Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1614/20.SBELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/03/2025
Relator:CRISTINA COELHO DA SILVA
Descritores:CONTRIBUIÇÃO SECTOR BANCÁRIO – 2019
Sumário:I - A Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) tem natureza de contribuição financeira e é devida pela sucursal de sociedade com sede num Estado-Membro da União Europeia.

II - As normas que modelam o regime jurídico da Contribuição sobre o Sector Bancário não violam os princípios da legalidade, igualdade na sua vertente da Equivalência.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Contencioso Tributário Comum do Tribunal Central Administrativo Sul



I – RELATÓRIO

C....... (L……), S.A. – SUCURSAL EM PORTUGAL, com os demais sinais nos autos, deduziu impugnação judicial contra a decisão de indeferimento que recaiu sobre a reclamação por si apresentada do ato de autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário (“CSB”) respeitante ao ano 2019, no montante de € 11.326,53.

*
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa julgou a ação totalmente improcedente, por sentença de 31 de Maio de 2022.
A impugnante e aqui Recorrente, não se conformando com a decisão, veio da mesma interpor recurso jurisdicional.

***

A Recorrente, nas suas alegações, formula as seguintes conclusões:

“VI. CONCLUSÕES
Enquadrando o litígio em causa,
1) A sentença sob censura no presente recurso pôs fim à impugnação judicial que correu termos sob o n.º 1614/20.8BELRS, no Tribunal Tributário de Lisboa, que foi submetida contra o indeferimento da reclamação graciosa n.º 3247202004004876 apresentada pela Recorrente por não concordar com a legalidade da autoliquidação n.º 26000015429 da Contribuição sobre o Setor Bancário («CSB») relativa ao ano de 2019, onde a Recorrente se viu obrigada a autoliquidar o montante de € 11.326,53 (onze mil, trezentos e vinte seis euros ecinquenta e três cêntimos). 2)
2) Todavia, a sentença recorrida não logrou analisar o real objeto da impugnação, falhando igualmente em analisar o caso concreto e escudando-se numa apreciação simplista e genérica, sem ouvir as testemunhas arroladas, e baseada em doutrina e jurisprudência sobre a aplicação da CSB a Instituições de Crédito residentes ou sobre temas adjacentes, que não são sequer aplicáveis ao caso da RECORRENTE nos presentes Autos.
3) A RECORRENTE apresentou o presente recurso para este douto Tribunal por não concordar, em primeiro lugar, com o teor da factualidade dada como provada, considerando que a mesma teria sido certamente diversa se o Tribunal a quo tivesse ouvido as testemunhas arroladas pela RECORRENTE. Nesta medida a RECORRENTE opõe-se à conclusão subscrita pelo Tribunal a quo, assente na errónea decisão de dispensar a produção de prova testemunhal (cfr. despacho do Tribunal a quo de 24 de abril de 2022) e que redundou na errada apreciação da prova produzida e do enquadramento jurídico aplicável.
4) O Tribunal a quo proferiu despacho, dispensando a audiência das testemunhas arroladas pela ora RECORRENTE. Sucede que parte da argumentação da RECORRENTE que depende da prova testemunhal que, no caso concreto, foi dispensada. Especificando: i) o passivo da RECORRENTE é incluído no passivo da casa-mãe; ii) a casa-mãe da RECORRENTE pagou efetivamente uma contribuição no âmbito da Diretiva, à entidade reguladora da sua residência / entidade reguladora europeia; iii) na qual suportou, em parte, o passivo da sucursal, iv) a autoliquidação da CSB em causa foi feita tendo por base a totalidade do passivo da sucursal (passivo bruto), uma vez que a sucursal não possui fundos ou capitais próprios – ao contrário do que se passa em relação a todas as instituições financeiras residentes em Portugal.
5) Com efeito, as instituições de crédito residentes em Portugal têm capital próprio e, como tal, a proporção de passivos no seu balanço é, sistematicamente, inferior à proporção dos passivos que financiam uma sucursal de uma instituição de crédito residente noutro Estado-Membro da UE, reduzindo proporcionalmente a sua base de incidência da CSB face à base de incidência das sucursais em situações similares.
6) O Tribunal a quo considerou que nada mais com interesse para a causa era necessário ser provado e não podia estar mais equivocado. A prova testemunhal destes factos é fundamental para que se possa justificar que estamos perante uma situação ilegal de violação do Direito Europeu: da Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014, por um lado, e, simultaneamente, fundamentar o tratamento discriminatório sofrido pelas sucursais no âmbito do regime da CSB, que constitui uma flagrante violação do princípio da liberdade de estabelecimento no âmbito do Direito Europeu.
7) Desta forma, só o depoimento de testemunhas que acompanharam o registo contabilístico e fiscal da Sucursal e da casa-mãe poderiam elucidar cabalmente o Tribunal acerca destes pontos em concreto, não podendo este elemento de prova ser descartado como inferior, dilatório ou desnecessário face aos documentos juntos. Serão, no limite, complementares – o que, aliás, se revela claro ao ler o Parecer do Senhor Professor António Martins, também junto a estes autos.
8) Finalmente, sempre se diga que a sentença recorrida, na parte em que acolhe o despacho de dispensa da prova testemunhal apresentado padece de um vício lógico ao pressupor que dos Autos já consta toda a factualidade necessária à decisão da causa. De facto, mesmo admitindo-se que o Tribunal, com base nos factos arguidos e na prova documental junta, pudesse estar já convencido da plena razão que assistia à RECORRENTE – o que não veio a verificar-se –, não poderia, ainda assim, ter prescindido da prova testemunhal já que, no processo fiscal não há base instrutória stricto sensu (e, consequentemente, não há factos assentes).
9) Neste caso, à luz da alínea c) do n.º 1 do artigo 662.º do CPC, deve a decisão de facto ser anulada e determinada a sua ampliação, devendo os Autos baixar à primeira instância para que sejam ouvidas as testemunhas arroladas e fixados todos os factos relevantes, o que imediatamente se requer.
10) Adianta-se aqui, desde já, que a controvérsia subjacente ao presente processo se prende, essencialmente, com a ilegalidade da liquidação da CSB à RECORRENTE decorrente da aplicação do regime da CSB numa entidade com a natureza jurídica de sucursal em Portugal de instituição financeira residente na União Europeia.
11) Deste erro capital derivam todos os vícios de ilegalidade da sentença proferida pelo Tribuna a quo, i.e. é por não compreender a relação jurídica base de uma Sucursal com a sua casa-mãe que decide erradamente e em violação do Princípio da Equivalência, do mesmo modo, é também por não compreender a relação jurídica base de uma Sucursal com a sua casa-mãe que o Tribunal a quo erra ao aplicar o Direito Europeu tanto na vertente da Liberdade de Estabelecimento como na aplicação harmonizada da Diretiva em causa.
12) Secundando o que acabamos de expor, há já vasta jurisprudência sobre a CSB, mas está construída em torno do pressuposto de que a instituição de crédito é residente em Portugal, o que neste caso, não se verifica, e altera toda a análise do regime desta contribuição. É nestes moldes que iremos explicar que a decisão a quo está errada, e que este douto Tribunal decida o caso da RECORRENTE, e não se limite a “seguir à boleia” dos casos de instituições de crédito residentes ou de outros temas adjacentes.
13) Em jeito de sumário executivo, a RECORRENTE demonstrará que a sentença recorrida erra grosseiramente nos seguintes termos:
Na análise do princípio da igualdade na vertente da equivalência, como fundamento das contribuições, uma vez que o regime da CSB está legitimado por uma presunção de «benefício» para os sujeitos passivos, que é o acesso às medidas de resolução do Banco de Portugal (às quais a CSB está consignada). Ora, para uma sucursal de uma instituição de crédito residente noutro Estado Membro da União Europeia existe uma impossibilidade de obtenção desse «benefício». É impossível juridicamente que a RECORRENTE seja alvo de medidas de qualquer medida resolução do Banco de Portugal. A legitimação da incidência da CSB para as sucursais está, portanto, posta em causa.
Na aplicação do Direito Europeu na vertente da liberdade de estabelecimento, uma vez que citando jurisprudência anterior, não aplicável ao caso concreto, entendeu que o regime legal da CSB consagra um tratamento necessariamente mais gravoso para as sucursais do que para as instituições de crédito residentes em Portugal, porém concluindo que não existe uma discriminação das sucursais EU ou restrição da liberdade de estabelecimento prevista no TFUE. Assim, não assaca as devidas consequências dessa análise, nomeadamente, as que decorrem do artigo 49.º do TFUE, que proíbe restrições discriminatórias à liberdade de estabelecimento, tal como tem sido interpretado pela jurisprudência do TJUE.
Na aplicação do Direito Europeu, agora na vertente da Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014 que harmonizou as regras sobre contribuições a aplicar às instituições bancárias para financiar a estabilização dos sistemas financeiros e os fundos de resolução nacionais e o Fundo Único de Resolução europeu. Evidentemente, a manutenção da CSB em Portugal, sem qualquer adequação ao novo quadro legal europeue, adicionalmente, a extensão da CSB às sucursais UE, coloca em causa a coerência do sistema da Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014, e os princípios básicos da União Bancária, redundando numa dupla tributação do passivo e violando as condições de livre concorrência no mercado único.
Assim,
Do erro do Tribunal a quo na aplicação do Princípio da Equivalência,
14) Como em qualquer figura de contribuição financeira, a CSB fundamenta a sua imposição tributária numa relação de equivalência (ainda que difusa) entre o tributo a pagar pelas instituições do setor bancário e um potencial benefício do Fundo de Resolução português. O referido Fundo de Resolução tem como função financiar as medidas de resolução deliberadas pelo Banco de Portugal. Assim, para determinar o montante de tributo a pagar o legislador tinha de “medir” o potencial benefício das medidas de resolução financiadas pelo Fundo. Fê-lo através do “risco sistémico” criado pelo setor bancário, indicado – de acordo com o legislador da CSB – pelos montantes presentes no passivo contabilístico das instituições de crédito que não estão segurados por qualquer outro mecanismo.
15) Observa-se a perfeita aplicação do que acabámos de expor no pagamento da CSB por qualquer instituição de crédito residente em Portugal.
16) Contudo, tal não é o caso da RECORRENTE porque esta é uma sucursal de Instituição de Crédito residente noutro Estado Membro da UE e, por essa circunstância, não aproveita do benefício, não obstante continuar obrigada ao pagamento da CSB!
17) Neste contexto, esclarece-se que o Banco de Portugal não tem competência para determinar a resolução de sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede noutro Estado Membro da União Europeia.
18) No caso das sucursais, estamos, pois, perante uma verdadeira impossibilidade absoluta de benefício, que começa pela inclusão errada da RECORRENTE numa classe ou grupo de contribuintes à qual não pertence (i.e. instituições de crédito residentes em Portugal) e, acaba consagrando uma proibição jurídica de beneficiar dessas mesmas contrapartidas.
19) Conclui-se, assim, que inexiste no caso em apreço qualquer prestação pública que, ainda que de modo difuso, permita justificar a incidência de CSB relativamente à RECORRENTE pelo que a sua sujeição implica a violação do princípio da igualdade na vertente da equivalência, enquanto critério e pressuposto das contribuições e manifestação do princípio constitucional da igualdade tributária vertido no artigo 13.º da Constituição, e que se encontra refletido no artigo 5.º, n.º 2, da LGT.
20) O Tribunal a quo adere simplisticamente à jurisprudência anterior do TC desconsiderando por completo a natureza jurídica de sucursal da ora Recorrente, na decisão de que agora se recorre, e erra claramente na aplicação do Direito à situação particular de incidência de CSB no caso sub judice.
21) Ou seja, as conclusões deste e de outros acórdãos do TC relativamente à violação do princípio da equivalência podem ter relevância para situações que envolvam instituições de crédito residentes em Portugal, mas não podem aplicar-se indistintamente a instituições de crédito não residentes a operar em Portugal através de sucursais, como é o caso da RECORRENTE.
22) Por um lado, porque embora as referidas sucursais estejam legalmente obrigadas a pagar a CSB, cuja receita está consignada ao Fundo de Resolução português, não podem, em qualquer circunstância, beneficiar das medidas de resolução do Banco de Portugal financiadas pela CSB. Por outro lado, porque as únicas entidades que podem, de facto e de direito, aplicar uma medida de resolução à RECORRENTE são as entidades reguladoras e de resolução bancária do EstadoMembro da sua casa-mãe / entidade de resolução europeia.
23) E nem se diga que a RECORRENTE beneficia das medidas em geral tomadas pelo Bano de Portugal. Estamos certos de que qualquer sucursal, empresa, pessoa singular ou outra entidade a operar na economia portuguesa beneficiará das variadas e importantes medidas do Banco de Portugal ou de qualquer outra autoridade pública portuguesa. Mas esse pressuposto não é suficiente para que todas estas entidades ou pessoas paguem CSB. Para isso pagam os seus impostos, e não contribuições como a que está aqui em causa. É suposto que o princípio da equivalência efetue o recorte dos sujeitos passivos que beneficiam da aplicação de medidas de resolução (financiadas pela CSB), para que possa atribuir à CSB a correta incidência subjetiva.
24) Com efeito, o Tribunal a quo fez um juízo sem qualquer fundamento ou base. A este respeito explica-se que uma sucursal em Portugal tem o seu passivo, e por isso, o seu risco sistémico, registado, contabilizado, regulado e assegurado por outro Estado Membro. Os passivos registados na casa-mãe – in casu no Luxemburgo – nunca chegarão à situação de criar qualquer custo direto ou indireto em Portugal, porque, em caso de necessidade de resolução, estão cobertos por um outro fundo, e não pelo Fundo de Resolução português.
25) Uma vez que, com a transposição da Diretiva 2014/59/UE de 15 de maio de 2014 que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento, essa competência é da entidade nacional competente e autoridade de resolução do Estado-Membro onde a empresa-mãe tem a sua sede (neste caso no Luxemburgo).
26) Nestes termos, a contribuição que é paga pela casa mãe, onde é consolidado o passivo da RECORRENTE, é paga ao Banco regulador luxemburguês / entidade reguladora europeia, para financiar qualquer medida de resolução ou apoio ao sistema bancário e que, neste caso em particular, que seria tomada pelo Banco regulador luxemburguês / entidade reguladora europeia, resgatando ou apoiando indiretamente a RECORRENTE, como sucursal a operar em Portugal.
27) Neste ensejo, fica claro que a sujeição da Recorrente à CSB surge como um capricho do legislador português, violador de imperativos constitucionais básicos e fundamentais, não preenchendo o fundamento comutativo das contribuições, uma vez que viola o princípio da equivalência, enquanto manifestação do princípio mais amplo da igualdade tributária consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Como se não bastasse,
Do erro do Tribunal a quo na aplicação do Direito Europeu na vertente da liberdade de estabelecimento – introdução
28) A RECORRENTE tem vindo a explicar que o regime da CSB aplicado a sucursais de instituições de crédito residentes noutros Estados Membros da União Europeia viola grosseiramente o Direito Europeu em duas vertentes principais.
29) Afigura-se-nos que o Tribunal a quo não ponderou, como o deveria ter feito, os elementos concretos invocados a respeito do incumprimento do Direito da União Europeia, nomeadamente, da liberdade de estabelecimento plasmada no artigo 49.º e seguintes do TFUE, e da Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014.
30) A esta luz, como é sabido, as sucursais UE não têm personalidade jurídica, efetuando diretamente, no todo ou em parte, operações inerentes à atividade da instituição de crédito não residente que integram — cf. artigo 2.º-A, alínea ll) do RGICSF. Esta ausência de personalidade jurídica determina, entre o mais, a inexistência de capitais próprios nas sucursais UE, tal como estes são considerados e contabilizados para efeito das instituições de crédito com sede e efetiva e administração em Portugal, para efeitos do apuramento da base tributável da CSB, o que implica uma clara situação de discriminação face a instituições de crédito residentes em Portugal.
31) Em março de 2016 foi aprovada uma alteração importantíssima ao Regime da CSB (efetuada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março) nos termos da qual foi estabelecido que, para além dos sujeitos passivos já inicialmente identificados, também as sucursais de instituições de crédito com sede principal e efetiva na União Europeia passariam a ser sujeitos passivos da CSB.
32) Na sequência desta alteração legislativa, a Portaria n.º 165-A/216, de 14 de junho aprovou a nova declaração modelo 26 e novas instruções de preenchimento dirigidas diretamente às sucursais, nos seguintes termos: «no caso das sucursais, em Portugal, de instituições de crédito com sede principal e efectiva fora do território nacional, de acordo com as regras contabilísticas, o respectivo passivo inclui as dívidas para com a sede (principal e efectiva fora do território nacional) e/ou outras sucursais desta, as quais são, assim, consideradas dívidas para com terceiros» (destaque nosso)
33) Este alargamento legal da incidência subjetiva da CSB às sucursais, conjugado com as normas da Portaria que densificam a incidência objetiva, clarificando que o free capital / capital alocado pela casa-mãe à sucursal de uma instituição de crédito residente noutro Estado Membro da União Europeia é sempre um passivo (e nunca poderá ser considerado como capital ou fundo próprio), discrimina grosseiramente e prejudica as sucursais UE face às instituições de crédito residentes e às não residentes com filiais residentes em território português.
34) A conjugação destes elementos consolida o enquadramento jurídico-tributário da CSB em Portugal, como uma contribuição que tem como principal pressuposto a tributação do passivo. De acordo com o legislador, este elemento contabilístico (i.e., o passivo) permitiria, grosso modo, “medir” o risco sistémico assumido por uma instituição financeira, pois que, representaria as responsabilidades assumidas perante outros.
35) No entanto, a extensão apressada, e sem ponderar devidamente as respetivas consequências legais e contabilísticas, às sucursais UE da incidência subjetiva em sede de CSB não tomou devidamente em conta as particularidades jurídicocontabilísticas das sucursais face às instituições de crédito residentes. Daqui decorre, como à frente se demonstra, uma inevitável discriminação no plano do apuramento da base de incidência entre estes dois tipos de entidade.
Do erro do Tribunal a quo na aplicação do Direito Europeu na vertente da liberdade de estabelecimento – aspetos fundamentais jurídico-funcionais, financeiros e contabilísticos
36) Recorde-se que a RECORRENTE, por ter a natureza jurídica de sucursal, recorrendo aos aspetos fundamentais jurídico-funcionais, financeiros e contabilísticos vê-se obrigada a reconhecer a totalidade do financiamento alocado pela casa-mãe como passivo. Assim, nos termos do Regime da CSB a base de incidência das sucursais é sempre proporcionalmente mais elevada face à base de incidência de uma instituição de crédito residente.
37) Isto significa que, simplificando, no caso de instituições de crédito residentes, a CSB incide sobre o seu passivo «líquido» (i.e. o seu passivo é composto por elementos do passivo e por elementos dos capitais próprios), ao passo que, no que às sucursais UE diz respeito, a CSB incide exclusivamente sobre a totalidade do financiamento (o seu passivo «bruto» total), sem consideração de elementos dos capitais próprios, colocando estas últimas em situação desfavorável face às primeiras.
38) A este respeito note-se que de entre os aspetos principais que fundamentam a discriminação das sucursais aqui em causa que causa, determinando a ilegalidade da CSB, um dos principais é o aspeto contabilístico, a propósito do qual foi junto como documento n.º 1 às presentes alegações de recurso um Parecer do Senhor Professor Doutor António Martins na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra que, de forma particularmente brilhante, esclarecida e com um rigor técnico notável explica porque é que, com base nas normas de contabilidade, estamos perante um desenho de uma contribuição que discrimina as Sucursais de Instituições de Crédito residentes noutros Estados-Membros da União Europeia face às Instituições de Crédito que são residentes em Portugal, colocando as primeiras sempre numa posição desfavorável face às segundas.
39) Como doutamente refere o Professor António Martins, no seu Parecer junto como documento n.º 1, na vertente jurídico-funcional o capital próprio de uma sociedade tem as funções de (i) constituição da mesma, (ii) de conservação da atividade da empresa, e (iii) de responsabilidade, ou garantia, perante os seus credores. Já quanto ao passivo, este é um meio de financiamento que implica a relação com terceiros. Por fim, as duas realidades distinguem-se ainda «pela prioridade de reembolso em caso de falência». Com efeito, como refere o referido parecer, «o capital próprio representa fundos em última análise responsáveis pelas dívidas sociais. (…) Por fim, num plano misto jurídico-económico, dado o maior risco a que se expõe o capital próprio, este terá, em regra, uma expetativa de mais avultada remuneração (contingente) ao invés de uma remuneração certa (como é usual nos passivos).»
40) Na vertente financeira, para determinar a diferença entre um instrumento de dívida e de capital próprio deve fundamentalmente considerar-se se o instrumento faculta ao seu titular a participação no controlo da gestão da empresa e se o instrumento tem alta ou baixa prioridade sobre os cash flows. Como expõe o Professor António Martins, no seu Parecer junto como documento n.º 1, esta é uma grelha de análise tendencial que deve ser usada na compreensão financeira de um instrumento de dívida.
41) Adicionalmente, na vertente contabilística, a Estrutura Conceptual do IASB permite distinguir claramente as definições contabilísticas de passivo face às definições contabilísticas de capital próprio, determinando que as sucursais têm, como já antes se viu, uma particular configuração jurídico-obrigacional para com as respetivas sedes ou casas-mãe. Donde resulta, para o que aqui releva no plano contabilístico, que os fundos que as sucursais recebem das sedes não são fundos de acionista (i.e., não representam direitos residuais) que respeitem a definição de capital próprio da dita norma contabilística, mas sim sempre de passivo.
42) Não restam, pois, dúvidas sobre uma discriminação que introduz na base de incidência das sucursais uma maior proporção de dívida do que numa instituição de crédito com personalidade jurídica, em situações similares, por via da maneira como os fundos que as financiam são qualificados contabilisticamente.
Em detalhe,
43) Recordemos, a incidência objetiva, em particular, a base tributável da CSB definida pelo Regime da CSB aprovado pela Lei n.º 55-A/2020, de 31 de dezembro: «O passivo (…) deduzido, quando aplicável, dos elementos do passivo que integram os fundos próprios, dos depósitos abrangidos (…) por um sistema de garantia de depósitos oficialmente reconhecido (…) e dos depósitos na Caixa Central constituídos por caixas de crédito agrícola mútuo pertencentes ao sistema integrado do crédito agrícola mútuo (…)».E também a definição de“passivo” determinada na Portaria n.º 121/2011, de 30 de março que regulamenta a CSB: «(…) entende-se por passivo o conjunto dos elementos reconhecidos em balanço que, independentemente da sua forma ou modalidade, representem uma dívida para com terceiros, com excepção dos seguintes: a) Elementos que, segundo as normas de contabilidade aplicáveis, sejam reconhecidos como capitais próprios (…)».
44) Podemos dizer, em consonância com o Parecer (já junto como doc. n.º 1), que, na definição de passivo, que é a base de incidência da CSB, a Portaria seguiu de perto a terminologia da contabilidade, equiparando os passivos registados sob qualquer forma ou modalidade, a qualquer tipo de obrigação, i.e., a “dívida[s] para com terceiros”, excecionado nos termos acima mencionados.
45) A este respeito, acresce ainda em relação a esta primeira fonte de discriminação, que até as próprias instruções de preenchimento da Modelo 26, aprovadas pela referida Portaria, vêm clarificar que o financiamento da casa-mãe à sucursal deve ser totalmente registado como passivo da sucursal.
46) Esta circunstância, por si só, representa uma discriminação, uma vez que, em circunstâncias semelhantes a uma instituição de crédito residente, a sucursal terá o lado direito do balanço apenas constituído por passivos relativos ao financiamento perante a casa-mãe, o que irá integrar a base de incidência da CSB. Já uma instituição de crédito residente terá sempre uma percentagem menor de passivo integrado na base de incidência, pois que o capital próprio reduz o passivo que enforma a base de incidência.
47) Continuando, e aplicando estas premissas ao caso dos autos, particularmente no que toca às sucursais, vejamos a doutrina interna da AT, a título de exemplo, na Resposta ao Pedido de Informação Vinculativa, n.º 21016, sancionada por Despacho de 2021-06-07, do Diretor da UGC em que clarifica que não há dúvidasde que todas as entradas de fundos que financiam uma sucursal, provenientes da sede, são passivos.
48) No entanto, mal andou a AT, aventando a possibilidade de as sucursais registarem capitais próprios consubstanciados no capital de base / free capital. Mesmo os fundos que por vezes se apelidam de “free capital”, e a que por vezes se confere a designação de “entradas de capital”, “capital de base” ou “equity”, quando estão em causa Sucursais, não representam, nem jurídica, nem financeira, nem contabilisticamente, capital próprio. E mesmo que o montante alocado pela casa-mãe tivesse sido alocado como capital-base ou free-capital da sucursal esta circunstância não alteraria em nada o respetivo tratamento contabilístico como passivo, uma vez que (i) de uma perfectiva contabilística não tem função de fundação ou constituição da entidade em causa, (ii) de uma perspetiva jurídicofuncional não existe esta obrigação de entrada, nem tão pouco, de almofada, e, por fim, (iii) de uma perspetiva financeira estes fundos não conferem o controlo da gestão da empresa em causa, como brilhantemente já clarificou o Senhor Professor Doutor António Martins (cfr. doc. n.º 1, que se juntou anexo).
49) Com efeito, as instituições de crédito residentes, nos termos do Regime da CSB, têm sempre uma base de incidência menor do que uma sucursal, uma vez que registam capitais próprios e estes reduzem o passivo que é contabilizado para efeitos da base de incidência da CSB, enquanto as Sucursais não podem registar capitais próprios, registando um passivo proporcionalmente superior, e, por isso, são sempre colocadas perante uma base de incidência de CSB superior.
50) O que se disse até aqui configura uma primeira fonte de verdadeira discriminação face à liberdade de estabelecimento, logo na determinação do passivo tributável feito pelo artigo 4.º, n.º 1 alínea a) da Portaria n.º 121/2011, de 30 de março, no que à CSB diz respeito.
51) Não restam, pois, dúvidas sobre uma discriminação que introduz na base de incidência das sucursais uma maior proporção de dívida do que numa instituição de crédito com personalidade jurídica, por via da maneira como os fundos que as financiam são qualificados contabilisticamente, tal secundado, repisado, explicado e demonstrado à saciedade não apenas pela Recorrente mas também pelo Senhor Professor Doutor António Martins, no Parecer que já foi junto ao presente processo (cfr. doc. n.º 1, que já foi junto às presentes alegações de recurso).
52) Afinal, além do capital próprio stricto sensu, que vimos acima, que outros elementos é que, segundo as normas de contabilidade aplicáveis, podem ser reconhecidos como capitais próprios? Damos aqui alguns exemplos: instrumentos de passivo com características de capital próprio; as obrigações convertíveis, as obrigações participantes; as ações preferenciais remíveis; os designados contingent convertible bonds; e isto apenas a título exemplificativo.
53) Por esta razão, as instituições de crédito residentes têm sempre “elementos que, segundo as normas de contabilidade aplicáveis, sejam reconhecidos como capitais próprios” que as sucursais não têm… São explicados um a um no corpo das presentes alegações de recurso.
54) E nem se diga que é assim por escolha. Não é. Tal situação resulta da própria natureza das sucursais, e não de uma política concertada entre elas e as sedes. Isto é, não se lhes aplica o argumento: “não tem, mas podem ter passivos perante a casa mãe com traços de capital próprio”. Ao contrário de uma instituição de crédito, não os pode ter. É tão simples quanto isso.
55) Com efeito, à luz de tudo quanto se expos do ponto de vista jurídico-funcional, financeiro, contabilístico, tributário e estritamente jurídico há ainda uma última perspectiva, a perspectiva regulatória ou prudencial.
56) Em face da natureza jurídica das sucursais, qualquer forma de fundos que que provenham da sede estão sempre sob a condição de ser “paybale on demand”, ou seja, a faculdade de a sede, a qualquer momento e em qualquer circunstância, poder determinar o seu reembolso (como fica bem claro dos reportes FINREP/COREP exigidos pelo Banco de Portugal – cf. Regulamento de Execução (UE) 2021/451 da Comissão de 17 de dezembro de 2020, que estabelece normas técnicas de execução para a aplicação do Regulamento (UE) n.º 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho no que respeita ao relato para fins de supervisão das instituições).
57) Veja-se que, tal como acima se expos para efeitos da violação da liberdade de estabelecimento, também a este respeito fica claro que os fundos que são afetos à Sucursal não são os relevantes para efeitos de definição de ratios prudenciais, esses são sempre os capitais da casa-mãe, como bem esclareceu o Senhor Professor António Martins bem no seu Parecer que se juntou em anexo como documento n.º 1.
Do erro do Tribunal a quo na aplicação do Direito Europeu na vertente da liberdade de estabelecimento – impossibilidade de deduzir os fundos próprios nos termos do artigo 3.º, alínea a) do Regime da CSB:
58) Mas as discriminações não terminam na fórmula legal usada para o cálculo da base de incidência, tal como consta da Portaria, pois que, mesmo no próprio Regime da CSB há uma discriminação evidente das sucursais: a dedução dos fundos próprios. Com efeito, nos termos do artigo 3.º, alínea a), do Regime da CSB que determina a incidência objetiva da contribuição, as sucursais ficam impedidas de aplicar a dedução prevista para os fundos próprios, como iremos agora demonstrar.
59) Ora conclui-se daqui que os elementos financiadores de uma sucursal, não são, como antes se desenvolveu, “segundo as normas de contabilidade aplicáveis, […] reconhecidos como capitais próprios”. Logo, esta consideração na base da CSB não está ao alcance de uma sucursal. Mas pode ser feita numa instituição de crédito. O que, uma vez mais, coloca as Sucursais UE numa situação discriminatória.
60) Cabe aqui finalizar a análise com a jurisprudência do TJUE, que foi devidamente exposta no corpo das alegações de recurso, sobre discriminação em casos semelhantes com o caso presente. Vejam-se os acórdãos Brisal e Novo Banco, particularmente próximos da realidade portuguesa do caso presente.
61) Como é consabido, os Estados Membros podem adotar medidas restritivas das liberdades fundamentais, desde que devidamente justificadas. Aqui, em especial, trata-se do direito de estabelecimento, atente-se ao artigo 52.º do TFUE, no qual se permite que haja essa restrição por «razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública». Além disso, na jurisprudência do tribunal verifica-se também uma cláusula aberta de justificação por «razões imperiosas de interesse geral», que nãos estando no catálogo do tratado, têm sido usadas pela jurisprudência (entre outros, os Acórdãos Cadbury Schweppes, C-196/04, n.º 47; e Comissão c. Países Baixos, C-521/07, n.º 42) – nenhuma justificação se verifica no caso concreto.
Do erro do Tribunal a quo na aplicação do Direito Europeu na vertente de violação da Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014
62) No caminho das violações do Direito Europeu perpetradas pelo Tribunal a quo, vejamos em que medida é que o referido Tribunal resolveu a questão do enquadramento europeu da CSB e da clara violação desse enquadramento.
63) A sentença recorrida, invoca as normas da Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014 que parecem permitir que os Estados-Membros criem «mecanismos nacionais de financiamento através de contribuições obrigatórias das instituições autorizadas no seu território». É certo que, tal como prevê a Diretiva, e como salienta o Tribunal a quo, que «os Estados-Membros podem adotar ou manter regras mais rigorosas ou adicionais em relação às estabelecidas na presente diretiva e nos atos delegados e de execução», mas não o podem fazer em total desarticulação com o sistema harmonizado europeu.
64) Reenquadremos o problema: não se trata de a criação da CSB ou dos objetivos por si prosseguidos serem ilegais. Antes, é a forma como a CSB foi criada e a falta de enquadramento e articulação com o regime harmonizado europeu que leva à ilegalidade da mesma.
65) E tanto assim é que toda a restante legislação portuguesa se conformou com os princípios da Diretiva e da restante regulação europeia nesta matéria, apenas a CSB se mantém como uma figura sui generis em Portugal. Por um lado, a CSB tem o objetivo de ser uma contribuição para o financiamento de medidas de resolução bancária, mas totalmente desenquadrada dos quadros legais da regulação bancária, das medidas de resolução dos bancos centrais e do Banco Central Europeu. Assim, obviamente, esta contribuição a meio caminho cria e perpetua situações absolutamente chocantes do ponto de vista fiscal como as que vimos anteriormente quanto à violação do princípio da equivalência e quanto à violação da liberdade de estabelecimento.
66) A este respeito importa recuperar que foi em 2014 aprovada a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabeleceu um enquadramento harmonizado a nível europeu para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento no contexto do mercado único da União Europeia.
67) Naquela Diretiva e no Regulamento (UE) n.º 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que se lhe seguiu, foram estabelecidos os critérios gerais a nível europeu para determinar a fixação e o cálculo das contribuições das instituições de crédito para os mecanismos nacionais de financiamento das medidas de resolução e para efeitos de financiamento do Fundo Único de Resolução.
68) Simplesmente, a CSB consubstancia uma contribuição sui generis, não prevista na Diretiva, que, digamo-lo desde já, viola o regime de contribuições criado pela referida Diretiva bem como a regulação do RGICSF, designadamente no seu artigo 153.º H, por se autonomizar em relação a este regime harmonizado a nível europeu.
69) No entanto, a partir do momento em que a aludida Diretiva entrou em vigor e, por essa via, passou a aplicar-se a todos os Estados-Membros envolvidos o mesmo regime de contribuições, o Regime da CSB deveria ter sido eliminado aquando da transposição da referida Diretiva para o ordenamento jurídico português, substituindo-se a CSB pelas contribuições previstas naquela Diretiva — o que evidentemente não aconteceu. Aliás, a Lei n.º 23-A/2015, de 26 de março, não introduziu qualquer alteração ao regime da CSB, sendo omissa no que à mesma diz respeito, o que evidencia a falta de consciência do Legislador português para este problema.
70) Aliás, como já foi referido nos Autos, a partir do momento em que a Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014, que harmoniza o regime de contribuições e resolução de instituições de crédito no âmbito da UE, exclui expressamente as referidas Sucursais de quaisquer contribuições é claro e evidente, que o regime jurídico da CSB aplicável à ora RECORRENTE colide com a referida Diretiva.
71) O mesmo ficou, como já foi referido, refletido no RGICSF, o qual estabelece que só as entidades participantes do Fundo de Resolução estão sujeitas a estas contribuições, estando as sucursais UE expressamente excluídas das mesmas — cfr. 153.º-D do RGICSF.
72) Com efeito, se ao nível da UE, os Estados Membros acordaram na criação de um regime europeu, único e harmonizado, que regula simultaneamente as contribuições a pagar pelas instituições de crédito e as correspondentes medidas de resolução bancária a adotar, a existência de um regime nacional paralelo, com regras que contrariam aquele regime harmonizado, viola frontalmente o direito europeu.
73) E é precisamente esta contradição e violação que ocorre no caso sub judice. Com efeito, se cada Estado-Membro da UE introduzisse no seu ordenamento jurídico uma contribuição unilateral sobre o setor bancário similar à que aqui se contesta, o propósito da Diretiva e dos Regulamentos perdia todo o seu efeito. Falece assim, de razão, o Tribunal recorrido ao decidir que o Regime da CSB aplicável às sucursais não colide com a Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014, uma vez que a letra e o espírito da referida Diretiva, que harmonizou os processos de resolução bancária e das contribuições que financiam essas medidas de resolução, impede que as Sucursais sejam chamadas a financiar, no Estado Membro onde estão instaladas, as medidas de resolução de bancos.
74) O regime legal da CSB, e os atos de liquidação da CSB daí decorrentes, não cumprem os critérios estabelecidos nesta Diretiva, o que significa que o regime legal português da CSB (atualmente em vigor) cria uma contribuição sui generis, não prevista no âmbito da Diretiva, criando situações de dupla tributação internacional e de violação da concorrência livre, igual e não falseada que enforma o Direito da União Europeia.
Do Reenvio Prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia,
75) Considerou o Tribunal a quo que «considerando que a decisão a proferir nos presentes autos é suscetível de recurso jurisdicional, não se encontra este Tribunal obrigado a proceder ao reenvio prejudicial. Deste modo, indefere-se o requerido reenvio prejudicial.» (página 25 da sentença recorrida).
76) Considera a RECORRENTE que seria em benefício da certeza e segurança jurídica de todos os agentes do setor bancário se este Tribunal se dignasse a realizar o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia, ao abrigo do disposto no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, para interpretação das normas de Direito da União Europeia aqui invocadas.
77) Tenha-se em conta a incontornável circunstância de não estarmos perante um processo único, uma questão isolada ou sequer incipiente: pelo contrário, o contencioso em torno da CSB face a estas normas de Direito da União Europeia tem-se alastrado de forma massiva nas instâncias portuguesas, e com reflexo, naturalmente, em todos os Estados-Membros da União Europeia.
78) E aqui se percebe a dimensão das matérias ora discutidas: não está em causa apenas direito português, aplicável a uma realidade intranacional, restrita às nossas fronteiras, antes, uma interconexão evidente com outros regimes e ordenamentos jurídicos de Estados Membros da UE, nos quais a decisão em causa irá certamente impactar.
79) Cabe, assim, dar às instâncias europeias próprias a oportunidade de se pronunciarem sobre as matérias em questão, que terão consequências a nível europeu e poderão colocar em causa os fundamentos da União Bancária que os Estados Membros se têm esforçado por construir e aprofundar.
80) A jurisprudência dos tribunais portugueses tem sido favorável ao reenvio prejudicial nestas situações, destacando-se a seguinte decisão do Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão n.º 01505/12, bem como no Acórdão n.º01336/12 e Acórdão n.º 01398/12.
81) Entende a RECORRENTE que a pertinência das questões de Direito da União Europeia não poderá ser colocada em causa: está em causa a sujeição a uma contribuição nacional de uma sucursal portuguesa de uma instituição bancária sedeada noutro estado membro, quando a legislação aplicável e conformadora dessa contribuição se mostra manifestamente discriminatória para com as sucursais de entidades estrangeiras, como bem demonstrou a RECORRENTE.
82) É plenamente aplicável o disposto nas normas de Direito da União Europeia invocadas, versando elas sobre as contribuições das instituições bancárias dos diferentes Estados-Membros, e ainda conformando a liberdade de estabelecimento que, como se demonstrou, pode encontrar-se verdadeiramente desrespeitada se se mantiver a situação aqui contestada.
83) Mais, sendo esta uma situação com impacto plurilocalizado, pois a sucursal portuguesa pertence a uma instituição bancária situada num outro EstadoMembro, acentua-se a necessidade de se recorrer ao Direito da União Europeia e de confiar ao TJUE a sua esclarecida interpretação.
84) Face ao exposto, para a melhor aplicação do Direito aos autos, em que a RECORRENTE demonstrou que tal contribuição tem carácter discriminatório, desde já se requer que V. Exa, ao abrigo do mecanismo do reenvio prejudicial previsto no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, solicite ao Tribunal de Justiça da União Europeia que se pronuncie sobre se:
O artigo 49.° do TFUE se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no regime doméstico português da Contribuição sobre o Sector Bancário, que tributa Instituições Financeiras residentes em Portugal, considerando uma proporção de passivos no seu balanço sistematicamente inferior à proporção dos passivos que financiam uma sucursal de umainstituição de crédito residente noutro Estado-Membro da UE, reduzindo proporcionalmente a sua base de incidência da CSB face à base de incidência das sucursais em situações similares, colocando as segundas em situação desfavorável face às primeiras?;
• A Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014 se opõe à aplicação do regime doméstico português da Contribuição sobre o Sector Bancário às instituições de crédito (residentes ou não residentes) a operar em Portugal através de uma sucursal, devendo este regime ter sido eliminado e substituído, aquando da transposição para o ordenamento jurídico português da referida Diretiva, pelas contribuições previstas naquela Diretiva?;
• A Diretiva 2014/59/UE, de 15 de maio de 2014 se opõe especificamente à aplicação do regime doméstico português da Contribuição sobre o Sector Bancário às sucursais em Portugal de instituições de crédito residentes noutro Estado Membro da União Europeia?;
VII. DO PEDIDO
Neste sentido e com o douto suprimento de V. Exas, ao presente recurso deve ser concedido provimento, com todas as consequências legais, designadamente:
(i) Revogando-se a decisão de facto da sentença recorrida e ser determinada a sua ampliação, devendo os Autos baixar à primeira instância para que sejam ouvidas as testemunhas arroladas e fixados todos os factos relevantes para a correta decisão do caso em apreço; ou,
(ii) Revogando-se a decisão emitida pelo Tribunal a quo, a qual deve ser substituída por outra que anule os atos em crise, reconhecendo os vícios enumerados, e, em consequência, determine a anulação integral do ato de autoliquidação de CSB, aqui em causa por violação do princípio da equivalência, por violação do direito europeu no que diz respeito à liberdade de estabelecimento e à violação da Diretiva 2014/59/EU, ordenando-se o reembolso da CSB paga pela ora Recorrente e a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT, tudo com as demais consequências legais.
Tudo com as devidas consequências legais e por ser da mais elementar JUSTIÇA!”


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A Recorrida devidamente notificada não contra-alegou.

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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, ofereceu aos autos o seu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Foram os presentes autos aos vistos.

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Delimitação do objeto do recurso

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, em consonância com o disposto no art. 639º do CPC e art. 282º do CPPT, são as conclusões apresentadas pelo recorrente nas suas alegações de recurso, a partir da respetiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objeto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer, ficando, deste modo, delimitado o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem.

As questões a decidir nos presentes autos recursivos são:

i) Erro de julgamento quanto à determinação da matéria de facto, motivado pela dispensa da prova testemunhal;
ii) Erro de julgamento de direito quanto à asserção de violação do princípio constitucional da equivalência por parte do tributo em apreço;
iii) Erro de julgamento de direito quanto à acusação da violação do princípio europeu da liberdade de estabelecimento por parte da imposição em referência;
iv) Erro de julgamento de direito quanto à imputação de violação da Directiva 2014/59/EU, que estabelece «o enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento», por parte do regime instituído da referida contribuição;
v) Subsidiariamente, o pedido de reenvio prejudicial.


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II – FUNDAMENTAÇÃO
- De facto
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
“Com relevância para a decisão da causa e de acordo com a prova documental junta aos autos, que se dá aqui por integralmente reproduzida, consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Impugnante é uma sucursal em Portugal de uma instituição de crédito, com sede principal e direção efetiva no Luxemburgo – facto não controvertido.
B) A Impugnante exerce a atividade “Atividades das Instituições Financeiras de Crédito” (CAE 64921) – facto não controvertido.
C) Em 05/06/2020, a Impugnante apresentou a declaração Modelo 26, relativa à CSB do ano de 2020, que deu origem à liquidação n.º 26000015429, no montante de €11.326,53, tendo efetuado o respetivo pagamento em 09/06/2020 – cf. documentos 3 e 4 juntos com a p.i.
D) Em 08/04/2020, a Impugnante apresentou reclamação graciosa de liquidação da CSB mencionada na alínea que antecede, cujo procedimento correu os seus termos sob o n.º 3247202004004876 – cf. documento a fls. 86 dos autos.
E) Em 13/10/2020, foi proferida decisão de indeferimento da reclamação mencionada na alínea que antecede, em concordância com os fundamentos vertidos na informação n.º 242-AIR1/2020, da Divisão de Justiça Tributária da Unidade dos Grandes Contribuinte, de cujo teor se extrai o seguinte:
“§ IV.I.I.II. Da apreciação
21. Comece-se por referir que não cabe no elenco das atribuições e competências da Administração Tributária ("AT’’) aferir da conformidade de uma qualquer norma face ao disposto na nossa Lei Fundamental, bem como ao Direito da União Europeia. Senão vejamos:
22. A subordinação da AT à Constituição da República Portuguesa (“CRP”) significa, desde logo, em geral, o dever de conformação da atividade administrativa, quer tenha ou não conteúdo normativo, pelas normas constitucionais, procurando conferir a máxima efetividade possível aos direitos fundamentais, significando isto, assim, em especial, nomeadamente, que são nulos e não anuláveis todos os atos administrativos ofensivos do conteúdo essencial dos direitos, liberdades e garantias.
23. Diante desta dimensão do princípio da constitucionalidade imediata impõe-se que a AT esteja ab initio vinculada às normas consagradoras no âmbito de direitos, liberdades e garantias.
24. Ao invés do que sucede com os tribunais, que têm constitucionalmente o direito e o dever de fiscalização da constitucionalidade das leis, desaplicando-as, caso estejam em contradição com as normas constitucionais,15 16 à AT, porém, não é reconhecido este direito de fiscalização prévia, impondo-se antes, como princípio geral, a observância da lei por força do denominado princípio da legalidade.
25. A AT não é um órgão de fiscalização da constitucionalidade e a submissão desta à lei não visa apenas a proteção dos direitos dos particulares, mas também a defesa e prossecução de interesses públicos.
26. A concessão ao poder administrativo de ilimitados ou vastos poderes para o controlo da constitucionalidade das leis a aplicar levaria a uma anarquia administrativa, invertendo a relação entre a Lei e a Administração, atentando frontalmente contra o princípio da divisão dos poderes, tal como está consagrado na CRP.
27. É este o entendimento que, aliás, se encontra maioritariamente firmado, quer na doutrina quer na jurisprudência, no sentido de se recusar, como regra geral, à Administração a competência para desaplicar normas que considere inconstitucionais.
28. Para GOMES CANOTILHO, "(...) o princípio básico é o de recusar à administração em geral e aos agentes administrativos em particular qualquer poder de controlo da constitucionalidade das leis, mesmo se dessa aplicação resultara violação dos direitos fundamentais”.
29. A este propósito, também JORGE MIRANDA sustenta não ser possível reconhecer à Administração um poder geral de controlo - necessariamente concreto - análogo ao dos tribunais, admitindo, apenas em determinadas situações, deixar àquela uma margem de não aplicação. A razão básica deste entendimento - justifica o autor - repousa na diferença de natureza das duas funções, a jurisdicional e a administrativa, e na diversa estrutura dos respetivos órgãos,18 na necessidade de evitar a concentração de poder no Governo que adviria se se admitisse o reconhecimento aos órgãos da Administração da faculdade de fiscalização da constitucionalidade, e por imperativos de certeza e de segurança jurídica.
30. Se a nossa Lei Fundamental aponta no sentido da necessária conformação da atividade Administrativa pelos preceitos e princípios constitucionais e se são nulos, e não anuláveis (por conseguinte, não sanáveis) os atos administrativos ofensivos de direitos, liberdades e garantias, têm de ser os tribunais a decidir sobre essa conformação; e têm de ser os tribunais administrativos, e não os órgãos da Administração dita ativa, a apreciar e a não aplicar leis inconstitucionais e a declarar a nulidade ou a anular atos administrativos inconstitucionais
31. No mesmo sentido, considera MARCELO REBELO DE SOUSA, a propósito do regime jurídico da nulidade no Direito Constitucional português, que tal vício tem de ser apreciado e declarado por um órgão jurisdicional, não existindo a possibilidade de a Administração Pública se recusar a obedecer a um ato que considera inconstitucional.
32. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA consideram que tem constituído solução tradicional e mais conforme ao sistema constitucional aquela segundo a qual, em princípio, a Administração está imediatamente subordinada à lei, não podendo deixar de cumpri-la a pretexto da sua inconstitucionalidade, não dispondo, portanto, de um poder de não aplicação de leis por tal motivo. Prosseguindo:
33. Quanto à posição que sobre este assunto tem sido acolhida pela Jurisprudência, veja-se, a titulo de exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (“STA”), proferido no âmbito do processo n.°. 0860/10, de 12 de outubro de 2011, onde a propósito de saber se os mesmos motivos que levaram o legislador à dispensa da reclamação graciosa prévia quando existam orientações genéricas emitidas pela AT, justifica também a dispensa quando o interessado pretenda impugnar a autoliquidação com exclusivo fundamento na inconstitucionalidade da norma, se referiu que “Nesse caso, e a menos que esteja em causa o desrespeito por normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cfr. art. 18°, n.° 1, da CRP (Diz o art. 18.° da CRP no seu n.° 1: «Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas».), a AT não pode recusar-se a aplicara norma com fundamento em inconstitucionalidade".
34. Fundamentando esta posição, refere-se ainda no douto Acórdão que “A nosso ver, a AT deverá aguardar a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, a emitir pelo Tribunal Constitucional (TC), nos termos do art. 281.° da CRP. É que, como diz VIEIRA DE ANDRADE, «Este conflito [entre a constitucionalidade e o principio da legalidade] não pode resolver-se através da prevalência automática do direito constitucional sobre o direito legal. Não é disso que se trata, porque o que está em causa é não a constitucionalidade da lei, mas o juízo que sobre essa constitucionalidade possam fazer os órgãos administrativos. Por um lado, a Administração não é um órgão de fiscalização da constitucionalidade; por outro lado, a submissão da Administração à lei não visa apenas a protecção dos direitos dos particulares, mas também a defesa e prossecução de controlo da inconstitucionalidade das leis a aplicar levaria a uma anarquia administrativa, inverteria a relação Lei-Administração e atentaria frontalmente contra o princípio da divisão dos poderes, tal como está consagrado na nossa Constituição» (Direito Constitucional, Almedina, 1977, pàg. 270.).No mesmo sentido, JOÃO CAUPERS afirma que «a Administração não tem, em princípio, competência para decidir a não aplicação de normas cuja constitucionalidade lhe ofereça dúvidas, contrariamente aos tribunais, a quem incumbe a fiscalização difusa e concreta da conformidade constitucional, demonstram-no as diferenças entre os artigos 207° [hoje, 204°] e 266°, n° 2, da Constituição. Enquanto o primeiro impede os tribunais de aplicar normas inconstitucionais, o segundo estipula a subordinação dos órgãos e agentes administrativos à Constituição e à lei. Afigura-se claro que a diferença essencial entre os dois preceitos decorre exactamente da circunstância de se não ter pretendido cometer à Administração a tarefa da fiscalização da constitucionalidade das leis. O desempenho de tal função, por parte daquela tem de ser visto como excepcional» (Os Direitos Fundamentais dos Trabalhadores e a Constituição, Almedina, 1985, pág. 157.). Concluímos, assim, que no Direito Constitucional Português não existe a possibilidade de a Administração se recusar a obedecer a uma norma que considera inconstitucional, substituindo-se aos órgãos de fiscalização da constitucionalidade, a menos que esteja em causa a violação de direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados (...)". Destarte,35. Fazendo a ponte entre estas considerações, que devem abranger qualquer análise relativa ao Direito da Uniáo Europeia, e o caso concreto, parece-nos então de concluir que uma qualquer nossa análise acerca desta questão, tal como nos é suscitada, fica desde logo prejudicada.
36. De referir ainda que, através do Acórdão proferido no âmbito do Processo n° 02340/13.OBELRS 0683/17 de 19-06-2019, o Supremo Tribunal Administrativo se pronunciou sobre a não inconstitucionalidade do regime jurídico a CSB, nos seguintes termos: "Tendo a Contribuição sobre o Sector Bancário natureza jurídica de contribuição financeira, não ocorre inconstitucionalidade orgânica e material das normas do seu regime jurídico, por violação dos princípios constitucionais da não retroactividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência, pelo que também a respectiva autoliquidação, ainda que referente ao ano de 2011, não enferma de ilegalidade por alegada violação desses mesmos princípios.” Nestes termos,
37. Através de uma adequada ponderação dos interesses em causa, e atendendo que a própria AT se limitou a fazer a interpretação das normas aplicáveis aos factos, sempre sobre o espetro do princípio da legalidade, somos de parecer que, em nossa opinião, face ao que até aqui foi dito, não subsistem razões atendíveis para os termos e efeitos de anulação do ato tributário ora colocado em crise pela ora Reclamante.
(…)
§ V.II. Da apreciação
44. Tendo em conta o teor dos argumentos utilizados pela Reclamante no exercício de seu direito de participação, reafirma-se tudo o que já foi dito no projeto de decisão, conforme consta dos artigos 21 a 37 da presente informação.
45. Relativamente à questão prévia colocada, dispõe o artigo 6.°, n.°1 da Portaria n.°121/2011, de 30.03.2011PJ que «a contribuição sobre o sector bancário é liquidada anualmente pelo sujeito passivo através da declaração de modelo oficial n.° 26 (...)».
46. Nos termos do n.° 2 do artigo 6.° da referida Portaria, «a base de incidência apurada nos termos dos artigos 3 ° e 4 ° é calculada por referência à média anual dos saldos finais de cada mês, que tenham correspondência nas contas aprovadas no próprio ano em que é devida a contribuição».
47. Ora, nos termos da lei comercial, as contas do exercício e os documentos da prestação de contas, devem, em regra, ser apresentados e apreciados no prazo de três meses a contar da data do encerramento de cada exercício anual.
48. De seguida, deverá a assembleia-geral reunir no prazo de três meses a contar da data do encerramento do exercício ou no prazo de cinco meses a contar da mesma data quando se tratar de empresas que devam apresentar contas consolidadas ou apliquem o método da equivalência patrimonial para, entre outros, (i) deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício e (ii) deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados.
49. Em face do que se acabou de referir, é simples de notar que o segmento textual «(...) contas aprovadas no próprio ano em que é devida a contribuição» tem implícito o seguinte:
a) O ano de aprovação das contas corresponde ao período a que respeita a CSB. Assim, nas contas aprovadas no ano de 2020 estará em causa a CSB relativa a esse ano (2020).
b) As contas aprovadas em determinado ano respeitam, regra geral, ao período económico precedente. Portanto, as contas relativas ao período económico de 2019 encerram-se, regra geral no final desse ano e são aprovadas no ano seguinte, portanto, em 2020.
50. Face a isto, não vemos qualquer razão para que procedam as alegações da Reclamante quanto ao ano da CSB em causa.
51. Ora, também não se levantam quaisquer dúvidas sobre a interpretação da lei, sendo sua redação clara relativamente à questão em apreço.
52. Em complemento, pode-se referir ainda a jurisprudência dos seguintes acórdãos:
- Acórdão do STA, proferido no âmbito do processo n.° 0703/14, de 21-01-2015:
“Uma vez que a AT está sujeita ao princípio da legalidade (cfr. art°. 266°, n.° 2, da CRP e art°.55° da LGT), não pode deixar de aplicar uma norma com fundamento em inconstitucionalidade, a menos que o TC já tenha declarado a inconstitucionalidade da mesma com força obrigatória geral (cfr. art°. 281.° da CRP) ou se esteja perante o desrespeito por normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cfr. art°. 18°, n.° 1, da CRP), o que não é o caso.”
- Acórdão do STA, proferido no âmbito do processo n.°. 0399/15, de 05-04-2017:
"A AT, porque está sujeita ao princípio da legalidade (cfr. art. 266.°, n.° 2, da CRP e art. 55.° da LGT), não pode deixar de aplicar uma norma com fundamento em inconstitucionalidade, a menos que o Tribunal Constitucional já tenha declarada a inconstitucionalidade da mesma com força obrigatória geral (cfr. art. 281.° da CRP) ou se esteja perante o desrespeito por normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cfr. art. 18.°, n.° 1, da CRP).”
53. No mesmo sentido, também a decisão do CAAD, proferida no âmbito do processo n° 218/2013-T, refere que:
“No caso, tratando-se de reclamação exclusivamente fundamentada na violação de princípios constitucionais pela AT, esta não podia proferir decisão expressa diversa do indeferimento considerando que em matéria de apreciação de constitucionalidade, só os Tribunais são competentes para declarar a inconstitucionalidade e a consequente desaplicação da lei ordinária com esse fundamento.
Concluímos assim, com a citada Doutrina e Jurisprudência, que no Direito Constitucional Português não existe a possibilidade de a Administração se recusar a obedecer a uma norma que considera inconstitucional, substituindo-se aos órgãos de fiscalização da constitucionalidade, a menos que esteja em causa a violação de direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados.
E por isso é que, apresentada a reclamação com fundamento na violação de princípios constitucionais que não põem em causa direitos, liberdades e garantias, elencados nos artigos 24° e segs., da Constituição, o desfecho nunca poderia ser o deferimento."
54. Relativamente à não apreciação das supostas violações do direito da União Europeia, temos a referir o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte 00462/06.2BEPRT, 02-07-2015:
"IV — A margem de apreciação eventualmente concedida pelo direito nacional ao funcionário ou à instituição autora dessa violação do Direito comunitário é irrelevante na determinação e alcance dessa violação e a simples infracção ao Direito comunitário pode bastar para provar a existência de uma violação suficientemente caracterizada, o que acontece quando a entidade nacional, no momento em que cometeu a infracção, dispõe de uma margem de apreciação consideravelmente reduzida, ou mesmo inexistente."
55. Também o Tribunal de Justiça da União Europeia já havia decidido no mesmo sentido, como por exemplo no Processo Hedley Lomas (Ireland) Ltd,(C-5/94):
“ 28. No que se refere à segunda condição, há que considerar que, na hipótese de o EstadoMembro em causa, no momento em que cometeu a infracção, não se confrontar com opções normativas e dispor de uma margem de apreciação consideravelmente reduzida, ou mesmo inexistente, a simples infracção ao direito comunitário pode bastar para provar a existência de uma violação suficientemente caracterizada.”
56. Ora, a margem de apreciação pela AT, tal como pretendida pela Reclamante, é inexistente, face ao princípio da legalidade a que a Administração Pública deve observar, tendo em conta o teor da lei, de caráter imperativo, e a inexistência de dúvidas interpretativas, conforme acima referido.
57. Portanto, a mesma razão de ser que se aplica à apreciação das inconstitucionalidades, aplica-se à margem de apreciação que a AT tem, no caso concreto, as supostas violações das normas de direito da União Europeia, ou da «Constituição Europeia», como refere PAULO NOGUEIRA DA COSTA, no que diz respeito às normas dos tratados da União Europeia.
58. Senão vejamos, as normas da União Europeia invocadas pela Reclamante são as seguintes:
- Os artigos 49° e 18° do Tratado de Funcionamento da União Europeia, relativos à liberdade de estabelecimento e ao princípio da não discriminação.
- A Diretiva 2014/59/UE, transposta pela Lei n° 23-A/2015, de 26 de março, e o Regulamento (UE) n° 806/2014.
59. O regime da CSB foi objeto de uma análise pormenorizada no âmbito do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19-06-2019, proferido no âmbito do Processo n° 02340/13.0BELRS 0683/17, em julgamento ampliado da Seção de Contencioso Tributário realizado ao abrigo do disposto no art. 148° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que dispõe relativamente à sujeição das sucursais de instituições de crédito com sede em outros Estados membros da União Europeia que:
"Ora, considerando o caso concreto da CSB, verifica-se que, por um lado, ela atinge igualmente todas as instituições de crédito do sector bancário a operar em Portugal, independentemente de a sua sede principal e efectiva se situar em território português (art. 2° do RCSB; art. 2° da Portaria n° 121/2011) — universalidade da le i— (E mesmo o alargamento da incidência subjectiva [resultante da alteração introduzida pela Lei 7A/2016, de 30/03 (OE para 2016)] às sucursais de instituições de crédito com sede noutros Estados-Membros da EU, não afastará a característica grupai inerente aos sujeitos passivos do tributo, por forma a que a contribuição se transmute num imposto: a circunstância de essas sucursais não estarem sujeitas à supervisão prudencial do Banco de Portugal e à consequente aplicação, por parte desta entidade, de medida de resolução (estarão, eventualmente, sujeitas à supervisão da entidade competente em termos da sede da instituição de crédito) não obsta a que a respectiva actuação possa contribuir para a provocação do risco sistémico do sector, no Estado em que a sucursal está implantada, ai se manifestando a presumida relação de equivalência entre a prestação da entidade pública e o valor do beneficio obtido ou do custo por aquela provocado.) e que, por outro lado, as modulações do peso e da medida do tributo em função dos maiores ou menores riscos sistémicos provocados pela actuação dos sujeitos passivos (expressão da observância de um critério de proporcionalidade na construção da estrutura sinalagmática), estão presentes na delimitação da respectiva base de incidência objectiva: incidindo a CSB sobre o valor do passivo apurado e aprovado e sobre o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados, fica claro que, apesar de a taxa não ser progressiva, o valor da contribuição a pagar por cada sujeito passivo é directamente proporcional à intensidade do risco sistémico que a sua actuação pode presumivelmente provocar, directamente associada à dimensão do passivo e, consequencialmente, à dimensão da lesão resultante do eventual incumprimento das suas responsabilidades para com terceiros, depositantes ou titulares de produtos financeiros emitidos ou garantidos pelas instituições de crédito (cfr. o art. 4° Portaria n° 121/2011)."
60. Entende o STA que as sucursais de instituições de crédito com sede noutros EstadosMembros da UE contribuem para a “provocação do risco sistémico do sector, no Estado em que a sucursal está implantada", justificando assim a sua sujeição à CSB.
61. Por fim, importa referir que uma suposta violação de uma Diretiva da União Europeia (Diretiva 2014/59/EU) pela Administração, com fundamento na sua transposição incorreta, no que diz respeito ao direito interno, não acarretaria nenhuma político-legislativa, de acordo com o artigo 15° do regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas (Lei 67/2007, de 31-12).” - cf. documento a fls. 72-86 dos autos.
F) A petição inicial da presente ação foi apresentada em 10/11/2020, via SITAF – cf. documento a fls. 1-3 dos autos.”

***
A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:
“Não existem outros factos alegados relevantes para a decisão, em face das possíveis soluções de direito, que importe referir como provados ou não provados.”
*
A decisão da matéria de facto fundou-se no seguinte:
“MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
A decisão da matéria de facto fundou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nos documentos juntos aos autos, conforme referido em cada alínea do probatório, bem como na posição expressa pelas partes, tendo sido considerados os factos relevantes para a decisão dentro das várias soluções plausíveis das questões de direito [nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e dos n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º do CPC, este último preceito aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT].”
***
- De Direito
Na presente sede recursória, começa a Recorrente por alegar que o Tribunal a quo dispensou a prova testemunhal que havia arrolado e que essa falta deu origem a uma errónea fixação da matéria de facto, sustentando, ainda, que a sentença sob recurso incorreu em erro de julgamento de facto por não ter considerado toda a prova produzida.
Vejamos, então.
A avaliação da necessidade da produção de prova testemunhal depende de uma apreciação a cargo do Juiz do Tribunal a quo, necessariamente casuística. Nessa apreciação o Juiz deverá ponderar, num primeiro momento se essa produção de prova é legalmente admitida, em face das normas que regulamentam a admissibilidade desse meio de prova e, num segundo momento, aquilatar da necessidade e relevância em face do alegado pelas partes e do objeto do litígio, tendo sempre como fito as várias soluções de Direito plausíveis. Decorre do aqui exposto que a sua dispensa só é possível quando a aludida produção de prova for inútil ou desnecessária. Isto mesmo é o que decorre da leitura do preceituado no artigo 13º, nº 1 do CPPT, onde é afirmado que: “Aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer.”
Efetuado este breve enquadramento legal, cumpre baixar ao caso dos autos e verificar se a factualidade indicada pelo Apelante, em sede própria, era passível dessa prova, se a mesma era relevante para uma decisão de mérito de acordo com as várias soluções de Direito plausíveis e, ainda, se a mesma não se encontrava já documentalmente comprovada, acarretando o seu incumprimento deficit instrutório com a competente anulação da decisão recorrida.
Advoga o apelante que tendo o Tribunal a quo dispensado a prova testemunhal pretendida, não permitiu que a Recorrente provasse certos factos que para si seriam determinantes para o sucesso do peticionado, assacando à decisão recorrida deficit instrutório.
Concretiza esta sua alegação, defendendo que seria indispensável a produção de prova testemunhal para comprovar quatro factos, a saber:
i) que o passivo da Recorrente é incluído no passivo da casa-mãe;
ii) a casa-mãe da RECORRENTE pagou efetivamente uma contribuição no âmbito da Diretiva, à entidade reguladora da sua residência / entidade reguladora europeia;
iii) na qual suportou, em parte, o passivo da sucursal,
iv) a autoliquidação da CSB em causa foi feita tendo por base a totalidade do passivo da sucursal (passivo bruto), uma vez que a sucursal não possui fundos ou capitais próprios – ao contrário do que se passa em relação a todas as instituições financeiras residentes em Portugal.
Vejamos, então.
Quanto ao primeiro facto que a Recorrente pretende ver aditado à matéria de facto, decorrente da inquirição das testemunhas, o mesmo carecia de prova documental, sendo insuficiente qualquer prova testemunhal para o dar como assente. Efetivamente, apenas através de documentação contabilística seria possível afirmar, com a certeza necessária, que o passivo da aqui apelante foi incluído na casa-mãe.
Também no que respeita ao segundo a quarto factos que a Recorrente pretende ver aditados ao probatório através do depoimento das testemunhas arroladas, a sua prova deveria ser efetuada através de prova documental, pois apenas tendo por base os documentos da contabilidade, designadamente da casa-mãe, seria possível afirmar se pagou efetivamente uma contribuição no âmbito da Diretiva, à entidade reguladora da sua residência / entidade reguladora europeia, na qual foi incluído o passivo da sucursal, bem como se na aludida autoliquidação foi tida em consideração o passivo bruto da mesma sucursal.
Nesta medida, o presente recurso terá de naufragar nesta parte.
Avançando.
Sustenta ainda a Recorrente que a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de Direito quando considerou que a contribuição aqui em dissidio não viola o Princípio Constitucional da Equivalência.
Também aqui, a razão não está do lado da Recorrente.
Senão vejamos.
A receita da CSB constitui um recurso do Fundo de Resolução (FdR), pessoa coletiva de direito público dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, e cujas finalidades se prendem com o apoio financeiro à aplicação de medidas de resolução adotadas pelo Banco de Portugal. Estas medidas de resolução por parte do Banco de Portugal visam objetivos relacionados com a manutenção da estabilidade do sistema financeiro, prevenindo o alastrar do risco sistémico, evitando situações de contágio entre entidades, incluindo às infraestruturas de mercado, pretendendo manter a disciplina no mercado, procurando salvaguardar os interesses dos contribuintes em geral.
Este conjunto de medidas, resultam de recomendações europeias e abrangem, desde 2016, as sucursais de instituições de crédito que atuem em Portugal, pois também elas podem contribuir para a existência dum risco sistémico, numa situação de crise financeira como aquela que nos assolou em 2008, a nível global, e em 2010, no caso português.
Sobre esta matéria tem sido muito vasta e esclarecedora a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, seja o STA, seja o próprio Tribunal Constitucional (deste último Alto Tribunal, salientamos, entre muitos, os Acórdãos nºs 268/2021, proc. 1010/19, proferido em 29 de Abril de 2021; 332/2021, proc. 1197/19, proferido em 26 de Maio de 2021; 505/2021, proc. 985/2019, proferido em 9 de Julho de 2021; 533/2021, proc. 458/2021, proferido em 13 de julho de 2021).
Pelo STA, quando em causa estava uma CSB de 2019, no seu Aresto de 05/07/2023, proferido no âmbito do processo nº 0510/20.3BELRS, foi sumariado o seguinte:
I - A Contribuição sobre o Sector Bancário (C.S.B.) tem a natureza jurídica de uma contribuição financeira.
II - Não ocorre inconstitucionalidade material das normas do seu regime jurídico (cfr.artº.141, da Lei 55-A/2010, de 31/12/OE 2011; portaria 121/2011, de 30/03; normas que renovam, anualmente, tal regime), por violação do princípio constitucional da legalidade, pelo que, também a respectiva autoliquidação referente ao exercício de 2019, não enferma de ilegalidade por alegada violação desse mesmo princípio.
III - Não ocorre inconstitucionalidade material das normas do seu regime jurídico (cfr.artº.141, da Lei 55-A/2010, de 31/12/OE 2011; portaria 121/2011, de 30/03; normas que renovam, anualmente, tal regime), por violação dos princípios constitucionais da não retroactividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência, pelo que também a respectiva autoliquidação referente ao exercício de 2019, não enferma de ilegalidade por alegada violação desses mesmos princípios, nem do Direito da União Europeia.”
Também este Tribunal Central Administrativo Sul tem vindo a decidir em igual sentido (vide, entre muitos, os acórdãos proferidos no âmbito dos processos nºs 2916/19.1BELRS, de 20/02/2025; 1057/18.3BELRS, de 06/02/2025; 759/17.6BELRS de 09/01/2025; 811/18.0BELRS, de 05/12/2024) sempre sustentando que esta contribuição assume natureza jurídica de Contribuição Financeira e que não padecendo de inconstitucionalidade por violação dos princípios constitucionais da igualdade e equivalência.
No acórdão deste TCAS de 09/01/2025, tirado do processo nº 281/19.6 BELRS, em que a relatora é a mesma dos presentes autos, sumariámos o seguinte:
I-A Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) tem natureza de contribuição financeira e é devida pela sucursal de sociedade com sede num Estado-Membro da União Europeia.
II- As normas que modelam o regime jurídico da Contribuição sobre o Sector Bancário não violam os princípios da legalidade, igualdade na sua vertente da Equivalência”.
Não vemos qualquer motivo para nos afastarmos da posição que tem vindo a ser sufragada, pelo que, tendo em vista uma uniforme interpretação e aplicação da lei, como é desígnio do artigo 8º, nº 3 do Código Civil, seguiremos o acórdão prolatado no processo nº 1057/18.3BELRS, de 06/02/2025, e supra aludido, e do qual se extrai, na parte que releva para os presentes autos, o seguinte:
“(…) a Recorrente não tem razão, vindo a jurisprudência dos nossos tribunais superiores a decidir unanimemente pela legalidade e conformidade da CSB com a Constituição da República Portuguesa, tendo-se pronunciado inequivocamente neste sentido o Tribunal Constitucional nos Acórdãos n.ºs 268/2021, proc. 1010/19, proferido em 29 de abril de 2021; 332/2021, proc. 1197/19, proferido em 26 de maio de 2021; 505/2021, proc. 985/2019, proferido em 9 de julho de 2021; 533/2021, proc. 458/2021, proferido em 13 de julho de 2021, e especificamente quanto à CSB de 2017, no Acórdão n.º 765/2022, proc. 128/2022, proferido em 15 de novembro de 2022 (todos disponíveis para consulta em www.tribunalconstitucional.pt). No mesmo sentido se tem igualmente pronunciado o Supremo Tribunal Administrativo em jurisprudência constante e uniforme, designadamente, e em concreto no que diz respeito à Contribuição referente ao ano de 2017, nos Acórdãos proferidos em 2019-06-19, no proc. 02340/13.0BELRS 0683/17, em 2020-05-06, no proc. 02921/17.2BEPRT, em 2022-10-12, no proc. 0592/19.0BEPRT, em 2023-01-25, no proc. 0336/18.4BELRS, e em 2024-09-11, no proc. 0231/18.7BELRS (todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt), arestos nos quais conclui pela natureza jurídica de contribuição financeira deste tributo, e pela respetiva constitucionalidade, orgânica e material, considerando que o respetivo regime não viola os princípios constitucionais da não retroatividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, da capacidade contributiva e equivalência. Também sobre esta matéria, e concluindo pela natureza jurídica de contribuição financeira da CSB, e pela não violação dos princípios constitucionais da legalidade, da não retroatividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, e da equivalência se pronunciou já este Tribunal Central Administrativo Sul, nos Acórdãos proferidos em 2023-01-11, no proc. 1721/18.7 BELRS, e em 2024-12-05, no proc. 811/18.0BELRS (disponíveis para consulta em www.dgsi.pt). Vejamos então. Quanto à natureza jurídica da CSB, e ao contrário do pretendido pela Recorrente, a mesma configura uma contribuição financeira, e não um imposto, pelo que não padece de qualquer inconstitucionalidade orgânica, não sendo também afrontados pelo seu regime os princípios da legalidade, ou da equivalência, aqui se acolhendo integralmente, e sem qualquer reserva, os fundamentos gizados no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2021, proc. 1010/19, proferido em 29 de abril de 2021, para se chegar a tal conclusão, fundamentos esses que se passam a citar (destacado nosso): (…) D.1 A questão da natureza jurídica da CSB 13. Subjaz às questões de constitucionalidade referentes à CSB suscitadas pela recorrente uma controvérsia quanto à natureza jurídica da CSB: saber se se trata de um imposto, como esta defende, ou antes de uma contribuição financeira, como foi considerado pelas instâncias que proferiram decisões nos presentes autos (cfr. supra o n.º 5). Com efeito, a autonomização das três categorias de tributos – imposto, taxa e contribuição financeira – assume um relevo fundamental, seja quanto aos princípios da legalidade, da tipicidade e da reserva de lei parlamentar, pelas diferentes exigências que decorrem do artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição – na medida em que aí se preveem dois tipos de reserva parlamentar: uma relativa aos impostos (abrangendo todos os seus elementos essenciais, incluindo a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes – artigo 103.º, n.º 2), outra restrita ao regime geral, que é aplicável às taxas e às contribuições financeiras –, seja porque o princípio da igualdade tributária não reveste o mesmo significado em todas as categorias de tributos, exigindo critérios de repartição que se adequem à respetiva estrutura e finalidade – o da capacidade contributiva para os impostos e o da equivalência para as taxas e contribuições. A qualificação jurídica da CSB é, assim, o primeiro problema a dilucidar, porquanto a resposta às questões colocadas pela recorrente depende da correspondência entre o tributo em causa e o regime constitucional de uma daquelas categorias. A este propósito, importa recordar que tal qualificação resulta da análise do regime jurídico concreto que se encontre legalmente definido, sendo irrelevante o nomen iuris atribuído pelo legislador ou a qualificação expressa do tributo como constituindo a contrapartida de uma prestação utilizada pelo sujeito passivo (cfr., por exemplo, os Acórdãos n.ºs 365/2008, 539/2015, 848/2017 e 344/2019). 14. A distinção entre as três categorias tributárias parte da consideração simultânea de um critério finalístico a par de um critério estrutural ou do pressuposto e da finalidade do tributo (cfr., Cardoso da Costa, ¯Ainda a distinção entre «taxa» e «imposto» na jurisprudência constitucional, in Homenagem a José Guilherme Xavier de Basto, Coimbra Editora, Coimbra, 2006, p. 549; e Sérgio Vasques, ¯A Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético, in Fiscalidade da Energia, 2017, Coimbra, Almedina, pp. 230 e 231, respetivamente). No mesmo sentido, escreveu-se no Acórdão n.º 344/2019 (referente à ¯taxa SIRCA), fazendo apelo a jurisprudência anterior e acolhendo os traços essenciais da doutrina defendida na matéria por Sérgio Vasques (em O Princípio da Equivalência como Critério de Igualdade Tributária, Almedina, Coimbra, 2008), o seguinte: «[7…A] qualificação de um tributo como imposto, por contraposição ao conceito constitucional de taxa, reside na análise do seu pressuposto e da respetiva finalidade: ¯o imposto constitui uma prestação pecuniária, coativa e unilateral, exigida com o propósito de angariação de receitas que se destinam à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, e que, por isso, tem apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais; diversamente, ¯a taxa constitui uma prestação pecuniária e coativa, exigida por uma entidade pública, em contrapartida de prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, assumindo uma natureza sinalagmática (Acórdãos n.ºs 365/2008, 177/2010, 152/2013, 539/2015, 320/2016, 848/2017, 418/2017, 367/2018, 379/18 e 7/2019). O critério distintivo dos tributos reside assim na natureza unilateral ou bilateral do pressuposto do qual depende a formação da obrigação tributária e na finalidade indeterminada ou determinada das prestações a que se destina a receita com ela angariada: enquanto o pressuposto do imposto – o facto tributário – respeita exclusivamente ao sujeito passivo, não lhe correspondendo qualquer contrapartida específica da administração pública, o pressuposto da taxa ou da contribuição integra uma relação do sujeito passivo com a administração pública, correspondendo sempre à contraprestação de uma certa atividade pública que especialmente lhe é dirigida; enquanto o propósito do imposto é angariar receita destinada ao financiamento de prestações públicas indeterminadas, provendo indistintamente às necessidades financeiras da comunidade, em cumprimento de um dever geral de solidariedade, a taxa destina-se a angariar receita para compensar o custo ou valor das prestações públicas determinadas, provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo. […] Uma terceira categoria de tributos públicos que foi reconhecida e autonomizada pela revisão constitucional de 1997, dando cobertura a um conjunto de tributos parafiscais que se situam num ponto intermédio entre a taxa e o imposto, é formada pelas contribuições financeiras a favor das entidades públicas (artigo 165.º, n.º 1, alínea i). A autonomização dessa espécie tributária levou o Tribunal Constitucional a reconhecer, pela primeira vez, a existência de uma tripartição nas categorias jurídico-fiscais, ao reconduzir a taxa de regulação e supervisão da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ESC) a uma contribuição financeira a favor dessa entidade (Acórdãos nºs 365/08, 613/08 e 261/09). Em rigor, esta categoria de tributos, não obstante pretender concretizar uma troca entre o Estado e o contribuinte, sem envolver uma prestação efetiva, não tem estrutura unilateral como o imposto nem estrutura bilateral como a taxa.» O Tribunal Constitucional reconhece, portanto, a existência de contribuições financeiras, enquanto categoria tributária autónoma, dotada de relevo no sistema fiscal português. As contribuições financeiras são, neste plano, globalmente entendidas como prestações pecuniárias coativas, bilaterais, exigidas por uma entidade pública, em contrapartida de uma prestação administrativa dirigida a um grupo, e apenas presumivelmente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo singular. Refira-se que, sem prejuízo da aparente simplicidade do conceito, esta é uma categoria de contornos muito heterogéneos, em especial na ausência da aprovação pela Assembleia da República do regime geral para as demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas, previsto no artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição. Na verdade, uma visão abrangente do sistema fiscal português revela que esta categoria integra um conjunto extenso e variado de tributos paracomutativos, com características nem sempre inteiramente coincidentes, sendo evidentes as especiais dificuldades experimentadas pela doutrina na sua delimitação precisa – v., a título de exemplo, entre outros, Ana Paula Dourado, que imputa à categoria das contribuições financeiras um caráter residual, enquadrando neste conceito todos os tributos que não apresentem as características dos impostos e das taxas e os tributos a favor de entidades públicas de base não territorial com características de sinalagma difuso (em Direito Fiscal – Lições, Almedina, Coimbra, 2015, p. 67); Sérgio Vasques, que reconhece às contribuições uma natureza fugidia, sediada num lugar intermédio entre as taxas e os impostos, integrando nesta figuras tributárias tão díspares como as contribuições para a segurança social, as taxas de regulação económica, os tributos associativos devidos às ordens profissionais e ainda os modernos tributos ambientais e impostos especiais pelo consumo (em Manual de Direito Fiscal, Almedina, Coimbra, 2018, pp. 257 e 274); ou F. Vasconcelos Fernandes, para quem a categoria das contribuições financeiras integra uma ampla e diferenciada panóplia de tributos de base bilateral e grupal (em As Contribuições Financeiras no Sistema Fiscal Português, Uma Introdução, Gestlegal, Coimbra, 2020, p. 43). A razão de ser desta heterogeneidade prende-se, em parte, com a circunstância de não se tratar aqui de um conceito classificatório, mas antes de um quadro tipológico caracterizador, podendo variar o grau e modo da correspondência entre a realidade concreta e o tipo. Concorrendo para a tipificação do tributo em apreço, afirmou-se no Acórdão n.º 539/2015 (que analisou a conformidade constitucional da ¯Taxa de Segurança Alimentar Mais, aí considerada como contribuição financeira) o seguinte (n.º 2 da fundamentação): «As contribuições financeiras constituem um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qualificadas como taxas coletivas, na medida em que compartilham em parte da natureza dos impostos (porque não têm necessariamente uma contrapartida individualizada para cada contribuinte) e em parte da natureza das taxas (porque visam retribuir o serviço prestado por uma instituição pública a certo círculo ou certa categoria de pessoas ou entidades que beneficiam coletivamente de um atividade administrativa) (Gomes Canotilho/Vital Moreira, em ¯Constituição da República Portuguesa Anotada, I vol., pág. 1095, 4.ª ed., Coimbra Editora). As contribuições distinguem-se especialmente das taxas porque não se dirigem à compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que apenas presumivelmente são provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica. Preenchem esse requisito as situações em que a prestação poderá beneficiar potencialmente um grupo homogéneo ou um conjunto diferenciável de destinatários e aquelas em que a responsabilidade pelo financiamento de uma tarefa administrativa é imputável a um determinado grupo que mantém alguma proximidade com as finalidades que através dessa atividade se pretendem atingir (sobre estes aspetos, Sérgio Vasques, ob. cit., pág. 221, e Suzana Tavares da Silva, em ¯As taxas e a coerência do sistema tributário, pág. 89-91, 2ª edição, Coimbra Editora).» Assim, na síntese do Acórdão n.º 255/2020 (n.º 9): «[O] Tribunal reconhece que a criação de tributos dirigidos à compensação de prestações presumidas e a admissibilidade de um quadro amplo de incidência das taxas torna mais diluída a fronteira entre as diferentes categorias de tributos e muito mais delicada a respetiva qualificação. Daí a determinação de um critério estrutural para demarcar a ¯linha de fronteira entre as diferentes categorias de tributos públicos (a natureza da prestação do ente público): ¯se o pressuposto de facto gerador do tributo é alheio a qualquer prestação administrativa ou se traduz numa prestação meramente eventual, estamos perante um imposto; se o facto gerador do tributo consubstancia uma prestação administrativa presumivelmente provocada ou aproveitada por um grupo em que o sujeito passivo se integra, estamos perante uma contribuição; se o facto gerador do tributo é constituído por uma prestação administrativa de que o sujeito passivo seja efetivo causador ou beneficiário, ou por um facto que, de acordo com as regras da experiência, constitui um indicador seguro da existência daquela prestação, estamos perante uma taxa. (ibidem) [Acórdão n.º 344/2019].» O critério de distinção das contribuições financeiras em relação às demais categorias tributárias assenta, portanto, no tipo de relação jurídica que se estabelece entre o sujeito passivo e os benefícios ou utilidades que para este decorrem do tributo (critério estrutural, pressuposto), com especial destaque para a incidência e a natureza do aproveitamento esperado (geral, difuso, concreto, 58 efetivo ou presumido). A contribuição financeira emerge, deste modo, como um tributo coletivo, fixado em função do grupo, pela utilização ou utilidade singular meramente presumida, numa relação de bilateralidade genérica. O mesmo é dizer que a qualidade de sujeito passivo de uma contribuição financeira não pressupõe a compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito, sendo a pertença ao grupo identificado pelo legislador condição necessária e suficiente para tal. Concretizando esta ideia, F. Vasconcelos Fernandes refere, a propósito da autonomização das contribuições financeiras, face aos demais tributos, no sistema fiscal português: «[A mesma prende-se] com o facto de corresponderem a tributos que servem de financiamento a entidades públicas cuja atividade beneficia grupos tendencialmente homogéneos de destinatários, estabelecendo-se assim uma estrutura de incidência ancorada numa prestação de acordo com a qual da atividade daquela mesma entidade decorre um benefício igualmente imputável aos indivíduos ou empresas inseridos nesse mesmo grupo. Como tal, pode mesmo dizer-se que o tipo particular de aproveitamento de que os membros dos referidos grupos usufruem é, nestes casos, determinantemente condicionado pela sua condição grupal, sendo totalmente distinto caso estivessem numa relação direta ou imediata com o ente público que lhes oferece a prestação, como sucede nas taxas, ou se não houvesse qualquer tipo de relação de benefício identificável, como sucede nos impostos.» (em ¯As «demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas» no sistema fiscal português – conceito, pressupostos e regime jurídico-constitucional (incluindo a analogia com as Sonderabgaben alemãs), in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, ano XII, 1/4, 2019, p. 82) «(…) a condição de sujeito passivo de uma dada contribuição financeira, quer esta respeite ao perímetro regulatório, associativo ou qualquer outro, apenas poderá despoletar-se na medida em que estejam reunidas as condições de pertença a um dado grupo homogéneo de interesses, entendendo-se por este último um conjunto institucionalmente ordenado para a expressão de objetivos de índole material e que se concretizam em benefícios concretos ao nível do referido grupo e, como tal, em benefícios presumidos para os seus membros.» (ob. cit., p. 84) Sublinha-se, ainda quanto a este ponto, no Acórdão n.º 344/2019, que: «Nos tributos comutativos, o ponto de referência para a fixação do custo provocado e do benefício aproveitado não é o mesmo em todos eles: nas taxas, porque se dirigem à compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, o custo e o benefício são reportados ao contribuinte individual (equivalência individual); nas contribuições, porque voltadas à compensação de prestações de que o sujeito passivo apenas é presumido causador ou beneficiário, o custo ou benefício é reportado ao grupo em que o sujeito passivo se integra (equivalência de grupo). (...) Nesta última espécie de tributos – contribuições – o princípio da equivalência vincula o legislador a definir o universo de sujeitos passivos que se presume provocar ou aproveitar a prestação administrativa. Não podendo dar-se por seguro que cada um dos concretos sujeitos passivos provoca ou aproveita a prestação pública – como ocorre nas taxas – exige-se que o legislador isole os grupos de pessoas às quais estejam presumivelmente associados custos e benefícios comuns. Assim, o princípio da equivalência projeta-se na estruturação subjetiva do tributo através do recorte de um grupo de pessoas que tem interesses e qualidades em comum, que tem responsabilidades na concretização dos objetivos a que o tributo se dirige, e que a prestação tributária seja empregue no interesse dos membros grupo.» O Tribunal Constitucional deixou, assim, claro que a delimitação da base de incidência das contribuições financeiras não decorre apenas da homogeneidade de interesses, mas, bem assim, de uma autêntica responsabilidade de grupo, «que se deve ao facto de os sujeitos passivos deste tipo de tributo partilharem um ónus ou responsabilidade de custeamento ou suporte da atividade pública que não pode atribuir-se isoladamente mas apenas em face daquela que é a respetiva inserção no grupo a que efetivamente pertencem» (F. Vasconcelos Fernandes, ob. cit., p. 85). Em linha com a conclusão que antecede, tem sido sublinhada pela jurisprudência do Tribunal a importância de atender, ainda, ao elemento teleológico do tributo (critério finalístico), na medida em que este pode constituir um indicador determinante no esclarecimento da sua natureza. Conforme esclarece Sérgio Vasques, ao contrário dos impostos, «a finalidade típica das contribuições não está na mera angariação de receitas mas em angariá-la para compensar as prestações presumivelmente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo» (em ¯A Contribuição Extraordinária ... cit., p. 226). Importa, por este motivo, conhecer o destino da receita obtida com o tributo em análise, designadamente, se está em causa o financiamento de prestações públicas indeterminadas ou de despesas gerais da comunidade, ou antes a compensação de custos incorridos por uma atividade pública determinada. Nesta perspetiva, a consignação de receitas à entidade pública competente para financiar as prestações subjacentes aos tributos que as geram constitui, por regra, «uma qualidade reveladora da natureza comutativa destes tributos, por tal consignação significar que a receita não pode ser desviada para o financiamento de despesas públicas gerais» (Acórdãos nºs 539/2015, 320/2016, 7/2019, 255/2020). Todavia, o Tribunal Constitucional reconhece que a consignação da receita do tributo não constitui, por si só, um elemento determinante na qualificação de um tributo – não é uma condição nem necessária nem suficiente (v. Acórdãos n.ºs 344/2019 e 255/2020). Na verdade, «dependendo do modo como seja feita, a consignação da receita tanto pode atestar a natureza comutativa de um tributo público quanto desmenti-la categoricamente. Se, por hipótese, o legislador consignar a receita do imposto sobre o tabaco ao investimento no parque escolar, a afetação da receita nega uma qualquer relação de troca entre o estado e aquele grupo, que não se pode dizer presumível causador e beneficiário das prestações administrativas a financiar, estando-se perante verdadeiro imposto. A qualificação de um tributo público como contribuição exige correspondência entre pressuposto e finalidade – nalguns casos a consignação comprova-a, noutros casos desmente-a.» (cfr. Sérgio Vasques, ¯A Contribuição Extraordinária ..., cit., p. 231.) 15. Tendo presente o enquadramento já realizado (cfr. supra os n.ºs 6 a 9), verifica-se que a CSB tem como sujeitos passivos as instituições de crédito com sede principal e efetiva da administração em território português, as filiais em Portugal de instituições de crédito que não tenham cá a sua sede principal e efetiva da administração e as sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora da União Europeia (cfr. artigo 2.º do RJCB). O mesmo é dizer, apelando às noções do RGICSF (vide supra), que através desta contribuição o legislador visa atingir os sujeitos cuja atividade consiste em receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder crédito por conta própria (i.e., o setor bancário). Visa, bem assim, abarcar todos aqueles que, prosseguindo a atividade enunciada, operam no sistema bancário nacional, independentemente de terem no território português a sua sede principal e efetiva ou uma filial ou sucursal (universalidade subjetiva). Em termos objetivos, aquela Contribuição incide sobre os passivos dos bancos, concretamente sobre o passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos deduzido dos fundos próprios de base (tier 1) e complementares (tier 2) e dos depósitos abrangidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos e pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo, e os depósitos na Caixa Central constituídos por Caixas de Crédito Agrícola Mútuo pertences ao Sistema Integrado do Crédito Agrícola Mútuo e, bem assim, sobre o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço apurado pelos sujeitos passivos (cfr. artigo 3.º RJCSB), ambos calculados nos termos do artigo 4.º da Portaria CSB. Ora, conforme resulta do contexto histórico em que é criada a CSB e da leitura das justificações político-legislativas que forem sendo apresentadas pelo legislador ao longo do tempo, as opções vertidas na delimitação das bases de incidência subjetiva e objetiva da CSB estão estreitamente relacionadas com as finalidades visadas com a criação deste tributo. Neste quadro, começa-se por afirmar, no Relatório do Orçamento de Estado para 2011, que se «procede […] à criação de uma contribuição sobre o sector bancário na linha daquelas que foram já introduzidas noutros Estados Membros, com o propósito de aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia e de o fazer contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas e de prevenção de riscos sistémicos, protegendo também, assim, os trabalhadores do sector e os mecanismos de segurança social.». Esclarece-se ainda no mesmo Relatório que «[o] impacto da recente crise económica e financeira internacional sobre a estabilidade financeira e o papel que o sector financeiro teve na criação do risco sistémico justificaram a introdução desta contribuição, cujo objetivo geral é o de garantir um contributo deste sector que reflita os riscos que o próprio sector gera, à semelhança do que tem vindo a acontecer em outros Estados-membros da União Europeia.». Ressalta, deste modo, um duplo propósito originário na criação do novo tributo: reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos, em linha com aqueles que haviam sido os objetivos traçados ao nível europeu, pela Comissão, na sequência da Cimeira de Pittsburgh – garantir que é o setor bancário que suporta os encargos que ele próprio gera («limitar os encargos para os contribuintes e minimizar – ou melhor ainda, eliminar – a futura dependência de fundos provenientes das contribuintes para salvar um determinado banco»); mobilizar os montantes necessários para cobrir os custos expectáveis dos fundos de resolução («que facilitem a resolução de crises nos bancos em dificuldades de formas que evitem o contágio e que permitam a liquidação de um banco de forma ordeira e num prazo que evite a venda urgente dos ativos (¯princípio da previdência)», «contribuir para o financiamento da resolução ordeira das dificuldades em que se encontra uma entidade financeira»); e criar incentivos à adoção de comportamentos adequados pelo setor da banca, reduzindo o risco de recurso aos mecanismos de resolução de crises («aplicação, também no sector financeiro, do chamado «princípio do poluidor-pagador»). Salientando a conexão existente entre a incidência objetiva da CSB e o segundo propósito traçado pelo legislador nacional, relativo à mitigação dos riscos sistémicos gerados pela atividade do setor bancário, os quais se tornaram evidentes com a crise económica e financeira, explicita-se no preâmbulo da Portaria CSB, o seguinte: «[…P]ara efeitos da aplicação da contribuição sobre o sector bancário qualificam[-se] por regra como passivo todos os elementos reconhecidos em balanço que representem dívida para com terceiros, independentemente da sua forma ou modalidade. Excluído para este efeito do passivo fica um conjunto de realidades muito circunscrito, tal como os capitais próprios ou os passivos associados ao reconhecimento de responsabilidades por planos de benefício definido, os passivos resultantes da reavaliação de instrumentos financeiros derivados e os passivos por ativos não desreconhecidos em operações de titularização, ou os passivos por provisões, atento o objetivo da mitigação de riscos sistémicos que subjaz largamente à criação desta contribuição. É também o objetivo da mitigação de riscos sistémicos que dita a desconsideração, para efeitos da base tributável, dos depósitos abrangidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos na parcela do respetivo valor que seja objeto de cobertura por esse mesmo fundo. Idêntica razão explica que não se integrem na base tributável os instrumentos financeiros derivados de cobertura de risco, bem como aqueles cujas posições em risco se compensem mutuamente (back to back derivatives).» O risco sistémico em apreço está, numa larga medida, associado à avaliação das dificuldades para superar uma crise de confiança do público quanto à solvabilidade da instituição, ou seja, quanto à sua capacidade para enfrentar uma eventual ¯corrida aos depósitos recebido de terceiros, e às consequências daí advenientes para outras instituições financeiras, nomeadamente o ¯contágio. O ponto de partida da análise é, por isso, a estrutura financeira da própria instituição e, muito em especial, as interdependências das várias instituições de crédito ao nível de tal estrutura. Deste modo, e pondo igualmente a tónica no objetivo de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos, o qual está na base do regime de resolução, no seu todo, e bem assim na origem da CSB, enquanto mecanismo de financiamento do mesmo (ainda que não o único), refere-se no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 24/2013, de 19 de fevereiro, que estabeleceu o método de determinação das contribuições iniciais, periódicas e especiais para o Fundo de Resolução (tal diploma foi, entretanto, revogado pelo artigo 13.º, alínea d) da Lei n.º 23-A/2015, de 26 de março), que: «O regime jurídico da resolução tem por finalidade a prevenção, a mitigação e a contenção do risco sistémico que, no limite, pode decorrer do colapso de uma instituição de crédito, ainda que provocado por choques externos, poder produzir um efeito de contágio sobre as restantes instituições do sistema. Tal risco agrava-se em função da dimensão, complexidade e interconexão - com outras entidades - que a instituição que entrou em grave desequilíbrio financeiro apresente. Perante este tipo de risco e as inerentes consequências, considerou-se necessário criar novos tipos de instrumentos de intervenção que assegurem a estabilidade financeira, bem como mecanismos de financiamento sem cuja existência aqueles instrumentos perderiam grande parte da sua eficácia. O regime instituído no RGICSF pelo Decreto-Lei n.º 31-A/2012, de 10 de fevereiro, estabelece que as necessidades de financiamento das medidas de resolução são asseguradas pelo Fundo de Resolução, o qual, por sua vez, é financiado essencialmente, nos termos do artigo 153.º-F do RGICSF, por via de contribuições das instituições nele participantes, a par da afetação das receitas da contribuição sobre o sector bancário. […]No plano jurídico, as contribuições, embora obrigatórias, assumem natureza análoga à de um prémio de seguro destinado a cobrir o risco de uma instituição participante deixar de cumprir, ou ficar em risco sério de deixar de cumprir, os requisitos para a manutenção da autorização para o exercício da atividade, por força da ocorrência de uma ou de várias das situações referidas no n.º 3 do artigo 145.º-C do RGICSF e, por via desse facto, contagiar outras instituições. As contribuições para o Fundo de Resolução constituem, neste contexto, a expressão de uma mutualização daquele risco. Em caso de ocorrência do evento contra o qual as instituições participantes se querem premunir, a intervenção do Fundo de Resolução protege o conjunto das entidades nele participantes, evitando que a situação verificada numa delas alastre às restantes e as contamine. Assim, as instituições pagam as suas contribuições como forma de se protegerem contra um eventual risco sistémico originado numa delas, mas que poderia, por seu turno, induzir o colapso financeiro das restantes instituições participantes, caso não existisse um sistema de financiamento do Fundo de Resolução […] Os custos da adoção de medidas de resolução advêm essencialmente da necessidade de apoiar o financiamento da eventual diferença que se verifique entre os passivos e os ativos transferidos para outra instituição de crédito ou, eventualmente, para um banco de transição. Ou seja, é da eventual insuficiência do valor efetivo, à data da aplicação da medida, dos ativos alienados ou transferidos face ao valor dos passivos a preservar, mediante aquela transferência, que emerge a necessidade de uma entrada de fundos para apoiar a aplicação de uma medida de resolução e, portanto, de uma adequada capitalização do Fundo de Resolução para fazer face, no futuro, a este tipo de necessidades. Por esta razão, a base de incidência das contribuições periódicas e das contribuições iniciais das instituições participantes no Fundo desde o início da sua atividade é composta por determinados elementos do passivo das instituições participantes, com dedução de certas responsabilidades incluídas no balanço que não merecem proteção em sede de resolução, como é o caso das responsabilidades perante acionistas e credores subordinados. Existem também responsabilidades que já beneficiam de outras formas de proteção, nomeadamente os depósitos cobertos pela garantia proporcionada pelo Fundo de Garantia de Depósitos ou pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo, que podem, a esse título, ser chamados a comparticipar no financiamento de uma medida de resolução. Por isso não se considera apropriado que sejam cobradas contribuições sobre estes elementos do balanço, embora se entenda que a definição da base de incidência deve ser o mais ampla possível, limitando a possibilidade de arbitragem na captação dos vários tipos de recursos e evitando induzir distorções artificiais na estrutura do balanço das instituições. A utilização, como referência, da base de incidência para a contribuição sobre o sector bancário, que se encontra estabelecida na Portaria n.º 121/2011, de 30 de março, alterada pela Portaria n.º 77/2012, de 26 de março, concretiza os princípios enunciados. […]» Resulta, assim, patente da motivação aduzida pelo legislador nacional nos diplomas que desenvolvem e concretizam o regime da CSB, que daquele duplo propósito originariamente identificado no Relatório do Orçamento de Estado para 2011, é o segundo objetivo enunciado – de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos – aquele que assume preponderância e que influi na estrutura do tributo. Já a referência ao objetivo de reforço do esforço fiscal feito pelo sector financeiro, parece assumir, neste quadro, um relevo subsidiário, na medida em que ao fazer o setor bancário contribuir de forma mais intensa, custeando os encargos que ele próprio gera, reduz-se proporcionalmente a participação dos contribuintes no esforço de consolidação das contas públicas.
16. Retira-se da análise que antecede que a CSB tem a natureza de contribuição financeira. Com efeito, estão reunidas as principais notas características desta categoria tributária: é uma prestação pecuniária (i), coativa (ii), cujas receitas são consignadas subjetiva e materialmente a um ente público (iii), que assenta numa relação de bilateralidade genérica ou difusa – visando compensar uma prestação administrativa presumivelmente provocada ou aproveitada (iv) por um grupo homogéneo de contribuintes em que o sujeito passivo se integra (v). Acompanha-se, por isso, o entendimento adotado pelos tribunais tributários e pelo Supremo Tribunal Administrativo, que consideram ter a CSB inquestionável natureza de contribuição financeira, devido a ter na sua base «uma contraprestação de natureza grupal». De resto, a mesma qualificação tem sido assumida pela jurisprudência arbitral no âmbito do CAAD, destacando-se pela profundidade da análise realizada – ainda que com referência particular à CSB aplicável em 2016 – o acórdão de 14 de junho de 2018, proferido no Processo n.º 347/2017-T (acessível a partir da ligação https://caad.org.pt/tributario/decisoes/; cfr., em especial, os n.ºs 77, 79, 82, 85 e 87). A prevenção, mitigação e contenção dos riscos sistémicos (que podem advir do desequilíbrio financeiro de uma instituição de crédito), assoma como pedra angular do regime, seja com vista a produzir um efeito disciplinador do mercado, na medida em que o maior ou menor valor da contribuição devida depende, pela sua incidência objetiva, da maior ou menor exposição do sujeito passivo ao risco, seja pela criação de um mecanismo de financiamento do sistema de resolução, que resulta num reforço das garantias de intervenção pública, em caso de necessidade, assegurando a estabilidade financeira e contendo o efeito de contágio. A CSB não pode ser qualificada como imposto porque a sua finalidade não é satisfazer os gastos gerais da comunidade; nem como taxa, porque não é contrapartida de uma prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo – visando, unicamente, contribuir para o financiamento das medidas de resolução a adotar pelo Banco de Portugal, obviando à formação de um risco sistémico no sistema bancário nacional, o que faz mediante consignação das receitas ao Fundo de Resolução que tem por missão custear esta intervenção (cfr. artigo 153.º-C, do RGICSF). Trata-se, sim, de um tertium genus, na medida em que o tributo visa a cobertura de despesas e a satisfação de necessidades especiais do setor bancário, face a situações que, em regra, gerariam custos, oferecendo condições de estabilidade financeira ao setor, de que cada instituição (filial e sucursal) há-de a título singular presumivelmente beneficiar. O Fundo de Resolução pode, para estes efeitos, disponibilizar apoio financeiro para: subscrever e realizar, total ou parcialmente, o capital social de uma instituição de transição ou de um veículo de gestão de ativos criados no âmbito da aplicação de medidas de resolução; garantir os ativos ou os passivos da instituição de crédito objeto de resolução, das suas filiais, de uma instituição de transição ou de um veículo de gestão de ativos; conceder empréstimos à instituição de crédito objeto de resolução, às suas filiais, a uma instituição de transição ou a um veículo de gestão de ativos; adquirir ativos da instituição de crédito objeto de resolução; ou pagar uma indemnização aos acionistas ou aos credores da instituição de crédito objeto de resolução caso seja determinado que os mesmos suportaram um prejuízo superior ao que suportariam caso não tivesse sido aplicada uma medida de resolução e a instituição de crédito objeto de resolução entrasse em liquidação no momento em que aquela foi aplicada (cfr. artigo 145.º-AA do RGICSF). Ou seja, tal Fundo destina-se quer ao financiamento dos custos inerentes ao serviço público de apoio à aplicação e de execução de medidas de resolução (cfr. artigo 145.º-E do RGICSF), quer à satisfação das finalidades de interesse público que, com tais medidas de resolução, se visam prosseguir (cfr. o disposto no artigo 139.º e no artigo 145.º-D do RGICSF). Importa ainda sublinhar que a circunstância da receita fiscal da CSB ser paga diretamente ao Estado e só depois transferida por este para o Fundo de Resolução (sendo aí contabilizada como recursos próprios, conforme resulta da leitura do Relatório e Contas dos anos 2014 e 2015) em nada afeta a conclusão que antecede, na medida em que a materialidade da relação subjacente ao tributo em apreço (pressuposto e finalidade) não sai prejudicada por esta configuração regulativa, de índole meramente formal ou de contabilidade orçamental. Pelos mesmos motivos, e pese embora se reconheça que a consignação da receita da CSB ao Fundo de Resolução constitui um indício forte da sua natureza de contribuição, cumpre referir que a circunstância de só em 2012 ter sido criado o Fundo de Resolução não compromete a posição seguida neste acórdão, pelo facto de se manter globalmente a materialidade da relação tributária, atentos os elementos constitutivos do tributo (base de incidência, base de cálculo e afetação da receita), não podendo ser a receita obtida desviada para o financiamento de despesas públicas gerais. Como refere o tribunal a quo: «[…A] CSB visou, em primeiro lugar e desde o início, atenuar as consequências resultantes das intervenções públicas no sector financeiro, face à situação de crise financeira então desencadeada no âmbito desse mesmo sector, reconduzindo-se a um instrumento de apoio na prevenção dos inerentes riscos sistémicos que ali então se identificaram, e não se destinando, assim, a colmatar necessidades genéricas de financiamento do Estado.» Acha-se, pois, aqui, uma relação de bilateralidade genérica ou difusa, que se estabelece na ordem jurídica por referência a um grupo delimitado e homogéneo de contribuintes – as instituições de crédito que operam em Portugal (o setor bancário) e que, pela sua integração e interligação, contribuem para e enfrentam um risco de contágio em caso de desequilíbrio financeiro de uma outra instituição de crédito parte do mesmo sistema. Doutro modo, a CSB foi criada para fazer face a situações de crise financeira, das quais os seus sujeitos passivos são simultaneamente potenciais causadores e potenciais beneficiários dos valores arrecadados, seja pela possibilidade de se virem a constituir como presumíveis destinatários diretos de medidas de resolução, seja por presumivelmente beneficiarem, enquanto parte do grupo, da adoção de tais medidas e da contenção do efeito de contágio que daí poderia advir para a sua própria esfera. Contexto que justifica, aliás, que a Comissão tenha invocado na já citada Comunicação COM/2010/254-final, também no setor financeiro, o conhecido princípio do poluidor-pagador, e o legislador tenha, por seu turno, recorrido à imagem da mutualização do risco sistémico para elucidar a natureza das contribuições para o Fundo de Resolução (cfr. Decreto-Lei n.º 24/2013). A CSB destina-se a compensar uma contraprestação concreta, ainda que potencial e futura, oferecida a um grupo homogéneo (v., a este propósito, Suzana Tavares da Silva, ob. cit., pp. 89 e 90). Em sentido próximo, reconhecendo expressamente a natureza de contribuição financeira da CSB, escreve Sérgio Vasques: «A cobertura desses riscos [sistémicos] e as medidas de reação perante o colapso das instituições financeiras têm custos que não podem com justiça ser exigidos da generalidade dos contribuintes, servindo esta contribuição para exigilos dos presumíveis beneficiários. A contribuição sobre o sector bancário opera, pois, à semelhança de um prémio de seguro, e por essa precisa razão a sua base de incidência é formada pelo passivo das instituições de crédito, indicador do risco que geram. Existe nisto, em suma, o mesmo fundo comutativo que encontramos em figuras mais recuadas como as contribuições para o Fundo de Garantia de Depósitos ou para o Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo, criadas ainda nos anos 90.» (cfr. ob. cit., p. 231.)» Posicionando-se igualmente em sentido favorável à aproximação da CSB às contribuições financeiras, pelo menos desde a criação do Fundo de Resolução, distinguem-se Suzana Tavares da Silva (ob. cit., p. 89) e Casalta Nabais e Matilde Lavouras (em ¯O imposto sobre as transações financeiras, in Boletim de Ciências Económicas, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Volume LVII, Tomo II, 2014, pp. 2493, 2494 e 2495), para quem a configuração deste tributo como contribuição está, aliás, «em consonância com contribuições semelhantes criadas em outros Estados-Membros da União Europeia com o duplo propósito de reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos que lhe estão associados» (ob. cit., p. 2495).
17. O tributo em apreciação nos presentes autos revela, em suma, uma natureza financeira paracomutativa, enquanto contrapartida das prestações públicas de vocação grupal (medidas de resolução e finalidades globais por estas visadas: salvaguarda da solidez financeira da instituição de crédito intervencionada e estabilidade do sistema financeiro). As medidas de resolução também visam salvaguardar os interesses dos depositantes, mas estes são in limine financeiramente assegurados pelo Fundo de Garantia de Depósitos (cfr. artigo 154.º e ss do RGICSF); são aproveitadas e/ou provocadas, presumivelmente, por cada instituição de crédito (filiais e sucursais) que integram o leque de sujeitos passivos (cfr. artigos 139.º, 145.º-C, 145.º-E, 145.º-AB 153.º-C do RGICSF). A arrecadação de receitas visada pelo tributo surge, deste modo, subordinada à prossecução da finalidade material específica de prevenção e contenção dos riscos sistémicos, daí advindo um benefício concreto imputável a um conjunto diferenciável de destinatários. Paralelamente é ainda possível encontrar neste tributo um fito extrafiscal, de orientação de comportamentos (ainda que em sentido impróprio, sem total autonomia e como mero efeito lateral, face à natureza comutativa do tributo, como explica Sérgio Vasques, O Princípio da Equivalência…, cit., pp. 584 e 585), na medida em que, ao incidir sobre o passivo e sobre o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço, o legislador parece ter igualmente pretendido incentivar as instituições de crédito a moderar a adoção adequada e prudente de riscos no endividamento, evitando comportamentos de endividamento excessivo, que estão na base das situações de desequilíbrio financeiro das instituições, com risco de insolvência e riscos sistémicos que a manutenção da estabilidade do sistema financeiro impõe contrariar. Em face de tudo o que antecede quanto à estrutura e finalidade da CSB, dúvidas não restam relativamente à sua natureza de contribuição financeira: tributo exigido por uma entidade pública em contrapartida de uma prestação administrativa presumivelmente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, nos termos acima melhor explanados no n.º 14 do presente acórdão. (…)
D.3 A questão da igualdade fiscal
21. Resta, por último, apreciar as questões de constitucionalidade suscitadas pelo recorrente quanto ao critério da igualdade na repartição dos tributos.
Seguindo de perto o enquadramento deste parâmetro feito no já citado Acórdão n.º 344/2019, é de referir que a conformação legal das várias categorias de tributos está sujeita ao princípio da igualdade tributária, enquanto expressão do princípio geral da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição. A igualdade na repartição dos encargos tributários obriga o legislador a não fazer discriminações ou igualizações arbitrárias, usando critérios distintivos manifestamente irracionais ou ¯sem fundamento material bastante – proibição do arbítrio.
A conceção puramente negativa da igualdade tributária, excluindo os casos de discriminação absurda, não garante, porém, a justiça material ou a coerência interna do sistema tributário. Impõe-se a definição de critérios materialmente adequados à repartição dos diversos tributos públicos. No caso dos tributos unilaterais, o critério que se afigura constitucionalmente mais adequado é o da capacidade contributiva, na medida em que, exigindo-se aos membros de uma comunidade que custeiem os respetivos encargos, a solução justa é que sejam pagos na medida da força económica de cada um (cfr., entre muitos, o Acórdão n.º 590/2015, n.º 12).
O referido critério não se mostra, porém, materialmente adequado à repartição dos tributos comutativos e paracomutativos (taxas e contribuições financeiras), na medida em que os mesmos não custeiam os encargos gerais da comunidade, mas antes prestações de que o sujeito passivo é (individualmente ou em grupo) causador ou beneficiário. A sua natureza bilateral característica exige, deste modo, que a repartição se faça em função do custo provocado pelo contribuinte ou em função do benefício de que ele se aproveita.
Resulta, nestes termos, inequívoco, no plano constitucional, que o critério de repartição dos tributos comutativos para que aponta o princípio da igualdade fiscal é o princípio da equivalência: estando em causa a remuneração de uma prestação administrativa, a solução justa é que seja paga na medida do custo que o sujeito passivo gera à Administração ou do benefício que a Administração lhe proporciona. A este propósito esclarece-se no Acórdão n.º 7/2019, que: «o 69 princípio da equivalência resulta do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da Lei Fundamental, com ele se procurando que taxas e contribuições se adequem às prestações públicas de que beneficiarão, real ou presumidamente, os respetivos sujeitos passivos», não carecendo, por este motivo, de consagração constitucional explícita.
22. No caso dos autos, e tendo por assente a qualificação da CSB como contribuição financeira (cfr. supra o n.º 17), fica, naturalmente arredada, a avaliação da conformidade material do tributo em causa com o princípio da igualdade fiscal, à luz do critério distintivo da capacidade contributiva, próprio dos impostos, subjacente às questões de constitucionalidade enunciadas supra no n.º 5, nas alíneas iv) e v) (v. também as conclusões 114.ª e 116.ª das alegações da recorrente). Com efeito, a recorrente só é – e só pode ser – sujeito passivo da CSB, na medida em que integre o grupo de entidades que poderão ser causadoras dos custos a financiar por tal contribuição financeira ou que poderão beneficiar da atuação pública que a mesma se destina a financiar. O Tribunal considerará, assim, para efeitos da referida avaliação de constitucionalidade, tão-somente, a questão enunciada na alínea vi) do citado n.º 5, à luz das exigências materiais do princípio da equivalência, enquanto critério material de igualdade adequado a contribuições financeiras.
23. Conforme resulta do anteriormente exposto, o princípio da equivalência exige que o quantum do tributo seja fixado em função do custo ou valor das prestações públicas:
«A correspondência entre o tributo e a prestação administrativa tanto pode ser aferida em função do custo que o sujeito passivo provoca (princípio da cobertura de custos) como em função do benefício que ele aproveita (princípio do benefício). Por isso, a estrutura desses tributos deve ser concebida de modo a que contribuintes que provoquem custos iguais ou que aproveitem benefícios iguais sejam chamados a pagar tributo igual e que contribuintes que provoquem custos diferentes ou aproveitem benefícios diferentes paguem tributos também diferente» (Acórdão n.º 344/2019).
Importa, contudo, sublinhar, que a relação de equivalência que se constitui, por esta via, entre a obrigação tributária e a prestação administrativa (provocada ou aproveitada) não tem que traduzir uma rigorosa equivalência económica, sendo suficiente que aquela relação traduza uma equivalência jurídica. Assim se escreveu no Acórdão n.º 344/2019:
«Para efeito de qualificação do tributo como taxa ou contribuição basta que o tributo seja cobrado em função de uma prestação provocada ou aproveitada pelo particular. Trata-se, portanto, de uma equivalência jurídica, que veda diferenciações entre contribuintes alheias ao custo ou benefício a compensar (Acórdãos n.ºs 461/87, 67/90, 640/95, 1108/96; 410/00, 115/02, 320/16).»
Acentua-se, por seu turno, no Acórdão n.º 539/2015, quanto ao caso típico das contribuições financeiras – assentes numa bilateralidade geral ou difusa, delimitada por referência a um grupo homogéneo e diferenciável de contribuintes, e não reportadas a cada sujeito passivo singularmente – que a equivalência em causa não é sinalagmática, uma vez que as contribuições financeiras respeitam a feixes de prestações difusas que apenas presumivelmente são provocadas ou aproveitadas por certos grupos de contribuintes. O custo ou benefício é reportado, neste plano, ao grupo em que o sujeito passivo se integra, sendo a contribuição uma compensação devida por prestações de que este é apenas presumido causador ou beneficiário.
Reclama-se, pois, no quadro deste tributo, uma equivalência de grupo (e não uma equivalência individual, como é próprio das taxas), assumindo especial relevo, na apreciação da validade constitucional do tributo, a delimitação operada pelo legislador quanto à base de incidência subjetiva e objetiva.
Assim, no tocante à incidência subjetiva – seguindo-se, neste ponto, as lições de Sérgio Vasques, que lança mão, para o efeito, de três noções trabalhadas pela jurisprudência alemã (em Manual... cit. pp. 311 e 312) –, considera-se que as exigências do princípio da equivalência serão respeitadas sempre que o legislador proceda à identificação e delimitação de um grupo de pessoas (universo de sujeitos passivos), que partilhe interesses e qualidades determinadas (homogeneidade de grupo, Gruppenhomogenität), que tenha especial responsabilidade na concretização dos objetivos a que o tributo se dirige (responsabilidade de grupo, Gruppenverantwortlichkeit), e ao qual estejam presumivelmente associados custos e benefícios comuns originados pelas prestações financiadas (utilidade ou aproveitamento de grupo, Gruppennützigkeit).
No que se refere à incidência objetiva, esta há-de ser fixada em função dos elementos mais capazes de revelar o custo ou valor das prestações públicas visadas, ficando excluídas diferenciações alheias à compensação que a contribuição visa financiar (como seja o valor do rendimento, património ou consumo do contribuinte) – sem prejuízo da situação particular que se constitui no caso de contribuições orientadas primordialmente à satisfação de finalidades extrafiscais (v. sobre esta hipótese e a derrogação da regra geral enunciada, Suzana Tavares da Silva, ob. cit., pp. 126 a 129, e Sérgio Vasques, Manual... cit. p. 293 e O Princípio da Equivalência ... cit., pp. 577 e ss).
Do mesmo modo, conforme sublinhado pelo Tribunal no Acórdão n.º 344/2019, a equivalência, enquanto expressão do princípio da proporcionalidade, exige que o quantitativo da prestação tributária deva corresponder ao custo ou benefício que se pretende compensar, sendo o tributo inválido se manifestamente excessivo face ao custo ou valor dos bens e serviços prestados ao sujeito passivo. Por isso, «só a provocação de custos comuns e o aproveitamento de benefícios comuns garantem a homogeneidade capaz de legitimar a sobretributação de um qualquer grupo social ou económico no confronto com o todo da coletividade, mostrando-se discriminatória uma contribuição cobrada na sua falta» (Sérgio Vasques, O Princípio da Equivalência ... cit., p. 528).
24. Analisando a CSB à luz destas considerações, verifica-se que, no plano da incidência subjetiva, a contribuição em apreço incide sobre um grupo delimitado de sujeitos, em termos precisos e homogéneos, que se caracteriza pela sua natureza de instituições de crédito. O tributo atinge, concretamente, todas as instituições de crédito (lato sensu) que integram e operam no sistema bancário nacional, independentemente da sua sede principal e efetiva se situar em território português (recorde-se que, nos termos do artigo 2.º do RJCSB, são sujeitos passivos da CSB não apenas as instituições de crédito com sede em Portugal, mas bem assim as filiais e sucursais de instituições de crédito que não tenham, respetivamente, sede em território português ou na União Europeia). Estas entidades, enquanto prestadoras de serviços financeiros de receção do público de depósitos ou outros fundos reembolsáveis e de concessão de crédito por conta própria, enfrentam, pela sua interconexão, um risco de contágio em caso de colapso financeiro de uma outra instituição de crédito parte do mesmo sistema. As instituições pagam, deste modo, a CSB como forma de se protegerem contra um eventual risco sistémico, na medida em que, na ausência de uma intervenção pública – designadamente do Banco de Portugal, no âmbito do sistema de resolução –, o desequilíbrio financeiro de uma delas poderia induzir o colapso financeiro das restantes instituições que integram o sistema. Trata-se aqui, nas palavras do legislador ¯de uma mutualização d[o] risco [sistémico] (cfr. o Decreto-Lei n.º 24/2013).
Confirma-se, nestes termos, o preenchimento das três notas acima enunciadas, que indiciam a equivalência da relação jurídica subjacente ao tributo – um grupo homogéneo de entidades, diferenciável dos contribuintes como um todo; a responsabilidade cumulativa do grupo na estabilidade do sistema financeiro e a utilidade do mesmo grupo, em caso de crise e intervenção da autoridade de resolução.
Já no que respeita à incidência objetiva, destaca-se o facto de a CSB ter por base tributável elementos do passivo das instituições de crédito, que representam dívida para com terceiros (independentemente da sua forma ou modalidade), deduzidas certas responsabilidades incluídas no balanço, seja porque o legislador considera que não merecem proteção em sede de resolução (como é o caso das responsabilidades perante acionistas e credores subordinados), seja porque já beneficiam de outras formas de proteção (como é o caso dos depósitos cobertos pela garantia proporcionada pelo Fundo de Garantia de Depósitos ou pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo, ou ainda dos instrumentos financeiros cujas posições em risco se compensem mutuamente back to back derivatives). A escolha do passivo como base de incidência resulta, conforme explicitado na Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Banco Central Europeu — Fundos de resolução de crises nos bancos, 26.5.2010 (COM/2010/254-final), do seguinte racional:
«Os passivos dos bancos aparentam ser os indicadores mais adequados dos montantes que poderão vir a ser necessários quando surgir a necessidade de resolver uma crise num banco. Os custos de resolução de uma crise num banco são mais suscetíveis de resultar da necessidade de apoiar determinados passivos (excluindo o capital próprio e os passivos segurados – ou seja, os depósitos).»
Em consonância, explicita-se no preâmbulo do Decreto n.º 24/2013 que a opção pelo passivo como base tributável se baseia na circunstância de os custos da adoção de medidas de resolução advirem designadamente da necessidade de apoiar o financiamento da eventual diferença que se verifique entre os passivos e os ativos transferidos para outra instituição de crédito ou, eventualmente, para um banco de transição. É, pois, da eventual insuficiência do valor efetivo, à data da aplicação da medida, dos ativos alienados ou transferidos face ao valor dos passivos a preservar, mediante aquela transferência, que emerge a necessidade de uma entrada de fundos para apoiar a aplicação de uma medida de resolução e, portanto, de uma adequada capitalização do Fundo de Resolução para fazer face, no futuro, a este tipo de necessidades.
Neste sentido, conforme reconhecido pelo tribunal a quo, o valor a pagar a título de CSB varia, para cada sujeito passivo, em função dos riscos sistémicos provocados pela sua atuação. Ou seja, incidindo sobre o valor do passivo apurado e aprovado e sobre o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados, conclui-se que a taxa a pagar por cada sujeito é diretamente proporcional à intensidade do risco sistémico que as suas opções de endividamento podem presumivelmente provocar, e à medida dos encargos públicos a empregar no âmbito do sistema de resolução, em face da dimensão da lesão resultante do eventual incumprimento das responsabilidades para com terceiros, depositantes ou titulares de produtos financeiros emitidos ou garantidos pela instituição de crédito (cfr. o artigo 4.º da Portaria CSB).
Sem prejuízo das inerentes dificuldades que a circunstância de se tratar in casu de uma prestação potencial e futura, cuja dimensão e valores envolvidos são, naturalmente, desconhecidos numa perspetiva ex ante, resulta, ainda assim, patente do exposto, que a estrutura da CSB atende, pela delimitação que se faz da base de incidência subjetiva e objetiva, aos custos que, em caso de desequilíbrio financeiro, o sujeito passivo presumivelmente provoca, e simetricamente ao benefício que este presumivelmente aproveitará através da adoção de medidas de apoio financiadas pelo Fundo de Resolução, ao qual está consignada a receita desta contribuição.
Mostra-se, por conseguinte, verificada a exigência de equivalência jurídica.
Já no que respeita ao benefício adveniente da mitigação do risco sistémico, para o sistema, considerado como um todo, o reconhecimento da equivalência de grupo assenta na, já formulada, ideia de uma mutualização do risco, operando a CSB, à semelhança de um prémio de seguro, sendo o passivo das instituições de crédito indicador do risco que geram.
Por estas razões é de concluir pela improcedência da alegada violação do princípio da equivalência quanto à norma extraída dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 3.º e 4.º do RJCSB. (…)(o destaque e sublinhado é nosso).
Há assim que concluir, com o Tribunal Constitucional, e a jurisprudência do STA acima citada de que a CSB é uma contribuição financeira, e não um imposto, devida pela sucursal de sociedade com sede num Estado-Membro da União Europeia, não afrontando o seu regime os princípios constitucionais da igualdade e equivalência. Isto posto, tal como se avançou, nada há a apontar à sentença recorrida, pelo que também por aqui o presente recurso terá de naufragar.”
Ali como aqui, estando também em causa uma CSB relativa a uma sucursal duma sociedade com sede num Estado-Membro da União Europeia, e fazendo nossos os argumentos expendidos no aresto citado, improcedente terá de ser julgado o presente recurso, nesta parte.
Prosseguindo.
Advoga, ainda, a Apelante que o julgado enferma de erro de julgamento de direito quanto à acusação da violação do princípio europeu da liberdade de estabelecimento por parte da imposição em referência.
Sobre esta mesma questão este TCASul no seu Aresto de 12/09/2024, tirado no processo nº 1576/20.1BELRS, com total identidade fáctico-jurídica, apenas diferindo relativamente ao exercício visado, e cujo discurso fundamentador se convoca e adere, designadamente, e novamente, tendo em vista uma uniforme interpretação e aplicação da lei, como é desígnio do artigo 8º, nº 3 do Código Civil, tendo nele se consignado o seguinte:
2.2.6. No que se refere ao fundamento do recurso referido em v) a recorrente alega que «[n]os termos da lei e para efeitos de incidência objetiva, a CSB incide sobre o passivo deduzido dos elementos que integram os fundos próprios dos sujeitos passivos - cfr. art.º 3.º, alínea a), do regime da CSB»; «[que], no caso das instituições de crédito residentes a CSB incide sobre o seu passivo “líquido”, depois de deduzidos os capitais e fundos próprios, ao passo que no que às sucursais UE diz respeito a CSB incide sobre o seu passivo “bruto”, sem qualquer dedução relacionada com capitais próprios, colocando as últimas em situação desfavorável face às primeiras em termos de base tributável»; que «[a] discriminação ocorre, ainda, por força da disparidade de tratamento que é dado contabilisticamente e para efeito do cálculo do Regime da CSB (i) às diferentes fontes de financiamento das instituições de crédito residentes em Portugal provenientes de acionistas, e (ii) às fontes de financiamento equiparáveis no caso das Sucursais UE, isto é, fundos que estas recebem das suas sedes»; que «[n]estes termos fica claro que as Sucursais UE, como a ora recorrente, não possuem capitais próprios, fundos próprios nem tão-pouco elementos do passivo com características de capitais próprios e, como tal, são, por força do regime da CSB, colocados numa posição desvantajosa e desfavorável, em comparação com as instituições de crédito residentes em Portugal».
Apreciação. A este propósito, o STA, por meio de Acórdão de 12/10/2022, P. 0850/17.9BELRS (autoliquidação de CSB (2016) relativa a uma sucursal de uma empresa sedeada noutro Estado-membro da União Europeia), teve ocasião de afirmar que:
«Em síntese, em conformidade com o que dispõe os artigos artigo 3.º, al. a) do Regime Jurídico da Contribuição sobre o Sector Bancário e 3.º, al. a) e 4.º da Portaria 121/2011, de 30 de Março (na redacção introduzida pela Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de Junho), é ao passivo [tal como delimitado pelo artigo 3.º al. a)] que são deduzidos os elementos identificados nas alíneas do n.º 1, do artigo 4º da mesma Portaria, sendo que, para efeitos do apuramento do passivo referido no artigo 3.º, al. a), por força do n.º 2 do artigo 4.º, o valor dos fundos próprios há-de calcular-se por apelo ao normativo constante a respeito do Regulamento (UE) ali referido. Ou seja, o que resulta do artigo 4º da Portaria 165-A/2016, de 14 de Junho é que o cálculo da base de incidência da contribuição sobre o sector bancário não inclui todo o valor do passivo constante do balanço pois contempla várias excepções que, embora fazendo parte integrante do passivo que figura no balanço, não inclui naquele valor. E esta exclusão da base de incidência da CSB também se aplica aos bancos residentes. // 3.2.3.9. Note-se, de resto, que as sucursais têm elementos que podem ser reconhecidos como capitais próprios, uma vez que são criadas e movimentadas contas de capital próprio, pelo menos o “capital afecto” (se existir) e os resultados transitados, nada impedindo que a sociedade-mãe aloque à sua sucursal em Portugal uma dotação de capital de base (“elementos do capital próprio”) registado em contas de capital próprio, caso em que tudo se assemelha às entradas feitas pelos sócios às empresas e que não são remuneradas, o que significa que, tal como o capital próprio dos bancos residentes é excluído da base de incidência da CSB, o mesmo sucede ao “capital afecto” às sucursais, quando contabilizado como tal. …”» .
As normas de determinação da incidência objectiva do tributo (artigo 3.º do RJCSB) não assumem o alegado sentido discriminatório entre entidades bancárias residentes e sucursais de entidades bancárias não residentes, dado que as possibilidades de dedução de elementos ao passivo das entidades em causa são asseguradas de forma uniforme em relação a todas as entidades (residentes e não residentes, abrangidas pelo RGICSF). Mais se refere que a eventual falta de personalidade jurídica das sucursais, como sucede com a recorrente, não obvia à titularidade de substracto contabilístico próprio de entidades revestidas de tal arquitetura jurídica, bem assim como não impede que as mesmas disponham de capitais próprios (fundos próprios) a deduzir ao passivo (artigo 3.º/1/a), do RJCSB e artigo 4.º das Portarias de regulamentação citadas), para efeitos de quantificação da base de incidência do tributo em apreço. A recorrente pode, também, invocar a redução da base de incidência objectiva, nos mesmos termos que os bancos residentes . De notar que as regras de determinação da incidência objectiva da CSB resultam da necessidade de prevenção do risco sistémico, medido pelo valor do passivo de cada um dos operadores em causa. Pelo que tais regras são justificadas no quadro do sinalagma de grupo que determina a criação do tributo em apreço. Por outras palavras, «o valor a pagar a título de CSB varia, para cada sujeito passivo, em função dos riscos sistémicos provocados pela sua atuação. Ou seja, incidindo sobre o valor do passivo apurado e aprovado e sobre o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados, conclui-se que a taxa a pagar por cada sujeito é diretamente proporcional à intensidade do risco sistémico que as suas opções de endividamento podem presumivelmente provocar, e à medida dos encargos públicos a empregar no âmbito do sistema de resolução, em face da dimensão da lesão resultante do eventual incumprimento das responsabilidades para com terceiros, depositantes ou titulares de produtos financeiros emitidos ou garantidos pela instituição de crédito» . Sendo tais parâmetros de aplicação uniforme a qualquer operador bancário que exerça a sua actividade em Portugal.
Na análise da alegação em referência, a sentença recorrida seguiu a presente orientação. Ao julgar no sentido referido, a mesma não enferma do erro de julgamento que lhe é apontado, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.”
Estando aqui em causa o mesmo regime que se aplicou no Acórdão transcrito, também quanto a este erro de julgamento, improcedente terá de ser julgado o presente recurso.
Aduz ainda a Recorrente que o Tribunal a quo erro no julgamento que efetuou quanto à imputação de violação da Directiva 2014/59/EU, que estabelece “o enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento”, por parte do regime instituído da referida contribuição.
Mais uma vez, último Aresto que temos vindo a seguir, efetua uma análise lapidar desta questão, discorrendo do seguinte modo:
“Apreciação. Está em causa a alegada preterição do regime inscrito na Directiva n.º 2014/59/EU, de 15 de Maio de 2014, que estabelece o regime de enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento(1). Compulsado o teor do acto normativo em apreço, não se apura norma atinente à CSB dirimida nos presentes autos ou que com a mesma colida. É que são realidades distintas, o mecanismo de Direito da UE de saneamento financeiro das instituições bancárias que operam no espaço da União Europeia, por um lado, e a contribuição devida pelas instituições bancárias em virtude do risco sistémico, de solvabilidade financeira, associado ao exercido da sua actividade no território nacional de recolha de depósitos bancários e concessão de crédito, por outro lado. O mecanismo europeu de resolução bancária, previsto na Directiva n.º 2014/59/EU, citada, dispõe das suas próprias contribuições e instituições de resolução bancária, outro tanto sucede com os regimes nacionais dos Estados-membros de resolução bancária (entre os quais se inclui o português) cuja existência e financiamento não é por aquele prejudicada. Para comprovar a presente asserção basta ter presente os fins, as condições e as entidades responsáveis pelo procedimento de resolução, no plano europeu (v., respectivamente, artigos 31.º, 32.º e 3.º da Directiva n.º 2014/59/EU, citada) com os fins e as entidades responsáveis por semelhante procedimento a nível nacional (v., respectivamente, artigos 145.º-C e 139.º do RGICSF(2)).
A este propósito, o Acórdão do STA, de 18-05-2022, P. 0783/20.1BEPRT, teve ocasião de referir que:
«(…) não se vê como a Diretiva n.º 2014/59/EU possa fazer inflectir o sentido dessa compatibilidade. // (…) // [D]a legislação europeia transcrita não resulta, como pretende o Impugnante, que a CSB definida pelo Regime aprovado pelo artigo 141.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, corresponda à contribuição ex ante instituída pela Diretiva 2014/59/UE, e nessa medida se deva conformar com a legislação europeia aplicável. // Mais, o próprio Impugnante constrói a alegação de desconformidade da CSB com a legislação europeia, sem indicar, de forma direta, qual a norma concretamente violada pela atuação do Estado Português, ou qual a norma que levaria à adequação ou revogação da CSB, por força da criação da designada contribuição ex ante. // (…) // Subsumindo a alegação do caso sub judice, ao enquadramento do Acórdão transcrito, temos que a alegação de que os artigos 2.º e 3.º do Regime da CBS e da Portaria da CBS são desconformes com o direito da União Europeia, nomeadamente por não assegurarem a fixação de critérios de ajustamento em função do risco, em conformidade com a Diretiva 2014/59/UE, e logo violarem o princípio da igualdade tributária, não é procedente, na medida em que o regime instituído ao nível interno não se confunde com o regime criado ao nível europeu, coabitando os dois no ordenamento jurídico, sem que com isso ofenda ou viole o direito da União Europeia».
Por outras palavras, o mecanismo europeu de resolução bancária não se confunde com o mecanismo nacional de resolução bancária, ao qual está afecta a receita derivada da contribuição financeira em apreço, pelo que a alegada contradição de regimes não se comprova. Ambos os regimes de resolução bancária (europeu e nacional) são ordenados à garantia do exercício da livre concorrência no sector bancário, em condições de solvabilidade, mas actuam em escalas de intervenção distintas, pelo que não se sobrepõem, nem contradizem.
Ali como aqui, tendo a sentença sob recurso pugnado pelo aqui explanado, não acompanhamos a alegação de que a mesma enferma de erro de julgamento de Direito, motivo pelo qual a mesma se deverá manter na ordem jurídica.
Subsidiariamente, vem a Recorrente requerer o reenvio prejudicial para o TJUE para apreciação das questões relacionadas com a harmonização com o Direito Europeu.
No Aresto a que nos temos vindo a reportar, também a Recorrente requeria este reenvio, tendo este Tribunal julgado que o mesmo não se justifica, aduzindo a seguinte argumentação:
“2.2.10. Quanto ao fundamento do recurso referido em ix), a recorrente suscita a questão do reenvio prejudicial junto do TJUE, com vista à correcta aplicação do direito.
O artigo 267.º do TFUE estabelece que «[s]empre que uma questão [sobre a interpretação do Direito da UE] seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal»(3).
A recorrente não indica a questão concreta de Direito da UE que justificaria o reenvio em apreço. Nos presentes autos, como já referido nos pontos anteriores, não se afigura existir questão relevante de interpretação do Direito da UE, dado que o regime da CSB não contende, nem convoca tal regime. Mais se refere que o presente acórdão é passível de recurso. Não estão, assim, reunidos os pressupostos de aplicação da obrigação de reenvio prejudicial em referência.
Motivo porque se rejeita a presente alegação.”
Também nos presentes autos a Recorrente não cumpre o ónus que sobre si impendia de indicar a concreta questão de Direito que justificaria o reenvio, pelo que se rejeita, também, o pedido formulado.
Assim sendo, e ao ter assim decidido, a sentença sob recurso não enferma dos erros de julgamento que lhe são assacados pela recorrente, motivo pelo qual a mesma se deverá manter na ordem jurídica.
*
CUSTAS
No que diz respeito à responsabilidade pelas custas do presente Recurso, atendendo ao total decaimento do recorrente, as custas são da sua responsabilidade. [cfr. art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT].

***
III- Decisão
Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Lisboa, 3 de Abril de 2025
Cristina Coelho da Silva – Relatora
Rui A.S. Ferreira
Tiago Brandão de Pinho



(1)e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/CE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n. o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho.
(2)Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31/12, com alterações posteriores
(3)JOUE, 26.10.2012,https://eurlex.europa.eu/legalcontent/PT/TXT/?uri=celex%3A12012E%2FTXT