Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:6222/25.4BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:10/23/2025
Relator:ANA CRISTINA LAMEIRA
Descritores:ASILO
PROTECÇÃO SUBSIDIÁRIA
PEDIDO INFUNDADO, COLÔMBIA
AUDIÊNCIA PRÉVIA /ART. 17º, Nº 2 DA LEI DO ASILO
Sumário:I – Compulsadas as declarações da Recorrente/Autora mostra-se evidente que não resultaram concretizados quaisquer actos persecutórios (vide nº 2 do artigo 5º da Lei do Asilo), de que a mesma tenha sido directamente vítima, no seu país de nacionalidade ou de grave ameaça de perseguição em consequência de actividade por si exercida em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, não se mostrando, pois, preenchidos os requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 3 da Lei do Asilo, que permitam conceder à Autora/Recorrente protecção internacional por esta via.
II - Não tendo sido indicada qualquer situação individual e pessoal concretizadora de a Recorrente ou a sua irmã (cujo pedido foi formulado autonomamente) sofrer ofensa grave em contexto de conflito armado internacional ou interno, que ameace a sua vida ou a integridade física, não se mostram preenchidos os requisitos do artigo 7.º da Lei do Asilo que permita conceder-lhe protecção subsidiária, pelo que também aqui se acompanha a decisão impugnada, que julgou infundado o pedido de concessão de asilo formulado pela Recorrente/Autora com fundamento na alínea e) do n.º 1 do artigo 19º da Lei do Asilo.
III- Concluindo, quanto ao seu receio individual de uma perseguição se tiver de regressar à Colômbia, não é mais que isso, um receio, que não está suportado em alegações concretas e circunstanciadas que justifiquem a existência de qualquer perseguição ou outra ofensa à sua integridade física.
IV- Aos procedimentos especiais, como o presente, de concessão de protecção internacional, regulado na Lei do Asilo, este diploma prevê e regula os termos do cumprimento da audiência prévia dos requerentes nos procedimentos de protecção internacional, o que afasta, em princípio, a aplicação das normas gerais sobre audiência prévia dos interessados previstas no CPA, nos termos do artigo 2.º, n.º 5, do CPA.
V- Sendo, antes aplicável o regime especial consagrado naquela Lei, nomeadamente no artigo 17º, nº 2 da Lei do Asilo.
VI - Tal solução normativa acolhe o consagrado no artigo 267º, nº 5 da CRP, ao estabelecer que cabe à lei infraconstitucional assegurar o modo de participação dos cidadãos nas decisões que lhes disserem respeito. Como sucede no caso sub iudice em que o legislador foi claro ao afirmar que a notificação ao requerente dos elementos aí previstos (nºs 1 e 2 do artigo 17º da Lei do Asilo), equivale, para todos os efeitos, como audiência prévia do interessado.
VII - Tal notificação destina-se a garantir que o interessado tenha oportunidade de, perante o relatório ou a transcrição das declarações que antes prestou e subjazem à análise inicial do pedido, o mesmo possa fazer observações e/ou prestar esclarecimentos relativamente a eventuais erros de tradução ou de compreensão constantes do relatório ou da transcrição (tal como estabelecido no n.º 3 do artigo 17.º da Directiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de protecção internacional).
VIII - Donde, além de se tratar de um procedimento de tramitação acelerada, a decisão que veio a ser proferida baseia-se sobretudo nas próprias declarações da Recorrente (artigo 19º, nº 1, alínea e) da Lei do Asilo).
IX- Em todo o caso, a realização da pretendida audiência prévia, nos moldes preconizados pela Recorrente, sempre se afiguraria como um acto inútil, na medida em que as circunstâncias por si invocadas, ainda que se verificassem, são inidóneas para despoletar a protecção requerida.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO

...(Autora), nacional da República da Colômbia, veio intentar contra a AGÊNCIA PARA A INTEGRAÇÃO, MIGRAÇÕES E ASILO, I. P. (AIMA I.P)/(Entidade Demandada) a presente acção administrativa urgente onde formulou os seguintes pedidos:
“ … deve a presente acção ser considerada procedente, por provada e, em consequência,:
Ser considerado admitido o presente pedido de protecção internacional, nos termos alegados; ou
Ser decretada a anulação do despacho impugnado, atenta a verificação dos vícios invocados, devendo ser a Entidade Demandada condenada a admitir o pedido de protecção internacional "sub judice" e/ou, ser deferida a protecção subsidiária."

Por sentença, de 01 de Julho de 2025, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa- Juízo Administrativo Comum julgou a acção totalmente improcedente.
Inconformada a Autora, ora Recorrente, interpôs o presente recurso, formulando na sua Alegação as seguintes conclusões:
“1ª. O acto impugnado refere que a actividade de grupos armados aumentou desde 2020 e que grupos armados não estatais oriundos e dissidentes das FARC e do Exército de Libertação Nacional, organizações de tráfico de droga cometem abusos de direitos humanos e crimes violentos, incluindo assassinatos, sequestros, tráfico de pessoas, bombardeios, restrições à liberdade de movimento, violência sexual, e reconhece a existência de ameaças.
2 ª. Porém, afirma que nada aconteceu à família da recorrente e que só esta e a irmã saíram do país, e, se estivessem em perigo toda a família abandonaria o país, argumento que não pode proceder, pelo que , ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, que sufragou esta tese, o acto em crise encontra–se deficientemente fundamentado, por contradição, o que equivale a falta de fundamentação, nos termos dos artigos 152º e seguintes do CPA , disposições que, assim, foram violadas pela douta sentença recorrida .
3.ª Ao contrário do considerado pela douta sentença recorrida, o relato da A. /Recorrente é verosímil e está de acordo com os relatos efectuado pela ONG “Comité Colombo Canadense de Derechos Humanos”, a propósito de outro nacional da Colômbia, mas que se aplica ao caso em apreço, onde se descrevem as atrocidades cometidas pelos grupos das FARC e a incapacidade do governo e do Estado para conseguir a segurança das pessoas.
4.ª O relato suprarreferido é efectuado por uma entidade isenta e descreve a situação que se vive no País de origem da A. /Recorrente, que não se mostra capaz de assegurar que a mesma viva em segurança, pois aí sofre perseguição e ameaças pelas FARC e grupos armados que ameaçam, praticam extorsão e matam, num autêntico terror.
5.ª Como documentado no procedimento, a irmã da Recorrente é menor, e, tendo sido a pessoa que maiores ameaças sofreu, foi necessário retirá-la do país, com a ajuda da A. /Recorrente.
6.ª douta sentença recorrida não retira dos factos em questão, a consequência devida, isto é, a vida e segurança da Recorrente e da sua irmã não é acautelada no seu país, correndo as mesmas vários riscos, quais sejam de ameaça, perseguição, e mesmo, risco de vida , pelo que, ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, o acto em apreço padece de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, tendo a douta sentença recorrida violado o artigo 19º, n.º 1, alínea e) da Lei 27/2008, de 30 de junho .
7.ª Foi, igualmente, violado o direito de participação do interessado na tomada de decisão.
8.ª O direito de participação dos interessados na decisão tem consagração constitucional (cfr artigo 267º da CRP), e impõe à Administração a obrigação de criar as condições indispensáveis para assegurar uma participação efectiva e útil dos destinatários do acto, nos casos em que seja projectada a emissão de uma decisão de sentido desfavorável aos seus interesses, não devendo reconduzir–se num mero acto de rotina ou no cumprimento de uma mera formalidade, sem consequências ao nível da ponderação administrativa dos interesses co-envolvidos no procedimento
9.ª No caso em apreço, o que foi notificado a Recorrente, foram as suas declarações transcritas sem qualquer relatório, nem qualquer projecto de decisão, e, muito menos, a foi informada do projectado sentido desfavorável da decisão, pelo que inexistiu verdadeira e própria audiência prévia.
10.ª Na verdade, a tomada de declarações ocorreu no dia 20/11/2024, às 14:10 horas e terminou às 16:30 horas, tendo, nesse mesmo dia, sido as mesmas notificadas à Recorrente para se pronunciar em 3 dias, valendo essa pronúncia como audiência prévia.
11.ª A audiência prévia prevista no artigo 17º, n.º 2, da Lei de Asilo mais não é do que um assomo de audiência prévia e atenta contra todas as regras administrativas que a consagram, incluindo a Constituição da República Portuguesa.
12.ª Como decidiu o douto Acórdão do STA, de 18 de Maio de 2017, processo n.º 0306/17, disponível em www.dgsi.pt , o pedido de protecção internacional (cfr. artigos 3º, 4º e 7º da Lei de Asilo) tem um procedimento único, estando a sua tramitação prevista nos artigos 10º a 22º da referida Lei, se o pedido de protecção internacional for formulado junto do Centro Nacional para o Asilo e Refugiados.
13.ª “In casu”, foi o que aconteceu, pelo que o Réu encontrava-se obrigado a elaborar o relatório com projecto de decisão, e notificá-lo não só à recorrente, para este se pronunciar sobre ele, como, igualmente, tal relatório devia ter sido notificado ao representante do ACNUR e ao CPR, o que não se verificou.
14.ª Ao considerar que não foi preterida a realização de audiência prévia, a douta sentença recorrida violou este instituto jurídico, tendo violado os artigos 121º e segs. do CPA, o artigo 17º Lei de Asilo e o artigo 267º, da CRP.
15.ª A interpretação efectuada pela douta sentença recorrida, do n.º 2, do artigo 17º, da Lei de Asilo, no sentido de considerar que a entidade demandada deu cumprimento à audiência prévia, viola o artigo 267º da Constituição da República Portuguesa.
16.ª O direito de participação dos interessados na decisão, enquanto garantia de defesa dos particulares, determina para a Administração a obrigação de criar as condições indispensáveis para assegurar uma participação efectiva e útil dos destinatários do acto, nos casos em que seja projectada a emissão de uma decisão de sentido desfavorável aos seus interesses, não devendo reconduzir - se num mero acto de rotina ou no cumprimento de uma mera formalidade, sem consequência ao nível da ponderação administrativa dos interesses co -envolvidos no procedimento.
17.ª No presente caso, apenas foi notificado a Recorrente as suas declarações transcritas, sem qualquer relatório, nem qualquer projecto de decisão, e, muito menos, foi informada do projectado sentido desfavorável da decisão, pelo que o que existiu foi um esgar de audiência prévia.
18.ª À Recorrente não foi notificado qualquer relatório nem qualquer projecto de decisão, e muito menos, o sentido desfavorável da decisão, para efeitos de autêntica audiência prévia que, deste modo, não se verificou, já que a audiência prévia prevista no artigo 17º, n.º 2, da Lei de Asilo mais não é do que um assomo de audiência prévia e atenta contra todas as regras administrativas que a consagram, incluindo a Constituição da República Portuguesa.
19.ª É, pois, inconstitucional a interpretação feita pela douta sentença recorrida no sentido de se ter verificado autêntica audiência prévia, inconstitucionalidade que se invoca para todos os efeitos legais.
20 .ª E, ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, e tendo em consideração a situação de ameaças constantes de que é vítima a Recorrente e a sua irmã, está em causa uma violação sistemática de direitos humanos que acarreta para ambas, o risco de sofrerem ofensa grave, mesmo com risco de vida, pelo que, pelo menos, devia ser - lhe concedida protecção subsidiária , sendo que, ao considerar tal pedido, igualmente, improcedente, a douta sentença recorrida violou o artigo 7º, da Lei de Asilo .
Nestes termos e nos mais de direito, com o mui douto suprimento de Vª. Exas. deve o presente recurso ser considerado procedente, por provado e, em consequência, ser a douta sentença recorrida revogada e substituída por douto acórdão que admita o presente pedido de protecção internacional, nos termos alegados, ou deferir o pedido de protecção subsidiária”.

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A Entidade Demandada, ora Recorrida regularmente notificada não apresentou Contra-Alegações.
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O Digno Magistrado do Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), emitiu pronúncia do sentido do não provimento do recurso.

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Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo submetido à conferência para decisão

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I.1 – Da delimitação do objecto do Recurso
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações – cf. artigos 144.º, n.º 2 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente] -, que residem em aferir se a decisão impugnada padece de erro de julgamento de Direito.
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II. Fundamentação
II. 1. De facto:
Nos termos do artigo 663º, nº 6, do CPC remete-se para a matéria de facto considerada provada pelo Tribunal a quo que se mostra estabilizada, por não ter sido impugnada.
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II.2 - De Direito


Atentas as conclusões recursivas cumpre aferir se o Tribunal a quo errou ao entender que a situação da Recorrente/Autora não se enquadra nem no artigo 3.º ,nem do artigo 7.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, na versão mais recente que foi dada pela Lei nº 53/2023, de 31.08 (Lei do Asilo), referentes respectivamente à concessão de asilo e protecção subsidiária, mantendo a Decisão impugnada da AIMA que considerou infundado o pedido de protecção internacional formulado pela Recorrente/Autora, em virtude de se verificarem os pressupostos de que depende a aplicação da alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei do Asilo. Bem como aferir se laborou em erro ao analisar os vícios de forma, por preterição do direito de audiência prévia e por deficiente fundamentação imputados pela Recorrente/Autora à referida Decisão. Concomitantemente apreciar da (in)constitucionalidade do artigo 17º, nº 2 da Lei do Asilo, na interpretação acolhida pelo Tribunal a quo.

Apreciando;

Renova a Recorrente nesta instância que a decisão impugnada padece de vício de falta de fundamentação, nos termos do artigo 152º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

O fundamento legal em que assenta a decisão impugnada é a norma constante da alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei do Asilo, nos termos da qual o pedido de protecção internacional se considera infundado quando se verifique que, ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para protecção subsidiária.
Quanto aos fundamentos de facto, dos quais a Recorrente discorda, a decisão de 12.12.2024 (ponto 8 do probatório), remete para a Informação que a antecede, constante do ponto 7. do probatório.
Considerando que, como bem se refere no Acórdão proferido pelo TCA Norte, de 14.07.2017, “1. Uma decisão está devidamente fundamentada, nos termos do disposto no artigo 125º do Código de Procedimento Administrativo [leia-se artigo 152º do CPA à luz da actual redacção] (de 1991) se permite ao particular perceber, ainda que de forma sucinta o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido para a tomada de decisão”.
Que a exigência de fundamentação do acto visa permitir ao destinatário um conhecimento cabal e adequado das razões que conduziram ao específico sentido decisório, vide o Acórdão do TCA Sul de 12.11.2020, Proc.º nº 135/18.3BEBJA-A, in www.dgsi.pt .
Logo, do argumentário da Recorrente facilmente se intui que o alegado vício de deficiente e contraditória fundamentação mais não é do que a discordância com os argumentos invocados na decisão que considerou infundado o seu pedido de protecção internacional e não qualquer vício intrínseco da mesma decisão que impeça ou prejudique o conhecimento dos respectivos fundamentos de facto e de Direito.
Daí que tal como assumiu a sentença recorrida, nesta parte:
“Compulsado o ato impugnado, o Tribunal constata que o R. de uma forma clara, suficiente, congruente, fez uma descrição dos factos relevantes para a decisão, indicou as normas legais aplicáveis e extraiu daí as conclusões. Da leitura deste documento é possível a um destinatário médio compreender o iter cognoscitivo que o R. fez para decidir como decidiu.
Mais, não obstante o R. ter referido, no ato impugnado, a existência de grupos armados não estatais na Colômbia, de seguida, de forma muita clara, congruente e suficiente, explica que do relato da Autora não se vislumbra qualquer perseguição ou ameaça atual e efetiva contra si que apenas pudesse ser afastada através do mecanismo de proteção internacional. Por isso, considerou que a Autora não procurou todos os mecanismos internos de proteção disponíveis e que se encontravam ao seu alcance no seu país de origem, para evitar e afastar-se das ameaças que diz ter sido alvo, nomeadamente ter procurado outra zona do país onde se pudesse sentir mais segura.
Além do mais, seria ainda expectável que perante um fundado receio toda a família ponderasse de imediato sair daquela zona da Colômbia, para uma outra onde estivessem em segurança e longe de todas as ameaças que alega terem sido alvo ao longo dos anos, o que não fizeram. Antes optaram por permanecer quase sempre no mesmo departamento, Valle Del Cauca.
Ante o supra exposto, e acompanhando a fundamentação da jurisprudência citada, o Tribunal conclui que o ato impugnado está devidamente fundamentado”.

O que ora se confirma.

A respeito do alegado erro de julgamento no que concerne à verificação dos pressupostos legais para concessão do pedido de asilo ou de protecção subsidiária.

Em primeiro lugar, a Recorrente não impugna a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, porque assume que as declarações que prestou no procedimento administrativo serão convincentes quanto ao facto de se sentir impossibilitada de regressar ao País de origem (Colômbia) e da sua residência habitual, verificando-se assim os motivos para que lhe seja concedida protecção internacional de asilo.

Vejamos;

A Lei do Asilo veio estabelecer as condições e procedimentos de concessão de asilo ou de protecção subsidiária e os estatutos de requerente de asilo, de refugiado e de protecção subsidiária.

No que concerne ao direito de asilo de acordo com o disposto no artigo 3.º, da Lei n.º 27/2008 de 30 de Junho, este “… é garantido aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência de actividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana” (n.º 1). “Têm ainda direito à concessão de asilo os estrangeiros e os apátridas que, receando com fundamento ser perseguidos em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, não possam ou, por esse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual(n.º 2).

Prosseguindo o mesmo preceito legal que Para efeitos do n.º 2, é irrelevante que o requerente possua efetivamente a característica associada à raça, religião, nacionalidade, grupo social ou político que induz a perseguição, desde que tal característica lhe seja atribuída pelo agente da perseguição (nº 4).
Efectivamente, do quadro legal em que nos movemos, temos que o direito de asilo é, assim, garantido não só a quem se encontre a ser perseguido ou gravemente ameaçado de perseguição por força da sua actividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, mas também a quem tenha receio de ser perseguido em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social se esses forem os motivos da mesma.
Para efeitos do que sejam actos de perseguição, o n.º 2 do artigo 5.º da Lei do Asilo esclarece que, os mesmos podem assumir, nomeadamente, as seguintes formas:
“a) Atos de violência física ou mental, inclusive de natureza sexual;
b) Medidas legais, administrativas, policiais ou judiciais, quando forem discriminatórias ou aplicadas de forma discriminatória;
c) Ações judiciais ou sanções desproporcionadas ou discriminatórias;
d) Recusa de acesso a recurso judicial que se traduza em sanção desproporcionada ou discriminatória;
e) Ações judiciais ou sanções por recusa de cumprir o serviço militar numa situação de conflito na qual o cumprimento do serviço militar implicasse a prática de crime ou ato suscetível de provocar a exclusão do estatuto de refugiado, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º;
f) Atos cometidos especificamente em razão do género ou contra menores.” Podem ser, para este efeito, agentes de perseguição, o estado, os partidos ou organizações que controlem o estado ou uma parcela significativa do território e, bem assim, agentes não estatais – cfr. artigo 6.º da mencionada legislação.
Neste seguimento, a alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei do Asilo clarifica que o estatuto de refugiado, traduz-se no reconhecimento, por parte das autoridades portuguesas competentes, de um estrangeiro ou de um apátrida como refugiado que nessa qualidade seja autorizado a permanecer em território nacional.”
Assim sendo, o artigo 4.º da Lei do Asilo determina que a concessão do direito de asilo confere ao beneficiário o estatuto de refugiado.
Já relativamente à protecção subsidiária, o artigo 7.º da Lei do Asilo, estatui o seguinte:
“1- É concedida autorização de residência por proteção subsidiária aos estrangeiros e aos apátridas a quem não sejam aplicáveis as disposições do artigo 3.º e que sejam impedidos ou se sintam impossibilitados de regressar ao país da sua nacionalidade ou da sua residência habitual, quer atendendo à sistemática violação dos direitos humanos que aí se verifique, quer por correrem o risco de sofrer ofensa grave.
2 - Para efeitos do número anterior, considera-se ofensa grave, nomeadamente:
a) A pena de morte ou execução;
b) A tortura ou pena ou tratamento desumano ou degradante do requerente no seu País de origem; ou
c) A ameaça grave contra a vida ou a integridade física do requerente, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos. (…)”

Nesta sequência, a alínea i) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei do Asilo define estatuto de protecção subsidiária comoo reconhecimento, por parte das autoridades portuguesas competentes, de um estrangeiro ou de um apátrida como pessoa elegível para concessão de autorização de residência por proteção subsidiária.

Quanto aos actos de perseguição, como já se aludiu, terão de constituir, pela sua natureza e reiteração, uma grave violação de direitos fundamentais, ou traduzir-se num conjunto de medidas que, pelo seu cúmulo, natureza ou repetição, afectem o estrangeiro ou apátrida de forma semelhante à que resulta de uma grave violação de direitos fundamentais – cf. artigo 5.º, n.º 1, da Lei do Asilo.

Nos termos do artigo 15.º do mesmo diploma legal, o requerente deve apresentar todos os elementos necessários para justificar o pedido de protecção internacional, devendo juntar ao mesmo os documentos de identificação e viagem de que disponha, bem como elementos de prova.
Com efeito, em termos de ónus da prova, é, assim, ao requerente de asilo ou de proteção subsidiária que cabe apresentar todos os elementos necessários que justifique o seu pedido de proteção internacional, sendo certo que o requerente é autorizado a permanecer em território nacional até à decisão sobre a admissibilidade do pedido – cfr. n.º 1 do artigo 11.º da Lei do Asilo.
Por sua vez, o artigo 18.º da Lei do Asilo estabelece as condições para a apreciação do pedido de protecção internacional, prevendo o artigo 19º, as situações em que a apreciação do mesmo não é submetida a instrução a que se refere o artigo 18.º, mas antes sujeita a um mecanismo de tramitação acelerada por se considerar que o pedido é manifestamente infundado.
Concretamente, a análise das condições a preencher para beneficiar do estatuto de protecção internacional é sujeita a tramitação acelerada e o pedido considerado infundado quando se verifique, além do mais, que “Ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária;”cfr. alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei do Asilo.
Estamos perante situações em que o legislador considerou que os pedidos não reúnem manifestamente os requisitos necessários à concessão de protecção internacional, abreviando o procedimento e dispensando a instrução, que se afiguraria como um acto inútil, na medida em que os factos invocados, ainda que se verificassem, não são idóneos a despoletar a protecção requerida.
O presente pedido de asilo ou de protecção subsidiária formulado pela Recorrente/Autora foi considerado infundado com fundamento na citada alínea e) do nº 1 do artigo 19º.

Da sentença recorrida destaca-se o seguinte:

“ (…) Resulta da conjugação dos factos provados que a Autora nas declarações que prestou ao Réu, à questão que lhe foi colocada sobre os motivos pelos quais estava a solicitar o pedido de proteção internacional, não relatou nenhuma situação que a visasse a si diretamente, mas sim a um terceiro (a sua irmã). Ainda de acordo com o seu relato, foi a recusa, pela sua irmã, de uma oferta de trabalho suspeita que levou à colocação de um papel com ameaças na porta da casa dos pais de ambas, local onde estas viviam com os seus pais. Tendo ainda dito, que este era o único motivo pelo qual estava a pedir proteção internacional.

*
Aplicando o direito aos factos.
Apreciado o relato da Autora, à luz das regras da experiência comuns e dos normais acontecimentos da via, não é crível que sendo a irmã da Autora menor e estando a ser ameaçada os seus pais não tenham procurado proteger-se a si e às suas filhas (Autora e irmã menor) tendo optado por, perante uma ameaça, continuar a residir no mesmo local sem pedir qualquer proteção às autoridades do seu país e entregar a filha menor aos cuidados da Autora.
Atento a que o relato da Autora não merece crédito, as conclusões que o Réu extraiu e que verteu no ponto 8 do ato impugnado, estão corretas, não merecendo qualquer censura pelo Tribunal.
Estabelece o artigo 19.º, n.º 1, al. e) da Lei do Asilo, que a análise das condições a preencher para beneficiar do estatuto de proteção internacional é sujeita a tramitação acelerada e o pedido considerado infundado quando se verifique que ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária.
Concluindo-se que a Autora na exposição dos factos apenas relata acontecimentos que não a visaram diretamente, tais acontecimentos terão, necessariamente, de ser qualificados de relevância mínima para a análise das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária.
Termos em que não tendo a Autora alegado factos suscetíveis de preencher as normas constantes dos artigos 3.º e 7.º da Lei do Asilo, o Tribunal conclui que o ato impugnado não padece de erro sobre os pressupostos”

O assim decidido será de confirmar não tendo a Recorrente, em sede do presente recurso, invocado argumentos que permitam infirmar tal juízo.
Com efeito, compulsadas as declarações da Recorrente/Autora mostra-se evidente que não resultaram concretizados quaisquer actos persecutórios (vide nº 2 do artigo 5º da Lei do Asilo), de que a mesma tenha sido directamente vítima, no seu país de nacionalidade ou de grave ameaça de perseguição em consequência de actividade por si exercida em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, não se mostrando, pois, preenchidos os requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 3 da Lei do Asilo, que permitam conceder à Autora/Recorrente protecção internacional por esta via.
Na petição inicial a Recorrente/Autora refere apenas quanto à sua situação:

E, o facto de o governo colombiano desenvolver esforços no combate aos grupos armados, tal protecção acaba por ser apenas do ponto de vista formal, que não em concreto, ficando a A. e a sua irmã à mercê destes grupos.
9º Acresce que, como documentado no procedimento, a irmã da A. é menor, e, tendo sido a pessoa que maiores ameaças sofreu, a A. e a sua família cuidaram de tentar retirá-la do país, com a ajuda da A..

Perante as declarações prestadas aquando do pedido, foi elaborada a Informação da Entidade Demandada (ponto 7 do probatório), da qual se destaca:
a) A requerente é nacional da Colômbia, tendo exibido o Passaporte Ordinário da República da Colômbia n.º ……, tendo declarado que se encontrava a viver no município de Pradera, no departamento de Valle dei Cauca;
b) Questionada, respondeu que efetuou o presente pedido de proteção internacional, devido a ameaças e perseguição;
c) Concretamente, referiu que tudo começou em setembro de 2023 quando vivia em Palmira, no mesmo departamento;
d) Referiu que o ambiente aí não era multo bom e que o seu pai era ameaçado por delinquentes por ser pastor de uma Igreja, que lhe diziam que não gostavam que estivessem ali;
e) Referiu ainda que, por causa da delinquência aí existente, havia uma câmara "comunitária" de vigilância na rua e que, por causa disso, também começaram a receber ameaças, pois pensavam que tinham sido eles a instalar a referida câmara, por estar mais perto da sua casa;
f) Concretamente referiu que se tratava de grupos de duas ou três pessoas, que passavam pela sua casa e que gritavam, sempre que por ali passavam: "chibos, Vão-se embora";
g) Alegou que, por causa dessa situação, em janeiro de 2024, juntamente com a sua irmã, requerente do pedido de proteção internacional n.º 2382/24, foi viver para a casa da sua avó em Cali, também no departamento de Valle dei Cauca;
h) Contou que começou a trabalhar e que a sua irmã, em março de 2024, encontrou uma oferta de emprego para ajudante de cozinha através da rede social Instagrom, tendo enviado o seu Curriculum vitae com todos os seus dados, como resposta a esse anúncio;
i) Alegou ainda que, passados uns dias a chamaram e marcaram uma data para se encontrarem, num restaurante, isto no dia 29 de abril, disseram-lhe que o salário seria de 1 milhão e quinhentos mil pesos e que teria telemóvel e transporte, disseram ainda que teria que fazer uma semana de estágio, para levar uma mala com coisas pessoais para lá ficar, pedindo-lhe que não dissesse a ninguém para onde ia;
j) A requerente referiu que, por ter achado a oferta suspeita, disse à sua irmã para não aceitar e ligou à senhora do anúncio a informar que a sua irmã não iria;
k) alegou ainda que essa senhora não gostou e continuou a ligar a dizer que a sua irmã tinha que ir tendo a requerente ameaçado de fazer queixa à policia, caso continuasse a insistir;
(…)
m) Relatou ainda que, no dia seguinte, 30 de abril, quando acordaram, havia um papel na porta de casa onde as declaravam "objetivo militar" assinado por um grupo chamado "Frente Ismael Ruiz - CompaPia Adan Izquierdo” - FARC - EP - e que O mesmo diria "TODA LA FAMÍLIA ….. ES DECLARADA OBJETIVO MILITAR SUS DIAS ESTAN CONTADOS PERRAS h.P." fotocópia do documento junto ao processo;
n) Mais acrescentou que fez denúncia online destas ameaças no site da Fiscalía — documento junto ao processo, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos;
o) Alega ainda que nesse mesmo dia, 30 de abril, regressaram a Palmira, para casa dos pais e, aí, combinaram que não iam atender chamadas anónimas ou de números desconhecidos, no entanto, no dia 3 de agosto voltaram a ligar à sua irmã e ameaçaram-na, dizendo que já sabiam onde estavam a viver e que as iam buscar sendo que, por causa dessa ameaça se mudaram então para Pradera e que falaram com os seus pais para saírem do país, pois estavam todos assustados e já não se sentiam seguros em nenhum lugar;
p) A requerente contou que estiveram a viver em Pradera até vir para Portugal e que, durante esse período de tempo não receberam ameaças, no entanto, não se sentiam seguras;
q) Relativamente à queixa que apresentaram online, referiu que, cerca de duas semanas mais tarde, responderam dizendo que se deveria apresentar na Fiscolio em Cali para dar andamento ao processo, no entanto, em Cali disseram que já não podiam dar andamento ao processo porque estavam a residir em Palmira e já não em Cali, pelo que, em Palmira, acabaram por ir à Unidad para las Victímas fazer o registo da situação, conforme documento junto ao processo que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos”.

Ante o exposto, entende-se que não tendo sido indicada qualquer situação individual e pessoal concretizadora de a Recorrente ou a sua irmã (cujo pedido foi formulado autonomamente) sofrer ofensa grave em contexto de conflito armado internacional ou interno, que ameace a sua vida ou a integridade física, não se mostram preenchidos os requisitos do artigo 7.º da Lei do Asilo que permita conceder-lhe protecção subsidiária, pelo que também aqui se acompanha a decisão impugnada, que julgou infundado o pedido de concessão de asilo formulado pela Recorrente/Autora com fundamento na alínea e) do n.º 1 do artigo 19º da Lei do Asilo.
Com efeito, do relato da Recorrente, das várias ameaças que referiu, nomeadamente de o/s agente/s em questão [desconhecendo-se a sua origem] identificar/em o nome da família e a sua morada, não relatou que alguma dessas ameaças tivesse sido concretizada sobre qualquer membro da sua família, mais se constatando que apenas as duas filhas abandonaram o país, tendo aí permanecido os seus pais e o outro irmão.
Verifica-se, ainda, que a Recorrente confiava nas forças de segurança, porquanto perante a tal proposta à sua irmã, que considerou suspeita, ameaçou fazer queixa à polícia e não mais teve consequências.
Concluindo, quanto ao seu receio individual de uma perseguição se tiver de regressar à Colômbia, não é mais que isso, um receio, que não está suportado com alegações concretas e circunstanciadas que justifiquem a existência de qualquer perseguição. Quanto a este aspecto, a jurisprudência dos tribunais superiores tem afirmado que o receio de perseguição, pressuposto essencial do direito de asilo, tem de ser avaliado objetivamente, a partir de factos invocados, não bastando um receio subjetivo, um estado pessoal de inquietação ou medo (neste sentido, vejam-se os acórdãos deste TCA Sul de 24.10.2019, e de 18.06.2020, proferidos, respetivamente, nos processos n.os 397/19.9BELSB e 10/20.1BELSB, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
Por último, recentemente este TCA SUL teve já oportunidade de se pronunciar sobre uma situação próxima da presente – em que a ora Relatora foi então adjunta – exactamente a respeito de um pedido idêntico formulado também por uma cidadã colombiana no processo nº 3414/250BELSB, acórdão de 11.09.2025, in www.dgsi.pt:
“Dada a amplitude da actuação dos grupos criminosos na Colômbia (em particular, as “Águias Negras” e grupos dissidentes que surgem e reaparecem em diferentes regiões), bem como as condições socioeconómicas e o fortalecimento de grupos paramilitares, é praticamente impossível encontrar um local no país de origem onde a família possa viver sem medo constante de retaliações ou tentativas de recrutamento forçado. O Registo Único de Vítimas é meramente declarativo de condição de vítima, não equivalendo a uma protecção efectiva contra grupos violentos, pelo que o regresso da autora à Colômbia implicaria um risco grave para a sua segurança pessoal, bem como para a segurança dos seus filhos, que foram explicitamente visados pelos criminosos.
Antes de mais, não se mostra minimamente concretizada nem fundamentada a conclusão a que chega a autora de que os alegados agressores seriam membros de um grupo armado, que nem sequer caracteriza, limitando-se a indicar a sua designação. Ademais, a autora não faz referência a qualquer pedido de ajuda que tenha dirigido ao Estado Colombiano para obter protecção em face dos supostos agressores e que tenha sido recusado.

Para efeitos de concessão de asilo, a situação de perseguição que a recorrente invoca reduz-se a uma alegação vaga e genérica que nada tem a ver com qualquer actividade exercida em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, nem sequer com a raça, religião ou opinião política do autor, que permita o enquadramento da situação descrita nos n.ºs 1 e 2 do artigo 3.° da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, e a ligação dos supostos agressores a um grupo armado não se mostra segura, decorrendo de uma conjectura da autora.
Quanto à também requerida protecção subsidiária, a autora não alegou qualquer factualidade apta a concluir pela impossibilidade de regresso à Colômbia, desde logo porque não descreve qualquer situação de sistemática violação dos direitos humanos. Na verdade, a recorrente não alega de forma credível e plausível que, caso regresse à Colômbia, corre o risco de sofrer pena de morte ou execução, tortura ou pena ou tratamento desumano ou degradante, ameaça grave contra a vida ou a sua integridade física, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos. Ademais, a recorrente não alegou que requereu protecção do Estado Colombiano face à ameaça de que se sente vítima, sendo certo que, quando os agentes são não estatais só podem ser considerados agentes de perseguição se ficar provado que são incapazes ou não querem proporcionar protecção contra a perseguição (cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 6.° da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho). Deste modo, na exposição dos factos que sustentam o seu pedido, a recorrente não invocou uma impossibilidade de regressar ao seu país de origem apta a sustentar o pedido protecção subsidiária, pelo que as razões que invocou para fundamentar a protecção internacional não revestem da pertinência e relevância mínima necessária para a análise do pedido. A este propósito, alega a recorrente que o Tribunal a quo pressupôs, que as autoridades policiais colombianas estariam aptas a protegê-la. Todavia, nesta sua alegação, olvida a recorrente que, como referido, é à mesma que incumbe a demonstração de incapacidade de protecção por parte das autoridades policiais, ónus que não cumpriu. Acresce que a recorrente ignora ainda a falta de verificação das condições a que se reporta o n.º 4 do artigo 18.º da mesma lei, nos termos acima referidos, no sentido de a alegação de factos ser insuficiente para sustentar o pedido.
E em face da manifesta insuficiência de alegação de factos, não assume qualquer relevância a desconsideração de meios probatórios (como o Registo Único de Vítimas, os panfletos e os relatórios internacionais) invocada pela recorrente.
De resto, não é aplicável ao caso o benefício da dúvida, nos termos do n.º 4 do artigo 18.º da Lei n.º 27/2008, de 30 de Junho, dado que o mesmo pressupõe a relevância da alegação do requerente de protecção internacional, a qual não ocorre no caso, pelas razões acima enunciadas.
Aqui chegados, concluímos que a autora não logrou sequer alegar – muito menos provar – factos concretos consubstanciadores das situações legalmente previstas como pressupostos para a concessão do direito de asilo e/ou de protecção subsidiária, pelo que não se impunha que, no âmbito do procedimento administrativo iniciado com o seu pedido de protecção internacional, fossem adoptadas quaisquer diligências instrutórias adicionais”.


Assim, tal como no caso sub iudice, do ante evidenciado, inexistem elementos suficientes para proceder à conjugação entre o elemento subjectivo e o elemento objectivo, que fundem o receio de perseguição ou de temor pela sua integridade física ou vida da Recorrente/Autora, ou dos seus familiares próximos, caso regresse ao local da sua residência habitual.
Em todo o caso, recentemente, em 16.04.2025, a Comissão Europeia propôs antecipar elementos do Pacto em matéria de Migração e Asilo e apresentar a primeira lista europeia de países de origem seguros entre os quais se inclui a Colômbia – acessível in https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/pt/ip_25_1070.

Por fim, no que respeita a não ter sido assegurado à Recorrente o direito de audiência prévia nos termos consagrados nos artigos 267º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 121º e segs. do CPA, o que teria sido erroneamente apreciado pelo Tribunal a quo, também aqui carece de razão a Recorrente.
A este propósito fundamentou a sentença recorrida:
“A Autora alega que o ato impugnado violou o direito de participação do interessado, pois o que
foi notificado à A., foram as suas declarações transcritas sem qualquer relatório, nem qualquer projeto de decisão, e, muito menos, a A. foi informada do projetado sentido desfavorável da decisão, pelo que inexistiu verdadeira e própria audiência previa. Além de que nem a A. se pôde pronunciar em sede de audiência prévia nem o CPR pôde emitir o parecer previsto na lei em sede de audiência de interessados.
O Réu não se pronunciou.
Estabelece o artigo 267.º, n.º 5 da CRP que “O processamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.”
Os artigos 17.º e 19.º da Lei do Asilo, na parte relevante, estabelece o seguinte:
“Artigo 17.º Transcrição ou relatório de declarações
1 - Após a prestação de declarações referida no artigo anterior, a AIMA, I. P., elabora a transcrição das declarações prestadas pelo requerente ou um relatório exaustivo e factual, do qual constem todos os elementos essenciais das declarações prestadas.
2 - A transcrição ou relatório de declarações, referidos no número anterior, são notificados ao requerente para que o mesmo se possa pronunciar sobre ele no prazo de três dias, que equivale, para todos os efeitos, a audiência prévia do interessado.
3 - A transcrição ou relatório de declarações referidos no n.º 1 são comunicados ao representante do ACNUR e ao CPR enquanto organização não governamental que atue em seu nome, desde que o requerente tenha dado o seu consentimento, para que aquela organização, querendo, se pronuncie no mesmo prazo concedido ao requerente.
(…).”
“Artigo 19.º Tramitação acelerada
1 - A análise das condições a preencher para beneficiar do estatuto de proteção internacional é
sujeita a tramitação acelerada e o pedido considerado infundado quando se verifique que:
(…)
e) Ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária;
(…)”
*
Extrai-se das disposições legais indicadas o seguinte:
A forma como a atividade administrativa se processa é objeto de lei especial, que, entre o mais, estabelece a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito;
Quando estão em causa pedidos de proteção internacional, após os requerentes prestarem declarações perante a AIMA, esta transcreve as declarações para um documento, de forma exaustiva e factual, e notifica o requerente para, querendo, se pronunciar sobre o documento no prazo de três dias, equivalendo isto, para todos os efeitos, a audiência prévia do interessado;
Os procedimentos administrativos de pedidos de proteção internacional têm tramitação acelerada.
***
Resulta da conjugação dos factos provados que após o pedido de proteção internacional da Autora, o Réu ouviu-a em declarações. Terminadas as declarações, o Réu transcreveu-as em documento e notificou a Autora para, querendo, se pronunciar ao abrigo do direito de audiência prévia, assim como notificou o Conselho Português para os Refugiados.
Recebida a notificação, a Autora optou por não se pronunciar no procedimento.
***
Aplicando o direito aos factos.
O artigo 267.º, nº 5 da CRP consagra o direito de participação dos interessados nas decisões que os afetem. Todavia, o legislador constituinte não estabeleceu os termos em que tal participação deve ocorrer, tendo optado por remeter para o legislador ordinário a responsabilidade de definir os termos em que a participação dos interessados nos procedimentos administrativos deve ser assegurada.
No que respeita à participação dos interessados, no âmbito do regime da Lei do Asilo, o legislador ordinário começou por definir que o procedimento tem tramitação acelerada e estabeleceu especificamente que (i) Após a prestação de declarações (…), a AIMA, I. P., elabora a transcrição das declarações prestadas pelo requerente ou um relatório exaustivo e factual, do qual constem todos os elementos essenciais das declarações prestadas. (ii) A transcrição ou relatório de declarações são notificados ao requerente para que o mesmo se possa pronunciar sobre ele no prazo de três dias, que equivale, para todos os efeitos, a audiência prévia do interessado.
Daqui decorre que o legislador não estabeleceu qualquer outra formalidade que não a transcrição das declarações do requerente e a sua notificação a este para efeitos de pronúncia no prazo de 3 dias úteis, valendo isso como audiência prévia do interessado.
Deste modo, ao contrário do alegado pelo Autor, o Réu não estava obrigado a entregar ao Autora
qualquer projeto de decisão, nem a informá-la do sentido desfavorável da decisão. Diga-se, aliás, que não obstante estas formalidades serem exigidas quando a audiência prévia decorre nos termos estabelecidos no CPA, que é o regime regra, quando há um regime especial como é o caso do constante no artigo 17.º da Lei do Asilo, o regime regra do CPA não se aplica, por força da prevalência do regime especial face ao regime geral.
Recorda-se que o artigo 267.º, n.º 5 da CRP, remete para a lei ordinária a disciplina da participação dos interessados nos procedimentos administrativos, todavia, daquela disposição constitucional não decorre uma imposição para o legislador ordinário de estabelecer um regime único e transversal de participação dos interessados. Ou seja, o legislador ordinário não está impedido de, ao abrigo do comando Constitucional previsto no artigo 267.º, n.º 5 da CRP, estabelecer um regime geral, como estabeleceu no CPA, e regimes especiais face à natureza e características de determinados procedimentos, como é o caso dos presentes autos que tem natureza urgente e tramitação acelerada.
Em consequência, tendo o Réu transcrito as declarações da Autora e notificando-a destas e de que podia pronunciar-se no prazo de 3 dias úteis, o que a Autora optou por não fazer, conclui-se que o
ato não padece do vício alegado pelo Autor”.

O argumentário da Recorrente é insuceptível de infirmar o assim decidido, desde logo, porque aos procedimentos especiais, como o presente, de concessão de protecção internacional, regulado na Lei do Asilo, onde se estabelecem as condições e procedimentos de concessão de asilo ou protecção subsidiária, este diploma prevê e regula os termos do cumprimento da audiência prévia nos procedimentos de protecção internacional, o que afasta a aplicação das normas gerais sobre audiência prévia dos interessados previstas no CPA, nos termos do artigo 2.º, n.º 5, do CPA.
Sendo, antes aplicável o regime especial consagrado naquela Lei, nomeadamente no artigo 17º, nº 2, quando aí se alude que A transcrição ou relatório de declarações, referidos no número anterior [1 - Após a prestação de declarações referida no artigo anterior, a AIMA, I. P., elabora a transcrição das declarações prestadas pelo requerente ou um relatório exaustivo e factual, do qual constem todos os elementos essenciais das declarações prestadas], são notificados ao requerente para que o mesmo se possa pronunciar sobre ele no prazo de três dias, que equivale, para todos os efeitos, a audiência prévia do interessado” (d/n).
Tal solução normativa acolhe o consagrado no artigo 267º, nº 5 da CRP, ao estabelecer que cabe à lei infraconstitucional assegurar o modo de participação dos cidadãos nas decisões que lhes disserem respeito. Como sucede no caso sub iudice em que o legislador foi claro ao afirmar que a notificação ao requerente dos elementos aí previstos (nºs 1 e 2 do artigo 17º da Lei do Asilo), equivale para todos os efeitos como audiência prévia do interessado.
Não se mostra disputado que a Entidade Demandada, transcreveu as declarações prestadas pela Recorrente, e notificou-a para, querendo, se pronunciar ao abrigo do direito de audiência prévia, assim como notificou o Conselho Português para os Refugiados. Todavia, recebida a notificação, a Recorrente optou por não se pronunciar no procedimento.
Neste contexto, importa trazer à colação o fundamento legal em que se ancorou a decisão impugnada, ou seja, que o pedido de protecção internacional será considerado infundado quando se verifique que ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária (artigo 19º, nº 1, alínea e) da Lei do Asilo).
Donde, além de se tratar de um procedimento de tramitação acelerada, a decisão que veio a ser proferida baseia-se sobretudo nas próprias declarações da Recorrente.
Assim, a única notificação ao requerente de protecção internacional que está prevista previamente à sua notificação da decisão final, é a que alude o artigo 17º, nº 2 da Lei do Asilo. Tal notificação destina-se a garantir que o interessado tenha oportunidade de, perante o relatório ou a transcrição das declarações que antes prestou e que servirão de referência na análise inicial do pedido, o mesmo possa fazer observações e/ou prestar esclarecimentos relativamente a eventuais erros de tradução ou de compreensão constantes do relatório ou da transcrição.
Tal como estabelecido no n.º 3 do artigo 17.º da Directiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de protecção internacional, Os Estados-Membros devem assegurar que, antes de o órgão de decisão tomar uma decisão, o requerente tenha a oportunidade de fazer observações e/ou prestar esclarecimentos oralmente e/ou por escrito relativamente a eventuais erros de tradução ou de compreensão constantes do relatório ou da transcrição, no final da entrevista pessoal ou dentro do prazo fixado. Para esse efeito, os Estados-Membros devem assegurar que o requerente seja plenamente informado do conteúdo do relatório ou dos elementos substantivos da transcrição, se necessário com a assistência de um intérprete. Os Estados-Membros solicitam ao requerente que confirme que o conteúdo do relatório ou a transcrição refletem corretamente a entrevista.”
Neste conspecto, no caso em apreço, estamos perante um procedimento abreviado e dispensado de instrução, sustentado no exame das próprias declarações do requerente, em que a entidade administrativa (AIMA) deve analisar se, no relato que faz e dos factos invocados pelo requerente invoca somente questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária.
Por último, em face do atrás expendido, a realização da pretendida audiência prévia, nos moldes preconizados pela Recorrente, sempre se afiguraria como um acto inútil, na medida em que as circunstâncias por si invocadas, ainda que se verificassem, não são idóneas a despoletar a protecção requerida.

No que concerne à invocada inconstitucionalidade do artigo 17º, nº 2 da Lei do Asilo por alegadamente violar o disposto no artigo 267º, nº 5 da CRP, além da norma constitucional remeter para o legislador ordinário os termos dessa participação, que veio a ser materializado no artigo 17º, nº 2 da Lei do Asilo, o certo é que, como atrás se desenvolveu, ressalta que a tese da Recorrente carece de fundamento, uma vez que, em face do presente procedimento especial, esta teve oportunidade de se pronunciar sobre os elementos relevantes para a decisão que veio a ser proferida pela Entidade Recorrida.

Além de que, como se alude na sentença, remetendo para o que se afirmou em recente Acórdão deste TCA Sul, de 13.02.2025, no Proc. nº 649/23.3BEALM, cabe a quem alega a inconstitucionalidade de uma norma densificar os argumentos que substanciem tal arguição, não se bastando para tal desiderato com uma alegação meramente genérica ou vaga (disponível em www.dgsi.pt).

Pelo exposto, decidiu assisadamente a sentença recorrida ao confirmar a legalidade do acto administrativo impugnado, pois que, ao abrigo da alínea e) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei do Asilo, o pedido de protecção internacional formulado pela ora Recorrente é considerado infundado e, nessa medida, deve ser desconsiderado, como foi.

Termos em que improcedem as conclusões de recurso, mantendo-se sentença recorrida.


*

ü Das Custas

Sem custas, por isenção objectiva – vide art.º 84.º da Lei do Asilo.

III. Decisão

Em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Administrativo Comum da Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.

Sem custas.
R.N.
Lisboa, 23 de Outubro de 2025

Ana Cristina Lameira, relatora
Lina Costa
Mara de Magalhães Silveira