Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 947/13.4BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 07/15/2025 |
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Relator: | FILIPE CARVALHO DAS NEVES |
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Descritores: | REVERSÃO DEMONSTRAÇÃO DA INSUFICIÊNCIA DE BENS ÓNUS DA PROVA |
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Sumário: | I - Decorre do regime da responsabilidade tributária subsidiária aplicável que constitui fundamento ou requisito legal de reversão da execução fiscal contra o gerente a inexistência ou insuficiência do património da devedora originária para satisfação da dívida exequenda e do acrescido. II - À Administração Fiscal incumbe o ónus da prova de que se verificam os factos que integram este fundamento previsto na lei para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes. III – Tendo o órgão de execução fiscal realizado todas as diligências que, razoavelmente, estavam ao seu alcance, face à informação disponível, para efeitos de localização de bens penhoráveis da devedora originária, e tendo as mesmas sido infrutíferas, está demonstrada a fundada insuficiência do património da devedora originária. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO A Fazenda Pública veio apresentar recurso da sentença proferida a 30/04/2020 pelo Tribunal Tributário de Lisboa («TTL») que julgou procedente a oposição judicial deduzida por J…, melhor identificado nos autos, no processo de execução fiscal («PEF») n.º 3158200601080253 e apensos, contra si revertidos, originariamente instaurados contra a «E… Serviços, Lda.», para cobrança de dívidas de juros compensatórios de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares («IRS») do ano de 2002, Imposto sobre o Valor Acrescentado («IVA») do exercício de 2005, Imposto Municipal sobre Imóveis («IMI») referente a 2006 e coimas do ano de 2007, no valor total de 29.586,72 Euros. A Recorrente apresentou alegações, rematadas com as seguintes conclusões: «I. A Fazenda Pública considera que a douta Decisão do Tribunal a quo, ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à aplicação dos artigos 23.º n.º 2 LGT e 153.º CPPT. II. Vem a douta sentença decidir que dos factos provados nos autos não é possível afirmar que resultou provada a inexistência de bens do património da devedora originária. E tal impossibilidade decorre de a Administração Tributária não ter logrado produzir prova bastante quanto à referida inexistência. III. Como esclarece a jurisprudência do STA expendida sobre esta matéria: “são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT). Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT)”, cfr. acórdão do STA de 16-10-2013, proc. n.º 0458/13. IV. Ao contrário do decidido na douta Sentença ora recorrida, nos termos da qual a AT não demonstra que tenha realizado todas as diligências necessárias a provar a inexistência patrimonial da devedora originária, cumpre referir que em 21.12.2012, (cfr. fls. 50 dos autos) foi lavrada informação nos autos de execução fiscal na qual se refere: "após diligências efetuadas, nomeadamente consulta a todos os sistemas informáticos, para averiguação da existência de bens, não foram encontrados quaisquer bens que garantissem o pagamento integral da dívida". V. Ora, foi precisamente neste contexto que se efetivou a reversão porquanto, nos termos dos artigos 23.º nº 2 da LGT e 153.º nº 2 do CPPT, a reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário depende de verificação da inexistência de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores/responsáveis solidários ou da fundada insuficiência, para pagamento da dívida exequenda e acrescido, dos bens penhoráveis, integrantes do património destes, sendo que esta última circunstância se pode ter como preenchida com base em elementos constantes de auto de penhora e outros elementos disponíveis na aplicação informática que cadastra os ativos penhoráveis, à qual também obedece a tramitação informática da execução fiscal. VI. No caso que nos ocupa o órgão de execução fiscal, após consulta ao cadastro de ativos penhoráveis que serve a execução fiscal, concluiu pela inexistência de bens da devedora originária para pagamento da quantia exequenda. E isso fez constar no projeto de reversão consubstanciado na informação a que se aludiu e que foi prestada em 21.12.2012. VII. Não pode, assim, a Fazenda Pública conformar-se com a douta sentença ora recorrida quando decidiu julgar como parte ilegítima o ora Recorrido, com fundamento em que a AT não logrou produzir prova bastante quanto à inexistência patrimonial da devedora originária.” VIII. É hoje pacificamente aceite tanto na jurisprudência como na doutrina que o órgão de execução fiscal não tem de especificar, no despacho de reversão, factos concretos nos quais baseia a sua fundamentação, não obstante até o ter feito em informações prévias. IX. In casu, o órgão de execução fiscal fez constar do despacho de reversão, o pressuposto de cariz substantivo da reversão, que corresponde à constatação de inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária, nos termos do artigo 23º nº 2 da LGT e nos termos do artigo 153º nº2 CPPT (cfr. ponto 8 do probatório). X. Vale isto por dizer que, o despacho de reversão permitiu ao Oponente conhecer, questionar e se este entender, atacar os pressupostos determinantes da reversão da execução que foi movida contra si. Tanto se verificou, que o Oponente deduziu a presente oposição judicial. XI. Por este motivo, não pode o douto Tribunal a quo desconsiderar toda a factualidade que consta dos autos e considerar que há défice instrutório. XII. Assim, e porque são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, bem como o exercício efetivo da gerência nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta, a “fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efetivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT)”, não se “impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.”. XIII. Deste modo, e tendo presente a realidade em análise e de todos os elementos constantes dos autos, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, que a atuação da Administração Tributária decorreu no estrito cumprimento do disposto nos artigos 23.º da LGT e 153.º CPPT. XIV. Face ao exposto, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a presente oposição judicial, enferma de erro de apreciação da prova e de erro de interpretação de lei, violando os normativos ante identificados e, como tal, não se pode manter na ordem jurídica. Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.». * Não foram apresentadas contra-alegações.* * Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão.* O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cf. art.º 635.º, n.º 4 e art.º 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil - «CPC» - ex vi art.º 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - «CPPT»), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente. Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo com fundamento em erro de julgamento, atendendo a que ficou demonstrada a inexistência de ativos da sociedade devedora originária para pagamento das dívidas exequendas e do acrescido. * III – FUNDAMENTAÇÃO III.A - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «1. A declaração de alterações (imposto sobre o valor acrescentado / Imposto sobre o rendimento), referente à sociedade “E… Serviços, Lda.”, apresentada no Serviço de Finanças de Loures, em 24.01.2002, encontra-se assinada por A…, na qualidade de representante legal da referida sociedade – cfr. fls. 60 e 61 dos autos; 2. Em 20.11.2002, o ora Oponente foi designado gerente da sociedade “E… Serviços, Lda.” – conforme se retira do documento de fls. 50 dos auto; não impugnado; 3. No ano de 2003, o Oponente recebeu rendimentos da Categoria A, pagos pela sociedade mencionada no ponto que antecede – cfr. fls. 53 e 54 dos autos; 4. A declaração de alterações (imposto sobre o valor acrescentado / Imposto sobre o rendimento), referente à sociedade “E… Serviços, Lda.”, apresentada no Serviço de Finanças de Loures, em 17.11.2003, encontra-se assinada por A…, na qualidade de representante legal da sociedade referida – cfr. fls. 62 e 63 dos autos; 5. Em 22.07.2004, o Oponente assinou a requisição do registo do ato de prestação de contas da sociedade devedora originária, referente ao ano de 2003 – cfr. fls. 97 dos autos; 6. Em 18.11.2006, foi instaurado, no Serviço de Finanças de Loures 3, contra a sociedade “E… Serviços, Lda.”, o processo de execução fiscal n.º 3158200601080253, para cobrança coerciva de dívidas de Juros Compensatórios de IRS do ano de 2002, no valor de € 406,38, ao qual foram apensados os seguintes processos de execução fiscal: a) Processo de execução fiscal n.º 3158200701027336, para cobrança de dívidas de IMI do ano de 2006, no valor de € 74,24; b) Processo de execução fiscal n.º 3158200701040910, para cobrança de dívidas de IVA dos meses de janeiro a novembro de 2005, no valor de € 37.845,45; c) Processo de execução fiscal n.º 3158200701044524, para cobrança de dívidas de Coimas do ano de 2007, no valor de € 306,17; d) Processo de execução fiscal n.º 3158200701049887, para cobrança de dívidas de Coimas, do ano de 2007, no valor de € 312,81; e) Processo de execução fiscal n.º 3158200701070371, para cobrança de dívidas de Iva de dezembro de 2005, no valor total de € 678,60; f) Processo de execução fiscal n.º 3158200701083651, para cobrança de dívidas de Coimas, do ano de 2007, no valor de € 607,36; g) Processo de execução fiscal n.º 3158200701091778, para cobrança de dívidas de Coimas, do ano de 2007, no valor de € 606,40; h) Processo de execução fiscal n.º 3158200701099523, para cobrança de dívidas de Coimas, do ano de 2007, no valor de € 304,82. - cfr. fls. 1, 65 e 66 dos autos; 7. Em 19.02.2013, foi proferido, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Loures 3, despacho de reversão contra o ora Oponente, na qualidade de responsável subsidiário, relativamente às dívidas em execução referidas no ponto que antecede, nos seguintes termos: «Imagem em texto no original» cfr. fls. 64 dos autos; 8. Em data que se desconhece, foi emitido o ofício “Citação (Reversão)”, dirigido ao Oponente, comunicando a reversão contra si, na qualidade de responsável subsidiário, dos processos de execução fiscal referidos no ponto 6, constando do mesmo, designadamente, o seguinte: – cfr. fls. 68 dos autos; 9. Em 22.02.2013 foi assinado, por A…, o “aviso de receção” referente ao ofício referido no ponto antecedente – cfr. fls. 69 dos autos; 10. Por ofício datado de 01.03.2013, o Oponente foi notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 241.º do CPC, da data de citação pessoal em 22.02.2013 – cfr. fls. 70 dos autos; 11. Em 03.04.2013, a petição de oposição, que deu origem aos presentes autos, foi apresentada junto do Serviço de Finanças de Loures 3 - cfr. fls. 2 dos autos. * A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:«Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.». * Mais resulta consignado em termos de motivação da matéria de facto o seguinte:«A decisão da matéria de facto provada fundou-se na análise crítica, e conjugada, do teor dos documentos não impugnados, juntos aos autos, conforme indicado em cada um dos pontos supra.». * 12. Em 21/11/2012, no âmbito dos PEF referidos no ponto 6. supra, foi elaborado pelo Serviço de Finanças de Loures 3 «projeto de decisão» no qual, além do mais, consta o seguinte: «Imagem em texto no original» (…) «Imagem em texto no original»
* III.B De Direito Insurge-se a Recorrente contra a sentença recorrida por, alegadamente, padecer de erro de julgamento, concretamente em relação à demonstração da inexistência de bens para pagamento das dívidas exequendas. Vem, assim, a Recorrente peticionar a revogação da sentença que recaiu sobre a oposição à execução fiscal apresentada no PEF n.º 3158200601080253 e apensos, defendendo, em suma, que in casu se pode concluir que ficou demonstrada a impossibilidade de pagamento dos créditos exequendos pela sociedade devedora originária, dado que não foram identificados quaisquer bens na sua titularidade. Apreciemos. Adiantando, desde já, a nossa posição, entendemos que a sentença em dissídio padece do desacerto que lhe vem assacado nas alegações recursivas. Vejamos, então, porquê. A responsabilidade pelo pagamento da dívida tributária poderá ser exigida, não só ao sujeito passivo originário, mas também aos substitutos legais e aos responsáveis tributários subsidiários previstos na lei. A responsabilidade tributária subsidiária encontra-se consagrada no art.º 22.º da Lei Geral Tributária («LGT»), que previa (na versão à data dos factos): «Artigo 22.º 1 - A responsabilidade tributária abrange, nos termos fixados na lei, a totalidade da dívida tributária, os juros e demais encargos legais.Responsabilidade tributária 2 - Para além dos sujeitos passivos originários, a responsabilidade tributária pode abranger solidária ou subsidiariamente outras pessoas. 3 - A responsabilidade tributária por dívidas de outrem é, salvo determinação em contrário, apenas subsidiária. 4 - As pessoas solidária ou subsidiariamente responsáveis poderão reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída nos mesmos termos do devedor principal, devendo, para o efeito, a notificação ou citação conter os elementos essenciais da sua liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais.». Todavia, o instituto da responsabilidade tributária caracteriza-se pela sua excecionalidade, apenas podendo operar em determinados casos, e verificados que estejam, cumulativamente, os respetivos requisitos, previstos no art.º 23.º da LGT, que dispunha o seguinte, no que releva para o caso dos autos (na versão à data dos factos): «Artigo 23.º 1 - A responsabilidade subsidiária efetiva-se por reversão do processo de execução fiscal.Responsabilidade tributária subsidiária 2 - A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão. 3 - Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adoção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei. 4 - A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação. 5 - O responsável subsidiário fica isento de juros de mora e de custas se, citado para cumprir a dívida tributária principal, efetuar o respetivo pagamento no prazo de oposição. 6 - O disposto no número anterior não prejudica a manutenção da obrigação do devedor principal ou do responsável solidário de pagarem os juros de mora e as custas, no caso de lhe virem a ser encontrados bens. (…)». Mais estabelece, a este respeito, o art.º 153.º do CPPT o seguinte, no que ora importa: «Artigo 153.º (…)Legitimidade dos executados 2. O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores; b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão de execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido.». Nestes termos, a efetivação da responsabilidade tributária subsidiária concretiza-se através da reversão da dívida tributária, imputando os efeitos do incumprimento, por parte do devedor originário, ao responsável subsidiário. Contudo, para que a reversão ocorra, a Administração Tributária («AT») tem de alegar e demonstrar a presença e verificação, cumulativa, dos seguintes pressupostos: (i) inexistência ou insuficiência do património/bens penhoráveis do devedor originário para a satisfação da dívida exequenda e acrescido, a aferir de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 153.º do CPPT e do n.º 2 do artigo 23.º da LGT; e, (ii) exercício efetivo do cargo de gerente/administrador nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta, de acordo com o regime previsto no artigo 24.º da LGT. No que respeita ao primeiro dos pressupostos, o Supremo Tribunal Administrativo («STA»), em acórdão de 16/5/2012, tirado no processo n.º 0123/12 (disponível em www.dgsi.pt), pronunciou-se sobre o conceito da «fundada insuficiência» dos bens da devedora originária para fazer face às dívidas tributárias, nos seguintes termos: «A “fundada insuficiência” dos bens do devedor originário legitima a reversão antes da prévia excussão dos bens do devedor originário. Trata-se, porém, de uma situação de excepção à regra geral do benefício da excussão prévia que apenas se justifica, como refere Tânia Meireles da Cunha, “em casos de incontestável e quase absoluta insuficiência de bens do devedor originário, ou seja, em casos em que tal património seja indubitavelmente diminuto” [cf. Da responsabilidade dos gestores de sociedade perante os credores sociais, 2ª ed. pág. 106). Para que essa insuficiência se possa considerar como demonstrada, é necessário que os elementos em que assenta o juízo permitam, em termos lógicos, retirar essa conclusão, fundamentando-se nos elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 153.º do CPPT. Para este efeito, avulta a necessidade de averiguação da situação patrimonial concreta da devedora originária por parte do órgão da execução fiscal, estando vinculado a fazer uma investigação aprofundada, proporcional e adequada sobre a existência de bens no seu património (dos eventuais responsáveis solidários), nos termos do artigo 58.º da LGT, que prescreve que “a administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido». Por outro lado, o devedor originário e o revertido estão sujeitos aos princípios da colaboração e da participação, previstos nos art.ºs 59.º e 60.º da LGT, devendo colaborar ativamente com o órgão da execução fiscal para a cabal determinação do património da devedora originária, mormente, no que ao responsável subsidiário respeita, aquando da audição prévia à reversão, prevista no n.º 3 do art.º 23.º da LGT. Quanto ao revertido, diga-se que não basta alegar a existência de ativos para afastar a conclusão fundada retirada pela AT quanto à inexistência ou insuficiência patrimonial da executada originária, sendo necessário e decisivo, nesse caso, demonstrar a titularidade de tais elementos patrimoniais (e no caso de créditos, que apresentam um mínimo de cobrabilidade ou alguma garantia de cobrança). Ademais, a inexistência de bens da sociedade devedora originária, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, deve reportar-se ao momento em que a reversão ocorre (cf. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 04/07/2019, processo n.º 03010/15.0BEPRT, disponível em www.dgsi.pt). Se os autos e o probatório evidenciam, à data em que a reversão ocorre, a existência de bens do devedor principal e o órgão de execução fiscal nada faz para proceder à sua penhora ou sequer para descortinar, com o necessário rigor, qual o seu valor, o ato de reversão enfermará, pois, de erro nos pressupostos de facto se no mesmo se afirma, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal, a insuficiência/inexistência de bens da devedora originária para a satisfação dos créditos exequendos, o que necessariamente se refletirá na validade desse ato de reversão. Finalmente, cumpre referir que o benefício da excussão prévia, previsto no n.º 3 do art.º 23.º da LGT (que resulta da transposição, para o domínio fiscal, do instituto civilístico com o mesmo nome, previsto no artigo 627.º do Código Civil), traduz-se no direito do responsável subsidiário se opor a que a execução dos seus bens se efetue enquanto não forem penhorados e vendidos todos os bens do devedor principal; contudo, tal não obsta a que a reversão da execução fiscal contra si possa efetuar-se em momento anterior a essa venda, desde que os bens penhoráveis do devedor principal (e eventuais responsáveis solidários) sejam fundadamente insuficientes para o pagamento da dívida exequenda e acrescido (cf., neste sentido, o acórdão do STA de 22/6/2011, processo n.º 167/11, disponível em www.dgsi.pt). Aqui chegados, e tendo ficado exposto o direito aplicável, regressemos, agora, ao caso concreto dos presentes autos. Comecemos por recuperar a fundamentação alinhada na sentença recorrida para sustentar a conclusão pela não verificação deste requisito da reversão e, em consequência, pela procedência da oposição apresentada pelo Recorrido: «Quanto ao alegado vício de falta de demonstração, pela AT, da insuficiência dos bens penhoráveis da devedora originária, cumpre referir que, da análise do despacho de reversão, em causa nestes autos, resulta que o mesmo assentou em diligências que não identifica (cfr. supra, ponto 7). Com efeito, dos autos não decorre qualquer evidência de diligências efetuadas, pelo órgão de execução fiscal, no sentido de apurar a existência de bens penhoráveis da sociedade devedora originária. Tão pouco é feita qualquer referência, no despacho que determinou a reversão, à inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária, nem na fundamentação do mesmo sequer se remete para o artigo 23.º, n.º 2 da LGT. Assim, não pode dar-se por demonstrado que, o património da devedora originária não integra bens penhoráveis, nem da sua fundada insuficiência para satisfazer a divida tributária. Tal como supra referido, o ónus da prova deste pressuposto da reversão recai sobre a Fazenda Pública, nos termos da regra geral do artigo 74.º n.º 1 da LGT. Pelo exposto, conclui-se que a Fazenda Pública não logrou demonstrar a ausência de bens penhoráveis da devedora originária ou a sua fundada insuficiência, pelo que procede o fundamento de oposição à execução fiscal previsto no artigo 204.º n.º 1, alínea b) do CPPT, sentido em que se decidirá a final.». Não podemos, porém, acompanhar a posição firmada nesta matéria pelo Tribunal a quo, porquanto, na nossa perspetiva, a conclusão quanto à verificação deste requisito da reversão retirada pelo órgão de execução fiscal está ancorada na realização de diligências instrutórias que, perante a factualidade dos autos, se afiguram suficientes. Senão vejamos. Desde logo, ressalta do probatório que, no âmbito do procedimento de reversão, foi afirmado pelo órgão de execução fiscal que «Após as diligências efectuadas, nomeadamente consulta a todos os sistemas informáticos, para averiguação da existência de bens, não foram encontrados quaisquer bens que garantissem o pagamento integral da dívida» (cf. ponto 12) da factualidade assente). Assim, contrariamente ao consignado na sentença recorrida, o órgão de execução fiscal realizou diligências para procurar identificar bens penhoráveis, nada tendo encontrado, sendo que essa informação consta do procedimento de reversão e terá sido comunicada ao Recorrido. Pelo que a afirmação «dos autos não decorre qualquer evidência de diligências efetuadas, pelo órgão de execução fiscal, no sentido de apurar a existência de bens penhoráveis da sociedade devedora originária» enunciada pelo Tribunal a quo, não se revela acertada e rigorosa tendo em conta o acervo documental que consta do PEF. Depois, porque se é verdade que, como é dito na sentença recorrida, «Tão pouco é feita qualquer referência, no despacho que determinou a reversão, à inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária, nem na fundamentação do mesmo sequer se remete para o artigo 23.º, n.º 2 da LGT», também é certo que, por um lado, não está em exame a falta de fundamentação formal do despacho de reversão, e, por outro, essa referência encontra-se incorporada na nota de citação rececionada pelo Recorrido (cf. ponto 8. da factualidade assente). E por ser assim, da conjugação do despacho de reversão, da nota de citação, assim como do teor do «projeto de reversão», resulta evidenciado que o órgão de execução fiscal considerou que este requisito legal se verificava in casu tendo em conta as diligências instrutórias encetadas. Nesse seguimento, conclui-se que a AT demonstrou de forma adequada e suficiente a inexistência do património da devedora originária nos termos que lhe são exigíveis, encontrando-se evidenciado o requisito previsto no n.º 2 do art.º 23.º da LGT, e no n.º 2 do art.º 153.º do CPPT. Neste sentido, este Tribunal, em acórdão de 30/03/2023, proferido no processo n.º 919/11.3BELRS, consultável em www.dgsi.pt, preconizou, numa situação em tudo similar à dos presentes autos, posição idêntica à que agora sufragamos.
* IV- DECISÃO Termos em que acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em: (i) conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida; e, (ii) ordenar a baixa dos autos ao tribunal a quo para que aí sejam conhecidas as restantes questões cuja apreciação foi pedida pelo Oponente. Custas pela Recorrida. Registe e notifique. Lisboa, 15 de julho de 2025 (Filipe Carvalho das Neves) (Isabel Vaz Fernandes) (Luísa Soares) |