Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:700/14.8BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:04/03/2025
Relator:FILIPE CARVALHO DAS NEVES
Descritores:LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
REVERSÃO
RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
PRESUNÇÃO LEGAL DE CULPA CONSAGRADA NO ART.º 24.º, N.º 1, ALÍNEA B) DA LGT
Sumário:I – O poder por parte do Tribunal de 2.ª instância respeitante à alteração da decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto deve limitar-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis nos concretos pontos questionados.
II – Em matéria de prova vigora o princípio da livre apreciação, gozando o Tribunal de uma ampla margem de discricionariedade de ponderação. Enquanto princípio orientador de valoração da prova, possui limites relativamente àqueles factos para cuja prova a lei exige determinada formalidade especial, só podendo ser provados por documentos, ou estejam plenamente provados, de que são exemplo as situações previstas nos art.ºs 364.º n.º 1, 393.º e 394.º n.º 1, todos do Código Civil.
III - Para se poder dizer que a ação ou omissão do Recorrido foi adequada à insuficiência do património da empresa para a satisfação dos créditos exequendos, deve seguir-se o processo lógico da prognose póstuma, ou seja, de um juízo de idoneidade, referido ao momento em que a ação se realiza ou a omissão ocorre, como se a produção do resultado se não tivesse ainda verificado, isto é, de um juízo ex ante.
IV - No caso, o Recorrido alegou e provou factualidade que permitiu concluir que administrou e geriu a empresa com observância dos seus deveres legais e contratuais destinados à proteção dos credores e que a falta de pagamento dos créditos tributários exequendos não resulta do incumprimento dessas disposições, tendo demonstrado a existência de uma situação de dificuldades de tesouraria que não lhe é imputável e a realização de iniciativas ulteriores para acautelar a satisfação das dívidas apuradas, dando conta, conforme devia, de medidas concretas que adotou tendentes a obviar o incumprimento e falta de pagamento das dívidas executadas.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

A Fazenda Pública veio apresentar recurso da sentença proferida em 20/06/2019 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou procedente a oposição apresentada por C…, melhor identificado nos autos, ao processo de execução fiscal («PEF») n.º 2208201200901106201 e apensos, contra si revertidos, instaurados originariamente contra a sociedade «G… – Sociedade Imobiliária, S.A.», para cobrança coerciva de dívidas provenientes de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis («IMT»), Imposto Municipal sobre Imóveis («IMI») e Imposto sobre o Valor Acrescentado («IVA»), no montante global de € 55.776,67.
Nas suas alegações, a Recorrente formula as seguintes conclusões:

«I. Foi a presente Oposição decidida por procedente, concluindo o Tribunal ter o Oponente logrado provar que desenvolveu todas as diligências necessárias para procurar manter a sociedade devedora originária a funcionar e para solver as dívidas da mesma, não sendo por culpa sua que os impostos em falta não foram pagos. Decisão com a qual, e com todo o respeito devido, não se concorda, entendendo-se não ter o Oponente feito a prova que lhe é exigida pela alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT;

II. O Tribunal “a quo”, apreciando da culpa, remete para o art.º 64.º do CSC, defendendo que «sobre todos os administradores/gerentes impende o dever de administrar com diligência as sociedades, ou seja, todos os administradores/gerentes têm o dever ou a obrigação geral de vigilância sendo que este dever não deve ser aferido pelo padrão de referência do bonus pater familiea, mas sim e como estabelece a alínea a) do nº 1 do art. 64º do CSC tendo como padrão de referencia a figura do gestor criterioso e ordenado. Será este padrão de referência que servirá para aferir da responsabilidade dos administradores.». Por outro lado, vai citar e usar Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCA Sul), com data de 21.05.2015, emitido no proc.º 8445/15, no qual ficou plasmado que a culpa que interessa deve precisamente: «aferir-se pela diligência de um bom pai de família em face das circunstâncias do caso concreto – isto quer se entenda que a responsabilidade em causa tem natureza contratual ou extra-contratual». E entende-se que não fez, o Oponente, prova de ter atuado como gestor criterioso, ou segundo o critério do bom pai de família;

III. Trata-se nos Autos de reversão de dívidas cujas datas limite de pagamento ocorreu em datas anteriores à da declaração de insolvência. Imputa, o Oponente, a responsabilidade pelos problemas financeiros do seu grupo de empresas a relação comercial com o Estado Angolano e à cessação abrupta de contrato por parte deste.
No entanto, não prova essa cessação abrupta, não prova o prejuízo que alega, não prova os contornos dos acordos realizados ao abrigo do PRESILD, omitindo nomeadamente o conteúdo do negócio de fornecimento às FAA, o qual terá sido (a fazer fé no declarado pelas testemunhas), o responsável por um crédito de 16 milhões da devedora originária para com aquele Estado, pois o financiamento da C… Angola ficou única e exclusivamente a cargo do Estado Angolano;

IV. O articulado do Acordo assinado no âmbito do PRESILD desde logo previa a transferência do negócio para a entidade Estatal, ainda que de forma faseada, estando igualmente clausuladas a possibilidade da sua denúncia ou resolução. E nada ficou provado quanto ao seu terminus. Salvo melhor opinião, também haveria que ter sido feita prova de ter o Oponente atuado de forma diligente quer na outorga quer no cumprimento do(s) contrato(s), e justificar qual a razão de existir uma dívida do montante que alega aquando da eventual denuncia do(s) contrato(s), ou do seu fim abrupto. Entende-se que nem sequer ficou provado que as dificuldades financeiras da sociedade advenham do fim do contrato/contratos com Angola;

V. E ainda que assim fosse, foi deliberadamente do Oponente a decisão de investir em Angola, mercado pública e notoriamente não isento de vicissitudes. E arrogando-se um crédito para com o estado Angolano superior a 16 milhões não indica quaisquer diligências realizadas, judiciais ou outras, no sentido de proceder à sua cobrança, ou sequer uma interpelação para ressarcimento daquilo que afirma ser devido;

VI. Imputa, o Oponente, todas as responsabilidades do não pagamento da dívida aqui em causa (e das dívidas do Grupo), ao Estado Angolano, aos bancos, ao Estado Português, ao CFO nomeado, ao administrador provisório no âmbito do PER, e ao administrador de insolvência no âmbito da mesma. Entende-se, no entanto, que a atuação dos bancos é a normal ou a desejável no âmbito de concessão de empréstimos de montante elevado, assim como nada resulta de estranho nas condições impostas pelo estado Português;




VII. Em nenhum dos contratos (ou minutas destes) juntos nos Autos está prevista a possibilidade/dever do não pagamento dos impostos - pelo contrário, tal obrigação de pagamento surge como requisito dos mesmos. E tal não estava previsto nem poderia estar. Mesmo estando, não seria nunca oponível à Autoridade Tributária. Não pode esta conceder moratórias, muito menos o podendo as partes, ou contratualizar entre si o não cumprimento das suas obrigações fiscais;

VIII. E sempre teria sido o Oponente quem, em representação da devedora originária, teria negociado as condições contratuais com as entidades financiadoras, vinculando as suas empresas às condições que entendeu. Por outro lado, os contratos de confirming nada tiveram que ver com o pagamento dos Tributos;

IX. Conclui, o Tribunal “a quo”, que o Oponente desenvolveu todos os esforços para evitar a insolvência do Grupo. No entanto, melhor seria ficar a constar que o Oponente desenvolveu todos os esforços para evitar que as empresas do Grupo fossem declaradas insolventes – o que resulta do testemunhado pela assessora jurídica do Grupo, que afirmou em Tribunal e consta da Douta Sentença, que o Processo de Revitalização teve apenas por objetivo evitar que algum dos credores pedisse a insolvência das empresas - retardou, desta forma, o Oponente, a declaração de insolvência da empresa, em prejuízo dos direitos dos credores, o que é precisamente o contrário do que ficou a constar na Sentença;

X. Com o devido respeito, não se vê como pode o Tribunal “a quo” considerar ter a atuação do Oponente sido de molde a evitar a frustração dos créditos dos seus credores, quando a sociedade é apenas apresentada à insolvência tardiamente e com a dívida já descontrolada, recorrendo anteriormente a um processo de revitalização precisamente com o intuito confessado de evitar o pedido de declaração de insolvência por algum credor;

XI. O que o Tribunal considera serem as delongas dos processos burocráticos das entidades bancárias, bem como as suas hesitações, serão as mesmas a que estão sujeitos todos os requerentes de empréstimos de avultados montantes, não parecendo que a banca devesse prescindir de garantias e salvaguardas apenas para agilizar os procedimentos de empresa com elevado grau de endividamento;

XII. Não ficou provado nos Autos que o CFO (este apenas por alguns poucos meses acompanhou a empresa) e a E… & Y… priorizassem os pagamentos de salários e dos fornecedores, em detrimento dos pagamentos fiscais. Antes pelo contrário, dos vários acordos firmados quer com o estado, quer com os Bancos (juntos nos Autos), era condição essencial a situação tributária das empresas estar devidamente regularizada – em todos eles esta cláusula existe;

XIII. O Tribunal aceita como certa a resolução abrupta pelo Estado Angolano (e apenas a este imputável) de um acordo com a devedora originária. Aceita que todos os males da empresa advieram de tal situação. E como tal, desinteressa-se de averiguar do comportamento do Oponente na outorga ou execução daquele contrato, e nem sequer indaga de eventuais diligências junto da contraparte em defesa da devedora originária. Ou seja, não foi feita prova pelo Oponente – nem o Tribunal a exigiu – de que não teve qualquer responsabilidade na (má) situação financeira da empresa.
Apenas interessou ao Tribunal a atuação do administrador depois da situação estar verificada;

XIV. E a posição da Autoridade Tributária no âmbito do PER ficou devidamente expressa por Ofício remetido dando conta das condições para participação no mesmo, o qual não consta sequer dos factos dados como provados. E, caso constasse, desde logo ficaria prejudicada a conclusão constante dos Autos, de que, após a entrada da devedora originária no PER o administrador judicial considerou que os impostos não deveriam ser pagos senão em sede de acordo de credores (facto unicamente suportado numa carta remetida ao Órgão de Execução Fiscal pelo Oponente com essa informação, não em qualquer decisão provinda daquele administrador que conste nos Autos).

XV. Ao decidir como decidiu, o Tribunal errou não apenas na factualidade que fixou, mas na análise que fez da mesma – quanto à análise da matéria de facto, remete-se, nesta sede para o ponto “I. Da fundamentação de facto” - artigo 32.º destas alegações – existindo, assim, erro de julgamento de facto;

XVI. Não fez também correta apreciação da prova testemunhal. Quanto à apreciação da prova testemunhal e ao que ficou fixado na Douta Sentença, remete-se para o ponto “II – Da prova testemunhal” - artigos 32.º a 47 das presentes alegações;

XVII. Errou também na aplicação do Direito (vide ponto “III- Da fundamentação de Direito” - artigos 48 e seguintes supra), existindo, assim, erro de julgamento de Direito, tendo violado o disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente Oposição, tudo com as devidas e legais consequências.».

*
O Recorrido apresentou contra-alegações, rematadas com as seguintes conclusões:

«1. Não deve ser dado provimento ao Recurso interposto pela Fazenda Pública contra a decisão proferida nos autos de procedência da oposição, em virtude da respetiva fundamentação não apresentar qualquer elemento suscetível de abalar o sentido da decisão recorrida.
2. Não há nenhuma divergência entre a fundamentação de facto da decisão recorrida com os documentos juntos aos autos.
3. É notória a incongruência a posição defendida pela AT para justificar o referido no ponto antecedente.
4. A AT não impugnou os vários documentos juntos aos autos pelo Recorrido, em particular os documentos de reestruturação do grupo G… e o contrato Presild celebrado com o Estado Angolano no entanto pretende de forma “encapotada” colocar em causa o seu teor.
5. Nos documentos intervieram variadas instituições independentes do grupo G…, tais como Governo Português, Governo de Angola, Instituições Públicas (IAPMEI, PME Investimentos SA, Facce, etc), consultoras (E… & Y… P… etc), instituições financeiras (B…, B…, etc).
6. O Bussiness Plan foi dado a conhecer à AT em sede de procedimento de reversão sem que em nenhuma altura o seu conteúdo fosse posto em causa.
7. A AT ao colocar em causa o seu conteúdo incorre em fundamentação a posteriori, inadmissível nos termos do preceituado no art. 77.º da LGT.
8. É manifesto da documentação junta aos autos a exposição do Grupo G… Portugal a Angola.
9. Pelo que, pelo antecedente não merece qualquer censura a decisão recorrida tão pouco nos termos pretendido pela AT.
10. E o antecedente vale para a alegada divergência invocada pela AT quanto ao ponto 7 do probatório.
11. As divergências detetadas pela AT relativamente aos pontos 13, 14 e 15 do probatório carecem de fundamentação ou, no limite de uma fundamentação obscura, já que não impugnou o relatório da E…& Y… somente na presente sede vem questionar o seu teor.
12. Já quanto ao ponto 28 do probatório a ATrefere não estar provado que os pagamentos estivessem dependentes do CFO, contudo, novamente de forma cirúrgica a AT omite que o no ponto em apreço a decisão deu por provado que “Os pagamentos ficaram todos dependentes da aprovação do CFO e da E… & Y…” (cfr. pág. 9 da Sentença).
13. Do teor do depoimento da referida testemunha constante na gravação junta aos autos a [01:04:38] a [01:05:54] e depois a [01:08:32] resulta o contrário do invocado pela AT.
É indubitável a inexistência da contradição imputada pela AT ao ponto 26 do probatório.
14. Fica demonstrado que bem andou o Triubnal a quo na valoração da prova testemunhal e na matéria dada por provado.
15. A divergência do ponto 30 do probatório alegada a AT resultará certamente de um lapso porquanto no indicado requerimento constante no SITAF a fls. 389 e ss, consta na pág. 11 um memorando de entendimento celebrado entre: i) as várias sociedades que integravam o grupo G…; ii) inúmeras instituições financeiras, a saber, B…, B…, B…e B…, no ficou estabelecido na al. h) da cláusula 8ª do referido memorando que as sociedades do grupo G… comprometiam-se a “transferir para o M… os contratos de TPAs em que alguma das sociedades que integra o Grupo G… seja parte”
16. A posição assumida pelo grupo G… perante a Banca e em particular perante o B… que no processo de reestruturação tinha uma posição dominante a nível negocial sendo inclusivamente representante das restantes instituições financeiras (cfr. ponto 9.3 da cláusula 9 do memorando em apreciação).
17. A alegada divergência no ponto 31 do probatório inovada pela AT não se compreende porquanto remete para documentação junta aos autos, não impugnada, que atesta as exigências da Banca para reestruturar o grupo G….
18. Tal foi assumido pelo Recorrido, pelas testemunhas inquiridas e demonstrado documentalmente nos autos.
19. No ponto 31 não há qualquer contradição com a documentação identificada pela AT.
20. E que foi dito quanto ao ponto 31 vale igualmente para o alegado pela AT relativamente ao ponto 39.
21. É falso que no ponto 41 do probatório não conte a menção à data da apresentação ao PER, ou seja, 23.08.2012, que correu termos sob o processo n.º 1519/12.6TYLSB porquanto encontra-se fundamentado ao ser referido que “(facto que se retira do doc. de fls 83 a 85 da cópia certificada do processo executivo junto aos autos)”.
22. A decisão recorrida comprova tal facto através de uma fundamentação remissa para os documentos da AT.
23. Quanto ao ponto 46 não se compreende o alegado pela AT porquanto identifica uma carta de 16.11.2012 distinta da carta identificada no ponto 47 do probatório.
24. Nos artigos 34.º a 41º das alegações de recurso a AT impugna a matéria de facto, com base na prova testemunhal produzida.
25. Contudo em desrespeito ao preceituado no artigo 640.º do CPC aplicável ex vi al e) do art. 2 do CPPT não identifica “com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso”.
26. O que por si só deverá conduzir à rejeição do pretendido pela AT.
27. A prova testemunhal não contradiz em nada a documentação constante nos autos.
28. Como bem decidiu o Tribunal a quo as testemunhas inquiridas prestaram depoimentos credíveis, isentos e demonstrando conhecimento direto dos factos.
29. Pelo que, deverá improceder a fundamentação da AT e ser confirmada a decisão recorrida.
30. É patente o esforço da AT em circunscrever a análise da prova testemunhal a frases soltas testemunhas inquiridas e a invocar contradições inexistentes com a prova documental.
31. Contudo, o depoimento das testemunhas inquiridas foi esclarecedor sobre o sucedido.
32. É óbvio o esforço argumentativo da AT em causar confusão com vista a fragilizar a decisão recorrida que, reitere-se, não merece censura.
33. Pelo que, deverá improceder o recurso e ser confirmada a decisão recorrida.
34. Ao contrário do alegado pela AT, quer da documentação junta aos autos, quer da prova testemunhal, verifica-se que: i) a exposição do Grupo G… ao projecto Angolano; ii) a dependência do Grupo G… do projecto Angolano; iii) a intervenção de entidades públicas - IAPMEI, PME Investimentos, FACCE - no processo de reestruturação do Grupo G… implementado após o corte abrupto do projecto Angolano; iv) a intervenção de consultoras independentes – E… & Y…, P…, D…, etc, no plano de reestruturação do grupo G… após o corte abrupto do projecto Angolano; v) a intervenção de várias instituições financeiras – B…, B…, B…, B…, etc – nos plano de reestruturação do grupo G… após o corte abrupto do projecto Angolano; vi) as diligências desencadeadas pelo Recorrido para fazer face à recuperação do Grupo G… e honrar os seus compromissos perante todos os credores, privilegiando o Estado.
35. As testemunhas, conforme consta da Sentença recorrida, relataram especificadamente e com diversos exemplos o corte abrupto do governo Angolano; a falta de pagamento de mais de 16 milhões de euros de fornecimento da G… em Portugal para Angola; os investimentos efetuados em Portugal para fazer face ao cliente Estado Angolano; todas as diligências desencadeadas pelo Oponente, ora Recorrido, para inverter a situação e recuperar o Grupo, honrando todos os compromissos; a falta de apoio da Banca (págs5 a 14 e 38 a 44 da Sentença Recorrida).
36. Segundo o CFO “….a situação de insolvência apenas se ficou a dever a insegurança no envolvimento da banca no grupo e que a injecção de capital foi mínima e com isso ocorreu o incumprimento do grupo. A banca hesitou e isso resultou na insolvência da sociedade. Esclareceu que a banca, quando a testemunha começou a exercer as suas funções, controlava a totalidade das entradas de capital nas empresas do grupo”
37. O Recorrido não é culpado pela ausência de pagamento das dívidas exequendas.
38. Do ponto de vista material, se tudo mais faltasse, está demonstrada à saciedade que a ausência de pagamento de quaisquer dívidas pela SOCIEDADE não resulta de má gestão, ou insensibilidade para com o pagamento das dívidas fiscais.
39. A ausência de pagamento das dívidas fiscais resulta de factores externos que se impuseram inelutavelmente à SOCIEDADE e ao grupo G… e que levaram à respectiva insolvência, como é reconhecido no relatório do Administrador da Insolvência.
40. Até 2010, o grupo G… tinha uma situação imaculada.
41. Em 2010 ocorre a nacionalização em Angola e as sociedades do perímetro G… ficam privadas de mais de 17 milhões de euros, ocorre um evento que inesperadamente altera toda a realidade do grupo, incluindo da SOCIEDADE.
42. O Recorrido imediatamente procurou inverter a situação, com um arrojado plano de reestruturação, mas foi ultrapassado por factores que não dependiam de si.
43. Foi celebrado um contrato de confirming com a Banca para pagar aos fornecedores.
44. Esse contrato não foi celebrado por vontade do Recorrido, foi obrigado a isso pois tal era exigido pelo plano de negócios gizado para reestruturar o Grupo.
45. E note-se no detalhe do plano de negócios apresentado com intervenção da P… e cuja execução foi supervisionada e acompanhada pela EY, que corroboram a viabilidade do Plano de Negócios.
46. Questões burocráticas da Banca, conforme atestado por entidades auditoras externas, colocaram em causa o plano de recuperação gizado, prejudicando a viabilidade da empresa.
47. E mais uma vez foi logrado pelo Recorrido alterar o Plano de reestruturação e contratados financiamentos com a Banca.
48. O Recorrido foi arredado contratualmente das decisões de efectuar pagamentos quando celebrou o contrato de financiamento umbrela grupado e em, 2011, a SOCIEDADE passa a pagar apenas o que é aceite pela Banca.
49. Foi imposto um CFO que passou a controlar todos os pagamentos realizados.
50. O CFO indicou o Recorrido não tinha poder de decisão sobre os pagamentos a realizar. Eles eram determinado pela Banca.
51. Na sequência das limitações impostas pela Banca o pagamento das dívidas fiscais era uma prioridade e, mesmo na escassez de fundos foram requeridos, aceites, contratados e iniciados planos prestacionais de pagamentos das dívidas exequendas..
52. Foram feitos acordos com o grupo S…e pedida a intervenção da PME INVEST que apresenta as condições para financiar a reestruturação no âmbito do FACCE.
53. Por problemas de mudança de governo não é assinado o contrato com o FACCE e a SOCIEDADE é empurrada para um PER em Abril de 2012 (momento em que ainda estavam a ser feitos os pagamentos prestacionais).
54. Até esse momento a situação tributária estava regularizada, mediante os acordos prestacionais.
55. Ocorre um problema informático que impediu os pagamentos e só em Agosto foi recolhido no sistema informático da AT novo plano de pagamentos.
56. Porém, no momento de prosseguir os pagamentos o Administrador Judicial que havia entretanto sido nomeado no PER indica que os planos prestacionais e demais pagamentos ao Estado, devem ser suspensos a partir desse momento.
57. O Recorrido coloca a questão à AT de o Administrador Judicial Provisório não pretender manter os pagamentos ao Estado, mas não obtém qualquer resposta.
58. Como pode ser imputada culpa na ausência de pagamentos ao Estado? Não pode.
59. E contra o exposto de nada valem os argumentos da AT a imputar culpa ao Recorrido na gestão da SOCIEDADE.
60. A AT tenta indicar que há culpa ao Recorrido na falta de pagamento das dívidas da SOCIEDADE, em virtude de má gestão.
61. Porém, a argumentação que a AT utiliza é totalmente alheia da realidade e da vida empresarial, que demonstra desconhecer em absoluto.
62. A AT indica que o grupo G… quando investiu em Angola descapitalizou-se, ficando sujeito ao risco da perda de todo o investimento realizado, bem como perda de 50% do respectivo volume de negócios, sendo que o plano de reestruturação resultou desses maus investimentos fora do país e daí a falta de pagamento ao Estado.
63. Ora, antes de prosseguir alerta-se que é falso que o grupo tenha descapitalizado as empresas para investir em Angola. Aliás nem a AT prova que a SOCIEDADE tenha tirado um cêntimo de Portugal para enviar para Angola.
64. O Grupo faz investimentos em Portugal para suportar a operação em Angola e faz vendas para as forças armadas Angolanas que não foram pagas ao Grupo, tal como foram não foi paga a estrutura criada em Portugal para suportar as operações em Angola.
65. Para além do investimento realizado ter sido efectuado em Portugal – com a reestruturação do grupo, a verdade é que as empresas não se encontravam descapitalizadas, de tal forma que operaram de 2006 a 2010.
66. E note-se que o risco assumido pelo grupo foi um risco equivalente ao das dezenas de grupos económicos com investiram e continuam a investir em Angola: Banca, grupo S…, grupo M…, grupo J…, B… etc.
67. As empresas veículo em Angola foram nacionalizadas e o estado Angolano deve 17 milhões de euros ao grupo G….
68. Em 2009, o grupo facturou 40.000.000,00 € nos negócios com Angola.
69. A conclusão de má gestão da AT e consequente culpa do Recorrido na falta de pagamento das dívidas é primária e sem qualquer substância, não podendo valer.
70. O Recorrido foi um gestor criterioso, diligente, que perante adversidades procurou manter um grupo de milhões de euros de pé, rodeou-se dos melhores auditores, fez tudo para que ocorresse a reestruturação.
71. A gestão dos fundos passa para a Banca – só esta podendo determinar pagamentos – com um elemento que os controlava a fazer parte da gestão – CFO – e vão sendo feitos pagamentos prestacionais – até ocorrer um problema informático da AT, durante 3 meses.
72. O problema informático é ultrapassado pela AT, mas na altura já havia sido nomeado um administrador Judicial, que ordena suspender os pagamentos prestacionais das dívidas exequendas.
73. O Recorrido procura junto da AT argumentos para solicitar ao Administrador que se mantenham os pagamentos prestacionais e a AT nada responde.
74. Donde, pelo exposto deverá improceder o recurso em apreciação e ser confirmada a Sentença recorrida.».

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A Exma. Magistrada do Ministério Público («EMMP») pronunciou-se no sentido de ser negado provimento do recurso.
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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão.





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II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cf. art.º 635.º, n.º 4 e art.º 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil - «CPC» - ex vi art.º 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - «CPPT»), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se:

(i) deve ser modificada a decisão da matéria de facto quanto aos pontos 6., 7., 13., 14., 15., 28., 30., 31., 39., 41. e 46.; e,

(ii) deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo, porquanto o Recorrido não logrou ilidir a presunção de culpa consagrada na alínea b) do n.º1 do art.º 24.º da Lei Geral Tributária («LGT»).

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III – FUNDAMENTAÇÃO

III.A - De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
«1. O Oponente era presidente do conselho de administração da sociedade G… – Sociedade Imobiliária, S.A. desde 17/07/2009 (cfr. doc. junto a fls. 41 a 52 do doc. de fls. 151, numeração do SITAF);
2. A sociedade G… – Sociedade Imobiliária, S.A. faz parte do grupo de sociedade designado por G…, do qual fazem parte as sociedades G… – Gestão de Comércio Total, SGPS,S.A., a G… – Distribuição Alimentar Directa, S.A., G… – Gestão de Plataformas e Transportes, S.A., P… – Supermercados, S.A. e a sociedade G… – Sociedade Imobiliários, S.A. (cfr. doc. de fls. 49 a 76 do doc. de fls. 432, numeração do SITAF);
3. O grupo empresarial G…, acima descrito, dedica-se à actividade de logística e distribuição, por grosso e a retalho, nas áreas alimentares e não alimentares (facto que se retira do relatório da E… & Y…, de fls. 432, numeração do SITAF);
4. Entre 2006 e 2010 o grupo empresarial G… desenvolveu, também, a sua actividade em Angola (facto que se retira dos relatórios da E… & Y…);
5. Em 10/10/2007 foi celebrado entre o Grupo de Coordenação do Presild – N…, criado por despacho do governo de Angola e o Grupo G…– Consultores e Serviços, Lda. e EAA – Entreposto Aduaneiro de Angola, E.P. um contrato
de Gestão Integrada Por Objectivos, relativo à conceptualização, implementação e gestão da Rede Integrada de Logistica e Distribuição, de uma nova rede de comercial de proximidade, das lojas pedagógicas para o sector do comercio e do desenvolvimento da produção interna (cfr. doc. junto a fls. 2 a 57, do doc. de fls. 3002 numeração do SITAF);
6. O negócio de Angola significava 50% do volume de negócio do grupo G… (depoimento das testemunhas T… e J…);
7. O negócio em Angola obrigou à criação de infra-estruturas em Portugal, bem como à contratação de mais pessoal (depoimento das testemunhas T…, M… e J…);
8. Em 11/10/2009 foi autuado o processo de execução fiscal n.º 2208201200901106201 que corre termos no serviço de finanças de Palmela contra a sociedade G… – Sociedade Imobiliária, S.A., por dívidas de IMT no montante de € 50.614,13, com data limite de pagamento de 31/12/2007 (cfr. doc. junto a fls. 1 e 2 do doc. de fls. 87, numeração do SITAF);
9. Ao processo identificado no ponto anterior foram apensos os processos de execução fiscal nºs 2208201101087550 e 2202201201078771 referentes a dívidas de IVA e IMI (facto que se retira do doc. de fls. 55 doc. doc. de fls. 1336, numeração do SITAF);
10.A executada requereu a suspensão do processo identificado no ponto anterior em virtude da existência de uma reclamação graciosa da liquidação (cfr. doc. junto a fls. 5 do doc. de fls. 87, numeração do SITAF);
11.Por oficio de 04/01/2010 foi a executada notificada para prestar garantia no montante de € 65.448,21 para suspender o processo executivo identificado em 8 (cfr. doc. de fls. 47 do doc. de fls. 87, numeração do SITAF)
12.A executada prestou garantia através da penhora do imóvel inscrito na matriz predial sob o artigo 1…., fracção “…”, da freguesia de São Vicente, Braga (facto que se retira do doc. De fls. 63 do doc. de fls. 87, numeração do SITAF);
13.Em Agosto de 2010 o Estado Angolano rescindiu unilateralmente o contrato identificado no ponto anterior com o grupo G… que operava em Angola (depoimento das testemunhas T…, M… e J…);
14.O Estado angolano ficou a dever ao grupo cerca de dezasseis milhões de euros (depoimento das testemunhas M… e J…);
15.Logo após a rescisão unilateral dos contratos por parte do Estado angolano o grupo apresentou um plano de negócio de forma a reestruturar toda a actividade do grupo (depoimento das testemunhas T…, M… e J…);
16.Este plano de reestruturação implicava um financiamento na ordem dos treze milhões de euros (depoimento das testemunhas M… e J…);
17.O grupo tentou renegociar os pagamentos aos fundos de investimento imobiliário (facto que se retira do relatório da E… & Y…, de fls. 432, numeração do SITAF, relatório de Fevereiro);
18.No âmbito do contrato de confirming os montantes apenas eram disponibilizados pelos bancos após a apresentação das facturas (depoimento das testemunhas T…, M… e J…);
19.A gestão do grupo tinha a possibilidade de realocar os montantes de plafond que tinham sido estabelecidos para os fornecedores (facto que se retira relatório da E… & Y…, de fls. 432,
numeração do SITAF, relatório de Fevereiro);
20.A banca não disponibilizava, nos prazos estabelecidos no plano de reestruturação, os montantes dos empréstimos concedidos nas datas acordadas o que dificultava a gestão (facto que se retira relatório da E… & Y…, de fls. 432, numeração do SITAF, relatório de Fevereiro);
21.Era a administração do grupo quem indicava à banca as instruções de pagamento à medida que ia celebrando acordos de fornecimento com os seus fornecedores, no âmbito do contrato de
Confirming e esta tinha de aprovar (facto que se retira relatório da E… & Y…, de fls. 432, numeração do SITAF, relatório de Fevereiro);
22.No mês de Março de 2011 já se tinha detectado uma necessidade de reforço dos empréstimos concedidos pela Banca (facto que se retira do relatório da E… & Y…, de fls. 568, numeração do SITAF, relatório de Março);
23.Foi acordado com o IAPMEI a participação do Estado através da PME Investimentos, S.A. e do Fundo Autónomo à Concentração e Consolidação de Empresas (FACCE), no apoio à tesouraria do grupo G… (facto que se retira do Memorando de entendimento junto a fls. 77 a 95 do doc. de fls. 568, numeração do SITAF);
24.Em 31/08/2011 foi assinado um Memorando de Entendimento entre C…, G… – Sociedade Imobiliária, S.A., a G… – Gestão de Comércio Total, SGPS,S.A., a G…– Distribuição Alimentar Directa, S.A., G… – Gestão de Plataformas e Transportes, S.A., P…– Supermercados, S.A. e a sociedade G… – Sociedade Imobiliários, S.A. e os Bancos Banco C…, S.A., Banco E…, S.A., Banco P…, S.A. e Banif – Banco I…, S.A. tendo em vista regulamentar os financiamentos existentes e financiamentos a contratar, do qual consta, designadamente, que o grupo de empresas se candidatou ao “Fundo Autónomo de Apoio à Concentração e Consolidação de Empresas” gerido pela PME Investimentos, S.A. (cfr. doc. junto a fls. 77 a 95 do doc. de fls. 568, numeração do SITAF);
25.Todos os esforços foram centrados nas sociedades operativas, a saber: G…, P… e GPT (facto que se retira do relatório da E… & Y… de fls. 568, numeração do SITAF, relatório de Março);
26.Em Março de 2011 já se tinha detectado ser necessário um reforço da linha de conforming (facto que se retira do relatório da E… & Y…, de fls. 568, numeração do SITAF, relatório de Março);
27.A banca, para garantir o financiamento, obrigou a que uma empresa externa fizesse o controlo de tesouraria, bem como que um CFO (chief financial officer) fosse nomeado para todas as empresas do grupo (depoimento das testemunhas M…, J… e J…);
28.Os pagamentos ficaram todos dependentes da aprovação do CFO e da E… & Y… (depoimento da testemunha J…);
29.Todas as disponibilidades financeiras do grupo eram controladas pela banca (depoimento das testemunhas M…, J… e J…);
30.Todos os pagamentos efectuados por ATM’s eram direccionados para a banca (depoimento das testemunhas M…, J… e J…);
31.Em 09/11/2011 a PME Investimentos, S.A. informou a G… – Gestão de Comercio Total, SGPS, S.A. dos termos e condições em que estavam dispostos a financiar o grupo na quantia de € 1.800.000,00 (cfr. doc. junto a fls. 17 a 24 do doc. de fls. 717, numeração do SITAF);
32.Em 17 de Novembro de 2011 foi celebrado entre a G… – Gestão de Comercio Total, SGPS, S.A. e a S… – M…, SGPS; S.A. um Acordo de Parceria (cfr. doc. de fls.
130 a 140 do doc. de fls. 568, numeração do SITAF);
33.Em 25/11/2011 foi celebrado entre as sociedades G…– Distribuição Alimentar Directa, S.A., G… – Gestão de Comercio Total, SGPS, S.A., o Banco C…, S.A. e o Banco E…, S.A. um contrato de Abertura de Crédito do qual consta que cada um dos dois bancos concede à primeira sociedade a quantia de € 1.900.000,00 em conta corrente, sendo que os Banco ficam com o poder de decidir de acordo com critérios de razoabilidade e práticas se, em cada momento, disponibilizam ou não os valores pedidos (cfr. doc. junto a fls. 112 a 126 do doc. de fls. 568, numeração do SITAF);
34.Em 25/11/2011 foi celebrado entre a devedora originária e a sociedade E… & Y… & Associados – SROC, S.A. um contrato de prestação de serviços do qual resulta que a segunda entidade passaria a desenvolver as funções de Revisor Oficial de Contas da devedora originária (cfr. doc. junto a fls. 43 a 49 do doc. de fls. 717, numeração do SITAF);
35.Todas as empresas do grupo G… foram obrigadas pela banca a nomear um CFO (depoimento das testemunhas M…, J… e J… e docs. de fls. 2 a 8 do doc. de fls. 717,
numeração do SITAF);
36.Todas as empresas do grupo G… foram obrigadas a celebrar contratos de prestação de serviço com a sociedade E… & Y… & Associados – SROC, S.A. no sentido de esta
passar a desenvolver as funções de Revisor Oficial de Contas das empresas do grupo (cfr. docs. junto a fls. 27 a 73 do doc. de fls. 717, numeração do SITAF);
37.Em 15/12/2011 foi celebrado um aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito, identificado no ponto 33, do qual consta que é alterada a data de vencimento do contrato, passando esta a ser em 31/12/2011 (cfr. doc. junto a fls. 75 a 78 do doc. de fls. 717, numeração do SITAF);
38.Em 28/12/2011 foi celebrado um aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito celebrado em 28/05/2011, entre o Banco C… , S.A. e a G… – Gestão de Comercio Total,
SGPS, S.A. passando o empréstimo a vencer-se em 31/12/2013 (cfr. doc. junto a fls. 79 a 82 do doc. de fls. 717, numeração do SITAF);
39.Em 28/12/2011 foi celebrado um aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito – Contrato Umbrella Grupado - celebrado em 29/12/2004, entre o Banco C…, S.A., a G… – Gestão de Comercio Total, SGPS, S.A., a G… – Sociedade Imobiliária, S.A., a G… – Distribuição Alimentar Directa, S.A., G… – Gestão de Plataformas e Transportes, S.A., P… – Supermercados, S.A. e a sociedade G… – Sociedade Imobiliária, S.A., sendo disponibilizado um crédito de € 10.000.000,00 que se vence em 31/12/2013, podendo ser prorrogado por prazos sucessivos de noventa dias, sendo que todas as utilizações de crédito terão de ser autorizadas pelo Banco (cfr. doc. junto a fls. 84 a 90 do doc.
de fls. 717, numeração do SITAF);
40.No âmbito do processo de execução fiscal referente à dívida de IVA, a devedora originária apresentou um requerimento solicitando o pagamento da mesma em prestações, em 27/09/2011 (cfr. doc. junto a fls. 3 a 4 do doc. de fls. 1520 numeração do SITAF);
41.A G…. – Sociedade Imobiliária, S.A. intentou um processo especial de revitalização que correu termos sob o nº 1522/12.6TYLSB junto do 3º Juízo do Tribunal do Comercio de Lisboa (facto que se retira do doc. de fls. 5 a 7, 16 a 18 do doc. De fls. 151, numeração do SITAF);
42.No âmbito do processo identificado no ponto anterior o Administrador judicial provisório, em face da impossibilidade de elaboração dum PER, requer que seja declarada a insolvência da
sociedade G… – Sociedade Imobiliária, S.A. (cfr. doc. junto a fls. 37 a 39, do doc. de fls. 902, numeração do SITAF);
43.Em 05/04/2013 foi proferida sentença a declarar a insolvência da sociedade G… – Sociedade Imobiliária, S.A. tendo sido nomeado administrador da insolvência J… (cfr. doc. junto a fls. 18 a 23, do doc. de fls. 287, numeração do SITAF);
44.No âmbito do processo de insolvência nº 638/13.6TYLSB foi elaborado um relatório pelo Administrador da Insolvência do qual consta que a sociedade em questão tentou a recuperação mas tal não foi possível, que a sociedade não tem qualquer actividade, bem como que a sociedade possui um passivo substancialmente superior ao seu activo (cfr. doc. junto a fls. 29 a 36 do doc. de fls. 902, numeração do SITAF);
45.No âmbito do processo identificado no ponto anterior foi elaborada uma lista provisoria de credores da qual consta que as dívidas da sociedade ascendem a € 48.566.379,33 (cfr. doc. junto
a fls. 41 a 51 do doc. de fls. 902, numeração do SITAF);
46.Em 05/09/2012 a devedora originária remeteu ao serviço de finanças um oficio informando que se encontra a correr um PER e convidando a AT a participarem nas negociações, bem como que detinham 20 dias contados da nomeação do administrador judicial provisório para reclamarem créditos (cfr. doc. junto a fls. 21 do doc. de fls. 151, numeração do SITAF);
47.Em 03/09/2012 foi nomeado administrador provisório da J… (cfr. doc. junto a fls. 23 a 25 , do doc. de fls. 151, numeração do SITAF );
48.Em 18/09/2012 deu entrada no serviço de finanças de Palmela uma carta da devedora originária dando conhecimento que, de acordo com o entendimento do Administrador Judicial Provisório, se deixariam de cumprir os planos prestacionais respeitantes a impostos por aquele entender que os montantes globais vencidos se encontram na lista de créditos reclamados, pelo que a liquidação destas responsabilidades terá de ser remetida para o momento das decisões tidas no âmbito do Plano de Recuperação (cfr. doc. junto a fls. 35 do doc. de fls. 151, numeração do SITAF);
49.Em 09/05/2013 foi elaborada uma informação no serviço de
finanças de Palmela da qual consta que a devedora originária se
encontra em processo de insolvência, que desde 17/07/2009 são seus administradores o Oponente e outros (cfr. doc. junto a fls. 35 a 37, do doc. de fls. 212, numeração do SITAF);
50.Em 21/05/2013 foi proferido despacho no sentido de ouvir o Oponente e outros sobre a intenção de contra si reverterem as dívidas exequendas, afirmando-se que, muito embora existam bens em nome da devedora originária, a sociedade tem uma situação liquida negativa e foi declarada a sua insolvência (cfr. doc. junto a fls. 54 a 57, do doc. de fls. 212, numeração do SITAF);
51.O Oponente foi notificado para se pronunciar sobre a intenção de contra si reverterem as dívidas exequendas (cfr. doc. junto a fls. 62 do doc. de fls. 212, numeração do SITAF);
52.O Oponente exerceu o seu direito de audição prévia (cfr. docs. juntos a fls. 25 a 77 do doc. de fls. 355, numeração do SITAF);
53.Por despacho de 31/10/2013 foi ordenada a reversão dos presentes autos executivos contra o Oponente (cfr. doc. junto a fls. 31 a 49, do doc. de fls. 837, numeração do SITAF);
54.Por despacho de 15/01/2014 foi anulado o despacho identificado no ponto anterior (cfr. doc. de a fls. 14 do doc. de fls. 1145, numeração do SITAF);
55.Foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo Oponente no seu direito de audição prévia (facto que se retira dos docs. de fls. 40 a 58 do doc. de fls. 1404, numeração do SITAF);
56.Em 13/05/2014 foi proferido despacho a ordenar a reversão do processo executivo contra o oponente e outro (cfr. doc. junto a fls. 59 a 70 do doc. de fls. 1404, numeração do SITAF, e 1 a 13 do doc. de fls. 1474, numeração do SITAF);
57.Do despacho identificado no ponto anterior consta o seguinte:




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(…)” (cfr. doc. junto a fls. 51 a 75 do doc. de fls. 1, numeração do
SITAF);
58.Durante o ano de 2011, mais concretamente nos meses de Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro, a devedora originária efectuou pagamentos voluntários no montante de € 22.865,96 (cfr. doc. junto a fls. 1 a 4 do doc. de fls. 2998, numeração do SITAF);
59.Durante o ano de 2011 as várias empresas que compõe o grupo G… efectuaram pagamentos ao Estado, no âmbito de processos de execução fiscal, a quantia global de € 352.130,05 (cfr. doc. de fls. 1 a 4 do doc. de fls. 2998, numeração do SITAF);
60.Sempre houve uma separação entre o património do oponente e das várias empresas do grupo (depoimento das testemunhas T…, M…, J… e R…);
*
A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:
«Dos factos constantes da oposição, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.».

*
Mais resulta consignado em termos de motivação da matéria de facto o seguinte:
«A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como dos depoimentos das testemunhas arroladas.
A primeira testemunha inquirida, T…, declarou ser responsável de controlo de gestão. Declarou ter trabalhado no grupo “G… – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde Agosto de 2007 até Novembro de 2011. Esclareceu que o grupo era um grupo de distribuição alimentar, tendo referido que a devedora originária fazia a gestão do parque imobiliário do grupo.
Afirmou ainda que o grupo tinha negócios em Portugal, Espanha e Angola. Ainda esclareceu qual a natureza e objectivos do contrato celebrado com Angola. O projecto consistia em implementar cerca de dez mil pequenos supermercados em Angola. As empresas do grupo cederiam o Know-how, bem como produtos que importava para serem vendidos nas lojas. Mais esclareceu que esteve em Angola e teve conhecimento que o Estado Angolano rescindiu unilateralmente o contrato com o grupo. Mais esclareceu que o volume de negócio com Angola significava cerca de 50% do volume de negócios do grupo. Esclareceu ainda que tinha grande peso o fornecimento as forças armadas e que era feito pela G… portuguesa, nada tendo a ver com a empresa G… angolana. Logo a seguir a esta situação, o grupo teve de se reestruturar e foi o que aconteceu logo em finais de 2010. Teve de ocorrer uma renegociação com os fornecedores, nomeadamente porque as compras iriam diminuir. O grupo teve de se socorrer de uma linha de conforming, em que os Bancos apenas efectuavam os pagamentos mediante a apresentação das facturas dos fornecedores e depois de os aprovarem. Mais esclareceu que a própria E… afirmou que se não ocorressem financiamentos até Março a sociedade entraria
em incumprimento. Declarou saber que a banca, numa fase inicial, apoio o grupo, mas entretanto, não sabe dizer quando, voltou atrás. Afirmou ainda que havia uma total separação entre o património do grupo e o património do Oponente. Também afirmou que as empresas tinham a sua tesouraria separada embora a gestão da mesma fosse efectuada centralmente. Mais afirmou que a devedora originária não tinha quaisquer interesses directos em Angola. O depoimento desta testemunha foi credível, seguro, isento, descomprometido e convicto, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs.
A segunda testemunha inquirida, M…, advogada, afirmou ter trabalhado no grupo “G… – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde 2005 até 2013. Tinha a seu cargo a acessória jurídica ao grupo e ao conselho de Administração. Afirmou que a devedora originária, e outra empresa do grupo, detinha o património imobiliário
do grupo. Esta empresa arrendava os seus imóveis às outras empresas do grupo. Esclareceu que a actividade em Angola foi iniciada a convite do governo angolano. O que aconteceu foi que o grupo foi exercer a sua actividade lá. Durante cerca de 4 anos os negócios correrem sem percalços. Foi por isso inesperado o terminus do negócio. Logo após esta situação foi, de imediato, apresentado um plano de reestruturação do negócio. Afirmou que em Setembro de 2011, não existiam quaisquer dívidas fiscais. O plano de reestruturação implicava um apoio financeiro na ordem dos treze milhões de euros. Os bancos não disponibilizaram a linha de conforming antes de Janeiro/Fevereiro de 2011. Isto fez com que não fosse possível tirar partido da época natalícia prejudicando o plano de negócios. Esclareceu também que a banca para garantir o financiamento obrigaram a que uma empresa externa fizesse o controlo de tesouraria, bem como um CFO (chief financial officer) que foi nomeado para todas as empresas do grupo. Afirmou que o trabalho foi feito de forma global, ou seja, os recursos eram distribuídos por todas as empresas de modo a que nenhuma ficasse prejudicada. A determinada altura, foi decidido pelo CFO que os impostos seriam pagos parceladamente para permitir cumprimento de várias obrigações. Esclareceu ainda que no âmbito do PER, foi a própria banca que nomeou o Dr. J… como administrador judicial. O que se pretendia com o PER era ganhar tempo e para evitar que os fornecedores viessem pedir a insolvência da sociedade. Durante todo o processo a administração do grupo teve uma atitude pro-activa no sentido de recuperar a actividade do grupo. Nunca houve um cruzar de braços. O PER tinha também como pressuposto vir a ser celebrado um contrato de parceria de negócio, mas com todas as demoras decorrentes do próprio PER, o parceiro de negócio, que no caso era a S…, acabaram por desistir o que levou ao fracasso do PER. Afirmou ainda, de forma muito peremptória, que nunca houve nenhuma retirada de património da sociedade para o seu administrador. Esclareceu ainda que a dívida da empresa angolana ao grupo ascendia a cerca de dezasseis milhões de euros. Esta dívida resulta do incumprimento das cláusulas do contrato, nomeadamente de remunerações resultantes dos serviços prestados pelo grupo. Ainda esclareceu que com a nomeação do administrador da insolvência aí foram dadas instruções directas que os impostos não seriam para pagar. O depoimento desta testemunha foi seguro, coerente, claro e isento, descomprometido e convicto, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs.
A terceira testemunha inquirida, J…, revisor oficial de contas, declarou ter trabalhado na sociedade desde cerca de 2000 até cerca de 2012. Era o responsável pela revisão de contas do grupo. Esclareceu que o negocio em Angola obrigou à criação duma estrutura em Portugal, para satisfazer a estrutura angolana, bem como à deslocação de trabalhadores do grupo para Angola, onde tinham também uma infra-estrutura logística.
Confirmou que o negocio em Angola representava cerca de 50% do volume de negócios do grupo. Foram montados, em Portugal, estruturas informáticas e outras, para sustentar as operações em Angola. A própria necessidade de cessar contratos de trabalho com os colaboradores do grupo que se encontravam em Angola criaram custos muito relevantes. Teve de ser criado um centro de logística que teve de ser construído para fazer face à actividade de Angola que, de repente, ficou completamente sem actividade e préstimo.
Afirmou que logo em seguida, a administração entrou em contacto com a banca e foi elaborado um plano de negócios por forma a reestruturar o negocio. Toda esta negociação com a banca demorou muito tempo o que originou ao incumprimento do grupo para com fornecedores. Esclareceu ainda que todos os pagamentos dos clientes ficavam logo nos bancos. Afirmou também que os bancos obrigaram à contratação dum CFO que era quem controlava tudo, no
que respeitava aos meios financeiros do grupo. Na opinião da testemunha foram os atrasos no financiamento por parte da banca que acabou por determinar a insolvência do grupo e das empresas do grupo. Mais afirmou que todos os fundos gerados eram sempre canalizados para o negócio, até porque era um grupo que se encontrava em permanente crescimento. Também
esclareceu que foi já no âmbito do PER que deixaram de ser feitos os pagamentos, ainda que prestacionais, à AT. Esclareceu que esse foi o entendimento do administrador judicial, tanto assim que foi pedido um esclarecimento à AT se esse seria o entendimento correcto. Esclareceu ainda que, pelo menos, os valores pagos em TPA’s eram imediatamente direccionados para a banca. Também este depoimento foi claro, coerente, seguro, isento, convicto e descomprometido, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs.
A quarta testemunha inquirida, R…, contabilista certificada, disse ter prestado serviços para o grupo “G… – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde Setembro de 2001 até Fevereiro de 2011. Esclareceu que trabalhava na sociedade que fazia a contabilidade de todas as empresas do grupo. Afirmou que depois do pagamento aos funcionários, mesmo antes dos pagamentos aos fornecedores, eram sempre pagos todos os impostos. Mais esclareceu que até ao momento em que deixou a sociedade os impostos estavam todos regularizados. Esclareceu que no momento em que os impostos que se encontram aqui a ser exigidos a empresa já se encontrava em dificuldades financeiras. Também este depoimento foi claro, coerente, seguro, isento, convicto e descomprometido, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs.
A quinta testemunha inquirida, J…, disse ter trabalhado para o grupo “G… – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde meados Novembro de 2011, como supervisor financeiro, nomeado pelos Bancos M… e B…, de algumas empresas do grupo. Esclareceu também que toda e qualquer disponibilização de meios financeiros por parte dos bancos para o grupo dependia de dois pareceres favoráveis, um da própria testemunha e outro
da E… & Y…. Durante o curto período que esteve a desempenhar as suas funções, não havia impostos em incumprimento. De duas uma, ou estavam a ser pagos no âmbito de planos prestacionais, ou seriam impostos que se encontravam a ser discutidos. Durante cerca de um mês e meio, dois meses, houve tesouraria e por isso os impostos iam sendo pagos. Depois deixou de haver tesouraria. Na opinião da testemunha a situação de insolvência apenas se ficou a dever a insegurança no envolvimento da banca no grupo e que a injecção de capital foi mínima e com isso ocorreu o incumprimento do grupo. A banca hesitou e isso resultou na insolvência da sociedade. Esclareceu que a banca, quando a testemunha começou a exercer as suas funções, controlava a totalidade das entradas de capital nas empresas do grupo.
Também este depoimento foi absolutamente isento, coerente, claro, seguro, convicto e descomprometido, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs.».

*
Quanto à impugnação da matéria de facto

Insurge-se a Recorrente quanto à factualidade consignada nos pontos 6., 7., 13., 14., 15., 28., 30., 31., 39., 41. e 46. da decisão da matéria de facto expendida na sentença recorrida, defendendo que «não está suficientemente alicerçada ou é desmentida por documentação que está junta nos Autos».

Entende, por seu turno, o Recorrido que devem improceder estas conclusões da Recorrente quanto à impugnação da factualidade em causa que ficou consignada na sentença recorrida.

Vejamos.

Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão.

Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:

(i) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cf. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];


(ii) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cf. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;

(iii) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cf. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Como tal, não basta ao recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo-se-lhe os ónus já mencionados.

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que quanto aos pontos 7., 13., 14., 15. e 41. a Recorrente não logrou dar cumprimento ao que preceitua o art.º 640.º do CPC, porquanto não indica os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. Com efeito, quanto à factualidade que ficou consignada nestes pontos do probatório a Recorrente limita-se a manifestar a sua discordância, não tendo, conforme deveria, indicado os meios de prova que, no seu entender, poderiam levar a conclusão distinta daquela que foi extraída pelo Tribunal a quo. Donde, improcedem, nesta parte, as conclusões recursivas em exame.

Relativamente ao que a Recorrente pugna quanto aos pontos 31., 39. e 46 do probatório, não se percebe a razão das alterações pretendidas. É que a modificabilidade da decisão da matéria de facto tem, pois, como pressuposto necessário e lógico que os factos a aditar ou modificar sejam relevantes e pertinentes para a decisão a proferir. E neste conspecto a Recorrente nada diz para justificar as pretendidas alterações quanto ao que ficou plasmado nestes concretos pontos do probatório, sendo que este Tribunal também não vislumbra qualquer pertinência nas mesmas, tendo em conta a questão em dissídio nos autos. Pelo que improcedem, também, estas conclusões recursivas.

Por último, estando cumpridas as exigências constantes do art.º 640.º do CPC quanto aos pontos 6., 28., 30. cumpre, assim, apreciar.

Começa a Recorrente por afirmar que o facto ínsito no ponto 6. do probatório deveria ter sido dado como não provado, dado que «não existe qualquer outra prova, para além do declarado pelas testemunhas de que o negócio com angola representava 50% do volume de negócio do Grupo G…[tal é referido na pág. 14 do Business Plan 2011 – 2013 (documento n.º 3, junto a fls. 2529)».

Ora, na fixação da matéria de facto o julgador decide de harmonia com o princípio da livre apreciação da prova (cf. art.º 607.º, n.º5 do CPC), sendo que in casu, na sentença recorrida foi apontado que este facto se encontra ancorado no depoimento das testemunhas T… e J…. E, aparentemente, o depoimento destas testemunhas foi suficiente para que o Tribunal a quo considerasse como provada a factualidade em causa.

Como é sabido, o tribunal forma a sua convicção sobre a prova atendendo a todos os meios de prova produzidos. Nesta análise, o tribunal goza de uma ampla margem de discricionariedade de apreciação, controlável apenas através de fundamentação da sentença, pela motivação aí indicada, que deve ter-se por acertada quando seja alicerçada em argumentos coerentes, razoáveis e plausíveis, que se coadunem com as regras da racionalidade, da lógica, da ciência e da experiência comum. O tribunal examina e avalia livremente a prova produzida, segundo a sua prudente convicção, valendo o referido princípio, de forma plena, frente à prova testemunhal, pericial, por inspeção, ou por declaração de partes. Quanto às principais ressalvas ao princípio, reconduzem-se aos factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, àqueles que só possam ser provados por documentos, aos factos que estejam plenamente provados, por documento, por acordo ou confissão das partes - cf. art.ºs 413.º, 466.º, n.º 3 e 607.º, n.º 5, do CPC.

Com efeito, à luz do princípio da livre apreciação da prova, «um facto resultará provado (ou não) consoante o juiz, perante a prova produzida, se tenha convencido de que o mesmo incorreu efetivamente ou não (…)» – cf. Helena Cabrita, in A sentença cível, fundamentação de facto e de direito, 2ª edição Revista e Atualizada, Almedina, pág. 185.

E, no caso, o Tribunal a quo ficou convencido desse facto, tendo também em conta o restante contexto fáctico dos autos relativo ao investimento feito em Angola, tal como ficou assinalado na motivação da decisão da matéria de facto que consta da sentença recorrida.

Acresce que na contestação apresentada esse facto não foi minimamente refutado e na presente lide recursiva é a própria Recorrente que reconhece que, pelo menos, também no documento n.º3 da petição inicial é feita referência a esse facto, não tendo sido colocada em crise a genuinidade desse documento. E assim sendo, não vemos razão para alterar o sentido da decisão do Tribunal a quo.

De igual forma, também não se descortina que a factualidade consignada no ponto 28. do probatório enferme do erro que lhe vem imputado pela Recorrente: é que como vem explanado nas contra-alegações de recurso, o depoimento da testemunha José da Silva Pereira foi categórico em afirmar que os pagamentos estavam dependentes do seu parecer prévio e da sociedade E… & Y….
Por outro lado, do contexto dos presentes autos resulta que essa exigência procedimental decorre do acordo alcançado entre a executada originária e as entidades bancárias para financiar a sua atividade (cf. pontos 26. e 27.), afigurando-se, assim, devidamente justificada e enquadrada nesse exato circunstancialismo. Pelo que improcedem também estas alegações da Recorrente.

Também no que se refere ao ponto 30. do probatório, verificamos que a impugnação quanto à factualidade aqui consignada não pode proceder: é que, como apontado no que tange à contestação do ponto 28. do probatório, também aqui o Tribunal a quo se socorreu do depoimento das testemunhas M…, J… e J… para formar a sua convicção neste âmbito. E não tendo a Recorrente abalado ou refutado a credibilidade dos seus depoimentos, tendo ainda feito menção à existência de suporte documental respeitante a este tema, concluímos que também estas alegações não podem proceder.

Termos em que o recurso não pode deixar de estar condenado, nesta parte, ao insucesso, pelo que se indefere a pretendida modificação da decisão da matéria de facto.
*
III.B De Direito

Insurge-se a Recorrente contra a sentença recorrida por, alegadamente, padecer de erro de julgamento na interpretação e aplicação do direito, concretamente em relação à ilisão pelo Recorrido da presunção de culpa ínsita na alínea b) do n.º1 do art.º 24.º da LGT. Vem a Recorrente peticionar a revogação da sentença que recaiu sobre a oposição à execução fiscal apresentada no PEF n.º 2208201200901106201 e apensos, defendendo, em suma, que o Recorrido não logrou alegar e provar factos que permitam afastar a aplicação da acima apontada presunção de culpa.

Considera, por seu turno, o Recorrido, assim como o EMMP junto deste Tribunal, que as conclusões recursivas devem ser julgadas improcedentes e, em consequência, deve ser mantida a sentença recorrida na ordem jurídica

Apreciemos.

Adiantando, desde já, a nossa posição, entendemos que não tem razão a Recorrente. Vejamos, então, porquê.

In casu, é indisputada a administração de facto da executada originária por parte do Recorrido, defendendo, no entanto, que é parte ilegítima ao abrigo do art.º 24.º, n.º1, alínea b) da LGT, porquanto não lhe pode ser imputada a falta de pagamento das dívidas tributárias.

Quanto à questão da ilegitimidade, dispõe o art.º 204.º, n.º 1, al. b) do CPPT que a oposição pode ter como fundamento a «[i]legitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor ou, sendo o que nele figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida».

Encontramo-nos, assim, perante uma ilegitimidade substantiva, assente na falta de responsabilidade do citado pelo pagamento da dívida exequenda. Quanto à questão da legitimidade do responsável subsidiário, encontramo-nos face a leis sobre a prova de atos ou factos jurídicos que simultaneamente afetam o fundo ou substância do direito, repercutindo-se, assim, sobre a própria viabilidade deste, pertencendo, por isso, ao direito substancial.

É, com efeito, pacífica a jurisprudência no sentido da aplicação a cada situação da lei que rege sobre o ónus da prova vigente quando se verificam os pressupostos de tal responsabilidade, visto se estar perante norma de cariz substantivo e atento o princípio tradicional da não retroatividade da lei substantiva, consagrado no artigo 12.º, n.º 1, do Código Civil («CC»).

Ora, no caso que agora nos ocupa, é aplicável o regime constante no art.º 24.º da LGT, que, no que importa, refere o seguinte no seu n.º 1:

«[o]s administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.».

O citado art.º 24.º da LGT consagra nas suas alíneas a) e b) uma repartição do ónus da prova da culpa, distinguindo entre:

(i) as dívidas vencidas no período do exercício do cargo relativamente às quais se estabelece uma presunção legal de culpa na falta de pagamento (cf. a parte final da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT); e,

(ii) as demais previstas como geradoras de responsabilidade, concretamente, aquelas cujo facto constitutivo se tenha verificado no período do exercício do cargo (e não se vençam neste) e aquelas cujo prazo legal de pagamento ou entrega termine já após o termo do exercício do cargo. Nestas situações o ónus da prova impende sobre a Administração Tributária («AT»), ou seja, os gerentes ou administradores podem ser responsabilizados desde que seja feita prova da culpa dos mesmos na insuficiência do património social.

No caso vertente, conforme resulta do recorte probatório dos autos, o despacho de reversão fundamentou-se na alínea b), do n.º 1, do art.º 24.º da LGT (cf. pontos 56. e 57. da factualidade provada), por estar assente e ser indisputado que o Recorrido exerceu funções de administrador da sociedade devedora originária, quer no período em que as dívidas se constituíram, quer no período em que se venceram, estando, por conseguinte, o Recorrido onerado com a respetiva presunção de culpa, imputando-lhe a falta de pagamento.

Razão pela qual, compete, assim, apurar se o Recorrido logrou ilidir a presunção de culpa que sobre ele recai nos termos desta disposição legal, da qual resulta ser-lhe assacado o ónus da prova de que não lhe foi imputável a falta de pagamento.

Dir-se-á, numa tentativa de densificar os contornos da ilisão da apontada presunção de culpa, que o que se presume é que o gestor não atuou com a observância das disposições legais aplicáveis aos gestores, em especial as contempladas no art.º 64.º do Código das Sociedades Comercias («CSC»), que lhe impõem a observância de deveres de cuidado, de disponibilidade, de competência técnica, de gestão criteriosa e ordenada, de lealdade, no interesse da sociedade e dos sócios que sejam relevantes para a sustentabilidade da sociedade.

A culpa, aqui em causa, como também se encontra perfeitamente estabilizado pela jurisprudência (cf., entre muitos outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo - «STA» - de 08/11/2023, proc. n.º 0709/14.1BEALM, disponível em www.dgsi.pt), deve aferir-se pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto e em termos de causalidade adequada, a qual não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano.

Como sublinha, a este respeito, a jurisprudência, a culpa «consiste na omissão reprovável de um dever legal de diligência, que é de aferir em abstrato, tendo como padrão o zelo do bónus pater familiae colocado na veste de um gerente competente e criterioso» (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 10/10/2000, processo n.º 1564/98) e «afere-se em abstrato, (…), operando com a teoria da causalidade, seguindo um processo lógico de prognose póstuma, por forma a averiguar se a atuação do gerente da sociedade originária devedora, concretizada quer em atos positivos quer em omissões, foi adequada à insuficiência do património societário para a satisfação dos créditos fiscais» (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 12/10/2004, processo n.º 00081/04, disponível em www.dgsi.pt).

Assim, «o ato ilícito e culposo que se presume praticado pelo gestor não se fica pela omissão de pagamento do imposto vencido.
(…)
Para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem pois que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável» (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 27/11/2014, processo n.º 06191/12, disponível em www.dgsi.pt).

No mesmo sentido, pode ler-se no acórdão do STA de 11/07/2012, processo n.º 0824/11, disponível em www.dgsi.pt o seguinte:
«I - O facto ilícito suscetível de fazer incorrer o gestor na responsabilidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT não se consubstancia apenas na falta de pagamento da obrigação tributária, mas também numa atuação conducente à insuficiência do património da sociedade.
II - Para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável.».

Assinala Sérgio Vasques a este propósito que «ao impor ao gestor o ónus de provar que “não lhe foi imputável a falta de pagamento” o que se lhe exige, afinal, é que demonstre que não foi por culpa sua que o património da empresa se tornou insuficiente para satisfazer a dívida tributária» (Manual de Direito Fiscal, 2ª edição, pág. 407) e que «A ilicitude está, numa e outra disposições, não na mera falta de pagamento, mas na violação das normas dirigidas à protecção dos credores da empresa. E, numa e outra disposições, essa violação haverá de ser culposa também. Só assim faz sentido o conjunto do art. 24.º» (in “A Responsabilidade dos Gestores na Lei Geral Tributária”, Fiscalidade, n.º 1 (Jan.2000), pág.47-66).

Regressando, então, agora ao caso dos presentes autos, e como acima já se apontou, tendo em conta a factualidade assente e o quadro normativo in casu aplicável, consideramos, acompanhando o bem gizado discurso fundamentador da sentença recorrida, que o Recorrido logrou provar que é parte ilegítima na execução fiscal porquanto ilidiu a presunção de culpa em causa, não enfermando, por isso, a sentença recorrida do erro de julgamento que lhe vem assacado pela Recorrente.

Senão vejamos.

Como resulta da factualidade assente, a AT sustenta a responsabilidade subsidiária do Oponente – agora Recorrido – no disposto na alínea b), do n.º 1, do art.º 24.º da LGT (cf. pontos 56. e 57. dos factos provados), cabendo-lhe, assim, porquanto se presume a sua culpa, provar que a falta de pagamento das dívidas revertidas não lhe é imputável.

Vejamos, então, se, tal como se decidiu na sentença recorrida, o Recorrido logrou demonstrar que não foi por culpa sua que o património da sociedade devedora originária se tornou insuficiente para solver as dívidas em causa.

Da factualidade assente nos autos resulta que o “Grupo G…”, do qual a sociedade devedora originária faz parte (cf. ponto 2. dos factos provados), a partir de 2006, expandiu a sua atividade para Angola (cf. pontos 4. e 5. dos factos provados).

Resulta, igualmente, da factualidade dos autos que, em agosto de 2010, sem que nada o fizesse prever, o Estado Angolano rescindiu unilateralmente o contrato que havia celebrado com o “Grupo G…” (cf. ponto 13. dos factos provados), na sequência do que o grupo perdeu cerca de 50% do respetivo volume de negócios (cf. ponto 6. dos factos provados) e ficou com um crédito de cerca de dezasseis milhões de euros (cf. ponto 14. dos factos provados).

Mais resulta que, na sequência do sucedido, o “Grupo G…” e, bem assim, a administração de cada uma das sociedades que o integra, designadamente a sociedade devedora originária, procurou, de imediato, reestruturar a respetiva atividade, designadamente através do recurso a financiamentos bancários (cf. pontos 15., 16., 17., 18., 24. e 33. dos factos provados), do apoio do Estado (cf. ponto 23. dos factos provados), e de parecerias com outras sociedades (cf. ponto 32. dos factos provados), que lhe permitissem manter a atividade e, bem assim, cumprir com os seus compromissos.

Emerge, também, do probatório que a Banca aceitou, numa primeira fase, apoiar a reestruturação do “Grupo G…” (cf. pontos 33., 37., 38. e 39. dos factos provados), mas as delongas do processo de financiamento, que determinaram constrangimentos diversos na tesouraria da sociedade devedora originária, levaram-na a apresentar um plano especial de revitalização (cf. ponto 41. dos factos provados), no âmbito do qual, porém, não foi possível alcançar nenhum acordo com os respetivos credores, vindo, posteriormente, a ser declarada a sua insolvência (cf. pontos 42., 43. e 44. dos factos provados).

Donde, poder-se-á inferir que a insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária se deveu a circunstâncias que são alheias à conduta do Recorrido e que não lhe podem ser imputadas.

Por outro lado, forçoso será concluir também que o Recorrido, enquanto presidente do conselho de administração da sociedade devedora originária, viabilizou - assinando toda a documentação necessária - a reestruturação da atividade da referida sociedade, encetando, assim, as diligências necessárias – e possíveis – a manter a atividade da sociedade e, bem assim, a evitar (ou ultrapassar) a sua situação de insolvência.

Não se pode, aliás, ignorar que durante este período, o “Grupo G…”, e, em concreto, a sociedade devedora originária, passou a ver todos os seus pagamentos sujeitos a prévia aprovação da Banca, quer por via do “CFO” nomeado (cf. ponto 35. dos factos provados), quer por via da sociedade revisora oficial de contas designada (cf. ponto 36. dos factos provados).

Acresce, ainda, que, após a apresentação do plano especial de revitalização, terá sido por indicação do Administrador Judicial Provisório que foram suspensos todos os pagamentos devidos pela sociedade devedora originária (cf. 47. dos factos provados), disso tendo sido dado conhecimento à AT (cf. ponto 48. dos factos provados).

Demonstrada que ficou a existência de causas externas à vontade do próprio conselho de administração da sociedade devedora originária, e, bem assim, do ora Recorrido, e que, perante a situação económico-financeira deficitária, o conselho de administração, e, bem assim, o ora Recorrido, tudo fez para reestruturar a atividade da sociedade, ter-se-á que concluir que inexiste o necessário nexo de imputação entre a atuação do Recorrido e a insuficiência do património da sociedade devedora originária.

O Recorrido logrou, assim, provar, como lhe competia, ter desenvolvido todas as diligências possíveis para solver as dívidas da sociedade devedora originária, não lhe podendo, pois, ser imputável a falta de pagamento da dívida em causa nos presentes.

Como supra se referiu, a culpa consiste na omissão reprovável de um dever de diligência, só assim se podendo afirmar que o resultado danoso se ficou a dever fundamentalmente a uma deficiente gestão ou administração da sociedade devedora originária.

Resulta demonstrado que, tão logo se deparou com uma situação de crise financeira, a administração da sociedade devedora originária acionou os mecanismos legais atinentes à proteção dos seus credores, maxime a evitar a sua situação de insolvência, e que, no exercício dos seus poderes de administração, o Recorrido usou da diligência que lhe era exigível no sentido de evitar essa situação.

Donde, perante os elementos de facto é de concluir que a insuficiência do património da devedora originária não foi devida a uma administração negligente, de molde a imputar ao Oponente a responsabilidade pelas dívidas em questão na execução fiscal.

No que diz respeito a esta temática, o STA, em acórdão de 08/11/2023, processo n.º 0709/14.1BEALM, disponível em www.dgsi.pt, em que era revertido um membro do conselho de administração de outra sociedade do «grupo G…» (a G… – Sociedade Imobiliária, S.A.), já perfilhou o entendimento que «temos por adquirido que os fundamentos invocados no Acórdão recorrido não são de molde a justificar a solução perfilhada no sentido de concluir pela responsabilidade tributária do Recorrente pela dívida revertida, por não ter logrado ilidir a presunção de culpa, o que implica a procedência do presente recurso, a revogação do Acórdão recorrido, subsistindo a decisão proferida em 1ª instância.». Ou seja, também o STA entende que numa situação fáctica em tudo idêntica à dos presentes autos se deve considerar que o visado – membro do conselho de administração da acima indicada sociedade – logrou ilidir a presunção de culpa ínsita na alínea b), do n.º1 do art.º 24.º da LGT.

Pelo que a posição sufragada neste acórdão do STA, e em harmonia com o plasmado no art.º 8.º, n.º 3 do Código Civil, que postula que «[n]as decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito», sendo inteiramente aplicável ao caso dos autos, dado que a factualidade relevante é em tudo idêntica aquela que dimana in casu assente, sendo, por outro lado, a mesma questão de direito em dissídio, impõe a conclusão no sentido que acima se apontou: o Recorrido logrou ilidir a presunção de culpa consagrada na alínea b) do n.º1 do art.º 24.º da LGT.

Em face do exposto, conclui-se que do acervo probatório dos autos é possível ilidir a presunção com a qual se encontrava onerado, pois foi feita prova positiva por parte do Recorrido que não atuou com culpa na falta de pagamento das dívidas objeto de cobrança coerciva.

E por assim ser, a decisão recorrida não padece do erro de julgamento que lhe vem assacado, devendo, por isso, ser mantida na ordem jurídica, o que de seguida se decidirá.
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IV- DECISÃO

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 03 de abril de 2025

(Filipe Carvalho das Neves)

(Lurdes Toscano)

(Luísa Soares)