| Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 45/24.5BECTB | 
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| Secção: | CA | 
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| Data do Acordão: | 10/23/2025 | 
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| Relator: | HELENA TELO AFONSO | 
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| Descritores: | IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO PREÇO ANORMALMENTE BAIXO PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA, DA IMPARCIALIDADE, DA IGUALDADE, DA CONCORRÊNCIA E DA PROSSECUÇÃO DO INTERESSE PÚBLICO. | 
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| Sumário: | I – As propostas apresentadas pela ora recorrente tinham preços anormalmente baixos, já que esses preços (compensações por obrigações de serviço público) apenas pressupunham custos com uma quantidade de meios (frota e recursos humanos) que seriam insuficientes para explorar todo o serviço público em cada um dos contratos, conforme descrito no caderno de encargos. II – A insuficiência de meios – frota e recursos humanos - para a prestação dos serviços objeto dos contratos, assim como insuficiência a nível das receitas, seja da compensação por serviço público, seja quanto aos serviços ocasionais refletidas nos preços apresentados, revelam um “preço anormalmente baixo” nos termos e para os efeitos do disposto na alínea e) do artigo 70.º do Código dos Contratos Públicos. III – O programa do procedimento e o caderno de encargos contêm todos os elementos necessários à apresentação das propostas pelos candidatos, sendo estas analisadas e avaliadas pelo júri com base naquelas peças procedimentais, razão pela qual a não disponibilização do denominado “modelo técnico-financeiro” não viola o princípio da transparência. IV – Tendo os preços apresentados pela autora sido considerados pelo júri como suscetíveis de ser qualificados como preços anormalmente baixos por comparação com o preço base fixado no programa do procedimento, com base em factos objetivos, não se provando que a entidade adjudicante tenha atuado de forma parcial, formulando juízos alheados dos factos e sem ponderação de todos os interesses subjacentes à decisão e com relevância para a mesma, não está demonstrada a violação do princípio da imparcialidade previsto no artigo 1.º-A, n.º 1 do CCP, bem como no artigo 266.º, n.º 2 da CRP e artigo 9.º do CPA. V – Não se tendo provado que as propostas da contrainteressada apresentaram preços significativamente inferiores ao preço base estabelecido no programa do procedimento e não tendo esses preços suscitado no júri a dúvida sobre se tratavam de preços anormalmente baixos para cobrir os custos da execução dos contratos, contrariamente aos preços apresentados pela recorrente que levaram o júri a solicitar-lhe que prestasse esclarecimentos, em face dos quais o júri de forma fundamentada considerou tratar-se de preços anormalmente baixos, razão pela qual propôs a exclusão de tais propostas, que foram excluídas em conformidade com a previsão do artigo 70.°, n.º 2 al. e) do CCP, não tendo assim ocorrido violação dos princípios da igualdade e da concorrência. VI – Não obstante as propostas da autora nos planos ambiental e de fiabilidade da frota serem aquelas que oferecem maiores garantias na execução do serviço público objeto dos contratos de concessão, não se pode concluir que por apresentarem o preço mais baixo, melhor salvaguardam o interesse público, preço este que era insuficiente para cobrir os custos inerentes à execução dos contratos, colocando em risco a prestação do serviço público, e que determinou a exclusão das mesmas, pelo que não foram infringidos os princípios da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público. | 
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| Votação: | Unanimidade | 
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| Indicações Eventuais: | Subsecção de Contratos Públicos | 
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| Aditamento: |  | 
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| Decisão Texto Integral: | Acordam na Subseção de Contratos Públicos, da 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório: V…, Lda. (“V…”), instaurou a presente ação urgente de contencioso pré-contratual contra Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa (“CIMBB”) na qual formulou os seguintes pedidos: “i) ser verificada a invalidade e anulada a decisão de adjudicação e, sendo o caso, os contratos que tenham sido celebrados; (ii) ser condenada a CIMBB a retomar o procedimento a partir da análise e avaliação e a admitir a proposta da apresentada pela Autora; (iii) ser determinada a suspensão automática dos efeitos do ato impugnado”. Indicou como contrainteressada a N… Gestão, Lda.. Por sentença proferida a 7 de julho de 2025 foi julgada improcedente a presente ação. Vencida na ação, a Autora interpôs recurso da referida sentença, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: “(A) A Recorrente pretende a revogação da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, de 07.07.2025, que julgou improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual e, por conseguinte, manteve o ato de adjudicação que, com suporte no Relatório Final, excluiu a proposta da Recorrente, com fundamento na alínea e) do n.° 2 do artigo 70.° do CCP. (B) A discordância da Recorrente prende-se, no essencial, com a valoração da prova testemunhal feita pelo Tribunal a quo, que por não ter extraído as devidas conclusões dos depoimentos das testemunhas da Recorrente, bem como das declarações de parte da sua sócia-gerente, acabou por incorrer em erro de julgamento no que concerne à causa de exclusão da proposta da Recorrente. (C) Ou seja, o Tribunal a quo desconsiderou a prova produzida em sede de audiência de julgamento, não tendo considerado como provados factos de onde facilmente se conclui que a proposta da Recorrente não é anormalmente baixa. (D) Antes de mais, cumpre recordar que o procedimento em causa tem como objeto a concessão do serviço público de transporte de passageiros por modo rodoviário, dividido em 2 lotes a saber: Lote 1: constituído pela área geográfica dos Municípios de Vila Velha de Ródão e Proença-a-Nova e respetivas carreiras intermunicipais e inter-regionais e o Lote 2: constituído pela área geográfica dos Municípios de Idanha-a-Nova, Penamacor e respetivas carreiras intermunicipais e inter-regionais. (E) A Recorrente apresentou proposta para os 2 lotes, tendo apresentado os seguintes atributos: (i) Para o Lote 1, solicitou o valor unitário por veículo quilómetro de € 1,19 (um euro e dezanove cêntimos) a título de compensação por obrigação de serviço público e obrigou-se a utilizar uma frota de veículos que cumpra, no mínimo, uma idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal, não superior a 26 meses; (ii) Para o Lote 2, solicitou o valor unitário por veículo quilómetro de € 0,69 (sessenta e nove cêntimos) a título de compensação por obrigação de serviço público e obrigou-se a utilizar uma frota de veículos que cumpra, no mínimo, uma idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal, não superior a 27 meses. (F) Pese embora a CIMBB não ter definido nas peças do procedimento o liminar a partir do qual a proposta seria anormalmente baixa, e ainda sem que os concorrentes estivessem vinculados a instruir a sua proposta com qualquer documento ou modelo de natureza técnica/financeira, após o Júri ter desencadeado o subprocedimento previsto no n.° 3 do artigo 71.º do CCP, não convencido da bondade dos esclarecimentos prestados pela Recorrente, decidiu pela exclusão da sua proposta, nos dois Lotes a concurso. (G) Pelo que, o que se pretende sindicar, juridicamente, é o total desacerto, e ilegalidade dessa mesma exclusão, que padece de vários vícios. (H) Em primeiro lugar, a Recorrente identifica a falta de fundamentação, não no simples aspeto procedimental invocado pelo Tribunal a quo quando chama à colação o conhecimento pela Recorrente do itinerário cognoscitivo seguido pelo Júri, mas, pelo desconhecimento das motivações substantivas invocadas para, inicialmente, identificar a proposta da Recorrente como anormalmente baixa, e num segundo momento, para excluir essa proposta. (I) A suficiência da fundamentação deve sempre ser aferida contextualmente. E na economia do procedimento ficou provado, quer documentalmente, quer nos depoimentos de todas as testemunhas, que a CIMBB lançou o procedimento com base num suposto modelo económico-financeiro. (J) Até aí, nenhum problema. A conduta do Júri, e da própria CIMBB, só se tornam ilegais a partir do momento em que decidem remeter esse modelo económico-financeiro ao mais profundo secretismo, recusando mesmo a sua disponibilização quando questionado pela Recorrente na fase de esclarecimentos às peças do procedimento. (K) Mais problemático ainda se torna, e por isso é violador do dever de fundamentação, quando para afastar os esclarecimentos da Recorrente, o Júri convoca por variadíssimas vezes, os pressupostos desse modelo económico-financeiro, alegando que esses pressupostos da Recorrente são contrários àquele. (L) Para aferir pela violação do dever de fundamentação é irrelevante, neste contexto procedimental, que a Recorrente tenha intervindo em sede de audiência prévia. O que é verdadeiramente conclusivo no sentido da sua violação é que a Recorrente não conhece, porque a CIMBB nunca permitiu, os verdadeiros fundamentos técnicos e financeiros vertidos no modelo económico-financeiro, com os quais a sua proposta, segundo o Júri, não está em conformidade. (M) Debruçando agora sobre a causa de exclusão da proposta da Recorrente, é manifesto que o Tribunal a quo, de maneira acrítica, favoreceu os depoimentos das testemunhas da CIMBB, pese embora as mesmas sejam confusas e, por vezes, contraditórias. (N) Contrariamente às testemunhas, e declarações de parte, da Recorrente que, com elevado grau de detalhe e precisão esclareceram o Tribunal a quo de todo o racional subjacente à proposta da Recorrente, quer do ponto de vista operacional, quer financeiro. (O) Por conseguinte, requer-se, nos termos do artigo 144.°, n.° 4 do CPTA a reapreciação da prova gravada, nos termos identificados nas presentes conclusões, uma vez que os pontos 6, 20, 28 e 29 dos Factos provados. (P) Mediante a reapreciação da prova, deverá este Tribunal Central Administrativo julgar que, efetivamente, a proposta da Recorrente foi formulada com base nas especificações fixadas no Caderno de Encargos, nomeadamente as rotas, percursos e horários, e o quadro de pessoal apresentado, sendo esses os únicos elementos que objetivamente a Recorrente poderia conhecer. (Q) E mais, impõem-se ainda dar como provado, com fundamento na reapreciação da prova gravada, que a Recorrente construiu a sua proposta com base numa escala operacional e que, tendo como pressupostos os definidos no Caderno de Encargos, assim como a sua experiência, dimensionou o número de veículos, os recursos humanos, e demais custos, nomeadamente FSE, de modo a assegurar as exigências contratuais. (R) Este aspeto é particularmente importante, na medida em que, o Tribunal o quo ao não ter feito a avaliação crítica dos depoimentos, apenas considerou como relevantes os depoimentos das testemunhas da CIMBB, e as conclusões do Júri. Vejamos: (S) O Tribunal a quo, no ponto 6 do probatório, julgou que: "Sem prejuízo da extensão do serviço público objeto dos contratos que a CIMBB pretende celebrar ao abrigo do Concurso, o Programa do Concurso apenas veio exigir que, para cada um dos lotes, as propostas -apresentadas por concorrentes que não revestissem a forma de agrupamento - fossem constituídas pelos documentos seguintes: (f) Documento Europeu Único de Contratação Pública; (ii) Declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos; (f) Proposta de Exploração do Serviço Público (elaborada em conformidade com o Anexo II do Programa do Concurso - o qual corresponde a uma declaração na qual as concorrentes, em suma, apenas tinham de indicar (i) o preço do valor unitário por veículo quilómetro a título de compensação por obrigação de serviço público e (ii) a idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal)". (T) Sucede que, face à prova testemunhal produzida, exige-se muito mais, pelo que este ponto foi incorretamente julgado. (U) Com efeito, o que decorre do depoimento da testemunha P…, a minutos 02:00:07, a CIMB não exigiu um número mínimo de autocarros. (V) No mesmo sentido, a sócia-gerente da Recorrente, a minutos 00:17:08 testemunhou que "não havia qualquer referência ao dimensionamento, ao número de meios mínimos necessários para executar a operação". (W) E foi confirmado pela testemunha J…, a minutos 00:39:11 quando questionado acerca dos meios mínimos referiu que "Essa é uma responsabilidade doi operador que o caderno de encargos não prevê". (X) Este ponto assume natureza central na medida que causa está o pressuposto de que partiu o Júri para excluir a proposta da Recorrente. (Y) Requer-se, pois, que seja aditado ao probatório, um ponto com o seguinte teor, "O Caderno de Encargos que a CIMMB disponibilizou aos concorrentes não patenteou o dimensionamento da frota, em termos do número mínimo de viaturas a propor pelos concorrentes para a execução do contrato de concessão". (Z) Ademais, a Recorrente não pode acompanhar o ponto 28 do probatório, quando o Tribunal a quo deu como provado que, "A operação isolada do Lote 2, nos termos propostos pela Autora, não é viável, e assumir a operação conjunta dos dois lotes acrescenta um risco de perturbação à operação no Lote 1". (AA) É notório que o Tribunal a quo considerou apenas o Relatório Pericial e a resposta ao quesito b) e Respostas dos Peritos aos pedidos de esclarecimentos apresentados. (BB) Principalmente, essa conclusão falha quando a Recorrente demonstrou o percurso lógico que fez para apresentar a proposta, quer no Lote 1, quer no Lote 2. (CC) No que concerne à componente financeira, a testemunha M… esclareceu, a minutos 01:31:42 que: "O custo estava... era também um dado. Nós consideramos um custo médio do colaborador de um pouco mais de 21 mil euros ano, acho que é isso. Hum que era no caso, que era o outro. E depois consideramos, levamos em conta, enfim, a idade média das pessoas a antiguidade. E portanto há aqui um acordo coletivo de trabalho nesta, nesta atividade, enfim, um bocadinho complexo. Ah, mas levamos em conta também isso e levamos em conta ainda mais o seguinte: foi que os custos com pessoal ou melhor o custo médio por pessoa que era, enfim, diria praticamente impossível fazemos o custo pessoa a pessoa, [inaudível] como é normal custo médio, levamos em consideração que eh esse custo sofreria uma atualização salarial anual de acordo com taxo de inflação". (DD) Tendo igualmente advertido a minutos 01:32:57 que a Recorrente teve como pressuposto que o custo com o pessoal sofrerá atualização tendo em conta a variação da taxa de inflação. (EE) A mesma testemunha, a minutos 01:33:23, reiterou que todos os custos foram considerados: "Sim. Todos o, todos os custos, ah, que não são variáveis ou seja que não, não são uma função dependente da dimensão dos réditos ou dos serviços prestados e estamos falar de custos como o gasóleo, os custos como pessoal que não são [inaudível] mas são faz parte dos operacionais, ah, os custos da bilhética, os serviços partilhados ah... tudo isso nós consideramos que são custos fixos, eu vou ter sempre alguém, ter sempre custo da bilhética e consideramos que estes custos, todos estes sofrem uma atualização anual de acordo com o taxa de inflação". (FF) Naturalmente, a rentabilidade não foi esquecida, conforme depôs a testemunha M…, a minutos 01:35:33: "Nós o que fizemos, nós [inaudível] tinha dito, a nossa proposta de preço de compensação financeira foi feita por diferença, o que é que isto quer dizer? Quer dizer que nós na preparação da proposta decidimos que naturalmente este. esta candidatura, este projeto empresarial [inaudível] rentável. Não faria sentido que não fosse rentável, não é? Portanto nós definimos que a rentabilidade, nós definimos o mínimo da rentabilidade económica para o lote um e para o lote dois. E em função disso, como consequência, é que determinamos o valor [inaudível, o preço da compensação financeira. E, portanto, se.". (GG) Adicionalmente, a minutos 01:36:44, referiu que: "Todos os anos, ah... a operação gera resultado económico positivo, económico e líquido, eu tenho memória mais, se me permitem, este enviesamento financeiro, tenho memória, ah, que a TIR, que é taxa interna de rentabilidade dos dois projetos, ah, num é 8% no outro é 10%. E portanto estamos falar de níveis de rentabilidade, portanto ou seja que a taxa interna da rentabilidade do, de um lote e do outro positivo. Ah. Agora... [inaudível] não lhe sei dizer se [inaudível] líquido é meio milhão de euros ou... não tenho isso em memória". (HH) Não só a operação do Lote 2, isoladamente, é viável, como também a operação conjunta dos dois lotes não acrescenta qualquer risco de perturbação, ou seja, operacional para o Lote 1. (II) Do ponto de vista operacional, é particularmente relevante o depoimento da testemunha V…, tendo em conta o papel que desempenhou aquando da preparação da proposta da Recorrente, e que fica devidamente explicitada a minutos 02:01:43: "Eu fiz a análise da rede de transportes, estava no caderno de encargos, fui ver todas as linhas, todos os percursos, as frequências, os horários, fui perceber de quantos autocarros precisávamos e de quantos motoristas". (JJ) E esclareceu, a minutos 02:04:18 a partir de que elementos a Recorrente chegou ao número de viaturas necessárias para cada um lote: "Eu fui analisar os horários todos e os percursos e as frequências, fui tentar fazer uma escala de segunda a sexta com todos os percursos que estavam no caderno de encargos e fui atribuindo autocarros e motoristas, tendo em conta que motoristas e tinha que pôr sempre mais para conseguir ter baixas, férias e folgas e qualquer doença que possa aparecer ao longo do tempo". (KK) E afirmou, sem qualquer margem para dúvidas, a minutos 02:05:02, que com 17 autocarros no lote um e 9 autocarros no lote dois, consegue preencher todos os serviços do Caderno de Encargos. (LL) Como não poderia deixar de ser a Recorrente considerou as vicissitudes laborais porquanto, como afirma essa testemunha a minutos 02:05:44, "temos que dar férias, folgas e o horário de trabalho normal". (MM) Para o dimensionamento proposto pela Recorrente contribuiu o conhecimento que tem da dinâmica em termos de mobilidade da região, conforme sublinhou a testemunha V…, a minutos 02:06:55,120: “Sim, porque nos conhecemos mais ou menos o território, ou melhor, muito bem o território, porque estamos cá muitos anos, não é, e portanto conseguimos perceber onde é que podemos ou não encaixar os autocarros". (NN) Não só a frota proposta pela Recorrente é mais do que suficiente, como existem períodos que as viaturas, por estarem paradas, poderão ser alocadas aos serviços ocasionais. (OO) Com efeito, quando questionada se os 17 autocarros para o Lote 1 e os 9 autocarros para o Lote 2 não vão andar ocupados com o serviço público as 24 horas por dia, esclareceu a minutos 02:08:01 que, "claramente que não, porque há horários que só se fazem de manhã e à noite e durante o dia podemos ocupar os autocarros com outros serviços". Por outro lado, no testemunho (minutos 02:08:36 a 02:10:44) ficou patente que os serviços ocasionais serão uma parte significativa a ter em contra na operação, enquanto fonte de receita, e os pressupostos em que a Recorrente se baseou para fazer as projeções em termos do universo expetável de entidades a que poderá prestar os serviços ocasionais. (QQ) Na medida em a conclusão vertida no ponto 28 do probatório é contrariada pelos testemunhos acima transcrito, deverá ser retirada da matéria de facto provada. (RR) Por outro lado, no ponto 29 do probatório, o Tribunal a quo julgou que, "Assumindo que a operação conjunta do Serviço Público de Transporte de Passageiros (SPTP) de ambos os lotes em conjunto, ou de forma isolada, fosse operacionalmente viável, ainda assim não seria economicamente viável". (SS) Resulta da Sentença Recorrida que o Tribunal a quo valorou a resposta vertida no Relatório Pericial. (TT) No entanto, essa conclusão é contraditória e afastada pela prova testemunha produzida e pelas declarações de parte da sócia-gerente da Recorrente. (UU) A sócia-gerente, a minutos 00:33:29, confirma que o número de autocarros proposto (para os dois lotes) resultou de uma análise técnica da rede. (VV) Do mesmo modo, no que se refere ao número de trabalhadores, explicou como foi possível alcançar o número de trabalhadores a minutos 00:34:22, "Exatamente como calculamos com os serviços, fomos olhar e pusemos ainda mais uns quantos de reserva para casos de baixas, férias, folgas que sejam necessárias para garantír o cumprimento do contrato". (WW) Desde logo, o Tribunal a quo desconsiderou que ficou patente que a CIMBB deixou à liberdade dos concorrentes o risco na exploração da operação. (XX) Assim depôs a testemunha J…, a minutos 00:42:20, "O risco dos meios é do concorrente". (YY) A testemunha V…, a minutos 01:21:56 admite que o modelo financeiro apresentado pela Recorrente do ponto de vista formal funciona e está certo. (ZZ) Por conseguinte, a inviabilidade económica que o Tribunal a quo deu como provada é uma consequência direta da errada valoração da prova testemunhal. (AAA) Impõe-se, por conseguinte, a eliminação do ponto 29 do probatório, porquanto da conjugação do Relatório Pericial, com a prova testemunhal, não resulta provada a inviabilidade económica da proposta da Recorrente, em nenhum dos Lotes a concurso. (BBB) Com efeito, o que o Relatório Pericial desconsiderou foi todo o racional subjacente à elaboração da proposta da Recorrente, mas a que o Tribunal a quo teve conhecimento direto através da prova testemunhal. (CCC) Ora, a minutos 00:21:00, a sócia-gerente da Recorrente esclarece que, "O caminho é exatamente esse, pegamos o anexo um na rede, fomos elencar todas as frequências e todos os percursos que o caderno de encargos nos obrigava a cumprir, colocámo-los no Excel, entretanto organizamos os serviços de acordo a ter uma eficiência de meios, colocamos motoristas, vimos quantos motoristas seriam necessários para fazer essa operação e os respetivos, a respetiva frota, os respetivos veículos e organizamos todos por dias da semana, para percebermos ao longo do ano quantos meios seriam necessários". (DDD) A mesma sócia-gerente, a minutos 00:22:29, esclareceu os impactos financeiros e operacionais de realizar a operação com uma frota nova, "Há muito menos custos de manutenção e os custos são muito mais controlados. Ainda para mais, se o fornecedor tiver alinhado connosco conseguimos controlar bastante bem esses custos e não terem previstos porque é uma frota nova, garante mais fiabilidade e segurança no serviço". (EEE) E, no que refere aos trabalhadores, uma parte fulcral da operação, esclareceu a minutos 00:23:23, que "Nós [inaudível] disponibilizou um quadro de pessoal num dos anexos de que está afeta a operação atualmente, nós somamos esses custos todos, os custos totais dos trabalhadores com os encargos sociais e dividimos pelo número total que vinha nesse quadro de pessoal, portanto encontramos um valor médio por colaborador, aplicamos esse valor médio ao número de meios humanos que nós dissemos que necessitávamos, que tínhamos dimensionado para cada lote e foi assim que encontramos o resultado dos custos com o pessoal". (FFF) O erro de julgamento do Tribunal a quo, vertido no ponto 29 do probatório, é ainda mais flagrante quando analisado o depoimento da testemunha M…, que a minutos 01:08:48 explicou detalhadamente os pressupostos financeiros da proposta da Recorrente: "Naturalmente, não foi assim, não é, nós construímos as projeções com base não só em alguns pressupostos que decorriam de encargos, mas também sobretudo com aquilo que foi a informação e a própria experiência da V…, que é um player do setor já com uma antiguidade significativa, como todos sabemos. Basicamente o que nós fizemos foi, olhamos em primeiro lugar para as receitas e depois para os custos. Eu não posso especificar os números que não tenho de memória, mas nas receitas basicamente o que nós fazemos, nós segregamos as receitas em três subsegmentos. O primeiro segmento correspondia àquilo que é denominado da compensação financeira, basicamente é oferta de preço que o candidato apresenta no ano do concurso público, isso mais à frente nós colocamos um bocadinho como diferença do [inaudível] centro, já lá irei. Numa segunda camada de receitas, consideramos a receita decorrente da bilhética e aquilo que nós definimos como pressuposto foi avaliar, com base no histórico, quantos bilhetes era possível obter de renda por ano por viatura, e depois o preço do bilhete, sempre que o preço do bilhete também era, enfim, um dado do modelo, não foi uma [inaudível] nossa, estava estipulado, portanto isto no que respeito à segunda camada de receitas. Temos uma terceira camada de receitas, que nós denominamos como serviços ocasionais, aqui o que fizemos, quer num lote quer no outro, foi considerar, com algum nível, pelo que senti no âmbito nos termos da feitura da projeção com algo nível de conservadorismo, consideramos que cada viatura, em função de ter muito tempo disponível, durante a semana apenas era capaz de realizar 1,5 serviços ocasionais por semana, isto dá 78 por ano, mas acho que é isto. E portanto, nós fizemos isto, enfim, com algum conservadorismo pelas informações que recolhemos, um serviço por viatura ou um serviço e meio por viatura por semana parece-nos baixo, pareceu-nos baixo na altura. Ainda assim consideramos isto desta maneira, e obrigamos a que estes serviços fossem à semana para também não pesássemos na estrutura de custos com custos adicionais, naturalmente porque, no âmbito do nosso staff, se fosse fora da semana, os custos também seriam diferentes. E portanto, foram estas três categorias de receitas que nós consideramos. Consideramos ainda que no respeito ao preço da compensação financeira e ao valor da bilhética, consideramos uma taxa de atualização anual de acordo com a taxa de inflação, que nos parece relativamente natural, e creio que de memória foi um pouco isto. Não sei se respondi à sua pergunta". (GGG) Relativamente aos custos, a minutos 01:16:13, a mesma testemunha esclareceu, inequivocamente, o Tribunal a quo que: "Pronto, então se permite, eu há bocadinho estava a explicar o tema das receitas, como nós fazemos esta geração das receitas, depois em seguida o que fizemos foi olhamos para estrutura de custos. Nas estruturas de custos num negócio como estes, as duas grandes fontes de custo são os custos com pessoal. Isto também era dado, nós damos em conta esse fator, e dimensionamos as equipas de um lado e do outro com base naquilo iríamos receber do incumbente. Consideramos também que os custos salariais iriam aumentar de acordo com a taxa de inflação, portanto isto no âmbito de custos com pessoal. No gasóleo, que é um aspeto muito relevante neste tipo de atividade, como sabemos, nós consideramos que cada viatura iria ter um consumo médio de 30 litros aos 100 e consideramos ainda o preço do gasóleo na altura da direção geral de energia que era 1,46,1,48 por aí". (HHH) Ora, se a Recorrente - partindo dos pressupostos do Caderno de Encargos - considerou as receitas e os custos, projetando as receitas que irá auferir em termos de compensação financeira, a receita de bilhética e ainda os serviços ocasionais, não se compreende em que medida o Tribunal a quo deu como provada a inviabilidade económica da proposta da Recorrente. (III) Inclusivamente, tendo em conta as projeções da operação e do Caderno de Encargos, a Recorrente poderia até ter ido mais longe na sua proposta, no entanto como referiu a testemunha M…, a minutos 01:13:44, "Nós tentamos colocar o conservadorismo nas projeções, sim, de facto". (JJJ)Aliás, relativamente a estes custos a sócia-gerente da Recorrente esclareceu que foram devidamente plasmados na documentação entregue aos peritos. Conforme referido a minutos 00:18:40, "Não, houve mesmo um documento que foi feito, em Excel naturalmente, e parte dele foi disponibilizado aos peritos que elaboraram o relatório pericial e ao qual pedimos aos peritos reserva e confidencialidade porque ali encontra-se o segredo do negócio, ali está espelhada a forma como vamos fazer a operação, mas demonstram-me por a + b aos peritos que os custos estão lá tudo e que a operação consegue ser feita com aqueles meios". (KKK) Na medida do possível, e salvaguardando o segredo comercial, a Recorrente disponibilizou aos Senhores Peritos a documentação com os custos devidamente identificados. (LLL) Portanto, foi a partir do binómio custos/receitas que a Recorrente construiu a sua proposta. (MMM) Nesse sentido, a minutos 00:26:29, a sócia-gerente da Recorrente afirma que: "Consigo. Fomos ver... temos receitas da bilhética, ou seja de passes e bilhetes passados aos passageiros à boca do autocarro. Essa bilhética veio [inaudível] no anexo de demografias, sobre a demografia e o número de passageiros transportados, com base nesses valores vamos calcular o valor da receita tarifária, adicionalmente calculamos um valor para as atividades acessórias, neste caso os ditos serviços ocasionais que falávamos há pouco, e são essas as receitas, e prevemos um valor de receitas, custos menos de receitas deu-nos o valor do veículo quilómetro". (NNN) Os valores apresentados pela Recorrente foram claros, e demonstram inequivocamente a rentabilidade e viabilidade económica da proposta. (OOO) Veja-se as declarações a minutos 00:28:59: "Consideramos. Temos uma margem razoável que ao fim dos 5 anos de contrato, temos um resultado líquido acumulado de cerca de 1.420.000 (um milhão, quatro centos e vinte mil) para o lote 1 e para o lote 2 um resultado líquido acumulado de 959,000 (nove centos e cinquenta e nove mil) euros". (PPP) E ainda a minutos 00:29:57: "Não, não, em todos os anos é positivo, começa no lote um com 127.00 € e vai crescendo até aos 488.000 € no lote 5, no ano 5, no lote dois começa nos 105.000 depois cresce até aos 288, sempre positivos". (QQQ) Assim, outra alternativa não resta do que a eliminação do ponto 29 do probatório uma vez que é inverídica a afirmação de que não será economicamente viável a operação, nos moldes propostos pela Recorrente. (RRR) Incorre também o Tribunal a quo em erro de julgamento, no ponto 20 do probatório, quando dá como assente que: "Nas propostas da Autora, não são identificados nem quantificados os seguintes gastos: a) Investimento em bilhética, nomeadamente, suportes físicos, validadores ou sistemas de venda em cumprimento do disposto no Anexo 3 do Caderno de Encargos; b) Informação ao público, nomeadamente, sinalética, cartazes e demais suportes de informação ao público; c) App e sistemas de informação. Como mapas, horários, etc., de acordo com o disposto no Anexo 3 do Caderno de Encargos; d) Serviço de atendimento ao cliente; e) Instalação e manutenção de postaletes (de acordo com o Anexo 5); e f) Sistema de apoio à exploração". (SSS) Neste ponto do probatório, o Tribunal a quo valou, erradamente, a prova documental constante a folhas 1333 a 1371 do PA, e uma vez mais, as conclusões vertidas do Relatório Pericial. (TTT) No entendimento da Recorrente, antes de mais, o Tribunal a quo incorre em uma contradição lógica. (UUU) É que, por um lado, no ponto 6 do probatório dá como assente que o Programa do Concurso "apenas veio exigir” a apresentação de "Proposta de Exploração do Serviço Público (elaborada em conformidade com o Anexo II do Programa do Concurso - o qual corresponde a uma declaração na qual as concorrentes, em suma, apenas tinham de indicar (i) o preço do valor unitário por veículo quilómetro a título de compensação por obrigação de serviço público e (ii) a idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal)". (VVV) No entanto, no ponto 20 do probatório dá como provado que a proposta da Recorrente não apresenta determinados “gastos” quando, verdadeiramente, tal não era exigido pelo Programa do Concurso. (WWW) Por outro lado, a sócia-gerente da Recorrente admitiu, respetivamente a minutos 00:17:39; 00:17:43; 00:17:52; 00:17:57; 00:18:01 e 00:18:07 que foram indicados os custos com frota, trabalhadores, sistema de apoio à exploração, combustível, sistema de informação ao público e custos com o sistema elétrico. (XXX) E a minutos 00:18:21 e 00:18:26 a mesma sócia-gerente afirmou que foram também considerados os custos com abrigos e pistoletos e com a criação de um website e com uma app. (YYY) A testemunha M…, a minutos 01:19:07, reiterou os custos que a Recorrente teve como pressuposto na formulação da proposta: “Então nós temos depois, consideramos ainda mais alguns custos, nomeadamente o seguro da viatura, os custos de manutenção que apesar de serem viaturas novas, ah, terão sempre algumas [inaudível]. Já não tenho isto de memória tenho, tenho isto apontado. Mas consideramos que 100 € por viatura por mês. Hum. E depois consideramos ainda uma fatia destas menos relevantes, talvez mais relevante, para incorrer com os custos de, da bilhética, da interação com, com o utente, ou seja [inaudível], com os cursos também importantes dos serviços partilhados porque ao fim ao cabo estaremos a contar com o apoio da v… para toda aquela parte mais administrativa, operacional, faturação... e portanto temos aí uma fatia, diria não despicienda quer no lote um, quer no lote dois para este tipo de encargos. Eu acho que era.". (ZZZ) Novamente, fica demonstrada a falta de rigor do Tribunal a quo na apreciação e valoração da prova produzida em sede de audiência final de julgamento, sendo que a partir daí aplicou erradamente o instituto do preço anormalmente baixo aos presentes autos. (AAAA) Quando, em bom rigor, o conceito de preço anormalmente baixo é indeterminado e para o seu preenchimento (ou não) relevam todas as circunstâncias que a Recorrente seja capaz de convocar, nomeadamente as suas vantagens, técnica e financeira. (BBBB) Com efeito, não estando a Recorrente, vinculada às "amarras" de um liminar de anormalidade, poderia, livremente, construir a sua proposta dentro da liberdade negocial e concorrencial pressupostas no CCP. (CCCC) De resto os indícios de anormalidade são de tal maneira insuficientes - limitam-se ao tal modelo económico-financeiro da CIMMB que nunca ninguém viu - que, se por exemplo, nos reportássemos ao anterior critério supletivo fixado inicialmente no CCP, a proposta da Recorrente não seria considerada anormalmente baixa. (DDDD) Mas, ainda mais importante, em sede procedimental própria a Recorrente respondeu aos esclarecimentos solicitados pelo Júri, nos precisos termos em que foram formulados, tendo carreado prova documental bastante, confirmada pela prova testemunhal de que a proposta não apresenta nenhum carácter anómalo. (EEEE) Contrariamente à CIMMB que, nem em sede de Relatório Preliminar, ou Final, e muito menos testemunhal, conseguiu ir além de meras ilações descontextualizadas, não tendo, jamais, apresentado cálculos que refutam os apresentados pela Recorrente. (FFFF) O que a Recorrente fez no procedimento, e na ausência de quaisquer vinculações procedimentais em sentido contrário, foi apresentar a melhor proposta, ainda que comercialmente agressiva, do ponto de vista operacional, financeiro e ambiental, e por causa disso, não pode ser ilegalmente excluída. (GGGG) O desacerto do Tribunal a quo é ainda potenciado por não ter aplicado corretamente o princípio da imparcialidade. (HHHH) Este princípio surge violado porque, pese embora a proposta da Contrainteressada também apresente um desvio relativamente ao preço base, não se sabe com que fundamento, o Júri decidiu restringir o subprocedimento à proposta da Recorrente. (MM) Se o tivesse feito, o Júri teria a inegável vantagem de, efetivamente, confrontar as soluções dos dois concorrentes, nomeadamente, melhor teria percebido o motivo da discrepância entre as mesmas. (JJJJ) Ao ter renunciado a essa possibilidade, a proposta da Contrainteressada partiu, na sua avaliação, numa posição de vantagem porquanto a CIMMB, sem qualquer indagação adicional deu como bons os pressupostos dessa proposta. (KKKK) Por fim, o Tribunal a quo desconsiderou as dimensões relevantes dos princípios da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público. (LLLL) Começando pelo princípio da prossecução do interesse público, naturalmente que a adjudicação de uma proposta mais cara, e que oferece piores garantias de sustentabilidade ambiental, em detrimento da proposta da Recorrente que, para além de ser mais vantajosa do ponto de vista financeiro, apresenta uma frota nova, e permitirá obter as vantagens do ponto de vista operacional que dispõe em função dos seus muitos anos de experiência, de modo algum garante o interesse público que é, afinal, selecionar a melhor proposta. (MMMM) O princípio da concorrência impõe não só a abertura dos procedimentos a um número maior de concorrentes, como exige o afastamento de causas de exclusão arbitrárias e injustificadas. (NNNN) É neste domínio em que o Júri, irremediavelmente, acabou por se enveredar ao cair na tentação de excluir ilegalmente a proposta da Recorrente. (OOOO) O que deveria ser um procedimento aberto, na verdadeira aceção do termo, acabou por não acontecer porquanto as propostas da Recorrente e da Contrainteressada não estiveram sujeitas às mesmas condições, visto que somente o conhecimento do seu teor o Júri abriu o subprocedimento unicamente dirigido à Recorrente. (PPPP) Violando, pois, o princípio da igualdade. Nestes termos e nos demais de Direito, requer- se a V. Exas que seja concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, seja revogada a Sentença recorrida.”. A recorrida “CIMBB” apresentou contra-alegação de recurso, que concluiu nos seguintes termos: “VIOLAÇÃO DO ÓNUS DE ESPECIFICAÇÃO A. A Recorrente vem pôr em causa a Sentença alegando errada valoração da prova produzida, mas o recurso causa a maior estupefação de tão desprovido de fundamento que é. B. Pese embora o recurso seja formalmente interposto tendo por objeto a revisão da Sentença por errada valoração da prova produzida, a Recorrente não contesta um único ponto dos pontos da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal. C. As alegações são completamente genéricas em matéria de reapreciação da prova gravada e na identificação da matéria de prova posta em causa. D. Primeiro, cita dez factos dados como provados na Sentença; e, depois, cita trechos da prova gravada ao longo de todas as alegações, sem se estabelecer o relacionamento dessa prova gravada e a matéria dada como provada ou não provada. E. A Recorrente deveria ter indicado de forma precisa e direta os pontos da matéria de facto dada como provada postos em crise, o motivo, e a formulação correta pretendida. F. Em nenhum ponto das suas alegações indica, em relação a esses factos, por que motivo ou de que forma os coloca em causa, nem de que maneira é que a reapreciação da prova gravada deveria modificá-los, pelo que se fica sem saber quais os factos dados como provados que são postos em causa, de que forma e porquê. G. Nem tão pouco diz que outros factos que não foram dados como provados o deveriam ter sido com base na prova gravada. H. O que a Recorrente realiza nas suas alegações é uma mera revisitação dos seus argumentos de Direito sobre cada um dos vícios que imputa ao ato de adjudicação, ainda que acompanhada de citações de declarações das testemunhas. I. Fica-se, pois, sem perceber quais os factos dados como provados que são postos em causa, e de que forma. J. «Cabe ao apelante que pretende impugnar a decisão de facto o ónus de delimitar o respetivo objeto, indicando com precisão os pontos concretos que questiona, e de fundamentar o recurso, apontando os meios probatórios que impunham decisão diversa» (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.07.2019 (Proc. n.° 121/06.6TB0BR.Pl.SI, disponível em www.dqsi.pt; cfr. também Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09.12.2021 (Revista n.° 9296/18.0T8SNT. Ll.SI - 2.a Secção): «A impugnação da decisão de facto, feita perante a Relação, não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente os factos e a prova valorada em l.a instância, razão pela qual, se impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objeto do recurso e à respetiva fundamentação»; e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.11.2021 (Revista n.° 391/17.4T8GMR.G1.SI - 7.a Secção) : «Entre os aspetos ou dimensões do ónus de delimitação do objeto e de fundamentação concludente da impugnação está a indicação dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões») . K. A impugnação da decisão de facto não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente os factos e a prova valorada em primeira instância, razão pela qual, se impõe ao recorrente um especial ónus de especificação. L. A Recorrente manifestamente não satisfez esse seu ónus de especificação, pelo que deve ser rejeitado o seu recurso quanto à reapreciação da prova gravada. A EXTEMPORANEIDADE DO RECURSO M. Apesar de formalmente ter intentado o seu recurso com o propósito de obter a reapreciação da prova gravada, o recurso verdadeiramente não tem por objeto a revisão da matéria de facto. N. O recurso tem apenas por objeto o erro de julgamento da Sentença recorrida por incorreta interpretação ou aplicação do regime jurídico vigente. O. O recurso interposto é na verdade meramente de Direito, porque o que a Recorrente pede que o Tribunal de recurso faça é uma diferente valoração da matéria dada como provada. P. O recurso não tem por objeto a modificação dos factos dados como provados conforme enunciados naquele capítulo da Sentença, com fundamento na reapreciação da prova gravada. Q. A Recorrente limita-se ao longo das suas alegações fazer citações da prova gravada entrecortadas com argumentação de Direito, o que não constitui uma verdadeira impugnação da matéria de facto. R. A reapreciação da prova gravada não pode ser considerada como verdadeiro objeto do recurso. S. A Recorrente interpôs o seu recurso fazendo uso do mecanismo de extensão de prazo previsto no artigo 144.°/4 do CPTA para os recursos que tenham por objeto a reapreciação da prova gravada. T. O uso desse prazo adicional para interposição de recurso pela Recorrente é abusivo, porque o seu recurso efetivamente não tem por objeto o previsto nessa disposição legal. U. Tendo o recurso apenas por objeto o erro de julgamento com razões de direito, o mesmo deveria ter sido interposto no prazo de 15 dias previsto no artigo 147. °/l do CPTA. V. O recurso apresentado é, por esse motivo, extemporâneo, devendo consequentemente ser rejeitado. INEXISTÊNCIA DE ERRO DE JULGAMENTO W. A Recorrida mantém integralmente a matéria de facto estabelecida na Sentença recorrida, que se dá por integralmente reproduzida. X. A Sentença recorrida refere expressamente de que forma a prova produzida foi mobilizada para dar os factos como provados no Capítulo III «Fundamentação», «De facto - 1. Factos provados». Y. À cabeça, esteve a prova documental e, logo de seguida, a prova pericial, através de Relatório Pericial cuja robustez científica e credibilidade não mereceram reservas, face à especial qualificação e competência dos Senhores Peritos. Z. O juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador, e não foi produzida prova documental nem testemunhal que contradiga as conclusões firmadas no dito Relatório Pericial. AA. A prova testemunhal foi valorada pelo Tribunal, orientando o seu juízo pelas regras da experiência comum. BB. O Tribunal valorou essa prova com a liberdade que lhe está atribuída e formou a sua convicção livremente. CC. A Recorrente pretende que este Tribunal desvalorize os juízos e conclusões plasmados num Relatório Pericial elaborado por um colégio pericial independente, quando foi a própria Recorrente que requereu ao Tribunal a realização dessa perícia. a) Falta de Fundamentação DD. Não há qualquer elemento probatório testemunhal que demonstre ter ocorrido o vício de falta de fundamentação. EE. Não houve qualquer violação do dever de fundamentação, não sendo verídico que não seja possível nos Relatórios Preliminar e Final descortinarem-se as concretas razões que levaram o Júri a decidir como decidiu. FF. O Relatório Final contém o juízo valorativo efetuado pelo Júri, a transmissão escorreita do fio condutor da análise deste órgão sobre a inviabilidade de execução do objeto das concessões aos preços propostos. GG. O Relatório Final exterioriza, em termos claros, objetivos e lógicos, um discurso fundamentador explicativo, que nada tem de obscuro, contraditório ou insuficiente. HH. O Relatório Final começou por analisar a suficiência dos meios que a Recorrente declarou querer afetar à execução do serviço público de cada Lote, de acordo com os esclarecimentos e elementos documentais fornecidos pela própria. II. O Relatório Final tem, pois, um discurso justificativo da exclusão das propostas assente em raciocínios fundamentadores e explicativos, que revelou de forma completa, clara e coerente o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo Júri. JJ. O Júri considerou os esclarecimentos prestados pela Recorrente: ponderou-os, teve-os em consideração, sem negligenciar qualquer um deles. KK. O Júri citou e respondeu aos esclarecimentos e argumentos apresentados pela Recorrente em fase de audiência prévia, um a um, tendo o Júri procedido à avaliação e valoração de todos eles. LL. Por isso, não merece provimento o recurso apresentado quanto à verificação do vício de erro de julgamento por falta de fundamentação. b) Violação dos artigos 70.°/2-e), 71.°, 146.° e 147.° do CCP MM. A questão de fundo sub judice é saber se as propostas apresentadas pela Recorrente tinham ou não preços ou custos anormalmente baixos. NN. A Recorrente apresentou as suas propostas aos dois lotes, com os seguintes preços: Lote 1, € 1,19; Lote 2, € 0,69. OO. Os preços propostos pela ora Recorrente eram percentualmente mais baixos do que os respetivos preços base em: Lote 1, 63,9%; Lote 2, 70,8%. PP. A própria Recorrente confessa no artigo 55.° da PI que os preços por si apresentados podem ser considerados baixos. QQ. Dado serem substancialmente abaixo dos respetivos preços base, o júri ajuizou que cada preço pudesse ser insuficiente para cobrir os custos inerentes à execução do contrato respetivo. RR. A Recorrente prestou esclarecimentos e forneceu documentos, revelando a estrutura de meios e custos que pretendia movimentar para executar cada contrato. SS. O júri constatou que subjacente às propostas da Recorrente estava a intenção de recorrer a uma quantidade de meios que seria insuficiente para explorar todo o serviço público em cada contrato posto a concurso. TT. Na proposta da Recorrente respeitante ao Lote 1 verifica-se uma diferença de pelo menos 2 viaturas no dimensionamento da frota, o que se traduziria em constrangimentos no deficiente cumprimento do nível de serviço público requerido. UU. Na proposta da Recorrente respeitante ao Lote 2 verifica-se uma diferença de pelo menos 8 viaturas no dimensionamento da frota, o que levou a considerar que o número de viaturas não permite assegurar o cumprimento do nível de serviços. VV. O Júri entendeu que as propostas tinham preços anormalmente baixos, já que esses preços apenas pressupunham custos com uma quantidade de meios materiais e humanos que seriam insuficientes para explorar todo o serviço público. WW. Entendeu também que sobrestimavam as receitas, nomeadamente quanto aos serviços ocasionais, o que punha em causa a sua sustentabilidade financeira. XX. Os preços propostos pela Recorrente só eram possíveis pelo incumprimento dos contratos a celebrar, caso contrário seriam mais altos, pelo que devem considerar-se «preço anormalmente baixo». YY. A tese da Recorrente sobre a ausência de um critério de preço anormalmente baixo nas peças do concurso e, em consequência, da impossibilidade de o Júri o sindicar sem esse respaldo, corresponde ao entendimento que uma parte minoritária da jurisprudência e da doutrina antigamente defendiam acerca do regime do preço anormalmente baixo. ZZ. O procedimento pré-contratual sub judice foi lançado após a entrada em vigor da Lei n.° 30/2021, cuja letra do artigo 71.° acolheu a visão maioritária da jurisprudência e da doutrina. AAA. É hoje inequívoco perante a letra da lei e do entendimento da maioria da doutrina e da jurisprudência, que na falta de indicação expressa de um critério, a entidade adjudicante está vinculada a verificar se há indícios de existência dessa anomalia: o Júri tinha por força do disposto no artigo 71.° do Código dos Contratos Públicos o dever de analisar, de forma casuística e com a necessária discricionariedade, as propostas apresentadas. BBB. O Relatório Pericial afirma de modo inequívoco e irrefutável que as propostas apresentadas pela Recorrente tinham preços ou custos anormalmente baixos. CCC. O Relatório Pericial resultante da prova pericial afirma inequivocamente que ambas as propostas apresentadas pela ora Recorrente no Concurso Público eram «operacional e financeiramente inviáveis». DDD. Não só a Recorrente não demonstrou que as suas propostas apresentadas não tinham preços ou custos anormalmente baixos, como aliás ficou provado que elas tinham efetivamente preços ou custos anormalmente baixos. EEE. Não existe qualquer elemento probatório oferecido pela Recorrente que aponte para a viabilidade operacional ou financeira das propostas por si apresentadas no procedimento; em particular, as testemunhas oferecidas pela Recorrente e por si citadas nas alegações nunca fizeram o exercício demonstrativo da viabilidade operacional e financeira das propostas apresentadas. FFF. Por outras palavras, não há no processo qualquer elemento de prova documental ou testemunhal que contradiga o Relatório Pericial, nem os Relatórios do Júri, com os quais o Relatório Pericial concorda. GGG. Não se verifica qualquer vício de violação do disposto nos artigos 70.º/2-e), 71.°, 146.° e 147.° do CCP, devendo manter-se a Sentença recorrida. c) Violação do princípio da transparência HHH. Não é verdade que o ato de adjudicação tenha ofendido o princípio da transparência previsto no artigo l.°-A do Código dos Contratos Públicos. III. A Recorrida já havia explicado o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo Júri no Relatório Final e no ato de adjudicação. 333. É falso que o Júri tenha feito uma comparação entre o Modelo Financeiro da Recorrente e o modelo financeiro elaborado pela Recorrida. KKK. Também é falso que a exclusão das propostas da Recorrente tenha tido por fundamento essa comparação. LLL. A exclusão resultou da impossibilidade intrínseca das propostas apresentadas pela Recorrente darem execução aos contratos a celebrar. MMM. Essa impossibilidade advém do facto de os custos assumidos pela Recorrente serem insuficientes para executar os contratos. NNN. 0 Júri detetou tal insuficiência ao analisar os esclarecimentos e elementos prestados pela própria Recorrente. OOO. A menção ao modelo financeiro da Recorrida no Relatório Final foi meramente contextual, para revelar a origem da suspeita inicial sobre a sustentabilidade das propostas. PPP. O modelo financeiro da Recorrida não fundamentou nem determinou a exclusão, pelo que não tinha de ser dado a conhecer à Recorrente. QQQ. A Recorrente não foi prejudicada por não conhecer esse modelo, inexistindo qualquer violação do princípio da transparência. RRR. Assim, não ocorreu erro de julgamento quanto à aplicação do princípio da transparência, devendo a Recorrida ser absolvida do pedido. d) Violação do princípio da imparcialidade SSS. É falso que o Júri tenha atuado de forma parcial ou que a decisão de exclusão revele qualquer parcialidade. TTT. Não há qualquer vestígio factual que suporte a ideia de que a exclusão das propostas não resultou de uma conduta imparcial. UUU. O Júri atuou em conformidade com a jurisprudência nacional, nomeadamente o Acórdão do TCA Sul de 05.05.2022 (Proc. n.° 590/21.4BESNT) . VVV. A objetividade da decisão está patente no Relatório Final, por ter resultado do confronto entre os dados das propostas e o caderno de encargos. WWW. O Júri não procurou motivos para excluir a Recorrente; limitou-se a analisar os elementos fornecidos pela própria Recorrente. XXX. A neutralidade da decisão decorre do facto de ter sido desinteressada de qualquer resultado final expectável. YYY. A transparência da decisão encontra-se assegurada pela fundamentação constante do Relatório Final. ZZZ. O Júri apenas solicitou esclarecimentos à Recorrente porque só as suas propostas apresentavam preços considerados anormalmente baixos. AAAA. Não existe obrigação legal de solicitar esclarecimentos a propostas que não revelem preços anormalmente baixos. Não ocorreu, assim, qualquer violação do princípio da imparcialidade, devendo a Sentença recorrida ser confirmada. e) Violação dos princípios da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público CCCC. É falso que o Júri tenha violado os princípios da igualdade e da concorrência ao solicitar apenas à Recorrente esclarecimentos sobre os preços das suas propostas. DDDD. O Júri não avaliou as propostas; limitou-se a analisá-las para efeitos de admissão ou exclusão, em conformidade com os artigos 70.° e 71.° do CCP. EEEE. A análise das propostas é um exercício individualizado, absoluto e intrínseco, não sendo comparativo, pelo que o Júri está legalmente vedado de analisar uma proposta à luz dos atributos de outra. FFFF. O pedido de esclarecimentos à Recorrente resultou unicamente do facto de as suas propostas se afigurarem anormalmente baixas. GGGG. Não se verifica violação do princípio da igualdade, que só ocorreria se tivesse havido tratamento diferenciado de situações idênticas. HHHH. Também não ocorreu qualquer violação do princípio da concorrência, pois o procedimento não foi organizado para favorecer ou desfavorecer concorrentes. IIII. O legislador impõe a exclusão prévia de propostas com preços anormalmente baixos, por serem insuscetíveis de avaliação comparativa. JJJJ. Não se verifica violação do princípio da prossecução do interesse público, pois este impõe a adjudicação de propostas viáveis e exequíveis. KKKK. Em suma, não ocorreu qualquer erro de julgamento quanto à aplicação dos princípios da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público, devendo a Recorrida ser absolvida do pedido. Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o Recurso interposto pela Recorrente: a) Ser rejeitado na parte respeitante à matéria de facto dada como provada, por o seu objeto não ser devidamente concretizado e demonstrado, em violação do ónus de especificação; b) Ser rejeitado por extemporaneidade, em virtude de o seu objeto ser exclusivamente de erro de julgamento por incorreta aplicação do direito, devendo ter sido interposto no prazo de 15 dias e sem gozar do prazo adicional de 10 dias previsto no artigo 144. °/4 do CPTA; Caso assim não se entenda, c) Ser julgado totalmente improcedente por não provado, improcedendo os vícios de erro de julgamento por falta de fundamentação, violação dos artigos 70.°/2-e), 71.°, 146.° e 147.° do CCP e, ainda, dos princípios da transparência, da imparcialidade, da concorrência, da igualdade e da prossecução do interesse público. Devendo ser mantida a Sentença recorrida.”. O Digno Magistrado do Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1 e 147.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), relativamente ao recurso interposto pela autora, pronunciou-se no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida. Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência. *II. Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pela autora e recorrente, assim como pela entidade recorrida delimitadas pela alegação de recurso e respetivas conclusões, são as de decidir se: - o recurso apresentado pela autora e recorrente quanto à impugnação da matéria de facto cumpre os ónus previstos no artigo 640.º, n.º 1 do CPC e se o mesmo é tempestivo; - a sentença recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto; - a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento por ter considerado que o ato impugnado não enferma de vício de falta de fundamentação; - a sentença recorrida incorreu em vício de violação do previsto dos artigos 70. °, n.º 2, alínea e), 71.º, 146.º e 147.º do CCP; e, se, - a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento por violação dos princípios da transparência, da imparcialidade, da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público. III – Fundamentação: 3.1. De facto: Na sentença recorrida foi julgada a matéria de facto com interesse para a decisão, nos seguintes termos: “A) Dá-se como provada a seguinte matéria de facto, relevante para o julgamento do mérito da lide: 1. Por Anúncio de Procedimento n.º 10775/2023, publicado no Diário da República - II Série, n.º 124 de 28.06.2023, e igualmente publicado no Jornal Oficial da União Europeia com o n.º de anúncio no índice do JO 2023/S 124- 391662, foi aberto concurso público internacional para a concessão do serviço público de transporte de passageiros por modo rodoviário na Região da Beira Baixa (“Concurso”), figurando como entidade adjudicante a CIMBB; (cfr. docs. 2 e 3 juntos com a petição inicial; admitido por acordo) 2. O Concurso tem por objeto a concessão do serviço público de transporte de passageiros por modo rodoviário, cada um relativo, a um dos lotes seguintes: a)	Lote 1: constituído pela área geográfica dos Municípios de Vila Velha de Ródão e Proença-a-Nova e respetivas carreiras intermunicipais e inter-regionais; unitário por veículo quilómetro (com uma ponderação de 60%); e (ii) Idade média da Frota (com uma ponderação de 40%); 
 (cfr. doc. 7 junto com a petição inicial; admitido por acordo) (i) Documento Europeu Único de Contratação Pública; (ii) Declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos; (iii) Proposta de Exploração do Serviço Público (elaborada em conformidade com o Anexo II do Programa do Concurso - o qual corresponde a uma declaração na qual as concorrentes, em suma, apenas tinham de indicar (i) o preço do valor unitário por veículo quilómetro a título de compensação por obrigação de serviço público e (ii) a idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal); (cfr. doc. 7 junto com a petição inicial; admitido por acordo) 7. No termo do primeiro terço do prazo fixado para apresentação das propostas, foram solicitados esclarecimentos por parte de dois interessados, bem como identificados erros e omissões nos termos do artigo 61.° do CCP; (admitido por acordo) 8. Tendo a Autora sido uma das interessadas que, para além de identificar erros e omissões, apresentou pedido de esclarecimentos às peças do procedimento; (cfr. docs. 4 e 5 juntos com a petição inicial; admitido por acordo) 9. Um dos pedidos de esclarecimentos que a Autora dirigiu ao Júri do procedimento prendeu-se com a decisão de contratar, tendo a mesma solicitado o esclarecimento seguinte: «Solicita se que se esclareça se existem documentos, designadamente de natureza financeira e operacional, que suportem a decisão de contratar tomada pelo Conselho Intermunicipal da Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa em 01 de junho de 2023. «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» (…)» (cfr. Anexo III do doc. 13 junto com a petição inicial) 25. Com vista a afastar o entendimento do Júri do procedimento, a Autora apresentou todos os elementos solicitados e as respetivas justificações, que passamos a citar: «(…) «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» (…)» (cfr. Anexo V do doc. 13 junto com a petição inicial) 26. Como resulta dos esclarecimentos prestados, a Autora propõe-se explorar o Lote 1 com 17 viaturas, sendo 13 viaturas de tipologia standard e as restantes 4 de tipologia mini e alocar 21 trabalhadores; (cfr. Anexo V do doc. 13 junto com a petição inicial; fls. 1415 e 1418 do PA) 27. Como resulta dos esclarecimentos prestados, a Autora propõe-se explorar o Lote 2 com 9 viaturas, sendo 7 viaturas de tipologia standard e as restantes 2 de tipologia mini e alocar 11 trabalhadores; (cfr. Anexo V do doc. 13 junto com a petição inicial; fls. 1420 e 1424 do PA) 28. A operação isolada do Lote 2, nos termos propostos pela Autora, não é viável, e assumir a operação conjunta dos dois lotes acrescenta um risco de perturbação à operação no Lote 1; (cfr. Relatório Pericial – resposta ao quesito b) e Respostas dos Peritos aos pedidos de esclarecimentos apresentados pelas partes, págs. 4 e 5) 29. Assumindo que a operação conjunta do Serviço Público de Transporte de Passageiros (SPTP) de ambos os lotes em conjunto, ou de forma isolada, fosse operacionalmente viável, ainda assim não seria economicamente viável; (cfr. Relatório Pericial – resposta ao quesito b) e Respostas dos Peritos aos pedidos de esclarecimentos apresentados pelas partes, págs. 4 e 5) 30. A proposta da Autora foi de 1.19 €/ km e de 0,69 €/ km para o lote 1 e 2, respetivamente, o que totaliza 2.412.403 euros e 2.020.548 euros, ou seja, uma redução de 36.07% e 29,23% quando comparado com o preço base de cada um dos lotes postos a concurso; (cfr. Relatório Pericial – resposta ao quesito d)) 31. A proposta apresentada pela N… foi de 1.64 €/km e 0.95 €/km, para os lotes 1 e 2, respetivamente, o que totaliza 3.324.657 euros e 2.781.914 euros, ou seja, uma redução de 11,90% e de 2,56% quando comparado com o preço base de cada um dos lotes postos a concurso; (cfr. Relatório Pericial – resposta ao quesito d)) 32. A proposta da Autora é, nos planos ambiental e de fiabilidade da frota, aquela que oferece maior garantias na execução do serviço público objeto dos contratos de concessão dada a sua reduzida idade média (26 meses e 27 meses, para o lote 1 e 2, respetivamente) e máxima (48 meses, em ambos os lotes), posta ao dispor das operações; (cfr. Relatório Pericial – resposta ao quesito f)) 33. No dia 04.01.2024, a CIMBB disponibilizou na plataforma AcinGov o Relatório Preliminar, do qual se extrata o seguinte: «(…) «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» 
 «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» (…) «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» (…)” (cfr. doc. 13 junto com a petição inicial) 34. Atenta a proposta de exclusão da Autora, a mesma exerceu o seu direito de audiência prévia, tendo apresentado Pronúncia ao Relatório Preliminar, na qual referiu o seguinte: «(…) «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» 
 
 
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 «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» (…)» (cfr. Anexo VII do doc. 14 junto com a petição inicial; admitido por acordo) 35. Após apreciação da pronúncia apresentada pela Autora em sede de audiência prévia, o Júri emitiu e notificou, em 25.01.2024, os concorrentes do Relatório Final e, não acolhendo nenhum dos fundamentos da Pronúncia da Autora, manteve o teor e as conclusões constantes no Relatório Preliminar, isto é, a proposta de adjudicação à N…; (cfr. doc. 14 junto com a petição inicial; admitido por acordo) 36. No que respeita à apreciação da pronúncia apresentada pela Autora em sede de audiência prévia ao Relatório Preliminar, o Júri do procedimento veio referir o seguinte: «(…) «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» 
 «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original»   «Imagem em texto no original» (…)» (cfr. doc. 14 junto com a petição inicial; admitido por acordo) 37. Nesse mesmo dia, a 25.01.2024, a Autora foi ainda notificada, via plataforma AcinGov, de mensagem com o assunto “Notificação da decisão de adjudicação - 17/2023”, da qual constava que: «Nos termos do artigo 77.º do CCP, serve o presente para o notificar da formalização da decisão de adjudicação relativa ao procedimento 17/2023 da Entidade Adjudicante Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa. A decisão de adjudicação realizada não prevê a adjudicação do procedimento à entidade concorrente que representa. Encontra-se igualmente disponível para consulta na plataforma o relatório final». (cfr. doc. 1 junto com a petição inicial; admitido por acordo) 38. A Autora tem a sua sede e as suas oficinas localizadas no concelho do Sabugal; (declarações de parte da Autora) ***2. Factos não provados Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa. ***3. Motivação da matéria de facto No que respeita aos factos provados, conforme especificado nos diversos pontos da matéria de facto provada, a decisão da matéria de facto efetuou-se com base na conjugação dos documentos não impugnados (cfr. artigo 374.º e 376.º do CC), incluindo o processo administrativo, e o relatório pericial integrado pelos esclarecimentos complementares entretanto prestados pelos Senhores Peritos, cuja robustez científica e credibilidade não nos mereceram reservas, face à especial qualificação e competência dos Senhores Peritos, à coerência, contextualização e justificação dos resultados apresentados. Anote-se, a este respeito, que o juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador, e, no caso, não foi produzida prova que contradiga as conclusões firmadas no dito relatório pericial. Adicionalmente, a convicção do Tribunal estribou-se na prova testemunhal e por declarações de parte, orientando o seu juízo pelas regras da experiência comum, e ainda na posição assumida pelas partes em juízo, nos seus articulados (na parte em que foi possível obter a admissão por acordo; cfr. art. 574.º, n.º 2, 1ª parte, do CPC). As declarações de parte da Autora, na pessoa da sua sócia-gerente A…, foram claras e objetivas, tendo versado sobre o modo como foram preparadas as propostas a ambos os Lotes do Concurso, maxime, o cálculo do volume de meios humanos e materiais necessários para o serviço e os custos e receitas esperados com a exploração do mesmo. Referiu que a Autora presta serviço público de transporte pesado de passageiros e serviço comercial (serviços ocasionais), e precisou a área territorial em que atualmente exerce essa atividade (concelhos abrangidos) e os locais onde tem sede e oficinas. A testemunha M…, Economista que assessorou a A. no desenho do plano financeiro/de negócios no âmbito do Concurso, explicou o método de elaboração das propostas da A., na sua dimensão estritamente financeira, tendo recebido para esse exercício alguns dados operacionais já pré-fixados pelos serviços da A., designadamente o número de viaturas e de trabalhadores afeto a cada Lote do Concurso. A testemunha V…, que trabalha para a Autora na qualidade de Chefe de Movimento, afirmou que realizou a análise da rede de transportes, todas as linhas, frequências, horários para a elaboração das propostas da A. aos Lotes do Concurso, para dimensionar os meios operacionais (veículos e trabalhadores) que seriam propostos. Asseverou, de forma genérica e conclusiva, que, com o número de veículos e trabalhadores proposto, será possível à Autora cumprir os níveis de serviço exigidos pelo Caderno de Encargos. A testemunha J…, Professor Universitário na área dos transportes, e Consultor em transportes e mobilidade, que colaborou com a Entidade Demandada CIMBB na definição dos pressupostos e critérios técnicos do procedimento em crise, e apoiou o júri nas suas avaliações técnicas, afirmou que, perante as propostas e aos esclarecimentos prestados pela A., a dimensão da frota por esta alocada não permitia garantir o serviço público cuja concessão foi posta a concurso e os valores de compensação não permitiam fazer face aos custos envolvidos na operação. Mais aventou que, prestados os esclarecimentos às propostas da A., verificou que no Lote 1 eram propostas menos 3 viaturas do que as necessárias e no Lote 2 menos 8 viaturas do que as necessárias, porque quando prepararam o procedimento verificam que meios são necessários de acordo com as frequências e as rotas estabelecidas. Assim, em sua opinião, os custos das propostas das A. estavam subestimados, porque os meios apresentados não eram suficientes para a realização plena do serviço, sobretudo no Lote 2. Ademais, os custos dos serviços complementares (ocasionais) não estavam calculados; só estavam as receitas, não os custos. E não havia meios para os realizar porque estes não eram sequer suficientes sequer para o serviço público regular depassageiros. Sendo, que as receitas dos serviços complementares, previstas pela A., pareceram-lhe muito elevadas. A testemunha V…, Economista que apoiou o Júri na análise económico-financeira das propostas e do modelo base inicial, esclareceu que as questões que se colocavam relativamente às propostas da A. se prendiam com a insuficiência dos meios humanos e materiais aí previstos para o serviço público pretendido pela Entidade Adjudicante, o que tinha reflexos na componente financeira. Afirmou que, em termos financeiros, não fosse a subavaliação dos meios e a sobreutilização de atividades acessórias, o modelo da A. estaria correto. E que, a conclusão da insuficiência de meios se respaldou nos dados de histórico e nos requisitos do serviço estipulados no Caderno de Encargos. A testemunha P…, Chefe de Divisão na CIMBB, que exerceu funções no procedimento concursal como Presidente do Júri, referiu que, após a abertura das propostas, foram pedidos esclarecimentos à A. para avaliar a questão da idade média da frota e que, se concluiu em sede de análise técnica que a proposta da A. ao Lote 1 tinha um défice de 2 veículos e a proposta da A. ao Lote 2 tinha um défice de 8 veículos, o que fez reduzir os custos (com viaturas e com pessoal, também ele associado à dimensão da frota), e explicava o baixo valor das propostas da Autora. Assim, declarou que os membros do Júri e os seus assessores tentaram preencher a rede de itinerários do objeto da concessão, com os dados fornecidos pela A., e não conseguiram. Os depoimentos recolhidos revelaram-se, de modo geral, seguros, claros, assertivos e dotados de razão de ciência, tendo como tal sido sopesados, de acordo com o critério da livre convicção do Tribunal. Todavia, atento o pendor essencialmente técnico e documental da matéria de facto subjacente ao pleito, contribuíram apenas para elucidar o Tribunal sobre o modo como a A. preparou a sua proposta e a metodologia seguida pelo Júri para concluir que as propostas daquela concorrente apresentavam um preço anormalmente baixo. Por isso, acabaram por não fundamentar autonomamente a prova de qualquer dos factos relevantes para a decisão a proferir. *No mais, considera-se não provada, conclusiva, de direito ou sem relevância para a decisão a proferir, a matéria alegada a que se não fez referência. É esta, em suma, a motivação que subjaz ao juízo probatório formulado.”. *3.2. De Direito. Nos presentes autos de contencioso pré-contratual formulou a autora, ora recorrente, V…, Lda. (“V…”) o seguinte pedido: “(i) ser verificada a invalidade e anulada a decisão de adjudicação e, sendo o caso, os contratos que tenham sido celebrados; (ii) ser condenada a CIMBB a retomar o procedimento a partir da análise e avaliação e a admitir a proposta da apresentada pela Autora; (iv) ser determinada a suspensão automática dos efeitos do ato impugnado”. A presente ação foi julgada improcedente, tendo a Entidade Demandada sido absolvida dos pedidos. Inconformada a Autora interpôs recurso desta sentença. *Importa, então, apreciar e decidir o recurso interposto pela autora e recorrente, sendo as questões a decidir, tal como vêm delimitadas pela alegação de recurso e respetivas conclusões, assim como pela contra-alegação e respetivas conclusões as supra enunciadas, em II. *3.2.1. Do invocado erro de julgamento da matéria de facto. Comecemos por apreciar e decidir se a sentença recorrida padece do invocado erro de julgamento da matéria de facto. Alegou a autora e ora recorrente que o Tribunal a quo desconsiderou a prova produzida em sede de audiência de julgamento, não tendo considerado como provados factos de onde facilmente se conclui que a proposta da recorrente não é anormalmente baixa. Referiu que é manifesto que o Tribunal a quo, de maneira acrítica, favoreceu os depoimentos das testemunhas da CIMBB, pese embora as mesmas sejam confusas e, por vezes, contraditórias, contrariamente às testemunhas, e declarações de parte, da recorrente que, com elevado grau de detalhe e precisão esclareceram o Tribunal a quo de todo o racional subjacente à proposta da Recorrente, quer do ponto de vista operacional, quer financeiro. Requereu a ora recorrente a reapreciação da prova gravada - pontos 6, 20, 28 e 29 dos factos provados – dizendo que “deverá este Tribunal Central Administrativo julgar que, efetivamente, a proposta da Recorrente foi formulada com base nas especificações fixadas no Caderno de Encargos, nomeadamente as rotas, percursos e horários, e o quadro de pessoal apresentado, sendo esses os únicos elementos que objetivamente a Recorrente poderia conhecer.”. Defendeu que se impõe dar como provado “que a Recorrente construiu a sua proposta com base numa escala operacional e que, tendo como pressupostos os definidos no Caderno de Encargos, assim como a sua experiência, dimensionou o número de veículos, os recursos humanos, e demais custos, nomeadamente FSE, de modo a assegurar as exigências contratuais”. E requereu o aditamento ao elenco dos factos provados da matéria constante das conclusões Q) e Y) da sua alegação de recurso. Defendeu, ainda, a recorrente que o Tribunal o quo ao não ter feito a avaliação crítica dos depoimentos, apenas considerou como relevantes os depoimentos das testemunhas da CIMBB, e as conclusões do Júri. Por seu lado, a entidade recorrida alegou que a recorrente deveria ter indicado de forma precisa e direta os pontos da matéria de facto dada como provada postos em crise, o motivo, e a formulação correta pretendida. Em nenhum ponto das suas alegações indica, em relação a esses factos, por que motivo ou de que forma os coloca em causa, nem de que maneira é que a reapreciação da prova gravada deveria modificá-los, pelo que se fica sem saber quais os factos dados como provados que são postos em causa, de que forma e porquê. Nem tão pouco diz que outros factos que não foram dados como provados o deveriam ter sido com base na prova gravada. O que a Recorrente realiza nas suas alegações é uma mera revisitação dos seus argumentos de direito sobre cada um dos vícios que imputa ao ato de adjudicação, ainda que acompanhada de citações de declarações das testemunhas. A impugnação da decisão de facto não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente os factos e a prova valorada em primeira instância, razão pela qual, se impõe ao recorrente um especial ónus de especificação, que a recorrente manifestamente não satisfez, pelo que deve ser rejeitado o seu recurso quanto à reapreciação da prova gravada. Mais defendeu a recorrida que a Recorrente interpôs o seu recurso fazendo uso do mecanismo de extensão de prazo previsto no artigo 144.°/4 do CPTA para os recursos que tenham por objeto a reapreciação da prova gravada. O uso desse prazo adicional para interposição de recurso pela Recorrente é abusivo, porque o seu recurso efetivamente não tem por objeto o previsto nessa disposição legal. Tendo o recurso apenas por objeto o erro de julgamento com razões de direito, o mesmo deveria ter sido interposto no prazo de 15 dias previsto no artigo 147. °/l do CPTA, sendo por esse motivo, extemporâneo, devendo consequentemente ser rejeitado. Defendeu, ainda, que a sentença recorrida refere expressamente de que forma a prova produzida foi mobilizada para dar os factos como provados, à cabeça, esteve a prova documental e, logo de seguida, a prova pericial, através de relatório pericial cuja robustez científica e credibilidade não mereceram reservas, face à especial qualificação e competência dos Senhores Peritos. O juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador, e não foi produzida prova documental nem testemunhal que contradiga as conclusões firmadas no dito Relatório Pericial. A prova testemunhal foi valorada pelo Tribunal, orientando o seu juízo pelas regras da experiência comum de acordo com a liberdade que lhe está atribuída e formou a sua convicção livremente. Vejamos. O artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) (1-Aplicável ex vi artigo 140.º, n.º 3, do CPTA, tal como os demais artigos do CPC invocados relativamente aos recursos.), dispõe que “1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”. “Com a nova redacção do art.º 662.º pretendeu-se que ficasse claro que (…) quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente, em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência. (…) a Relação deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem. (2-Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, 2.ª Edição, Almedina, págs. 232-233.)”. O artigo 640.º, n.º 1, do CPC, prevê os ónus que estão a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, nos seguintes termos: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (…)”. No acórdão deste TCA Sul, de 22 de agosto de 2019, proc. n.º 580/18.4BEBJA, consultável em www.dgsi.pt, considerou-se que “a impugnação da matéria de facto e a modificabilidade da mesma pelo tribunal superior não visa alterar a decisão de facto fundada na prova documental ou testemunhal, apenas porque a mesma é susceptível de produzir convicções diferentes, podendo ser diversa a tomada no tribunal superior daquela que teve o tribunal da 1.ª instância. Diferentemente, este tribunal superior só pode alterar a matéria de facto porque as provas produzidas na 1.ª instância impunham, decisiva e forçosamente, outra decisão diversa da aí tomada (cf. art.º 662.º do CPC). Portanto, para a modificação da matéria de facto é necessário que haja uma dada matéria de facto que foi identificada e apreciada pelo tribunal de 1.ª instância e que este tenha exteriorizado a sua convicção na fixação da matéria provada e não provada. Só depois, se face às provas produzidas e para as quais o Recorrente remete, se impuser forçosamente decisão diversa da tomada pela 1.ª instância, há que alterar aquela. Mas terá que se tratar de uma prova firme, indiscutível ou irrefutável, que necessariamente abala a convicção que o tribunal de 1.ª instância retirou da prova produzida. Igualmente, a matéria de facto que se exige fixada e que pode justificar a alteração em sede de recurso é apenas a que releve para a decisão da causa e não qualquer outra que haja sido alegada pelo A. e R. Ou seja, ainda que seja alegada determinada matéria de facto e ainda que a mesma resulte provada nos autos, se a mesma for irrelevante para a decisão a proferir, não há-de ser tomada em consideração pelo juiz em sede de 1.ª instância e tal omissão também não conduz a um erro decisório.”. Não assiste razão à entidade recorrida quando defendeu que a recorrente não cumpriu os ónus de impugnação especificada a cargo do recorrente que impugne a matéria de facto. Com efeito, como resulta do acima referido a recorrente requereu a reapreciação da prova gravada, no que respeita aos pontos 6, 20, 28 e 29 dos factos provados, requereu que sejam aditados dois pontos (que indicou expressamente) ao elenco dos factos provados, assim como que sejam eliminados os n.ºs 28 e 29 dos factos provados. Para tanto, indicou, transcrevendo as concretas passagens da gravação quer das declarações de parte da sua sócia-gerente, quer das testemunhas, que na sua perspetiva impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, assim como a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, cumprindo, assim, os ónus que impõe para o efeito o artigo 640.º, do CPC. Desta forma, não tendo o recurso apenas por objeto o erro de julgamento com fundamento em razões de direito, contrariamente ao defendido pela recorrida, tendo também por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição do recurso e de resposta acrescem 10 dias, em conformidade com o previsto no artigo 144. °, n.º 4, do CPTA, sendo, por isso, tempestivo o recurso apresentado pela autora e ora recorrente. Como acima se referiu a recorrente requereu a reapreciação da prova gravada quanto aos factos provados sob os n.ºs 6, 20, 28 e 29 dos factos provados e o aditamento ao elenco dos factos provados da matéria constante das conclusões Q) e Y) da sua alegação de recurso. É a seguinte a redação do ponto 6 da matéria de facto provada e respetiva fundamentação: “6. Sem prejuízo da extensão do serviço público objeto dos contratos que a CIMBB pretende celebrar ao abrigo do Concurso, o Programa do Concurso apenas veio exigir que, para cada um dos lotes, as propostas - apresentadas por concorrentes que não revestissem a forma de agrupamento - fossem constituídas pelos documentos seguintes: (i) Documento Europeu Único de Contratação Pública; (ii) Declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos; (iii) Proposta de Exploração do Serviço Público (elaborada em conformidade com o Anexo II do Programa do Concurso - o qual corresponde a uma declaração na qual as concorrentes, em suma, apenas tinham de indicar (i) o preço do valor unitário por veículo quilómetro a título de compensação por obrigação de serviço público e (ii) a idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal); (cfr. doc. 7 junto com a petição inicial; admitido por acordo)”. O Tribunal a quo julgou provado o que consta neste ponto 6 do probatório. Referiu a recorrente que face à prova testemunhal produzida, exige-se muito mais, pelo que este ponto foi incorretamente julgado. O que decorre do depoimento da testemunha P…, a CIMB não exigiu um número mínimo de autocarros. No mesmo sentido, vai o depoimento da sócia-gerente da recorrente, que testemunhou que "não havia qualquer referência ao dimensionamento, ao número de meios mínimos necessários para executar a operação" e a testemunha J…, que a propósito dos meios mínimos referiu que "Essa é uma responsabilidade doi operador que o caderno de encargos não prevê.”. Requereu o aditamento ao probatório de um ponto com o seguinte teor “O Caderno de Encargos que a CIMMB disponibilizou aos concorrentes não patenteou o dimensionamento da frota, em termos do número mínimo de viaturas a propor pelos concorrentes para a execução do contrato de concessão”. Sucede que as declarações de parte da sócia-gerente da autora relativamente à interpretação das peças do procedimento, designadamente, do programa do procedimento ou das disposições do caderno de encargos, assim como a interpretação que das mesmas é feita pelas testemunhas não pode sobrepor-se à interpretação do Tribunal, a quem compete julgar a matéria de facto provada e fazer a subsunção dos factos ao direito. Este ponto que a recorrente pretende que seja aditado ao probatório não consubstancia matéria de facto que deva ser levada ao probatório. Será conclusão a extrair dos factos provados ou não provados pelo Tribunal. Atenta a redação do n.º 6 dos factos provados, a qual se mostra fundamentada de forma correta, com base no documento que consubstancia o programa do concurso, e no qual encontra correspondência (cfr. artigo 10.º, n.º 1 do Programa do Procedimento (PP) e modelo constante do anexo II ao PP), documento que as partes não impugnaram, pelo que não se impõe a alteração do mesmo, nem aditar a pretendida matéria ao probatório. Sendo que do probatório, por referência ao programa do procedimento e ao caderno de encargos, consta a factualidade que permite saber quais os documentos e elementos que devem integrar as propostas a apresentar pelos concorrentes. Com efeito, só a matéria de facto que releve para a decisão da causa deve ser julgada provada ou não provada, não sendo de incluir no elenco dos factos matéria conclusiva. Devendo manter-se a redação do n.º 6 dos factos provados, não sendo de aditar o referido ponto à matéria de facto provada. Termos em que não assiste razão à recorrente quanto a este ponto. Referiu a recorrente que na medida em que a conclusão vertida no ponto 28 do probatório é contrariada pelos testemunhos das testemunhas M… e V… deverá ser retirada da matéria de facto provada. E que é notório que o Tribunal a quo considerou apenas o Relatório Pericial e a resposta ao quesito b) e Respostas dos Peritos aos pedidos de esclarecimentos apresentados. Essa conclusão falha quando a Recorrente demonstrou o percurso lógico que fez para apresentar a proposta, quer no Lote 1, quer no Lote 2. O ponto 28 da matéria de facto provada tem a seguinte redação e fundamentação: “28. A operação isolada do Lote 2, nos termos propostos pela Autora, não é viável, e assumir a operação conjunta dos dois lotes acrescenta um risco de perturbação à operação no Lote 1 (cfr. Relatório Pericial – resposta ao quesito b) e Respostas dos Peritos aos pedidos de esclarecimentos apresentados pelas partes, págs. 4 e 5)”. O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão de julgar provado este ponto 28 da matéria de facto com base unicamente no relatório pericial e esclarecimentos dos peritos ao mesmo, como resulta da respetiva fundamentação. Com efeito, no que concerne à componente financeira e à rentabilidade da proposta da autora a testemunha M… prestou um depoimento genérico, com afirmações vagas e desacompanhadas de qualquer elemento ou dado concreto que as sustentasse. Salientando-se que elaborou a proposta financeira com base nos dados relativos ao número de viaturas, de trabalhadores e outros elementos respeitantes a custos e proveitos que lhe foram facultados pela autora, ora recorrente. Não resultando do seu depoimento qualquer concreto elemento factual ou informação fundamentada que permita concluir no sentido propugnado pela recorrente. Quanto à componente operacional a testemunha V… explicou a metodologia utilizada para chegar ao número de viaturas que considerou necessárias para prestar o serviço relativo a cada lote, assim como de motoristas, que serviram de base à suas propostas, isto é, o denominado “plano operacional” da autora, afirmando de forma conclusiva que “com 17 autocarros no lote um e 9 autocarros no lote dois, consegue preencher todos os serviços do Caderno de Encargos”, afirmação esta desacompanhada de qualquer justificação que permitisse comprovar essa afirmação. O mesmo sucedeu com as previsões de rentabilidade quanto aos serviços ocasionais, que não se mostram alicerçadas em factualidade que permita concluir no sentido da probabilidade da correção das mesmas. Razões pelas quais nestes depoimentos não se encontra fundamento para a pretendida eliminação deste ponto da matéria de facto provado. Em rigor deste n.º 28, consta uma conclusão alicerçada nos factos que os Senhores Peritos extraíram dos documentos que as partes juntaram aos autos e que lhes foram remetidos para a realização da perícia. Sublinhe-se, ainda, que na resposta dada ao quesito a) os Senhores Peritos concluíram que “existem rúbricas de custos de atividades inerentes ao objeto do concurso (tal com exposto no ponto 1.) que não estão incorporadas na proposta da Autora”, dando exemplos, tais como “Investimento em bilhética, nomeadamente, suportes físicos, validadores ou sistemas de venda em cumprimento do disposto no Anexo 3 do Caderno de Encargos”, “Informação ao público, nomeadamente, sinalética, cartazes e demais suportes de informação ao público”, “App e sistemas de informação, como mapas, horários, etc., de acordo com o disposto no Anexo 3 do Caderno de Encargos”, “Serviço de atendimento ao cliente”, “Instalação e manutenção de postaletes (de acordo com o Anexo 5)” e “ Sistema de apoio à exploração”, para além de outros custos relativos a pessoal que não foram previstos, designadamente “aumentos salariais associados à progressão de carreira decorrentes da aplicação do CCTV da Antrop”. Sendo que relativamente aos serviços ocasionais são contabilizadas as receitas associadas aos serviços, mas não são incorporados os respetivos gastos. O que permite a conclusão de que “a operação isolada do Lote 2, nas condições propostas pela concorrente VM, não é viável” – cfr. resposta ao quesito b), no relatório pericial e resposta às questões 3 e 5 do documento relativo aos esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos, constante de fls. 2627-2633 do SITAF. Apesar de os Senhores Peritos considerarem que os meios propostos pela Autora, frota e recursos humanos, podem ser adequados à operação constante na proposta quanto ao lote 1, ainda que não seja viável economicamente viável. Conclusões que os peritos extraíram com base na informação facultada, designadamente, pela autora, como resulta do documento relativo aos esclarecimentos prestados pelos mesmos “A informação partilhada pela Autora permitiu aferir as rúbricas de custos consideradas na sua proposta, os meios afetos e os serviços acessórios a prestar”. Os depoimentos das testemunhas M… e V…, pelas razões acima enunciadas, não lograram infirmar as conclusões alcançadas pelos Senhores Peritos, as quais se mostram devidamente fundamentadas e alicerçadas em prova documental não impugnada. Desta forma, atendendo à fundamentação constante do relatório pericial junto a fls. 2479-2497 do SITAF e aos esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos ao mesmo juntos a fls. 2627-2633 do SITAF deve manter-se este ponto na factualidade assente. Defendeu a recorrente que se impõe a eliminação do ponto 29 do probatório, porquanto da conjugação do Relatório Pericial, com a prova testemunhal, não resulta provada a inviabilidade económica da proposta da Recorrente, em nenhum dos Lotes a concurso. Referiu que essa conclusão é contraditória e afastada pela prova testemunhal produzida e pelas declarações de parte da sócia-gerente da Recorrente. O Tribunal a quo desconsiderou que ficou patente que a CIMBB deixou à liberdade dos concorrentes o risco na exploração da operação. O relatório pericial desconsiderou todo o racional subjacente à elaboração da proposta da Recorrente, mas de que o Tribunal a quo teve conhecimento direto através das declarações de parte da sócia-gerente e da prova testemunhal, das testemunhas J…, V… e M…. Mais referiu que “se a Recorrente - partindo dos pressupostos do Caderno de Encargos - considerou as receitas e os custos, projetando as receitas que irá auferir em termos de compensação financeira, a receita de bilhética e ainda os serviços ocasionais, não se compreende em que medida o Tribunal a quo deu como provada a inviabilidade económica da proposta da Recorrente”. Concluiu dizendo que “outra alternativa não resta do que a eliminação do ponto 29 do probatório uma vez que é inverídica a afirmação de que não será economicamente viável a operação, nos moldes propostos pela Recorrente”. É do seguinte teor a redação do ponto 29 da matéria de facto provada e respetiva fundamentação: “29. Assumindo que a operação conjunta do Serviço Público de Transporte de Passageiros (SPTP) de ambos os lotes em conjunto, ou de forma isolada, fosse operacionalmente viável, ainda assim não seria economicamente viável; (cfr. Relatório Pericial - resposta ao quesito b) e Respostas dos Peritos aos pedidos de esclarecimentos apresentados pelas partes, págs. 4 e 5)”. A sócia-gerente, em declarações de parte, explicou a metodologia utilizada para a elaboração das propostas apresentadas, que foi prevista a frota necessária, os motoristas necessários para fazer essa operação, os custos de manutenção, atendendo a que se trata de uma frota nova, os custos totais com trabalhadores, esclarecendo que os respetivos custos foram devidamente plasmados na documentação entregue aos peritos. Referindo-se de forma genérica e conclusiva às fontes de receita, assim como à previsão de resultado líquido anual e acumulado no final dos 5 anos. A testemunha M… explicou os pressupostos financeiros subjacentes à elaboração da proposta da Recorrente, do lado da receita, fez menção a “três subsegmentos”: “compensação financeira”, “receita decorrente da bilhética” e “serviços ocasionais”. Tal como a estrutura de custos – referindo-se, designadamente, aos custos com pessoal e gasóleo. Sucede que os depoimentos da referida testemunha e as declarações de parte, consubstanciam, essencialmente, apreciações que não se demonstrou estivessem alicerçadas em factos, designadamente as respeitantes às projeções da operação, em conformidade com o previsto no caderno de encargos – cfr. designadamente, anexo 1 (Rede de transporte público objeto da concessão), razão pela qual não permitem contrariar as conclusões alcançadas pelos peritos no relatório pericial e respetivos esclarecimentos, as quais para além de apresentarem racionalidade, mostram-se devidamente fundamentadas por referência aos documentos patenteados a concurso, assim como aos documentos remetidos pelas partes, a pedido dos Senhores Peritos. Não sendo possível, designadamente, comprovar “o conservadorismo nas projeções” relativas a serviços ocasionais a que se refere a ora recorrente. Sucede que como referiu a sócia-gerente, os custos foram contemplados em documento “em Excel” e “parte dele foi disponibilizado aos peritos que elaboraram o relatório pericial”, no qual “está espelhada a forma como vamos fazer a operação, mas demonstram-me por a + b aos peritos que os custos estão lá tudo e que a operação consegue ser feita com aqueles meios”. No entanto, com base nos documentos que lhes foram remetidos, os peritos não alcançaram a mesma conclusão, como resulta de forma fundamentada do respetivo relatório e documento relativo aos esclarecimentos. Por outro lado, dos depoimentos das testemunhas V… e J… não é possível formar a convicção de que as propostas apresentadas pela autora, ora recorrente são viáveis, pelo contrário, os seus depoimentos vão no sentido da inviabilidade financeira das mesmas. Em rigor este n.º 29, como já acima referido relativamente ao ponto 28 da matéria de facto, encerra uma conclusão fáctica. Do mesmo consta uma conclusão que os Senhores Peritos extraíram dos documentos que lhes foram remetidos para a realização da perícia. Sendo que, não concluíram os senhores peritos no sentido propugnado pela recorrente que os documentos “demonstram inequivocamente a rentabilidade e viabilidade económica da proposta”. Ao invés, verificaram que “no que se refere aos serviços ocasionais, importa contabilizar alguns custos associados à sua prestação que não constam da Demonstração de Resultados apresentada pela Autora”, designadamente custos com pessoal e manutenção. O que levou à conclusão de que “a inclusão dos custos referidos nos pressupostos do modelo financeiro da Autora torna a operação inviável para o Lote 1 e Lote 2 em operação isolada e em operação conjunta.”. Desta forma, atendendo à fundamentação constante do relatório pericial junto a fls. 2479-2497 do SITAF e aos esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos ao mesmo juntos a fls. 2627-2633 do SITAF deve manter-se este ponto na factualidade assente. Aduziu a recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, ao julgar provada a matéria constante do ponto 20 do probatório, porquanto valorou erradamente a prova documental constante a folhas 1333 a 1371 do PA, e uma vez mais, as conclusões vertidas do Relatório Pericial, incorrendo numa contradição lógica. É que, por um lado, no ponto 6 do probatório dá como assente que o Programa do Concurso "apenas veio exigir” a apresentação de "Proposta de Exploração do Serviço Público (elaborada em conformidade com o Anexo II do Programa do Concurso - o qual corresponde a uma declaração na qual as concorrentes, em suma, apenas tinham de indicar (i) o preço do valor unitário por veículo quilómetro a título de compensação por obrigação de serviço público e (ii) a idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal)". No entanto, no ponto 20 do probatório dá como provado que a proposta da Recorrente não apresenta determinados “gastos” quando tal não era exigido pelo Programa do Concurso. O ponto 20 da matéria de facto tem o seguinte teor: “20. Nas propostas da Autora, não são identificados nem quantificados os seguintes gastos: a) Investimento em bilhética, nomeadamente, suportes físicos, validadores ou sistemas de venda em cumprimento do disposto no Anexo 3 do Caderno de Encargos; b) Informação ao público, nomeadamente, sinalética, cartazes e demais suportes de informação ao público; c) App e sistemas de informação. como mapas, horários, etc., de acordo com o disposto no Anexo 3 do Caderno de Encargos; d) Serviço de atendimento ao cliente; e) Instalação e manutenção de postaletes (de acordo com o Anexo 5); e f) Sistema de apoio à exploração; (cfr. doc. 1333 a 1371 do PA; Relatório Pericial - resposta ao quesito a))”. A fls. 1333 a 1371 do PA consta a proposta apresentada pela ora recorrente, designadamente os anexos 1 e 2, certidão permanente e Documento Europeu Único de Contratação Pública (DEUCP). Saliente-se que do anexo 2, relativo ao lote 1 e ao lote 2, consta a indicação do “valor unitário por veículo quilómetro”, a pagar “a título de compensação por obrigação de serviço público, a pagar nos termos do n.º 1 da Cláusula 73.ª do Caderno de Encargos”, assim como a indicação da “idade média da frota” a utilizar, tal como exigido no programa do procedimento. Refira-se, desde já, que não existe qualquer contradição entre o ponto 6 do probatório, o qual respeita aos documentos que obrigatoriamente devem constituir a proposta que os concorrentes apresentem relativamente a cada lote – cfr. artigo 10.º do Programa do Procedimento, no qual, efetivamente, não se exige que se junte um documento onde se indiquem os custos referidos no ponto 20 do probatório, ou outros como relativos ao custo da frota, gasóleo, manutenção, custos com recursos humanos. O que se exige nesses documentos que devem instruir a proposta, em particular no documento relativo à “Proposta de Exploração do Serviço Público”, elaborado em conformidade com o Anexo II ao PP é que se indique “o valor unitário por veículo quilómetro a título de compensação por obrigação de serviço público e (ii) a idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal)". E a autora, ora recorrente fez indicação. E foi precisamente esta indicação que por se afigurar ao júri que poderia consubstanciar uma proposta de preço anormalmente baixo levou ao pedido de esclarecimentos. Pedido este com enquadramento no subprocedimento a que se refere o artigo 71.º, do CCP, para efeitos de o júri aferir se o preço apresentado pela recorrente pode, efetivamente, ser considerado anormalmente baixo. As declarações da sócia-gerente da recorrente, assim como o depoimento da testemunha M… a propósito dos custos que elencaram como incluídos na proposta careciam de ser documentalmente suportados e em face disso poder-se-ia concluir que se mostravam refletidos nas suas propostas de preço, o que não sucedeu, como alcançou o júri e veio a ser dado como correto pelos Senhores Peritos. Ora, pelo facto de não se exigir no programa de procedimento que a matéria constante do ponto 20 do probatório constitua um documento que deva instruir a proposta, como sucede com os documentos referidos no ponto 6 do probatório, não significa que a proposta não deva refletir os custos a que se refere o ponto 20 do probatório, pelo contrário os mesmos dado que respeitam a serviços a prestar no âmbito da concessão têm um custo que terá de ser suportado e como tal refletido no documento relativo à “Proposta de Exploração do Serviço Público”, ainda que não se refira expressa ou discriminadamente o mesmo, tal como nele não são identificados outros custos, como frota e recursos humanos. Em suma, não resulta evidenciado o erro que a recorrente imputa à decisão pelo Tribunal a quo quanto ao ponto 20.º da matéria de facto provada. Foi, pois, com base nos esclarecimentos prestados pela autora, ora recorrente, que se chegou a essa conclusão, a qual está devidamente demonstrada no relatório pericial e esclarecimentos ao mesmo – cfr. fls. 2479-2497 e 2627-2633 do SITAF, não enfermando a matéria constantes deste ponto 20 de qualquer contradição lógica com a matéria constante do ponto 6, ambos da matéria de facto assente. Em face do exposto, não se pode concluir que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto ao julgar provada a matéria constante do ponto 20 do probatório, por ter valorado erradamente a prova documental constante a folhas 1333 a 1371 do PA e as conclusões vertidas do Relatório Pericial, pelo que deve, também, manter-se este ponto na factualidade assente. Com efeito, a prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial – cfr. artigo 388.º do Código Civil (CC). Como se estabelece no artigo 389.º do CC a “força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal”. Tal como nos termos previstos no artigo 489.º do CPC as perícias são livremente apreciadas pelo tribunal. O que significa que o relatório apresentado pelos peritos fica sujeito à livre apreciação do tribunal (artigo 607.º, n.ºs 4 e 5 e artigo 489.º ambos do CPC). No caso dos autos, estamos perante um relatório pericial elaborado por peritos idóneos, que revelaram imparcialidade e competência na realização da perícia e compreensão do objeto da perícia, sendo o relatório claro, isento de contradições e apresentando-se devidamente alicerçado e fundamentado em prova documental, como fomos referindo a propósito de cada uma dos pontos da matéria de facto impugnada. Não tendo a recorrente logrado demonstrar factos que justifiquem a não aceitação das conclusões do relatório pericial e subsequentes esclarecimentos ao mesmo limitando-se a discordar dos mesmos por no seu entendimento a prova testemunhal permitir alcançar outras conclusões. Trata-se de mera discordância da autora que não tem Tendo o Tribunal a quo formado a sua convicção com base na prova documental junta aos autos, no relatório pericial e adicionalmente, na prova testemunhal e por declarações de parte, como claramente resulta da motivação da decisão da matéria de facto, no âmbito e ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova, e sendo a mesma sustentável e compatível com os meios de prova em causa, este tribunal ad quem não tem fundamento para alterar o decidido. As divergências da recorrente tratam-se de matéria de pura opinião, a qual não se pode sobrepor à convicção do julgador. Deste modo, a impugnação de facto da recorrente não merece acolhimento e a decisão de facto da sentença recorrida permanece intocada. * 3.2.2. Da invocada falta de fundamentação Nas conclusões H) a L) da sua alegação recursória defendeu a autora e ora recorrente que identifica a falta de fundamentação não no simples aspeto procedimental invocado pelo Tribunal a quo quando chama à colação o conhecimento pela Recorrente do itinerário cognoscitivo seguido pelo Júri, mas, pelo desconhecimento das motivações substantivas invocadas para, inicialmente, identificar a proposta da Recorrente como anormalmente baixa, e num segundo momento, para excluir essa proposta. A suficiência da fundamentação deve sempre ser aferida contextualmente. E na economia do procedimento ficou provado, quer documentalmente, quer nos depoimentos de todas as testemunhas, que a CIMBB lançou o procedimento com base num suposto modelo económico-financeiro. A conduta do Júri, e da própria CIMBB, são ilegais a partir do momento em que decidem remeter esse modelo económico-financeiro ao mais profundo secretismo, recusando mesmo a sua disponibilização quando questionado pela Recorrente na fase de esclarecimentos às peças do procedimento. E por isso é violador do dever de fundamentação, quando para afastar os esclarecimentos da Recorrente, o Júri convoca por variadíssimas vezes, os pressupostos desse modelo económico-financeiro, alegando que esses pressupostos da Recorrente são contrários àquele. Para aferir a violação do dever de fundamentação é irrelevante, neste contexto procedimental, que a Recorrente tenha intervindo em sede de audiência prévia. O que é verdadeiramente conclusivo no sentido da sua violação é que a Recorrente não conhece, porque a CIMBB nunca permitiu, os verdadeiros fundamentos técnicos e financeiros vertidos no modelo económico-financeiro, com os quais a sua proposta, segundo o Júri, não está em conformidade. A recorrida defendeu que o relatório final começou por analisar a suficiência dos meios que a Recorrente declarou querer afetar à execução do serviço público de cada lote, de acordo com os esclarecimentos e elementos documentais fornecidos pela própria; tem um discurso justificativo da exclusão das propostas assente em raciocínios fundamentadores e explicativos, que revelou de forma completa, clara e coerente o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo Júri, que considerou os esclarecimentos prestados pela Recorrente: ponderou-os, teve-os em consideração, sem negligenciar qualquer um deles. O Júri citou e respondeu aos esclarecimentos e argumentos apresentados pela Recorrente em fase de audiência prévia, um a um, tendo o Júri procedido à avaliação e valoração de todos eles. Por isso, não merece provimento o recurso apresentado quanto à verificação do vício de erro de julgamento por falta de fundamentação. Vejamos, então, os fundamentos subjacentes ao ato de exclusão da proposta da recorrente para efeitos de aferir se o mesmo padece do vício de falta de fundamentação que a mesma lhe imputou, ou seja para saber se a fundamentação desse ato permite apreender os fundamentos que levaram à sua exclusão. Comecemos por transcrever o excerto da sentença recorrida que analisou este vício de falta de fundamentação que a recorrente imputou ao ato de exclusão da sua proposta, na parte com relevância para a apreciação do vício que a recorrente imputou à sentença recorrida: “Colhe-se do Relatório final que o Júri, após analisar os esclarecimentos escritos e os elementos documentais fornecidos pela A. na sua resposta ao pedido de esclarecimentos previamente formulado, concluiu pela «insuficiência de meios circulantes a afetar às concessões, que subjaz a cada uma das propostas, contamina no mesmo sentido a previsão de outros meios a afetar, revelando existir insuficiência ao nível de recursos humanos e prestação de serviços para o cumprimento das obrigações emergentes do Anexo 1 do Caderno de Encargos». De seguida, concluiu que «os custos das propostas apresentadas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., são insuficientes para cumprir as obrigações contratuais emergentes do Caderno de Encargos, tal como referido no artigo 71.°, n.° 2, do Código dos Contratos Públicos, razão pela qual devem ser excluídas». Bem assim, decorre do Relatório Final que, na perspetiva do Júri, «[o]s esclarecimentos dados pelo Concorrente 2 – V…, Lda., revelam que do outro lado da equação - i.e., das receitas - está posto em causa o equilíbrio económico-financeiro das propostas», porquanto «(...) as receitas dos serviços ocasionais previstas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., são muito superiores às previstas no modelo económico-fnanceiro da CIMBB que constituiu a base de preparação do caderno de encargos para o lançamento do presente concurso público, sendo baseadas num valor de veículo.quilómetro de serviços ocasionais 405% e 149% superiores aos previstos no modelo base para os lotes 1 e 2 respetivamente, muito acima dos valores médios considerados em concursos desta natureza». Por fim, em linha com estes argumentos, ajuizou o Júri que «(...) o preço das propostas apresentadas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., aos lotes para efeitos de compensa.ção por obrigação de serviço público a pagar pela CIMBB (i.e., o preço contratual) é considerado anormalmente baixo por dois motivos: - Desde logo pelas razões antes apontadas, i.e., os valores de compensação por obrigação de serviço público foram calculados tendo em vista cobrir estruturas de custos que, como se viu, estão manifestamente subdimensionadas. Por esse motivo, o preço fica sempre aquém do que seria suficiente para explorar o serviço público de acordo com as exigências resultantes do Anexo 1 do Caderno de Encargos; - Como as receitas dos serviços ocasionais previstas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., estão artificialmente empoladas, como acima se demonstrou, o valor de compensação por obrigação de serviço público a pagar pela CIMBB (o preço) proposto para cada Lote é inferior ao que deveria ser se aquele valor de receitas dos serviços ocasionais estivesse razoavelmente calculado. Por esse motivo, o preço proposto é insuficiente para cumprir as obrigações contratuais emergentes do Caderno de Encargos. Esse mesmo juízo resulta também das considerações anteriores sobre a estrutura de custos apresentada, que se revela manifestamente insuficiente para cumprir as obrigações contratuais (cfr. acima), e das considerações sobre o facto de nas propostas não ter sido contabilizado o número superior e realmente necessário de veículos para a exploração do serviço público; pois se esses custos tivessem sido devidamente ponderados, é forçoso concluir que os custos totais seriam superiores e, consequentemente teriam de ser superiores as receitas a obter pela Concessionária, designadamente o preço proposto para cada lote. Assim, os preços das propostas apresentadas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., são insuficientes para cumprir as obrigações contratuais emergentes do Caderno de Encargos, tal como referido no artigo 71.°, n.° 2, do Código dos Contratos Públicos, razão pela qual devem ser excluídas». Perpassa das linhas citadas, e das demais que vertem o juízo valorativo efetuado pelo Júri, a transmissão escorreita do fio condutor da análise deste órgão sobre a inviabilidade de execução do objeto das concessões aos preços propostos pela A., face aos esclarecimentos aduzidos pela A. no subprocedimento aberto para justificação dos preços. (…) Carece, assim, de acerto a tese da A., no sentido da desconsideração, pelo Júri, dos esclarecimentos justificativos apresentados. As questões nucleares que pontificam na constelação argumentativa entretecida na pronúncia de interessado da ora A., subsequente ao Relatório Preliminar, foram, na sua totalidade ponderadas pelo Júri no Relatório Final, onde foi reiterada a posição antes assumida. Releve-se que o facto de os argumentos da A. não terem sido perfilhados pelo Júri não significa que tenham sido ignorados. Do mesmo modo, convém enfatizar que o Júri não tinha de apreciar, ponto por ponto, a audiência prévia, e rebater cada um dos argumentos terçados pelo interessado, contanto que ponderasse os respetivos contributos. Ora, o Júri ponderou, efetivamente, os contributos aduzidos pela A. no sentido de infletir o sentido do projeto de decisão vertido no Relatório Preliminar. A fundamentação adotada demonstra que o Júri sopesou os nódulos principais da argumentação anteriormente expendida pela concorrente, ora A., e respeitou o seu direito de audiência prévia, cumprindo simetricamente o dever de fundamentar a decisão em diálogo com esses argumentos. A dado passo da p.i., a A. chega mesmo a referir que o Júri do procedimento veio “rejeitar e contra-argumentar todas as justificações apresentadas pela Autora”. A ilogicidade, incoerência e desrazoabilidade apontadas ao ato surgem na p.i. como juízos de valor puramente conclusivos, e, mesmo quando recorre a um “exemplo prático” para ilustrar as suas conclusões, a A. adota uma postura de crítica substantiva, alegando que, ao contrário do invocado pelo Júri do procedimento, “a Autora não deixou de demonstrar e justificar que os recursos se encontram devidamente dimensionados e contabilizados na concessão”. O que se depreende da leitura da p.i. é, aliás, que a A. se inteirou bem do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, com os quais se limita a discordar. Temos, assim, que no caso sub judice, o ato impugnado se mostra devidamente fundamentado, de um ponto de vista formal, com suporte em factos concretos e não meramente conclusivos, fundamentos esses que vieram a ser, no geral, compreendidos pela Autora. O que não obsta, claro está, a que a A. discorde desses fundamentos e dos pressupostos de facto e de direito que estiveram na base do ato sindicado, mas tal prende-se já com a fundamentação substancial/material da decisão, e não com o vício de forma por falta de fundamentação.”. E o assim decidido é para confirmar. O dever de fundamentação dos atos administrativos está constitucionalmente consagrado no artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP). E tem a sua concretização, designadamente, no artigo 152.º, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), o qual prevê no n.º 1 que “[p]ara além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente: a) Neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos, ónus, sujeições ou sanções;”. E como se prevê no artigo 153.º, n.º 1 do CPA “[a] fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato.”. Sendo que equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato – cfr. n.º 2. A fundamentação, quando exigível deve constar obrigatoriamente do ato, como se dispõe no artigo 151.º, n.º 1, alínea d) do CPA. E deve ser enunciada de forma clara, de modo a poderem determinar-se de forma inequívoca o seu sentido e alcance e os efeitos jurídicos do ato administrativo – cfr. n.º 2, do referido artigo 151.º. A este propósito e citando Vieira de Andrade, in “O Dever da Fundamentação Expressa de Actos Administrativos”, Almedina, Janeiro de 2003, pág. 247, «A declaração do autor do acto deveria, pois, conter os elementos suficientes para que uma pessoa normal, perante a situação concreta, ficasse em condições de perceber quais as razões de facto e de direito que tinham determinado o mesmo autor a agir ou a escolher aquele conteúdo – ou, para utilizar a linguagem do STA, de “conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo do Autor”.». Citando Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco de Amorim, in Código de Procedimento Administrativo, Comentado, 2ª Edição, Almedina, pág. 600-601 (3-Em anotação ao anterior CPA, mas que mantém atualidade atenta a similitude de regulação normativa do dever de fundamentação no atual CPA.) “(…) para dar cumprimento à exigência de fundamentação não basta que o autor do acto determine e pondere os factos e factores jurídico-administrativos em presença, à luz dos interesses que no caso caiba realizar, é também necessário que revele externamente os termos, a sequência lógica, dessa determinação e ponderação (sem prejuízo, claro, de os fundamentos do acto poderem ser expressos ou manifestados por concordância com as razões manifestadas no procedimento, em outros actos)”, o que aconteceu no caso dos presentes autos, com resulta claramente do ato impugnado e que a sentença recorrida bem explica. Conforme decidiu o Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA), em Acórdão de 30.04.1997, [Proc. n.º 030138 (4-Consultável em www.dgsi.pt, como todos os acórdãos sem indicação de fonte.) ], “não enferma de vício de forma por falta de fundamentação o acto que, pela motivação em que se apoia, se mostra apto a revelar a um destinatário normal as razões que determinaram a decisão”, sendo o critério relevante para aferir da suficiência no cumprimento do dever de fundamentação o da “compreensibilidade por parte de destinatário normal, colocado na situação concreta”. E como se referiu no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do STA, de 26/10/2017, proferido no processo n.º 038/14 “utilizando as palavras de Vieira de Andrade, que «O imperativo da fundamentação não é absoluto, nem em densidade, nem em extensão, que depende das zonas de actividade, do tipo de actas e das circunstâncias em que [o acto] é emitido» - Andrade, José Carlos Vieira, «O dever de fundamentação expressa de actos administrativos», Almedina, Coimbra, 2003, página 174. E em sintonia com tal doutrina, também a jurisprudência, nomeadamente deste STA, tem sublinhado que a fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo na medida em que varia em função do tipo legal de acto. Mas, mais ou menos «sucinta», mais ou menos «patente», sempre se exigirá à fundamentação da decisão administrativa, sob pena de esvaziar o seu conteúdo e imposição constitucional - artigo 268º, nº3, da CRP - que torne acessível, ao detentor do direito ou do interesse legalmente protegido afectado, o conhecimento do iter avaliativo realizado, do motivo ou motivos por que se decidiu assim. (…)”. O Código dos Contratos Públicos no que, em particular, respeita às propostas com preço anormalmente baixo prevê no artigo 71.º, n.º 2 que “[m]esmo na ausência de definição no convite ou no programa do procedimento, o preço ou custo de uma proposta pode ser considerado anormalmente baixo, por decisão devidamente fundamentada do órgão competente para a decisão de contratar, designadamente por se revelar insuficiente para o cumprimento de obrigações legais em matéria ambiental, social e laboral ou para cobrir os custos inerentes à execução do contrato.”. Estabelecendo o artigo 146.º do CCP, que: “1 - Após a análise das propostas, a utilização de um leilão eletrónico e a aplicação do critério de adjudicação constante do programa do concurso, o júri elabora fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve propor a ordenação das mesmas. 2 - No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas: (…) o) Cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º”. Prevendo-se no artigo 148.º, n.º 1, do CCP a propósito do relatório final que “o júri elabora um relatório final fundamentado, no qual pondera as observações dos concorrentes efetuadas ao abrigo do direito de audiência prévia, mantendo ou modificando o teor e as conclusões do relatório preliminar, podendo ainda propor a exclusão de qualquer proposta se verificar, nesta fase, a ocorrência de qualquer dos motivos previstos no n.º 2 do artigo 146.º”. No caso dos autos, não subsistem quaisquer dúvidas que o ato de exclusão das propostas da autora carece de ser fundamentado. E adianta-se, desde já, que quer do relatório preliminar, como do relatório final, é possível apreender com clareza as concretas razões que levaram o Júri a decidir propor a exclusão das propostas da recorrente. Na verdade, desde logo no pedido de esclarecimentos enviado à autora, ora recorrente, o júri formulou com clareza e precisão os concretos pontos que pretende ver esclarecidos pela autora, ora recorrente, para avaliar da suficiência ou insuficiência dos valores apresentados nas propostas da autora para cobrir os custos inerentes à execução do contrato, em conformidade com a previsão do artigo 71.º, n.ºs 2 a 4 do Código dos Contratos Públicos (CCP). Com efeito, não só está espelhado o percurso cognoscitivo que o júri efetuou para concluir no sentido da proposta de exclusão da recorrente, quer no relatório preliminar, quer no relatório final. Tal como dos mesmos constam as razões – substantivas – de facto e de direito pelas quais na perspetiva ou entendimento do júri a proposta da autora deverá ser excluída. E tais razões prendem-se, em linhas gerais com i) a insuficiente previsão de meios técnicos e humanos - não sendo possível essa insuficiência ser colmatada com a utilização de recursos da “Casa mãe”, designadamente da dispensa de veículos para necessidades/situações extraordinárias -, que levou a um subavaliado valor de compensação de serviço público, com apresentação de um preço que foi considerado insuficiente para explorar o serviço público de acordo com as exigências do Caderno de Encargos; ii) assim como com a previsão de verbas que não se afiguram concretizáveis, designadamente, no que respeita a serviços ocasionais, explicando as razões pelas quais considera que não será possível realizar esse volume de serviços e consequentemente, por que se verifica uma previsão, em excesso, quanto a essas verbas. E dúvidas não subsistem de que as razões constantes do relatório preliminar e do relatório final, que o ato impugnado fez suas permitem que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão, sentido esse da decisão que a autora claramente apreendeu, como espelha a petição inicial. Ainda que a recorrente não concorde com os fundamentos aduzidos pela recorrida, tal não significa que a decisão não esteja fundamentada. Pois, a fundamentação consiste na declaração a constar do ato administrativo, por intermédio da qual o respetivo autor expõe os fundamentos de facto e de direito que estiveram na base da decisão. E no caso, a fundamentação aduzida pela recorrida e que supra se referiu, em termos muito sintéticos, permite compreender as razões pelas quais a entidade recorrida tomou a decisão de exclusão da proposta da ora recorrente, que no essencial se prendem com o facto de ter apresentado propostas que revelam que os meios técnicos e humanos que se propunha utilizar para a prestação dos serviços de transporte objeto da concessão eram insuficientes, como tal os custos apresentados relativamente aos mesmos estavam subavaliados, não sendo possível essa insuficiência ser colmatada com a utilização de recursos da “Casa mãe”, designadamente da dispensa de veículos para necessidades/situações extraordinárias, o que redundaria numa compensação de serviço público a pagar pela recorrente insuficiente. Para além de que o valor das receitas apresentava-se inflacionado quanto à prestação dos serviços ocasionais, entendendo o júri que as mesmas estavam “sobrestimadas” (veja-se a análise que é feita no relatório final, quanto ao lote 1 e quanto ao lote 2, relativamente à “Idade média e dimensionamento da Frota”, “Estrutura de custos com pessoal e FSE”, e “Receitas”), concluindo a entidade recorrida que as receitas revelavam-se insuficientes para assegurar a prestação do serviço público, nos termos previstos para os contratos a celebrar. A circunstância de, para além da fundamentação acabada de sintetizar, o júri ter feito referência a previsões que constavam do denominado “modelo económico-financeiro”, para concluir que os valores apresentados pela recorrente se afastavam dos mesmos, não configura violação do dever de fundamentação, pois, a recorrente fica exatamente a conhecer as razões pelas quais no relatório final o júri considerou que a sua proposta deveria ser excluída. Com efeito a fundamentação do ato impugnado - de exclusão da proposta da recorrente – colhe-se no relatório final, que absorveu a fundamentação do relatório preliminar e não no denominado “modelo económico-financeiro”, ainda que por vezes se faça referência a valores constante deste mas que em face da objetivação constante do relatório são perfeitamente percetíveis para explicar as razões da proposta de exclusão da proposta da recorrente, pois as mesmas são sempre mencionados por referência a elementos constantes das peças do procedimento. A este propósito Mário Aroso de Almeida refere que é “importante sublinhar que nos encontramos aqui no domínio do vício de forma, porque não se trata, neste plano, de discutir se os fundamentos apresentados aderem à realidade. Importa, por isso, não confundir o problema da correcção formal da fundamentação com o problema da exactidão material dos fundamentos. Na verdade, é cumprido o dever de fundamentar desde que, na forma do acto, certas circunstâncias e interesses sejam formalmente identificados como existentes e relevantes para a decisão” (5-Cfr. Teoria Geral do Direito Administrativo – O Novo Regime do Código do Procedimento Administrativo (temas nucleares), 3.ª edição, Almedina, 2015, pág. 300.). Fundamentação que a entidade recorrida externou devidamente e que a recorrente claramente compreendeu ou pode compreender. Termos em que a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento por ter considerado que não se verificava o vício de falta de fundamentação do ato de exclusão das propostas da autora, ora recorrente. Improcedendo, assim, este fundamento do recurso. *3.2.3 Da violação do disposto nos artigos 70.º, n.º 2 alínea e) e 71.º, do CCP Alegou a recorrente que o Tribunal a quo aplicou erradamente o instituto do preço anormalmente baixo aos presentes autos. O conceito de preço anormalmente baixo é indeterminado e para o seu preenchimento (ou não) relevam todas as circunstâncias que a recorrente seja capaz de convocar, nomeadamente as suas vantagens técnica e financeira. Não estando a Recorrente vinculada às "amarras" de um limiar de anormalidade, poderia, livremente, construir a sua proposta dentro da liberdade negocial e concorrencial pressupostas no CCP. Os indícios de anormalidade são de tal maneira insuficientes - limitam-se ao tal modelo económico-financeiro da CIMMB que nunca ninguém viu - que, se por exemplo, nos reportássemos ao anterior critério supletivo fixado inicialmente no CCP, a proposta da Recorrente não seria considerada anormalmente baixa. Mas, ainda mais importante, em sede procedimental própria a Recorrente respondeu aos esclarecimentos solicitados pelo Júri, nos precisos termos em que foram formulados, tendo carreado prova documental bastante, confirmada pela prova testemunhal de que a proposta não apresenta nenhum carácter anómalo. Contrariamente à CIMMB que, nem em sede de Relatório Preliminar, ou Final, e muito menos testemunhal, conseguiu ir além de meras ilações descontextualizadas, não tendo, jamais, apresentado cálculos que refutam os apresentados pela Recorrente. O que a Recorrente fez no procedimento, e na ausência de quaisquer vinculações procedimentais em sentido contrário, foi apresentar a melhor proposta, ainda que comercialmente agressiva, do ponto de vista operacional, financeiro e ambiental, e por causa disso, não pode ser ilegalmente excluída. Por seu lado, a entidade recorrida referiu que a recorrente apresentou as suas propostas aos dois lotes, com os seguintes preços: Lote 1, € 1,19; Lote 2, € 0,69, que eram percentualmente mais baixos do que os respetivos preços base em: Lote 1, 63,9%; Lote 2, 70,8%. A própria recorrente confessa no artigo 55.° da PI que os preços por si apresentados podem ser considerados baixos. A recorrente prestou esclarecimentos e forneceu documentos, revelando a estrutura de meios e custos que pretendia movimentar para executar cada contrato tendo o júri constatado que subjacente às propostas da Recorrente estava a intenção de recorrer a uma quantidade de meios que seria insuficiente para explorar todo o serviço público em cada contrato posto a concurso. Não só a recorrente não demonstrou que as suas propostas apresentadas não tinham preços ou custos anormalmente baixos, como aliás ficou provado que elas tinham efetivamente preços ou custos anormalmente baixos. Não há no processo qualquer elemento de prova documental ou testemunhal que contradiga o relatório pericial, nem os relatórios do júri, com os quais o relatório pericial concorda. Não se verifica qualquer vício de violação do disposto nos artigos 70.º, n.º 2, alínea e), 71.º, 146.º e 147.º do CCP, devendo manter-se a sentença recorrida. Vejamos. Dispõe o artigo 70.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos (CCP) que “As propostas são analisadas em todos os seus atributos, representados pelos fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação, e termos ou condições”. Nos termos do n.º 2 do referido artigo 70.º “São excluídas as propostas cuja análise revele: (…) e) Um preço ou custo anormalmente baixo, cujos esclarecimentos justificativos não tenham sido apresentados ou não tenham sido considerados nos termos do disposto no artigo seguinte;”. Com a epígrafe “Preço ou custo anormalmente baixo” dispõe o artigo 71.º do CCP: “1 - As entidades adjudicantes podem definir, no convite ou no programa do procedimento, as situações em que o preço ou custo de uma proposta é considerado anormalmente baixo, devendo nesse caso indicar os critérios que presidiram a essa definição, designadamente por referência a preços médios obtidos em eventuais consultas preliminares ao mercado. 2 - Mesmo na ausência de definição no convite ou no programa do procedimento, o preço ou custo de uma proposta pode ser considerado anormalmente baixo, por decisão devidamente fundamentada do órgão competente para a decisão de contratar, designadamente por se revelar insuficiente para o cumprimento de obrigações legais em matéria ambiental, social e laboral ou para cobrir os custos inerentes à execução do contrato. 3 - Nos casos previstos nos números anteriores, o júri solicita previamente ao respetivo concorrente que preste esclarecimentos, por escrito e em prazo adequado, relativos aos elementos constitutivos relevantes da sua proposta. 4 - Na análise dos esclarecimentos prestados pelo concorrente nos termos do número anterior, pode tomar-se em consideração justificações inerentes, designadamente: a) À economia do processo de construção, de fabrico ou de prestação do serviço; b) Às soluções técnicas adotadas ou às condições excecionalmente favoráveis de que o concorrente comprovadamente disponha para a execução da prestação objeto do contrato a celebrar; c) À originalidade da obra, dos bens ou dos serviços propostos; d) Às específicas condições de trabalho de que beneficia o concorrente; e) À possibilidade de obtenção de um auxílio de Estado pelo concorrente, desde que legalmente concedido; f) À verificação da decomposição do respetivo preço, por meio de documentos comprovativos dos preços unitários incorporados no mesmo, nomeadamente folhas de pagamento e declarações de fornecedores, que atestem a conformidade dos preços apresentados e demonstrem a sua racionalidade económica; g) Ao cumprimento das obrigações decorrentes da legislação em matéria ambiental, social e laboral, referidas no n.º 2 do artigo 1.º-A.”. A Diretiva 2014/24/EU prevê no n.º 1 do artigo 69.º que “[a]s autoridades adjudicantes exigem que os operadores económicos expliquem os preços ou custos indicados na proposta, sempre que estes se revelem anormalmente baixos para as obras, fornecimentos ou serviços a prestar.”, prevendo-se no n.º 3 do referido artigo 69.º que “[a] autoridade adjudicante avalia as informações prestadas consultando o proponente. Só pode excluir a proposta no caso de os meios de prova fornecidos não permitirem explicar satisfatoriamente os baixos preços ou custos propostos, tendo em conta os elementos a que se refere o n.º 2. As autoridades adjudicantes excluem a proposta caso determinem que esta é anormalmente baixa por não cumprir as obrigações aplicáveis a que se refere o artigo 18.º, n.º 2.”. Como refere Pedro Costa Gonçalves (6-In Direito dos Contratos Públicos, 3.ª edição, novembro 2018, Vol. I, Almedina, págs. 902-904.) “A existência de um regime de exclusão de propostas de preço ou custo anormalmente baixo explica-se pela necessidade de habilitar as entidades adjudicantes a afastar as ofertas que apresentem um preço (ou custo) que, pelo seu carácter excessivamente baixo, comprometa a boa execução do contrato. (…) o carácter anormalmente baixo da proposta tem, na opção da lei, uma relação direta com os custos, os “encargos” a suportar pela entidade adjudicante. (…) de uma outra perspetiva, os custos empresariais (…) podem adquirir uma efetiva relevância na aplicação deste preceito (…), o concorrente pode justificar os custos baixos da sua proposta para a entidade adjudicante por causa dos custos baixos que ele próprio tem de suportar, em razão, por exemplo, da “economia do processo de construção, de fabrico ou de prestação do serviço” ou das “específicas condições de trabalho de que beneficia” [artigo 71.º, n.º 4, alíneas a) e d)]”. O transcrito artigo 70.º, n.º 2, alíneas e) e f) do CCP impõe a exclusão das propostas cuja análise revele “e) Um preço ou custo anormalmente baixo, cujos esclarecimentos justificativos não tenham sido apresentados ou não tenham sido considerados nos termos do disposto no artigo seguinte;”. Com efeito, a exclusão de propostas ao abrigo das duas referidas alíneas (e) e f) do n.º 2 do artigo 70.º) operacionaliza-se de forma diferente, pois no que respeita à exclusão de uma proposta com fundamento na alínea e) do artigo 70.º, do CCP impõe-se ao júri que, previamente, lance mão do procedimento previsto no art.º 71.º do CCP, solicitando esclarecimentos ao concorrente (cfr. n.º 3). Sendo que, mesmo quando no convite ou no programa do procedimento não tenham sido definidas as situações em que o preço ou custo de uma proposta pode ser considerado anormalmente baixo, as propostas podem ser excluídas com este fundamento, nos termos previstos no artigo 71.º n.º 2, do CCP (7-Que transpõe o art.º 69.º n.º 3, da Diretiva 2014/24/EU, onde se estatui que “3. A autoridade adjudicante (…) só pode excluir a proposta no caso de os meios de prova fornecidos não permitirem explicar satisfatoriamente os baixos preços ou custos propostos (…)”.), o qual impõe a obrigação de fundamentar a decisão sobre a exclusão da proposta que contenha um preço anormalmente baixo. Assim, a decisão de exclusão não decorre do facto de o preço ou custo da proposta ser anormalmente baixo, mas, antes do juízo que o órgão adjudicante faz no sentido da insuficiência dos esclarecimentos prestados e/ou dos meios de prova fornecidos pelo concorrente. Ou seja, o que conduz à exclusão é a ausência, a insuficiência ou a improcedência de uma explicação ou justificação sobre a anomalia da proposta, numa interpretação do CCP à luz do que se estabelece na Diretiva 2014/24/EU (artigo 69.º, n.º 3) (8-Neste sentido cfr. Pedro Gonçalves, in Direito dos Contratos Públicos, 3.ª edição, novembro, 2018, Vol. I, Almedina, pág. 910.). Relativamente a esta problemática da averiguação das “causas de justificação” e consideração de um preço como anormalmente baixo decidiu-se no acórdão do STA, de 22/09/2022, proferido no processo n.º 0339/21.1BECBR que: “(…) o dever de controlo exigido às Entidades Adjudicantes não se reporta, apenas, à fase da execução do contrato, mas deve focar-se, desde logo, na fase pré-contratual da “formação dos contratos públicos”. (…) Em face da atual normação do CCP – pelo menos desde 2017 -, não é mais possível defender que o risco de um preço ou custo insuficiente pode correr apenas por conta das empresas adjudicatárias, sem controlo, nesta sede, por parte das Entidades Adjudicantes; ou que basta uma declaração/compromisso no sentido do cumprimento das obrigações legais; ou que um preço ou custo insuficiente pode ser compensado com recurso a outras fontes de financiamento das empresas adjudicatárias, ou a outros contratos; ou que consubstancie um prejuízo que as empresas adjudicatárias estejam dispostas a suportar, nomeadamente por razões de marketing ou estratégia comercial, em nome da sua “liberdade de gestão empresarial”. O atual direito nacional, por via do direito da UE, opõe-se claramente a todo este argumentário em nome do “interesse público” e em nome de uma “livre, clara e sã concorrência”. Assim é que o art. 69.º n.º 1 da citada Diretiva nº 2014/24/EU - “sempre que estes (preços ou custos indicados na proposta) se revelem anormalmente baixos para as obras, fornecimentos ou serviços a prestar” - estabelece, para o efeito, a relevância da relação “preço/prestação”, no sentido de que o eventual carácter anormalmente baixo de uma proposta deve ser apreciado exclusivamente “face à prestação”, e não pela maior ou menor capacidade dos proponentes, cabendo, em suma, aferir se o preço proposto é, ou não, objetivamente suficiente para cobrir os custos a incorrer. (…)”. “É inquestionável que de acordo com o prescrito no artigo 69.º, n.º1 da Diretiva 2014/24/EU e o n.º 3 do art.º 71.º do CCP ( e 17.º do PP), nenhuma proposta pode ser excluída com fundamento em preço anormalmente baixo sem antes ser solicitado ao respetivo concorrente, em prazo adequado, esclarecimentos justificativos da proposta, de modo que os mesmos possam fornecer explicações para os preços ou custos indicados na respetiva proposta, sempre que estes se revelem anormalmente baixos para as obras, fornecimentos ou serviços a prestar. (…) 48. Por outro lado, conforme é também consensual na doutrina e na jurisprudência, de acordo com o disposto no art.º 71.º, n.º 3 do CCP e art.º 69.º da Diretiva 2014/24/UE, uma proposta só poderá ser excluída com esse fundamento, quando os esclarecimentos fornecidos pelos operadores económicos não permitirem explicar satisfatoriamente os baixos preços ou custos propostos, sendo esse, também, o sentido da jurisprudência comunitária convocada pela Recorrente. (…) a entidade adjudicante fará uma comparação com um determinado perfil (o necessário e suficiente para demonstrar um mínimo de viabilidade para cumprir o contrato em respeito das normas legais e regulamentares que sejam aplicáveis) – tendo em conta o preço global da proposta e não, como ocorre com os parâmetros base, os preços parcelares que decompõem a proposta. Aquilo que se compara são os custos necessários para o cumprimento contratual num sentido amplo e aquilo que foi o preço apresentado pelo concorrente na sua proposta. E o tipo de juízo efetuado pela entidade adjudicante quanto ao preço anormalmente baixo — insista-se, um juízo globalmente comparativo — tem de ser evidentemente articulado com a autonomia que os concorrentes dispõem para definir o preço da sua proposta. O que leva a que tal regime preveja que nenhuma proposta seja excluída com fundamento em preço anormalmente baixo sem a possibilidade de o concorrente poder explicitar a razão de o seu preço global não ser insuficiente para cobrir todos os custos inerentes à prestação do serviço. (…) 85. A contratação pública pode ser usada como instrumento para o fomento de políticas públicas em matérias sociais, ambientais ou laborais, o que “não significa uma autorização para as entidades adjudicantes decidirem, na prática, com critérios alheios a uma racionalidade estruturalmente baseada nos ganhos de eficiência que se entende decorrerem da concorrência” - Miguel Assis Raimundo Direito dos Contratos Públicos, AAFDL, vol. I, 2023, pág. 88. 86. Necessário é assegurar que tais decisões devem “ser pautadas pela razoabilidade e pela proporcionalidade, uma vez que é ilegítimo impor exigências que restringem o universo potencial de concorrentes se o seu cumprimento é inútil ou desnecessário para a satisfação das necessidades públicas em causa - não sendo então a restrição imposta ao princípio da concorrência compensada com qualquer mais-valia na prossecução do interesse público subjacente ao contrato”,- Pedro Sánchez, Direito da Contratação Pública, AAFDL, 2020, vol. I, págs. 684.” (9-Cfr. o acórdão do STA de 12/09/2024, proc. n.º 01172/23.1BELSB. No mesmo sentido de que para efeitos de ponderação da exclusão de proposta com fundamento nas alíneas e) e f) do nº 2 do art.º 70.º do CCP “não relevam preços parcelares relativos a partes de execução do contrato, em si mesmo considerados, sem prejuízo de estes poderem servir de elementos indiciários de tais violações ou da anomalia do preço global, designadamente quando corresponderem a partes com peso significativo na execução do contrato, afetando a sua coerência e a do preço global (cfr. Ac. TJUE de 28/1/2016, proc. T-570/13, “Agroconsulting”)”, veja-se, também, o acórdão do STA proc. n.º 03/21.1BEBRG, de 27/04/2022.) . É consabido que a legislação europeia não define o conceito de “preço ou custo anormalmente baixo”, tal como a legislação nacional não o define, tendo sido o mesmo objeto de construção pela jurisprudência e pela doutrina, visando essencialmente impedir que nos procedimentos pré-contratuais sejam admitidas propostas que apresentem preços que se afigurem insuficientes para custear a realização das prestações contratuais nas condições normais do mercado ou que configurem sério risco de incumprimento do contrato que vier a ser celebrado. Como refere João Amaral e Almeida uma “Proposta de preço anormalmente baixo pode pois definir-se como sendo aquela que, apesar de satisfazer o interesse da entidade adjudicante em que a adjudicação seja feita ao preço mais baixo possível, provoca todavia um juízo de suspeita sobre se está ou não em condições de garantir a satisfação correcta e integral das prestações contratuais a cargo do adjudicatário, no tempo e no modo estabelecidos no caderno de encargos, oferecendo por isso o sério risco de causar graves danos ao interesse público inerente à execução do contrato. Trata-se de uma proposta que se revela afinal ser portadora, do ponto de vista económico-financeiro, de uma anomalia que a pode impedir de ser considerada como séria ou congruente. Trata-se, em suma, de uma proposta anómala (10-Cfr. João Amaral e Almeida, in obra citada, p. 89.)”. Ainda que não tenham sido previamente fixadas no Programa do Procedimento “as situações em que o preço ou custo de uma proposta é considerado anormalmente baixo”, não está vedado à entidade pública adjudicante excluir uma proposta que apresente o preço ou custo anormalmente baixo (11-Com reservas sobre esta possibilidade decorrentes dos princípios da transparência, da igualdade e da não discriminação a justificar um rigoroso controlo judicial – cfr. Pedro Costa Gonçalves, in Direito dos Contratos Públicos, Almedina, 5.ª ed. pág. 864.). Pelo contrário, tal possibilidade/dever ocorre desde que observado o procedimento contraditório previsto no artigo 71.º do CCP, devendo o júri solicitar “previamente ao respetivo concorrente que preste esclarecimentos, por escrito e em prazo adequado, relativos aos elementos constitutivos relevantes da sua proposta” e quando após análise dos mesmos – tomando em consideração as justificações exemplificativamente enumeradas no n.º 4, do artigo 71.º do CCP – se conclua, por decisão devidamente fundamentada do órgão competente para a decisão de contratar, que o preço ou custo é anormalmente baixo “designadamente por se revelar insuficiente para o cumprimento de obrigações legais em matéria ambiental, social e laboral ou para cobrir os custos inerentes à execução do contrato.” – cfr. n.ºs 2 e 3 do referido artigo 71.º. Tem-se entendido que a entidade adjudicante goza de “discricionariedade técnica-administrativa” ou de um “poder funcional - inserido na margem de livre apreciação administrativa” - na apreciação do preço que considera anormalmente baixo e na apreciação e decisão sobre as justificações que o proponente eventualmente venha a apresentar. Deste modo, ainda que não tenha sido fixado um preço anormalmente baixo no programa do procedimento, como sucedeu no caso em apreciação, a entidade adjudicante poderia proceder à exclusão de propostas com preço anormalmente baixo, desde que, nomeadamente o preço ou custo se revelasse insuficiente para o cumprimento de obrigações legais em matéria ambiental, social e laboral ou para cobrir os custos inerentes à execução do contrato. Está provado que foi aberto concurso público internacional para a concessão do serviço público de transporte de passageiros por modo rodoviário na Região da Beira Baixa (“Concurso”), figurando como entidade adjudicante a CIMBB. O Concurso tem por objeto a concessão do serviço público de transporte de passageiros por modo rodoviário, cada um relativo, a um dos lotes seguintes: a) Lote 1: constituído pela área geográfica dos Municípios de Vila Velha de Ródão e Proença-a-Nova e respetivas carreiras intermunicipais e inter-regionais; b) Lote 2: constituído pela área geográfica dos Municípios de Idanha-a-Nova, Penamacor e respetivas carreiras intermunicipais e inter-regionais; Provou-se que a adjudicação é feita de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante, na modalidade multifator, de acordo com a qual o critério de adjudicação é densificado por dois fatores correspondentes à: (i) “Compensação por Obrigação de Serviço Público”, i.e., preço unitário por veículo quilómetro (com uma ponderação de 60%); e (ii) Idade média da Frota (com uma ponderação de 40%); Nos termos previstos na cláusula 70.ª, n.º 1 do caderno de encargos “A CONCESSIONÁRIA assume, expressa, integral e exclusivamente, a responsabilidade por todos os riscos inerentes à Concessão, incluindo, nomeadamente, os riscos relativos à procura, à oferta, ao investimento e ao tráfego, exceto quando o contrário resulte expressamente do Contrato.”. A concessionária é responsável pela obtenção dos fundos necessários para o desenvolvimento de todas as atividades concedidas, de forma a cumprir integral e atempadamente todas as obrigações por si assumidas – cfr. cláusula 71.ª, n.º 1, do caderno de encargos. No que respeita a proveitos e custos da concessão rege a cláusula 72.ª do caderno de encargos que prevê que todos os proveitos relativos às atividades objeto da concessão, nomeadamente as receitas resultantes da cobrança dos Tarifários, revertem a favor da concessionária, exceto se de outra forma estiver expressamente previsto no presente Contrato (cfr. n.º 1). Prevendo-se no n.º 2 da mesma cláusula que “constitui remuneração da CONCESSIONÁRIA, designadamente: a) Os proveitos das atividades concessionadas; b) Os proveitos das atividades acessórias; c) O pagamento pelos municípios dos bilhetes de assinatura dos alunos que beneficiam do transporte escolar nos termos do Decreto-Lei n.° 21/2019, de 30 de janeiro; d) As compensações por Obrigações de Serviço Público pagas pela CONCE- DENTE, nos termos da Cláusula seguinte; e) Outras compensações atribuídas pelo Estado ou por qualquer outra entidade pública, relativas às atividades concessionadas”. Sendo que “todos os custos relativos às atividades objeto da Concessão correm por conta da CONCESSIONÁRIA, exceto se de outra forma estiver expressamente previsto no presente Contrato; os proveitos referidos e a remuneração devida à CONCESSIONÁRIA ao abrigo da Cláusula seguinte cobrem todos os custos, serviços e obrigações que lhe cabe prestar no âmbito do Contrato, não sendo, como tal, devida à CONCESSIONÁRIA qualquer remuneração adicional pela execução do Contrato” – cfr. n.º 3 da cláusula 72.ª do caderno de encargos. As compensações por obrigações de serviço público são as previstas na cláusula 73.ª, do caderno de encargos, a qual previa que “o valor unitário máximo por veículo quilómetro a título de compensação por Obrigações de Serviço Público que a entidade adjudicante se dispõe a pagar é, relativamente ao: a) Lote 1, € 1,861472597 b) Lote 2, € 0,974924131” – cfr. n.º 2. Sendo o valor do preço base do procedimento, para o contrato do Lote 1, de € 3.773.633,00 (três milhões setecentos e setenta e três mil seiscentos e trinta e três euros) e, para o contrato do Lote 2, de € 2.854.900,00 (dois milhões oitocentos e cinquenta e quatro mil e novecentos euros) – cfr. n.º 2 da cláusula 73.ª do caderno de encargos. Nas suas propostas, a Autora obrigou-se a executar os contratos objeto do presente procedimento nas condições seguintes: (i) Para o Lote 1, solicitou o valor unitário por veículo quilómetro de € 1,19 (um euro e dezanove cêntimos) a título de compensação por obrigação de serviço público e obrigou-se a utilizar uma frota de veículos que cumpra, no mínimo, uma idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal, não superior a 26 meses. (ii) Para o Lote 2, solicitou o valor unitário por veículo quilómetro de € 0,69 (sessenta e nove cêntimos) a título de compensação por obrigação de serviço público e obrigou-se a utilizar uma frota de veículos que cumpra, no mínimo, uma idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal, não superior a 27 meses - cfr. n.º 21 dos factos provados. A proposta da Autora foi de 1.19 €/ km e de 0,69 €/ km para o lote 1 e 2, respetivamente, o que totaliza 2.412.403 euros e 2.020.548 euros, ou seja, uma redução de 36,07% e 29,23% quando comparado com o preço base de cada um dos lotes postos a concurso – cfr. facto provado n.º 30. A contrainteressada N…, nas suas propostas, obrigou-se a executar os contratos objeto do presente procedimento nas condições seguintes: (i) Para o Lote 1, solicitou o valor unitário por veículo quilómetro de € 1,64 (um euro e sessenta e quatro cêntimos) a título de compensação por obrigação de serviço público e obrigou-se a utilizar uma frota de veículos que cumpra, no mínimo, uma idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal, não superior a 126 meses. (ii) Para o Lote 2, solicitou o valor unitário por veículo quilómetro de € 0,95 (noventa e cinco cêntimos) a título de compensação por obrigação de serviço público e obrigou-se a utilizar uma frota de veículos que cumpra, no mínimo, uma idade média da frota, medida em cada mês do Período de Funcionamento Normal, não superior a 162 meses – cfr. n.º 22 dos factos provados. A proposta apresentada pela N… foi de 1.64 €/km e 0.95 €/km, para os lotes 1 e 2, respetivamente, o que totaliza 3.324.657 euros e 2.781.914 euros, ou seja, uma redução de 11,90% e de 2,56% quando comparado com o preço base de cada um dos lotes postos a concurso – cfr. facto provado n.º 31. Como já referido, no caso em apreciação, a entidade recorrida não usou da faculdade prevista no n.º 1, do artigo 71.º, n.º 1, do CCP, ou seja, não definiu no programa do procedimento, as situações em que o preço ou custo de uma proposta é considerado anormalmente baixo. Todavia, tendo o júri constatado que os preços apresentados nas propostas pela ora recorrente aparentavam não ser suficientes para assegurar os custos relativos à execução do contrato, ou seja, o preço apresentado pela recorrente para o Lote 1 e para o Lote 2 afigurava-se-lhe “anormalmente baixo por ser insuficiente para cobrir os custos inerentes à execução do contrato” lançou mão do poder/dever previsto no artigo 71.º do CCP, e solicitou esclarecimentos à autora, quanto “aos elementos constitutivos” que considerou relevantes das suas propostas – cfr. facto provado n.º 24. Ora, como resulta deste ponto 24 do elenco dos factos provados o júri fundamentou de forma clara e objetiva as razões pelas quais se lhe afiguravam de “preço ou custo anormalmente baixo” as propostas apresentadas pela recorrente, formulando o pedido de esclarecimento dos seguintes pontos sobre cada uma das propostas apresentadas: “- Confirmação de que a idade média da frota proposta é de 26 meses (vinte e seis meses) no Lote 1 e de 27 meses (vinte e sete meses) no Lote 2; • Plano de constituição e características detalhadas da frota e de aquisição das viaturas de cada um dos Lotes, em cada um dos anos da concessão, bem como os prazos de entrega/afetação dos veículos ao serviço de transporte objeto do procedimento; • Indicação se os prazos de entrega dos veículos anteriormente referidos são suficientes para dar cumprimento à Idade média da frota constante das propostas apresentadas; • Plano mensal com a previsão da Idade média da frota a operar em cada um dos Lotes no decurso de todo o período da exploração do serviço de transportes a contratualizar; • Demonstração de que o investimento a realizar na aquisição de veículos é compatível com o cumprimento da idade média da frota constante das propostas apresentadas; • Indicação do valor de Investimento em cada ano associado à aquisição de viaturas para cumprir a Idade média da frota constante das propostas apresentadas; • Demonstração do plano de financiamento a implementar para sua execução; - Demonstração de resultados. Mapa de fluxos de caixa para o período da concessão, que comprove que o preço por compensação a pagar pela entidade adjudicante, constante das propostas apresentadas, e as receitas tarifárias a arrecadar em cada Lote, permitem suportar as estruturas de custos de investimento e de custos de operação subjacentes à execução de cada um dos respetivos contratos, nomeadamente no que respeita aos seguintes Itens: Custos financeiros, Custos laborais, Custos com combustíveis; • Indicação de qual o lucro razoável que espera obter em execução de cada um dos contratos considerando os custos e receitas acima indicados, nomeadamente em taxa Interna de rentabilidade, valor atualizado líquido e cash-flow do projeto e do acionista.”. Como resulta do ponto 25 dos factos provados “Com vista a afastar o entendimento do Júri do procedimento, a Autora apresentou todos os elementos solicitados e as respetivas justificações”, quanto ao lote 1 e quanto ao lote 2, tendo concluído a sua resposta nos seguintes termos: “Resulta do exposto que os preços propostos pele V…, para ambos os Lotes 1 e 2, correspondem a preços que, em condições normais de mercado, permitem cobrir os custos envolvidos na execução de cada um dos contratos Assim, e sem prejuízo da já referida falta de fundamentação por parte do Exmo. Júri, o que é certo é que a V… logrou demonstrar que o preço proposto nos Lotes 1 e 2 não se afigura anormalmente baixo para cobrir os custos inerentes à execução do contrato, não podendo, em caso algum, ser a proposta da V… excluída nos termos do disposto no artigo 70.º, n.º 2, alínea c) do CCP. Pelo contrário, propor a adjudicação dos Lotes 1 e 2 à V… é a única solução que se afigura legal, uma vez que a mesma é a concorrente que melhor cumpre com o critério de adjudicação fixado para o presente concurso. A V… requer que o Exmo. Júri considere os presentes esclarecimentos justificativos e, em consequência, proponha a adjudicação dos Lotes 1 e 2 do presente concurso a V…, uma vez que as suas propostas são, para além, das que se apresentam como economicamente mais vantajosas, aquelas que apresentam uma idade média da frota inferior. Apenas desta forma - adjudicando os lotes 1 e 2 à V… – é que o Exmo. Júri poderá assegurar, para além de um benefício notório para o erário publico, o cumprimento da legalidade administrativa e, em consequência, a celebração de dois contratos |Lotes I e 2) cujo validade não será posta em causa.”. Nesta sequência o júri procedeu à análise dos esclarecimentos e elementos apresentados pela autora, ora recorrente, tendo concluído que “os esclarecimentos e documentos facultados não só não refutam, como confirmam o entendimento de que as propostas por este apresentadas aos Lotes 1 e 2 têm custo e preço anormalmente baixos. É o que se passa a expor Não obstante o modelo económico enviado pelo Concorrente 2 – V…, Lda, com os seus esclarecimentos apresentar uma rentabilidade razoável, uma análise detalhada dos pressupostos considerados revela a existência de pressupostos e parâmetros inadequados, que evidenciam que as propostas têm um custo anormalmente baixo, à luz do artigo 71.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, colocando em causa a normal exploração do serviço público de transporte regular de passageiros em cada um dos Lotes em causa se essas viessem a ser adjudicadas. Enunciam-se abaixo os aspetos críticos das propostas. 1) Dimensionamento da frota Dado que os fundamentos apresentados pelo Júri assentavam no dimensionamento da Frota, e nas implicações no investimento inicial e de substituição para efeitos de equilíbrio económico-financeiro, o Concorrente 2 – V…. Lda., procurou explicar por que motivo o Júri não tinha razão. Para o efeito, revela qual o número de veículos que pretende afetar a cada Frota (Lote 1 e Lote 2), demonstrando com o seu modelo económico-financeiro que o negócio proposto é financeiramente equilibrado. O problema é que os números de viaturas agora indicados como sendo os pressupostos das respetivas propostas, pese embora proporcionem um «equilíbrio financeiro» na conta da folha de cálculo, não permitem dar resposta às exigências e requisitos do nível de serviço exigidos no Caderno de Encargos, nomeadamente assegurar todas as carreiras e horários indicados de forma adequada. - Lote 1 O Concorrente 2 – V…, Lda., apresenta uma frota de 17 viaturas, 13 Standard e 4 mini. (…) o caderno de encargos prevê a existência de 19 serviços e, tentando otimizar ao máximo o aproveitamento da frota, foi estimada a necessidade de dispor de pelo menos 18 viaturas para executar todos os horários em escala. Uma análise mais detalhada permite admitir a possibilidade de reduzir uma viatura, aproveitando uma viatura que efetua outro serviço noutro horário, mas esse aproveitamento significaria assumir um aumento de 40 veículos.quilómetro em vazio por dia, com o acréscimo de custos de operação e manutenção associados. (…) Admitindo, apenas hipoteticamente, esta versão ‘‘minimalista” do número de veículos necessários para uma normal exploração, pode concluir-se, que se verifica uma diferença de pelo menos 2 viaturas no dimensionamento da frota apresentado pelo Concorrente 2 – V…, Lda., o que se traduziria em constrangimentos e/ou aumento de custos ao nível da manutenção das viaturas com consequência no deficiente cumprimento do nível de serviço público requerido no concurso, nos termos definidos no Anexo 1 ao Caderno de Encargos. - Lote 2 O Concorrente 2 – V… Lda, apresenta uma frota de 9 viaturas, 7 Standard e 2 mini. (…) Procedeu-se a uma análise detalhada, considerando a exploração do serviço em período escolar (horários escolares de segunda a sexta-feira), período em que a oferta de transportes é maior e, portanto, em que será necessário o número máximo de viaturas em simultâneo. Neste período está prevista a existência de 15 serviços, e tentando otimizar ao máximo o aproveitamento da frota, foi estimada a necessidade de dispor de pelo menos 15 viaturas para executar todos os horários em escala. (…) Admitindo, mais uma vez, esta versão “minimalista” do número de veículos necessária para uma normal exploração, pode concluir-se que se verifica uma diferença de pelo menos 8 viaturas no dimensionamento da Frota na proposta apresentada pelo Concorrente 2 – V…, Lda., o que nos leva a considerar que o número de viaturas constante da sua proposta do concorrente não permite assegurar o cumprimento do nível de serviços definidos no Anexo I ao Caderno de Encargos. 2) Custos com Pessoal e FSE (…) as propostas assentam em custos que não permitem cumprir as obrigações exigidas no Caderno de Encargos, tanto no Lote 1 como no Lote 2. Por um lado, em resultado de um número insuficiente de veículos e de recursos apresentados nas propostas para cada um dos lotes: 2 viaturas no Lote 1 e 8 viaturas no Lote 2. Considerando globalmente os valores referentes ao Pessoal e FSE, no lote 1, a proposta possui um custo total significativamente menor, correspondendo a 52% do custo por veículo.quilómetro previsto no modelo económico-financeiro da CIMBB que constituiu a base de preparação do caderno de encargos para o lançamento do presente concurso público. Isso deve-se principalmente aos custos com pessoal e FSE por veículo.quilómetro, que são substancialmente mais baixos na proposta (0,99 euros/ veículo.quilómetro) em comparação com o modelo (1,92 euros). Já no Lote 2, a diferença é também significativa, correspondendo a proposta do Concorrente a um peso de 67% face ao modelo económico-financeiro da CIMBB que constituiu a base de preparação do caderno de encargos para o lançamento do presente concurso público. Mais uma vez, os custos com pessoal e FSE por quilómetro desempenham um papel crucial, com a proposta apresentando valores de apenas 0,90 euros por veículo.quilómetro em comparação com os 1,34 euros do modelo base. É certo que o presente concurso público tem em vista a celebração de um contrato de concessão, no qual o risco de oferta corre por conta do Concessionário (cfr. Cláusula 70. ° do Caderno de Encargos). Porém, a CIMBB não se pode abstrair das condições financeiras e operacionais que subjazem às propostas apresentadas, sob pena de colocar futuramente em crise a prestação do serviço público de transporte de passageiros, que é um serviço público essencial que deve funcionar em continuidade e universalidade (i.e., sem quebras ou roturas de serviço), caso venham a ser adjudicadas e, depois, verificar-se a sua impossibilidade de execução. Ora, da análise acima efetuada fica evidente que os custos efetivamente considerados pelo Concorrente 2 – V…, Lda., nas suas propostas aos dois lotes têm em vista (i) financiar a aquisição e substituição de uma estrutura de frota, bem como a sua manutenção e operação, com um número de veículos que será objetivamente insuficiente para cumprir as obrigações contratuais plasmadas no Anexo I do Caderno de Encargos, e (ii) custear uma estrutura de recursos humanos e FSE subdimensionada. Tivessem as propostas considerado a totalidade de veículos, recursos humanos e FSE efetivamente necessários para responder às necessidades dos serviços públicos postos a concurso tal como expressas no Anexo 1 do Caderno de Encargos, o número de veículos, recursos humanos e FSE subjacentes seriam superiores e, consequentemente, também seriam superiores os valores considerados para o investimento na aquisição e substituição desses veículos adicionais, bem como para a manutenção e operação da frota, bem como os valores de despesa respeitantes a recursos humanos. Em suma, equivale tudo a dizer que os custos das propostas apresentadas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., são insuficientes para cumprir as obrigações contratuais emergentes do Caderno de Encargos, tal como referido no artigo 71. °, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, razão pela qual devem ser excluídas. 3) Receitas Os esclarecimentos dados pelo Concorrente 2 – V…, Lda., revelam que do outro lado da equação - i.e., das receitas - está posto em causa o equilíbrio económico-financeiro das propostas. Lote 1 e 2 A viabilidade financeira das concessões postas a concurso depende de dois tipos de receitas: as receitas resultantes da exploração de serviços pela Concessionária (as tarifária/bilhética e as de serviços ocasionais) e as receitas das compensações por obrigações de serviço público que serão pagas pela CIMBB. Este último valor a pagar pela CIMBB à Concessionária é, de resto, o principal critério de adjudicação (cfr. Cláusulas 71.° a 73.° do Caderno de Encargos e Artigo 15.° do Programa do Concurso). As receitas de bilhética (tarifárias) previstas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., em cada um dos lotes estão em linha com as receitas previstas no modelo económico-fnanceiro da CIMBB que constituiu a base de preparação do caderno de encargos para o lançamento do presente concurso público (embora no Lote 2 seja apresentado um valor de veículo.quilómetro do serviço público, base para o cálculo, inferior ao valor previsto nos termos do concurso - 2 662 120 em vez de 2 928 330 veículo.quilómetro para os 5 anos). Porém, de acordo com os esclarecimentos dados, as receitas dos serviços ocasionais previstas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., são muito superiores às previstas no modelo económico-financeiro da CIMBB que constituiu a base de preparação do caderno de encargos para o lançamento do presente concurso público, sendo baseadas num valor de veículo.quilómetro de serviços ocasionais 405% e 149% superiores aos previstos no modelo base para os Lotes 1 e 2 respetivamente, muito acima dos valores médios considerados em concursos desta natureza. Refira-se que tais valores pressupõem uma grande utilização dos veículos, para além da realização dos serviços de transporte público regular de passageiros objeto da concessão, com implicações no consequente desgaste da frota e do pessoal, bem como eventual prejuízo no nível do serviço público e de aumento dos custos. Não há fundamento empírico no passado do serviço público que justifique esta previsão de aumento dos serviços ocasionais, sendo praticamente impossíveis de conciliar com a operação do serviço público regular de transporte de passageiros sem um aumento considerável dos custos. Ou seja, sendo os meios propostos (frota e motoristas) considerados insuficientes para cumprir as obrigações contratuais, não se antevê como possam os mesmos ainda ser utilizados com tanta intensidade em serviços ocasionais, fora dos serviços regulares contratualizados. Assim sendo, o preço das propostas apresentadas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., aos Lotes para efeitos de compensação por obrigação de serviço público a pagar pela CIMBB (i.e., o preço contratual) é considerado anormalmente baixo por dois motivos: - Desde logo pelas razões antes apontadas, i.e., os valores de compensação por obrigação de serviço público foram calculados tendo em vista cobrir estruturas de custos que, como se viu, estão manifestamente subdimensionadas. Por esse motivo, o preço fica sempre aquém do que seria suficiente para explorar o serviço público de acordo com as exigências resultantes do Anexo 1 do Caderno de Encargos; - Como as receitas dos serviços ocasionais previstas pelo Concorrente 2 – V…, Lda. estão artificialmente empoladas, como acima se demonstrou, o valor de compensação por obrigação de serviço público a pagar pela CIMBB (o preço) proposto para cada Lote é inferior ao que deveria ser se aquele valor de receitas dos serviços ocasionais estivesse razoavelmente calculado. Por esse motivo, o preço proposto é insuficiente para cumprir as obrigações contratuais emergentes do Caderno de Encargos. Esse mesmo juízo resulta também das considerações anteriores sobre a estrutura de custos apresentada, que se revela manifestamente insuficiente para cumprir as obrigações contratuais (cfr. acima), e das considerações sobre o facto de nas propostas não ter sido contabilizado o número superior e realmente necessário de veículos para a exploração do serviço público; pois se esses custos tivessem sido devidamente ponderados, é forçoso concluir que os custos totais seriam superiores e, consequentemente teriam de ser superiores as receitas a obter pela Concessionária, designadamente o preço proposto para cada Lote. Assim, os preços das propostas apresentadas pelo Concorrente 2 – V…, Lda., são insuficientes para cumprir as obrigações contratuais emergentes do Caderno de Encargos, tal como referido no artigo 71.°, n.° 2, do Código dos Contratos Públicos, razão pela qual devem ser excluídas». Atenta a proposta de exclusão das propostas apresentadas pela autora, ora recorrente, a mesma exerceu o seu direito de audiência prévia, tendo apresentado pronúncia sobre o relatório preliminar, nos termos constantes do ponto 34 dos factos provados, a qual foi objeto de apreciação pelo júri em sede de relatório final (cfr. ponto 36 dos factos provados). Referiu, em síntese, a recorrente, quanto aos lotes 1 e 2 que “não foi considerado viaturas de reservas uma vez que a casa mãe (V…) poderá dispensar veículos para necessidades/situações extraordinárias”, todos “os serviços de gestão (Contabilidade, RH, marketing), são partilhados pela casa mãe (a V…), como é típico na gestão deste tipo de atividade, o que leva a sinergias operacionais e consequentemente a uma redução de custos ao nível de gastos com pessoal.”. E que o valor das receitas quanto aos serviços ocasionais “está subvalorizado, dado que na zona da operação existem inúmeras associações como Academias de Futebol, Escolas, Ranchos Folclóricos, Associações Recreativas, entre outros”. Após apreciação da pronúncia apresentada pela Autora em sede de audiência prévia, o Júri emitiu e notificou, em 25.01.2024, os concorrentes do Relatório Final e, não acolhendo nenhum dos fundamentos da Pronúncia da Autora, manteve o teor e as conclusões constantes no Relatório Preliminar, isto é, a proposta de adjudicação à N… – cfr. pontos 35 e 36 do probatório. Em face do acabado de expor não pode deixar de se concluir que não assiste razão à recorrente nas críticas que teceu quanto ao ato de exclusão das suas propostas, ou seja, não é possível afirmar que os indícios de anormalidade são insuficientes e que se limitam “ao tal modelo económico-financeiro da CIMMB que nunca ninguém viu”. Como vimos o júri procedeu a uma análise detalhada e devidamente fundamentada dos esclarecimentos prestados pela ora recorrente, assim como dos documentos juntos relativos à estrutura de meios e custos que pretendia movimentar para executar cada contrato, o que aquele fez tendo por referência o objeto contratual em causa, não obstante ter feito menção a um “modelo económico-financeiro da CIMBB que constituiu a base de preparação do caderno de encargos para o lançamento do presente concurso público”. Mas foi com base ou por referência às previsões do programa do procedimento e do caderno de encargos que aferiu as condições propostas pela recorrente para a prestação do serviço público em causa nos autos, como evidenciam os relatórios preliminar e final. Assim, em face da análise dos elementos apresentados pela ora recorrente, o júri constatou que os meios (frota e recursos humanos) indicados seriam insuficientes para explorar todo o serviço público em cada contrato posto a concurso de acordo com os parâmetros exigidos pelo programa do procedimento e pelo caderno de encargos. Com efeito, o júri concluiu, em sede de relatório preliminar e final que na proposta da Recorrente respeitante ao Lote 1 verifica-se uma diferença de pelo menos 2 viaturas no dimensionamento da frota, o que se traduziria em constrangimentos e/ou aumento de custos ao nível da manutenção das viaturas com consequência no deficiente cumprimento do nível de serviço público requerido no concurso, nos termos definidos no Anexo 1 ao Caderno de Encargos. Na proposta da Recorrente respeitante ao Lote 2 o júri considerou que se verifica uma diferença de pelo menos 8 viaturas no dimensionamento da frota, o que levou a considerar que o número de viaturas constante da sua proposta não permite assegurar o cumprimento do nível de serviços definidos no Anexo I ao Caderno de Encargos. Está demonstrado que: - A Autora propõe-se explorar o Lote 1 com 17 viaturas, sendo 13 viaturas de tipologia standard e as restantes 4 de tipologia mini e alocar 21 trabalhadores; - A Autora propõe-se explorar o Lote 2 com 9 viaturas, sendo 7 viaturas de tipologia standard e as restantes 2 de tipologia mini e alocar 11 trabalhadores; – cfr. pontos 26 e 27 dos factos provados. Mais provou que a operação isolada do Lote 2, nos termos propostos pela Autora, não é viável, e assumir a operação conjunta dos dois lotes acrescenta um risco de perturbação à operação no Lote 1; assim como se provou que assumindo que a operação conjunta do Serviço Público de Transporte de Passageiros (SPTP) de ambos os lotes em conjunto, ou de forma isolada, fosse operacionalmente viável, ainda assim não seria economicamente viável (pontos 28 e 29 dos factos provados). Em suma, a recorrente não logrou demonstrar que “a capacidade instalada apresentada” “é a correta uma vez que responde a todos os trajetos”, nomeadamente as linhas, os respetivos percursos e horários, para que se pudesse concluir que o número de veículos indicados seriam suficientes para executar os contratos, tal como a estrutura de recursos humanos, reconhecendo ainda na pronúncia apresentada em sede de audiência prévia que a sua proposta não considera viaturas de reservas “uma vez que a casa mãe (V…) poderá dispensar veículos para necessidades/situações extraordinárias” e que “...os serviços de gestão (Contabilidade, RH, marketing), são partilhados pela casa mãe (a V…)...”, o que permite concluir que os preços das propostas apresentadas pela autora, ora recorrente, não incluem todos os custos inerentes à prestação do serviço público objeto do contrato. De todo o modo, importa, ainda, sublinhar que a análise das propostas da autora, ora recorrente, assim como dos esclarecimentos por esta prestados e documentos juntos, em resposta ao pedido do júri, bem como os argumentos invocados em sede de audiência prévia, teve por base o serviço público a contratar para os lotes 1 e 2, tal como definido no programa do procedimento e no caderno de encargos, o que está espelhado nos excertos do relatório preliminar acima transcritos. Saliente-se que a autora não logrou provar de que forma poderia, com os meios propostos, prestar o serviço público a que respeitam os dois lotes, em conformidade com as necessidades decorrentes do caderno encargo, quanto a linhas, trajetos e horários. A insuficiência da frota, assim como dos recursos humanos propostos refletiu-se nas propostas de custos apresentadas pela ora recorrente, ou seja, de preço a pagar a título de compensação pela prestação do serviço público, os quais se revelaram insuficientes para prestar os serviços objeto dos contratos e para fazer face aos custos com a execução dos contratos. Evidenciando, assim, as suas propostas insuficiências também a nível das receitas, quer da compensação por serviço público, quer quanto aos serviços ocasionais, como claramente resulta do ato impugnado. Razões pelas quais, o júri considerou que as propostas apresentadas pela ora recorrente tinham preços anormalmente baixos, já que esses preços (compensações por obrigações de serviço público) apenas pressupunham custos com uma quantidade de meios (frota e recursos humanos) que seriam insuficientes para explorar todo o serviço público em cada um dos contratos, ou seja, para executar cada um dos contratos conforme descrito no caderno de encargos. Por outro lado, apresentando as propostas da recorrente meios humanos e materiais insuficientes, existem razões objetivas e fundadas para o júri suspeitar que o volume de receitas estimado pela Recorrente para os serviços ocasionais não poderia ser atingido sem sacrifício do serviço público de transporte regular de passageiros, com o consequente prejuízo, ou para o interesse público (se tal sacrifício se materializasse), ou para o equilíbrio económico-financeiro da concessão (se o volume de receitas previsto não fosse atingido), como defendeu a entidade recorrida. Provou-se, ainda, que a autora tem a sua sede e as suas oficinas localizadas no concelho do Sabugal e que tem experiência na prestação de serviços de transporte no Município de Penamacor, o que só por si não permite concluir que dispõe de “condições excecionalmente favoráveis (…) para a execução da prestação objeto do contrato a celebrar”, em conformidade com o previsto na alínea b), do n.º 4, do artigo 71.º do CCP. Assim, a sentença recorrida não incorreu no erro de julgamento que lhe imputou a recorrente por ter decidido que as propostas da autora, ora recorrente apresentavam “preço anormalmente baixo” nos termos e para os efeitos do disposto na alínea e) do artigo 70. ° do Código dos Contratos Públicos. Termos em que se conclui que a sentença recorrida não padece dos vícios de violação dos artigos 70. °, n.º 2, alínea e) e 71.º, ambos do CCP que a recorrente lhe imputa, não podendo proceder este fundamento de recurso. * 3.2.4. Da violação do princípio da transparência Ainda que não tenha formulado conclusões quanto ao invocado erro de julgamento da sentença recorrida no que respeita à violação do princípio da transparência, a recorrente em sede de alegação recursória defendeu que “Contrariamente ao julgado pelo Tribunal a quo, o que se extrai, tanto da prova documental, mormente as conclusões do Júri vertidas nos Relatórios Preliminar e Final, como da prova testemunhal produzida em sede de julgamento é que foi a partir dos supostos pressupostos operacionais e financeiros que constam no modelo económico-financeiro da CIMBB que a proposta da Recorrente foi qualificada como anómala, e por consequência, excluída”. E que o “modelo financeiro da CIMBB, quer o Tribunal a quo queira, ou não, admiti-lo foi determinante na exclusão da proposta da Recorrente porquanto o Júri entendeu que a proposta em causa é contrária aos pressupostos daquele modelo.”, por conseguinte, era indispensável que, em algum momento, a Recorrente tivesse tido acesso ao mesmo. Por isso, quando o Tribunal a quo julgou que o princípio da transparência “Não reclama que o Júri publicite os documentos e cálculos de que se socorreu na construção das regras do procedimento e do conteúdo das prestações contratuais”, retira uma ilação totalmente descontextualizada face à factualidade subjacente ao procedimento. A CIMBB ao não ter permitido que a Recorrente tivesse acesso ao modelo financeiro violou o princípio da transparência, por ter restringido ilegitimamente o direito da Recorrente de ter conhecimento de todos os pressupostos a partir dos quais a sua proposta seria avaliada. Por seu lado a entidade recorrida defendeu que o modelo financeiro da recorrida não fundamentou nem determinou a exclusão, pelo que não tinha de ser dado a conhecer à Recorrente, que não foi prejudicada por não conhecer esse modelo, inexistindo qualquer violação do princípio da transparência. Vejamos. Prevê-se no artigo 1.º-A, n.º 1 do CCP, que na formação e na execução dos contratos públicos devem ser respeitados os princípios gerais decorrentes da Constituição, dos Tratados da União Europeia e do Código do Procedimento Administrativo, em especial os princípios da legalidade, da prossecução do interesse público, da imparcialidade, da proporcionalidade, da boa-fé, da tutela da confiança, da sustentabilidade e da responsabilidade, bem como os princípios da concorrência, da publicidade e da transparência, da igualdade de tratamento e da não-discriminação. “… para que possa (e deva) afirmar-se a violação de um princípio jurídico é necessário que a hipótese, por uma qualquer perspectiva relevante do ponto de vista da função lógica da contratação pública, implique ou constitua uma lesão séria e efectiva dos interesses e valores a cuja tutela ele vai dotado neste domínio.” (12-Cfr. Rodrigo Esteves de Oliveira, in Contratação Pública, I vol., Coimbra Editora, 2008, pág. 65.). O princípio da transparência, no âmbito de um procedimento pré-contratual concorrencial, impõe que “tanto a intenção de contratar da Administração quanto as regras fundamentais que presidem a essa contratação sejam divulgadas e publicitadas de modo transparente. Não existe verdadeira concorrência se a vontade de celebrar um contrato não é revelada pela entidade adjudicante; tão-pouco podem ser observados os princípios da igualdade e da imparcialidade se os interessados em contratar não conhecem as “regras do jogo” que presidem ao procedimento, as condições de participação e de admissão das candidaturas ou propostas e as respetivas regras de avaliação. Sob esse ponto de vista, a proteção da transparência surge também conexa com a tutela da confiança e da segurança jurídica (13-In Pedro Fernández Sánchez, Direito da Contratação Pública Vol. I, 2.ª Edição AAFDL Editora, 2024, págs. 121-122.)”. A tramitação dos procedimentos pré-contratuais é profundamente marcada por manifestações do princípio da transparência e da publicidade, designadamente quanto à “obrigação de publicitação dos procedimentos”, “divulgação das informações essenciais para o decurso do procedimento a todos os interessados em contratar”, prestação a todos os concorrentes de informação sobre as “decisões simultâneas ou posteriores à adjudicação”, ao dever de fundamentação, entre outros (14-cfr. Pedro Fernández Sánchez, in obra citada págs. 123-130.). Como resulta dos relatórios preliminar e final elaborados pelo júri, e que constituem a fundamentação do ato impugnado, e como, de resto, a entidade recorrida referiu em sede de contra alegação recursória a “razão pela qual o preço das propostas foi considerado anormalmente baixo não residiu no facto de os custos assumidos pela Recorrente no seu Modelo Financeiro serem anormalmente inferiores aos custos previstos nesse modelo financeiro da Recorrida”, reside, sim, no facto de os preços propostos pela recorrente apenas assegurarem a cobertura de custos que eram insuficientes para executar os contratos, nos termos definidos no caderno de encargos. Conclusão a que o júri chegou pela análise dos esclarecimentos e dos elementos apresentados pela recorrente, dos quais resultava, como acima já se referiu, que as propostas apresentavam para a execução dos contratos uma frota e recursos humanos que não seriam suficientes para cumprir as obrigações previstas no caderno de encargos. Como, também, já acima referido, não obstante ter sido feita menção nos relatórios preliminares e final ao “modelo” com base no qual a recorrida elaborou as peças do procedimento e que esteve na base do pedido de esclarecimentos, este modelo não foi o fundamento para excluir as propostas da recorrente. Com efeito, a conclusão do júri de que os preços propostos pela recorrente eram substancialmente mais baixos do que os preços base de cada lote resulta do confronto das propostas da recorrente com os documentos patenteados a concurso, designadamente, com as cláusulas do caderno de encargos. Conclusão que a autora, ora recorrente, não refuta. Veja-se que em sede de petição inicial refere: “Admite-se que os preços das propostas apresentadas pela Autora possam ser considerados baixos” – cfr. artigo 55.º -, visando esclarecer o júri sobre o número de viaturas e recursos humanos que se propunha utilizar para prestar os serviços em cada contrato, tendo, no entanto, o júri concluído que se tratava de uma frota e recursos humanos insuficientes, incapazes de fazer os percursos e horários previstos no caderno de encargos - conforme relatórios preliminar e final, pelo que o fundamento da decisão de exclusão das propostas apresentadas pela recorrente não foi o modelo financeiro elaborado pela recorrida e que serviu de orientação para a elaboração das peças do procedimento. Provou-se que a A. solicitou ao Júri, na fase de esclarecimentos “que esclareça se existem documentos, designadamente de natureza financeira e operacional, que suportem a decisão de contratar tomada pelo Conselho Intermunicipal da Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa em 01 de junho de 2023. Em caso afirmativo, agradecia-se a respetiva disponibilização” – cfr. ponto 9 dos factos provados. O Júri do procedimento, em resposta ao pedido de disponibilização de documentos que suportem a decisão de contratar dirigido pela Autora, recusou a disponibilização dos documentos, no qual se inclui o modelo económico-financeiro da CIMBB que constituiu a base de preparação do caderno de encargos, indicando o seguinte: “1. Decisão de contratar. A CIM da Beira Baixa apenas irá disponibilizar os elementos que constam da plataforma eletrónica. Os concorrentes deverão apresentar as suas propostas com base nas suas informações e cálculos” - cfr. ponto 11 do probatório. Como se decidiu na sentença recorrida “Como bem nota a Entidade Demandada, a menção no Relatório Final ao dito modelo financeiro elaborado pela Entidade Demandada é apenas contextual, no sentido de dar a conhecer à Autora a origem da suspeita inicial do Júri sobre a sustentabilidade das propostas. A razão pela qual o preço das propostas da A. foi considerado anormalmente baixo não residiu no facto de os custos assumidos por essa concorrente no seu modelo financeiro serem anormalmente inferiores aos custos previstos nesse modelo financeiro da Entidade Demandada. Noutras palavras, o modelo financeiro elaborado pela Entidade Demandada não determinou nem fundamentou a decisão de exclusão das propostas apresentadas pela Autora. O que motivou essa decisão foram, como vimos, as seguintes asserções: i) o escrupuloso e pontual cumprimento das rotas e dos horários estabelecidos no Caderno de Encargos envolveria a afetação de mais meios (veículos e recursos humanos) e, portanto, mais custos; ii) a ordem de grandeza das receitas extraordinárias com serviços ocasionais estimadas no modelo financeiro da Autora é desadequada da prática de mercado e pressupõe uma grande utilização dos veículos, para além da realização dos serviços de transporte público regular de passageiros objeto da concessão, com o consequente desgaste da frota e do pessoal. O modelo financeiro elaborado pela Entidade Demandada não é uma das peças do procedimento, nem é uma informação essencial para o decurso do procedimento, ou para a compreensão dos seus documentos conformadores, cuja divulgação fosse exigível para salvaguarda do princípio da transparência. O princípio da transparência no contexto da contratação pública, implica, além do mais, uma publicação das regras de cada procedimento, que devem ser claras e postas no documento normativo de uma forma adequada, para evitar surpresas aos operadores económicos e exige uma definição clara e precisa das regras das principais decisões procedimentais (cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19.03.2013, proc. n.° 0587/12, in www.dgsi.pt). Não reclama que o Júri publicite os documentos e cálculos de que se socorreu na construção das regras do procedimento e do conteúdo das prestações contratuais. Por conseguinte, improcede a arguição de violação do princípio da transparência.”. E o assim decidido está correto. Por outro lado, a entidade pública optou por submeter à concorrência a definição dos meios para prestar o serviço objeto do procedimento em causa nos autos, em vez de fixar um limite mínimo e/ou máximo de autocarros para prestar os serviços. Portanto, não foi esta a opção, deixou aos concorrentes a possibilidade de, no uso da sua liberdade de iniciativa, desenharem um modelo que fosse adequado (e demonstrável) para a prestação do serviço público a concessionar. Mas tal não significa que não fizesse um estudo sobre a forma de prestar esse serviço, no qual, partindo da análise das redes a concurso, com a previsão do número de autocarros que considerava adequado à prestação desse serviço, o número de motoristas necessário para o assegurar, os meios humanos e técnicos para substituir aqueles, designadamente, respetivamente em caso de folgas, férias, doença, feriados, ou de avarias, acidentes ou qualquer imprevisto. E partindo destes dados projetasse a compensação mínima a pagar pela prestação do serviço público e definisse o valor base do procedimento. Justificando-se, assim, que em face da significativa diferença para menos dos valores apresentados nas propostas da recorrente por referência aos valores constantes do programa de procedimento, o júri por comparação ou referência ao modelo que a entidade adjudicante elaborou para efeitos de definir, designadamente, o preço base, solicitasse esclarecimentos à ora recorrente tendo em vista aferir se, efetivamente, as propostas apresentavam um preço anormalmente baixo. Ora, sucede que o programa do procedimento e o caderno de encargos contêm todos os elementos necessários à apresentação das propostas pelos candidatos, razão pela qual a não disponibilização do modelo técnico-financeiro para além de não violar o princípio da transparência, também não infringe o direito à informação procedimental ou o direito de acesso aos arquivos administrativos constitucionalmente consagrados (artigo 268.º, n.ºs 1 e 2 da CRP) e previstos no artigo 17.º do CPA e na Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto (LADA). Termos em que se conclui que a sentença recorrida não incorreu na invocada violação do princípio da transparência, assim como não incorreu em violação do previsto no artigo 268.º, n.ºs 1 e 2 da CRP, no artigo 17.º do CPA e na LADA. * 3.2.5. Da violação do princípio da imparcialidade Defendeu a recorrente que este princípio surge violado porque, pese embora a proposta da contrainteressada também apresente um desvio relativamente ao preço base, não se sabe com que fundamento, o Júri decidiu restringir o subprocedimento à proposta da Recorrente. Se o tivesse feito, o Júri teria a vantagem de confrontar as soluções dos dois concorrentes, nomeadamente, melhor teria percebido o motivo da discrepância entre as mesmas. A proposta da Contrainteressada partiu, na sua avaliação, numa posição de vantagem porquanto a CIMMB, sem qualquer indagação adicional deu como bons os pressupostos dessa proposta. A entidade recorrida referiu que não há qualquer vestígio factual que suporte a ideia de que a exclusão das propostas não resultou de uma conduta imparcial. A transparência da decisão encontra-se assegurada pela fundamentação constante do Relatório Final. O Júri apenas solicitou esclarecimentos à Recorrente porque só as suas propostas apresentavam preços considerados anormalmente baixos. Não existe obrigação legal de solicitar esclarecimentos a propostas que não revelem preços anormalmente baixos. Não ocorreu, assim, qualquer violação do princípio da imparcialidade, devendo a Sentença recorrida ser confirmada. Preceitua o artigo 266.º, n.º 2, da CRP, que “Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem atuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.”. O princípio da imparcialidade, com previsão no artigo 1.º-A, n.º 1 do CCP, no âmbito da contração pública exige da entidade adjudicante uma atuação que se abstenha de tratar de forma parcial os concorrentes a um determinado procedimento, impedindo o favorecimento de um candidato em detrimento de outros, impondo a ponderação de todos os interesses públicos e privados em presença com relevância para a decisão de contratar, assim como os interesses privados suscetíveis de ser afetados pela decisão. Vejamos o que se decidiu na sentença recorrida a respeito da invocada violação do princípio da imparcialidade, na parte com relevância, para a decisão deste fundamento do recurso: “A ratio deste princípio consiste em tutelar a igualdade de condições, de acesso e de oportunidades no âmbito do concurso, dando-se garantias que visam assegurar os direitos e interesses legalmente protegidos de cada candidato e de assegurar o respeito dos princípios da imparcialidade pela Administração e da igualdade de tratamento. A imparcialidade visa proteger a objetividade e transparência decisória e a consequente confiança dos cidadãos na capacidade da Administração para tomar decisões justas e adequadas. Por isso, deve a Administração considerar com objetividade todos e apenas os interesses relevantes no contexto decisório. No tocante às causas de exclusão das propostas, após a sua abertura devem ser apreciadas e consideradas todas as causas de exclusão previstas na lei e nas peças do procedimento, mas apenas essas. Isto dito, a circunstância de o Júri apenas ter aberto o subprocedimento de esclarecimentos previsto no n.° 3 do artigo 71.° do CCP relativamente à Autora, e não à outra concorrente, aqui Contrainteressada, não reflete de per si qualquer quebra da imparcialidade administrativa. (…) O Júri entendeu, fundamentadamente, que da análise das propostas da A. resultavam indícios de preço anormalmente baixo no tocante aos concretos preços apresentados para ambos os Lotes do Concurso. E, por isso, não podia deixar de abrir oficiosamente o supramencionado subprocedimento, com o fito de recolher todos os elementos necessários para a boa formação da sua decisão, cabendo ao Júri exercer competência instrutória para determinar se a concorrente, ora A., se encontrava ou não afetada pela causa de exclusão referenciada na al. e) do n.° 2 do art. 70.° do CCP. Da análise das propostas da Contrainteressada, o Júri não extraiu qualquer indício de preço anormalmente baixo. Assim sendo, não cabia abrir o subprocedimento de esclarecimentos relativos aos “elementos constitutivos relevantes da sua proposta”, nos termos do art. 71.°, n.°s 2 e 3, do CCP. Os preços das propostas da A. e da Contrainteressada para cada Lote não eram os mesmos, e nem sequer havia proximidade dos respetivos valores [cfr. os pontos 21 e 22 do probatório]. Tendo formulado um juízo casuístico e discricionário de suspeita quanto aos preços da A., e não quanto aos preços da Contrainteressada, por detetar indícios de anomalia nos preços da A. e não os encontrar nos preços da Contrainteressada, a Entidade Demandada andou bem ao tomar a iniciativa de pedir esclarecimentos sobre o preço apenas em relação à Autora. (…) A análise das propostas, tendo em vista a sua admissão ou exclusão, é necessariamente um exercício individualizado, absoluto, intrínseco e centrado em cada proposta. Por outro lado, a decisão de exclusão das propostas foi tomada com objetividade, tal como evidenciado no Relatório Final, porque resultou do confronto de dois dados objetivos: (i) os pressupostos e as caraterísticas das próprias propostas conforme apresentadas pela Autora e (ii) o Caderno de Encargos, nomeadamente as suas exigências do Anexo 1. E foi precedida de uma fase contraditória, em que a A. teve oportunidade de apresentar esclarecimentos, os quais não foram tidos como justificativos da anomalia do preço. Aliás, a decisão de exclusão não decorreu, nem podia decorrer, do mero facto de o preço ou custo das propostas ser anormalmente baixo, mas antes do juízo formulado pela entidade adjudicante sobre a insuficiência dos esclarecimentos prestados pela concorrente, aqui Autora. As considerações urdidas pelo Júri apoiaram-se, como acentuámos, num cânone lógico, e não em meras suposições, perceções ou intuições do Júri. Acresce que, a análise que conduziu à exclusão das propostas da A. não resvalou para considerações de teor subjetivo, i.e., não foi opinativa nem centrada em aspetos exteriores às propostas. Por todo o exposto, não encontramos no procedimento sub judice qualquer sinal de uma atuação administrativa parcial ou arbitrária, decaindo assim a arguição de ofensa ao princípio da imparcialidade.”. E o assim decidido será para confirmar pois, como se provou, só os preços apresentados pela autora, ora recorrente foram considerados pelo júri como suscetíveis de ser qualificados como preços anormalmente baixos por comparação com o preço base fixado no programa do procedimento. E tal diferença de entendimento está assente em factos objetivos. Veja-se que a proposta da Autora foi de 1,19 €/ km e de 0,69 €/ km para o lote 1 e 2, respetivamente, o que totaliza 2.412.403 euros e 2.020.548 euros, ou seja, uma redução de 36,07% e 29,23% quando comparado com o preço base de cada um dos lotes postos a concurso; e a proposta apresentada pela N… foi de 1,64 €/km e 0,95 €/km, para os lotes 1 e 2, respetivamente, o que totaliza 3.324.657 euros e 2.781.914 euros, ou seja, uma redução de 11,90% e de 2,56% quando comparado com o preço base de cada um dos lotes postos a concurso (cfr. factos n.º 30 e 31 do probatório). Sucede que nada se provou no sentido de que a entidade adjudicante tenha atuado de forma parcial, formulado juízes alheados dos factos e sem ponderação de todos os interesses subjacentes à decisão e com relevância para a mesma. Termos em que se conclui que não ocorreu violação do princípio da imparcialidade previsto no artigo 1.º-A, n.º 1 do CCP, bem como no artigo 266.º, n.º 2 da CRP e artigo 9.º do CPA. * 3.2.6. Da violação dos princípios da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público. Alegou a recorrente que a adjudicação de uma proposta mais cara, e que oferece piores garantias de sustentabilidade ambiental, em detrimento da proposta da recorrente que, para além de ser mais vantajosa do ponto de vista financeiro, apresenta uma frota nova, e permitirá obter as vantagens do ponto de vista operacional que dispõe em função dos seus muitos anos de experiência, de modo algum garante o interesse público que é, afinal, selecionar a melhor proposta. O princípio da concorrência impõe não só a abertura dos procedimentos a um número maior de concorrentes, como exige o afastamento de causas de exclusão arbitrárias e injustificadas, tendo o júri excluído ilegalmente a proposta da Recorrente. O que deveria ser um procedimento aberto, na verdadeira aceção do termo, acabou por não acontecer porquanto as propostas da Recorrente e da Contrainteressada não estiveram sujeitas às mesmas condições, visto que somente o conhecimento do seu teor o Júri abriu o subprocedimento unicamente dirigido à Recorrente, violando, pois, o princípio da igualdade. A entidade recorrida defendeu que é falso que o Júri tenha violado os princípios da igualdade e da concorrência ao solicitar apenas à recorrente esclarecimentos sobre os preços das suas propostas. O pedido de esclarecimentos à recorrente resultou unicamente do facto de as suas propostas se afigurarem anormalmente baixas. Não se verifica violação do princípio da igualdade, que só ocorreria se tivesse havido tratamento diferenciado de situações idênticas. Também não ocorreu qualquer violação do princípio da concorrência, pois o procedimento não foi organizado para favorecer ou desfavorecer concorrentes. O legislador impõe a exclusão prévia de propostas com preços anormalmente baixos, por serem insuscetíveis de avaliação comparativa. Não se verifica violação do princípio da prossecução do interesse público, pois este impõe a adjudicação de propostas viáveis e exequíveis. Em suma, não ocorreu qualquer erro de julgamento quanto à aplicação dos princípios da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público, devendo a Recorrida ser absolvida do pedido. Vejamos. Como se prevê no artigo 1.º-A, n.º 1 do CCP “Na formação e na execução dos contratos públicos devem ser respeitados os princípios gerais decorrentes da Constituição, dos Tratados da União Europeia e do Código do Procedimento Administrativo, em especial os princípios da legalidade, da prossecução do interesse público, da imparcialidade, da proporcionalidade, da boa-fé, da tutela da confiança, da sustentabilidade e da responsabilidade, bem como os princípios da concorrência, da publicidade e da transparência, da igualdade de tratamento e da não-discriminação.”. Como defendem Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira in “Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública”, Almedina, pág. 180-182 e 185, os princípios comunitários funcionam como parâmetros de validade das leis internas e das suas opções em matéria de contratação pública. O princípio da concorrência - a verdadeira trave mestra da contratação pública, que aponta para uma maior concorrência, mas também para uma efetiva e sã concorrência. Ali funcionando como obstáculo à instituição de barreiras de acesso, aqui ele pode ser o seu fundamento. É sabido que a concorrência efetiva e sã é um dos principais objetivos da contratação pública e, por isso, o CCP consagra o princípio da concorrência como um dos princípios fundamentais do procedimento pré-contratual. Associado ao princípio da igualdade e da transparência e, bem assim, à prossecução do interesse público, o princípio da concorrência determina que, nos procedimentos de adjudicação de um contrato público, se garanta o mais amplo acesso dos interessados em contratar, em condições de igualdade de tratamento e de imparcialidade. Por força do princípio da igualdade “devem as entidades adjudicantes assegurar a igualdade de tratamento dos concorrentes na apresentação, na comparação e na avaliação das propostas (…). Os concorrentes devem dispor das mesmas chances na formulação dos termos das suas propostas, o que implica que todas estas sejam submetidas às mesmas regras e condições” (6-Cfr. Pedro Costa Gonçalves, in Direito dos Contratos Públicos, Vol. I, 3.ª edição, Almedina, novembro, 2018, págs. 359-360.). Decidiu-se na sentença recorrida que “a qualificação do preço de determinada proposta como anormalmente baixo e consequente início do subprocedimento de esclarecimentos quanto a essa proposta, e não quanto a outras propostas, que contêm preços mais elevados (não considerados anómalos pela entidade adjudicante), não viola o princípio da igualdade. Essa violação só existiria se tivesse sido dado um tratamento diferenciado de concorrentes em idêntica situação, o que não era o caso da A. e da Contrainteressada, na medida em que os preços das propostas que ambas apresentaram a cada um dos Lotes do Concurso eram díspares - disparidade que sobressai, de forma impressiva, do cotejo dos pontos 30 e 31 do probatório, que dão conta do diferencial em percentagem entre os preços de cada proposta e o preço base de cada Lote. Como existiria se tivesse sido dado um tratamento idêntico de concorrentes em situação diferente, que é o que a A. no fundo reclama, ao pretender que a Entidade Demandada seja censurada por não ter dado o mesmo tratamento a propostas que são materialmente diferentes. Evidentemente, o Júri do concurso só pode solicitar esclarecimentos sobre os preços das propostas se estas se lhe afigurarem anormalmente baixas, o que aconteceu com as propostas da A., mas não com as da Contrainteressada. Paralelamente, retira-se do Relatório Preliminar e do Relatório Final que o Júri tomou efetivamente em consideração os esclarecimentos apesentados pela A., mas não os aceitou. Já não se retira desses elementos, ou de quaisquer outros do procedimento, que ab initio a intenção do Júri era a exclusão da A. do procedimento. Inexistiu, outrossim, qualquer violação do princípio da concorrência, porque nada indicia que o procedimento adotado tenha sido organizado para favorecer ou desfavorecer qualquer concorrente. Por força deste princípio, as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas. Este “mínimo necessário” traduz-se em apenas admitir o maior leque possível de propostas que possam ser consideradas legais, ou seja, que não se reconduzam a algum dos casos de exclusão expressamente previstos na lei [seguimos de perto os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 19.02.2021, proc. n.° 00731/20.9BELSB e de 29.04.2022, proc. n.° 00339/21.1BECBR, in www.dgsi.pt]. O princípio da concorrência entre operadores de mercado é a pedra angular do direito da contratação pública, mas não interdita toda e qualquer redução da concorrência. A partir do momento em que o Júri entendeu que as propostas da A. apresentavam preços anormalmente baixos para cobrir os custos da execução dos contratos, e que os esclarecimentos prestados por esta confirmaram os receios e a desconfiança gerada sobre a suficiência desses preços, restava-lhe propor a exclusão de tais propostas, por imperativo legal [art. 70.°, n.° 2 al. e) do CCP], não podendo a A. invocar o princípio da abertura à concorrência para as salvar.”. E o assim decidido será para manter, pois não merece qualquer censura. Como já sobejamente se referiu e está demonstrado as propostas da autora apresentaram preços significativamente inferiores ao preço base estabelecido no programa do procedimento, o que não sucedeu com as propostas da contrainteressada, como resulta dos factos provados. Preços, aqueles, que foram suscetíveis de suscitar no júri a dúvida sobre se tratavam de preços anormalmente baixos para cobrir os custos da execução dos contratos, pelo que o júri solicitou à ora recorrente que prestasse esclarecimentos, o que esta fez. Sucede que o júri de forma fundamentada considerou tratar-se de preços anormalmente baixos, razão pela qual propôs a exclusão de tais propostas, em conformidade com a previsão do artigo 70.°, n.º 2 al. e) do CCP, não tendo assim a sentença recorrida incorrido em violação dos princípios da igualdade e da concorrência. A sentença recorrida considerou que o ato impugnado não infringiu o princípio da prossecução do interesse público, essencialmente, com a seguinte fundamentação: “O princípio da prossecução do interesse público implica que a entidade adjudicante defina os seus procedimentos na ótica da melhor defesa dos seus interesses, designadamente os seus interesses financeiros. Daí que, no âmbito da avaliação das propostas, seja adjudicada a que se revela economicamente mais vantajosa, apurada por via da aplicação do critério positivado no art. 15.° do Programa do Concurso. Todavia, só passam à fase de avaliação as propostas que superem o teste de regularidade formal, orgânica e substancial a que são previamente submetidas, em sede de análise - o que não aconteceu com as propostas da A., que foram excluídas. Após ter concluído, fundamentadamente, que as propostas da Autora não permitiriam executar os contratos de concessão postos a concurso, dado antecipar que os seus preços não cobrem os custos inerentes ao respeito por todo o Caderno de Encargos, por escassez de frota e recursos humanos, o Júri mais não podia fazer do que excluir tais propostas. É que, o preço inferior não é o mais vantajoso para a entidade adjudicante, se ele for deficitário para a cobertura dos custos em que o concorrente incorre com a execução do contrato. Não é de somenos notar que o regime aplicável à apresentação de preços anormalmente baixos tem em vista, para além da proteção do mercado, a própria tutela do interesse público subjacente à decisão de contratar, evitando que a entidade adjudicante fique amarrada a propostas que sabe à partida que, pelo carácter anormalmente baixo do seu preço, comprometem a boa execução do contrato. A adjudicação de propostas que comportem menor esforço financeiro da entidade adjudicante nem sempre é sinónimo de prossecução do interesse público, desde logo, se elas contêm preços que não permitem dar satisfação a obrigações legais ou suportar os custos associados ao contrato - sabendo-se que um baixo custo a curto prazo pode redundar num aumento da despesa a médio e longo prazo, se o risco de incumprimento do contrato se concretizar.”. O assim decidido não merece censura e será para manter. Com efeito, provou-se que a Autora propõe-se explorar o Lote 1 com 17 viaturas, sendo 13 viaturas de tipologia standard e as restantes 4 de tipologia mini e alocar 21 trabalhadores; e propõe-se explorar o Lote 2 com 9 viaturas, sendo 7 viaturas de tipologia standard e as restantes 2 de tipologia mini e alocar 11 trabalhadores. Para além de que apresentou para tal preços substancialmente inferiores aos preços base definidos, o que na sequência da prestação dos esclarecimentos solicitados pelo júri levou o júri a concluir, de forma fundamentada que as propostas apresentadas pela autora, ora recorrente apresentavam preços anormalmente baixos, com a fundamentação acima referida e que consta do relatório final, que absorveu a fundamentação do relatório preliminar. Mais se provou que a operação isolada do Lote 2, nos termos propostos pela Autora, não é viável, e assumir a operação conjunta dos dois lotes acrescenta um risco de perturbação à operação no Lote 1; assim como se provou que ainda que se assumisse que a operação conjunta do Serviço Público de Transporte de Passageiros (SPTP) de ambos os lotes em conjunto, ou de forma isolada, fosse operacionalmente viável, ainda assim não seria economicamente viável. Assim, verificando-se uma causa de exclusão das propostas da autora, como se demonstrou, a circunstância das propostas da autora apresentarem o preço mais baixo (preço este que foi, precisamente, a causa de exclusão) e de nos planos ambiental e de fiabilidade da frota, serem aquelas que oferecem maiores garantias na execução do serviço público objeto dos contratos de concessão dada a sua reduzida idade média (26 meses e 27 meses, para o lote 1 e 2, respetivamente) e máxima (48 meses, em ambos os lotes), posta ao dispor das operações, não permite concluir que são as propostas da autora, por serem as que apresentam o preço mais baixo, melhor salvaguardam o interesse público. Preço este que como vimos era insuficiente para cobrir os custos inerentes à execução dos contratos, colocando em risco a prestação do serviço público. Razões pelas quais improcede, também, este fundamento de recurso. Termos em que não se pode concluir que ocorreu violação dos princípios da igualdade, da concorrência e da prossecução do interesse público. *Em face do exposto, deve ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida. * As custas serão suportadas pela recorrente – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, todos do Regulamento das Custas Processuais. *IV. Decisão: Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Subsecção de Contratos Públicos, da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. Custas pela recorrente. Lisboa, 23 de outubro de 2025. (Helena Telo Afonso – relatora) (Jorge Martins Pelicano – 1.º adjunto) (Paula Cristina Oliveira Lopes de Ferreirinha Loureiro – 2.ª adjunta) |