteração, reparação, conservação, reabilitação, limpeza, restauro e demolição de bens imóveis, bem como qualquer outro trabalho que envolva processo construtivo, seja de natureza pública ou privada” – Cf. citada lei nº 41/2015, de 3 de junho, artigo 3º alínea b) e k). Na ausência de uma definição de construção civil para efeitos fiscais, devemos socorrer-nos das Leis citadas, tendo em conta o estabelecido no artigo 11º da LGT, invocando o conceito próprio do seu ramo de direito. Uma vez que o artigo 2º nº 1 al. j) nos fala de obras de construção civil em regime de empreitada ou subempreitada (que por regra ocorrem em bens imóveis), consultando o artigo 1.207º do Código Civil, ali se estabelece que, uma empreitada é o contrato pela qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar uma certa obra, mediante um preço. Por seu turno, o artigo 1.213º do mesmo compêndio legal, prevê que, uma subempreitada é o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a obra a que se encontra vinculado, ou parte dele. Na alínea j) do nº1 do artigo 2º do CIVA, supratranscrita, para ocorrer a inversão de sujeito passivo, a atividade prestada, terá de se inserir num regime de empreitada ou subempreitada, sendo que a obra, será, como visto, quaisquer serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis que envolvam um processo construtivo num imóvel. O Regulamento de execução (UE) n.º 1042/2013 do Conselho, de 7 de outubro de 2013, que alterou o Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011, (nenhum deles vigente à data dos factos), relativo ao lugar das prestações de serviços, veio introduzir uma definição de “bens imóveis” no art.º 13.º B, dispondo o seguinte: “Para a aplicação da Diretiva 2006/112/CE, consideram-se “bens imóveis”: b) Qualquer edifício ou construção fixado ao solo ou no solo, acima ou abaixo do nível do mar, que não possa ser facilmente desmantelado ou deslocado; d) Qualquer elemento, equipamento ou máquina permanentemente instalado num edifício ou numa construção que não possa ser deslocado sem destruir ou alterar o edifício ou a construção.” (…) «Subsecção 6-A Prestações de serviços relacionadas com bens imóveis Artigo 31.º -A 1.Os serviços relacionados com bens imóveis a que se refere o artigo 47.º da Diretiva 2006/112/CE incluem apenas os serviços que tenham uma relação suficientemente direta com esses bens. Considera-se que os serviços têm uma relação suficientemente direta com bens imóveis nos seguintes casos: a) Quando derivam de um bem imóvel e esse bem é um elemento constitutivo do serviço e constitui um elemento central e essencial para a prestação dos serviços; 2. O n.º 1 abrange, em especial, o seguinte: a) A elaboração de plantas de um edifício ou de partes de um edifício destinadas a um determinado terreno, independentemente de o edifício estar ou não construído; e) Os trabalhos efetuados em terrenos, incluindo serviços agrícolas tais como a mobilização dos solos, a sementeira, a rega e a fertilização; f) O estudo e avaliação do risco e da integridade dos bens imóveis; i) A prestação de serviços de alojamento no sector hoteleiro ou em setores com funções similares, como os campos de férias ou os terrenos destinados a campismo, incluindo o direito a permanecer num lugar específico resultante da conversão de direitos de utilização periódica e direitos afins; j) A atribuição e a transmissão de direitos, com exceção dos abrangidos pelas alíneas h) e i), para a utilização da totalidade ou de partes de um bem imóvel, incluindo a licença para utilizar parte de um bem, como a concessão de direitos de pesca e de caça ou o acesso a salas de espera nos aeroportos, ou ainda a utilização de uma infraestrutura pela qual são cobradas portagens, por exemplo, pontes e túneis; m) A instalação ou montagem de máquinas ou equipamentos que, após a instalação ou montagem, possam ser considerados bens imóveis; n) A manutenção e reparação, inspeção e fiscalização de máquinas ou equipamentos no caso de estes poderem ser considerados bens imóveis; o) A gestão de bens imóveis, com exceção da gestão de carteiras de investimentos imobiliários abrangida pelo n.º 3, alínea g), que consista na exploração de bens imobiliários de natureza comercial, industrial ou residencial pelo proprietário dos bens ou em seu nome; p) A intermediação na venda ou na locação ou arrendamento de bens imóveis e na constituição ou transferência de determinados direitos ou direitos reais sobre bens imóveis (equiparados ou não a bens corpóreos), com exceção da intermediação abrangida pelo n.o 3, alínea d); q) Os serviços jurídicos relacionados com a transferência de um título de propriedade imobiliária, o estabelecimento ou transferência de determinados direitos ou direitos reais sobre bens imóveis (equiparados ou não a bens corpóreos), como atividades notariais, ou a elaboração de contratos de compra e venda de bens imóveis, ainda que a operação subjacente que resulta na alteração jurídica da propriedade não se venha a verificar.” Ou seja, do acervo normativo apontado, decorre que o conceito de bens imóveis para efeitos de IVA não pode ser interpretado com o sentido que assume na lei civil (cf. artigos 11.º, n.º 2 da LGT e 204.º e 205.º do Código Civil), compreendendo também os equipamentos ou máquinas permanentemente instalados em edifícios ou construções (fabris), como também equipamentos sem os quais o edifício ou construção (fabril) possa adquirir aptidão para a sua finalidade industrial, aí se incluindo estruturas permanentes, como condutas de água, gás, esgotos e afins e a montagem, reparação ou substituição destas estruturas, sendo que a ligação permanente ao bem imóvel se reconduz ao período de vida útil dos equipamentos- Veja-se, neste preciso sentido o acórdão deste TCAS de 14.03.2019, tirado do processo nº 325/19.1BELRA. Não obstante tudo que fomos avançando, importa salientar, que, para operar este mecanismo de reverse charge é necessária a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: (i) Que se esteja perante a aquisição de serviços de construção civil; (ii) O adquirente seja sujeito passivo do IVA em Portugal e aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA. Na situação colocada, o que importa saber é se os serviços prestados pela recorrente são serviços de construção civil, na medida em que, relativamente ao pressuposto referido em ii) as partes não colocam o mesmo em questão. Como visto, a regra da inversão do sujeito passivo aplica-se sempre que, no âmbito de uma obra, empreitada ou subempreitada de construção civil, o prestador dos serviços de construção efetue e fature os serviços de construção propriamente ditos, podendo, ao mesmo passo, faturar outros serviços relacionados, desde que necessários à sua realização, como sucede, por exemplo, com o aluguer ou colocação de andaimes, aluguer de gruas e de outros bens, serviços de limpeza, sinalização, fiscalização, remoção de entulhos, serviços de projetistas ou de arquitetura, etc. Aqui, o valor global da fatura incluirá, a par dos trabalhos de construção em si mesmo, outros serviços relacionados e necessários para o processo construtivo da empreitada ou subempreitada. Ou seja, o prestador, aqui, juntamente com os serviços de construção civil propriamente ditos, poderá incluir e verter na fatura material e outros serviços com ela relacionados que sejam necessários à sua realização, ficando a totalidade dos fornecimentos abrangidos pela regra da inversão do sujeito passivo em IVA. No entanto, se, pelo contrário, forem apenas prestados, isoladamente (sem se relacionar com os serviços da construção civil propriamente ditos levados a cabo pelo empreiteiro ou subempreiteira na execução da obra de construção), a uma empresa, serviços como os aqui em causa- aluguer de camião com condutor-, prestados por uma empresa de transportes rodoviários, de aluguer de viaturas e máquinas para construção civil, este prestador, terá já de liquidar o IVA (2), na medida em que, aquele serviço em si (sem estar envolto num processo construtivo, numa empreitada levada a cabo por si) não configura qualquer empreitada em obra de construção civil, ou serviços de construção civil, por si realizados, nos termos acima enunciados, afigurando-se, pelo contrário, envolto na sua atividade de operador económico que se dedica, também, ao aluguer de viaturas, e nessa qualidade prestou os seus serviços aos beneficiários. Conforme se sumariou no acórdão deste TCAS de 25.06.2019, Processo nº nº 117/16.0BELRA, diremos também nós que: “3) A reverse charge (regra da inversão do sujeito passivo) determina, que no caso em que o sujeito passivo é beneficiário de prestações/fornecimentos realizados por operadores económicos de construção civil, que se relacionam com o mesmo nessa qualidade, cabe a este último, como tal, a liquidação de IVA, devido pelas quantias em causa”. Olhando para o probatório na sua integralidade, bem como para o descritivo das faturas, ali inscreveu a recorrente a natureza dos serviços prestados, como sendo o aluguer de camião com condutor. A natureza destes serviços assim descritos não autorizam, sem mais, como avançado, que se conclua que estejamos perante serviços de construção civil. É verdade que, as exigências no descritivo de uma fatura não carece de ser exaustivo. No entanto, há exigências mínimas que ali devem ser vertidas para se atestar a natureza dos serviços (ou ser complementadas com outros elementos adicionais de modo a fazer prevalecer a verdade material sobre a formal). Na situação sujeita, olhando as faturas, a que alude o probatório, da menção ali constante (aluguer de camião com condutor), não se vê que em causa estejam trabalhos de construção civil e menos ainda relacionados com um alegado contrato celebrado com a sociedade “M……….” e a “T…………….R……….. S…………, Lda”, para movimentação de terras e preparação de terreno para construção, na medida em que o mesmo não foi trazido aos autos e nem testemunhas foram arroladas de modo a esclarecer a sua alegada existência, o tipo de serviços, etc. Ademais, a existir esse contrato de empreitada para movimentação de terras com aluguer de máquinas e manobrador (que ficou por provar), normal seria que esses serviços constassem do descritivo das faturas, em vez de aluguer de camião com condutor. De facto, o próprio descritivo das faturas, inscrito à data da sua emissão em 2008, contraria a existência desse alegado contrato para movimentação e preparação de terras no seio de uma obra de construção civil. Ora, como adiantamos, o aluguer de um camião, ou de máquinas com manobrador para exercer trabalhos de construção, como a remoção de terras para preparar a construção, são operações económicas diferentes, abrangidas, respetivamente, pelas distintas atividades da recorrente (transporte de viaturas e aluguer de máquinas para construção, etc), sendo que apenas a segunda poderia levar à inversão do sujeito passivo. O normal, usual e o que se impõe é que, no âmbito da execução de uma obra de construção civil, o prestador desses serviços, indique na fatura tais serviços de construção civil (e quaisquer outros com ela relacionados e necessários à sua realização), desde logo as ditas “movimentação de terras”, indicando até a máquina usada pelo manobrador (e o alegado contrato), sem que se pretenda dizer que tem de haver uma discriminação exaustiva dos vários itens. Importa é que se detalhe de modo a identificar a natureza da operação, por forma a que se compreendam e apreendam os serviços de construção civil e obras (empreitada ou subempreitada) em questão e a executar. Não pode, é, alegar que em causa estavam movimentações de terras com máquinas, e mencionar na fatura “aluguer de camião”, quando tais operações não são sequer confundíveis ou equiparáveis. Atenta a atividade da recorrente, temos que, se em 2008 faturou serviços de aluguer de camião com condutor, foi isso mesmo que a recorrente prestou, apesar de, anos após a faturação e após a ação inspetiva apregoar que se tratava de aluguer de máquinas para preparação de terreno de construção a que se obrigara por via de um contrato cuja prova ficou por trazer e fazer. Informam, ademais, as regras da experiência que, atenta a atividade da recorrente (quer de transportes rodoviários, quer de aluguer de máquinas para construção civil, demolição, terraplanagem, etc), a mesma saberá identificar adequadamente os serviços que presta, não sendo credível que, se estivesse a faturar serviços que não de aluguer de camião o não fizesse inscrever na fatura, nomeadamente atentas as exigências do mecanismo excecional da inversão do sujeito passivo como a aqui trazida. Não se compreende é que, a estar em causa a movimentação de terras com máquina e manobrador (com vista a preparar a construção), no âmbito de um contrato, que se indique que os serviços correspondem a aluguer de camião com condutor sem nada que justifique ou permite evidenciar que em causa estão serviços de construção civil com que se relaciona, também, o seu escopo social. De resto, a fatura deve conter os elementos atinentes à quantidade, denominação usual dos bens transmitidos ou serviços prestados, com a especificação dos elementos necessários à caraterização da operação e determinação da taxa aplicável, quando for o caso (cf. art. 36º do CIVA, anterior 35º do mesmo diploma). Essas menções, que devem figurar nas faturas, não têm de corresponder a toda a informação disponível acerca do bem ou do serviço prestado, devendo, quando existam, permitir se apreenda a natureza do serviço prestado. Com efeito, a natureza de uma prestação tem de estar vertida na fatura com um grau mínimo de precisão adequado a apreciar a aplicação da taxa do imposto correta, de uma isenção ou de outras normas especiais, uma vez que o imposto em causa depende, em muitos aspetos, do conteúdo dos serviços prestados, de modo a dar cumprimento às exigências da Diretiva IVA. Tal como se doutrina no acórdão Barlis do TJUE (acórdão datado de 15.09.2016, processo nº C-516/14), o artigo 226º nº 6 da DIVA exige a determinação da extensão e natureza dos serviços prestados, sem, contudo, estipular que é preciso descrever os serviços específicos de forma exaustiva. O artigo 226º da Diretiva 2006/112 precisa que, sem prejuízo das disposições específicas previstas nesta diretiva, só as menções citadas nesse artigo devem obrigatoriamente figurar, para efeitos do IVA, nas faturas emitidas em aplicação do disposto no artigo 220º da referida diretiva. Por essa razão, tal como referido no acórdão “Pannon”, do TJUE, datado de 15.06.2010, Proc. C-368/09, não é legítimo aos Estados-Membros associar o exercício do direito à dedução do IVA ao preenchimento de pressupostos relativos ao conteúdo das faturas que não estão expressamente previstos nas disposições da Diretiva 2006/112. De acordo com o citado normativo, de modo a poder atestar-se os serviços em causa e as eventuais taxas, isenções, regimes especiais, impõe-se que a fatura contenha a menção da extensão e natureza dos serviços prestados, sendo apenas obrigatório especificar a extensão e natureza dos serviços, sem contudo precisar que é necessário descrever os serviços específicos prestados de forma exaustiva, na medida em que, a finalidade das menções que devem obrigatoriamente constar da fatura, têm na mira, permitir à AT realizar os controlos do pagamento do imposto devido, regimes especiais e, se for caso disso, da existência do direito à dedução do IVA. É, portanto, à luz desta finalidade que importa analisar as faturas como as que estão em causa nos autos, para aferir a natureza dos serviços (em complemento com outros elementos, quando existam). Por assim ser, entendendo a recorrente que ocorre a inversão do sujeito passivo, portanto não teria de ser ela a liquidar o IVA (mas o destinatário dos serviços), tendo emitido faturas de serviços, que entende serem de construção civil, por ter sido contratada, segundo alegou (mas não provou), para realizar trabalhos de construção civil, não se compreende porque não fez essa menção, então, nas faturas, sobretudo quando a sua atividade é essencialmente relacionada com aluguer de transportes, apontando o aluguer de camião para essa atividade “principal”. Não se pode tratar de modo semelhante a situação em que a prestadora celebra um contrato e coloca máquinas com operador, numa obra de construção civil, de modo a alisar ou remover terras, com vista à execução da “empreitada”, com o simples aluguer de um camião com condutor, sem que nada mais seja trazido e provado para se poder concluir que se tratasse de trabalhos de construção. Quando aplique a regra de inversão, o emitente da fatura deve, além de indicar os trabalhos de construção realizados, emitir a fatura sem IVA com a expressão “IVA – autoliquidação”, nos termos do artigo 36º nº 13 do CIVA. Mas, de nada valerá esta menção se os serviços não se enquadram nos serviços de construção civil a que alude o artigo 2º nº 1 al. j). Na situação colocada, de modo a evidenciar, nomeadamente, que os trabalhos de construção civil foram realizados, no âmbito da empreitada que refere (e não demonstrou), apregoa a recorrente que as adquirentes daqueles serviços, que vão identificadas nas faturas, liquidaram e entregaram o IVA nos cofres do Estado, o que mereceu, como se viu supra, resposta negativa do Tribunal por não ter sido feita essa prova. Por tudo isto que fomos expondo, ressalta evidente que em causa não estão de facto serviços de construção civil prestados aos adquirentes, por essa razão não se vê que tenha errado o Tribunal a quo na aplicação e interpretação do artigo 2º nº 1 al. j) do CIVA e do artigo 36º nº 13 do mesmo diploma, desde logo mediante o descrito nas faturas, que, sem qualquer outro elemento adicional (nomeadamente o contrato de empreitada com as adquirentes, etc) não permitiria inverter a conclusão a que chegou a AT por via do ato corretivo. Por outro lado, não andou mal o Tribunal a quo na interpretação das regras do ónus da prova (artigo 342º do CC indicado na conclusão de recurso sem qualquer densificação) a que se refere a recorrente, por tudo que acima se disse, na medida em que não ficou demonstrado, como visto, quer que a recorrente se pudesse louvar da não liquidação de IVA à luz do mecanismo da inversão do sujeito passivo, assim como não demonstrou que os adquirentes liquidaram e pagaram o IVA (de modo a poder ser equacionada a situação de duplicação de coleta que a recorrente acaba por não colocar em causa, diretamente, no recurso, ficando-se por referir que o Tribunal valorou mal os documentos que comprovariam esse pagamento e liquidação, o que foi objeto da nossa apreciação inicialmente). Finalmente, aduz a recorrente, sem qualquer concretização e alegação que o Tribunal errou no julgamento quanto ao artigo 329º do CC. Não se vê em que medida esse vício foi cometido, nem a recorrente o esclarece e densifica, bastando-se em referir, na conclusão I) que a decisão recorrida “ Não pode manter-se, por indevida interpretação e aplicação dos artigos dos artigos 2.°, n.° 1, al. j) do CIVA, art.° 35.° n.° 13 do CIVA, art. 342.°, n.°1 e 329.°do Código Civil”. Ora, o artigo 329º do CC respeita à caducidade, designadamente ao início do prazo de caducidade. Contudo, no domínio do Direito Tributário, a caducidade do direito à liquidação dos tributos (se é a essa caducidade que a recorrente se reporta, pois nada diz…) tem um regime próprio vertido nos artigos 45º e ss da LGT. No entanto, essa questão da caducidade não foi invocada na PI, por essa razão não foi submetida ao conhecimento do Tribunal recorrido, razão pela qual, não poderia o sentenciado cometer o vício “assim” apontado. Além disso, sendo questão nova, a este Tribunal ad quem, sempre estaria arredado o seu conhecimento. Aqui chegados, assuma a conclusão de que o recurso terá de naufragar, mantendo-se as liquidações e correspondentes juros compensatórios que da mesma sorte do imposto (IVA) padecerão (art. 35º da LGT), o que por si só leva a que a indemnização por garantia indevida (verificados que fossem os pressupostos para sua apreciação nesta sede) não pudesse ser atendida. * DAS CUSTAS No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo da recorrente, por ser parte vencida. * V- DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida. Custas a cargo da recorrente. * Lisboa, 15 de julho de 2025. Isabel Silva (Relatora) ___________________ Rui A. S. Ferreira (1º adjunto) ______________ Margarida Reis (2ª adjunta) ________________ (2) Vide, neste sentido, tese de Mestrado de Ana Cristina de Sousa Marques, apresentada no IPCA em abril de 2022, sob tema “O IVA E O REVERSE CHARGE NA CONSTRUÇÃO CIVIL, UMA ANÁLISE JURÍDICO-LEGAL”(consulta em -https://mail.google.com/mail/u/0/#inbox?projector=1) |